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Organização da edição
Arthur Henrique Maresca
Iago Matheus Borges Braga
Revisão Técnico-científica
Arthur Simões Caetano Cabral
Pedro Henrique Gonçalves
Rodrigo Bombonati de Souza Moraes
Rone Rosa Martins
Maria Carolina Carvalho Motta
Maria Izabel Machado
C749 Congresso de Ensino, Pesquisa, Extensão e Cultura – CONEPEC (8 : 2019 : Goiás, GO)
[Anais do] VIII Congresso de Ensino, Pesquisa, Extensão e Cultura [E-book] /
Organização Pedro Henrique Gonçalves ... [et.al.] ;
Comitê científico Suzete Almeida de Bessa ... [et.al.]. – Goiás (GO): Gráfica UFG, 2019.
815 p. : il.
A
A Colaboração Social na Formação dos Arquitetos Urbanistas............ 12
Izadora Carvalho Laner
Edinardo Rodrigues Lucas
José Rodolfo Pachedo Thiesen
Vitor Sousa Freitas
Arthur Maresca
A Construção Prática do Direito Pela Alternância na Perspectiva da
Atuação Jurídica Popular................................................................... 30
Amanda Inara de Brito Santana
Ananda Natyelle da Silva Nunes
Gercina Alves Filgueiras
A Experiência Internacional de Discentes do Curso de Serviço Social da
Universidade Federal de Goiás, Regional Goiás................................... 53
Joel dos Santos Lima
Bianca Stefani Alexandre Irineu
Neimy Batista da Silva
Adilson da Silva Santos
A Invisibilidade do Trabalho da Mulher Camponesa: Reflexos Jurídicos
e Sociais............................................................................................ 78
Anna Paula Brito Dutra
Margareth Pereira Arbués
A Lei Maria da Penha e a Cidade de Goiás Como um Modelo de sua
Aplicação........................................................................................... 91
Gabriella Aguiar Valente
Gabriel Xavier Godoi
A Luta Das Mulheres Contra A Criminalização Do Aborto No
Brasil E Argentina..................................................................
106
Ana Karoline Dirino
Margareth Pereira Arbues
A POLÍTICA CRIMINAL DE DROGAS: Uma análise criminológica do inimigo
do Estado e da mídia.......................................................................... 126
Nathália Lemes Toledo Bernardino
Thiago Ferreira Cabaline
A Saúde da Mulher em Questão – A Efetivação dos Princípios de
Integralidade e Equidade do Pré-Natal ao Puerpério.......................... 145
Jordanna Pacheco Felisberto
Carla Agda Gonçalves
André Nunes dos Santos
Aplicação da Lei Maria da Penha, Atuação Jurídica Brasileira Diante da a
Violência Doméstica e Familiar........................................................... 163
Isabela Aparecida Azevedo Coqueiro
Luizmar Peixoto Dantas
Apontamentos dos Principios da Universidade Poupar: Um Olhar Sobre
a Ontologia do Ser Social................................................................... 182
Alcides Pontes Remijo
As Determinações do Trabalho na Sociedade Burguesa e suas
Implicações no Trabalho Profissional do Serviço Social....................... 201
CEOLIN, George Francisco
C
Contabilidade e Controle Interno: Uma Análise dos Gastos na
Administração Pública do Município..................................................223
Elismar Oliveira de Siqueira
Iram Leandro da Silva
Anderson de Queiroz
D
Democracia Participativa.................................................................248
Jaqueline Maria Lino
Nayara Bento da Silva Queiroz
Raquel Monteiro de Moura
Rodrigo Bombonati de Souza Moraes
Desafio do Marketing de Serviço com Empreendedoras em Salões de
Beleza............................................................................................... 267
Thalita Cristina de Paula Arantes
Hélcia Daniel da Silva
Desafios de Tutorear uma Monitoria para Matéria de Conforto
Ambiental......................................................................................... 282
Victória Malta Canello
Pedro Henrique Gonçalves
Desafios e Possibilidades no Processo de Formação Acadêmica de Duas
Mulheres Campesinas do Município da Cidade de Goiás-Go.............. 298
Márcia Nunes dos Reis Xavier
Rosária dos Reis Francisco dos Santos
