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PRINCIPAIS MENSAGENS 4
1 INTRODUÇÃO 7
2.1. Indústria 25
2.1.1.
Cimento 26
2.1.2.
Cerâmica 28
2.1.3.
Siderurgia 29
2.1.4.
Indústria Química 32
3 CONSIDERAÇÕES FINAIS 46
Anexo I 52
Anexo II 56
Anexo III 57
4 PANORAMA E PERSPECTIVAS PARA O GÁS NATURAL NO BRASIL
PRINCIPAIS MENSAGENS
1Registramos também a contribuição de Joaquim Levy que preparou a versão inicial desse documento enquanto pesquisador visitante (fellow) do Centro Steyer Taylor de Energia e Finanças na
Universidade de Stanford e inspirou a discussão de vários dos temas aqui apresentados.
2Luiz Augusto Barroso: Matemático e Presidente do E+ Painel e Presidente da PSR; Rafael Kelman: Engenheiro e Diretor Executivo na PSR; Luana de Souza Gaspar: Engenheira e Analista de
Energia na PSR.
3“Gás para o Desenvolvimento” (BNDES, 2020); “Competitividade do Gás Natural: Estudo de Caso na Indústria de Fertilizantes Nitrogenados” (EPE, 2019); “Impactos Econômicos da
Competitividade do Gás natural” (CNI, 2019); “Plano Decenal de Expansão de Energia (PDE) 2029” (EPE, 2020).
4Dada a centralidade da eventual capacidade de substituição de outras fontes de energia pelo gás, sempre que possível, serão utilizadas nesse relatório unidades de energia (milhões de
toneladas equivalentes de petróleo - Mtep) para facilitar a comparação entre diferentes fontes.
PANORAMA E PERSPECTIVAS PARA O GÁS NATURAL NO BRASIL 7
1. INTRODUÇÃO
O uso do gás natural tem crescido 2019). Seu uso no Brasil se consolidou
rapidamente nos últimos 30 anos, a partir da virada do século XXI, com o
correspondendo em 2019 a 24% da início da operação do gasoduto Bolívia-
energia primária global (Figura 1) e 21% Brasil (Gasbol) em 1999, mas corresponde
das emissões de gases de efeito estufa ainda a apenas 13% da matriz energética
(GEE) dessas fontes, ou 7 bilhões de brasileira, ligeiramente acima da
toneladas de gás carbônico equivalente contribuição da energia hidroelétrica
ao ano (GtCO2eq/ano) (BP, 2019; IEA, (EPE, 2019).
Figura 1b - Oferta interna primária de energia por fonte no mundo e no Brasil em Mtep (%), 2018.
Global Brasil
Renováveis Nuclear
Outras Primárias
Hidráulica 5% 4%
8% (21,6)
6%
Petróleo
Cana
32% (87,8)
Petróleo 19% (50,9)
Gás Natural 33%
24%
Lenha
9% (24,1)
Gás Natural
Carvão Hidráulica 13% (35,9)
28% 12% (33,5)
Nuclear Carvão
2% (5,6) 6% (15,6)
5Um bilhão de m3 de gás natural em condições normais tem o poder energético de 0,9-1,0 milhão de toneladas de petróleo (1 Gm3 gás natural = 0,9 Mtep).
Disponível em: http://agnatural.pt/documentos/ver/natural-gas-conversion-guide_cb4f0ccd80ccaf88ca5ec336a38600867db5aaf1.pdf
PANORAMA E PERSPECTIVAS PARA O GÁS NATURAL NO BRASIL 9
significativamente desde 2000 (Figura 2), oferta contou ainda com a possibilidade
principalmente associada aos campos de de importação de gás liquefeito após
petróleo do Pré-Sal, com mais de 80% do a construção de três terminais
gás produzido no Brasil sendo associado dedicados a essa atividade na
ao petróleo, proporção que chega a 98% segunda metade da primeira década
no Rio de Janeiro (Tabela 1). O aumento da do século.
Fonte: MME
140 160
Produção +
Importação
140
120
Produção
120 Consumo
100 Total
100
Consumo Consumo
80 Total Final
80 Energético
60 Geração
Perdas,
60 Elétrica
Reinjeção e
Estoques
40
40
Produção de
Importação Derivados de
20 Petróleo
20
Consumo
0 0 Final Não-
Energético
2000
2004
2010
2014
2008
2018
2006
2016
2004
2014
2008
2018
2006
2016
2012
2002
2012
2000
2010
2002
Figura 3 - Preços do gás natural entre 2007 e 2019, em US$ por milhão de BTU.
20
18
16
U$$/MMbtu
14
12
10
0 mar 19
mar 14
Jul 07
set 11
mai 18
abr 16
mai 08
nov 15
out 13
dez 12
jan 15
abr 11
dez 17
mar 09
set 16
jan 10
dez 07
mai 13
ago 09
fev 12
fev 17
jun 15
jul 12
ago 14
out 18
jun 10
jul 17
out 08
GNL via RJ Sudeste com desconto Sudeste sem desconto Renegociado Sudeste Importado Sudeste
11Apenas em 2020, com a substancial queda do preço do gás natural nos mercados mundiais e a presença do gás liquefeito no Brasil, houve uma redução de cerca de 30% no preço do gás
natural da Petrobras, levando o preço em maio de 2020 abaixo de US$6 por MMBTU. Fonte: Boletim Mensal de Acompanhamento da Indústria de gás natural – MME, 2020.
12 PANORAMA E PERSPECTIVAS PARA O GÁS NATURAL NO BRASIL
15
US$ /MMBtu
10
0
jun 14
fev 15
fev 19
dez 13
jun 15
abr 15
fev 18
abr 19
dez 15
ago 19
abr 18
jun 18
out 13
ago 14
out 18
jun 19
dez 19
fev 20
out 15
abr 16
fev 16
abr 14
ago 17
out 19
dez 18
fev 14
dez 16
abr 17
jun 17
dez 17
out 14
ago 15
jun 16
out 16
fev 17
out 17
ago 18
ago 16
abr 20
jun 13
dez 14
ago 13
Fonte: MME, 2020 e Seminário Novo Mercado de Gás Natural – EPE, 2019.
Figura 5 - Preços do gás natural nos principais mercados estaduais em 2017 (US$/MMBTU).
