Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Coimbra 2002/2003
Índice
1) Introdução:...................................................................................................................8
1.1) Noção e objecto:....................................................................................................8
1.2) A noção de limites da lei:...................................................................................10
1.3) Princípio da territorialidade:............................................................................10
1.4) Tipos de situações jurídicas:..............................................................................11
1.4.1) Situações puramente internas:.......................................................................11
1.4.2) Situações internacionais plurilocalizadas:.....................................................12
1.5) Modo de funcionamento do DIP.:.....................................................................13
Elemento de conexão...................................................................................15
Conceito Quadro..........................................................................................15
1.5.1) A negação da regra de conflitos como «prius» metodológico:.....................16
1.6) A «lex fori» como lei do processo:.....................................................................17
1.7) Natureza e fontes do DIP.:.................................................................................18
1.8) Fundamento geral do DIP., sua natureza e principais interesses que visa
satisfazer:....................................................................................................................20
1.8.1) Fundamento nacional ou internacional do DIP.:...........................................20
1.8.1.1) Doutrinas internacionalistas:..................................................................20
1.8.1.1.1) Doutrinas Internacionalistas ― teoria da delegação:......................21
1.8.1.1.2) Doutrinas internacionalistas ― associação à doutrina unilateralista:
.........................................................................................................................22
1.8.1.2) Posição adoptada:...................................................................................22
1.8.2) Natureza do DIP.:..........................................................................................27
1.9.) Princípios estruturantes do DIP.:....................................................................28
1.9.1) Princípio da harmonia jurídica internacional:...............................................28
1.9.2) Princípio da paridade de tratamento dos ordenamentos jurídicos:................29
1.9.3) Princípio da harmonia jurídica material ou interna:......................................29
1.9.4) Princípio da boa administração da justiça:....................................................30
1.9.5) Princípio da eficácia ou efectividade das decisões:......................................30
1.9.6) Princípio da maior proximidade:...................................................................31
1.10) Conflito entre princípios ― o problema das questões prévias:...................31
1.11) A justiça do DIP.:.............................................................................................32
1.12) O DIP. e domínios afins:..................................................................................34
1.12.1) O DIP. e o Direito Intertemporal:................................................................34
1.12.2) Conflitos internacionais e conflitos internos:..............................................35
1.12.3) DIP. e direito privado uniforme:.................................................................36
1.12.4) DIP. e direito comparado:...........................................................................36
1.12.5) DIP. e Direito Constitucional:.....................................................................37
1.13) Âmbito do DIP.:................................................................................................40
1.13.1) Doutrina alemã e italiana:...........................................................................40
IV Direito Internacional Privado – 1.º Semestre FDUC
— Índice —
2002 — 2003
Bibliografia:
1) Introdução:
Mas o que fazer ou que norma aplicar quando um dos sujeitos da relação
for estrangeiro ou quando a coisa objecto da relação jurídica se encontra em um outro
Estado?
Como vimos, o DIP. se ocupa das relações plurilocalizadas, ou
seja, daquelas relações que, correspondendo a uma actividade que não se comporta nas
fronteiras de um único Estado, entram em contacto, através dos seus elementos
(sujeitos, objecto, facto jurídico, garantia), com diversos ordenamentos jurídicos.
Dada a conexão existente entre essas relações (através dos seus
elementos) e várias ordens jurídicas não seria, decerto, boa solução sujeitá-las sempre e
sem mais exame à autoridade do direito local, mas, de outro modo (e como é natural)
deve escolher-se, dentre as ordens jurídicas que com a relação entram em contacto, a
que lhe seja mais próxima ― aquela ordem jurídica que com a relação tenha um
contacto mais forte ou mais estreito.
Não obstante o que ficou dito, parte da doutrina sustentou que nada
obrigava a que os tribunais de um Estado, quando chamados a conhecer de um conflito
emergente de uma relação jurídico-privada com carácter internacional, tivessem de
encarar a possibilidade de, para ela, encontrar uma regulamentação diferente daquela
que directamente resultasse do seu direito interno. É esta a chamada teoria da
territorialidade que consagrou o princípio da territorialidade das leis.
Uma tal teoria, contudo, já desde a Escola Estatutária foi negada e,
quanto a nós, também achamos que deve ser rejeitada, pois a aplicação da «lex fori
materialis» (da lei do foro) a quaisquer factos e situações que lhe sejam estranhos (ou
seja, que não tenham com ela qualquer conexão espacial), violaria gravemente o
princípio universal do direito segundo o qual, visando a norma jurídica regular os
comportamentos humanos que se desenvolvem no seio de uma sociedade, não poderá
10 Direito Internacional Privado – 1.º Semestre FDUC
— Introdução —
considerar-se aplicável a condutas que se situem fora da sua esfera de eficácia (fora,
portanto, do alcance do seu preceito), e isso quer em razão do tempo (princípio da
irretroactividade das leis), quer em razão do lugar onde se verificam (princípio da não
transactividade das leis).
O princípio da não transactividade das leis, portanto, consiste no
princípio segundo o qual nenhuma lei ― a do foro ou qualquer outra ― deve
considerar-se aplicável a um facto ou situação que não se acha (por qualquer dos seus
elementos) em contacto com ela. O não acatamento deste princípio universal de direito
traria inevitavelmente consigo o perigo da ofensa de direitos adquiridos ou de
expectativas legítimas dos indivíduos.
A denominação deste ramo como «Direito Internacional Privado»
ficou assente por influência de uma obra intitulada «Traité du Droit International
Privé» de FOELIX em 1843. É esta a denominação que veio a prevalecer nos países
da Europa Continental e América Latina, contudo, nos países anglo-americanos
prevaleceu a denominação «Conflito de Leis», assim como denominavam os
estatutários holandeses e alemães e também JOSEPH STORY.
Ao contrário dos outros ramos de direito que são integrados por normas
materiais, o DIP. é integrado por normas secundárias ou indirectas (normas
instrumentais) denominadas «regras de conflitos».
Localização no tempo
Direito de Conflitos (Direito Intertemporal)
Localização no espaço
(DIP.)
Direitos de conexão: a conexão dos factos com os sistemas jurídicos é que constitui o
dado determinante (facto operativo ou facto jurídico) básico de
aplicabilidade dos mesmos sistemas jurídicos.
Por exemplo: artigo 46º do Cód. Civ.: «o regime da posse... é definido pela
lei do Estado em cujo território as coisas se encontrem
situadas».
elemento de conexão. E isto em atenção a certos valores que o DIP. visa acautelar,
entre eles:
→ protecção das expectativas jurídicas legitimamente concebidas
pelos indivíduos; e
→ protecção da segurança jurídica internacional.
Importa salientar: a competência da «lex fori» enquanto pura lei de processo não
depende de qualquer conexão particular que a ligue à situação
jurídica em litígio.
Basta:
→ que o tribunal deste Estado seja chamado a decidir a questão;
→ que se verifique o pressuposto da competência interna de jurisdição
desse Estado; e
18 Direito Internacional Privado – 1.º Semestre FDUC
— Introdução —
Ora, como não podemos conceber que um Estado singular dite normas
delimitadoras da esfera de soberania de outros Estados situados, necessariamente, num
plano de igualdade; e, como diz o antigo brocardo romano, «par in parem non
habet autoritatem», tais normas seriam, necessariamente, normas de direito
supraestadual.
Procuram os defensores desta doutrina estabelecer a existência de um
complexo de princípios de Direito Internacional supraestadual mais ou menos vagos,
mais ou menos concretamente determinados, os quais vinculariam o Estado a manter-se
dentro dos limites demarcados no exercício da sua soberania.
Frisa-se, por outro lado, o significado do reconhecimento internacional
de um Estado. Reconhecer um Estado significaria, em primeiro lugar, reconhecer o
seu ordenamento jurídico; negar o reconhecimento a um ordenamento jurídico
equivaleria a negar a existência do respectivo Estado.