Desvelando Paisagens nas Entrelinhas da Cidade: da Experiência
Sensível à Expressão Poética.............................................................. 312
Arthur Simões Caetano Cabral
Direito À Saúde: Alguns Apontamentos Sobre os Desafios Enfrentados no
Transplante de Células Tronco Hematopoiéticas................................336
Daniela Kedna Ferreira Lima
Carla Agda Gonçalves
Direitos Humanos, Sociedade Tecnológica e Empresas: O Problema da
Proteção de Dados........................................................................... 354
Andrea Abahão Costa
Maria Carolina Carvalho Motta
E
Educação Permanente em Serviço Social: Dimensão Formativa em
Tempos Temerários........................................................................... 371
Fernanda Felisberto Bueno
Neimy Batista da Silva
Maria Ciurinha Pereira dos Santos
Ana Júlia Moreira Silva
Rayane Santos Cardoso
Educação Sexual: desafios à escola................................................... 385
Rone Rosa Martins
Escola Municipal Cristal/Go: Práticas e Saberes no Ensino Primário.... 402
Ilmara Borges Bueno
Geovanna de Lourdes Alves Ramos
L
Lazer no Vão Livre do Masp de Lina Bo Bardi...................................... 416
Arthur Henrique Maresca
Emilliano Alves de Freitas Nogueira
M
Medicalização: Uma Reflexão Sobre a Constituição de Um Campo de
Poder................................................................................................ 444
Rodrigo Bombonati de Souza Moraes
Mobilidade e a Acessibilidade Urbana: Inclusão Social na Cidade de
Goiás-Go........................................................................................... 472
Marcos Ferreira de Magalhães
Rone Rosa Martins
N
Novas Formas e Limites da Gentrificação: Um Estudo de Caso Sobre o
Mercado Central de Belo Horizonte................................................... 500
Ághata de Moura Silva
Giullia Jansen Carreiro Nascimento
Rachel de Castro Almeida
O
O Corpo Como Obra De Arte: Performances de Marina Abramovic..... 523
Thaís Araújo Machado
O Processo de Ocupação e Uso do Solo nas Margens do Lago de Palmas:
O Caso da Praia da Graciosa............................................................... 539
José Marcelo Martins Medeiros
Heliara Aparecida Costa
O Que as Mulheres Temem? A Cultura da não Denúncia no Brasil...... 556
Arthur Damaceno De Oliveira
Amanda Caroline Da Silva
P
Participação Política no Sus: Desafios Para a Democratização das
Instâncias Colegiadas......................................................................... 575
André Nunes dos Santos
Carla Agda Gonçalves
Jordanna Pacheco Felisberto
Práticas de Gestão na Administração Pública Municipal da Cidade de
Goiás: Um Estudo de Caso................................................................. 591
Anderson Queiroz Lemos
Géssica Ribeiro Bueno
João Paulo Vieira
R
Reflexões Acerca Da Concepção Marxiana De Trabalho...................... 614
Ana Carolina Borges de Lacerda
Pedro Adalberto Gomes de Oliveira Neto
Relevância dos Mecanismos de Aplicabilidade da Lei Maria da Penha no
Âmbito Municipal da Cidade de Goiás................................................. 629
Beatriz Vieira Brito
Késsia Brenda Felinto Carmo
S
Saberes e Práticas Educativas no Assentamento Engenho Velho-
Goiás/Go............................................................................................ 642
Rhuth Ferreira de Souza Gomes
Geovanna de Lourdes Alves Ramos
Satisfação no Trabalho: Análise de Clima Organizacional na Universidade
Federal de Goiás – Regional Goiás..................................................... 657
Rodrigo Bombonati de Souza Moraes
Amanda Justo da Silva
Saúde do Trabalhador Um Debate Necessário.................................... 686
Alcides Pontes Remijo
Serviço Social Na Interface com As Práticas Terapêuticas/Serviço Social
Clinico............................................................................................... 707
Danúbia de Brito Rodrigues Silva
Carla Agda Gonçalves
Silenciamentos do Professor: Esp – Escola Sem Partido e Suas
Concepções....................................................................................... 726
