Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
CRÍTICA TEATRAL:
UMA REFLEXÃO SOBRE O GÊNERO NA IMPRENSA BRASILEIRA
SÃO PAULO
2018
2
CRÍTICA TEATRAL:
UMA REFLEXÃO SOBRE O GÊNERO NA IMPRENSA BRASILEIRA
SÃO PAULO
2018
3
CRÍTICA TEATRAL:
UMA REFLEXÃO SOBRE O GÊNERO NA IMPRENSA BRASILEIRA
_____________________________ _____________________________
_____________________________ _______________________________
SÃO PAULO
2018
5
AGRADECIMENTOS
Aos meus colegas de classe, amigos, que, apesar das milhões de diferenças,
estiveram ao meu lado, seja para rir durante o intervalo, ou para lamentar uma nota
baixa e compartilhar inúmeros momentos da vida acadêmica. Essa união me tornou
mais forte e me fez compreender que todos estamos destinados a algo, e podemos
de fato mudar a vida de alguém todos os dias.
RESUMO
ABSTRACT
JURNO, Isabel C. B. The Theatrical Critique: A reflection on the genre in the Brazilian
press. São Paulo, 2018. 75f. (Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à
Faculdade Paulus de Tecnologia e Comunicação, para a obtenção do título de
Bacharel em Comunicação Social, com habilitação em Jornalismo).
SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO 11
2. A CRÍTICA 18
3. ESTRUTURA DE UM TEXTO CRÍTICO 27
4. O CRÍTICO 37
5. A CRÍTICA E A ARTE NO MEIO IMPRESSO 43
5.1 A cultura sob um olhar politizado 47
6. A CRÍTICA NA INTERNET 52
7. CONSIDERAÇÕES FINAIS 56
8. REFÊRENCIAS BIBLIOGRAFICAS 59
9. APÊNDICE 62
11
1. INTRODUÇÃO
Deixando claro que não podemos tratar nenhum dos fatos com menor
preocupação, ou que os movimentos que se sentiram atingidos por tais estejam
completamente errados, existe sim uma tangência entre o correto e o pouco
explorado, sendo assim, a visão aqui não é repreensiva em questões de gênero,
racismo e religião. O debate fica envolto no campo da censura e da crítica, ou seja,
como o tema foi abordado e qual a sua conclusão.
13
A peça não chegou a ser encenada com sua montagem original, pois após
grande comoção nas redes sociais o Teatro Itaú Cultural de São Paulo, que sediaria
a mesma, resolveu abrir um espaço para um debate entre o movimento negro que
se sentiu ameaçado, atores e produtores da peça além de outros convidados. Ao
final ficou decidido que a peça sairia de cartaz e sofreria modificações, para que não
voltasse a, de alguma maneira, ser propulsora de racismo.
1
Os fofos encenam é uma companhia teatral paulista, que iniciou sua trajetória em 2001 com o
espetáculo “Deus Sabia de Tudo”.
14
2
Heliodora Carneiro de Mendonça (Rio de janeiro, 1923 – 2015) era crítica, ensaísta, professora e
tradutora. Acompanhava a atividade teatral desde os anos 60, e era especializada na obra de Willian
Shakespeare. (DEL RIOS; HELIODORA; MAGALDI, 2014).
15
Então a ideia deste projeto justifica-se como mais um canal para refletir sobre
o papel deste gênero jornalístico no espaço cultural e, de que forma, a crítica pode
ajudar na função social do jornalismo.
3
https://www.facebook.com/jesusrainhadoceu/posts/1523817404330896
16
Sendo assim, pode-se dizer que o problema que ronda, e desencadeia toda
esta pesquisa, está envolto na forma da seguinte pergunta: Quais os padrões a
serem seguidos para a escrita (produção) de uma crítica teatral na imprensa
brasileira? De fato uma questão peculiar e que desfere diversas hipóteses que
podem ou não fazer sentido dentro deste paralelo.
Estes padrões que estão pontuados remetem aos casos que foram relatados
anteriormente, aonde os espetáculos não chegaram a ter uma crítica estampada nos
meios de comunicação, ou se tiveram, não podemos chamar de fato de crítica, mas
talvez de informe, ou em linguagem jornalística, de serviço.
Outra é exatamente o oposto, não como algo então completo mas, como algo
então exagerado, ou seja, também encontram-se críticas com demasiado
aprofundamento, um olhar mais seco para quem realmente é do meio profissional,
costumam contar o espetáculo todo sem deixar ao menos que o leitor escolha se é
relevante ou não ir ao mesmo.
18
2. A CRÍTICA
Não tem como mensurar o alcance de uma crítica ou ainda qual a sua
relevância se não existe um embasamento histórico prévio, que demonstre como
funciona o mecanismo primário do gênero, de onde ele veio e como adentrou as
páginas dos jornais.
Sendo assim, a priori a crítica, como causa, significa colocar ideias em crise,
ou seja, confrontar os lados para entender melhor o que é apresentado, julgar se
existe ou não validade e por vezes qualificar esta mesma. Segundo Piza 5 (2004), a
importância da crítica está em seu papel de formar o leitor, de fazê-lo pensar em
coisas que ainda não tinha pensado, além de dar as informações em si do centro
criticado.
Em tese, a crítica possui uma função pedagógica, é como dizer que esta
procura esclarecer e pontuar ideais, de maneira a clarear o pensamento daquele
que se baseia por ela para solucionar ou compreender um determinado assunto.
Porém vale lembrar que o texto crítico não é um relato factual, como deixa claro o
6
crítico Jefferson Del Rios (2014), no entanto se apresenta como uma forma de
guardar aquilo que não pode ser compreendido pela tecnologia e a momentaneidade
de hoje.
Assim adentramos o cenário das críticas de artes, essas que nada se diferem
enquanto texto de cunho opinativo, mas que de certa maneira comportam uma parte
de subjetividade maior do que as demais. Segundo a crítica e dramaturga Maria
Cecília Garcia (2004), este gênero é uma representação da realidade com
capacidade de eternizar momentos e obras por olhares diferentes e questões
únicas, que nem mesmo uma fotografia seria capaz. O ato de escrever sobre algo
prevalece enquanto o próprio objeto pode ter fim, como, por exemplo, uma
5
Daniel Piza (1970 – 2011) foi um jornalista, escritor e artista plástico brasileiro. Formado em direito,
não seguiu na área jurídica e começou a carreira no Jornal O Estado de S. Paulo em 1991, cobrindo
especialmente a área de cultura.
6
Jefferson Del Rios Vieira Neves (Ourinhos- SP. 1943) é Crítico de longa atividade na imprensa
paulista, como jornalista é também redator e editor, além de ter sido correspondente no exterior. (DEL
RIOS; HELIODORA; MAGALDI. 2014)
19
exposição, que possui data para deixar de existir, enquanto dentro das linhas do
texto de um crítico continuará em jornada eterna.