NA
6,96
6,97 - 12,70
12,71 - 13,41
13,42 - 13,93
13,94 - 14,66
14,67 - 15,44
15,45 - 17,62
Para os setores de transporte rodoviário últimos anos (ainda assim, mais barato
e residencial, o preço do gás natural que a gasolina por unidade de
é ainda maior do que na indústria. energia). Já o gás natural canalizado
Como indicado sistematicamente no para uso residencial, frequentemente
Boletim Mensal de Acompanhamento passa de US$40/MMBTU em São Paulo
da Indústria do Gás Natural, publicação e se aproxima de US$50/MMBTU
do Ministério de Minas e Energia (MME), no Rio de Janeiro, em ambos casos,
o preço do gás comprimido para uso acima do custo do GLP, que oscila
veicular - por exemplo no Rio de Janeiro próximo a US$30/MMBTU em ambas
- esteve próximo a US$20/MMBTU nos áreas.
Box 1
14As alterações incluem a Lei 12.351/2010 que adicionou o regime de partilha da produção e a Lei 12.276/2010, autorizando a União a
ceder onerosamente à Petrobras a pesquisa e lavra do petróleo e gás natural em áreas específicas.
15Novo Mercado de Gás, MME.
16 PANORAMA E PERSPECTIVAS PARA O GÁS NATURAL NO BRASIL
Box 2
Na falta de uma Nova Lei do Gás, o mercado de gás natural, a ser regulada
governo federal tomou iniciativas por Resolução. Por sua vez, a Agência
infralegais a partir de 2017. Dentre elas Nacional do Petróleo, Gás Natural e
se destaca o Decreto nº 9.616/2018, que Biocombustíveis (ANP) desenvolveu
altera a regulamentação da Lei do Gás uma série de iniciativas visando
estabelecida pelo Decreto nº 7.382/2010 promover a concorrência no mercado
e traz elementos encontrados no de gás natural e otimizar o uso dos
Substitutivo da Câmara, como o conceito ativos existentes, tais como gasodutos
de sistema de transporte de gás natural de transporte, UPGNs e terminais de
e a contratação de capacidade por gaseificação.
Emenda Emenda
Constitucional 5 Constitucional 9
Altera Art.25 Altera Art.177
permitindo companhias permitindo companhias ANP
privadas no upstream.
privadas na distribuição de gás.
“Rodada Zero” ANP Iniciativa Programa
Lei 11.909
Rodada 1 “Lei do Gás” “Gás para Crescer” “Novo Mercado de Gás”
1988 ... 1995 1997 1998 1999 ... 2009 2010 2016 2018 2019
Fonte: PRYSMA.
18 PANORAMA E PERSPECTIVAS PARA O GÁS NATURAL NO BRASIL
16Inquérito Administrativo - IA nº 08700.007130/2015-82, a partir de representação da Associação Brasileira das Empresas Distribuidoras de Gás Canalizado (Abegás), complementando o Processo
Administrativo nº 08700.002600/2014-30 decorrente de reclamação contra o oferecimento pela Petrobras de descontos para uma distribuidora de gás integrada ao Sistema Petrobras, que resultou
na recomendação de condenação da Petrobras por suposta prática de infração à ordem econômica, e ao qual foi apensado o IA nº 08700.003335/2018-31.
17O Novo Mercado de Gás é tipicamente descrito como um programa do Governo Federal brasileiro nascido da Iniciativa Gás Para Crescer, agregando agentes públicos e privados para colaborarem
em grupos de trabalhos com o objetivo de propor medidas concretas de aprimoramento do arcabouço normativo do setor de gás natural, visando aumentar a competição e fomentar a presença
de múltiplos agentes (Firjan, 2019).
18No seu Artigo 2º, a Resolução estabelece que o novo mercado deverá “ocorrer de forma coordenada” para (VII) incentivar a adoção voluntária, pelos Estados e o Distrito Federal, de boas práticas
regulatórias relacionadas à prestação dos serviços locais de gás canalizado, que contribuam para a efetiva liberalização do mercado (...) e a precificação adequada no fornecimento de gás natural
por segmento de usuários. No seu 5º artigo, recomenda que o MME e o Ministério da Economia incentivem os entes subnacionais a (IV) aderirem a ajustes tributários necessários à abertura do
mercado de gás natural discutidas no âmbito do Conselho Nacional de Política Fazendária – CONFAZ, a exemplo do Ajuste do Sistema Nacional Integrado de Informações Econômico-Fiscais -
SINIEF nº 03/18, de 3 de abril de 2018.
19Pela cláusula 2.2., a Petrobras se compromete a, em até 90 dias, indicar os volumes de injeção e retirada máxima em cada ponto de recebimento e zona de entrega, por área de concessão de
cada companhia distribuidora local e consumos próprios, perante a ANP e os referidos transportadores, ajustando a seguir os contratos visando limitar a flexibilidade que dispõe hoje, a fim de que
os transportadores TAG, NTS e TBG, sob supervisão da ANP, possam ofertar a capacidade remanescente ao mercado, por entrada e saída, com a definição das respectivas tarifas de entrada e saída
aplicáveis; a empresa também se compromete a declinar da exclusividade ainda remanescente em função de ser carregadora inicial referente aos contratos de serviço de transporte vigentes.
PANORAMA E PERSPECTIVAS PARA O GÁS NATURAL NO BRASIL 19
Sem acesso
de terceiros
Sem acesso
de terceiros
Processamento
Gasodutos de
Escoamento
Transporte Distribuição
E&P
Acesso de terceiros
existe mas 100%
Petrobras produz 77% Terminais de Petrobras controla
da capacidade está
do gás natural doméstico, regaseificação 2 distribuidoras
contratada pela
mas é o único supridor, e tem participação
Petrobras.
porque compra 100% do gás minoritária em
Petrobras possui outras
produzido por outros players
Sem acesso 10% de 19 distribuidoras
(exceto o projeto
de terceiros participação na TAG (através Gaspetro).
de gas-to-power no Maranhão).
e NTS,
e 51% na TBG.
Acesso
Negociado
Acesso
Negociado
Processamento
Gasodutos de
Escoamento
Transporte Distribuição
E&P
1. Capacity release 1. Saída da Petrobras
na NTS e TAG. 2. Incentivos
2 I ti aos
Terminais de
1. Redução da compra de regaseificação 2. Saída da Petrobras. estados:
gás de terceiros. 3. Modelo de • Práticas Regulatórias
entrada - saída. • Agências Regulatórias
2. Possível programa de Sem acesso
4. Operação • Privatização
Release, se necesseario. de terceiros independente • Ajustes Tributários
por transportadores.