Rone Rosa Martins
T
Teoria da Equilibração de Piaget e a Robótica Educacional na Educação
do Campo.......................................................................................... 746
Kelly Rita Ferreira dos Santos Silveira
Carlos Antônio Pereira Júnior
Higor Junior de Oliveira
Vitor de Almeida Silva
Trabalho, Saberes E A Terra: As Mulheres No Assentamento Serra
Dourada/Go....................................................................................... 759
Jéssica Lorrane Gonçalves Souza
Geovanna de Lourdes Alves Ramos
U
Um Método para Aplicação do Planejamento Urbano Climaticamente
Responsável e os Desafios a Serem Superados nas Cidades de Pequeno
Porte................................................................................................. 774
Carina Folena Cardoso
Camila Pinheiro Rocha
Neilor de Carvalho Paes
Pedro Henrique Gonçalves
V
Vale do Rio Doce e a Mercantilização da Natureza: Um Crime
Anunciado......................................................................................... 795
Erika Macedo Moreira
Rosangela Piovizani Cordeiro
A Colaboração Social na
Formação dos Arquitetos
Urbanistas
Resumo
13
The Social Collaboration In The Formation
Of Urbanist Architects
Abstract
14
the Projects Laboratory of the Architecture and Urbanism course
of the Federal University of Goiás - Regional Goiás, is presented,
based on the work of housing improvements, carried out with the
community of Goiás City The fact that it is a consolidated course
in a small city, with different characteristics of the metropolitan
urban context, turns it into a singular opportunity to develop an
academic formation that prioritizes the discussion of the social
function of the Architect and Urbanist together with the conquest
of the right to the city vulnerable population.
Keywords: Technical Assistance, University Extension, Hou-
sing Improvement.
Introdução
15
urbanas, suscitadas a partir das novas demandas em aspectos sociais,
econômicos e culturais (MARICATO, 2015).
O cenário caótico da falta de planejamento, principalmente
no que tange à habitação, tornou-se uma constante que se des-
dobrou na ausência ou baixa qualidade das condições de moradia,
entendendo que essa plena qualidade é um direito social básico
brasileiro, previsto no artigo 6° da Constituição Federal de 1988. É
em virtude desses fatores que esse momento foi marcado pelas lutas
em prol da moradia própria, o que automaticamente gerou conse-
quências no território das cidades brasileiras. Motivou-se, assim, a
rearticulação do Movimento de Reforma Urbana, para que, dentro
do processo de democratização, se procurasse formas de incluir
na constituinte pontos que conduzissem a um maior controle do
território pelos municípios. Essa articulação teve como principais
conquistas a inclusão de institutos jurídicos fundamentais previstos
nos artigos 182 e 183 da Constituição Federal de 1988, posterior-
mente a criação da Lei n. 10.257, do Estatuto das Cidades, em 2001
e as Políticas e Programas[1] sociais e territoriais decorrentes dos
primeiros anos da criação do Ministério das Cidades, em 2003.
É inegável que os programas de gestão urbana, de aplicação do
direito à cidade, moradia, dentre outros, surgiram nesse período e
modificaram significativamente as dinâmicas territoriais e a paisagem
de municípios brasileiros. A nova legislação e seus instrumentos
levaram para esses lugares questões que ainda passavam por
dificuldades de serem geridas, como o caso da habitação. Assim, a
implantação do Programa Minha Casa Minha Vida (PMCMV) se
tornou presente em diversas cidades e seus conjuntos se tornaram
16
fato; passaram a figurar nos espaços urbanos e as paisagens foram
modificadas em virtude da implantação de conjuntos habitacionais.
Porém, muitos desses foram inseridos descontextualizados da trama
urbana e colocados em áreas distantes dos núcleos centrais. A grande
vulnerabilidade social na qual vivem as famílias atendidas, seja no
campo ou na cidade, faz com que o modelo tenha boa aceitação.
