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JORNAL DO CA 27 DE AGOSTO DE PSICOLOGIA 

segunda edição, 2021

novos caminhos

diferentes dificuldades

Colagem "O que se passou e não se viu nem se vê" de Júlia Paris dos Santos (estudante de Psicologia da PUC-Campinas)
JORNAL DO CA 27 DE AGOSTO DE PSICOLOGIA 

FALE CONOSCO
jornaldoCA27@gmail.com

Fotografia de Maria Luiza Nascimento - Estudante de Psicologia da PUC-Campinas

Nesta Edição

Editorial....................................................................3

Homenagem ao Quino.....................................4

Grupos de Pesquisa............................................5

Viver e morrer andam juntos........................7

Iniciação Científica.............................................10

Entrevista com Profissionais.........................12

Refrata Indica.......................................................17

Alguns motivos para se perguntar pela


história da Psicologia na PUC-Campinas.....19

Reflexões de um Prounista...........................34

Posicionamento do C.A. ................................36

Contribuições......................................................38

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JORNAL DO CA 27 DE AGOSTO DE PSICOLOGIA 

Editorial
Nesta edição trataremos de temas super
interessantes como o movimento estudantil e seus
lá, esta é a segunda edição do Refrata: jornal desdobramentos históricos nos campus, entrevistas
do Centro Acadêmico 27 de agosto de com profissionais de diversas áreas da Psicologia,
Psicologia da Puc-Campinas. É importante projetos desenvolvidos em centros de pesquisa,
ressaltar que nossa equipe editorial não é contendo relatos pessoais, matérias que
composta apenas por membros do C.A., mas, contextualizam o momento em que estamos vivendo
e permitem reflexões ampliadas e críticas sobre
sim, por membros do corpo estudantil da
nossa atuação, indicações de textos e livros, dentre
graduação e da pós-graduação de Psicologia, os
outras coisas que julgamos ser interessantes para os
quais compõem a Comissão do Jornal.
estudantes de Psicologia.
É fundamental compreender que essa
Sinta-se à vontade para expressar sua opinião,
comissão, assim como o C.A. e suas demais
crítica, ou sugestão para nós. Lembramos que esse é
comissões, estão sempre abertas para a
um jornal feito por alunos e para os alunos, sendo
participação de novos membros. Assim, se você
assim, a participação de todos é fundamental para
gostaria de contribuir, entre em contato
sabermos se estamos indo no caminho correto.
conosco e faça parte dessa nova proposta de
comunicação com os estudantes.
Assinado, Equipe Editorial.

QUEM
SOMOS
Graduação
Camila Gomes Garcia
5º ano
Júlia Paris dos Santos
4º ano
Giovana Molina
2º ano
Marcel Delfino Carvalho de Souza
5º ano
Maria Luiza Nascimento
2º ano
Fotografia de Maria Luiza Nascimento
Pós-Graduação (estudante de Psicologia da PUC-Campinas)
Letícia Gonzales Martins

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JORNAL DO CA 27 DE AGOSTO DE PSICOLOGIA 

HOMENAGEM AO QUINO
Criador de uma personagem de personalidade, Dentre algumas curiosidades sobre a pequenina
Joaquín Salvador Lavado Tejón, nasceu em está o fato de ter sido criada pelo argentino para
Mendoza, Argentina, em 17 de julho de 1932. um projeto publicitário de eletrodomésticos, mas
Quino, como ficou conhecido, deu vida a uma que não foi levado adiante. Mafalda ficou guardada
jovem garota chamada Mafalda e um universo de até que Quino foi convidado para publicar no jornal
personagens protagonistas de histórias em Primera Plana em 1964.
quadrinhos que foram um marco na cultura latina
A personagem chegou a representar os
e internacional. Em meio a um contexto de
pensamentos de Quino, já que em seu escritório,
mudanças políticas e cenários de grande tensão, o
por anos, uma placa que dizia “por motivos de
cartunista criou uma obra irreverente e de
timidez, não se aceita reportagem de qualquer
importância histórica.
tipo.” ficou pendurada. Quino falava através de
A pequena Mafalda é definitivamente uma ótima Mafalda e admitia isso, “optei pelo desenho porque
imagem representativa do pensamento crítico. falar é difícil para mim”.
Suas conclusões e observações afiadas acerca de
O cartunista argentino não se resumia à Mafalda,
um mundo tão caótico, mesmo que com a
mas sua personagem de maior sucesso é a mascote
simplicidade de uma criança e com frases curtas,
deste jornal universitário, cuja equipe editorial
mal cabiam nos balões dos quadrinhos. A
busca, com o mesmo entusiasmo e perspicácia,
personagem inspira a repensar a realidade que
relatar o que vivemos de maneira crítica, mas sem
nos cerca e da luta diária para alcançar cada
deixar de lado a simplicidade dos pensamentos por
conquista.
si próprios. Escrever, relatar, contar o que acontece
Fosse a paz mundial, política ou a desigualdade, vai muito além de registrar meros fatos, é um
as histórias criadas por Quino serão eternamente processo de aprendizado, crescimento e
lembradas por falarem sobre humanidade. Por autoconhecimento.
décadas Mafalda resumiu realidades em poucas A pequena personagem argentina que ficou tão
palavras e em diálogos com seus amigos, pais e grande, acabou por se tornar símbolo da luta pela
professores. Com aguçada noção do mundo, igualdade, pela educação e pela liberdade. Quino se
comentou desde alguns dos maiores foi, mas Mafalda fica como lembrete atemporal do
acontecimentos da história até reflexões sobre a mundo que queremos construir e da luta que
existência humana. travamos todos os dias contra a opressão.

Nosso eterno
agradecimento a Quino.

¡Adiós maestro!

Matéria redigida por:


Júlia Paris dos Santos,
estudante do quarto ano
de Psicologia na PUC-
Campinas.

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JORNAL DO CA 27 DE AGOSTO DE PSICOLOGIA 

GRUPOS DE PESQUISA
Psicologia e Trabalho: Abordagem Experiencial: Grupo coordenado pelo
Prof. Dr. João Carlos Caselli Messias

Eduardo Henrique Tedeschi Como tem sido sua experiência nesse grupo
Mestrando em Psicologia na PUC-Campinas, tem de pesquisa?
Especialização em Psicologia Fenomenológico
Tem sido bastante transformadora. A princípio
Existencial: Existere (Campinas), Aperfeiçoamento
pensei que não faria sentido para mim estar no
em Orientação Profissional e de Carreira - Instituto
de Psicologia USP. Graduado em Psicologia pela grupo, ou mesmo entrar na pesquisa naquele
UNIP Campinas, em 2016. momento, mas o professor João Carlos Messias me
acolheu, assim como acolhe a todos e todas que
Sobre o que você está pesquisando desejam conhecer o grupo, e isso fez com que
atualmente? crescesse meu desejo de estar neste grupo e poder
Atualmente pesquiso o tema do trabalho de desenvolver a minha pesquisa. Tenho aprendido
pessoas com deficiência intelectual, mais mais a cada momento com meus colegas. O grupo
especificamente o papel da família no apoio ao é bastante heterogêneo, o que provoca a
desenvolvimento do sentido e construção de pluralidade de ideias e o enriquecimento de todos.
identidade para o trabalho destes indivíduos.

O que te despertou o interesse pela


pesquisa em Psicologia?
Desde a graduação tive interesse em transmitir o
conhecimento que adquiria com a minha
formação, percebi que a pesquisa seria um
caminho que facilitaria este processo, porém
necessitei trabalhar por questões financeiras, me
organizei durante os últimos quatro anos para
poder estar no mestrado em psicologia, durante
este tempo trabalhei com o público com
deficiência e percebi que poderia contribuir com
esta realidade produzindo conhecimento a respeito
desta questão.

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GRUPOS DE PESQUISA

Mônica de Oliveira Rocha


Doutoranda em Psicologia pela PUC-Campinas,
Mestrado em Psicologia na mesma instituição. Tem
MBA em Gestão de Negócios pela FGV, Pós
Graduação em Administração de Empresas pela
FGV. Especialização em Administração de Recursos
Humanos pelo INPG. Pós Graduação em Psicologia
do Desenvolvimento em Pediatria pela Unicamp.
Graduada em Psicologia pela PUC-Campinas.

Sobre o que você está pesquisando


atualmente?
No momento estou participando de uma pesquisa,
coordenada pelo meu orientador, Professor João
Carlos Caselli Messias, sobre o sentido do trabalho
que professores de Ensino Médio e Fundamental I
estão atribuindo ao seu trabalho, em tempos de
pandemia de COVID-19.

O que te despertou o interesse pela


pesquisa em Psicologia?
Tão logo me formei minha opção de carreira foi
ingressar no mercado de trabalho, especificamente
na área de Educação Corporativa e
Desenvolvimento Organizacional.

Durante esta trajetória realizei cursos de pós-


graduação direcionados à minha necessidade
O GRUPO NO SITE DA profissional. Realizar mestrado e doutorado era um
PUC-CAMPINAS sonho antigo, que foi planejado e viabilizado em
2018. A busca pela pesquisa em Psicologia foi
O propósito essencial do grupo motivada pelo interesse em compreender, com
consiste em pesquisar aspectos maior profundidade, alguns fenômenos que
psicológicos envolvidos na relação ocorrem no ambiente de trabalho. Retornar à
das pessoas com o trabalho em suas Puccamp também é motivo de orgulho. Me traz
múltiplas dimensões com a um sentimento de pertencimento.
finalidade de produzir conhecimento
passível de promover saúde e Como tem sido sua experiência nesse grupo
qualidade de vida no trabalho, de pesquisa?
estratégias de intervenção e proteção Muito positiva. Os temas pesquisados são
interessantes e relevantes, a equipe é acolhedora,
a transtornos mentais ocupacionais.
comprometida e tem um perfil que alia experiência
O referencial metodológico adotado
profissional, com interesse acadêmico. Nosso
é qualitativo fenomenológico e a
orientador, Professor João Carlos Caselli Messias,
subjetividade é compreendida a facilita a interação do grupo, proporciona
partir da Abordagem Experiencial de oportunidade de participação em diversos projetos,
Eugene Gendlin. tem uma postura agregadora e facilitadora em
nosso processo de desenvolvimento. Esses fatores
foram decisivos para minha continuidade na
pesquisa, agora como Doutoranda.

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JORNAL DO CA 27 DE AGOSTO DE PSICOLOGIA 

VIVER E MORRER ANDAM

JUNTOS
Essa matéria surge da necessidade de falarmos É, portanto, ter de lidar com a responsabilidade de
sobre lutos e perdas, enquanto psicólogas em encarar sua própria história, não como um produto
formação, uma vez que estamos inseridos em uma final, mas como um processo que ainda está sendo
cultura que não costuma falar sobre a morte. Dessa significado. O que vivi? Gostaria de ter feito algo
forma, inicialmente, falar sobre esse tema também diferente? O que é realmente significativo para
pode ser (e foi) um desafio para nós, enquanto mim? Ao pensar na morte, também podemos
sujeitos. ressignificar o momento presente. Mas morrer, para
além de um processo de existência, causa dor a
O contexto atual nos faz encarar a morte
quem fica.
cotidianamente. Além da perda de entes queridos,
também fomos forçados a alterar Você já deve ter ouvido falar das famosas “fases do
significativamente muitas de nossas tarefas luto”: negação, raiva, barganha, depressão e
cotidianas e evitar o contato presencial com aqueles aceitação. Compreendemos que esse “modelo”
que amamos. De início, tendemos a acreditar que deve ser repensado, uma vez que traz uma visão
somente a morte de alguém próximo gera um linear, ao invés de abordá-lo enquanto processo.
processo de luto, no entanto, todos esses aspectos Nele, dá-se a impressão de que basta seguir esses
podem exigir um processo de luto para que passos, nessa respectiva ordem, que o luto está
possamos superá-los. Mas como assim todos? O elaborado. No entanto, é preciso lembrar que o luto
processo de luto não é restrito à morte, mas a é um processo experienciado de diferentes formas
perdas significativas que enfrentamos ao longo da por diferentes sujeitos. Cabe refletir: Quem
vida, sendo assim, perder o contato presencial com determina o que é um processo de luto e o que é
sua família, perder um emprego ou perder uma depressão?
rotina, também podem despertar sentimentos de
perda. Não pretendemos aqui desenvolver um
trabalho teórico sobre as definições de luto para Título inspirado no Livro:
cada abordagem ou manual, mas despertar
reflexões sobre esse tema tão latente em nosso
cotidiano atual.

Vivenciamos tempos doentios, mas a expansão


tecnológica nos fez encarar a vida a partir de muitas
possibilidades de longa duração. Em tempos
doentios, trazer à tona o adoecimento é aproximar-
se com a morte. Nos esquecemos que somos meros Bom dia,
mortais? Encarar as doenças e os processos de
morrência tem se tornado fundamental. Ignorar, por Angústia de
outro lado, as perdas e não confirmar as dores André
enfrentadas atualmente, podem tornar o processo
de luto complicado. Comte-
Sponville
Evita-se pensar na morte, pois atribuir um sentido
de finitude à vida é ter de atribuir significados
importantes à existência, significados estes que
ultrapassem as tentativas de se preencher diante da
lógica do imediatismo mercantil.

