Você está na página 1de 5

Lições éticas de Machel

Samora Moisés Machel, em quase todos os seus discursos a nação, sempre deixou claro
sua eticidade, criticando diversas áreas da vida social da nação, país, e comunidade.
Suas críticas são direccionadas às diversas áreas para aspectos do comportamento
humano. Com razão, quando fala da política, em defesa do socialismo, Machel deixa
claro suas pretensões de universalidade. Diferente de Habermas que, vê na linguagem
um instrumento de um discurso dialógico fundamentado por um princípio de
universalidade, que una todos em um mesmo comportamento ético, Machel, olha para o
socialismo como esse instrumento, de busca da felicidade e bem-estar da república.
Contudo, para atingir esse objectivo, Machel segue uma metodologia de discursos de
reflexões éticas, “Não podemos construir o bem-estar, a felicidade, com bandidos e
malandros.” (Yassin Amuji, 2020), com o objectivo de despertar no povo uma
consciência moral universal.

Não podemos reduzir a ética de Machel, a uma ética discursiva, mas, trata-se de
discurso prático, enquanto instrumento de uma ética nacional. O objectivo era combater
o inimigo, que agora já não era o colono, mas as ideias do colono sob o povo
moçambicano. Conforme pode se notar, quando Machel diz:

As características dos trabalhadores da fábrica de cerveja é barba suja despenteada, o cabelo


cheio de caspa. E produzem a cerveja que nós consumimos, são unhas cumpridas cheias de
sujidade. Ouçam bem isto, agitaram a fábrica para abaixar a produção, quem sofre? Levam o
povo a lutar contra o seu governo, foram os da PIDE, eles não lavavam com água os pés dos

colonialistas, lavavam com a língua. São os inimigos do povo. Yassin Amuji (2020)

Samora Moisés Machel, como líder da nação, seu objectivo constituía despertar uma
ética virada a uma consciência nacional: agir bem pelo povo, para o povo e pelo bem-
estar do povo. Não criticava a higiene pessoal do individuo, mas as consequências da
higiene pessoal do individuo para o povo. Ao contrário de Kant, que defende uma ética
apriorística, em que a moralidade da acção, não está contida nas consequências dessa
acção, mas na própria acção, Machel, sustenta o contrário, está mais virado as
consequências, portanto defende uma ética teleológica, tal como a ética aristotélica, cuja
a finalidade é o bem-comum.
Enquanto o catalisador Kantiano para as acções éticas é a autonomia da vontade, em
Machel, as acções humanas devem subordinar-se a vontade da nação. Machel, parece
parcialmente encarnar as ideias maquiavélicas, ao agir mesmo de forma considerada
imoral, para alcançar a liberdade e o bem-estar do povo. Usa termos como porco, boçal,
indisciplinado, etc, para se referir aos transgressores dos seus ideias, de uma república
social, em que tudo é de todos:

A nossa luta é contra os sabotadores, A nossa luta é contra os preguiçoso, A nossa luta é contra
os ladrões, A nossa luta é contra os drogados, A nossa luta é contra os marginais, A nossa luta é
contra os especuladores, A nossa luta é contra aqueles que querem oprimir e explorar o povo,
roubam os produtos escondem e depois especulam. (Yassin Amuji, 2020)

Conforme podemos entender, em Machel, o julgamento moral das nossas acções,


depende da finalidade dessas acções, são correctas, as acções que buscam o bem-estar
da nação, e não o interesse individual. Quem contribui para o prejuízo e, contra o
progresso da nação, não é só o inimigo da nação, mas um individuo que age fora dos
padrões éticos. Gilles Lipovetsle, diria que esta é a melhor concepção ética, pois não
exalta e muito menos consagra os deveres e direito individuas. O que se busca é a
universalização.

Uma ética nacionalista, embasada em interesses colectivos, é o que aprendemos em


Machel, agir de tal maneira que a máxima das nossas acções concorra para o bem-estar
nacional. Mas o que será que determina a moralidade das nossas acções? Será que
podemos fazer tudo sem respeito a lei (natural) pelo bem-estar da nação?