Conclui-se, assim, que não é bastante dizer que o DIP. tem por missão
indicar a lei aplicável às relações multinacionais; é indispensável acrescentar que, para
cumprir de modo adequado essa missão, há-de ele proceder em termos de a competência
da lei assim designada ser susceptível de reconhecimento universal.
Significa isso que um dos principais objectivos visados pelo DIP. é a
harmonia jurídica internacional, uma ideia de que já falava SAVIGNY, inspirado por
KAHN que teve o mérito de ter formulado esse princípio.
O princípio da harmonia jurídica internacional responde à intenção
primeira do direito de conflitos que é assegurar a continuidade e uniformidade de
valoração das situações plurilocalizadas. Nenhum sistema positivo o pode ignorar,
pois ele está na própria natureza das coisas e ignorá-lo seria o mesmo que negar, pura e
simplesmente, o DIP.
Facilmente se concebem os inconvenientes que hão-de resultar do facto
de uma situação jurídica não ser submetida em todos os países à mesma lei, pois,
enquanto se não chegar à designação de uma única lei para cada questão jurídica
concreta, não se poderá pôr termo a bem conhecida tendência das pessoas para se
dirigirem àquela jurisdição nacional, de entre as que se julguem competentes para
conhecer do caso, cuja decisão de lhes antolhe mais favorável. A esta situação
chamamos de «forum shopping».
Contudo, é impossível construir um sistema de DIP. partindo unicamente
do princípio da harmonia jurídica internacional ou do mínimo de conflitos.
Outro princípio geral a ter em conta é o da harmonia material.
Ao contrário do princípio da harmonia jurídica internacional, não está
o princípio da harmonia material ligado à natureza específica do DIP. Este princípio
da harmonia material exprime a ideia da unicidade do sistema jurídico, à ideia de que
no seio do ordenamento jurídico as contradições ou antinomias normativas são
intoleráveis.
Na verdade, o jogo das regras de conflitos, na medida em que, por vezes,
conduz à convocação de duas leis para a resolução do mesmo ponto de direito, presta-se
a gerar situações deste género. Mas estas situações também podem derivar de uma
divergência de qualificação entre duas leis chamadas a pronunciarem-se sobre aspectos
distintos do mesmo acto jurídico, ou sobre questões jurídicas diferentes, mas de tal
modo interligadas, que a decisão quanto a uma delas afectará, inevitavelmente, a outra.
conflitos, de modo a evitar ao máximo o risco de duas leis virem interferir na resolução
da mesma questão.
Assim, poderia recomendar-se a adopção de um único factor de conexão
para cada acto ou relação jurídica, sem distinguir, quanto àquele, a forma da substância,
nem, quanto a esta, o momento constitutivo da questão do conteúdo ou das
consequências jurídicas imediatas. Além disso, todas as questões emergentes do
casamento e da filiação deveriam ser reguladas por uma única lei, de modo a realizar a
unidade da família.
Porém, esta tendência é contrariada por razões ponderosas que estão na
base do método da especialização ou fraccionamento de que o DIP. se serve para
resolver os seus problemas; procedimento que consiste em destacar da relação ou figura
jurídica que se considera certos elementos e em eleger para cada um deles uma conexão
independente.
Outras ideias:
1) o Estado com melhor competência será o que em
melhores condições se encontrar para impor o acatamento dos seus preceitos.
Esta consideração é uma das vias possíveis para fundamentar a competência
da «lex rei sitae» em matéria de direitos reais;
2) outra consideração que pode influenciar o sistema de
normas de conflitos de leis é a do interesse na boa administração da justiça.
Sob esse ponto de vista, seria desejável que os tribunais decidissem a maior
parte dos feitos submetidos a julgamento segundo os princípios do seu
próprio direito nacional, único, naturalmente, em que são versados. Assim
se lhes facilitará consideravelmente a tarefa e se garantirá o acerto das suas
decisões. Daqui resultará, inevitavelmente, o alargamento do âmbito de
aplicação do direito local, pois o que por este modo se preconiza é o medir
com medidas diferentes a esfera de competência do direito nacional e a do
direito estrangeiro.
Embora as razões que estão por detrás desta tendência tenham certo
valor, poder-se-á perguntar se não seria preferível, tendo em conta a ideia de
que as normas de conflitos estabelecidas por todo legislador devem ser de
molde a poderem universalizar-se, tomar como norte uma ideia de paridade
de tratamento, a exprimir deste modo: «o DIP. deve colocar os
diferentes sistemas jurídicos em pé de igualdade, de modo
tal que uma legislação estrangeira seja considerada
competente sempre que, se ela fosse a «lex fori» se
apresentasse como aplicável». É esta a feição assumida pelo DIP
português em vigor.
Assim:
Mas, se é certo que todo o sistema positivo de DIP. deve ser influenciado
em maior ou em menor medida por tais princípios, não é menos verdade que, com a
única excepção do princípio da eficácia das decisões judiciais, eles não nos conduzem
às soluções concretas dos conflitos de leis. Esses princípios, contudo, visam mais o
sistema de DIP. considerado como um todo, do que as regras particulares que o deverão
constituir.
Cada norma de conflitos elege o elemento de conexão que deverá
prevalecer em certo domínio ou sector jurídico. Esta escolha deve conformar-se com
uma directiva geral que é a seguinte: «é preciso que a lei considerada
competente seja apta a reger as situações multinacionais que se têm
em vista, ou determinados aspectos de tais situações». Esta adequação
nada tem a ver, em princípio, com o conteúdo da lei, mas decorre tão só da sua posição
espacial relativamente aos factos, ou da relação em que se encontra com as pessoas a
quem estes factos respeitam.
Por outras palavras, a lei aplicável será a que tiver a conexão mais forte
ou mais estreita com a relação ou situação jurídica em causa, tendo em conta uma
ponderada avaliação dos interesses que se apresentem como prevalecentes no sector
considerado.
Por outras palavras, a lei aplicável será a que tiver a conexão mais forte
ou mais estreita com a relação ou situação jurídica em causa, tendo em conta uma
ponderada avaliação dos interesses que se apresentem como prevalecentes no sector
considerado.
Na determinação do elemento de conexão, o principal papel compete ora
a interesses individuais, ora a interesses colectivos e não, como pretenderam as
doutrinas internacionalistas, a interesses estaduais.
Os indivíduos, os sujeitos das relações de direito privado, tiram
vantagem de serem submetidos, em tudo o que respeita ao seu estatuto pessoal, a uma
lei a que possam chamar «a sua lei»... uma lei a que se sintam ligados de maneira
estreita e permanente. Obviamente que essa lei só poderá ser a do Estado nacional ou a
do Estado do domicílio. Por outro lado, o interesse dos sujeitos das relações jurídico-
privadas reclama também um sistema que facilite tanto quanto possível o
desenvolvimento da sua vida jurídica e lhes conceda, inclusive, o direito de escolher,
em certos domínios (naqueles onde vigoram leis supletivas), a lei aplicável às relações
que constituem.
Temos ainda aqueles interesses que, embora sendo ainda individuais, se
reportam, contudo, a pessoas indeterminadas ou ao público em geral, e a que podemos
chamar interesses do comércio. Estes aconselham o recurso a elementos de conexão de
natureza puramente objectiva, tais como o «lugar da situação» para os direitos
sobre as coisas, o «país da sua criação» para a propriedade industrial, o «locus
delicti» para a responsabilidade extracontratual.
Dissemos acima que a justiça do DIP. é, predominantemente, de cunho
formal, isso significa que o DIP. tem os seus visos próprios, a sua própria justiça
inconfundível com a do direito material, já que a escolha da lei competente para reger
uma determinada relação não é, em princípio, feita em função do conteúdo da lei, mas
José Eduardo Dias Ribeiro da Rocha Frota 27
por ser ela a que se encontra em melhor posição ou a que exibe os melhores títulos para
interferir; posição e títulos esses que só a análise dos interesses apontados revelará.