É nítido então que o texto crítico visa suportar uma carência de estado, é a
forma mais pura que a arte tem para se reverberar enquanto produto latente. É o
meio e a conclusão de um trabalho que pretende se eternizar, lembrando ainda que
por vezes a própria crítica procura se encaixar no quesito de arte concreta. Além
disso, é o único produto que consegue para mais de suas funções acadêmicas, ele
7
Theodor Adorno (1903 – 1969) foi um filósofo, sociólogo e musicólogo alemão, um destacado
representante da chamada “Teoria crítica da sociedade”, desenvolvida no instituto de pesquisas
sociais (Escola de Frankfurt).
20
desmistifica o mundo artístico à sociedade, seja ela leiga ou não, assim como essas
expressões descritas por Bourdieu8 (1996).
Claro que nem sempre a crítica agrada, nem sempre é vista com bons olhos,
afinal o seu intuito é deixar alguma coisa válida à sociedade, seja por algo de valor
inestimável, ou por um erro fatal. Por isso a crítica deve ser funcional, desprendida
do ego de seu autor para de fato exercer seu papel. É como se fosse necessário se
libertar de amarras mundanas, cheias de equivalência para conseguir criticar algo
eticamente, reverenciando seus pontos positivos e negativos sem influência da
indústria cultural, “A crítica não é injusta quando destrói - está ainda seria sua maior
qualidade, mas quando ao desobedecer, obedece.” (ADORNO, 1998, p.11).
Um fato histórico que comprova tal pensamento, segundo Piza (2004), foi o
festival de Edimburgo que ocorreu na Escócia em 1998. Durante o festival várias
expressões artísticas foram apresentadas e como consequência muitas críticas
também foram veiculadas na mídia, algumas destas que sofreram represália por
parte dos artistas (como acontece ainda hoje). No entanto no ano seguinte, no
mesmo festival, a revista inglesa The Economist foi atrás dos artistas para
perguntar o que melhorariam em suas performances anteriores se tivessem a
oportunidade e para a surpresa desses, 80% das mudanças tinham sido apontadas
como necessárias pelos críticos no ano anterior. (PIZA, 2004, p. 69).
8
Pierre Bourdieu (1930 – 2002) foi um importante sociólogo e pensador francês, autor de uma série
de obras que contribuíram para renovar o entendimento da sociologia e da tecnologia no século XX.
21
Um dos primeiros críticos teatrais do mundo foi Aristóteles, esse que foi
pioneiro em examinar de forma objetiva o conteúdo da barriga do ursinho10, como
dizia a crítica Bárbara Heliodora (2014), isso quer dizer que foi o primeiro a entender
que uma crítica deveria ter contexto, informações e dilacerações de um espetáculo,
e que não culminasse em problemas posteriores de entendimento. Ele inaugurou a
teoria da Catarse, essa que é o meio através do qual o homem purifica sua alma,
contando com apresentações trágicas. Como dizer que toda a peça de Teatro que
prossiga de maneira construtiva ajudará a sociedade a se posicionar em
determinado âmbito, como se purgasse as emoções humanas por escolhas ruins.
É bom lembrar que se pode “(...) definir a crítica teatral como um texto em
estado de latência, aquele que jamais se conclui ou jamais adquire uma forma
acabada e completa.” (GARCIA, 2004, p. 26). Isso porque existe uma constante
mutação dentro da área, essa que faz com que o gênero continue existindo, mesmo
com os mil percalços que veremos mais adiante.
9
Franthiesco Ballerini, jornalista, foi repórter e crítico do Grupo Estado. Mestre em comunicação
social.
10
A comparação vem do livro “O urso com música na barriga” (1938) de Érico Veríssimo, isso porque
neste todos querem saber o que de fato é o conteúdo da barriga do ursinho, que diferente dos outros,
toca música.
22
Então para fazer parte desta editoria é preciso pensar na divisão de poderes
que ela possui na área dos saberes e dos dizeres sobre Teatro “(...) ou seja,
interessa pensar em como se divide e se organiza o que se fala sobre Teatro no
circuito dos discursos visíveis, como se dá essa partilha e como se pode remoldurar
os princípios que dão as regras para essa hierarquia.” (SMALL, 2015, p. 17).
Além destes dois marcos temporais, Ballerini (2015) traz uma lista muito mais
extensa desde o desembarque desse gênero jornalístico no Brasil, ele inicia a
caminhada em 1827 com O Espelho Diamantino, um dos primeiros periódicos da
imprensa, destinado ao teatro, literatura, arte, moda, política e afins. Tudo, é claro,
para senhoras brasileiras. O autor ainda pontua que por volta de 1836 o jornalista
Justiniano José da Rocha já publicava com regularidade suas críticas nos jornais
cariocas O Brasil e O Cronista.
11
Mona Lisa também conhecida como A Gioconda ou ainda Mona Lisa del Giocondo é a mais notável
e conhecida obra de Leonardo da Vinci, um dos mais eminentes homens do Renascimento italiano
24
debatida por esse, precisando por vezes do olhar do diretor, para direcionar esse
pensamento analítico.
Ballerini (2015) ao citar Décio de Almeida Prado diz que o texto crítico teatral,
de certo modo, se torna a única forma de compreender o desempenho de atores, de
uma montagem e de todo o restante que faz parte de um espetáculo para endereçá-
lo as então interpretações do público. Funciona, de alguma maneira, como um guia,
no qual os olhares devem ser captados e transcritos de uma maneira mais clara
para o público.
Ballerini (2015) então diz que uma função definida e concreta de um texto crítico
teatral é de interpretar, interrogar, desconfiar e provocar crenças e concepções, para
com o espetáculo apresentado, homologando a sua existente enquanto obra de arte.
É necessário recortar que aqui o viés no qual as pontuações são feitas que é
o jornalístico, para com a crítica enquanto pertencedora da editoria de cultura, seja
no meio online, ou no impresso, mas como, portanto, gênero da escrita opinativa
jornalística, tendo como primeira obrigação (visando as funções dos encargos
jornalísticos) de informar e formar um público apto a compreender e consumir o seu
produto final.
Vale ressaltar que esse ponto se constrói como uma das opções viáveis de
endereçamento da crítica, mas que destrincharemos melhor mais a diante.
Magaldi (2014), por sua vez diz que “A primeira função da crítica é detectar a
proposta do espetáculo, esclarecendo-a, se preciso, pelo veículo de comunicação –
jornal, revista, rádio e tevê. Em seguida cabe-lhe ajuizar o equilíbrio do conjunto.”
(DEL RIOS; HALIODORA; MAGALDI, 2014, p.45).