Fonte: PRYSMA.
20 PANORAMA E PERSPECTIVAS PARA O GÁS NATURAL NO BRASIL
2024
2030
2034
2028
2026
2029
2027
2022
2025
2023
2032
2035
2033
2014
2018
2016
2019
2017
2021
2015
2031
20Os principais gasodutos de escoamentos do Pré-Sal são: o que liga o campo de Lula a uma linha-tronco da plataforma de Mexilhão (Rota 1, com vazão de 10 MMm3/dia) a qual segue para
Guaratatuba em São Paulo; o que liga a área do Pré-Sal ao hub de gás de Cabiunas, próximo a Macaé no Rio de Janeiro (Rota 2, com vazão de 16 MMm3/dia); e um terceiro, que liga a mesma área
do Pré-Sal a uma usina projetada em Itaboraí no Rio de Janeiro, chegando à costa próximo a Maricá no mesmo estado (Rota 3, previsto para 18 MMm3/dia). Conforme indicado na Figura 8 do texto,
substancial parte da produção potencial dos campos fronteiros a São Paulo ainda não tem rota definida para escoamento, inclusive por meio de interligações como a Rota 1.
PANORAMA E PERSPECTIVAS PARA O GÁS NATURAL NO BRASIL 21
24O consumo final de gás natural em termos de poder calorífico (19 milhões de toneladas equivalentes de petróleo — Mtep) corresponde a 7,5% do consumo total de energia no país (255 Mtep).
A oferta interna de gás (36Mtep) corresponde a 13% do total da oferta interna de energia no país (288 Mtep), a diferença refletindo o uso do gás na geração de energia e frações líquidas usadas
na gasolina, que são parte do consumo intermediário. Se o gás extraído fosse comercializado ao invés de reinjetado nos poços, a oferta interna de energia aumentaria em 12 Mtep (4,4% da oferta
interna total do país, ou o equivalente a 37% da geração hidroelétrica). O consumo de gás natural na indústria (9,2 Mtep) corresponde a apenas 11% do consumo de energia do setor (80 Mtep) e 3,6%
do consumo final de energia no país.
PANORAMA E PERSPECTIVAS PARA O GÁS NATURAL NO BRASIL 23
200
milhões de m3/dia
200
180
0
150 160
milhões de m3/dia
140
120
100
100
80
50 60
40
20
0
0
2020 2021 2022 2023 2024 2025 2026 2027 2028 2029 2020 2021 2022 2023 2024 2025 2026 2027 2028 2029
GN nacional associado - Pré-Sal GN nacional associado - Outros Demanda não Termelétrica Demanda Termelétrica a Gás Natural
Demanda Termelétrica Indicativa - Ciclo Combinado Demanda Termelétrica Bicombustível
GN nacional não associado Importação via Gasodutos
Demanda Adicional Novo Mercado de Gás Oferta Potencial
Capacidade dos terminais de GNL Oferta Total (malha integrada)
Oferta Potencial Novo Mercado de Gás Demanda Potencial Novo Mercado de Gás
Demanda total (despacho médio)
2.1 Indústria
A indústria responde por significativa parte e uma avaliação de proximidade
do consumo total de gás natural no país dos gasodutos. Apresenta-se, para
(28%), apesar de essa ser em muitos casos esse fim, a disposição geográfica
uma fonte energética cara (Figura 10). Com das principais unidades de produção
o alto custo do gás, a demanda do setor tem desses setores, comparando-se
estado deprimida e sua competitividade com o trajeto dos gasodutos de
pode ter sido prejudicada pela necessidade transporte existentes. Essa indicação
de utilizar combustíveis alternativos que é de interesse na hipótese de que
nem sempre proporcionam o melhor a capacidade de transporte desses
processo produtivo. Nesse sentido, tem dutos não seja um cargalo para o
sido observado que alguns segmentos acesso ao gás, na medida em que essa
industriais, potencialmente demandantes capacidade possa ser aumentada em
de gás natural, tiveram sua produção cerca de 40% em vários pontos pela
diminuída nos últimos 15 anos, tornando-se adoção da metodologia de pontos
grande importadores, especialmente em de entrada e saída no cálculo de
períodos de expansão econômica seu valor e cessão dessa capacidade
(CNI, 2019). para terceiros (Silva, 2019). Desse
modo, a infraestrutura de gasodutos
A análise da demanda potencial dos existente poderia abastecer um
segmentos de cimento, cerâmica, possível aumento de demanda,
siderurgia e química usa as matrizes de sem necessidade de vultosos
consumo energético publicadas pela EPE investimentos na malha.
30
25
20
US$/MMBTU
15
10
0
Lenha Coque Carvão Carvão Gás Natural Óleo GLP
de petróleo mineral Vegetal combustível
2.1.1 Cimento
A atual distribuição das fontes de energia responder a fatores como a diferença de
para produção de cimento tem forte poder calorífico entre o gás e o coque,
preponderância de derivados do petróleo, mas esses ajustes são bem conhecidos
como mostra a Tabela 4. O coque de e factíveis sem maiores dificuldades.
petróleo corresponde a 70% do total da A viabilidade da transição também
energia usada na indústria e a eletricidade dependerá do preço do gás, já que o coque
por 13%, sendo pequena a presença do é barato (US$ 200/t), e dos distúrbios que
gás natural, que estaria entre as fontes poderiam ser causados pelo deslocamento
primárias de energia usadas pelo setor da produção nacional de coque. Essa é
(as quais incluem ainda a lenha e o parte da cadeia de craqueamento nas
carvão, que somam apenas 4% do total refinarias locais, associada ao atendimento
de consumo energético na produção da demanda por gasolina e outras frações
cimenteira). leves no país.
TABELA 4 | Consumo de Energia na Indústria de
Cimento em 2018 em Mtep. Segundo o Anuário Estatístico da ANP,
o Brasil produziu 4,4 MMm3 de coque
Mtep %total de petróleo em 2018, tendo importado
Coque de Petróleo 2,68 70,5% outros 2,7 MMm3 e exportado 0,6 MMm3.25
Eletricidade 0,51 13,5% Assim, a substituição energética do coque
Fontes primárias 0,40 10,5%
pelo gás natural no setor de cimento
provavelmente deslocaria primeiro a
Outras 0,20 5,5%
importação e só depois a produção
Total 3,79 100,0%
nacional.
Fonte: BEN, 2019.
