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Voz de mulher, muito velada, igualmente mate, voz de leitura recitativa, sem
pontuação, resposta:
ELE - Você não viu nenhum hospital em Hiroshima. Você não viu nada de
Hiroshima.
Então, a voz da mulher torna-se cada vez mais impessoal. Dando um condição
(resumo) para cada palavra.
Agora vemos o museu que desfila. O mesmo que sobre o hospital, luz ofuscante,
feio.
Imagens documentais. Vestígios de bombardeio.
Mockups. Ferros torcidos.
Peles, cabelos queimados, cera. Etc.
Tenho sentido calor na Plaza de la Paz. Dez mil graus, na Plaza de la Paz. Já sei. O
temperatura do sol, na Plaza de la Paz. Como eu poderia não saber ...? A grama é
muito
simples…
A. - Você não viu nada em Hiroshima, nada.
ELA.- ... mas justamente chorar para suportar aquele espetáculo abominável de
todo o mundo. E deixá-lo triste o suficiente para não perder a cabeça.
ELA. - As pessoas ficam lá, pensativas. E sem ironia, pode-se dizer que nessas
ocasiões servem para fazer as pessoas pensarem que são sempre boas. E que os
monumentos, do que às vezes se sorri, são, no entanto, as melhores desculpas
para aquelas ocasiões ...
ELA. - Para aquelas ocasiões ... pensar. Geralmente, é verdade, quando se
apresenta a oportunidade de pensar ... com aquele luxo ... você não pensa nada.
O que não significa que o espetáculo dos outros, que deveriam estar pensando,
seja encorajando.
ELE. - Não.
A Plaza de la Paz desfila, vazia, sob um sol deslumbrante que lembra o da bomba,
cegando. E sobre esse vazio, novamente a voz do homem:
No segundo dia, diz a história, eu não inventei nada, desde o segundo dia,
Certas espécies animais surgiram das profundezas da terra e das cinzas.
Os cães foram fotografados.
Para sempre.
Eu os vi.
Eu vi as notícias.
Eu os vi.
Desde o primeiro dia.
No segundo dia.
No terceiro dia.
Cachorro amputado.
Pessoas, crianças.
Feridas
Crianças queimadas chorando.
Da mesma forma que existe essa ilusão no amor, essa ilusão de ser capaz de não,
nunca se esqueça, eu também tive a ilusão antes de Hiroshima de que nunca irei
esquecer.
Assim como no amor.
A notícia continua.
ELA. - Eu também vi os sobreviventes e aqueles que estavam no ventre de
mulheres de Hiroshima.
Uma linda criança volta para nós. Então vemos que ele tem um olho só.
Um homem está morrendo porque não consegue dormir há anos. (Uma vez por
semana que seus filhos o trazem.)
Nuvem atômica.
Atomium que gira.
As pessoas caminham pela rua na chuva.
Pescadores afetados pela radioatividade.
Um peixe não comestível.
Milhares de peixes não comestíveis enterrados.
ELA. - As mulheres correm o risco de dar à luz filhos deformados, monstros, mas
tudo segue. Os homens correm o risco de serem atacados com esterilidade, mas
tudo continua.
A chuva é assustadora.
Chuvas de cinzas nas águas do Pacífico.
As águas do Pacífico matam.
Pescadores do Pacífico morreram.
A comida é assustadora.
A comida de uma cidade inteira é jogada fora.
A comida de cidades inteiras é jogada fora.
Uma cidade inteira está em fúria.
Cidades inteiras estão em fúria.
Noticiários: algumas manifestações.
Eu esqueci, como você. Como você, gostaria de ter uma memória inconsolável,
uma memória de sombras e pedra.
ELA. - Lutei sozinho, com todas as minhas forças, todos os dias, contra o horror de
não
entendo por que lembrar. E como você, esqueci ...
Lojas nas quais, em cem exemplares, se encontra a maquete reduzida do Palácio
do
Industria, o único monumento cuja estrutura retorcida permaneceu de pé após a
bomba, e que tem sido mantida assim desde então.
Loja abandonada.
Treinador de turismo japonês.
Turistas na Plaza de la Paz.
Gato cruzando a Plaza de la Paz,
ELA. - Haverá dez mil graus na terra. Dez mil sóis, eles dirão. O asfalto vai queimar.
Igreja.
Propaganda japonesa.
ELA. - Uma profunda desordem reinará. Uma cidade inteira será levantada do chão
e voltará às cinzas …
Areia. Um maço de cigarros "Peace". Uma planta gorda se espalha como uma
aranha na areia.
ELA. —... Quatro alunos esperam uma morte fraternal e lendária juntos.
ELA. - Você!
O rosto do japonês aparece depois do da mulher numa risada extática (risada), que
não vem à mente na conversa. Se volta:
ELE- Eu sim. Você terá me visto.
Os dois corpos nus aparecem. A mesma voz de uma mulher muito velada, mas
desta vez não declamatório.
ELA. - Você é japonês ou não é?
ELE - De todo. Eu sou japonês.
ELE- Seus olhos são verdes. Não é isso?
ELA. - Oh, eu acho ... sim ... eu acho que eles são verdes.
Ele beija o ombro dela e afunda a cabeça no oco desse ombro. A cabeça dele virou
em direção à janela aberta, em direção a Hiroshima, à noite. Um homem passa na
rua e tosse. (Você não pode vê-lo, só pode ouvi-lo.) Ela se endireita.