Portanto, o texto crítico pode ser personificado como aquele funcionário que é
impossível de se demitir, afinal ele possui todas as características que uma empresa
necessita e ainda compadece de todos os momentos éticos possíveis, ele sabe que
seu dever é entre o palco e o público, não antes, nem depois mas entre e que de
fato pode influenciar, ou seja, deve ter muito conhecimento prévio antes de apontar
ou não algo que vê.
“De que serve a crítica? Entre outras coisas, serve também de ponte entre o
público e o novo. A crítica serve também para explicar, para colaborar com a
identificação de qualidades.” (DEL RIOS; HELIODORA; MAGALDI, 2014 p. 29).
Portanto, a crítica é como uma via de mão dupla, hora serve como base educativa,
pedagógica, outra com medidor de qualidade, de propriedade informativa. Em
ambos os casos ela serve, mas nunca se apropria do estado de obra superior, é um
texto de apoio que em tese não tem capacidade de modificar momentaneamente,
servindo como consulta e quem sabe moeda de troca.
Por isso, é engano julgar que o público de fato escolha ver algo ou não
apenas pela crítica, apesar de que nos Estado Unidos como diz Magaldi (2003), o
texto é sim parâmetro para investidores tirarem uma produção de cartaz ou não, isso
logo após a estreia. No entanto no Brasil a cadeia monetária não funciona dessa
maneira, até pela pouca cultura de leitura de críticas, mas o ponto é que não deve-
se subjugar o público apenas para com a crítica, ele sempre terá sua opção de
escolha e será apenas direcionado por tal gênero.
Por fim, é necessário lembrar que a crítica, apesar de ter suas funções iniciais
pré-estabelecidas, é um texto em constante mutação, ela deve se adequar por vezes
ao que está em alta no ramo teatral do momento, como os musicais hoje em dia, e
por isso atrela a “necessidade de averiguar com maior pautério o que se destaca em
determinado instante” (MAGALDI, 2003, p. 22) levando sempre em consideração,
que, por ser um texto de cunho opinativo, depende sempre dos traços de seu
escritor, que devem permanecer como um diferencial, em meio a todas as
informações necessárias para ser uma narrativa qualitativa.
27
Não se tem ao certo um modelo padrão a ser seguido para a construção literária de
uma crítica, seja ela da área que for, no entanto, alguns autores trazem suas
divisões para, de certo modo, guiar o escritor (identificação dos pontos conceituais)
e o leitor.
Piza (2004) acredita que para se ter um bom texto crítico no universo cultural
é necessário que contenha os seguintes pontos:
1 – Introdução
2 - Texto (escola teatral)
12
LEAD é a estrutura do texto que inicia uma notícia. “O lead clássico é formado por seis perguntas básicas, que
teoricamente, irão fortalecer as informações mais importantes do fato ocorrido. São elas: O que, quem,
quando, onde, como e por que.” (BARREIRA, 2013)
13
“Pirâmide invertida – estrutura que ordena as ideias de acordo com o sentido decrescente, isto é, dos fatos
mais importantes, que encabeçam a matéria, no lead, para os fatos menos importantes, que estão no final”
(REGO, 1984)
14
Clóvis Garcia (1921 – 2012) foi crítico, cenógrafo, figurinista, ator e professor. Personalidade Teatral
envolvida em diversas áreas do teatro, tanto teórica, quanto práticas desde 1950. (GUIMARÃES, 2009)
28
2.1 – Autor
2.2 - A peça
3 – Direção
4 – Concepção do espetáculo
5 – Interpretação
6 – Cenografia/ Figurino
7 – Música/ Coreografia
8 – Espetáculo
Aqui estão dois textos críticos sobre o musical “A Pequena Sereia”, uma
produção brasileira que segue os moldes do espetáculo de mesmo nome
apresentado na Broadway (EUA) e na Holanda. Um deles é fonte do blog de
entretenimento Queer as Geek15, este foi escolhido como objeto de análise porque
não aborda apenas críticas do meio teatral, mas também do cinema, além de outros
conteúdos relacionados, ou seja, atrai uma gama de audiência muito maior do que
15
https://queerasgeek.com.br/
29
apenas leitores engajados em um assunto em especial, também, por não ser uma
plataforma especializada neste tipo de texto opinativo, sendo produzido para o meio
online. O outro é um texto que apareceu nas páginas da Folha de São Paulo, mais
precisamente no Guia Folha. Este produto do meio impresso foi escolhido para
análise, porque, além de ser parte integrante de um jornal convencional, ainda
apresenta a necessidade de seguir, de certa maneira, os manuais da casa e do
jornalismo, atuando em um público que se difere do atingindo apenas no meio
online.
A primeira crítica a ser analisada é a do Blog Queer as Geek, que foi escrita
por Lucas Werner16, esta virá em itálico, tamanho 11 e com o título sublinhado, de
maneira que seja possível identificar o que é texto opinativo e o que é análise (que
estará em padrões convencionais):
16
Lucas Werner é redator do Blog Queer as Geek e estudante de Publicidade e Propaganda.
30
coletiva de imprensa, onde você pode conferir o que rolou aqui, vi neste último
domingo(1) o musical completo, fazendo me encantar mais ainda por essa história.
Ariel sempre foi minha princesa favorita da Disney, e há exatos 9 anos atrás
quando o musical nascia nos palcos da Broadway eu já estava esperançoso por
alguma montagem brasileira desta história que marcou minha infância. Quem nunca
quis ser uma sereia quando era pequeno não é mesmo? Após longos anos de
espera, finalmente temos uma montagem para chamar de nossa literalmente! Afinal
foi a primeira vez que a Disney liberou que fosse feita uma montagem do musical
que não precisasse seguir a risca a versão americana, e nós só temos a agradecer
por isso!
Assim que entrei ao teatro, o barulho da água e das aves invadem todo o
ambiente fazendo você se sentir prestes a mergulhar no fundo mar. E quando tudo
começa é inevitável você não ser puxado, pelas luzes e pelos cenários magníficos.
Bom a história já sabemos de cor, o que surpreende no primeiro ato do espetáculo
realmente é a forma como eles representaram o nado dos personagens. Algo que
realmente eu paguei com a língua ao ver alguns vídeos e ler comentários de muitas
pessoas que não gostaram do fato da Ariel ser carregada por alguns ensemble, que
estavam ‘vestidos’ de água… Sim, você pode até estranhar como eu estranhei no
começo, mas ao vivo tudo flui, tudo funciona perfeitamente bem, e fica lindo de se
ver como eles trabalharam tão bem essa parte e, principalmente, o movimento
corporal de cada um que tinha seu jeito de nadar diferente.
mais, porém uma das melhores músicas do espetáculo é cantada por ele e pelas
irmãs de Ariel, que aliás estão engraçadíssimas sentindo ciúmes da irmã, cutucando
a mesma com vários trocadilhos referente ao mar. Cada personagem em cena foi
muito bem trabalhado e se destaca na sua hora, como as enguias fiéis de Úrsula
que roubam a cena quando estão cima do palco.