Contudo, por vezes, é a própria justiça material que invade o domínio do
DIP., fazendo prevalecer aí os seus juízos de valor, impregnando com seus critérios as
normas de conflitos e vindo ela mesma, por fim, influir na escolha da lei aplicável.
Mas a intervenção da justiça material no campo do direito de conflitos
não reveste sempre esta forma. Por vezes, ocorre de o juiz recusar o seu visto a um
preceito jurídico estrangeiro, todavia, em princípio, plenamente aplicável à situação
controvertida, unicamente por entender que a aplicação deste preceito ao caso concreto
produziria um resultado absolutamente intolerável para o sentimento ético-jurídico
dominante, ou lesaria gravemente interesses de primeira grandeza da comunidade local.
Também aqui se constata uma certa intromissão da justiça material, no entanto, ela não
aparece, desta vez, a inspirar as normas de conflitos, antes permanece exterior à justiça
conflitual, de que se limita a travar a marcha. Estamos aqui no domínio da chamada
«excepção da ordem pública internacional».
A excepção de ordem pública internacional consiste num limite à
aplicação do direito estrangeiro competente.
→ reenvio;
→ atitude internacionalista por parte do legislador, ou seja, o
legislador deve, no momento da construção das suas regras de
conflitos, recorrer aos critérios de escolha que são utilizados na
generalidade dos casos ou àqueles critérios que, pela sua
razoabilidade, sejam verdadeiramente susceptíveis de se tornarem
universais.
O juiz, para dar a solução mais adequada ao caso, deve aplicar a lei que
melhor conhece (a «lex fori»), pois assim ficaria facilitada consideravelmente a tarefa
do juiz e garantir-se-ia o acerto das decisões (e é óbvio que a probabilidade de erro
judiciário é maior quando o juiz deixa de pisar o chão firme do ordenamento jurídico
local). Contudo, isso entraria em colisão frontal com o princípio da paridade de
tratamento das ordens jurídicas estaduais e com o princípio da harmonia jurídica
internacional, uma vez que alarga o campo de aplicação da «lex fori». O nosso
sistema não simpatiza muito com este princípio (não havendo grandes expressões dele
no nosso ordenamento jurídico) e, assim sendo, este só deve ser aplicado quando não
comprometa a harmonia jurídica internacional, não sendo, portanto, este princípio,
susceptível de generalização, caso contrário, iríamos voltar a cair no princípio da
territorialidade.
sujeitos da relação jurídica (este afastamento da lei pessoal dos sujeitos da relação
pressupõe que a «lex rei sitae» se julgue exclusivamente competente ou quando
reenvie para outro ordenamento que a «lex causae» reconheça como aplicável). É
este o meio necessário e suficiente para reconhecer aquela decisão no Estado da
situação dos bens.
Como resolver o problema da escolha da lei aplicável quando a lei do foro não for
competente para regular a questão principal?
Há, na verdade, dois sistemas para resolver tal desiderato:
Conclusão: a solução pela qual devemos optar passa por tentar harmonizar estes dois
princípios ― a adopção do sistema da conexão subordinada com limitação
que podem passar pela delimitação da área de competência exclusiva do
foro. Nem sempre este sistema violará o princípio da harmonia material
ou interna.
solução no plano e com os meios específicos do direito, do que nas próprias soluções
conseguidas. Os problemas normativos são, em grande medida, susceptíveis de
formulação comum, o que difere são as reacções ou respostas a tais problemas.
A tarefa (ou uma das tarefas) do direito comparado consiste em apurar
quais os diferentes meios técnicos a que os vários legisladores recorrem para levar a
cabo funções sociais equivalentes. Através do direito comparado, ver-se-á como
instituições diferentes tendem, nos diversos lugares, para fins análogos e, ao contrário,
como a instituições, na aparência homólogas, correspondem objectivos distintos.
Tudo isso se reveste de primordial importância para o DIP., dada a
missão que lhe compete de coordenar, na sua aplicação, todas as leis existentes. Para
tanto possui o DIP. as suas categorias normativas próprias e, a cada uma destas,
corresponde um elemento de conexão determinado.
A matéria que preenche essas várias categorias é, justamente, formada
pelos vários preceitos e instituições jurídicas dos diferentes Estados em cada uma de tais
categorias deverão ser incluídas todas as normas e instituições (quer de direito nacional
quer de direito estrangeiro) que se proponham, como finalidade precípua, aquela mesma
finalidade visada pelo legislador do foro ao elaborar a respectiva regra de conflitos.
Assim, só o recurso ao método da comparação jurídica permitirá, em
muitos casos, resolver adequadamente este tipo de problemas.
Por último, diga-se que o método da comparação rende largos frutos
quando, justamente, aplicado ao próprio DIP. O conhecimento crítico das divergências
existentes entre os sistemas conflituais dos Estados é essencial à tarefa da unificação das
regras de conflitos e, bem assim, à elaboração dessas normas pelo legislador interno.
A mais, tal conhecimento assume, igualmente, importância fundamental
para resolução do problema dos conflitos de sistemas de DIP.
discriminação contra os filhos nascidos fora do casamento ― cfr. o artigo. 36º, n.º 4
da CRP).
Mas daqui não resulta a radical impossibilidade de se dar efeito entre nós
a um direito estrangeiro que consagre ainda aquela distinção.
Os preceitos da lei estrangeira designada pela norma de conflitos que se
não coadunem com os direitos fundamentais consagrados na legislação portuguesa são
seguramente inaplicáveis, porque contrários à ordem pública internacional do Estado
português. Só que, para tanto, será indispensável que, no caso, se encontrem
verificados os pressupostos de relevância da ordem pública.
→ Deve tratar-
Pressupostos de se de valores da máxima importância
relevância da do ordenamento do foro; e
ordem pública
→ deve existir
uma conexão significativa da espécie a
julgar com aquele ordenamento.
Dito isto, conclui-se que: não cabendo ao julgador do foro sindicar a compatibilidade
constitucional de preceitos da lei estrangeira, incumbe-lhe aplicar a mesma
lei tal como ela seria aplicada pelo juiz do respectivo sistema jurídico. Aqui,
portanto, assume relevância o facto de certa norma da «lex causae»
considerada inconstitucional não ter aplicação nesse sistema. Do ponto de
40 Direito Internacional Privado – 1.º Semestre FDUC
— Introdução —
vista do foro, a referida relevância tem lugar, não por a norma em causa ser
inconstitucional, mas por ela não ser aplicável no sistema a que pertence.
alegado direito efectivamente existe segundo os preceitos de uma lei que se possa
considerar competente segundo os preceitos de DIP. do Estado do foro, isso porque não
basta que o alegado direito adquirido seja como tal reconhecido por um qualquer
sistema jurídico, sendo indispensável que o seja pelo sistema tido por competente para
regular o caso concreto.
Assim, a determinação da lei competente constitui um «prius»
relativamente ao reconhecimento de um suposto direito adquirido. A mais, em
princípio, as regras de conflitos aplicam-se quer às relações a constituir em Portugal,
quer às situações já constituídas no estrangeiro.
Uma vez determinada a lei aplicável à situação litigiosa, não há senão
que proceder à aplicação das normas dessa lei que, precisamente, se referem aos factos
considerados: é esta lei competente que dirá se, no caso concreto, há ou não um direito
adquirido a respeitar.
Em suma, se o reconhecimento de um direito como legitimamente
adquirido decorre sem mais do reconhecimento da competência da lei que presidiu à
constituição do mesmo direito, e se não é pelo facto de ser um direito constituído no
estrangeiro que a questão da determinação da lei aplicável se coloca em face das regras
de conflitos da «lex fori», então podemos legitimamente concluir que o
reconhecimento de direitos adquiridos no estrangeiro não deve ser considerado um
problema autónomo face ao problema do conflito de leis.
São questões que podem ser levantadas numa situação privada de direito
internacional; são domínios afins do DIP. e, como tal, temos que os referenciar nos
aspectos em que eles ajudam a resolver questões de DIP. Mas não são autonomizáveis.