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VIVER E MORRER ANDAM JUNTOS

Quem deve especificar o tempo “correto” para


elaborar o luto? É importante compreender que
existem diversas maneiras de experienciar perdas
significativas, contudo essas maneiras perpassam
pelas ideologias prescritas no delineamento da
ordem social, que conduzem, muitas vezes, a
concepções patologizantes do luto.Ainda é muito
presente em nossa sociedade a visão de
superioridade do profissional de saúde em relação
ao sujeito que é atendido, ou seja, existe o
pressuposto de uma relação vertical, em que o
profissional de saúde sabe mais, e é superior, ao
usuário do serviço. Esse fator, somado ao fato de
que vivemos em uma sociedade que valoriza a
felicidade desesperadamente, pode agravar
situações de patologização e medicalização do luto.
A palavra para 2020 é perda.
Nós perdemos.
Sendo assim, é importante que nós tenhamos
muita sensibilidade e cuidado, ao entrar em
Perdemos abraços. contato com situações de luto, para não perpetuar
Perdemos possibilidades de conhecer o outro. essa lógica.
Perdemos almoços no domingo com a família.
Perdemos apoios.
Perdemos pessoas. Assim como começar esse texto foi difícil, finalizá-lo
Perdemos as chances de concretizar planos. também o é. Não temos uma conclusão única a ser
Perdemos sonhos. tirada dessas reflexões, apenas esperamos que elas
Perdemos empregos.
tenham feito você pensar sobre o luto de maneiras
Perdemos a segurança (ainda que sobre alguns aspectos, ilusória)
de longevidade. diferentes, e que a morte não seja mais um tema
Perdemos a paz de saber que alguém está bem. tão distante, afinal, viver e morrer são parceiros
Perdemos nosso senso de coletivo. nesta caminhada.
Perdemos nossas certezas.
Perdemos diversas vezes a chance de olhar genuinamente o/para Matéria redigida por:
o outro. Camila Gomes Garcia,
estudante do nono período de Psicologia na PUC-Campinas,
Mas nós também perdemos alguns medos. Letícia Gonzales Martins, mestranda
Perdemos alguns jeitos ensimesmados de olhar as coisas. em Psicologia como Ciência e Profissão na PUC-Campinas.
Perdemos nosso foco no futuro e pudemos olhar mais para o
presente.
Perdemos opiniões e reconstruímos compreensões sobre nós e
os outros.
Perdemos nossos vieses de que não conseguiríamos nos
organizar.
Perdemos o jeito de demonstrar afeto: se antes era pelo "fazer",
aprendemos a "ser".
Perdemos nossa ideia de mundo e de certo/errado a partir de
uma perspectiva individual.
Perdemos hábitos desnecessários e ampliamos nossa potência.
Perdemos a certeza de nossa inteligência e vimos o quão
perdidos estamos. Nós nos perdemos de - um antigo,
consolidado - nós.
Mas isso faz lembrar Clarice:

"Andava olhando os edifícios sob a chuva, de novo impessoal e


onisciente, cego na cidade cega; mas um bicho conhece a sua
floresta; e mesmo que se perca – perder-se também é caminho".

Que não nos esquecemos disso: nós perdemos. Mas perder-se


também é caminho.
Que agora, para além das grandes metas e planos, a gente
consiga lidar, aprender e crescer com as nossas perdas. E (porque
não): com o outro. Dica de podcast
Com afeto,
Juliana Soares
CRP: 06/125360

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JORNAL DO CA 27 DE AGOSTO DE PSICOLOGIA 

REFRATA PÁGINA 9
estudante de psicologia na PUC-Campinas
JORNAL DO CA 27 DE AGOSTO DE PSICOLOGIA 
Fotografia de Maria Luiza Nascimento

INICIAÇÃO CIENTÍFICA
A EXPERIENCIA DE UM ESTUDANTE

Esse texto foi escrito a partir de um projeto da equipe editorial que buscava dar alguma luz sobre os
caminhos na vida acadêmica e suas possibilidades na nossa universidade. Escrevi o seguinte relato
querendo mostrar a relação com os estudos que me levou a Iniciação Científica, não ressaltando outros
aspectos mais críticos e objetivos desta. Ao leitor ou leitora que busca por informações a esse respeito,
sugiro consultar o Manual dos calouros 2020, confeccionado pelo C.A. de Psicologia
(https://drive.google.com/file/d/1PMQEecwAGS1BFqIa70Axdg_twOAX3SZQ/view?usp=sharing).

Sobre Simone Weil, encontrei um outro texto


Sou um aluno de Psicologia e faço Iniciação
escrito por Ecléa que, realmente, me arrebatou e
Científica na área de Ciências da Religião e
me fez comprar um livro seu, que comecei a ler
Teologia, na nossa universidade. Foi onde eu
entusiasmado, mesmo sem entender o que eu lia.
consegui estudar Psicologia como eu queria.
Essa foi uma época de uma leitura, talvez, não
Na biblioteca do nosso campus, quando entrei no
muito alegre, mas muito insistente de ir atrás de
curso, eu vivia paquerando os livros da parte de
algo que aqueles textos pareciam esconder ou
Psicologia Social e Antropologia, um deles era o
que davam pistas. Muitos dos meus intervalos e
“Memória e Sociedade: lembranças de velhos” da
almoços foram na biblioteca, nessa época.
psicóloga social, Ecléa Bosi (1936-2017). Nele, eu
encontrei com algumas reflexões e uns nomes que Era como se eu estivesse atrás de uma parte dos
me intrigaram e acabaram por se tornar minha textos que eu lia que parecia não existir. Esse foi
companhia de estudo até os últimos anos, Simone um momento importante para minha introdução
Weil (1909-1943) e Walter Benjamin (1892-1940) em na Iniciação Científica, de aprender a procurar
específico. com vontade.

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INICIAÇÃO CIENTÍFICA A EXPERIÊNCIA DE UM ESTUDANTE

Eu mais queria saber do que sabia quando eu lia Eu, morando no centro, fico à distância de um
esses textos. Em certa medida, é assim até hoje. ônibus do Campus II e um ônibus do Campus I. As
reuniões do grupo são quinzenais, então não fica
Foi em uma aula de Antropologia Teológica B que
muito corrido, mas exige um pouco de esforço e,
eu ouvi falar, pela primeira vez, dessa Psicologia
também, mais gastos com passagens de ônibus.
que eu via, enquanto estava na universidade,
somente na biblioteca: a professora, Ceci Baptista, O grupo RELINC é formado por graduandos,
citou durante uma aula o nome de Simone Weil. mestres e doutores de diversas áreas, da
Quando eu ouvi, não pude deixar de externar Sociologia, da Filosofia, da Ciências da Religião e
minha alegria para ela em, depois de 1 ano e meio Teologia e, não somente eu, da Psicologia
na universidade investigando um caminho entre a também. No grupo, organizamos juntos nosso
sala de aula e a biblioteca, ouvir pela 1º vez um cronograma de atividades, lemos textos, assistimos
rastro legítimo daquilo que me fascinou lendo e gravamos as apresentações de trabalhos,
aquelas autoras, mesmo sem eu entender ao certo discutimos estética, literatura, dança, teatro,
sobre o que elas falavam. cinema e uma série de outros assuntos que
vinculam Religião, Linguagem e Cultura.
Fui até a professora, ao fim da aula, e perguntei se
existia algum grupo de pesquisa do qual ela Enfim, os caminhos criados ou descobertos entre a
participava ou se ela sabia de algum em que, de sala de aula e a biblioteca foram possíveis no
alguma forma, era possível estudar Simone Weil. exercício de uma leitura sincera e um percurso que
Ela me disse que fazia parte do grupo “Religião, não se resume a sair da biblioteca em direção a
Linguagem e Cultura” (RELINC), lá no Centro de sala de aula e vice-versa; envolve, na verdade, a
Ciências Humanas Sociais e Aplicadas (CCHSA), no vida do estudante em uma realidade social, onde
Campus I, me entregou, na semana seguinte, o seu muitas vezes o caminho se dá em meio a um não
projeto de pesquisa impresso e me disse para ler e saber inflexível, sobre o qual a vontade se fortalece
pensar em algo que eu gostaria de estudar na e encontra apoio firme para ir mais adiante.
Iniciação Científica, escrever um texto sobre esse
No final de 2019, conversei com minha orientadora
tema e enviar à ela por e-mail.
sobre a possibilidade de dar continuidade a
Lembro que cheguei em casa, nesse dia, dei uma aproximação ao pensamento de Simone Weil e ela
olhada na descrição do grupo no site da PUC- me solicitou, novamente, que eu escrevesse um
Campinas e, depois disso, me dediquei a escrever o novo projeto. Agora, com ele aprovado, estudo essa
texto para a Ceci, que gostou da ideia. Um tempo Psicologia que eu queria conhecer, mas que ainda
depois, ela me pediu para que eu escrevesse um mais quero do que sei algo ao certo.
projeto. Tive que escrever o projeto sozinho e as
aulas de Pesquisa em Psicologia com a professora
Cristina Dib me ajudaram bastante. “Simone Weil e
o estudar: a experiência mística da atenção”, esse
foi meu primeiro projeto. Foi feito sozinho e sei que Matéria redigida por:
não ficou como, hoje, imagino que deveria ficar, Marcel Delfino Carvalho de Souza
mas fui contemplado com a bolsa da nossa reitoria Graduando em Psicologia no 9º semestre e
e segui muito feliz conhecendo o mundo da membro do grupo de pesquisa “Religião
pesquisa. Linguagem e Cultura” (RELINC).
Desde de 2018 participo das reuniões do RELINC,
onde encontrei novas companhias de pesquisa -
muitos desses, próximos dos meus companheiros
de estudo, Simone e Benjamin -, o que certamente
favoreceu minha formação no campo das Ciências
Humanas, almejada desde que comecei a ler
aquelas autoras no inicio da graduação. Esses
encontros aconteciam no Campus I, ao menos
antes da quarentena, ultimamente têm ocorrido
online.

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JORNAL DO CA 27 DE AGOSTO DE PSICOLOGIA 

ENTREVISTAS COM

PROFISSIONAIS
Profissional: Luana Maria de Oliveira CRP 06/130492
Conclusão do curso: 2015
Área de atuação: Psicologia Hospitalar
Como você avalia a relação entre sua
formação e as atividades que você
Descreva um dia comum do seu trabalho: desempenha atualmente?
O dia a dia no hospital é muito dinâmico. A rotina
Durante a graduação, algumas disciplinas foram
inicial é levantar os pacientes que estão
essenciais para minha área, como, Psicologia na
internados. Posteriormente, atendo os pacientes a
Saúde, Políticas públicas e os estágios na área da
partir de busca de demandas ativa ou por
saúde. Além disso, as disciplinas eletivas,
solicitação da equipe Multiprofissional. Os
auxiliaram para ampliar meu conhecimento sobre
pacientes são atendidos beira leito e seus
a área. Direcionei minhas escolhas e realizei as
familiares, quando presentes também recebem
disciplinas de Psico-oncologia e Clínica Ampliada.
apoio psicológico. Após cada atendimento
No momento dos estágios pude escolher pela área
realizado é feita uma evolução em prontuário,
em que daria ênfase, escolhi o estágio de
respeitando as questões éticas do sigilo. Outra
Psicologia Hospitalar, pois já tinha optado por
atividade que faz parte da rotina no hospital, são as
tentar a residência multiprofissional. Essa
Visitas Multiprofissionais, nas quais, os profissionais
possibilidade de escolha enriquece a nossa
se reúnem para discussão de caso, decisão de
formação e preparação para a prática e o estágio
condutas e compartilhamento de saberes. Ao final
realmente nos insere na prática do dia a dia da
do dia, é realizado uma marcação dos pacientes
profissão. Destaco, que no início da vida
atendidos e demais informações relevantes para
profissional senti falta, e acredito que em nossa
gerar indicadores dos atendimentos psicológicos.
formação pudéssemos ter mais disciplinas e
É necessário um planejamento dos atendimentos,
estágios que favorecessem a formação com a
quais as prioridades, entretanto, como tudo é
integração multiprofissional e aprofundar mais nas
muito dinâmico, pode haver uma urgência
práticas e realidades do Sistema Único de Saúde
psicológica em outra unidade do hospital, um
(SUS). Posteriormente, realizei a Pós-graduação,
chamado para acolher e acompanhar uma
Residência Multiprofissional, e experimentei uma
comunicação de óbito, etc. Por isso há uma
inserção integral na área da Psicologia Hospitalar.
flexibilidade e mudanças na rotina de
atendimentos.
Como considera seu trabalho importante?
O que despertou seu interesse pela área? Trabalhando como Psicóloga Hospitalar consigo
Quando tive a disciplina Psicologia na saúde, na enxergar a importância do meu trabalho, pois
graduação, a Professora, Dra Nely Nucci, despertou acolho o paciente e seu familiar, talvez no maior
em mim o interesse ainda maior pela Psicologia momento de fragilidade de sua vida. Consigo
Hospitalar. Ela contava suas experiências, falava avaliar o alívio proporcionado aos pacientes, ao
sobre a rotina, vivências dentro do hospital e eu trabalhar para um melhor enfrentamento e
identifiquei que era nesse contexto em que adaptação à dificuldade vivida. Além disso,
gostaria de atuar. Queria realizar atendimentos enquanto Psicóloga Hospitalar, apresentamos para
pontuais, trabalhar em equipe, conhecer sobre os demais profissionais o lado emocional do
diversos adoecimentos físicos e poder amenizar o paciente, os sintomas psicológicos e as relações
sofrimento, cuidando da parte emocional. Sem importantes para sua vida, ampliamos o olhar da
dúvida foi um grande despertar tê-la ouvido e equipe e possibilitamos uma visão integral da
desejar ter experiências como as que ela contava. pessoa, não apenas um corpo adoecido.