Como já dizia o ditado ”O peixe morre pela boca”, foi isso que pensei logo que
o musical acabou. Após entrar com um pé atrás, eu sai com o coração
transbordando mais amor por tudo que vi. A delicadeza e a forma como a direção
criativa e coreógrafa teve de pensar o nado para que isso funcionasse ao vivo, e unir
o movimento corporal e o cabos como referência da montagem australiana e
japonesa da peça foi brilhante. Com um elenco dedicado, A Pequena Sereia – O
Musical consegue entregar o que deseja e encanta o público que tem o privilégio de
ver essa peça completa.
17
Explicação é destrinchada no capítulo 5.
18
Canção interpretada sem o acompanhamento de qualquer instrumento musical.
33
A segunda crítica a ser analisada é a da Folha de S. Paulo, que foi escrita por
Leonardo Sanchez19, esta também estará em itálico e com o título sublinhado, para
ajudar a identificar a análise e o texto da mesma maneira:
19
Leonardo Sanchez é jornalista formado pela PUC –SP e trabalho como crítico no Guia Folha
34
prepara o leitor para aquilo que ele deve encontrar nas linhas seguintes, deixando-o
ciente do conteúdo do texto, além disso, é neste compilado que também estão
destrincados os tópicos 2 (Escola teatral) e 3 (Direção), isso quando o autor fala das
montagem anteriores que seguem o mesmo caminho dentro do Teatro infanto-
juvenil como o citado “Rei Leão”, e ainda no momento que o nome da Diretora é
exposto, pontuando os outros espetáculos que também liderou dentro do mesmo
âmbito artístico.
“A gente continua contando a mesma história, mas com uma visão, com uma
linguagem teatral diferente. A ligação com o desenho fica na memória afetiva”, diz o
ator.
35
Por fim, encontra-se mais uma vez o serviço, esse que pode ter sido enviado
a mídia por meio de release, por isso eventualmente não traz nenhuma informação
nova, ou aparentemente diversificada para com outros meios.
4. O CRÍTICO
Imagine uma figura obscura, um tanto quanto aterrorizante, pálido, com uma
sombra tão vultuosa que por vezes é confundida com parte de sua vestimenta.
Um homem, magro e alto beirando seus 50 anos, frio, calculista, inescrupuloso e
porque não, autoritário. Uma figura de fato intrigante, no entanto muito temida, essa
é a visão mais próxima do senso comum que se tem de um crítico, assim como o
icônico Anton Ego, personagem de Ratatouille20, filme da Disney.
Um autor que reverberou parte deste pensamento foi Adorno (1998), mas isso
porque ele estudava que a cultura já não era nada de que pudéssemos nos orgulhar,
a indústria já pautava o que era ou não relevante, quando não estava objetificando e
fazendo produção em escala da mesma.
O Crítico da cultura não está satisfeito com a cultura, mas deve unicamente
a ela esse seu mal - estar. Ele fala como se fosse o representante de uma
natureza imaculada ou de um estágio histórico superior, mas é
necessariamente da mesma essência daquilo que pensa ter a seus pés.
(ADORNO, 1998, p. 7).
Sendo assim Adorno não acreditava no trabalho de um crítico, entendia que esse
tenha sido corrompido também pela indústria e que sua produção nada tem a
agregar, é apenas um jogo de egocentrismo e empoderamento, que cai por terra
quando o objeto se adequa às mesmas condições que seu público.
Ainda como forma de elucidar que o crítico é alguém incapaz de atuar, o autor
(1998) diz que O crítico da cultura mal consegue evitar a insinuação de que, possui
a cultura que diz faltar. A declaração é consistente, uma vez que nos deparamos
20
Ratatouille é uma animação da Disney em parceria com a Pixar, lançado em 2007, o longa conta a
história do rato Remy que vive em paris e em o sonho de virar chef de cozinha.
38
com profissionais (ou não) que não possuem de fato artimanhas para regrar sua
narrativa, o conhecimento prévio, adquirido em anos ou ainda que não se
desvencilhou de seus atributos pessoais para guiar a produção.
21
Jacques Copeau (2013) Acreditava que ser crítico de Teatro era um
trabalho duro e ingrato, além de monótono e perigoso. De fato nos deparamos com
uma não proteção ao trabalho de um profissional da área, em primeira instância
porque as páginas de jornal tem diminuído o espaço para tal produção, em segunda
porque não se tem tanto espaço para a arte em si, se essa não possuir grande nome
e elenco (o que veremos adiante).
Piza (2004) possui uma argumentação muito bem estruturada sobre o crítico
de arte, ele expõe tal linha de raciocínio à intenção de desmistificar a atuação do
mesmo, elencando como bom ou mau crítico, e ainda pontuando sua apreciação
segundo a sociedade: “O crítico tem uma imagem ruim, especialmente em países
como o Brasil. Para muitos é um criador frustrado, que aponta erros que ele mesmo
cometeria se estivesse - do outro lado -. É chato e ressentido.” (PIZA, 2004, p. 77).
Essa visão categórica diz respeito exatamente a uma junção dos outros dois
autores apresentados, sendo eles Heliodora (2014) e Small (2015). O estereótipo do
crítico se constrói com base no que ele diz e não agrada, é uma complexidade maior
do que podemos entender, mas é como uma imagem deturpada a partir tanto de um
egocentrismo que alguns esbanjam quanto pela intensidade da crítica atrelada a
gostos pessoais, o que não é uma regra no meio.
21
Jacques Copeau (1879 – 1949) foi um escritor francês e renovador do Teatro comediógrafo. Órfão
de pai decidiu se dedicar à crítica teatral.
39
fora do senso comum, quais os moldes que deve seguir e qual sua função dentro da
editoria de cultura. Lembrando que assim como pontua Small (2015) pretendemos
deixar em um mesmo patamar a inteligência de quem escreve para com aquele que
lê. Isso não significa que uma anula a outro, mas sim que o leitor tem a capacidade
de a partir do que leu, tomar suas próprias decisões para com o conteúdo
apresentado, iniciando reflexões próprias, apenas guiadas pelo crítico. Portanto é
como parte do que Magaldi (2003) apresenta em seu pensamento sobre o
profissional: “O espectador não sabe como orientar-se e delega ao crítico a função
de escolher por ele (...)” (MAGALDI, 2003, p. 26).