Para responder essas questões, temos que voltar ao contexto de Machel. Os


acontecimentos dessa época foram marcados por severa luta pela independência
nacional, após a independência, a tarefa do governo liderado por Machel, era conduzir o
povo a unidade nacional, e a autonomia financeira, económica e política. Por esta razão,
Machel, criou a ofensiva, uma série de esforços para melhorar a governação, visitou as
fábricas, as empresas, as lojas, e todos os departamentos do país, para ver o que estava a
falhar. Ao longo das visitas, Machel percebeu que o que falhava, era o individualismo,
marcado pela corrupção, e outras discrepâncias que se podem observar:
Nos portos encontramos: ausência de direcção, desorganização, encontramos incompetência
estalada, encontramos indisciplina, encontramos burocratismo, encontramos desleixo, espírito de
rotina, preguiça, mentes trabalham errados, roubo, sabotagem e destruição de mercadorias e de
equipamentos, encontramos, toneladas de produtos, que foram deixados apodrecer, que foram
deixados de qualquer maneira ao sol, a humidade, e a chuva e se estragaram, encontramos, o
burocratismo organizado, o burocratismo transformado em sistema para paralisar a nossa
economia, encontramos o roubo organizado, roubo que desde a época colonial, era uma coisa
normal. Esta era a situação dos nossos portos. Yassin Amuji (2020)

No entanto, em geral, o objectivo era combater o retrocesso e promover o progresso do


país. Daí que se justifica que Machel, puna severamente todo comportamento desviante
ante esses ideais, de progresso socialista. O que pretendia era chamar o povo a reflexão
e a pautar por uma postura ética que respeite os valores individuais e morais de cada
grupo, ao mesmo tempo que apelar por uma postura nacionalista.

Saber refrear o nosso desejo (concupiscência), ter o controlo sobre nossas acções
(racional) e lutar pela vontade geral (irascível) é sinteticamente o desejo de Machel, sob
a perspectiva da estrutura platónica. É preciso ter o triplo domínio de todo o nosso ser,
para que as nossas acções, sejam moralmente correctas, enquanto individuais, assim
como nacionais.

Em suma Machel nos ensina que não podemos deixar que os interesses individuais
interfiram no bem-estar colectivo, pois a finalidade própria, das nossas acções
individuais depende da colectividade. Não é necessariamente por beneficiar a nação e
prejudicar o individuo que uma acção se torna moral, mas por beneficiar a ambos, tanto
a nação como o individuo. O julgamento ético das nossas acções não depende de suas
consequências nacionalistas, nem individualistas, mas do bem-estar nacional e
particular de cada membro da nação.

O que Machel nos apresenta, é uma espécie de um projecto ético nacional, um código
de conduta abstracta que cada um possa carregar onde estiver. Assim como Platão
apresentou sua cidade utópica. As pretensões de Machel nos seus discursos são mais
que para o presente, são para o futuro da nação. Para Hans Jonas, Machel estaria a
cumprir com o desenvolvimento de uma ética futurista, que valoriza as futuras gerações.

Em suma, Samora Machel, não nos ensina uma moral estática, como é o exemplo de um
código de conduta, um regulamento ou estatutos, ele, insere na mente do povo uma
forma de agir que necessariamente baseia-se na reflexão. Não se trata de um
racionalismo, como na ética Kantiana, nem de um empirismo como a ética dos
contratualistas, mas sim, de uma revolução copernicana na ética de uma nação. Uma
ética que se articula em discursos, e se representa em praxis.

O principal fundamento dessa ética é o regime socialista. Tudo quanto for feito tem
como objecto a sociedade. Buscar o bem comum e respeitar ao mesmo tempo o a
igualdade individual. Machel, combateu severamente o capitalismo, e promoveu o
comunismo. O comportamento que se ali ao capitalismo na bisca de bens individuais
não respeita os valores éticos, como queria Machel. Só é possível buscar uma ética
quando pensamos num todo.
Bibliografia

Yassin Amuji (2020). Samora Machel – A Ofensiva. Acesso em


https://youtu.be/ThFc_8YDax0 no dia 13 de Janeiro de 2021.

Você também pode gostar