REFRATA PÁGINA 12
ENTREVISTAS COM PROFISSIONAIS

Ao estar atuando em equipe, trocamos


experiências e acolhemos também a equipe,
ofertando escuta e compreensão para o
sofrimento e estresse que o cuidar gera. A cada
recuperação, a cada palavra que estava guardada
gerando sofrimento e interferindo na recuperação
física, que consegue ser dita e elaborada durante o
atendimento, há a importância de um
atendimento da Psicologia Hospitalar. A cada
processo de nascimento e morte que
acompanhamos há um maior espaço para vivencia
e elaboração dos que ali estão enquanto sujeitos,
vistos e atendidos de uma maneira integral.

Como seu trabalho afeta a vida


das pessoas?
Na maioria das vezes, o hospital é um lugar visto
como frio, disparador de medos, dor e tristeza. A
psicologia Hospitalar quando acompanha um
paciente e sua família nesse contexto, pode
proporcionar uma mudança, no sentido de
mudança de percepção, esse ambiente pode ser o
disparador de resolução de problemas, de
despedidas amenas, de construção de novos
hábitos e, sem dúvida, de crescimento pessoal.
Acolhemos as dores e medos das pessoas, isso a
afeta a sua vida. Cada paciente que é atendido,
volta a ser a pessoa que internou, deixam de ser
apenas o número do quarto, o exame ou cirurgia a
ser realizada. Falam sobre o que viviam fora desse Para ilustrar um pouco, tenho certeza que
contexto, seus sentimentos, contam sobre a afetamos a vida das pessoas, seja no nascimento
família, não conversam apenas sobre os remédios ou no processo de morte, em momentos agudos
e dores físicas. ou crônicos. Quando atendemos uma paciente
que não aceita o filho que acabou de nascer e
conseguimos acolher, escutar, valorizar e respeitar
os sentimentos que ela está sentindo e ajudamos a
equipe a fazer o mesmo, a pessoa consegue
elaborar melhor a situação, compreender o que
está acontecendo e iniciar o processo de cuidado
ao seu bebê. Quando a família e seu ente em
estado terminal não querem aceitar a morte e
escondem os sentimentos, não falam sobre os
desejos para o fim de vida e sofrem sozinhos,
criando “muralhas do silêncio”, nós podemos
mediar a relação, ficamos juntos e suportamos a
dor das pessoas, com elas. E como é reforçador
quando vemos o afetar da nossa profissão:
despedidas, pedidos e compartilhamentos que
geram alívio para o paciente e sua família. Com
tudo isso, afetamos a vida das pessoas de maneira
positiva, para o crescimento pessoal.

REFRATA PÁGINA 13
ENTREVISTAS COM PROFISSIONAIS 

Profissional: Felipe de Martino Pousada Gomez CRP 06/87444,


Formação: 2008 (PUC-Campinas)
Área de atuação: Psicologia Jurídica/Forense

Psicólogo autônomo desde sua formação,


atua como psicólogo clínico, área jurídica
como perito psicólogo, assistente técnico
parecerista e consultor independente.

Descreva como é o dia a dia do seu


trabalho.
O termo forense e jurídico são sinônimos porém
alguns autores fazem algumas distinções em
relação a isso. No Brasil, especificamente, se usa
psicologia jurídica como uma menção para uma
especialidade [reconhecida pelo CRP/SP]. No meu
caso especificamente, optei pelo trabalho
autônomo pela trajetória pessoal que presenciei e
me identifiquei. Esse trabalho aconteceu da
seguinte forma: eu me cadastrei nos tribunais para
oferecer meu trabalho porque é possível um
De onde partem essas nomeações que você
citou?
profissional prestar trabalhos dessa maneira e,
através dos [clientes] particulares para serviços As nomeações vêm do tribunal, no qual o
judiciais. Quando não há processos judiciais eu fico profissional se cadastra para trabalhar como perito,
disponível para dar uma consultoria. Essas são e quando no meio de um processo judicial existe a
formas de trabalhar como um profissional desse necessidade daquele trabalhador, o juiz e sua
campo. É possível também seguir esse ramo equipe nomeiam o profissional que está
prestando concursos públicos, desta maneira é cadastrado.
uma forma de estar inserido em um quadro do
tribunal. Existe alguma diferença entre ser
cadastrado ou concursado?
Minha rotina de trabalho como consultor
autônomo é diferente de uma rotina de trabalho Basicamente, o trabalho ocorre da mesma forma,
do profissional concursado. No meu caso, o fluxo de o que muda são coisas pequenas como por
encaminhamentos é grande, então quando eu exemplo a posição que o profissional se classifica.
recebo esses encaminhamentos é através das O profissional que trabalha de forma autônoma
nomeações da necessidade de um perito, ou não está dentro de um serviço, então talvez ele
quando sou procurado por umas das partes de tenha condições diferentes, por exemplo o tempo
maneira privada. Ou seja, uma dia normal de dos prazos que ele pode resolver aquela situação,
trabalho envolve esses tipos de situações, com pois a demanda que vem pra ele, não é em um
burocracias e atividades que envolvem as tempo em que se torna obrigação. Sua carga
nomeações, que seria responder termos, chamadas horária torna-se mais flexível. Então existe uma
no tribunal, realizar petições, responder de uma pequena diferença em relação aos prazos e
maneira que o ambiente exige com um remuneração.
comportamento e respostas específicas, então isso O trabalho é o mesmo, mas determinadas
faz parte do meu dia a dia. Também faz parte da condições podem interferir, o perito que não é
minha rotina avaliar pessoas, fazer entrevistas, concursado, ele pode ter condições mais favoráveis
avaliações psicológicas, exames com algumas em relação a essa função e realizá-lo com uma
finalidades particulares, entrevistas com crianças e qualidade melhor, diferente de um profissional
a elaboração de documentos. que está dentro de um quadro que apresenta
Atuo também como professor de cursos de algumas limitações interferindo na realização do
capacitação de profissionais dentro dessa área serviço que ele presta.

REFRATA PÁGINA 14
ENTREVISTAS COM PROFISSIONAIS

O que despertou seu interesse pela área? Qual a diferença entre assistente técnico e
perito e qual o papel que cada um cumpre?
Durante a minha graduação aconteceram duas
coisas que me despertaram a curiosidade do O profissional que tem uma graduação
campo jurídico. Primeiro foi uma professora que eu reconhecida pelo MEC e um respectivo conselho
conheci da PUC-Campinas que é a Maria Fátima de classe eles podem atuar como perito.
Franco dos Santos. Ela mostrou a forma de Compreende-se que o perito é um expert em um
trabalho dela e mesmo eu estando interessado em determinado assunto. No caso do psicólogo, ele
clínica eu me importei na forma como ela pode ter essa atuação em perícia psicológica. A
trabalhava, aquilo foi me chamando atenção. atuação de um psicólogo perito acontece quando
Vendo uma mulher, psicóloga, perita, professora dentro de um processo judicial houver a
que conseguiu seu espaço no mercado de trabalho necessidade de uma matéria que possa ser
e se fazer respeitada em toda sua competência explicada por um profissional que é um expert
como profissional e pessoa, e aquilo serviu de neste assunto e então este profissional é chamado.
inspiração para mim. No começo da minha carreira No caso da Psicologia, envolve também a
eu tive muita dificuldade na área em que eu estava realização de exames e avaliações de pessoas,
exercendo, que era a clínica, por questões de então o profissional que é reconhecido como
emprego então, eu resolvi me tornar autônomo, eu perito no caso judicial, não é um título nem fica
tinha uma identificação muito grande na questão classificado como um período para sempre e nem
social, tinha trabalhos em ONGs, trabalhei também um cargo, mas sim alguém que é chamado para
com capoeira pois, era uma formação que eu exercer aquela função naquele momento (a
investi antes da Psicologia o que me ajudou na perícia). Como perito, ele vai saber responder
área social. Apesar disso, eu senti uma dificuldade aquilo que precisa ser respondido, vai saber
para eu sobreviver enquanto psicólogo, cheguei a articular a demanda necessária naquela tarefa.
pensar que não daria certo se eu continuasse Essa é a atuação do psicólogo como perito, o qual
trabalhando daquela forma. Ao mesmo tempo, eu é convidado pela justiça para atuar, seja como
estava dando início a um mestrado para trabalhar autônomo ou concursado.
com a área acadêmica, e depois disso comecei a
pensar em outras formas de trabalho e foi aí que Quando isso ocorre, cada uma das partes
cogitei na área jurídica, uma possibilidade. envolvidas no processo tem o direito de contratar
um profissional da mesma expertise do perito para
Então fui realizar o curso de capacitação daquela ser assistente técnico naquela matéria. É como se
professora, e a partir de então eu passei a me ele fosse um “perito particular”, que também pode
inserir nesse mercado. Compreendi que eu fazer avaliações, entrevistas. Ele também pode
poderia sobreviver melhor e fiquei feliz em saber dialogar com o perito, questionar, manifestar e
que poderia ajudar as pessoas e servir o judiciário. complementar o trabalho do perito.
O processo começou comigo agregando cursos
dessa área, passei a fazer supervisões, e de
sequência o fluxo dessa atividade foi aumentando,
até que se tornou o meu principal foco, deixando
de ser algo complementar à clínica. Após um
tempo eu me dediquei também a capacitação de
passar esse conhecimento para outros
profissionais, pois ensinando e passando essa
informação para outras pessoas contribuiria para
área.

REFRATA PÁGINA 15
ENTREVISTA COM PROFISSIONAIS

Quais são os temas e/ou casos mais


frequentes no seu trabalho?
Tenho bastante trabalho no âmbito familiar, e
dentro deste tema, vou ter avaliação de casos que
envolvem questões de de guarda e
regulamentação de visitas por exemplo. Questões
de violência doméstica, de abuso. Situações que
vou avaliar crianças, crianças em situação de
abuso, em situação de violência. Na área civil
envolve questões ligadas à sanidade mental,
pessoas que precisam de uma tutela, casos que
envolvem assinatura de documentos, testamentos,
casamentos e até questões de pessoas já falecidas
que precisam ser resolvidas na justiça (autópsia
psicológica). Além disso, na área do trabalho
aparecem mais questões relacionadas a danos
morais e assédio moral no trabalho.

Como você avalia sua formação na


graduação com o que você trabalha
atualmente?

Estou muito satisfeito com a minha formação,


gostei da PUC, achei que foi um diferencial na
minha educação. Porém, muito do que sei e
precisei saber pra trabalhar dentro da minha área
eu precisei buscar fora da universidade. Os cursos
de capacitação da área de forense principalmente, Na sua visão, como seu trabalho afeta a vida
elas acrescentaram mais do que os estudos
das pessoas?
acadêmicos e teóricos que foram apresentados pra O trabalho do psicólogo no geral tem um objetivo
mim. Em relação à instituição até senti uma de olhar profundamente para a vida das pessoas.
ausência de informações desse campo. Por isso Dentro desse campo o profissional vai ter uma
acabei indo buscar complementos em outros participação e responsabilidade muito alta pelo
lugares. Só um conhecimento teórico não ia me impacto que ele vai promover. Pois, ele vai estar
ajudar, precisei conciliar com estudos práticos e diante de questões muito importantes e
supervisões. individuais na vida daquelas pessoas, tornando-se
primordial para aqueles que necessitam de seu
trabalho.

Que mensagem você gostaria de passar


para os estudantes de Psicologia?
As entrevistas foram realizadas de forma
Que a minha história sirva para mostrar duas
remota no segundo semestre de 2020 coisas a você, a primeira a abrangência da área da
psicologia e a segunda, como a psicologia vem se
por Camila Garcia e Letícia Martins.
tornando a ciência do futuro, pois ela está cada vez
mais necessárias em empresas, em famílias, em
instituições e como entender o ser humano tem
sido cada vez mais importante.

REFRATA PÁGINA 16
JORNAL DO CA 27 DE AGOSTO DE PSICOLOGIA 

REFRATA INDICA
Texto de Pedro Misailidis Antonini*

Em 2014 a Editora Alínea publicou uma tradução


do livro “Revolução na psicologia”, de Ian Parker,
traduzido por diferentes pessoas, mas com grande
contribuição da professora Raquel S. L. Guzzo,
daqui da PUC-Campinas. Como primeira
impressão, adianto que fiquei com a sensação de
que devia ter lido esse livro antes, no início da
graduação, e que se o fizesse teria aproveitado
mais ele.

A proposta do livro me pareceu ser explicar tintim


por tintim o caráter ideológico de cada pedacinho
da psicologia, desde a neuropsicologia até a
abordagem centrada na pessoa (ou seja, desde o
positivismo até o humanismo). Dessas críticas, o
Ian Parker não deixa passar a psicanálise e a
psicologia social, para quem acha que elas são a
solução de todos os problemas da psicologia, e
também a teoria transpessoal, que muitas vezes é
vista como fora do problema.

É um livro muito bom de introdução justamente


porque o autor se propõe a falar de tudo. Por se
propor a falar de tudo, ele não se aprofunda em
nada - ou em quase nada -, o que de certa forma é
ruim, mas tem literalmente referências por toda
parte. Nada do que ele fala é deixado sem dizer Também é importante lembrar, já que falei da
onde você pode ir atrás e além disso ele origem do Ian Parker, que não é por ele ser
frequentemente dá uma referência para um britânico que ele não pensa e não escreve sobre
contra argumento daquilo que está posto em questões como o colonialismo e também a
questão - e às vezes até um “contra contra América Latina, que na realidade são temas muito
argumento”. explorados por ele.