Assim sendo, diante do problema da delimitação do âmbito do DIP.:
42 Direito Internacional Privado – 1.º Semestre FDUC
— Introdução —
→ Em primeiro lugar: devemos fazer consistir o seu objecto numa matéria forte /
homogénea, núcleo de questões da mesma natureza e a
resolver por métodos idênticos.
Ideias tradicionais:
→ É correcto reduzir o problema do DIP. ao problema do conflito de leis (escolha da
lei aplicável). Ao DIP., assim, competirá unicamente indicar por qual legislação se
resolvem as questões emergentes das relações internacionais privadas.
→ Direito de conflitos: trata-se sempre de princípios de uma natureza muito especial,
pois nada dizem sobre o sentido da composição dos conflitos de interesses.
→ Normas de conflitos: não provêem, elas próprias sobre o regime das relações
sociais, não são normas de direito substancial, mas são puramente instrumentais.
Artigo 8º do CC: vamos ter que lhe encontrar um outro estatuto, uma outra lei pessoal.
44 Direito Internacional Privado – 1.º Semestre FDUC
— Introdução —
Artigo 32º do CC: → Se o sujeito for maior e não interdito, dever-se-á aplicar a lei da
sua residência habitual
→ Se o sujeito for menor e interdito, aplicar-se-á a lei do domicílio
legal
Caso não tenha residência habitual, manda o artigo 32º, n.º 2 do CC.
que remete para o artigo 82º, n.º 2 do mesmo diploma legal que seja aplicada a lei da
residência ocasional e, se esta não puder ser determinada, deve aplicar-se a lei do lugar
onde o sujeito se encontrar (aplica-se aqui a noção de paradeiro).
2) Princípio da reciprocidade (artigo 14º, n.º 2 do CC.): não são atribuídos aos
estrangeiros os direitos que, sendo reconhecidos pelo respectivo
Estado aos seus nacionais, o não sejam aos portugueses em
José Eduardo Dias Ribeiro da Rocha Frota 45
=
do Estado a que pertencem
têm competência devem aplicar para solucionar
internacional → é este o um determinado caso. A sua
objectivo directo e primário. actuação resulta da
Indirectamente vêm a assumir delimitação da esfera de
a feição de verdadeiras competência dos diversos
normas de conflitos de sistemas de direito privado.
jurisdições
FERRER CORREIA critica esta norma. Segundo ele, pode ser que
esta conexão seja meramente ocasional, que não deveria retirar a possibilidade de o
nosso país ter competência internacional, assim sendo, sugere uma ressalva a este
preceito legal: «a menos que esta conexão da situação controvertida
José Eduardo Dias Ribeiro da Rocha Frota 47
Visa evitar a denegação de justiça: cada litígio deve ter uma sede
própria de conflito. Para evitar a denegação de justiça vamos admitir que os nossos
tribunais sejam competentes para solucionar esta questão (mas deve haver um elemento
de conexão ponderoso).
No caso de haver uma impossibilidade fáctica e jurídica de tornar
efectivo um direito, far-se-á valer o princípio da autonomia da vontade, podendo as
partes convencionar qual a jurisdição competente, excepto no que se refere à situação de
competência exclusiva (situações que se retiram da regra geral da competência
internacional).
O DIP. dos nossos dias, ao contrário do que ocorre com grande parte dos
outros ramos do direito privado, não nos foi legado pelos romanos, mas por juristas que
viveram a partir do século XI.
Para que haja necessidade de um direito de conflitos é preciso, antes de
mais, que exista ou haja a possibilidade de existir uma situação internacional, ou seja,
uma situação que se encontre em contacto com mais do que um ordenamento jurídico.
São pressupostos do DIP.:
→ que existam vários ordenamentos jurídicos;
→ que existam situações que exorbitem do âmbito interno, ou seja, que
apresentem contacto com mais do que um ordenamento jurídico
estadual; e
→ é preciso que haja liberdade de movimento (ou de pessoas, ou de
bens).
peregrinas tiveram de ser reconhecidas pelos juristas romanos, função que foi,
sobretudo, deferida ao pretor peregrino, nomeadamente em sede de relações de família.
Daqui nasceu uma nova prática: a aplicação, por um mesmo juiz, de leis
diferentes, segundo a origem das partes.
Deste sistema não poderiam deixar de resultar conflitos de leis, mas tal
problema foi ignorado pelos juristas romanos.
O sistema feudal da Idade Média conduziu a que não houvesse relações
entre pessoas dos vários feudos e dos vários domínios territoriais (não há relações
internacionais)
As origens do moderno DIP. remontam ao fim do século XIII.
A partir do século XI as cidades da Itália do Norte (que se tinham
tornado centros comerciais de grande importância), no exercício da sua autonomia
legislativa, começaram a reduzir a escrito o seu direito consuetudinário local e a
compilar os seus estatutos. Os estatutos das cidades, que se ocupavam, principalmente,
das relações jurídicas de carácter privado, diferenciavam-se muito entre si: as
regulamentações que estabeleciam para estas relações estavam longe de ser uniformes.
Entregando-se em larga escala ao exercício do comércio, originavam,
naturalmente, contactos cada vez mais frequentes entre habitantes de diferentes cidades.
Bem cedo, como também é natural, acontece tornar-se frequente o caso de ser
demandado, perante a justiça de uma cidade, um habitante de outra cidade. Surgia
então a pergunta: qual o estatuto aplicável a estes casos?
A primeira solução a que se chegou determinava como aplicável o
estatuto local, ou seja, a «lex fori». Mas, muito cedo, surgiram ideias novas.
Com a recepção do direito romano, começaram a surgir teses audaciosas.
Começou a entender-se que a aplicação do direito local comporta limites, pois o direito
local, que não se dirige senão aos súbditos do soberano local, só a estes poderia obrigar.
Contudo, se o direito local não é aplicável aos estrangeiros, que direitos se lhes
havia de aplicar?
Nesta primeira fase (séculos XII e XIII) a pergunta não obteve uma
resposta satisfatória. No início do século XIII, a «lex fori» era considerada a única
aplicável, contudo, já cerca de 50 (cinquenta) anos antes, ALDRICUS ensinava que
quando os litigantes pertenciam a diversos territórios com direito consuetudinário
diferente, o juiz deveria julgar segundo o que lhe parecesse melhor.
Assim:
Permissivos (extraterritoriais)
Estatutos pessoais
Favoráveis (extraterritoriais)
Proibitivos
Odiosos (territoriais)
a) Cada relação jurídica deve ser regulada pela lei mais conforme à
sua natureza;
b) a lei mais adequada à natureza da relação jurídica é a lei da sua
sede.
f) Forma dos actos jurídicos: deveria ser regulada pela mesma lei competente
para regular a relação jurídica em geral, mas sucede que
no lugar onde se pratica o acto jurídico é, muitas vezes,
de difícil conhecimento ou impossível observância das
formalidades prescritas na lei reguladora da relação
jurídica. Por isso admite SAVIGNY a suficiência da lei
do lugar da celebração.
Quais os princípios ou critérios de harmonia com os quais cada Estado deve ser
obrigado a reconhecer e aplicar leis estrangeiras?
→ Pessoal; e
Direito privado → nacional. Direito público → territorial
→ Necessário; ou
→ voluntário.
José Eduardo Dias Ribeiro da Rocha Frota 61
Para PILLET, uma solução justa dos conflitos de leis deve derivar da
natureza da lei, como expressão da vontade soberana do legislador. Tanto quanto
possível, deve procurar manter-se na lei (considerada nas relações internacionais) as
qualidades que ela tem nas relações internas. Deste modo, conseguir-se-á sacrificar de
cada lei nacional, na resolução dos conflitos de leis, apenas o que for estritamente
indispensável para a justa conciliação das soberanias.
62 Direito Internacional Privado – 1.º Semestre FDUC
— Introdução —
Contra tal estado das coisas, tomou vulto uma reacção por volta da
década de 1930.
