Existente um contraste entre a mentira das máscaras sociais no cumprimento do dever, no amor e no dia a dia e a
verdade lúcida do Doido.
A máscara surge-nos assim na dicotomia entre a essência e a aparência. A aparência do que o “eu” quer mostrar ao
outro, escondendo a sua essência. A presença da dicotomia existente entre o ser e o parecer permitem-nos abordar
a problemática existencial na obra. A peça tem características que a aproximam do teatro simbólico ,
nomeadamente as personagens porque são símbolos da inconsciência alienada e vulgar de viver de tal modo que
mesmo perante a morte têm relutância em encarar a verdade. O contraste existente entre a mentira das máscaras
sociais no cumprimento do dever, no amor e no dia a dia e lucidez do Sr Milhões que era afinal um louco. A
consciência do doido sobre a condição humana contrasta com a ausência de consciência cívica e humana do
governador civil que apesar do sucesso alcançado ao longo da sua vida, se chega à conclusão que teve uma vida
inútil, pela ausência de sentimentos verdadeiros e de sentido.
Podemos introduzir mais um tópico filosófico viver vs existir, na verdade é, precisamente, no momento em que o Sr
Milhões ameaça explodir a bomba que nos começamos a aperceber que a personagem governador civil não vive,
apenas existe, porque nunca se questionou, nem nunca questionou todos aqueles que o rodeavam e que
aparentemente o respeitavam, admiravam e até amavam, limitou-se a exercer o poder que o cargo lhe atribuía
como se este fosse um atributo inerente à sua condição humana.
“Os livros, as peças, a arte, enfim, só valem pelo que sugerem. O que está lá em regra não presta para nada; o que
cada um de nós constrói sobre a linha, a cor e o som é que é verdadeiramente superior.” Ele parece dizer que o
invisível, sugerido nas relações de forças da peça, traz à tona não um processo reflexivo, mas criativo. Essa é uma
outra resposta possível para o niilismo que se coloca na peça: diante do vazio existencial, é possível preenchê-lo, é
possível criar, é possível construir a diferença a partir do desfigurado, sem fugir da infinitude do tempo, mas indo em
busca do tempo perdido.
Prende-se com a existência humana, com o mundo a servir de lugar de exílio, de refúgio ao indivíduo. É na morte
que o indivíduo se confronta com a sua própria condição humana. O Homem apenas tem a vida, orientada para a
morte.