A Constituição Federal de 1988 conferiu aos municípios a tarefa
de conduzir e implementar a Política de Desenvolvimento Urbano,
mediante diretrizes fixadas em lei federal. Sendo assim, O Estatuto
das cidades (lei nº 10.257/2001) estabeleceu a gestão democrática
por meio de associações representativas dos vários segmentos da
comunidade. Somos, então, participativos? Estudos de caso de pro-
jetos mostram níveis bem distintos de participação popular, gerando
projetos de habitação com resultados significativamente diferentes.
Partindo do panorama acima e com relação à atual efetividade
desses instrumentos de gestão democrática e a capacidade técnica
em atuar junto às comunidades nesse sentido, o artigo pretende
demonstrar a importância de se incorporar práticas participativas
no recorte de formação dos profissionais urbanistas, por meio da
extensão universitária. Seu enfoque está na assessoria técnica, que
parte de um entendimento de colaboração paralela onde as etapas
projetuais, ao serem desenvolvidas junto à população, potencia-
lizam a relação aditiva entre saber técnico e saber local. Como
estudo de caso, apresenta-se a abordagem de assessoria técnica
desenvolvida por alunos e professores do curso de Arquitetura
e Urbanismo da Universidade Federal de Goiás – Câmpus da
Regional Goiás – dentro do Laboratório de Projetos, a partir do
17
trabalho de melhorias habitacionais, efetuado junto à comunidade
da Cidade de Goiás. O fato de ser um curso consolidado em uma
cidade pequena, que foge aos padrões do contexto metropolitano
de urbanização, favorece a configuração de um locus privilegiado
na discussão sobre a função social do Arquiteto e Urbanista junto
à conquista do direito à cidade para a população vulnerável; fator
esse que influencia o ascendimento constante do debate não só em
sala de aula, mas nas diferentes práticas de extensão e pesquisa que,
aos poucos, vão se solidificando junto ao corpo docente e discente.
18
Por ser reflexo social e fragmentado, o espaço urbano,
especialmente o da cidade capitalista, é profundamente
desigual: a desigualdade constitui-se em característica pró-
pria do espaço urbano capitalista. (CORRÊA, 1989. P. 8)
19
esta classificação, de modo a unir os proprietários e promotores
imobiliários em iniciativa privada, destrinchar os grupos sociais
excluídos em sociedade civil organizada - movimentos sociais e
terceiro setor - e sociedade civil desorganizada - o cidadão comum
que representa interesses próprios - e acrescentar a Universidade
como, também, um agente social urbano, por fomentar a relação
entre a produção de conhecimento técnico e o saber local, através
de programas de extensão que se aproximam das comunidades.
Para Kevin Lynch, o fato do espaço da cidade ser constituído
tanto pela materialização quanto pela combinação das dinâmicas
que compõem a sociedade, faz com que cada indivíduo gere uma
imagem mental da cidade, mutável, formada pela percepção de
cenários identitários importantes, carregando significados simbó-
licos, afetivos e memórias. Tais significados podem ser estritamente
individuais ou coletivos. Relacionando-se a ideia de produção do
espaço urbano condicionado às relações sociais de Corrêa, essas
imagens da cidade apresentadas por Lynch corresponderiam, por-
tanto, às demandas dos agentes sociais urbanos aqui descritos.
Cada indivíduo cria e assume sua própria imagem, mas
parece existir um consenso substancial entre membros
do mesmo grupo. Essas imagens de grupo, consensuais
a um número significativo de observadores, é que inte-
ressam aos planejadores urbanos dedicados à criação de
um ambiente que venha a ser usado por muitas pessoas.
(LYNCH, 2014. P. 8)
20
formação dessas imagens que o urbanista tem de se preocupar: Para
que se faça cumprir plenamente a função social da propriedade
urbana, definida pelo Estatuto das Cidades, o técnico deve buscar
tornar essa imagem coletiva da cidade a mais inclusiva possível,
ou seja, traduzir a maior quantidade de perspectivas de diferentes
agentes sociais e alcançar a mais plena integração entre eles.
