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Adolph Wagner. Embora fique nos aspectos mais criativos do método de Marx, como a
distinção entre “método de investigação” e “método de exposição” ou a efetiva
concepção dialética de determinação, o estudo de Carver ainda se move no terreno
limitado da dialética como movimento interpretativo que vai do abstrato ao concreto na
síntese de muitas determinações, mas abstratamente.
Trabalhando desde o final dos anos 1930 com o conjunto da obra de Marx, e
certamente um dos primeiros e poucos a lê-la integralmente, Lefebvre construiu
interpretação diversa e menos formal da questão do método do autor alemão. Sobretudo,
no retorno a Marx, a questão do movimento teórico entre abstrato e concreto, no meu
modo de ver e em perspectiva lefebvriana, pede particular atenção à complexidade
teórica do “método de investigação” como momento lógico e integrante do “método de
exposição”. E não como momento estritamente cronológico dos procedimentos da
sociologia marxiana. O método de investigação não só como momento do abstrato, mas
também como momento do empírico e condição de reconstituição sociológica do
socialmente concreto, isto é, histórico. Não só o peso das gerações mortas e o fardo do
presente alienado, mas também a carga de superação e destino.
Lefebvre entendeu que a obra de Marx é um todo, ainda que um todo inacabado, e
é um processo intelectual, um movimento sem rupturas nem renúncias, mas momentos
de uma análise da sociedade contemporânea e do capitalismo. Enquanto alguns vêm
uma descontinuidade entre livros de Marx, Lefebvre tenta desvendar o entendimento
sociológico subjacente à sua diversidade. Um dos pontos metodologicamente decisivos
dessa compreensão da obra de Marx é o relativo à verdadeira relação teórica entre os
Grundrisse e O Capital. Em sua interpretação os Grundrisse tratam do desenvolvimento
desigual do capital enquanto O Capital trata de seu desenvolvimento igual. Ênfases
metodologicamente diversas que vão muito além do meramente preparatório em
contraposição ao meramente definitivo. Trata-se de perspectivas teoricamente
complementares entre si. Assim é possível compreender o caráter metodologicamente
triádico da obra, que aparece no terceiro e inacabado tomo de O Capital, quando Marx
reintroduz na interpretação da distribuição da mais-valia a renda da terra personificada
por uma classe social fundamental da sociedade capitalista. O proprietário rentista se
tornaria uma figura perturbadora na compreensão do capitalismo se nos limitássemos à
simplificação binária de compreendê-la como sociedade estruturalmente polarizada
entre burguesia e proletariado, capital e trabalho, o que ela efetivamente não é.
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Paris durante a pesquisa. Nos meus estudos, o método de Lefebvre permitiu situar o
subúrbio industrial como lugar da produção da riqueza, mas não como lugar de
realização das possibilidades que a riqueza cria; como lugar de insuficiências em
contraposição ao centro como lugar do que a riqueza possibilita. A necessária
monumentalidade do centro, o monumento, isto é, a obra de arte, o teatro, o museu, a
sala de concertos, a universidade, o próprio partido político e o próprio sindicato, são
possibilidades do lugar de realização da riqueza, mas não o são no lugar de produção da
riqueza, no lugar do trabalho, o da fábrica.
Nessa orientação, é possível reencontrar linhas de compreensão da sociedade
brasileira em outra perspectiva presentes, sobretudo, na obra de Roger Bastide, na de
Antonio Candido e na de Florestan Fernandes (cf., em especial meu livro Florestan –
Sociologia e Consciência Social no Brasil, Edusp/Fapesp, 1988). Refiro-me, em
particular, às questões interpretativas que foram propostas no âmbito da Sociedade
Brasileira de Sociologia nos anos 1950 e que perduram ao longo da história da
sociologia brasileira, como a do atraso social em relação ao desenvolvimento
econômico, a das resistências à mudança social, à função da educação e da própria
sociologia na história brasileira do presente.