Assim como Piza (2004), Heliodora (2014) não aconselha que um crítico se
baseie no bom ou mau para descrever uma obra, nem que este a condene ou eleve
a toa, sem justificativas e compreensão, ela ainda acredita que em muitos dos textos
isso ocorra não como uma forma de guiar o leitor de maneira mais clara, mas por
pena, sim, pena de que por causa de suas palavras um número x de atores perca
seu emprego (o que pouco ocorre no Brasil).
mais diversos temas, sejam estas obras do ramo musical, dramático, comédia e
tantos outros. João Apolinário (DEL RIOS; HELIODORA; MAGALDI, 2014), um dos
mais antigos críticos da área, dizia que o crítico é o guarda costas do teatro, isso
porque esse tem o dever de zelar pela história do mesmo, auxiliando que as obras
estejam sempre dentro dos padrões estabelecidos pela arte e reverberando a
necessidade de acompanhá-la de perto pelo público.
23
Wasilewski (2018) é um crítico contemporâneo que abraça as estruturas
clássicas do texto, e assim regenera a ideia de que o maior papel do crítico para
com o público é de situá-lo para com o contexto em que a obra foi escrita, abrindo
de fato um panorama informativo ao mesmo, isso aproximando o do espetáculo.
Piscitelli (2018) acredita que o crítico tem que trazer para o leitor um
panorama do que ele terá em cena, “(...) a quem serve aquilo no palco. Como aquilo
pode afetar um público e que público é esse (...)”. Ou seja, é um jogo complexo,
onde qualquer ponto faz a diferença e onde a necessidade maior é que produza um
23
Luís Francisco Wasilewski começou a carreira de crítico em 1998 com 19 anos no Jornal Palco e
Plateia, Hoje, Mestre e Doutor em Teatro Brasileiro, atua na área no site Aplauso.
41
texto autoexplicativo, com postura de regência mas, que abra portas para olhares
diferenciados e reflexões posteriores.
Vale pontuar que então uma crítica negativa não é de todo ruim, é uma
ferramenta útil para a construção de um pensamento mais elaborado, de uma visão
mais firme e porque não uma forma de pontuar debates posteriores, afinal são estes
que vão desencadear a necessidade ou não de assistir a um espetáculo. Heliodora
(2014) já dizia que o crítico tem por obrigação mensurar e exemplificar suas
afirmações, sejam elas negativas ou positivas.
Lembrando que uma crítica negativa não leva alguém a desistir de assistir a
algo, é apenas uma forma de direcionar o público aos detalhes que devem estar em
evidência. Pode-se entender até que um material que pontue algo como não
merecedor de aplauso é um chamariz para o espetáculo, afinal quem não estaria
disposto a provar se aquilo é verdade ou não, ainda mais hoje na sociedade
desafiadora que estamos inseridos, é quase que uma jogada de marketing discreta,
que pode alavancar as bilheterias de uma hora para a outra.
Para Pamela Duncan 24 (2018), outra entrevistada, a função que o crítico deve
exercer é a seguinte: “(...) ver se foi cumprida a proposta que a produção, grupo ou
idealizador se propôs. Por isso a visão pessoal sobre a arte não conta. Mas sim se
está bem conceituada ou não.”. Há quem discorde em tese desse pensamento uma
vez que a narrativa em questão se encontra nos meios dos textos opinativos, mas a
questão básica é, acima de tudo, verificar o que a obra trouxe e se isso foi bem
executado dentro dos parâmetros sugeridos pelos diretores.
24
Pamela Duncan começou como crítica há cinco anos (2013) em uma coluna sobre Teatro adulto
dos Jornais Associados.
42
Foi durante a revolução industrial que a arte começou a ter seu declínio como
forma de reflexão, e adotar outros tantos sentidos para que se mantivesse viva e
não obsoleta. É claro que o poder vigente na época, que continua até hoje, que
comandava as grandes empreitadas era o dinheiro, afinal porque se produzir em
massa se o intuito não é lucrar.
É neste momento então que a arte passa a ser reproduzida com maior
destreza. Não que ela nunca tenha passado pelo processo de reprodução, afinal já
se familiarizou há tempos com a xilogravura25 e afins, porém, como aponta Walter
Benjamin (2015) é neste estalo que a monetização passa a fazer parte do processo,
que o ganho final é visado para além da eternização da obra em si.
25
Xilogravura é a arte e técnica de fazer gravuras em relevo sobre madeira.
44
E o pouco espaço que sobrou para a arte em geral ainda passou a ser
subdivido em diversas categorias, eliminando aquelas que menos podiam gerar
lucros, como o Teatro, por exemplo, que move muito menos capital do que uma
produção televisiva, ou ainda um filme cinematográfico, assim como conta Magaldi
(2003). Então o espaço antes monopolizado pelas artes cênicas, passou a ser
dividido por numerosas outras manifestações de popularidade indiscutível.
Veja que, uma coisa gera a outra, com a saída do Teatro das grandes
manchetes, e com seu espaço reduzido, este passou a não habitar mais o cotidiano
do leitor, tornando-se por consequência uma arte elitista de certo modo, ainda que
críticos como Heliodora (2015) acreditem que a arte em questão sempre foi
intelectualmente superior e que denota um público mais ramificado. No entanto
artistas e dramaturgos como Roveri (2015, apud, BALLERINI 2015), que vivem do
meio, pontuam fervorosamente que o teatro, desde o seu nascimento, se consagrou
como uma arte popular.
26
Pablo Ruiz Picasso, foi um pintor espanhol, escultor, ceramista, cenógrafo, poeta e dramaturgo.
27
Romero Britto Romero Britto é um pintor, escultor e serígrafo brasileiro radicado nos Estados
Unidos. Considerado um dos artistas mais prestigiados pelas celebridades americanas.
45
28
Existe então, na editoração cultural uma forma de agenda setting ainda
muito bem estruturada. Está se dá inicialmente seguindo a mercantilização das
artes, a necessidade de padronizar o conteúdo para um mercado consumidor ativo,
em seguida e como uma via de mão dupla atua regulando aquilo que deve ser
discutido na esfera pública, com referências já estabelecidas não pelo gosto do
freguês, mas pela roda da fortuna.
É claro que existe também o lado não antagônico dessa moeda, este que
implica em diversas dificuldades para a cobertura. Antigamente, segundo Magaldi
(2003), ocorriam cerca de 30 estreias anuais no cenário das artes cênicas, enquanto
28
“A capacidade de influência dos mass média sobre o conhecimento daquilo que é importante e relevante,
varia segundo os temas tratados” (WOLF, 1995, p. 67).
47
hoje o número passa perto de uma centena por temporada. Como então cobrir esse
conteúdo todo, sem ao menos uma leve defasagem? A margem passa a ser mais
tênue nesse caminho.