É neste contexto que se valoriza a importância da gestão de-
mocrática das cidades no que tange, sobretudo, aos instrumentos de
planejamento urbano local. A inclusão e justaposição de divergen-
tes visões e perspectivas sobre o papel que a cidade precisa cumprir
para satisfazer as necessidades das classes sociais - sobretudo as mais
excluídas do direito à cidade - só pode ser alcançada, efetivamente,
por meio da adoção de processos participativos que entendem o
saber técnico e o saber local em um mesmo patamar de conheci-
mento. Ainda que cheguem a resultados diferentes - o que faz com
que sejam complementares -, ambos possuem a mesma importân-
cia para a consolidação de um diálogo democrático sobre como
a cidade deve crescer e direcionar suas dinâmicas, priorizando a
função social da propriedade urbana como controle e termômetro
na consolidação do espaço urbano, acima das relações de produção.
21
como campo de conhecimento, a pensar na conciliação destas ex-
pectativas sociais a partir da colaboração plena, visando a construção
de cidades progressivamente inclusivas. Assim, o arquiteto urbanista
deixa de ocupar o centro do processo de criação projetual para se
tornar um facilitador. Para que se torne possível solidificar essa visão,
é importante estendê-la a própria formação de futuros profissionais,
partindo de práticas de extensão que aproximem os estudantes da
comunidade, estabelecendo um contato contínuo de colaboração. O
contato com a comunidade deve ensinar uma prática de projeto e
planejamento que reconheça o saber local em equidade de impor-
tância e cumpra a função de fornecer aos indivíduos as ferramentas
necessárias para suscitar a representação de suas próprias demandas.
Paola Jacques, ao tratar do papel do arquiteto e urbanista na
intervenção em assentamentos, atribui a função de “interlocutor”.
Atualmente, ainda que muitos autores reconheçam a importância
da inclusão das pessoas na construção das cidades na contempora-
neidade, a gestão urbana ainda insiste em uma postura impositiva,
tornando o esforço de fomentar o papel do técnico planejador
como mediador dessas necessidades sociais ainda incipiente. Para
a autora, contudo, esse profissional deveria adotar um papel mais
voltado à condução dos diferentes atores e no gerenciamento da
expressão de seus anseios autonomamente. (JAQCUES, 2003)
Em resumo, o arquiteto-urbanista deveria simplesmente con-
duzir os diferentes atores e gerenciar os fluxos de movimento já
existentes no contexto local. Desse modo, o papel do técnico se tor-
naria discreto, coletivo e anônimo. Para isso acontecer, é necessário
abandonar, dentro da profissão, a tradicional postura demiúrgica,
22
onde a participação social serve apenas como consulta póstuma.
Assim, é possível entender a necessidade de, ainda na formação
acadêmica, estimular os urbanistas a respeitarem as dinâmicas locais
consolidadas e, ao intervir, dar continuidade ao processo de leitura
urbana já iniciado pelos próprios moradores, apenas auxiliando-os
a materializar os anseios sociais de forma a obter a maior qualidade
de vida urbana e habitabilidade possível.
É dentro dessa perspectiva que se pode entender a concep-
ção da assessoria técnica cumprindo um importante papel dentro
da Universidade, através de programas de extensão. Isso porque
busca uma confluência entre a formação do arquiteto urbanista
e uma atuação profissional futura mais próxima ao saber local das
comunidades e da importância de se reconhecer o poder de voz da
comunidade - sobretudo nos recortes mais vulneráveis - em uma
posição equânime ao tecnicismo na gestão das cidades.
Para que essa horizontalidade no processo participativo seja
alcançada, um programa de assessoria técnica em Arquitetura e
Urbanismo deve ter como parâmetro primordial a elaboração de
estratégias de ação participativa, atingindo os níveis de formação
e educação. Para Gramsci, justamente essas estratégias de forma-
ção e educação eram a solução para que o trabalhador, nutrido
de códigos, se elevasse culturalmente e passasse a ser agente de
sua transformação, deixando de lado o conformismo e a simples
adesão a programas “vindos de cima”. Nesse sentido, o profissional
que desempenha a assessoria técnica cumpriria sua função social na
construção das cidades, tornando-se um facilitador da autonomia
do indivíduo no processo de fomento ao engajamento comunitário
23
e um interlocutor que fornece os instrumentos técnicos necessá-
rios a representação dessas diretrizes e demandas sociais levantadas
em desenho urbano e planejamento.