25O coque divide-se naquele usado como combustível e o de grau anodo (incluindo o coque agulha), de maior qualidade. A produção citada provavelmente corresponde à produção de coque
de destinação energética e o usado para a produção de anodos, que são usados na produção de alumínio. O consumo de coque como anodo pela indústria brasileira de alumínio em 2010 foi da
ordem de 0,5 Mt, um consumo unitário abaixo do típico de 0,5 t de anodo por tonelada de alumínio produzido. Desde então, a produção de alumínio primário caiu praticamente pela metade
(0,8 Mt em 2016), sugerindo uma queda da mesma ordem na demanda doméstica por coque de grau anodo. A Petrobras assinala que parte significativa do coque de grau anodo é exportada.
PANORAMA E PERSPECTIVAS PARA O GÁS NATURAL NO BRASIL 27
Fonte: “Plano Indicativo de Gasodutos de Transporte”, EPE, 2019 (esquerda) e Santos et al., 2011 (direita).
26https://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S0008884616311425
28 PANORAMA E PERSPECTIVAS PARA O GÁS NATURAL NO BRASIL
2.1.2 Cerâmica
A indústria de cerâmica é separada em A demanda interna de cerâmica branca
três subsegmentos principais: da cerâmica e revestimentos, que depende muito
vermelha, que produz sobretudo tijolos, do desempenho do setor de construção
blocos e telhas; da cerâmica branca, que civil, pode crescer 40% nas próximas
é composto principalmente por louças; e décadas, enquanto a exportação pode
da cerâmica de revestimento, que produz crescer até mais, dada a pequena
materiais como azulejos e porcelanato. participação do Brasil no mercado
Enquanto a cerâmica branca e a de mundial (Figura 12), especialmente
revestimento já usam o gás natural (e se a expansão do uso do gás barato
GLP) de forma intensiva (30% da energia continuar permitindo o aprimoramento
total do setor), a cerâmica vermelha ainda da qualidade dos produtos brasileiros.
depende muito da energia vinda da lenha Ainda assim, o aumento do consumo de
(49% da energia do setor) ̶Tabela 5. O gás estaria próximo a apenas 5 MMm3/
aumento do consumo do gás natural dia (aproximadamente 2 Mtep/ano),
dependerá principalmente da expansão mesmo em um cenário ambicioso, em
dos segmentos da cerâmica branca e de que a demanda no segmento de azulejos
revestimento, já que a transição da lenha dobrasse e 30% do consumo de lenha
(sustentável) para o gás natural no setor fosse deslocado pelo gás natural.
da cerâmica vermelha, embora represente
ganhos em eficiência, encontra barreiras,
Figura 12 - Principais produtores
principalmente geográficas. Os pontos de Azulejos - 201827
de produção de cerâmica vermelha
são muito numerosos (já que o custo
de transporte é alto em relação ao
produto) e distribuídos pelo território, não
necessariamente próximos à malha de
distribuição de gás natural.
Outras 0,11 3%
GLP 0,15 4%
Outros Derivados de
0,22 5%
Petróleo
Eletricidade 0,32 8%
Outras 0,08 2%
2.1.3 Siderurgia
A siderurgia é grande consumidora seu uso na usina de Pecém em virtude da
de energia (17 Mtep/ano), produzida dificuldade de suprimento de gás natural
principalmente pela queima do coque naquele local à época pela Petrobras. A
de carvão mineral, importado na sua conversão integral do uso de coque para
maioria (Tabela 6). O papel do coque, o gás natural poderia adicionar perto de
além de gerar calor, é combinar-se com 25 MMm3/dia (aproximadamente 9 Mtep/
os átomos de oxigênio presentes no ano) de demanda para o gás, imaginando-
minério de ferro ao ser queimado nos se que a produção de aço não aumente
alto-fornos, transformando o minério significativamente nos próximos 10 anos.
em ferro metálico (gusa) e depois em A conversão do carvão vegetal utilizado
aço, mediante a retirada da maior parte no setor é improvável porque esse carvão
do carbono presente no gusa. O gás está associado à produção distribuída de
natural já é usado no setor (e.g., na CSN), ferro gusa, realizada cada vez mais com
mas representa uma fração exígua (7%) lenha de madeira cultivada.
do total de consumo de energia da
siderurgia, inclusive pela desistência de O acesso da siderugia ao gás natural
pode ser facilitado pela liberação de
TABELA 6 | Consumo de Energia na Indústria
Siderúrgica em 2018 em Mtep.
capacidade nos gasodutos existentes.
A maior parte das usinas siderúrgicas
Mtep %total
fica próxima a gasodutos de transporte
Primária 3,58 21% (nos estados do Rio de Janeiro, São Paulo
Gás natural 1,17 7% e Minas Gerais, sendo no último estado
Carvão vapor 2,41 14% próximas a Juiz de Fora e no entorno de
BH) ou de distribuição (João Monlevade/
Secundária 13,07 79%
ArcelorMittal, Ipatinga/ Usiminas),
Derivados de Petróleo 0,10 0%
facilitando o uso desse combustível
Gás Coqueria 1,24 7%
(Figura 13).
Coque de carvão mineral 7,35 44%
Outros 0,09 1%
Total 16,65 100%
Fonte: Mapas de ANP, 2018 com dados de usinas do Instituto Aço Brasil.
28O custo do carvão em alto fornos pode ser encontrado em https://www.steelonthenet.com/cost-bof.html. No caso da redução direta, o custo da energia por tonelada de aço é dez vezes o custo
por MMBTU (e.g., o gás natural a US$6/MMBTU implicando em US$60/t aço). Já o carvão na faixa de US$2/MMBTU implicaria em um custo de US$40/t aço, mas não é claro se aí estão incluídas
todas as fases do minério até o aço (e.g. produção do ferro esponja).
Fonte: www2.deloitte.com/content/dam/Deloitte/global/Documents/Manufacturing/gx_remaking%20the%20global%20steel%20industry_06_13.pdf
29Hidrogênio produzido a partir da eletrólise da água com energia elétrica gerada a partir de fontes renováveis e não a partir do gás natural.