A quem diga como Del Rios (2015) que a solução seria mais de um crítico
dentro do jornal, como ocorre na coluna de cinema, assim, existiria uma rotatividade,
e então um panorama maior seria coberto pela mídia. Bom, essa construção não
passa de um ideal, afinal parece que o jornalismo não se abala com essas
modificações de cenário, é leve e contundente a curva que esse faz para se
adequar, mas não de maneira a não perder seu espaço, mas na vontade de não ser
mais reconhecido com o anseio de antigamente. “(...) a mercantilização da cultura, e
tudo que ela implica para o amortecimento do espírito crítico, vem reinando
soberano, sem que o jornalismo mova uma palha para mudar o curso da história.”
(GARCIA, 2004, p. 13).
29
Holocausto, também conhecido como Shoá, foi o genocídio ou assassinato em massa de cerca de
seis milhões de judeus durante a Segunda Guerra Mundial.
49
Imagine então que seja um post no facebook que afirma que dia tal do mês tal
o mundo irá acabar. Lógico que algumas dessas postagens são fundadas, e de certo
modo se baseiam sobre algo real, mas ainda assim precisam de mais informações,
mais conhecimento para se tornarem verídicas, assim como acontece com o Teatro
e sua crítica.
Críticos como Dib Carneiro (2015, apud, BALERRINI, 2015) pontuam que,
além dos pormenores já citados, para manter a cultura, o Teatro em especial, vivo
em sua essência mais pura, ainda precisa lidar com assessorias de comunicação e
50
marketing que procuram com seus releases reger e conduzir o tom e a frequência
com que a cobertura teatral aparece na mídia.
Fica claro por fim que ainda hoje vive-se em uma sociedade brasileira com
picos conservadores, que acredita que nem toda forma de cultura é valida para o
desenvolvimento da mesma perante o futuro. Wasilewski (2018) concorda com tal
pensamento e vai mais longe dizendo que acha:
No entanto, que fique claro, que o pontuado como negativo aqui é a censura
sofrida pelas artes, seja qual for sua origem, e não os motivos em si, sendo assim,
não visando o julgamento como correto ou não, mas como uma forma de calar uma
manifestação artística.
Isso ficou ainda mais aparente no Brasil em 2018, quando duas Arguições de
Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF), as ADPFs 183 e
293, propunham a extinção da necessidade de Registro Profissional (DRT) para que
artistas e técnicos em espetáculos exerçam suas atividades profissionais, este
reconhecimento legal que foi garantido pela classe quase 40 anos atrás. O porquê
de tal ato? Simples, se ser ator não é considerado profissão formal, então as formas
51
de arte que são provenientes destes também não possuem nenhum valor concreto
para com a sociedade contemporânea.
6. A CRÍTICA NA INTERNET
Apesar de a cobertura teatral na internet ser, segundo Ana Salles (2015, apud
BALLERINI, 2015) a ferramenta para se chegar de forma mais rápida e quase sem
custo a um grande público potencial, ainda não se criou um vinculo de grande
confiança com o leitor, não que não haja conteúdo de qualidade para isso, mas
porque ainda se têm uma desconfiança para com um ambiente onde ilusoriamente
tudo é permitido.
O problema é que a internet, por quanto, parece não ter o mesmo status
dos veículos impressos. Uma crítica em um jornal ainda parece ser mais
relevante do que as críticas ou comentários feitos em blogues e no
facebook, mas isso esta mudando rapidamente. (ROVERI 2015, apud
BALERRINI, 2015, p. 127)
O que acaba por ocorrer é que ambos os canais (impresso e online) passam
a competir pela audiência, mas não de maneira a abrir mais espaço para a
53
divulgação, ou estender a editoria nas paginas dos jornais. “A mídia impressa acha
que, para concorrer com a velocidade da internet (...) precisam trazer textos mais
curtos, mais pragmáticos e menos analíticos.” (DIB, 2015, apud BALERRINI, 2015
p.125)
30
Paulo Neto, Jornalista, começou a publicar artigos sobre Teatro na revista Drops Mag em 2016, e
agora lidera, como crítico, o braço paulistano do site carioca Incitarte.
54
Isso é o que acredita Ana Salles (2015, apud BALLERINI, 2015) quando diz
que deveriam ser feitas mais de uma crítica de um mesmo espetáculo, por
temporada. Assim seria possível captar com maior intensidade a ideia destaca. Não
que isso já não ocorra de alguma maneira no meio online pela diversidade de
conteúdos publicados em diferentes momentos, mas agora por um mesmo autor, e
por uma mesma plataforma. Seria uma maneira mais eficaz de combater erros que
levam a comentários distorcidos e censuras, ou ainda uma forma de cobrir todo o
evento artístico e não apenas o tempo do espetáculo estipulado à imprensa.
Claro que ainda se perde algo dentro deste processo, imagine os musicais,
que saíram da Broadway para tomar o mundo. Eles estão na integra no Youtube em
suas mais diversas versões e línguas, assim como possuem todas as suas canções
disponíveis para download no Spotify, por exemplo. Roveri (2015 apud BALLERINI,
2015) acredita que apesar de tais atos revolucionários, ainda existe uma grande
defasagem para com o ao vivo: “Existe no Teatro um contato visual e emocional que
ainda não encontrou uma tradução à altura nos meios eletrônicos.” (ROVERI, 2015,
apud BALLERINI, 2015, p. 129). Outro autor que traz essa ideia, ainda que em outra
categoria, é Benjamin (2015) quando dizia que por mais perfeita que uma
reprodução possa ser, ela sempre vai perder alguma coisa dentro de sua essência
final.
7. CONSIDERAÇÕES FINAIS
A revista Veja São Paulo, de 21 de março de 2018 (nº12) trouxe como capa a
seguinte manchete: “As novas estrelas da Broadway Paulistana”, ilustrada com uma
foto feita com atores de diversos musicais e entrariam ou já estava em cartaz na
cidade de São Paulo.
O conteúdo em si, eram perfis de cada um dos atores e sua história desde os
palcos até, por exemplo, o mundo acadêmico ou a televisão, no entanto o que se
deve verificar é a afluência desse estilo teatral que desponta cada vez mais e que
atrai diversos olhares, seja pelo seu elenco, ou pela história que da vida. Isso quer
dizer que, também estão sob a possibilidade de integrar as páginas de publicações
impressas, ou não, pelo seu conteúdo ou por uma visão equivocada de seu assunto
como o caso de “Jesus Cristo, Rainha do céu”.
Vale lembrar que o objetivo da arte é ser vista e participada pela sociedade
em que se enquadra, e não adormecer como material intocável. Heliodora (2014)
acreditava que o Teatro era como um ato intelectual, que só aqueles que
57
Tendo esta gama de informações, é possível ainda destacar que a crítica não
se trata então apenas de um texto com afluências dentro do Jornalismo
contemporâneo, mas sim um gênero opinativo de grande amplitude dentro do
cotidiano. É como dizer que o jornalismo cultural possui o papel de disseminar a
área, mas não de molda-la de acordo com seus interesses e requisitos subsidiados.