A ideia de que uma sã solução dos conflitos de leis deve inspirar-se
fundamentalmente no interesse dos indivíduos, a quem, afinal, se destina todo o direito;
a progressiva utilização neste domínio do método da jurisprudência dos interesses; o
reconhecimento da necessidade urgente de emancipar o DIP. do direito interno em
ordem a tornar possível o ideal da unificação; o aproveitamento, neste sentido, da
investigação comparatista; a tendência para uma interpretação das regras de conflitos
estaduais adequada à sua missão eminentemente internacional, isto é, da compreensão e
coordenação de todas as legislações do mundo civilizado.
2) O método do Direito Internacional Privado:
mais estritas ou estabelece medidas mais elevadas de protecção financeira do que a lei
do Estado onde o réu agiu ou onde tinha a sua residência, é a lei daquele primeiro
Estado que deve prevalecer, a menos que a existência de uma relação entre o autor e a
vítima do dano justifique a aplicação da lei que rege esta relação.
Tendo por função determinar, para cada caso, a lei aplicável, este
princípio de preferência por último referido é uma verdadeira norma de conflitos ―
apesar de não se limitar a utilizar um critério de conexão espacial, referindo-se também
ao conteúdo dos preceitos materiais em colisão.
Existe, como vemos, uma semelhança inegável entre esta última posição
defendida por CAVERS e a posição tradicional, ideia esta que se vê reforçada pelo
facto de o fim último dos princípios de preferência ser igual ao das normas de conflitos.
CAVERS considera que a validade de tais princípios depende de sua
aptidão para serem incluídos num direito comum a todas as nações → ponto de vista
universalista.
O recurso sistemático a critérios semelhantes aos formulados por
DAVID CAVERS, em toda a zona não recoberta por normas de conflitos de conteúdo
rígido, não é empresa realizável, pois:
→ não é possível prever todos os tipos de conflitos de preceitos
materiais susceptíveis de serem verificados; e
→ mesmo se o fosse, não seria possível, seguramente, formular para
cada um destes tipos uma válida razão de decisão, um princípio de
preferência baseado no conteúdo das leis em concurso e dotado de
aptidão para ser incluído num direito comum a todas as nações (v.g.:
problema da admissibilidade do divórcio sendo, por exemplo,
aplicável a lei que admite a dissolução do vínculo matrimonial →
esta solução não teria, decerto, acolhimento nos países menos
abertos a tal ideia, nunca podendo, portanto, converter-se em critério
de aceitação universal.
E se houver várias leis estrangeiras em concurso, o que é que o juiz deve fazer?
Neste caso, o juiz do foro chamado a conhecer do litígio não deve aplicar
nenhuma delas, já que não se pode substituir ao legislador estrangeiro, não podendo
escolher qual o interesse governamental superior. Sendo assim, deve ser aplicada a lei
do foro.
No caso de nenhuma lei querer ser aplicada, aplicar-se-á,
subsidiariamente, a lei do foro.
a) Conflito aparente;
b) lei do foro se esta se quiser aplicar;
c) aplica-se a lei estrangeira com interesse;
d) no caso de serem várias as leis estrangeiras em
concurso deve aplicar-se a lei do foro (mais tarde CURRIE admite
que, nesta situações, sejam constituídas regras de conflitos «ad
hoc»);
e) se nenhuma lei quiser ser aplicada, dever-se-á
aplicar a lei do foro a título subsidiário.
a) «Lex certa»:
1) «Forum rule by non choice»:
aplicar-se-ia nestes casos a «lex fori» sem qualquer
ponderação (sem recurso a qualquer critério de escolha), já que
estão em causa normas imperativas do ordenamento jurídico do
foro (funcionam antes das regras de conflitos).
Fala também dos casos de qualificação procedimental.
No caso de tratar-se de uma questão procedimental, aplicar-se-
ia, automaticamente a lei do foro sem haver qualquer
ponderação. Tratando-se, porém de uma questão substancial, já
não poderia operar o «forum rule by non choice»,
tornando-se necessária uma prévia ponderação. Que questões
vamos qualificar como procedimentais ou como substantivas?
Considerava, por exemplo, a adopção e a capacidade
das partes como questões processuais.
Momento jurisprudencial:
Momento legislativo:
Segundo «Restatement»: é uma compilação que vale pelo prestígio dos seus
autores e incluía três níveis:
a) factores de orientação relevantes: factores
e interesses que auxiliariam o juiz a decidir a questão;
b) regra de conflitos; e
c) «open-ended Rules»: dão um maior
espaço de conformação ao juiz (v.g.: o artigo. 52º, n.º 2 do Cód.
Civ.).
b) materialização.
2.4.1) A flexibilização:
Foi-se notando no sistema europeu, que era rígido, uma certa mutação no
sentido da aproximação deste à perspectiva norte-americana, nomeadamente, verificou-
se uma flexibilização da regra de conflitos, reconhecendo-se uma margem de
conformação judicial do princípio da proximidade ou localização. Começou a ser dado
um maior poder de decisão ao juiz, e isso por duas vias:
1) Dá-se ao juiz a possibilidade de identificar, no caso concreto,
qual a lei mais próxima a ele.
Os artigos. 52º, n.º 2 e 60º, n.º 2 do Cód. Civ., por
exemplo, contêm normas de conexão múltipla subsidiária (o
legislador estabelece três conexões que se vão aplicar
subsidiariamente no caso de a primeira não funcionar) ― v.g.: se
não há nacionalidade comum (primeiro elemento de conexão);
se não há residência comum (segundo elemento de conexão),
deve aplicar-se a lei com a qual a vida familiar se encontra mais
estreitamente conectada (terceiro elemento de conexão). É o
juiz que vai decidir qual a lei que se acha mais estreitamente
conectada com a vida familiar.
contacto mais forte com a situação «sub judice» poderá aplicar essa lei (trata-se aqui
de uma verdadeira flexibilização).
O artigo. 45º do Cód. Civ., depois de estabelecer que a lei aplicável ao
contrato de compra e venda (se as partes não escolherem uma) é a lei da residência do
vendedor, vem depois, em seu n.º 3, estabelecer: «se, porém, o agente e o
lesado tiverem a mesma nacionalidade ou, na falta dela, a mesma
residência habitual, e se encontrarem ocasionalmente em país
estrangeiro, a lei aplicável será a da nacionalidade ou a da residência
comum, sem prejuízo das disposições do Estado local que devam ser
aplicadas indistintamente a todas as pessoas» (princípio da maior
proximidade). Tratar-se-á aqui de uma cláusula de excepção?
Neste caso, o juiz poderá optar pela aplicação de outra lei, só que, neste
caso, esta lei também é indicada pelo legislador: é ele que descreve as circunstâncias
abstractas para a aplicação da lei que tenha com a situação um contacto mais forte e
qual é essa lei.
Sendo assim, não sendo o juiz, ele próprio, a escolher a lei a aplicar, não
se poderia, com propriedade, falar de cláusula de excepção, mas agora falamos de
cláusulas de excepção abertas e fechadas.
→ Cláusula de excepção aberta: cfr. os artigos. 4º, n.os 1 e 5 e 6º, n.º
2 da Convenção de Roma sobre obrigações contratuais.
→ Cláusula de excepção fechada: cfr. o artigo. 45º, n.º 3 do Cód.
Civ.
O artigo. 36º do Cód. Civ. dispõe sobre a forma do contrato; nos termos
do seu n.º 1: «a forma da declaração negocial é regulada pela lei
aplicável à substância do negócio; é, porém, suficiente a observância
da lei em vigor no lugar em que é feita a declaração, salvo se a lei
reguladora da substância do negócio exigir, sob pena de nulidade ou
ineficácia, a observância de determinada forma, ainda que o negócio
seja celebrado no estrangeiro». O n.º 2 do mesmo preceito estabelece: «a
declaração negocial é ainda formalmente válida se, em vez da forma
prescrita na lei local, tiver sido observada a forma prescrita pelo
Estado para que remete a norma de conflitos daquela lei, sem
prejuízo do disposto na última parte do número anterior».