32 PANORAMA E PERSPECTIVAS PARA O GÁS NATURAL NO BRASIL
1,0
sejam muito voláteis, há indicações
0,5 de que projetos para a construção de
0
2011 2012 2013 2014 2015 2016 2017 2018 2019
plantas de escala mundial do metanol,
FAFEN-SE FAFEN-BA
importante insumo para a produção
de formaldeído e biodiesel, poderiam
Fonte: Boletim Mensal Acompanhamento da Indústria
de Gás – MME, 2020.
ser desencadeados caso o custo do gás
fosse substancialmente reduzido. Essa
demanda corresponderia a um consumo
adicional de gás natural da ordem de
4 MMm3/dia (1,4 Mtep/ano).
30https://abiquim-files.s3-us-west-2.amazonaws.com/uploads/guias_estudos/Livreto_Desempenho_da_Ind%C3%BAstria_Qu%C3%ADmica_Brasileira_R4_-_Abiquim_DIGITAL_1.pdf
PANORAMA E PERSPECTIVAS PARA O GÁS NATURAL NO BRASIL 33
Adubos ou
Código
Fertilizantes 2019 2018 2017
CUCI
químicos
Nitrato de
562111 248 1.235 217 1.033 253 1.327
amônio
Sulfato de
56213 427 2.637 376 2.324 295 1.904
amônio
Outros
5629 2.785 7.898 2.696 6.989 2.568 7.597
fertilizantes
12 80%
10,6
70%
Consumo adicional de GN (MMm3/ dia)
10 75%
60%
% importação líquida
8
50%
6 40%
Consumo adicional de GN (MMm³/ dia)
30%
4 % importação líquida
20%
10%
2
10%
0 0%
2019 2020 2021 2022 2023 2024 2025 2026 2027 2028 2029 2030 2031 2032 2033 2034
Fonte: EPE, 2019 - “Competitividade do Gás Natural: Estudo de Caso na Indústria de Fertilizantes Nitrogenados”.
34 PANORAMA E PERSPECTIVAS PARA O GÁS NATURAL NO BRASIL
de 200 mil viagens por dia35. O consumo O percurso Florianópolis - Curitiba - São
de gás estimado nesse exercício seria por Paulo - Rio de Janeiro, que representa
volta de 4 MMm3 de gás natural por dia, parte expressiva do tráfego de carga,
admitindo-se a substituição de 10% da está localizado próximo aos gasodutos
frota de diesel para gás natural. O estudo existentes e corresponde a viagens de
sugere que o gás natural, precificado a extensão compatível com o raio de ação
US$7,52/MMBTU seria entre 40% e 60% de um caminhão a gás. O percurso
mais econômico (em US$/MMBTU) do que da rodovia Fernão Dias (São Paulo-
o óleo diesel, mesmo considerando várias Belo Horizonte) não fica ao longo de
restrições ao seu uso e os custos de capital um gasoduto, mas há entrega de gás
e operacional envolvidos36. O artigo nas suas duas pontas, cuja distância
não avalia se esta significativa redução poderia ser coberta por caminhões a gás
do custo seria suficiente para induzir a (tanto comprimido quanto liquefeito).
adesão dos motoristas ao uso do GNL, seja Os gasodutos existentes podem ser a
pelo investimento em novos caminhões já fonte para postos de reabastecimento
preparados para utilizar o gás natural, seja de gás comprimido ou GNL, podendo
pela instalação de “kits” para adaptação o abastecimento ser completado
dos caminhões a diesel para este uso. por caminhões de transporte de gás
Estima-se que, nestas condições, o sem a necessidade da construção de
payback da adesão ao GNL seria menor numerosos “city gates”.
que três anos37.
Para regiões distantes de gasodutos,
É razoável pensar no uso do gás postos de abastecimento podem ser
natural por caminhões pesados e semi- alimentados com GNL trazido em
pesados para além do eixo do Gasbol. caminhões com contêineres.
35Dominique Mouette, Pedro Gerber Machado, Denis Fraga, Drielli Peyerl, Raquel Rocha Borges, Thiago Luis Felipe Brito, Lena Ayano Shimomaebara, Edmilson Moutinho dos Santos, Costs
and emissions assessment of a Blue Corridor in a Brazilian reality: The use of liquefied natural gas in the transport sector, Science of The Total Environment, Volume 668, 2019, Pages 1104-1116
https://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S0048969719307533.
36Para calcular estes custos, os autores avaliaram a infraestrutura para oferecer GNL ao transporte de cargas no estado de São Paulo, envolvendo: a liquefação e armazenamento do gás natural;
distribuição e armazenamento em tanques criogênicos e abastecimento (obras civis e outros). Além do CAPEX, foram estimados valores de OPEX (ex. mão de obra, consumo de energia elétrica,
refrigerantes, como etano e propano, e insumos nas plantas de liquefação, custos administrativos etc.). Para a liquefação foram consideradas duas opções: uma centralizada, de maior porte, em
que o GNL é distribuído para as regiões do estado de São Paulo por caminhões. Uma segunda (descentralizada) utiliza algumas plantas de liquefação de menor porte, que são espalhadas pelo
estado.
37Caminhão rodando 120 mil km/ano, fazendo 2,5km/l de diesel a R$3,50/litro e tendo 50% de economia pelo uso do GNL resultaria em R$84 mil de economia. Se os demais custos se
mantiverem, e se o sobrecusto do caminhão GNL com respeito ao caminhão diesel for de R$200 mil, o payback simples do investimento é de 200/84 = 2,4 anos.
PANORAMA E PERSPECTIVAS PARA O GÁS NATURAL NO BRASIL 37
Capital
Divisão Estadual
Divisão Internacional
Alocação VMDA - 2015*
5.000
10.000
15.000
Tanque de combustível
(gás natural comprimido)
Bateria
Bateria
Módulo de Controle
Eletrônico (ECM) Módulo de Controle
Eletrônico (ECM)
Motor de Combustão Interna Motor de Combustão Interna
(ignição por faísca) (ignição por faísca)
Tanque de combustível
Tanque de combustível
Sistema de exaustão
Filtro de combustível
Transmissão Transmissão
Filtro de combustível
Fonte: AFDC
40Entre os modelos de caminhão já existentes encontra-se o FM MethaneDiesel da Volvo, que opera com uma mistura de GNL e diesel, e o modelo R 410 da Scania, de ciclo Otto, que opera
apenas com GNC. O sistema DG Flex da empresa Bosch, por seu turno, é um exemplo de kit de adaptação para caminhões usados.