Mas isso coloca uma questão no livro: o autor é Sendo um livro tão abrangente, passando por
britânico, então as referências que ele passa pra questões que não são tão simples e com um pano
gente na maioria das vezes não são daqui, o que de fundo complexo (o de denunciar o caráter
torna difícil a tarefa de achar elas. A maioria das ideológico da psicologia), não seria uma surpresa
que dá pra achar são em inglês, o que é ruim pra se ele tivesse uma leitura difícil. Mas, pelo
quem não fala a língua - como é o meu caso -, contrário, é uma leitura muito fácil. Não exige
além de que na edição em que o livro foi publicado muito conhecimento prévio sobre temas da
não são indicados os textos que possuem tradução psicologia; na realidade, senti que exige a mesma
para o português (o que normalmente é feito familiaridade com a psicologia que com as
referenciando pela tradução existente), ou seja, discussões do marxismo, e essa familiaridade seria
você tem que ir atrás para ver se ela existe só para não simplesmente comprar as coisas que
traduzida ou não. ele fala.

REFRATA PÁGINA 17
REFRATA INDICA

Possui alguns erros de tradução, de edição, de Por fim, por uma questão de gosto pessoal, senti
pontuação, de concordância verbal, uma ou duas também que ele poderia ter falado mais de
vezes falta uma palavra, mas nada que tire o psicanálise. Ele é psicanalista, então tem um amplo
mérito do livro e que dificulte sua fluidez. estudo na área. Faz críticas muito boas à
psicanálise e aos psicanalistas, coisa que não é
Acredito que seja um livro muito bom para quem
comumente bem feita por pessoas de dentro da
se interessa por qualquer nível de crítica ao
própria psicanálise, então acho que ele poderia ter
pensamento ocidental hegemônico (e ele também
explorado mais esse ponto.
dá muita ênfase àqueles que se supõe críticos, mas
não fazem nada além de reproduzir as mesmas
groselhas, como já falei no começo), por ser de fato
claro, fluido, com ótimas críticas e completo (de O LIVR
O SE
novo, dentro dos limites que ele se propõe). ENCON
TRA NO
ACERV
O DA
Outro ponto que chamou muito a minha atenção BIBLIO
TECA D
foi que, na leitura que fiz, tive a impressão de que a UNIVER A
SIDADE
proposta do Ian Parker é mais próxima de algo no CAMPU , NO
S II (NÚ
sentido de implodir a psicologia (e uso ‘implodir’ DE CHA M ERO
MADA:
não para ficar mais bonito no texto, mas porque 150
P238R)
ele é psicólogo, então ele argumenta pelo fim da .
psicologia sendo de dentro da psicologia), do que
de melhorar ela. Inclusive, o título me enganou:
achei que ele falaria de revolução na psicologia
próximo do sentido que o Kuhn[1] trabalha com
revolução científica, mas no fim percebi que o uso
é mais próximo do sentido de uma revolução *Pedro Misailidis Antonini é estudante do
anticapitalista. Não é à toa que ele fala, em outros nono período de Psicologia na PUC-
textos (mas não nesse livro), em antipsicologia.
Campinas.
[1] Nota da equipe editorial: Thomas Kuhn, físico e filósofo da ciência,
publicou em 1962 o livro "Estrutura das Revoluções Científicas", onde ele
introduz suas compreensões a respeito do progresso da ciência e do
conhecimento que ganharam notoriedade nos debates da época e
ainda hoje permanecem em questão.

REFRATA PÁGINA 18
JORNAL DO CA 27 DE AGOSTO DE PSICOLOGIA 

Fotografia do espaço de convivência do Campus II, nas


imediações da placa do CCV. imagem cedida pelo autor.

ALGUNS MOTIVOS PARA SE PERGUNTAR

PELA HISTÓRIA DA PSICOLOGIA NA

PUC-CAMPINAS [1]
Autor: Marcel Delfino Carvalho de Souza
Co-autora: Júlia dos Santos Paris

Talvez você já tenha se perguntado "por que razão Aqui vão alguns:
a Psicologia se encontra no Centro de Ciências da 1. Ela não esteve no Campus II desde sempre. Na
Vida (CCV)?". Por mais que muitos já estejam verdade, mais da metade da sua história, 35
entediados dessa questão e se satisfaçam anos, ela esteve em outro campus, o Campus
repetindo por aí a frustrante resposta com a qual Central;
resolveram se contentar, "porque é o centro onde 2. Houve um momento em que ela poderia ter ido
estão as ciências da saúde, junto da Biologia e, para o Campus I;
também, da Psicologia, que na nossa universidade 3. Há professores que falam de um projeto (com
está mais voltada para esse campo", por mais que planta arquitetônica) construído por eles,
essa seja a resposta de praxe (e, de certa forma, juntamente a universidade, de uma Psicologia
entendida como óbvia), ainda há, sim, motivos do Campus I;
completamente razoáveis para insistir em levantar 4. Não há nenhum relato oficial encontrado sobre
a questão: por que a Psicologia está no Campus II? como aconteceu a transposição do curso de
Psicologia, do seu antigo campus para o seu
atual, ou seja, sobre o porquê da Psicologia estar
no Campus II;[2]

REFRATA PÁGINA 19
ALGUNS MOTIVOS PARA SE PERGUNTAR PELA HISTÓRIA DA PSICOLOGIA NA PUC-CAMPINAS

5. Entre os atuais professores e professoras, não há


um consenso sobre as decisões que levaram a
Psicologia a se estabelecer no Campus II; [1] Esse texto resume alguns dos achados de
uma pesquisa feita por alunos do curso, sobre a
6. No site da universidade, na página do curso de
história do movimento estudantil no Campus II.
Psicologia, entre os "cursos relacionados" à ela
A pesquisa envolveu entrevistas com atuais
estão "Ciências Sociais", "Filosofia" e "História",
professores, professoras, ex-diretoras, ex-
todos do CCHSA, do Campus I e, mesmo assim, ela
diretores, além de ex-alunas e ex-alunos do
reside no CCV, no Campus II;
curso de turmas passadas. A pesquisa e todo
7. O fato mesmo de existir uma explicação de praxe material utilizado, juntamente com as
sobre a inserção da Psicologia no CCV, já deveria entrevistas realizadas, estão disponíveis para
ser motivo de interesse de ingressantes e acesso na íntegra aqui.
participantes do curso, uma vez que ela, de certa
forma, justifica a condição atual do curso e a
formação dos seus estudantes.
Foi na década de 1970, no período da ditadura
A Psicologia esteve, durante cerca de 35 anos da militar, que ela adquiriu os espaços do Campus I e
sua formação, no Campus Central, berço da II. Essa aquisição serviria, no final das contas, a um
universidade, que agora se encontra fechado em grande remanejamento dos cursos da
um processo de restauração do seu edifício – trata- universidade, por meio do qual a Psicologia veio,
se de um prédio do século XIX que foi, em 1984, em 2002, a ingressar em um novo campus, o
tombado como patrimônio histórico[3]. Campus II.
Juntamente de outros cursos que vieram a surgir
O que acontece entre 1998 e 2002, no que diz
na universidade, além dos já existentes, a
respeito a essa transição da Psicologia, no entanto,
Psicologia, com o passar do tempo, cresceu,
é opaco e dúbio, se forem levados em
ampliou turmas, transformou seu corpo docente e
consideração os relatos oficiais da universidade
teve, também, de ser reestruturada diversas vezes,
que tivemos acesso.
segundo as normas de ensino e educação do país,
que também se alteraram ao longo dos anos. A Por exemplo, se procurarmos por qualquer indício
busca pela continuidade de crescimento e da saída da Psicologia do Campus Central para o
qualificação da universidade, somado a todos esses Campus II, no Plano Pedagógico do curso,
fatores, em alguma medida, levaram a encontraremos somente a breve menção de uma
universidade a adquirir novos espaços, além do seu "grande reestruturação de 1981, (...) pela extensão
antigo prédio. dos Serviços de Psicologia a outras áreas de
atuação, como os Centros de Saúde, o Hospital e
Maternidade Celso Pierro" (p. 21). Porém, como
[2] Para a realização do trabalho que gestou o revelado nas entrevistas com professores e
presente texto, além do site do hospital PUC-Campinas, professoras do curso, sabe-se que essa "extensão"
do site da universidade e dos seus Planos de
não se refere ainda à mudança do campus. Como
Desenvolvimento Institucionais (PDIs) nele disponíveis
dito há pouco, a transposição só foi acontecer em
(https://www.puc-campinas.edu.br/avaliacao-
institucional/), foram consultados os nove Planos 2002 e essa extensão de serviços constituía,
Pedagógicos dos dez cursos que compõe o Centro de apenas, uma implementação feita a uma parte
Ciências da Vida, no qual a Psicologia está inserida específica das atividades do curso.
(somente não foi possível consultar o Plano
Pedagógico de Fisioterapia, que não se encontrava
disponível na biblioteca da universidade). A seção da
história e trajetória do curso, no Plano Pedagógico de [3] O curso de Psicologia surge, como relata o Plano
Psicologia, encontra-se disponível no nosso acervo de Pedagógico, em maio de 1964. Em 1965 recebe seus
entrevistas e materiais, e para quem quiser consultar, primeiros alunos. Um dos entrevistados, Sérgio Leite,
na íntegra, este o documento, basta solicitá-lo na recordou que inicialmente o curso se estabelecia no
biblioteca do Campus II). Além desses, foi base para prédio da Rua Barreto Leme, esquina com a Rua Dr.
este trabalho uma pesquisa feita no jornal da Quirino, e que, somente depois, em torno de 1967 ou
universidade (http://jornal.puc-campinas.edu.br/), na 1968, é que passou a funcionar no prédio anexo ao
sua ferramenta de busca, com as palavras-chave Prédio Central.
"História" e "Psicologia".

REFRATA PÁGINA 20
ALGUNS MOTIVOS PARA SE PERGUNTAR PELA HISTÓRIA DA PSICOLOGIA NA PUC-CAMPINAS

Sabendo disso, se averiguarmos o


que existe, no Plano Pedagógico de
Psicologia, relacionado a 2002,
encontraremos no máximo que

- "Em 2001 e 2003 o curso passou por


pequenas modificações em algumas
cargas horárias de disciplinas, as
quais não configuram uma
reestruturação” (p. 26);
- E que, dois anos antes de 2002, foi
elaborada uma grande
reestruturação curricular, a 7ª
reestruturação, "caracterizada por
grandes modificações", que teve
início em 2001. No entanto, nessa
descrição não há menção, em
nenhum momento, à entrada da
Psicologia em um novo campus ou
sobre sua inclusão no CCV.

Além de percebermos uma aparente


contradição, com "pequenas
modificações" e "grandes
modificações" sendo articuladas no
mesmo período, a ausência da
menção à transposição do curso é evidente. Fotografia, da fonte de água do “Solar do Barão”, prédio do
Campus Central. A imagem, datada de 1950, está
Considerando isso e a concomitante ausência de disponível no site da universidade (www.puc-
qualquer menção nos outros nove planos campinas.edu.br/80anos/).
pedagógicos dos cursos que compõem o CCV,
Não poderíamos saber dessas histórias se não
além da ausência de menção sobre o fato,
tivéssemos realizado as entrevistas que,
também, nos Planos de Desenvolvimento
juntamente da nossa pesquisa[4] em alguns
Institucional (PDI) da universidade, desenvolvidos
materiais relacionados à história do curso e seu
de 2003 a 2020, há de se constatar que a história
movimento estudantil, revelaram outras histórias
do curso é oficialmente narrada de um modo que
tão importantes na formação do curso de
isso parece nunca ter ocorrido.
Psicologia quanto imperceptíveis elas eram nos
Mas houve, sim, um momento em que a Psicologia seus relatos oficiais.
chegou no Campus II. Apesar de não ser narrado
De 1967 até 1998, o Instituto Superior de Psicologia,
oficialmente, essa é uma história conhecida por
órgão na época diretamente vinculado à reitoria da
alguns veteranos, professores e outros
universidade, era a instituição responsável por
funcionários. Mas, além desta, há uma outra
administrar o curso de Psicologia, no Campus
importante história, talvez menos conhecida e que
Central.
também remete à chegada da Psicologia no
Campus II: a história do momento em que a Nesse Instituto Superior de Psicologia, o curso e as
Psicologia poderia ter ido para o Campus I. pesquisas nele realizadas eram organizadas e
administradas em departamentos.
Como se pôde perceber nas entrevistas, foi
organizado um plebiscito, na década de 1990, no
Campus Central, entre os alunos e professores dos
[5] Entidade que congregava os então existentes
departamentos do instituto que formavam a
Departamentos do Instituto de Psicologia.
"congregação"[5] para a votação sobre qual
campus o curso de Psicologia deveria ser
transferido.