“O jornalismo cultural, portanto, é uma ferramenta imprescindível para a arte teatral,
não só para fins de registro como para reflexão, crítica e dialogo como o seu tempo,
seu entorno etc.” (BALLERINI, 2015, p.115)
Fica dito então que, a necessidade da crítica é eminente, e que por isso deve
ser tratada com destreza e certa habilidade, cooperando para sua ascendência
como gênero textual respeitado, além de valorizas os profissionais que trabalham na
área, empoderando de fato seu produto como bem de vigência perpendicular dentro
58
8. REFÊRENCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Monografias
Online
Livros
60
ADORNO, Theodor. Prismas – Crítica cultural e sociedade. São Paulo, Ática. 1998.
BOURDIEU, Pierre. As regras da arte. São Paulo, Companhia das Letras. 1996.
GARCIA, Maria Cecília. Reflexões sobre a Crítica Teatral nos jornais: Décio de
Almeida Prado e o problema da apreciação da obra artística no jornalismo cultural.
São Paulo, Editora Mackenzie. 2004.
SMALL, Daniele Avila. O crítico Ignorante: Uma negociação não teórica meio
complicada. Rio de Janeiro, 7 letras. 2015.
Entrevistas
NETO, Paulo. Entrevista concedida a Isabel Cristina Branquinha Jurno. São Paulo,
18 maio 2018. [A entrevista encontra-se transcrita no Apêndice “C” desta
monografia].
9. APÊNDICE
que iria vê-lo. Ela me disse: "Fran, você viu as fotos dele? Eu fiquei com medo". E
realmente, Ilana tinha razão, o musical era um horror. Passei a prestar muita
atenção nas fotos das encenações antes de assisti-las.
65
mudado a peça com uma desculpa de ser um processo em eterna criação. Mudaram
por causa do Miguel, eu sei. Eu escrevi o que pensava e o debate ganhou uma
força.
A gente ajuda a projetar a mudar. Acrescentamos um olhar, que não é o da
verdade, mas faz sentido, sempre que análise é cuidadosa. Teve um caso maluco
recente que uma dramaturga levou a mal o Jose Cetra, meu colega da APCA,
porque ele disse que o texto é prolixo. Ela foi violenta e no final, não houve quem
não concordasse com ele. A crítica media e nunca pode ser histérica. Esse é ponto
de equilíbrio. Por isso, o bom e ruim não funciona. Só no guia mesmo e para
adolescentes como um dia eu fui... rsrs...
P. Agora visando a sociedade moderna, os conflitos dentro da área das artes,
com peças canceladas por motivos ideológicos, produções que acabam por serem
alvos de preconceito, ou que disseminam o preconceito, mesmo que
involuntariamente, qual seria então a função da crítica?
R. Acho que respondi já, né? Essa peça Branco, do Alexandre Del Farra é um
caso contundente. Agora arte censurada? Não pode, né? A arte é o espaço da
reflexão, do que pode se fazer tudo e acessar aquele espaço em que não temos
coragem na vida real, sabe? Por isso, eu reafirmo que o crítico tem que mediar
esses conflitos sem ir para o Fla X Flu. Em tempos extremistas, que vão e voltam na
história, isso é mais difícil. Foi duro ver o Wagner Schwartz ser condenado pela peça
La Bête dois anos depois que eu assisti a performance, na Bienal SESC de Dança.
Dois anos depois. É importante se posicionar, mas tentar o equilíbrio.
P. Uma vez, Sábato Magaldi disse que a crítica tinha o poder de influir na
afirmação de determinado gênero teatral, em prejuízo de outro, você concorda?
R. Sim. Classificação é coisa de crítico e não de público. Classificações em
geral. O público quer entender a função daquilo para ele, divertir, chorar, aprender,
se ver. O Teatro é lugar que você se encontra com os seus fantasmas, com você
mesmo, com o outro e tem contato com mundos e sensações. E essas
classificações tem mudado muito e precisamos rever isso, de alguma forma, as
peças não seguem mais o épico ou clássico com a figura de um protagonista ou
mesmo de um gênero. Peguem, por exemplo, O Nós, do Grupo Galpão, que
arrebatou a crítica. O Grupo Galpão é um exemplo desse Teatro que não se encaixa
em gêneros, não tem protagonista claro e nem, por exemplo, uma luz que possa
desassociada do cenário. O híbrido tomou conta desse Teatro contemporâneo e os
72
prêmios estão ali no mesmo lugar e tratando dos meus termos. Esse é um dos
desafios da crítica atual.
P. O crítico deveria ter como objeto de estudo o conjunto do espetáculo, não
apenas um de seus elementos, você, como profissional da área acredita que isso de
fato aconteça ou que ainda temos defasagem quanto ao objeto? Quais os pontos
que não podem faltar em uma crítica?
R. Deveríamos analisar o todo sim. Isso é óbvio. Como diria Sábato o crítico
não pode ter preconceitos. E olha a gente tem que estar no teatro. Ser um
espectador assíduo, como diz a crítica Mariangela Alves de Lima. E tem que gostar
e muito, porque a gente vê muita coisa ruim. É frustrante também e exige dedicação
– é estar 4 vezes por semana no teatro.
Agora, a crítica passa por um momento que você talvez possa trabalhar são
dois pontos: como a força das leis de incentivo mudou essa crítica e até que ponto a
crítica hoje, que cooptada pelo mercado é isenta e verdadeira.
As leis de incentivo mudaram a configuração dos teatros. É mais desafiador
entrar num Teatro para ter só bilheteria do que antes, porque não se trabalha mais
isso hoje. Para ensaiar você tem que pagar e quem decide, com as leis, quem
merece o palco é a iniciativa privada. Já ouvi produtores que foram captar para a
Bibi Ferreira que em encontros comerciais a pessoa diz que só faria uma temporada
curta porque a Bibi poderia morrer no meio e como fica? Mas, ele tecnicamente
ganhou isenção de imposto para estar ali. Pergunta se o Prêmio de Incentivo Infantil
e Jovem, anos feito em parceria da Coca teve incentivo dentro da empresa como
contrapartida? Não, só a isenção importa e não arte. E ainda não querem arriscar
prejuízos. Mas e a plateia e o interesse público. No Canadá uma produção que
ganha muito dinheiro de lei deve ajudar uma pequena a se projetar. Aqui não temos
contrapartida e não pensamos na arte. A crítica sofre com isso e reflete isso
também.