PANORAMA E PERSPECTIVAS PARA O GÁS NATURAL NO BRASIL 39
no curto prazo, ser mais de 70 vezes baixa qualidade e, por enquanto, sem
maior do que o do gás carbônico. Nesse grandes pontos de apoio a caminhões
sentido, o GNL pode ter um impacto com tanques criogênicos.
climático mais pronunciado do que o
GNC, visto que não é incomum que seja Assim, considerando custo de
necessário deixar escapar gás natural infraestrutura, rapidez e facilidade de
quando o tanque aquece, de forma a adaptação dos motores, a facilidade
não permitir que a pressão do gás no de manipulação e risco de emissões
interior do tanque ultrapasse a pressão fugitivas, é provável que o GNC se
máxima de segurança desses recipientes. mostre mais seguro e vantajoso do
Já que a vaporização aumenta quando que o GNL, a despeito do menor raio
a temperatura ambiente é mais alta, de ação e do maior peso morto do
a chance de ocorrerem emissões tanque de combustível do GNC. A
involuntárias de metano pode ser resposta ̶ ausente uma orientação
relevante em um país como o Brasil, que de política pública ̶ virá da decisão
tem temperatura média alta e estradas de de cada transportadora.
41Para atender aos sistemas isolados, o gás, seja liquefeito ou comprimido, poderia ser transportado por barcaças, no caso de cidades ribeirinhas e costeiras, ou mesmo por caminhões. A ENEVA,
por exemplo, planeja se valer de caminhões transportadores de GNL para abastecer Roraima a partir do campo do Azulão, situado a mais de 1000 km de distância do ponto de consumo.
42Velocidade média do vento alta, com baixa variância; boa radiação solar (sobretudo no Semiárido).
43Muitas referências internacionais, como o NREL do Departamento de Energia dos EUA (DoE) estimam uma redução de custos adicional da ordem de 30% no caso das usinas solares
fotovoltaicas e 20% no caso das eólicas.
40 PANORAMA E PERSPECTIVAS PARA O GÁS NATURAL NO BRASIL
13.500 450,00
12.000 400,00
10.500 350,00
9.000 300,00
7.500 250,00
6.000 200,00
4.500 150,00
3.000 100,00
1.500 50,00
0 0,00
PROINFA (2004)
Dez 2009
Jul 2010
Ago 2010
Ago 2011
Dez 2011
Dez 2012
Ago 2013
Nov 2013
Dez 2013
Jun 2014
Out 2014
Nov 2014
Abr 2015
Ago 2015
Nov 2015
Abr 2016
Set 2016
Dez 2017
Abr 2018
Ago 2018
Jun 2019
Out 2019
Fonte: EPE - Leilões de Energia Elétrica de 2019.
44Conceitualmente, as soluções para implantação de termelétricas que farão uso do gás natural extraído dos campos offshore na costa brasileira incluem: (a) Transporte do gás por gasoduto
subaquático até a costa e geração de energia em terra; (b) Geração de energia na plataforma offshore e transmissão da eletricidade até a costa (gas-to-wire, ou GTW): consiste em extrair o gás
e gerar energia em usina localizada em plataforma oceânica, transmitindo a energia gerada para a costa através de cabos submarinos em corrente contínua; (c) Transporte do gás em fase
líquida até a costa e geração de energia em terra. Nessa opção, o tratamento do gás (separação de frações líquidas e impurezas) pode-se dar no mar, antes da liquefação, ou já em terra, antes
da regaseificação.
45A construção de plantas de liquefação de gás no mar ou no litoral daria maior flexibilidade à comercialização do produto. Permitiria o fornecimento a térmicas inflexíveis e flexíveis, com o
potencial de substituir o GNL importado, a consumidores livres e às distribuidoras, além de abrir caminho para entrega em outras regiões do país, via cabotagem (GNL de pequena escala), e
para a exportação.
46Esse valor precisaria ser ainda menor se fossem atribuídos custos associados às emissões de carbono.
47Custos para o suprimento do mesmo MWh “firme” por ambas tecnologias.
48A implantação geográfica de usinas de forma a minimizar os custos de distribuição e transporte, assim como das perdas e riscos na transmissão de energia a largas distâncias é um
componente importante para a eficiência global do SIN. Esquemas tarifários que enviem sinais econômicos aos investidores sobre localizações ótimas tem, portanto, papel relevante para a
economicidade do sistema.
42 PANORAMA E PERSPECTIVAS PARA O GÁS NATURAL NO BRASIL
Box 3
1 Uma estimativa muito simplificada sugeriria que o custo variável a R$100/MWh com 50% de eficiência do ciclo combinado e
3,44MMBTU/MWh resulte em R$50/3,44MMBTU, ou R$14,5/MMBTU. Dependendo do câmbio, isto significaria um gás entregue
à usina entre US$3-4/MMBtu, o que pode ser alcançável para um produtor de gás que precifique o gás levando em conta o seu
caráter associado (ou seja, custo unitário próximo de zero ao se levar em conta o investimento feito para a produção de petróleo),
tenha acesso franco a uma rota de escoamento e facilidade de conexão da usina a essas instalações sem custo excessivo da etapa
de distribuição.
PANORAMA E PERSPECTIVAS PARA O GÁS NATURAL NO BRASIL 43
2O modelo OPTGEN possui representação horária, rampas operativas das usinas, tempos mínimos de operação e parada das
unidades, custos de partida, restrições hidráulicas das hidrelétricas nas principais bacias hidrográficas, reservas operativas ‒ para
compensar variabilidade das renováveis ‒ e, finalmente, uma modelagem probabilística (através de cenários) da produção das
fontes renováveis em nível horário. Portanto, a comparação feita pelo estudo da PSR considera as contribuições ‒ e custos ‒ de cada
fonte para todos estes atributos.
3Portfólio que minimiza o valor presente da soma dos custos de investimento e custos operativos para suprir energia, potência e
reservas operativas, de modo a atender o crescimento esperado do mercado de energia de forma segura.
4
Nazaré, F.; Bezerra, B. and Barroso, L.A., Assessing the value of baseload generation from associated gas fields in hydro dominated
systems with growing penetration of renewables, 2020, Rio Oil e Gas Expo and Conference 2020, Rio de Janeiro, Brazil.
44 PANORAMA E PERSPECTIVAS PARA O GÁS NATURAL NO BRASIL
49O problema do CO2 na operação das plataformas e sistemas associados ao óleo e ao gás não seria minimizado. Caso a reinjeção do CO2 aconteça no reservatório de produção, o nível de
contaminação do reservatório tende a aumentar com o tempo. Mesmo no caso onde o gás é simplesmente reinjetado sem a separação do CO2, o elevado nível de contaminação requer que os
materiais utilizados na completação e no desenvolvimento dos poços produtores sejam resistentes a grande concentração de CO2. (IBP, UFRJ, 2017).