Assim sendo, temos
→ 1ª conexão: lei reguladora da substância do negócio;
→ 2ª conexão: lei do lugar da celebração.
→ 3ª conexão: lei para a qual remete a lei do local da celebração (esta
terceira conexão não está prevista pelo artigo 9º da Convenção de
Roma).
2.4.3.1) A qualificação:
2.4.3.2) A adaptação:
São normas materiais que delimitam (pelo seu fim e conteúdo) o seu
âmbito de aplicação espacial e que exige um contacto mais ténue e menos exigente do
que o exigido pela regra de conflitos, tendo, assim, uma força expansiva e aplicando-se
mesmo que o ordenamento jurídico onde se inserem não se queira aplicar (são
exactamente o contrário das outras).
Em regra, pela regra de conflitos o ordenamento jurídico onde se inserem
não é o competente, mas elas exigem um contacto mais ténue e são, por isso,
expansivas.
→ Visam proteger os interesses do foro.
→ São de aplicação necessária porque se aplicam de forma imperativa,
não admitindo, por isso, postergação, já que visam proteger valores
caros do ordenamento jurídico onde se inserem.
→ São de aplicação imediata porque prescindem (e podem,
inclusivamente, preceder) da actuação da regra de conflitos.
Isto muito embora suponham sempre um contacto espacial (elas inserem
uma regra de conflitos específica unilateral «ad hoc»).
Há uma variante doutrinal das normas de DIP. material (mas não é bem
uma fonte interna).
VON MEHREN adopta uma visão salomónica do DIP., propugnando
pela conciliação e reconhecimento dos pontos de vista de todos os ordenamentos
jurídicos em contacto.
Contudo, estas razões não constituem base suficiente para justificar uma
adesão à via ou perspectiva «substancialista». É errado supor que a opção por
normas de DIP. material eliminaria o problema da conexão e da escolha da lei. Se
assim fosse, violaríamos um princípio fundamental de DIP.: o princípio da não
transactividade, segundo o qual, não é lícito aplicar a uma situação da vida uma lei que
lhe seja completamente estranha, uma lei que não tenha com ela qualquer contacto
efectivo. A fundamentação deste princípio (limitação espacial do campo de aplicação
José Eduardo Dias Ribeiro da Rocha Frota 97
3.1.1.1) Conceito-quadro:
3.1.1.1.2) Objecto:
3.1.1.1.3) Função:
Nota: também pode funcionar como elemento de conexão o nexo de interligação com
uma outra ordem jurídica.
Quanto ao conteúdo:
→ nacionalidade, residência, domicílio, sede (no caso de pessoas
colectivas);
→ situação duma coisa («lex rei sitae»);
→ lugar do cumprimento de uma obrigação;
→ convenção das partes sobre a lei aplicável;
→ lugar onde o processo decorre («lex fori»);
→ lugar da prática de um facto («lex loci actus», «lex loci
delicti commissi»); e
→ nexo de interligação com outra relação jurídica.
e, portanto, indica apenas uma lei como aplicável (cfr. os artigos 30º, 37º e 40º do Cód.
Civ.)
Mas, convém salientar, este sistema nem sempre conduzirá à
determinação de uma só lei. Como adverte WENGLER: há factores de conexão que,
eventualmente, podem levar-nos por duas ou mais vias. Em tais casos, há que,
normalmente, arredar a hipótese de a aplicação simultânea dessas leis corresponder ao
sentido da regra de conflitos; sendo assim, deve, neste caso, proceder-se a uma nova
escolha entre as conexões que se nos apresentarem no caso concreto.
Toda vez que essa anomalia se verificar, o critério que deverá presidir a
esta forçosa especificação ulterior do elemento de conexão não poderá ser outro senão
aquele que levou à escolha do factor utilizado pela regra de conflitos.
em cada uma delas; e isto com vista a evitar a criação de situações que não podem
aspirar ao reconhecimento num dos Estados com elas mais estreitamente conexionado.
Aqui, o escopo visado é o da harmonia jurídica internacional (cfr. o artigo 60º, n.os 1
e 4 do Cód. Civ., que faz depender a constituição do vínculo da adopção do voto de
conformidade de duas leis, a do adoptando e a lei reguladora das relações entre o
adoptando e a sua família de origem ― tem-se em consideração que a adopção não põe
somente em causa os interesses do adoptante e do adoptado, mas afecta também a
família natural desse último). Conclui-se, assim, que há aplicação cumulativa
propriamente dita quando duas ou mais leis consideradas como
competentes para a resolução da mesma questão jurídica concorrem
em plano de igualdade, sendo ambas (ou todas) competentes a título
primário, de modo tal que certos efeitos jurídicos só se produzem
quando sejam simultaneamente reconhecidos pelas leis em concurso.
A cumulação tem uma função negativa, qual seja, a de afastar a
consequência jurídica que, sendo estatuída por uma das leis, o não seja também pela
outra, sendo que, sob este aspecto, exerce uma função oposta à da conexão alternativa.
Este sistema, porém, não é recomendável como critério geral e dele só
encontramos raras aplicações nas legislações mais recentes. BATIFFOL entende que
tal sistema «dá mais do que promete» ― promete aplicar cumulativamente duas
leis em presença para, ao fim e ao cabo, aplicar apenas uma: a mais restritiva.
Dado por assente que o conceito-quadro se refere a dados normativos, não poderia
entender-se que naquele conceito se contém também uma referência pressuponente
a esses dados normativos?
Como já foi dito várias vezes, a regra de conflitos tem uma função
bilateral, referindo-se tanto ao direito do foro como aos direitos estrangeiros. Vem de
longe a caracterização da regra de conflitos como norma de remissão ou reenvio,
sendo este o verdadeiro sentido desse referência.
Para muitos autores como, por exemplo, AGO, esta caracterização
significa que a regra de conflitos funciona como verdadeira norma de remissão através
da qual o legislador do foro proveria à regulamentação de certas situações da vida
mediante o chamamento de normas estrangeiras que viriam integrar o ordenamento
jurídico-material do foro. Assim sendo, as norma de DIP. teriam a função de inserir
direito estrangeiro no ordenamento jurídico interna do foro.
Para outros autores, a designação da regra de conflitos como norma
indirecta significa apenas que ela é uma norma que se limita a indicar o sistema jurídico
aplicável.
116 Direito Internacional Privado – 1.º Semestre FDUC
— Parte Geral —
Reenvio
→ Extra-sistemático ou «ad aliud ius»: quando feito
relativamente a normas de um sistema
normativo diferente.
→ Expressa;
Remissão
― ela manifesta-se no poder de fazer cumprir a lei, sendo que a aplicação de uma
norma jurídica não põe em jogo senão a soberania territorial. Daqui resulta que não é
possível deduzir dos limites territoriais da soberania nacional os limites de
aplicabilidade dos vários direitos estrangeiros. Se a aplicação do direito estrangeiro
pusesse, realmente, em causa a soberania estrangeira, concluiríamos que os órgãos de
um qualquer Estado nunca poderiam aplicar senão o direito vigente nesse mesmo
Estado.
O DIP. não pode conceber-se como um conjunto de princípios ou normas
tendentes à resolução de conflitos de soberania.
Para defender o sistema da unilateralidade, podemos enveredar por dois
caminhos:
a) tese unilateralista extroversa: entende-se que a
única função da regra de conflitos é a de chamar, para a
regulamentação dos factos da vida jurídica externa, um determinado
ordenamento jurídico estrangeiro, pelo que, só indirectamente, ela
delimitaria o âmbito de aplicação da lei interna; e
b) tese unilateralista introversa (QUADRI): o
unilateralismo pode ser defendido com base noutros argumentos.
Não será ele o sistema mais consentâneo com o principal escopo e
desígnio do DIP.: salvaguardar a estabilidade e continuidade das
situações multinacionais através do seu reconhecimento em todos os
países?