24
reconhecer e expressar suas demandas familiares de moradia, bem
como ler essas representações projetuais do espaço edificado.
O Bairro Tempo Novo foi construído mormente a partir de
políticas habitacionais diversas, executadas em três etapas, e atual-
mente conta com 303 (trezentos e três) lotes ocupados. A criação
do bairro, a partir de 2001, pode ser questionada, visto que o censo
demográfico de 2000 apontava que dos 11.115 domicílios exis-
tentes, 1.389 são considerados vagos (IBGE, 2000). Esse número
seria suficiente para resolver o déficit de 696 habitações apontadas
pelo Instituto Mauro Borges (2017) para o município. A ausência
de política urbana necessária para o aproveitamento desse esto-
que imobiliário é resultado da falta de planejamento relacionada à
insuficiência técnica do município, bem como a incapacidade de
enfrentar o desafio político de destinar parte desses imóveis para
habitação de interesse social. O plano Diretor da cidade data de
1992 e não utiliza os instrumentos inovadores garantidos após a
aprovação do Estatuto das Cidades em 2001.
A instalação do bairro no referido local serve ao interesse de
expandir a malha urbana e valorizar áreas adjacentes através da
instalação de infraestruturas, ainda que precárias. Registra-se, no
bairro Tempo Novo, a inexistência de equipamentos sociais públi-
cos como Unidade Básica de Saúde (UBS), atendimento de Agente
de Saúde, educação infantil (antiga Creche), centro de convivência,
escola, praças, áreas de lazer, de trabalho e renda, de arte, de cultura
dentre outros. O bairro Tempo Novo é constituído (com constante
flutuação nos dados por conta do surgimento e demolição de ocu-
pações pelo bairro) por aproximadamente 200 famílias em situação
25
mais ou menos regular e mais, aproximadamente, 100 famílias em
situação ainda não regularizada (ocupações).
Toda essa realidade social mobilizou a Universidade Federal
de Goiás (UFG) - Regional Goiás, por meio do Curso de Serviço
Social em 2012, a encampar um Projeto de Extensão, nominado
em 2017 de “Residencial Tempo Novo: arte cultura e sociabilida-
de”. O trabalho pautou-se em reivindicações discutidas em ple-
nárias, abrangendo, sobretudo a demanda de abrigos nas paradas
do ônibus/coletivo; manutenção da iluminação pública; áreas livres
(atividades físicas, lazer, convivência e outras); transporte público
escolar; regularização das escrituras habitacionais; distribuição de
lixeiras (material reciclável); acompanhamento de Agente de Saúde
(ações preventivas e educativas); urbanização, arborização e reflo-
restamento; água potável em tempo de estiagem; captação de água
das chuvas; trabalho e renda (oficinas produtivas, cooperativa de
material reciclável, artesanais, hortas medicinais e alimentícias).
O projeto de extensão iniciado pelo Curso de Serviço So-
cial realizou atividades que marcaram o processo de formação
acadêmico-profissional, bem como a possibilidade de empreender
ação-reflexão-ação (práxis) evidenciadas em eventos como o “Dia
na Praça”, “Chá das Cinco”, Ato fundacional da Praça Comuni-
tária, entre outros. Em julho de 2017 inaugurou-se uma constru-
ção ampliada das ações de extensão com a participação efetiva de
um professor de Arquitetura e Urbanismo, experiência que sela
uma diversidade evidenciada no trabalho coletivo. No período de
agosto a dezembro de 2018, as atividades extensionistas ocorreram
sob a liderança do Laboratório de Projetos (LabProj) do Curso
26
de Arquitetura e Urbanismo/UFG/Regional Goiás, que objetivou
desenvolver a melhoria habitacional no Tempo Novo. A realização
deste Projeto viabilizou a construção de conhecimentos, de sabe-
res, do acesso à arte e à cultura por meio de iniciativas inovadoras,
criativas de organização social, de mobilização, de participação
democrática, e de desenvolvimentos local e regional.