50Stefano Ferrari Interlenghi, Raquel de Pádua F. Silva, José Luiz de Medeiros, Ofélia de Q. Fernandes Araújo, Low-emission offshore Gas-To-Wire from natural gas with carbon dioxide:
Supersonic separator conditioning and post-combustion decarbonation, Energy Conversion and Management, Volume 195, 2019 https://www.sciencedirect.com/science/article/pii/
S019689041930651X
PANORAMA E PERSPECTIVAS PARA O GÁS NATURAL NO BRASIL 45
Pão de
Legenda Cessão Onerosa: Açucar
Búzios, Itaipú, Atapú,
Sépia (contorno de Iara)
Cabo Frio
Tamanbuatá
Búzios
Libra
Sargitário Parati ara
Lapa Lula
Carcará Jupiter
Sapinho
Peróba
3. CONSIDERAÇÕES FINAIS
A discussão sobre os usos do gás natural e propriedade da rede de gasodutos de
no Brasil ganhou impulso nos últimos transporte existente e o acesso de novos
quatro anos, especialmente com as carregadores de gás a essa rede.
tentativas de liberalização do setor e pela
exigência de se dar destino econômico Uma parte importante do esforço
ao gás natural associado ao petróleo dos regulatório está associada à
campos brasileiros. Facilitar a exploração implementação do melhor uso de
(e exportação) do petróleo do Pré-Sal instalações existentes. Destaca-se o
tem ganhado urgência em vista da potencial de aumento da capacidade
aceleração da transição da economia efetiva dos gasodutos de transporte
mundial para estruturas de baixo ou zero considerando a metodologia de pontos
carbono. Há em discussão no Congresso de entrada e saída do produto, assim
Nacional um projeto de Nova Lei do Gás como a facilitação do acesso ao GNL,
com inovações importantes visando o cujos preços de futuros de referência
aumento da concorrência no setor, e que sugerem redução do custo desse produto
complementam iniciativas de liberalização no mercado internacional. Ela deve se
que se manifestaram a partir de 2018 completar com a discussão do uso dos
através de decisões de diversos órgãos gasodutos de escoamento, formas de
públicos especialmente na direção de acesso de grandes consumidores (“livres”)
promover a diversificação do controle ao gás sem desequilibrar as empresas
52Um exemplo desse alternativas seriam as plataformas cilíndricas com lastro mais pesado do que a água, conhecidas como SPAR, dentre as quais podem ser incluidas aquelas usando
tecnologia desenvolvida pelo escritório Horton. O estudo em Medeiros et al. (2019) prevê, no entanto o uso de turbinas aeronauticas acomodadas na própria FPSO.
53Um aspecto interessante a ser avaliado para o GTW é avaliar se o cabo submarino seria de uso exclusivo de um projeto ou se futuros projetos poderiam utilizar uma solução compartilhada.
Neste último caso, há potencial upside de compartilhamento de custos ou alocação dos custos entre usuários da Rede Básica. Um precedente foram as instalações de transmissão
compartilhada de geradores (ICG) - mecanismo utilizado no desenvolvimento de parques eólicos geograficamente próximos. No caso de uso exclusivo, todo CAPEX da linha seria
responsabilidade do investidor e a tarifa de transmissão (TUST) seria calculada na subestação onshore. No caso de compartilhamento, a TUST poderia ser calculada em uma subestação offshore.
PANORAMA E PERSPECTIVAS PARA O GÁS NATURAL NO BRASIL 47
adicionais (2% das emissões de origem Isso corresponde a 16,5% do consumo final
fóssil no Brasil)54. de energia no Brasil, ou 116 MMm3/dia (o
dobro do consumo final de gás atual em
A geração termelétrica a gás offshore 2018). Em outras palavras, se o preço for
com a captura e sequestro de CO2 (GTW- reduzido a US$ 4-7/MMBTU (no cliente),
CCS) pela sua reinjeção nos reservatórios há oportunidades para o gás na indústria,
de petróleo ajudaria a resolver alguns transporte de cargas e geração elétrica,
desafios ambientais e regulatórios da inclusive com captura de carbono.
geração termelétrica. A geração GTW-
CCS economiza no custo de separação Por fim, as análises aqui realizadas
do CO2 do gás natural necessária para não incorporaram de forma explicita a
o escoamento por gasoduto de campos discussão sobre benefícios sociais – como
em que essa concentração é expressiva, aumento de empregos e renda – das
e auxilia a produção do petróleo onde alternativas analisadas.
o CO2 é injetado. Sendo de baixo
carbono, a geração com captura de CO2 Em suma, a nota traz indicações de que,
estará praticamente imune a eventuais com o auxílio de um quadro regulatório
impostos sobre emissões de GEE e que promova a concorrência e a
teria legitimidade para “gerar na base” transparência, a expectativa de duplicação
concorrendo com as fontes renováveis. do consumo total de gás natural pode
Além disso, haveria vantagens econômicas ser alcançada com eficiência econômica,
por a energia gerada offshore estar ambiental e retorno social permitindo:
sob regulação federal, aumentando
→ Destravar a produção e exportação de
a segurança jurídica do produtor e
contornando as incertezas da regulação petróleo em campos com gás natural
da distribuição do gás natural. Alguns associado sem a perda econômica
estudos já sugerem sua viabilidade desse gás, mediante o uso desse
econômica e a existência da tecnologia recurso em atividades lucrativas e com
necessária para sua adoção, abrindo uma retorno social significativo.
oportunidade de o Brasil desenvolver uma
→ Estimular a competitividade de várias
liderança nesse setor.
indústrias no Brasil pelo acesso a uma
A partir do consumo de energia ou energia mais limpa e barata, caso o custo
insumos determinados pela produção final do gás possa ser reduzido para a
atual e projetada em setores industriais, faixa de US$4-7 por MMBTU, facilitando
no transporte rodoviário e na geração também a futura adoção de tecnologias
termelétrica, é possível apresentar um que levem o Brasil na direção de uma
valor potencial de expansão da demanda economia de emissões liquidas de
anual por gás natural no Brasil para os carbono zero com protagonismo da
próximos 10 a 20 anos (Tabela 9). indústria e transportes. Além disso, seria
54Uma usina de 500 MW queima perto de 1 Gm3 de gás natural por ano, emitindo 2 MtCO2/ano.