Para QUADRI, a aplicabilidade de uma norma estrangeira
resulta de uma regra do sistema a que ela pertence, ou seja, da
«vontade de aplicação» desse sistema à situação controvertida.
Para que uma lei estrangeira se torne aplicável «in foro
domestico» têm que estar preenchidas duas condições:
→ que a situação «sub judice» não esteja ligada à «lex fori»
através do elemento de conexão que esta lei considera decisivo
no sector em causa; e
→ que entre a situação e a lei estrangeira exista precisamente a
relação que essa lei requer a fim de se reputar competente.
Cúmulo jurídico: a solução tradicional é optar por um dos sistemas ou uma das
normas, mas pode perguntar-se: com base em que critérios isso se
faz? Se se fizer com base num critério substancialista, seria
contra-indicado pelo seu casuísmo.
Pareceria melhor solução a de elaborar expressamente para este
tipo de situações normas de conflitos especiais. Tais normas
podem ser de uma ou outra de duas espécies:
a) ou normas que operassem a escolha em função do resultado;
b) ou regras que utilizassem o método tradicional da conexão
espacial.
CURRIE aplica a lei do foro porque não vai optar por nenhuma
soberania estrangeira; num segundo momento, admite a criação e aplicação da regra de
conflitos «ad hoc».
QUADRI aplica o princípio da efectividade (princípio de DIP.) que é
muito mais universalista.
Por quê é que é um unilateralista selvagem? Porque não atende à
coordenação das ordens jurídicas e à harmonia jurídica internacional (nacionalista).
QUADRI pretende isto e este é o fundamento da sua doutrina e o
instrumento para a atingir é o princípio da cooperação e da boa-fé entre as ordens
jurídicas. Isto leva-nos a concluir que QUADRI é um universalista.
Porém, ambas violam o princípio da paridade de tratamento.
Esta teoria não difere assim tanto da nossa no que diz respeito à
qualificação secundária. O grande ponto de divergência é a questão da qualificação
primária.
ROBERTSON observa que o nosso problema surge, por vezes, como
incidente no processo de actuação da norma de conflitos já determinada como aplicável
em momento anterior; em tal hipótese, a única questão susceptível de pôr-se é uma
questão de qualificação secundária. Simplesmente, o conhecimento de qual seja a
regra de conflitos aplicável ao caso supõe que se tenha previamente «qualificado» a
situação factual que se apresenta ao juiz, isto é, que se tenha previamente operado a sua
subsunção a uma das categorias do direito conflitual do foro. É nesta operação que
consiste a qualificação primária. Qualificados os actos, está definida a norma de
conflitos aplicável e fixada em definitivo a competência da lei. A qualificação primária
seria, assim, um passo obrigatório e decisivo para a determinação de regra de conflitos
apropriada ao caso e da legislação competente.
José Eduardo Dias Ribeiro da Rocha Frota 137
O certo, contudo, é que este entendimento das coisas está longe de ser
forçoso.
O nosso Código Civil não propõe aqui qualquer directiva. Por nós,
pensamos que a solução dos mencionados problemas deve, normalmente, buscar-se no
José Eduardo Dias Ribeiro da Rocha Frota 139
plano do próprio DIP. Para tanto, tentar-se-á definir uma relação de hierarquia entre as
qualificações conflituantes. E o critério norteador dessa hierarquização será,
fundamentalmente, o dos fins a que as várias normas de conflitos vão apontadas.
Mas, se o critério geral é este, por vezes, a questão só poderá ser
correctamente resolvida se nos colocarmos numa perspectiva diferente, uma perspectiva
jurídico material. Haverá, então, que ter em conta as soluções oferecidas pelas próprias
leis em presença, já para entre elas optar, já para as harmonizar entre si (adaptação), em
termos de se tornar possível a sua aplicação combinada, já para aplicar uma única dentre
elas, mas depois de convenientemente ajustada à nova situação que se apresenta.
O facto de a doutrina propugnada sobre a qualificação poder engendrar
dificuldades do tipo das referidas, não há razão para condená-la. Só uma posição de
rígida sujeição à «lex fori», como a defendida por AGO, poderia eliminar estes
problemas, porém, esta tese é absolutamente inaceitável. Por outro lado, é certo que a
produção de situações destas está longe de ser uma consequência exclusiva do método
de qualificação adoptado.
7º passo: ver se, no caso de não se aplicar a nossa lei, se há algum mecanismo que
possa, no entanto, levar à sua aplicação (v.g.: normas de aplicação
142 Direito Internacional Privado – 1.º Semestre FDUC
— Parte Geral —
Resposta:
→ lei da nacionalidade de A;
Lei portuguesa
→ lei da residência comum ao início da união de facto
→ «lex fori».
→ O artigo 53º do Cód. Civ., por fim, regula o regime patrimonial secundário
e chama a lei da nacionalidade comum e, na falta desta, a lei da residência
comum ao tempo do casamento (contudo, no nosso caso, não há casamento,
mas uma simples união de facto) ― chama a lei portuguesa. Trata-se de
uma regra de conflitos de conexão múltipla subsidiária fixa (concretiza-se
num determinado tempo).
Será então que o art. 2020º do CC. tem uma natureza sucessória ou familiar?
Quanto a nós, defendemos que tem natureza familiar. Parece não ter
natureza sucessória, já que B não é chamado a herdar, pois não se integra em nenhuma
classe sucessória. É certo que o direito a alimentos tem efeitos sucessórios, mas é uma
questão meramente reflexa. O essencial é a configuração do próprio direito a alimentos
que decorre da prévia existência de uma relação familiar ou para-familiar.
José Eduardo Dias Ribeiro da Rocha Frota 145
Esta norma do artigo 2020º do Cód. Civ. subsumir-se-á ao artigo 52º ou ao art. 72º
do Cód. Civ.?
Caso 2:
A, suíça, morreu em Portugal tendo deixado em testamento todos os seus
bens aos médicos (portugueses) que a assistiram. Aberta a sucessão, os familiares
suíços, residentes na Suíça, invocam a invalidade do testamento com base no artigo
2194º do Código Civil português. O direito suíço não se opõe à validade do
testamento. «Quid iuris». Mobilize as regras de conflitos dos artigos 25º e 62º,
ambos do Cód. Civ.
Resposta:
Caso 3:
A, francês, residente em França, encarregou B, também francês e
residente em França, nos termos de uma relação jurídica contratual, de transporte de
14 Direito Internacional Privado – 1.º Semestre FDUC
6 — Casos Práticos —
determinados bens para Portugal. Perto de Viseu ocorreu um acidente de viação por
exclusiva culpa de B. C, português, sofreu danos avultados. Invocando o artigo 500º
do Cód. Civ., este último vem demandar A e B nos tribunais portugueses.
Na contestação, A pretende não ser responsabilizado pelos actos
culposos de B, uma vez que, segundo o direito material francês que regularia as relações
entre comitente e comissário, aquele não responderia pelos actos deste.
Resposta:
Caso 4:
A, português e B, italiana, casaram-se em 1985 em Milão. Quando
casaram, A tinha 77 anos e B apenas 35. Em 1986 fixaram residência com carácter
estável e permanente em Barcelona. Em 1990, na comemoração do 5º aniversário de
casamento, A ofereceu a B um jipe que havia adquirido meses antes em Coimbra. A
doação realizou-se em Espanha.
C, filho de A pretende invalidar a doação invocando para tal os artigos
1720º e 1762º do Cód. Civ. Deveria o juiz dar razão a C sabendo que a doação é válida
face ao direito espanhol que chama para reger a doação entre casados a «lex locit
celebrationis»?
José Eduardo Dias Ribeiro da Rocha Frota 147
Resposta:
→ O artigo 25º do Cód. Civ., que regula a capacidade, chama a lei portuguesa;
→ o artigo 42º do Cód. Civ. que disciplina as obrigações chama a lei da residência e,
portanto, a lei espanhola;
→ o artigo 52º do Cód. Civ. que regula as relações entre os cônjuges, atribui
competência à lei da residência comum habitual e, portanto, também atribui
competência à lei espanhola; e
→ o artigo 53º do Cód. Civ. que dispõe sobre as convenções antenupciais e regime de
bens, chama a aplicar a lei da primeira residência comum do casal e, portanto,
também a lei espanhola.
