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PREFÁCIO

Há livros difíceis de classificar, e Como aprendi o português é um


desses. Quais são seus temas centrais? Crítica literária e cultural?
Investigações acerca da natureza das línguas e da história pervertida do
século XX? Esboços autobiográficos e recordações de amigos seus
assassinados durante a guerra? Uma ponte entre idiomas, culturas e
tradições que, antes de seu trabalho, ignoravam-se quase completamente
entre si? Tudo isso e mais. E, ainda assim, tamanha riqueza e variedade
não diminuem em nada a coerência desta reunião de ensaios. Pois ocorre
que o autor tampouco é fácil de classificar.
Paulo Rónai, um judeu húngaro salvo da morte certa no Holocausto
graças a seu interesse pelo português e pela literatura brasileira, foi, entre
outras coisas, crítico, estudioso e historiador da literatura, tradutor literário
e poético, que vertia de diversas línguas p ara outras tantas, latinista e
professor de latim, teórico da tradução, editor, filólogo, lexicógrafo e
testemunha lúcida de tempos terríveis. Ele foi, em suma, na acepção
antiga e quase esquecida do termo, um autêntico intelectual dotado de uma
vasta cultura universal, de uma curiosidade insaciável, bem como de uma
capacidade de trabalho e de um rigor ilimitados.
Nos textos da presente coletânea, a mais eclética e, ao mesmo tempo, a
mais pessoal que publicou, Rónai se revelou também um mestre da forma
ensaio e um elegante estilista cujo exemplo merece ser cada vez mais
estudado e seguido.

Nelson Ascher

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