PANORAMA E PERSPECTIVAS PARA O GÁS NATURAL NO BRASIL 49
Potencial do GN
Descrição
(Mtep/ano)
Transporte Rodoviário 9,00 Substituição de 25% do diesel utilizado em caminhões semi-pesados e pesados
Eletricidade 14,00 Expansão de geração termoelétrica com o gás do Pré-sal e o GNL importado
55Os números apresentados nessa tabela apenas indicam a ordem de grandeza do potencial de aumento do consumo de gás natural nos segmentos analisados.
50 PANORAMA E PERSPECTIVAS PARA O GÁS NATURAL NO BRASIL
Referências:
Ana Luiza Andrade Novo. “Perspectivas para o consumo de
combustível no transporte de carga no Brasil: uma comparação
entre os efeitos estrutura e intensidade no uso final de energia
do setor”. Dissertação de Mestrado, Programa de Planejamento
Energético–COPPE/UFRJ, Rio de Janeiro, RJ, Brasil.
EPE, 2019 - “Seminário Novo Mercado de Gás Natural: Integração na Matriz Energética”. Disponível em: http://www.mme.gov.br/
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Nazaré, F.; Bezerra, B. and Barroso, L.A., Assessing the value of baseload generation from associated gas fields in hydro dominated
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2019, https://fgvenergia.fgv.br/sites/fgvenergia.fgv.br/files/caderno_opiniao_-_agosto_-_web_versao_final.pdf
Santos, Bruno. “A indústria de cimento no Brasil: origens, consolidação e internacionalização”, Soc. nat. (Online) vol.23 no.1 Uberlândia,
2011. Disponível em: https://doi.org/10.1590/S1982-45132011000100007
Silva, N., O fenômeno do tight gas e tight oil americano e o mercado de gás brasileiro, Caderno de Opinião, FGV Energia, Agosto 2019,
https://fgvenergia.fgv.br/sites/fgvenergia.fgv.br/files/caderno_opiniao_-_agosto_-_web_versao_final.pdf
Steelonthenet, 2020 - “Basic Oxygen Furnace Route Steelmaking Costs 2020”. Disponível em: https://www.steelonthenet.com/cost-
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Stefano Ferrari Interlenghi, Raquel de Pádua F. Silva, José Luiz de Medeiros, Ofélia de Q. Fernandes Araújo, Low-emission
offshore Gas-To-Wire from natural gas with carbon dioxide: Supersonic separator conditioning and post-combustion decarbonation,
Energy Conversion and Management, Volume 195, 2019. Disponível em: https://www.sciencedirect.com/science/article/pii/
S019689041930651X
TENNET, 2017 - “The Offshore grid in the Netherlands”. Disponível em: https://www.tennet.eu/fileadmin/user_upload/Our_Grid/
Offshore_Netherlands/Brochure/Brochure_Connecting_wind_energy.pdf
U.S. Energy Information Administration (EIA), 2019 – Natural gas explained: Use of natural gas. Disponível em: https://www.eia.gov/
energyexplained/natural-gas/use-of-natural-gas.php
Valor econômico, 2019 - “Golar testa caminhão movido a GNL”. Disponível em: https://valor.globo.com/empresas/noticia/2019/12/06/
golar-testa-caminhao-movido-a-gnl.ghtml
Vanderley M. John, Bruno L. Damineli, Marco Quattrone, Rafael G. Pileggi. “Fillers in cementitious materials – Experience, recent
advances and future potentials”, Cement and Concrete Research, Volume 114, 2018, Pages 65-78. Disponível em: https://www.
sciencedirect.com/science/article/pii/S0008884616311425
World in Data, 2019 - “CO2 and Greenhouse Gas Emissions”. Disponível em: https://ourworldindata.org/co2-and-other-greenhouse-
gas-emissions
52 PANORAMA E PERSPECTIVAS PARA O GÁS NATURAL NO BRASIL
ANEXO I
O CONSUMO DO GÁS NATURAL
NOS EUA E NA UNIÃO
EUROPEIA
Transporte
3%
Comercial
12%
Geração Elétrica
35%
Residencial
17%
Industrial
33%
8,4% Siderurgia
25,00
s/ impostos impostos
20,00
US$/MMBtu
15,00
10,00
5,00
0,00
Finlândia
Suêcia
Brasil
Grêcia
Dinamarca
Lituânia
Estônia
França
Áustria
Latívia
Irlanda
Holanda
Alemanha
EslovIênia
Eslováquia
Hungria
Espanha
Itália
República Tcheca
Polônia
Portugal
Croácia
Luxemburgo
Romênia
Reino Unido
Bélgica
Bulgária
Fonte: Seminário Novo Mercado de Gás Natural – EPE, 2019.
ANEXO II
FUNCIONAMENTO
DOS MOTORES DUAL-FUEL
passar por um túnel, pois o motor aquece A tecnologia tem certas desvantagens.
a níveis que podem dificultar o controle da A maioria dos motores dual-fuel só
combustão do gás natural. Nesse caso, o conseguem queimar no máximo 65% a
sistema da GE reduziria automaticamente 80% de gás natural. Contudo, a empresa
a quantidade de gás natural utilizada. Westport, baseada na universidade
British Columbia, desenvolveu motores
A tecnologia dual-fuel não é nova – ela foi que conseguem funcionar com até 95%
demonstrada na década de 1960. Contudo, de gás natural. Eles ainda precisam do
os recentes preços baixos de gás natural diesel para desencadear a combustão,
causaram um aumento da demanda e mas são otimizados para rodar com o gás.
fizeram com que produtores de motor Diferente dos outros motores dual-fuel,
ajustassem a tecnologia para atender aos este não funciona tão bem com o diesel
requerimentos de emissão e deslocar o puro e só pode ser utilizado com GNL.
máximo de diesel possível, mantendo a
Fonte: https://www.technologyreview.com/2013/10/08/176207/cleaner-
performance. long-haul-engines-guzzle-diesel-or-natural-gas/
1 Mtpa (milhão de toneladas por ano de GNL) = 3,60 milhões m3/dia de gás natural
* Considerações:
Poder calorífico do gás natural: 9.400 kcal/m3.
GNL: Massa específica 456 kg/m3.
Consumos em Ciclo Aberto e em Ciclo Combinado: valores típicos de referência (variam de térmica para térmica).
O valor de referência do Ciclo Combinado representa uma eficiência de 48,8%, enquanto que do Ciclo Aberto 31,4%.