Caso 5:
A e B, canadianos, residentes em Portugal, celebraram em Coimbra, em
1983, um contrato de mútuo; alguns meses depois casaram-se; em 2000 divorciaram-
se e o mutuante A intenta agora, em 2001, em Portugal, uma acção condenatória para o
pagamento da dívida. B alega a prescrição da dívida alegando que, segundo o direito
canadiano, o prazo de prescrição é de 5 (cinco) anos e não existe no Canadá qualquer
causa de suspensão semelhante à do artigo 318º, alínea a) do Cód. Civ.
Resposta:
→ O artigo 40º do Cód. Civ., que regula a prescrição e caducidade dos negócios
jurídicos dispõe: «a prescrição e a caducidade são reguladas pela lei
aplicável ao direito a que uma ou outra se refere».
→ Não podemos aplicar o artigo 41º do Cód. Civ., pois o enunciado não se refere a
qualquer declaração tendente a designar a lei competente para regular a respectiva
relação jurídica.
→ Sendo assim, nos termos do artigo 42º do Cód. Civ.: «na falta de residência
comum, é aplicável..., a lei do lugar da celebração», ou seja, a «lex
loci celebrationis». Deste modo, no nosso caso, seria aplicável a lei portuguesa.
→ O artigo 52º do Cód. Civ., que rege as relações entre os cônjuges, dispõe: «as
relações entre os cônjuges são reguladas pela lei nacional comum
dos cônjuges», ou seja, por esta via seria aplicável a lei canadense.
14 Direito Internacional Privado – 1.º Semestre FDUC
8 — Casos Práticos —
Caso 6:
Em Fevereiro de 1998, A, português residente em Munique, e B, também
português, mas residente em Viena, ambos trabalhavam nas respectivas cidades de
residência, celebraram em Roma um contrato de compra e venda de um prédio urbano
situado em Berlim, elegendo a lei portuguesa como competente para regular o contrato.
Dois meses depois, pretendendo B ocupar o respectivo prédio, A recusou-se a entregá-
lo. Em seu favor alega ser ainda o titular da propriedade do mesmo por não se ter ainda
verificado o acto de carácter real exigido pelo direito alemão, não se deu ainda a
transferência do direito de propriedade. B, por seu turno, contesta alegando os artigos
408º, n.º 1 e 879º, alínea a).
Resposta:
→ O estatuto real é regulado pela «lex rei sitae» que, no nosso caso,
é a lei alemã (BGB);
→ o estatuto contratual, por sua vez, nos termos do artigo 3º da
Convenção de Roma, é regulado pela «lex contractus» que, no
caso, é a lei portuguesa.
Caso 7:
José Eduardo Dias Ribeiro da Rocha Frota 149
Resposta:
Caso 8:
A e B, espanhóis, casados, adoptaram plenamente na Espanha, nos
termos do direito espanhol, uma criança de nacionalidade portuguesa. Algum tempo
depois, D pretende reconhecer a paternidade de C. A e B invocam o artigo 1987º do
Cód. Civ. Para impugnar o reconhecimento, ao que D contrapõe o facto de o direito
espanhol não conhecer nenhum preceito análogo àquela disposição. «Quid iuris»,
movimentando as normas dos artigos 56º e 60º do Cód. Civ.
Resposta:
Caso 9:
Em Junho de 1996, JAMES, cidadão inglês domiciliado na Inglaterra,
foi atropelado em Coimbra por CARLOS, cidadão português residente na Lousã. Em
Outubro JAMES veio a falecer em Coimbra em consequência dos traumatismos
causados pelo acidente e após um longo período de hospitalização, solteiro e sem
descendentes.
Por morte de JAMES, os seus pais, com base nos artigos 495º, n.º 3 e
496º, ambos do Cód. Civ., reclamam a indemnização por danos não patrimoniais e
alimentos que recebiam de JAMES, e apoiados no artigo 2161º, n.º 2 do Cód. Civ.
reclamam metade da herança. Agora, ANGELINA, herdeira testamentária reclama ser
a única herdeira uma vez que o testamento é válido segundo o direito inglês e que este
ordenamento jurídico não reconhece qualquer direito sucessório aos ascendentes. Na
verdade, no testamento de JAMES, ANGELINA era considerada a única e universal
herdeira.
a) «Quid iuris» considerando os artigos 45º e 62º do Cód. Civ. e o
facto de a lei inglesa regular a sucessão pela lei do último domicílio
do «de cujus» e considerando ainda que a responsabilidade
aquiliana é regulada pela lei do local de ocorrência do facto?
b) Se partilharmos da concepção de AGO, «quid iuris»?
Resposta:
Caso 10:
A, cidadã italiana, casou-se com B, português, em 1986, passando ambos
a residir em Portugal. Em Fevereiro de 1989 foi aberta a sucessão de C, italiano, que
em seu testamento havia nomeado A como sua herdeira. Todavia A, ainda nesse mês,
declarou repudiar essa herança. Volvido 1 (um) mês, B veio pedir a anulação desse
repúdio invocando para tal os artigos 1683º, n.º 2 e 1687º, n.os 1 e 2 do Cód. Civ., ao
que se contrapõem os herdeiros legítimos de C invocando, para tal, que no artigo 519º
do Código Civil italiano não havia qualquer disposição idêntica à do referido preceito
do Código Civil português.
Aduzindo ainda que A, face ao direito italiano, não padecia de qualquer
incapacidade, suponha que o direito italiano adoptava soluções conflituais idênticas à
portuguesas.
a) Com base nos artigos 25º, 52º e 62º do Cód. Civ.,
«quid iuris»?
b) e se seguisse-mos a concepção de AGO?
Resposta:
Caso 11:
A, português e residente em França, casou-se com B, francesa e residente
no Luxemburgo. O casamento foi validamente celebrado em Junho de 1994. Como na
altura A tinha apenas 16 anos de idade, obteve a necessária autorização dos pais nos
termos do artigo 1604º-A do Cód. Civ. Após o referido casamento o casal fixou
residência no Luxemburgo. Em Fevereiro de 1995, A desloca-se para Portugal para aí
vender uma casa de férias situada no Algarve de que era proprietário desde 1990.
No momento da realização da escritura pública, o notário recusa-se a
realizar o acto invocando o facto de que, segundo o direito competente para reger os
efeitos do casamento, este não implicava a plena aquisição da capacidade de exercício.
Efectivamente, no direito de Luxemburgo não há qualquer disposição com conteúdo
idêntico ao dos artigos 132º e 133º do nosso Cód. Civ., e, assim, o casamento não
implica a emancipação dos menores. «Quid iuris» considerando os artigos 25º, 47º e
52º do Cód. Civ.
Resposta:
→ Estabelece o artigo 25º do Cód. Civ. relativo ao âmbito da lei pessoal: «o estado
dos indivíduos, a capacidade das pessoas, as relações de família e
as sucessões por morte são regulados pela lei pessoal dos
respectivos sujeitos...». Tal preceito possui natureza pessoal e declara
competente em tais casos a lei portuguesa.
→ Nos termos do artigo 47º do Cód. Civ. é definida pela lei da situação da coisa «a
capacidade para constituir direitos reais sobre coisas imóveis ou
para dispor deles, desde que essa lei assim o determine; de
contrário, é aplicável a lei pessoal».
→ Por fim, preceitua o n.º 2 do artigo 52º do Cód. Civ.: «não tendo os cônjuges
a mesma nacionalidade, é aplicável a lei da sua residência
habitual comum...». Este preceito tem natureza patrimonial e, no nosso caso,
declararia competente a lei de Luxemburgo.
15 Direito Internacional Privado – 1.º Semestre FDUC
4 — Casos Práticos —