A concepção de extensão que tem sido desenvolvida no LabProj
é a de que os saberes existentes dentro e fora da universidade po-
dem ser trocados construindo processos de unidade (dialeticamente,
unidade na diversidade) entre o saber acadêmico e o saber popular,
aproximando-se assim das ideias de Paulo Freire que concebe a ex-
tensão como uma forma de comunicação. Por isso, essas ações de
extensão, aqui descritas, têm sido orientadas a partir da busca de
efetivação da assessoria técnica. É importante ressaltar a diferenciação
em utilizar-se a expressão “assessoria técnica” no lugar da comumen-
te “assistência técnica”. A última, garantida pela lei 11.888 de 2008,
assegura o direito das famílias de baixa renda à assistência técnica
pública e gratuita para o projeto e a construção de habitação de
interesse social. No entanto, a troca de termos intenciona trazer à
discussão a necessidade de uma mudança no pensamento da arquite-
tura e urbanismo enquanto um mero serviço a ser prestado.
Baltazar e Kapp (2016) colocam que o termo “assistência téc-
nica” se funda em um ideário assistencialista, enquanto a “assessoria
técnica” apontaria para uma relação sem dominação (ainda que
assimétrica) entre técnicos e população assessorada. Demartini
(2016), por sua vez, evidencia o termo “assessoria técnica” como
uma prática mais ampla, onde substitui a ideia de trabalhar para o
27
outro pela ideia de trabalhar com o outro, direcionando seu pen-
samento para uma perspectiva de cocriação ou colaboração em
patamares de equanimidade social.
Quando se fala em “unidade na diversidade”, dentro da cons-
trução da assessoria técnica, importa destacar que não se trata de
simplesmente misturar saberes, rompendo sem mediações as hie-
rarquias impostas pela presença da institucionalidade diante de uma
comunidade historicamente desassistida. Trata-se, na verdade, de
construir caminhos para a superação das barreiras que separam a
universidade e as classes trabalhadoras, entendendo que este é um
processo que pode ser substancialmente lento e contraditório. Uma
das primeiras e mais importantes condições o início de tal processo
é a auto-organização das comunidades envolvidas. A assessoria téc-
nica pode requerer, como ponto de partida, uma auto-organização
e engajamento prévio desses grupos sócio-espaciais; pode, também,
fomentá-los através de processos que fortaleçam os vínculos no
interior desses grupos. Ao ascender a percepção de organização,
eles podem reivindicar e conquistar transformações de maneira
autônoma. Os processos participativos de projeto são um exemplo
de como isso pode ocorrer.
Assim, o LabProj se coloca como um ator social, onde propõe
não uma atuação como protagonista, mas como facilitador para o
desencadeamento de um processo de diálogos e trocas, em que o
principal objetivo é a construção de autonomia entre os diversos
atores envolvidos. Através destas ações, pretende, ainda, propiciar
que os alunos coloquem à disposição da comunidade métodos
e conceitos apreendidos nas disciplinas e pesquisas regulares do
28
curso; dessa forma, possibilitar uma interação e troca de saberes
que viabilize a relação integradora e transformadora entre a uni-
versidade e a sociedade.
Referências Bibliográficas
BALTAZAR, Ana; KAPP, Silke. Assessoria Técnica com interfaces. In:
ENANPARQ – Encontro da Associação Nacional de Pesquisa e Pós-Gradua-
ção em Arquitetura e Urbanismo, IV, 2016, Porto Alegre. Anais do IV Enanparq.
Porto Alegre, Anpur, julho de 2016. Disponível em: https://enanparq2016.files.
wordpress.com/2016/09/s22-01-baltazar-a-kapp-s.pdf
CORRÊA, Roberto. O Espaço Urbano. 1ª Edição. São Paulo: Editora Ática, 1989.
JACQUES, Paola. Estética da ginga: a arquitetura das favelas através da obra de Hélio
Oiticica. Rio de Janeiro: Casa da Palavra, 2003.
MARICATO, Ermínia. Para entender a crise urbana. São Paulo: Expressão Popular,
2015.
29
SOBRE O E-BOOK