REFRATA PÁGINA 21
ALGUNS MOTIVOS PARA SE PERGUNTAR PELA HISTÓRIA DA PSICOLOGIA NA PUC-CAMPINAS

[4] Ao longo do artigo e do dossiê utilizamos a Entretanto, isso não significa que nos abstemos de
palavra “pesquisa” para designar nosso trabalho qualquer cuidado necessário à participação dos
realizado. Não se deve, no entanto, entender entrevistados, às entrevistas e com o material
que essa palavra remete a uma “pesquisa delas colhido. Todos os procedimentos da
científica”. A palavra “pesquisa” não pesquisa foram esclarecidos aos professores e
necessariamente remete a isso e seu uso professoras via e-mail além de outras conversas
informal é comum - além de que substituir a em redes sociais. Nenhuma articulação feita com
palavra pesquisa por qualquer outra apenas os materiais elaborados a partir das entrevistas foi
para evitar a atribuição de um sentido específico publicada ou alterada sem a sugestão ou
a essa palavra seria mais uma preocupação autorização dos participantes. Portanto, não é pela
moralista e pouco objetiva com esse sentido ausência de respaldo de um Comitê de Ética que
específico, quase tratando-o de forma sagrada, o presente trabalho se fez na ausência de um
e, ainda mais, prejudicando a fluidez da leitura compromisso ético com seus participantes.
do texto. Essa nota deve ser, sobretudo, Deixamos claro que, para salvaguardá-los de
considerada pelo fato de, também, no nosso qualquer risco ou prejuízo, permanecemos
trabalho, entrevistarmos alguns de nossos abertos a suas considerações antes e depois das
professores e professoras, ou seja, por se tratar entrevistas e da publicação do presente material.
de uma pesquisa que envolveu pessoas. Mais informações a respeito das entrevistas
Sabemos que, se fosse o caso de uma pesquisa realizadas podem ser encontradas no nosso
científica, seria fundamental que tivéssemos acervo de entrevistas, onde deixamos esclarecido,
respaldo de um Comitê de Ética devidamente na abertura do material, as questões levadas em
vinculado ao Conselho Nacional de Saúde (CNS) consideração a metodologia e os procedimentos
e ao Conselho Nacional de Ética em Pesquisa das entrevistas.
(CONEP).

Sobre esta votação, segundo a maior parte dos professores entrevistados[6] seu resultado teria sido uma
maioria de votos pela transposição da Psicologia para o Campus I, ao contrário do que acabou
acontecendo, sua ida para o Campus II.
Há professores, também, que
dizem terem participado
dessa votação e afirmam não [6] Referir-se a maioria da nossa amostra de dados levantada na entrevista
saberem qual peso tiveram os não é o mesmo que dizer que temos qualquer evidência objetiva e
votos ou se foram, de fato, significativa dos resultados ou sequer da existência dessa votação. No
considerados; e há entanto, consideramos válido ressaltar esse dado da nossa amostra pois
evidencia a existência de uma contradição, uma tensão entre o relato da
professores que dizem, por
maioria dos entrevistados e o relato oficial encontrado nos materiais
outro lado, que a votação
institucionais. É fundamental compreender, com isso, que o objetivo deste
ocorreu e pela maioria dos trabalho não consiste em julgar se foi justo ou não a transposição do curso,
votos foi decidido que a ou julgar as justificativas da deliberação dessa transposição. Nós sabemos
Psicologia iria para o Campus que não temos os dados objetivos para realizar tais procedimentos e, assim,
II. É certo que há não nos propomos a fazê-los, nem o fazemos. Não faltam considerações
contradições e não foi nossas a respeito do caráter inconclusivo deste trabalho, o que certamente foi
possível consultar as ATAs da feito para esclarecer nosso empreendimento de, simplesmente, dar forma
escrita a histórias que permaneciam no âmbito oral da tradição do curso.
instituição para averiguar a
Com isso, indicamos que existem mais pessoas que devem ser entrevistadas
natureza das deliberações
para poder responder a essas questões, além de materiais a serem
que estiveram em jogo
consultados. Ressaltamos, assim, que nossa amostra é limitada tendo em
nesses eventos. No entanto, já vista os objetivos de estabelecer esses julgamentos e, sabendo disso, o texto
é significativo que tenhamos não endereça seus argumentos para esse fim.
descoberto essas
contradições com as histórias
levantadas nas entrevistas.

REFRATA PÁGINA 22
ALGUNS MOTIVOS PARA SE PERGUNTAR PELA HISTÓRIA DA PSICOLOGIA NA PUC-CAMPINAS

O professor Nilton Júlio Faria, que assumiu o cargo


"Fizemos um plebiscito, que de diretor na época, exatamente na entrada do
venceu, em todos os segmentos, curso para o seu novo campus, relata, na nossa
a ida para o Campus I. Claro entrevista, que essa votação, ocorrida em meados
que me refiro a maioria da
de 1998, acabou não sendo considerada, ainda que
comunidade universitária e não unanimidade".
ela tivesse indicado a decisão da maioria do curso
(Acervo de entrevistas, Silvana Brandão)
pela transposição para o Campus I. Segundo o
relato do professor e ex-diretor, em dezembro de
"Por fim, houve um plebiscito, contando com a
1998, o Grão-Chanceler Dom Gilberto Pereira Lopes
votação de alunos, funcionários e professores,
teria baixado uma portaria nomeando um novo
tendo como 'vencedor' Campus I.
reitor na universidade, sem seguir a tradição de
(...)
eleição pela lista tríplice[7]. Sem acatar a esta lista,
Foi um processo autoritário, sem direito a recurso.
Fomos surpreendidos com a informação de que em uma espécie de intervenção, o Grão-Chanceler
mudaríamos para o Campus II, onde já haviam escolhe outro reitor, que teria a função de operar
salas de aula disponíveis, salas para serem uma reestruturação prevista para ser realizada na
laboratórios e espaço a ser adaptado para a universidade, envolvendo estatutos do próprio
clínica". (Acervo de entrevistas, sigilo à fonte) CONSUN[8] (Conselho Universitário), da
organização dos cursos e institutos, dos seus
espaços físicos, entre outras atividades
"(...) a Psicologia, na verdade, faz interface com a
área de humanas e com a área da saúde, mas administrativas.
toda votação que a gente fez no curso não foi
Em 1999, o novo reitor assume o posto e, no ano
para ir para o Campus II, quer dizer, o
seguinte, tem início a reestruturação. A
posicionamento dos professores foi que nós
reorganização prevista, no entanto, envolvia a
ficássemos com o curso de humanas, a ideia é que
nós fossemos para a área de Ciências Humanas destituição dos departamentos da universidade,
no Campus I". (Acervo de entrevistas, Carmem isto é, aqueles que formavam a Congregação na
Sílvia Cerri Ventura). qual fora feita a votação da transposição do curso
de Psicologia.
"Debatemos, apresentamos prós e contra de cada A votação, pelo que se pôde entender deste relato,
proposta, votamos e acabamos definindo o
apesar de ter ocorrido, não teve peso na
Campus II como nosso espaço de formação e
deliberação oficial da transposição do curso, que
trabalho". (Acervo de entrevistas, Raquel S. L.
acabou sendo decidida apenas pelo CONSUN, sob
Guzzo)
um novo estatuto de regimento. Como ressalta o
professor, tendo valido ou não a votação, ela seria,
"Era professora e diretora na época. As decisões
em última instância, avaliada pelo CONSUN e, de
foram discutidas com toda a comunidade,
certa forma, foi o que ocorreu.
existiam posições a favor e contra o Campus II".
(Acervo de entrevistas, Diana Tosello Laloni)

"Nós fomos convidados a votar, como um tipo [7] Pelo que se pôde entender, os diretores dos cursos
de um plebiscito, não sei que peso teve esse e institutos da universidade, no Conselho
Universitário (CONSUN - cf. nota seguinte), elegiam
voto, mas nós fomos convidados a optar e essa
três pessoas candidatas ao cargo de reitor, sendo
transposição se deu de uma forma cuidadosa,
que uma delas, por fim, seria escolhida pelo Grão-
na minha opinião". (Acervo de entrevistas,
Chanceler para o cargo.
Tatiana Slonczewski) [8] O Conselho Universitário é uma organização
deliberativa da universidade que deve incluir todos
"O Campus Central deixaria de existir e a gente representantes dos segmentos que a constitui,
teria que migrar para algum campus, ou inclusive o corpo discente. No entanto, sabe-se que,
Campus I ou Campus II. E houve uma votação hoje, pela inatividade do DCE, esse espaço no
sim". (Acervo de entrevistas, Karina Magalhães) CONSUN encontra-se desocupado.

REFRATA PÁGINA 23
ALGUNS MOTIVOS PARA SE PERGUNTAR PELA HISTÓRIA DA PSICOLOGIA NA PUC-CAMPINAS

Porém, sob o novo regime da universidade, a do curso, na verdade, essa discussão deve
votação antes feita pelos departamentos da contemplar outros aspectos, como a importância
Congregação da Psicologia, entidades legítimas dos serviços da Psicologia e suas pesquisas no
até um ano antes da decisão final do CONSUN, espaço em que seu campus se insere e, inclusive,
acabaria por ser desconsiderada na deliberação da de que modo essa participação contribui para a
mudança do curso para o novo campus. formação dos estudantes da faculdade.

"Nas nossas congregações - aquele fórum que Ao ir para o espaço das


reunia todos os professores do Instituto de humanas, a gente estaria junto
Psicologia - a gente sempre fez a defesa de que com os colegas das demais
a Psicologia é da área de Ciências Humanas, e ciências sociais aplicadas, outras
nós tínhamos claro para gente que, uma vez ciências humanas.
que nós saíssemos do prédio central, nós Quando a gente vai para o Campus II, a gente
deveríamos ir para o Campus I, por uma maior convive com outros colegas. Mas a gente também
identificação com as Ciências Humanas, ganha em conviver com a realidade do distrito
embora lá também tenha Ciências Exatas - noroeste, que é um distrito de saúde onde está
mas, é claro, a área de Ciências Humanas está alocado nosso Campus II. Eu acho que a gente
lá. Isso era uma coisa que tínhamos clareza, a ganha muito de proximidade com uma realidade
instituição também tinha clareza disso (...)". social que permite a gente crescer muito
(Acervo de entrevistas, Nilton Júlio Faria) profissionalmente, não só a clínica, mas as escolas
dos arredores, os contextos sociais ali dos arredores,
a gente acaba ganhando bastante com isso, pelo
menos eu vejo assim.
A partir deste relato, por um lado, somos levados a (…)
nos perguntar sobre a legitimidade democrática O espaço próximo ao Campus II é crescente em
da decisão pela transposição: a votação foi demandas sociais e demandas de saúde. Embora
oficialmente invalidada com a alteração do nos afaste um pouco do convívio com os demais
regimento? De certa forma, não, pois a votação da colegas das ciências sociais, das ciências humanas,
ele nos aproxima de uma realidade importante de
Psicologia ocorreu sob outro regime de
saúde. Então, não conseguiria te dizer que, isso, de
organização da universidade, portanto não foi
alguma forma, é ruim para a identidade do curso.
invalidada, somente feita sob outro regime não
Eu considero que a gente tem uma problemática
mais vigente. Porém, de certa forma, sim, foi
super importante ali, no nosso entorno. A gente tem
invalidada em um processo desmobilizador e
condições de ter até, na proximidade com o
desdemocratizante, pois destituindo os hospital, uma ampliação do acesso de algumas
departamentos e a congregação, dentro de um pessoas ao nosso ambulatório; a chance de a gente
novo regime, o plebiscito estaria sendo legalmente ter trocas com outros profissionais, também, da
invalidado, o que é evidentemente injusto, área de saúde, é importante. Eu vejo assim, para
sabendo que, com ou sem os departamentos, em mim a mudança foi propícia". (Acervo de
novos ou em antigos regimes, a maioria dos entrevistas, Tatiana Sloczewsk)
votantes, não deixava de representar a Psicologia
da PUC-Campinas.

Contudo, por outro lado, também, pode-se pensar Tatiana Slonczewski, nesse sentido, expande a
no que significou para o curso de Psicologia sua ida discussão a respeito da localização do curso e o
para o Campus II, quando poderia ter ido para o seu campus, para questões que estão além de
Campus I. A professora Tatiana Slonczewski ressalta uma ideia de identidade interna do curso.
que a questão sobre o campus para o qual a Também encontramos esse discurso no que
Psicologia veio a ser transposta e onde comenta Karina Magalhães, ao ressaltar a
continuou sua trajetória não apenas importância do trabalho da Psicologia para a
deve ser discutida tendo em região noroeste de Campinas, no hospital,
vista somente uma noção da identidade vinculado ao SUS.

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ALGUNS MOTIVOS PARA SE PERGUNTAR PELA HISTÓRIA DA PSICOLOGIA NA PUC-CAMPINAS

"No meu olhar, enquanto psicóloga, eu achava que o fato de ir para o Campus II seria muito
importante para criar um serviço de Psicologia que tivesse uma facilidade de inserção nas
outras áreas, em outras profissões da saúde (...), abrir um serviço naquele local podia abranger
[o acesso] à população mais carente de Campinas, que é a região noroeste e que eu atendia
no hospital da PUCC". (Acervo de entrevistas, Karina Magalhães)

Mas também deve-se assinalar, como outras professoras relatam, que mesmo a discussão a respeito
dessa identidade interna do curso no seu campus, ainda implica outras questões. Raquel Guzzo, ao
comentar o processo de transição, diz:

Houve muita discussão, reuniões envolvendo professores e estudantes. Foi um tempo de muito
debate e participação no Instituto de Psicologia que ficava no centro de Campinas. (...)
Entendi que [os] estudantes não avaliavam muito a dimensão de estarmos vinculados às
profissões da saúde.
Porque psicologia não é DA saúde é uma profissão das humanidades que se aloja em distintos
campos - então está NA saúde, assim como NO judiciário, NAS organizações, NAS escolas, NAS
comunidades, etc... A compreensão desse processo impacta definitivamente na formação - por
exemplo, não temos UMA disciplina que introduza o campo das comunidades para o trabalho
da psicologia e ainda assim temos psicólogos atuando na assistência social sem terem um
preparo específico para esse campo... e outros muitos exemplos que poderia dar aqui". (Acervo
de entrevistas, Raquel S. L. Guzzo)

Uma ex-aluna e ex-professora[9] do curso traça alguns outros questionamentos, relacionados a essa
noção de identidade, que foram debatidos no momento em que se discutia qual tipo de Psicologia viria a
ser construída com a sua transposição para outro campus. Ela escreve:

Print screen captado na página do curso no site da universidade (www.puc-campinas.edu.br/graduacao/psicologia/).