Por outro lado, os grandes festivais têm contratado críticos para escrever e
como fazemos com o nosso direito. Imagina se não é constrangedor que um crítico
fale mal de uma peça e no dia seguinte essa crítica esteja sendo distribuída para os
espectadores antes do espetáculo? No Festival de Curitiba deste ano diante do
espetáculo Domínio Público, que juntou os artistas que sofreram censura em 2017,
uma professora na plateia disse que o espetáculo a fez se sentir vazia e que aquilo
não era teatro. De forma elegante, ela perguntou se era essa a intenção? O curador
73
Guilherme Weber, então, pediu a palavra e disse que se sentia preenchido e não
vazio e defendeu a peça e o convite que tinha feito para eles estarem no palco. A
intenção dele não foi inibir nada, tenho certeza, mas o fez, porque o diálogo acabou
ali. Como curador ele exerceu um poder e o debate possível morreu. O que se viu foi
um monte de gente falando da onde vinha e como isso e a arte importavam para si.
Masturbação de palavras, sabe? Desculpa usar essa palavra.. rsrs. Mas ela define.
Até que a Renata (a atriz que trans que fez Jesus) fez uma fala linda sobre o para
quem se quer falar. Que a gente na vida só quer falar para quem é igual a gente,
exatamente igual e atingir esses semelhantes. E onde fica a crítica aí? A crítica é um
ponto de vista, uma maneira de olhar, mas se olhamos sempre para os mesmos
pontos e pessoas onde está o debate?
P. Bárbara Heliodora acreditava que a crítica começava antes do espetáculo
em si, desde a escolha dos atores, até a montagem, você concorda com esse
pensamento?
R. A Bárbara era uma mulher clássica em todos os sentidos. Eu não sou essa
mulher clássica, eu sou revolucionária... rsrs... Quando Sábato começou a escrever
ele olhou para aquilo que a crítica antiga odiava, como Nelson Rodrigues e fez um
trabalho muito importante nessa renovação. Então, como espírito jovem, eu evoco e
carrego essa responsabilidade de tentar ver o que não serve mais. A gente pega
vícios e moldes com a idade. Então, eu aprendo com as pessoas clássicas, mas
tento dar minha contribuição. E oxalá, um dia eu esteja nessa calçada como olhar de
um período, entende? A crítica ela não é dona da verdade é um ponto de vista que
tem lugar e conjuntura histórica. O Brasil tem essa mania de não guardar a história,
dizer que o Teatro foi refundado a cada movimento como se nada antes valesse.
Não dá para analisar nada sem olhar tempo e espaço. Acho que isso mudará com a
tecnologia, mas ainda não mudou... rsrs...
Por que dizer isso? Para tentar, elegantemente, discordar dessa musa e
mulher que impôs respeito na crítica brasileira. Processo não é Teatro e Teatro é no
palco. Você não pode ter preconceitos e olhar o ator sem a construção do
personagem. Senão é preconceito? Você vai julgar se fulano ou ciclano é bom para
isso ou aquilo sem ver? Teatro é conjunto e o conjunto a gente vê no palco. E o
crítico por mais que ele tenha seus vícios e um bom conhecimento – e a gente prevê
muita coisa que acerta – tem que estar aberto. Esse é nosso trabalho. O dia que eu
não sentir mais a emoção de me surpreender, de ficar puta com uma peça que não
74
funcionou ou algo assim, eu não serei mais crítica, porque não me fará sentido
sentar no Teatro quatro vezes por semana. E temos que ver tudo e sem
preconceitos. A comédia mesmo ainda sofre muito com isso. O público ama e a
crítica odeia. Nós, críticos é que temos que nos perguntar com quem temos falado e
não julgar o público jamais.
P. Você acredita que o espectador, hoje, concorda com o crítico apenas
quando o crítico concorda com ele? Se sim, então acha que existe alguma
adequação de alguns meios para corresponder com o gosto do leitor?
Acho que o panorama dessa questão vem de uma outra pergunta. A crítica
tem espaço? O interesse do público pela crítica ainda existe? Acredito que esse é o
limbo em que estamos. Helena Katz, crítica de dança, disse uma vez num debate da
Bienal SESC de Dança que o público ali lamentava o pouco espaço nos jornais para
a arte, mas que todas as vezes que o jornal corta o espaço não há efeitos drásticos
só quem se dói é a classe e não o público.
Até que ponto, então, a crítica importa. Cada vez menos as pessoas leem.
Certa vez vi uma matéria assim: “5 razões para ver a peça tal”. A matéria tinha um
abre e cinco questões e eu pensei: “será essa a crítica no futuro”? O mundo do CEO
em que títulos diretos vendem mais do que os de efeitos e tudo mais tem mudado a
crítica. Como fazer uma análise de algo em quatro parágrafos? Mais do que isso a
internet transformou todo mundo em crítico, então por que ler ainda uma crítica
especializada ainda?
Essa é a pergunta. O que te legitima a ocupar esse lugar e para quem você
ocupa. Por isso, o crítico de hoje deve se preocupar em trazer para o leitor, para os
vídeos... rs (esses estão mais em alta ainda) um panorama do que ele terá em cena
e a quem serve aquilo no palco. Como aquilo pode afetar um público e que público é
esse. Essa é a análise que faz sucesso hoje em dia. Análise de estéticas e etc
interessam à academia e não ao leitor.
P. O que a crítica teatral pode trazer de diferencial, quando bem feita, não
apenas ao seu leitor?
R. A crítica ela tem uma função hoje em dia que é a da divulgação, que é um
lugar diferente do de antes – quando analisava aquilo. O Daniel Piza, que escrevia
para o Estadão e morreu tão precocemente, teve um embate seríssimo com o
Wagner Moura e uma montagem de Hamlet que ele atuou e disse que o próprio ator
brincou não se importar porque o Teatro estava lotado e a crítica serviu também de
75
divulgação. É isso. A reflexão atualmente está em segundo plano hoje. Não sei se
isso é ruim ou é uma transformação – ou parte – da transformação que vemos hoje
na comunicação. Eu com o pouco espaço que tenho prefiro falar bem do que falar
mal. Ou sendo menos maniqueísta, falar do que preenche algo do que de algo
desnecessário ou terrível em vários aspectos. Mas, a crítica tem esse fundamento
atual, que ajuda ao teatro. Ninguém vai deixar de ir ao Teatro porque saiu algo com
uma estrela e metendo o pau. A polêmica vende também. Mas, quando se fala algo
bom e que direciona um público e mostra uma função, os grupos e peças têm usado
o escrito como propaganda para promover a peça e há casos de sucesso com isso.
Uma peça chamada Milhares de Cães Vindos do Mar, encenado no pequeno Teatro
da Cia Elevador, ganhou o APCA e chegou ao Centro Cultural porque a crítica
impulsionou o espetáculo e eles souberam cooptar isso em marketing. Os pequenos
espetáculos são sim os mais beneficiados, porque são os que carecem de espaço e
os grandes muitas vezes têm trabalhado mais na compra de mídia online, por
exemplo, do que preocupados com indicações.