[9] Não identificada, por solicitação de sigilo à fonte.

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Essa sensação, certamente, remete à situação em


"Como professora, participei de inúmeras que ficou à parte da Psicologia relegada à sua não
reuniões, estudos, palestras com o objetivo de construção, ao mesmo tempo, que remete a um
discutir a questão, tendo como focos principais: outro "prêmio", a sua construção que antes era
qual é a área de conhecimento da Psicologia, possível.
onde estão as bibliotecas com livros mais úteis à Essa construção que não foi possível, não deve, no
Psicologia, qual campus ofereceria a professores
entanto, ser confundida com um mero projeto que
e alunos mais possibilidades de interlocução com
foi esboçado durante os anos de decisão e
outros cursos propiciando enriquecimento no
transposição da Psicologia, como se tudo tivesse
processo ensino-aprendizagem, entre outros".
começado em um dia, no qual professores e
(Acervo de entrevistas, sigilo à fonte [9])
estudantes do Campus Central foram
surpreendidos com uma votação sobre a
Sobretudo, vê-se que esses relatos remontam uma transposição da Psicologia e, a partir de então,
época em que foram esboçadas outras Psicologias, começaram a discutir e construir novos projetos.
com discussões sobre a identidade do curso e Como podemos ver com o professor Nilton Júlio
outras que vão além desta. Vale destacar que Faria, o verdadeiro prêmio dessa Psicologia já era
"Psicologias" também vão além de uma Psicologia objeto de uma elaboração há mais de dez anos.
do Campus I, ou uma Psicologia do Campus II.
Porém, com a contradição da história da votação "(...) a universidade chegou a destinar um terreno,
dos campus e a continuação dessa história no um espaço, um território, lá [no Campus I], para a
Campus II, se, de fato, houve uma maioria que gente poder construir o Instituto de Psicologia da
apostava na Psicologia do Campus I, é de extrema PUC-Campinas. Nós chegamos a fazer o projeto
relevância entender, ao menos, o que foi essa arquitetônico para construção do prédio de
Psicologia almejada pela maioria, pois, de algum Psicologia no Campus . I. Tudo isso estava pronto.
modo, ela deve ainda estar presente, mesmo que Nós levamos uns 10 anos para fazer esse projeto.
não construída, no que é a Psicologia, hoje, do Porque, é claro, é uma coisa institucional, uma
Campus II. construção da qual sabíamos que levava um longo
processo mesmo. E a universidade também não
Do pouco que se pôde explorar neste aspecto[10]
tinha dinheiro para dizer "vamos lá, vamos fazer",
dois relatos chamam a atenção. Uma ex-aluna e
mas, ao longo de 10 anos, tudo isso foi trabalhado
ex-professora do curso, diz: (...). Nós imaginamos, projetamos salas de aula,
salas de reuniões, a nossa clínica de Psicologia.
Tudo isso foi projetado e a gente estava certo de
"Particularmente, fui chamada para opinar sobre que havendo possibilidade, era isso que ia ocorrer.
móveis e equipamentos para o Laboratório de São 10 anos de discussão - e estou falando dos 10
Pesquisa [na recepção da Psicologia no Campus anos dos quais eu participei, pode ser anterior".
II], o que certamente me agradou, pois até então (Acervo de entrevistas, Nilton Júlio Faria).
só contávamos com salas, com carteiras comuns
e nenhum equipamento, mas também gerou a Portanto, uma parte da Psicologia que chegou ao
sensação de prêmio consolação". (Acervo de Campus II, talvez a sua maioria, trazia consigo
entrevistas, sigilo à fonte). todas essas possíveis outras Psicologias que
seriam construídas no Campus I, inclusive uma
Psicologia Clínica do Campus I.

[10] Que fique explícito o caráter inconcluso deste trabalho que convida outros a tanto dar continuidade aos estudos aqui desenvolvidos,
quanto a realizar uma leitura crítica do levantamento e análise apresentada.
Esclarecemos também que o presente estudo não se deteve em analisar as grades curriculares e as transformações advindas dos
processos de reestruturação que levaram a Psicologia ser o que agora ela é, no Campus II. Isso seria valiosíssimo para as próximas
gerações, imaginamos. Ainda assim, fazemos o convite ao leitor para conhecer o levantamento feito, na pesquisa, com os relatos e os
materiais colhidos, a partir dos quais outras histórias do passado narrado nos documentos oficiais consultados, além da transposição da
Psicologia, foram reencontradas. As buscas realizadas acerca da ausência de relatos oficiais sobre a chegada da Psicologia no Campus II
levou-nos a conhecer outras lacunas da sua história oficial, sobretudo, a respeito do conturbado início da Psicologia da PUC-Campinas, no
macabro período da Ditadura Militar brasileira. A fim de expor os resultados desse trabalho, na presente edição do jornal, da forma menos
extensa e mais formadora possível, restringimos a exposição dos resultados a apenas alguns recortes da totalidade dos achados.

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ALGUNS MOTIVOS PARA SE PERGUNTAR PELA HISTÓRIA DA PSICOLOGIA NA PUC-CAMPINAS

E por se tratar de uma maioria, chama atenção


que, hoje, não se encontra indício de um "A gente tinha muitos momentos de discussão
movimento que tivesse ocorrido depois da interna (...). No ano de 1993, nós fizemos um projeto
transposição do curso, que tratasse dessa pauta, de reestruturação curricular do curso (...). Nós
com esses termos em específico, "a Psicologia do fizemos 19 plenárias de curso, para discutir essa
Campus II"[11]. De certa forma, poderíamos pensar reestruturação curricular. Em plenária de cursos
que houve uma resistência antes da transposição eram convidados professores todos do curso, além
do curso, sobretudo, explícita no resultado do da representação estudantil. Cada hora que entrou
próprio plebiscito. em uma disciplina ou em outra foi discutida, votada
(...).
A respeito da ausência de resistência, é importante
Há uma dinâmica de funcionamento da
destacar o que significou para alguns professores universidade, agora, que não dá muita folga… (...)
o estabelecimento das novas formas de Hoje a representação de professores no CONSUN,
organização impostas pela intervenção de 1999, tem um professor, um aluno, quer dizer, isso foi
que levou, pelo que se pôde notar, à inclusão da sendo morto a partir de 98, 99 para frente. Eu faria
Psicologia no Centro de Ciências da Vida no um marco: de 99 para frente é outra PUCC. (...) A
Campus II. gente sofreu de 99 para frente, nem sei quantos
anos, não sei quando eu parei de sofrer por isso. (...)
"Nós tínhamos a Congregação, que era o fórum Mas a PUCC é outra PUCC, de 99 para frente. Daí,
mais geral, ele reunia todos os docentes do Instituto não teve mais a Congregação. (...) Tinha discussão
de Psicologia (...). Então, a Congregação era o poder de departamento, conselho departamental,
maior de deliberação, estava acima, inclusive, do congregação, não tem mais nada.
diretor de faculdade. Nessas congregações, a gente As pessoas discutem na Psicologia, o pessoal é
levava pautas para serem deliberadas e ali a gente muito combativo, muito crítico, as coisas não
tinha discussões e fazia a votação e, o que fosse passam batido, sempre alguém levanta a questão,
votado ali, era o que a direção de faculdade devia tem um grupo que faz eco, um levanta a bola o
conduzir. Quando a gente fala da nossa escolha outro corta, o resto fica ali para não deixar a bola
para ir para o Campus I, isso tinha sido uma cair, mas não é a mesma coisa. (...) Quando a gente
deliberação da Congregação. É claro que nós levantou, agora, "a gente quer participar da
tínhamos também, professores que faziam a defesa reestruturação" [a atual reestruturação do curso],
de que a gente devia ir para o Campus II, para a "não, tudo bem, vocês podem participar, mas tem
área da saúde, mas não era majoritário (...). Uma prazo, tem isso, tem isso...", como quem diz "o
vez rompido com esses fóruns, essas instâncias caminho já está determinado", você pode até
deliberativas, aí a gente não tinha mais voz, né? participar mas a influência vai ser dentro de um
Nós professores perdemos muita voz… os alunos, os limite. (...) Quando a gente fazia 19 reuniões de curso,
funcionários". (Acervo de entrevistas; Nilton Júlio a gente reunia terça à noite, trabalhava,
Faria) trabalhava, fazia a reunião no sábado, fazíamos isso
19 vezes para discutir reestruturação de curso. Sabe
quando isso acontece agora? Nunca mais". (Acervo
Comentando a mais recente reforma do curso que de entrevistas; Carmen Ventura)
está agora sendo estabelecida, Carmen Ventura
compara a atual situação com uma reestruturação
que houve em 1993, quando ainda havia a Portanto, é notável a desmobilização promovida
Congregação e os departamentos: após 1998 no curso com o novo regimento da
universidade, independente, de certa forma, do
[11] Tanto pelo que foi possível consultar nos materiais do Centro campus em que ela veio a se alojar. Não se pode
Acadêmico de Psicologia, quanto no que foi perguntado para os
professores e professoras. Essas constatações, assim como
confundir, nesse sentido, o que concerne às
quaisquer outras referentes ao movimento estudantil, prescindem condições político-deliberativas do novo
de uma documentação e um acervo de materiais, infelizmente, regimento da universidade com o que
escassos, que nos permite acessar, apenas, até 2007. Os materiais
utilizados na nossa pesquisa foram aqueles que ficaram
corresponde à situação do curso no seu atual
guardados com o Centro Acadêmico, ao longo dos anos em que a campus. Com esses relatos, não é estranho pensar
sua sede ("salinha") manteve-se fechada com outros materiais – que a ida da Psicologia para o Campus II tenha
talvez mais antigos – dentro. Como a sua reabertura ocorreu quase
no mesmo período da eclosão da pandemia, não foi possível sido viabilizada pela intervenção de 1998.
consultar os arquivos lá disponíveis.

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ALGUNS MOTIVOS PARA SE PERGUNTAR PELA HISTÓRIA DA PSICOLOGIA NA PUC-CAMPINAS

Nesse sentido, o fato da Psicologia ter ficado


distante de outras áreas do conhecimento das
Ciências Humanas, embora implique uma forma
de desmobilização política, não deve ser entendido
como a única razão da sua desmobilização. Certa
desmobilização é evidente, inclusive, em nível
nacional. Basta lembrar da ascensão neo-fascista
vivida nos últimos anos no Brasil, capaz de levar e
manter Jair Messias Bolsonaro no poder.
Entretanto, é necessário compreender que as
decisões que atravessaram e determinaram a
chegada da Psicologia no seu atual campus, até
como ela se organiza hoje, não deixam de
corresponder às mesmas condições objetivas da
conjuntura em que ela se implica.
Essa compreensão, certamente, não se resume a
uma análise do passado que venha a comprovar
determinadas constatações sobre a sua situação
presente, mas, sim, depende de desvelar todo o
suposto pragmatismo e a neutralidade das
tomadas de decisões no rumo da história.
Não escapa à nossa análise que ainda existam
mobilizações das psicologias que habitam o nosso
curso e campus, instabilidades e tensões presentes
em decisões ainda a serem tomadas. Essas devem
ser objeto de estudo e debate dos estudantes.
Imagem retirada da postagem feita em 29/05/2014 pela página do
No que concerne ao movimento estudantil, ainda
C.A. de Psicologia no Facebook
que não tenhamos encontrado nenhum indício de (www.facebook.com/ca27deagostopucc).
discussão sobre "a Psicologia do Campus II",
acreditamos que o rumor a respeito do "porquê da
Psicologia estar no Campus II", além também do "Confesso que, mesmo após tantos anos, ainda
movimento de 2015 "#Por Uma Outra Psicologia", me é bastante incômodo o convívio com
não deixam de nos fazer pensar na possibilidade ambulâncias, jalecos e estetoscópios por todos os
da construção de outras psicologias que, como lados". (Acervo de entrevistas, sigilo à fonte)
temos visto, parecem latejar no que hoje é a atual
Psicologia do nosso curso.
No final, a Psicologia foi para o Campus II. Sobre Mas, além disso, não se deve deixar de pensar nas
isso, ainda vale ressaltar que ela foi o último curso razões que sustentaram toda essa situação,
a chegar no Campus II. No seu relato, o professor culminando, por fim, na chegada de uma Psicologia
Nilton Júlio Faria também menciona que a "intrusa" no Campus II. Além das justificativas
Psicologia chegou como uma "intrusa". É certo mencionadas por Tatiana Slonczewski e Karina
que essa característica notada por ele é descrita de Magalhães, Nilton Júlio elencou aquelas que ele
forma cômica, remetendo tanto ao fato dela ter entendeu como as consideradas pelo CONSUN para
chegado por último no campus, quanto, como a transposição do curso:
esclareceram anteriormente as professoras Raquel -a economia promovida com o uso do espaço
S. L. Guzzo e o próprio Nilton Júlio Faria, por ela ser clínico do hospital, que dispensava gastos com
uma área do conhecimento das Ciências a construção de uma nova clínica no Campus I,
Humanas, no meio, agora, das Ciências Biológicas além de não necessitar construir novos prédios
e da Saúde. A respeito disso, seria interessante para a Psicologia;
citar o que diz uma ex-aluna e ex-professora:

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ALGUNS MOTIVOS PARA SE PERGUNTAR PELA HISTÓRIA DA PSICOLOGIA NA PUC-CAMPINAS

-a abundância de espaço ocioso no Campus II, Assim, conseguimos perceber que a universidade,
no período vespertino, o que, pelo visto, na 7ª mesmo sendo comunitária, nesse contexto, não
reestruturação de 2001, escrita no Plano deixa de ter de corresponder à situação, o que,
Pedagógico, era um importante requisito para inclusive, podemos ver com a considerável
o curso, com três turmas no período integral, expansão do curso de Psicologia, na 7ª
usando o período vespertino com todas elas, reestruturação, feita à procura de
duas matutinas-vespertinas e uma vespertina-
noturna;
-além de que, no momento da transposição da "atender as duas maiores necessidades do curso,
Psicologia, também seria feita a transposição naquele momento: a primeira referente a
das Engenharias, que ainda estavam em um redução do número de alunos por turma (...) e, a
antigo prédio da instituição: como já haviam segunda, com respeito a competitividade do
sido instalados os cursos das Exatas e curso. O curso de Psicologia da PUC-Campinas é
Tecnológicas no Campus I, foi feita, assim, a reconhecido como um dos pioneiros e mais
opção de se transpor as Engenharias para este, tradicionais no cenário nacional e, durante mais
enquanto a Psicologia seria transposta para o de 30 anos configurou-se como única ou, pelo
Campus II, permanecendo junto dos cursos das menos, como a mais atraente opção aos
áreas biológicas e da saúde; candidatos da cidade e região. Entretanto, o
crescimento de inúmeros outros cursos,
Como o próprio professor e ex-diretor Júlio analisa, oferecidos por outras universidades na cidade e
tendo em vista essas justificativas, deve-se dizer região (...) criou a necessidade de uma
que a decisão que levou a Psicologia ao Campus II alternativa que viabilizasse um bom curso, (...)
não foi subsidiada por discussões teóricas, para candidatos que, por necessidades
metodológicas, pedagógicas, como fora na antiga econômicas, precisassem trabalhar enquanto
Congregação, mas, sim, "administrativa", cursavam o 3º grau". (Plano Pedagógico, 2013;
puramente "técnica". Acervo de entrevistas e materiais).

Seria preciso, para pensar nessas justificativas,


como dito anteriormente, entender como as
É importante não confundir o contexto da criação
tendências nacionais e globais, sobretudo, da
do Campus II com o contexto da ida da Psicologia
educação, na época, se desenvolviam e vieram a se
para este local. Apesar de ambos contextos
desenvolver.[12] Poderíamos, brevemente, levar
estarem envolvidos por conjunturas em que a
em consideração que a década de 1990, período
mercantilização da educação estava em jogo, não
em que houve a mudança de reitor e início da
podem ser misturados para julgarmos as
decisão sobre a transposição do curso, como
justificativas da transposição do curso.
escreve Carvalho (2013),[13] foi marcada pela
Brevemente, pode-se distinguir o período da ida
intensa mercantilização da educação e, também,
da Psicologia para o Campus II como sendo
pelo crescimento das empresas educacionais,
característico dessa realidade competitivista entre
reconhecidas como tais e distinguidas de
universidades particulares, enquanto o período da
universidades comunitárias como a PUC-
aquisição do Campus II, caracterizado pelo intenso
Campinas, em 1996, com a promulgação da Lei de
incentivo ao crescimento e ao surgimento delas,
Diretrizes e Bases (LDB).
com a reforma universitária de 1968.[14]

[12] O que, evidentemente, não conseguimos fazer com a devida precisão neste artigo.
[13] CARVALHO, Cristina Helena Almeida de. A mercantilização da educação superior brasileira e as estratégias de mercado das
instituições lucrativas. Rev. Bras. Educ., Rio de Janeiro, v. 18, n. 54, p. 761-776, Sept. 2013. Available from
<http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1413-24782013000300013&lng=en&nrm=iso>. access on 01 Mar. 2021.
https://doi.org/10.1590/S1413-24782013000300013.
[14] Como se pode notar, a aquisição do Campus II ocorreu, nesse período, com auxílio do Ministério da Educação, na época
representado por Jarbas Passarinho – digno de nota, um dos signatários do macabro AI-5. A política econômica do regime
militar era marcada pela privatização que, apesar de não ser uma característica única da sua economia, como destaca Saviani
(2008), se aprofundou sob o seu governo; além de que, como escreve Machado (2002, p. 29), que analisou o perfil institucional da
PUC-Campinas ao longo dos anos de 1968 a 1981, a "política de privatização do ensino superior empreendida pelo regime militar"
parece "justificar o projeto megalômano" da nossa "universidade, revelando o comprometimento da instituição com a política
educacional do governo militar, cujo objetivo proclamado era o desenvolvimento e modernização do país".

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ALGUNS MOTIVOS PARA SE PERGUNTAR PELA HISTÓRIA DA PSICOLOGIA NA PUC-CAMPINAS

Vista aérea de onde, hoje, se situa o CCV. Fotografia de 1977 retirada do acervo do Museu Universitário PUC-Campinas, em exposição na página
comemorativa dos 80 anos da universidade (www.puc-campinas.edu.br/nossa-historia/)

Destacamos ainda, com relação ao contexto, que enunciadas por Tatiana Slonczewski e Karina
essas alterações realizadas na 7ª reestrutura Magalhães.
curricular do curso, aparentemente, concomitante Enfim, é evidente que esses levantamentos não
a sua transposição, foram elaboradas em resposta chegam nem perto de elucidar as muitas nuances
a uma avaliação do MEC da época. Portanto, a desse passado do curso. Importante ponderar,
transposição do curso de Psicologia para o também, que o nosso trabalho, ao priorizar as
Campus II, para ser lida em termos de entrevistas e a investigação pelos documentos da
mercantilização da educação precisa ter como instituição,[15] acaba não conseguindo realizar
base uma avaliação dessas exigências do MEC, uma análise mais detida de como as tensões
juntamente de uma avaliação da normativa de políticas e sociais macro-estruturais atravessaram
1998, ambas condições objetivas que implicaram a as articulações estatutárias da universidade e
transposição do curso - e que, no presente também as decisões tomadas para que viesse a se
trabalho, não conseguimos nos deter com o constituir uma Psicologia do Campus II.[16]
devido rigor. Por fim, ainda vale ressaltar a importância do
Nesse sentido, sem averiguar as ATAs das reuniões reconhecimento dessas outras histórias aqui
de deliberação do CONSUN, apesar destas levantadas sobre a formação da estrutura atual da
evidências aqui expostas virem do relato do diretor instituição. Entendemos que isso pode contribuir
do curso, no período da sua entrada no novo para o movimento estudantil da nossa época,
campus, não é possível estabelecer um julgamento recobrando a importância de se pensar em formas
com consistência sobre as justificativas dessa de organização institucional mais inteligentes e
transposição, ainda mais sabendo de justas para a construção da universidade como um
outras razoáveis justificativas possíveis, como as todo.[17]

[15] Essas que, claramente, foram limitadas por oportunas ou inoportunas decisões nos recortes da pesquisa, pelo curto espaço de tempo
para investigação (que foram dois meses de férias) e, é claro, nossa inexperiência nesse tipo de trabalho, que comporta seus erros e faltas
de iniciantes. Talvez os leitores possam ajudar nesse aspecto, criticando e elaborando novos estudos que sejam pertinentes às
necessidades sociais e políticas que envolvem as ações da universidade como um todo.
[16] A esse respeito deixamos uma lista de sugestões de leitura, ao final deste texto para facilitar o acesso dos que tiverem o interesse de
estudo.
[17] O DCE, certamente, é uma dessas formas e precisa, urgentemente, estar nas pautas principais de discussão e trabalho dos
movimentos estudantis da PUC-Campinas.

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ALGUNS MOTIVOS PARA SE PERGUNTAR PELA HISTÓRIA DA PSICOLOGIA NA PUC-CAMPINAS

A chegada da Psicologia, pelo que os nossos enquanto indefinida, isto é, a ser definida, em
levantamentos indicaram, aparece como algo que constante movimento.
ainda hoje é uma questão não bem acabada. Isso
Agora, na comemoração dos 80 anos da
pode ser, de certa forma, entendido como um
universidade, além do fim de uma gestão de
problema a ser resolvido, o que talvez não seja a
diretores e reitores e da elaboração de uma nova
forma mais profícua de entender a questão. Pois,
estrutura curricular para Psicologia,
pensando de outra forma, um passado não bem
experimentamos a interdição do seu espaço físico,
acabado talvez seja a revelação da sua forma mais
devido às medidas de distanciamento social no
fidedigna, quando ele se mostra não acabado,
período da pandemia. Trata-se de uma interdição
indefinido, que exige ser retomado, pois está ainda
no espaço em que, há 19 anos, o curso de
em construção, no presente.
Psicologia se estabelecia.
E um passado não acabado, indefinido,
Nessa situação, as formas de relação social que
certamente, não deve servir de fonte de
nesse espaço se organizavam são postas em
pretensões saudosistas. Eleger uma espécie de
suspenso, passando a se movimentar sob outras
pauta da volta ao Campus I seria criar um ideal a-
condições de organização, até então inéditas, nos
histórico, mera projeção da nossa necessidade de
espaços virtuais, sem deixar de esperar a
estabilidade em uma história que,
possibilidade de botar, novamente, os pés no chão.
fundamentalmente, só poderá ser transformada

Fotografia tirada pelos próprios autores sobre uma passagem interditada para manutenção no Campus I, em 2020.

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ALGUNS MOTIVOS PARA SE PERGUNTAR PELA HISTÓRIA DA PSICOLOGIA NA PUC-CAMPINAS

Com o fim da gestão técnico-administrativa neste ano, a mudança curricular do curso e com novas
turmas entrando a cada ano que se passa nessa suspensão, o espaço do campus torna-se cada vez mais
inédito, nos aproximando do que poderia ser uma nova chegada da Psicologia. Sobre esse evento de
2002, Nilton Júlio Faria conta:

"Eu só me lembro que eu assumi a direção da faculdade no dia 1º de fevereiro e


as aulas começavam no dia 10 de fevereiro e nenhum aluno sabia onde ia ser,
nenhum professor sabia onde ia ser..." (Acervo de entrevistas, Nilton Júlio Faria)

Por um lado, podemos pensar: "normal, em uma mudança para um novo campus é esperado que
ninguém saiba onde, ao certo, seria". Porém, por outro lado, olhando para as histórias que aqui foram
lembradas, a ideia de não "saber onde ia ser" pode nos dizer mais do que objetivamente essa frase parece
aludir.
Ao relê-la, podemos
lembrar do verdadeiro
desafio que
enfrentamos, nesses
últimos tempos de
pandemia: vencer o
fascismo que ameaça a
construção de uma
civilização mais justa,
que ainda não sabemos
ao certo onde vai ser,
onde vai dar, isto é,
uma construção ainda
por vir. No que diz
respeito à prática, pode
ser que isso não sirva à
construção de uma
nova Psicologia ou
mesmo uma nova
Universidade, mas
certamente dá alguma
luz à importância das
perguntas e suas
respostas indefinidas,
que podem sustentar
um cuidado definitivo
com o passado e ações
atentas e realmente
transformadoras no
presente.

Fotografia dos próprios autores sobre uma passagem interditada para manutenção no Campus II, em 2018.

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ALGUNS MOTIVOS PARA SE PERGUNTAR PELA HISTÓRIA DA PSICOLOGIA NA PUC-CAMPINAS

Se pensarmos que o passado da Psicologia já está definido, acabado, qualquer pergunta sobre as
razões dela ser o que hoje ela é, perde o seu sentido, torna-se desnecessária. Com ela, vão todas
outras histórias que não puderam ser contadas nos registros oficiais e, assim, vai-se uma
multiplicidade de formas possíveis de se reconhecer o presente. Por isso, é preciso não ignorá-las, ter
o cuidado de ouvi-las para conseguirmos enxergar no passado, não mais o fim, não mais uma história
acabada e, sim, um começo oportuno.

Fotografia da construção do Campus II, na década de 70, disponível no site da universidade (www.puc-campinas.edu.br/80anos/).

REFERÊNCIAS
CARVALHO, Cristina Helena Almeida de. A mercantilização da educação superior brasileira e as estratégias de mercado das
instituições lucrativas. Rev. Bras. Educ., Rio de Janeiro, v. 18, n. 54, pp. 761-776, Sept. 2013. Disponível em
<www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1413-24782013000300013&lng=en&nrm=iso>.
JORNAL DO C.A., Acervo de entrevistas e materiais. 2021. Disponível em:
https://drive.google.com/drive/folders/1s37nMT_50KzhlP30fRAsaeVpQRClQfOQ?usp=sharing

MACHADO, Vera Lucia de Carvalho. A identidade institucional da Puc-Campinas: estudo dos projetos pedagógicos (1968-1981).
2002. 219 p. Tese (doutorado) - Universidade Estadual de Campinas, Faculdade de Educação, Campinas, SP. Disponível em:
<www.repositorio.unicamp.br/handle/REPOSIP/250870>.
PUC-Campinas. Projeto pedagógico do curso de Psicologia. Campinas, 2013.

SAVIANI, Dermeval. O legado educacional do regime militar. Cad. CEDES, Campinas, v. 28, n. 76, p. 291-312, Dec. 2008. Disponível
em: <www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0101-32622008000300002&lng=en&nrm=iso>.

SUGESTÕES DE LEITURA
CASTELAR, Marilda. A Presença da Psicologia na Saúde Pública em Campinas-História e Memórias. Conselho
Regional de Psicologia de São Paulo. Disponível em: http://www.crpsp.org.br/memoria/servico/artigo.aspx

Simionato, M. PUC-Campinas faz 'eleições paralelas' (1998). https://www1.folha.uol.com.br/fsp/campinas/cm10109805.htm

Simionato, M.; Avancini, M. Alunos protestam na PUC-Campinas (1998). https://www1.folha.uol.com.br/fsp/campinas/cm10109805.htm

TANGERINO, Marcio Roberto Pereira. Pontificia Universidade Catolica de Campinas: vicissitudes historicas e busca
de uma identidade. 2004. 203 p. Tese (doutorado) - Universidade Estadual de Campinas, Faculdade de Educação,
Campinas, SP. Disponível em: http://www.repositorio.unicamp.br/handle/REPOSIP/252872

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JORNAL DO CA 27 DE AGOSTO DE PSICOLOGIA 

REFLEXÕES DE UM BOLSISTA

PROUNI DURANTE A PANDEMIA

Para aqueles que não conhecem, o Programa A pandemia oferece uma combinação única de
Universidade para Todos (PROUNI), foi criado pelo crise sanitária, econômica e claro, política. Há
governo federal em 2004 e oferece bolsas quem diga que estamos todos no mesmo barco, o
integrais e parciais (50%) em universidades que discordo; podemos estar sob a mesma
particulares do Brasil. Ao observar o nome do tempestade, mas alguns sequer têm um barco -
Programa, a primeira coisa que se questiona é: o ou meio necessário para navegar. E se outrora as
PROUNI é realmente para todos? Ou ainda, quem dificuldades incidiam sobre as condições de
são os sujeitos beneficiados pelo programa, quem transporte, moradia e alimentação, durante o
ensino à distância as dificuldades são de natureza
são todos?
de conexão. De um dia para o outro foi necessário
Através desse questionamento são colocadas as para ter acesso às aulas uma boa internet, um
condições de acessibilidade ao ensino superior de computador ou um bom celular - além de ter um
pessoas de baixa renda. Condições estas que são espaço reservado em casa destinado aos estudos.
atravessadas por inúmeras despesas antes de se E quem paga por essa conta?
falar do custo da graduação em si. O aluno
O Núcleo de Atenção Solidária (NAS), responsável
bolsista, assim como os demais alunos de uma
pela administração e manutenção das bolsas de
universidade particular, tem de arcar com sua
estudo chegou a enviar um questionário via
alimentação, transporte e moradia. Houve uma
Google Forms perguntando se os alunos tinham
época em que havia um auxílio de R$400,00
condições de permanência estudantil e de acessar
(quatrocentos reais) por mês para alunos bolsistas
as aulas online em junho de 2020 – quando já
arcarem com esses custos – atualmente, somente
havia se passado quase 3 meses de aulas online.
alunos de Medicina e Odontologia podem
Mas nada além disso. Não houve retorno desse
requisitar esse auxílio, uma vez que somente
formulário. Além disso, a aferição documental
esses cursos são considerados de período Integral
anual foi mantida e, no mês seguinte, o NAS
devido à carga horária; logo, cursos como a
encaminhou as instruções para que se enviassem
Psicologia, apesar de serem integrais, não
os documentos via Microsoft Teams comprovando
garantem o direito a esse auxílio. Todo esse
renda e outras condições necessárias para se
panorama reduz o alcance do programa e
manter a bolsa. Nós, alunos bolsistas, nos
desmente seu próprio nome, já que não beneficia
mobilizamos e fizemos um abaixo assinado contra
a todos, mas apenas uma parcela de baixa renda -
as aferições documentais abusivas que exigiam
que nem sempre é a mais baixa.
diversos documentos com firma reconhecida em
Não bastasse a situação delicada em tempos cartório, o que expôs alunos e seus familiares ao
habituais, a ausência de auxílios ou políticas de risco da contaminação pelo Coronavírus devido à
permanência de alunos de baixa renda na necessidade desse deslocamento. Ao todo foram
universidade, durante uma pandemia há um 347 assinaturas de alunos PROUNIstas e 396
agravamento da situação daqueles que assinaturas de alunos pagantes que
enfrentam barreiras econômicas para dar demonstraram seu apoio, além de mais de 180
continuidade nos estudos em nível superior. relatos expondo todas as dificuldades para o
atendimento desses requisitos do NAS.

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REFLEXÕES DE UM BOLSISTA PROUNI DURANTE A PANDEMIA

Apesar de toda a mobilização, não houve retorno Houve um tempo que afirmavam que o PROUNI era
novamente. A reitoria da Universidade e o NAS um erro, pois alunos de escolas públicas não teriam
simplesmente ignoraram as reivindicações e capacidade para acompanhar o ensino privado.
mantiveram o sistema de aferição documental Hoje, mais do que desmistificado, é comprovado
como se a pandemia não existisse. É interessante através do sucesso acadêmico de alunos bolsistas
notar como ao afirmar que um sistema que essa afirmação não passava de preconceito. Por
responsável pela manutenção de um direito outro lado, atualmente os questionamentos são
assegurado por lei, a bolsa de estudos, é intitulado outros, não sobre as capacidades dos bolsistas e não
mais regido pelo preconceito, mas sobre as
de solidário, desloca-se o verdadeiro papel do
condições objetivas que estes têm para alcançar um
núcleo. Solidariedade e assistencialismo, mas não
bom desempenho.
deveres. O que o NAS supostamente faz pelos
bolsistas é um gesto de caridade, É necessário ter em mente que a Universidade
descompromissado - é como se fosse um favor. Se privada não foi pensada para alunos de baixa
o que se presta aos alunos é um favor, não se deve renda. O acesso à educação dessa população,
reclamar; cabe a nós, apenas aceitar as aferições subverte uma lógica elitista da qualificação
documentais abusivas e rezar a ladainha da profissional que perpetua o domínio de classes
solidariedade. Até porque, nenhum aluno deseja subalternas e mantêm o capital social e intelectual
ter sua bolsa cortada porque não enviou dezenas nos perímetros daqueles que podem pagar para
de documentos exigidos com um prazo muito ocupar esse espaço. A desigualdade e o descaso
curto e claro, durante uma pandemia. suscitam uma necessidade urgente de mudança
nesse ambiente para que haja uma maior
O descaso sistemático da Universidade que incidiu
visibilidade dos percalços de alunos bolsistas para
sobre os pagantes durante as revogações de
se manterem na faculdade e conquistarem
redução da mensalidade incide apenas de
igualdade de condições para continuarem seus
maneira diferente – e intensificada – sobre alunos
estudos. Como outrora disse o movimento do
bolsistas. Antes mesmo da pandemia já não havia
Centro Acadêmico por melhores condições de
condições alimentares a preço popular dentro do
alimentação no campus “a gente não quer só
campus, com restaurantes a preços altíssimos, não
comida”, - acrescento aqui, como bolsista –
havia desconto no xerox e sequer o mínimo auxílio
queremos também condições de permanência,
para a permanência estudantil. Acontece que
menos aferições documentais abusivas e
crises como a que enfrentamos não
visibilidade das demandas de nossa população
necessariamente produzem novas desigualdades,
estudantil.
mas antes, escancaram estas que já existiam.
Diante desses percalços, os alunos seguem, se
mantendo como podem – porque trancar o curso
também não parece uma boa opção quando já se
garantiu a bolsa por mais um ano. Não parece
Miguel José Camargo de Jezus
ainda uma boa opção, quando a necessidade de
Graduando em Psicologia na Pontifícia
entrar no mercado de trabalho e ter
Universidade Católica de Campinas (PUC-
independência financeira é premente e a
Campinas)
realidade de muitos alunos de nível
Bolsista de iniciação científica do CNPq e
socioeconômico baixo.
membro do grupo de pesquisa: Psicologia da
Espero apenas que essas reflexões sirvam de apelo saúde e do desenvolvimento da criança e do
àqueles que devem dar atenção, ainda que adolescente.
solidária, e dar o devido suporte para que se
compreenda que políticas de ações afirmativas
não são meramente a implementação de um
sistema de bolsas ou de cotas; é necessário
suporte continuado para oferecer o mínimo de
condições para que alunos bolsistas continuem
seus estudos.

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JORNAL DO CA 27 DE AGOSTO DE PSICOLOGIA 

POSICIONAMENTO DO

CENTRO ACADÊMICO
O ano de 2020 começou e terminou sendo um De maneira alguma o Movimento Estudantil deve
desafio, até o último momento. Muitos dos planos enxergar os últimos acontecimentos como
foram adiados e a manutenção da luta do derrotas. Foi durante o ensino remoto, imposto
movimento estudantil se mostrou como uma sem diálogo algum, com mensalidades cobradas
tarefa difícil de ser cumprida. Cenário que não se integralmente, que o corpo estudantil se
fez diferente do encontrado no curso de Psicologia mobilizou e o curso de Psicologia se fez presente
e enfrentado pela atual gestão e todo o corpo nessa luta. Foi durante esse momento que
estudantil. Como se mobilizar e se articular sem o entidades de base de tantos cursos se uniram e
contato, sem a presença, sem os estudantes? nos permitiram ter um vislumbre do que seria ter
Todos os acontecimentos, respostas e posturas da um DCE novamente e a falta que nosso Diretório
faculdade indicavam que nada seria como Central dos Estudantes faz.
imaginávamos em 2020. Surpresas negativas
No posicionamento publicado na edição anterior
atingiram o corpo estudantil em cheio, a falta de
do Jornal Refrata enumeramos, com detalhes, as
comunicação e transparência por parte da PUC, o
ações tomadas pelo C.A. de Psicologia. A gestão
desamparo referente às evidentes dificuldades
(Re) Uni deu o melhor para cumprir com seu papel
financeiras, estruturais, sociais, psicológicas,
e planos estabelecidos durante as eleições de 2019.
enfrentadas diariamente pelos estudantes, a
Sua contribuição para a história desse Centro
censura e negligência diante de movimentos
Acadêmico ficará marcada. Muito aprendemos,
legítimos, a interrupção de tantas trajetórias no
celebramos e nos organizamos pela
ensino superior pela falta de compreensão e ação.
representatividade do corpo estudantil, que se fez,
A sensação era de estarmos com as mãos atadas.
em igual medida, fundamental para o
enfrentamento desse período que vivemos.
Mas foi igualmente surpreendente o fato de que
conseguimos nos articular e realizar um O Movimento Estudantil e entidades de base
movimento com tamanha adesão. Algo que não como o C.A. de Psicologia são essenciais para que
era visto há algum tempo no cenário do, a voz dos estudantes seja ouvida, para que sua
tradicionalmente forte, movimento estudantil da mensagem seja ecoada dentro de instituições que
PUC Campinas. O C.A. 27 de Agosto de Psicologia, insistem em fingem que nada está acontecendo e
em um ano acometido por uma pandemia, que faz com que as injustiças sejam colocadas
articulou junto a tantas outras entidades de base, como meros desafios que teriam como resultado
lutando pela redução das mensalidades, por uma imediato a união. Os desafios dos últimos meses
comunicação democrática e efetiva entre a realmente nos uniram, mas as questões,
instituição, docentes e discentes, pela demandas e necessidades nos diferenciam
transparência financeira e pela consideração das daqueles que se aproveitam da narrativa de
demandas estudantis nas decisões a serem companheirismo quando estão de olhos fechados
tomadas. Lutamos e a PUC manteve seu para a realidade. É pela existência e resistência de
posicionamento negligente, em busca do organizações de alunos com posicionamento
enfraquecimento do movimento estudantil, já político e linhas de ação coerentes com a
sendo de conhecimento geral que essa é sua realidade da comunidade acadêmica e local que
forma de agir diante das demandas trazidas pelos podemos sonhar com um cenário em que a
estudantes. permanência estudantil, o diálogo democrático e
construção conjunta de uma universidade para
todos sejam parte do nosso cotidiano.

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POSICIONAMENTO DO CENTRO ACADÊMICO

Nossa passagem pela faculdade tem um tempo


limitado, de cinco a seis anos, precisamos nos
articular de maneira efetiva, dos alunos que
acabam de chegar aos que já estão para se inserir
no mercado de trabalho. Assim, é fundamental
compreender como funcionam as entidades e
organizações estudantis dentro da graduação. O
Centro Acadêmico 27 de Agosto possui um
estatuto:
e seus integrantes são definidos por meio de votos,
em um processo eleitoral organizado pelos
próprios estudantes do curso de Psicologia. Uma
comissão eleitoral é responsável pelo
desenvolvimento da eleição e duas ou mais chapas
de no mínimo 5 alunos matriculados no curso
passam então a concorrer pela próxima gestão do
Centro Acadêmico. As eleições ocorrem
anualmente no segundo semestre do ano,
normalmente entre Setembro e Novembro.

Gestão 2019-2021 (extendida) do


C.A. 27 de Agosto de Psicologia

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JORNAL DO CA 27 DE AGOSTO DE PSICOLOGIA 

REFLEXÕES

DE SÁBADO A TARDE
Sabemos que os estudos nos exigem muita energia e muito foco, e com isso, às vezes não
temos tempo de pensar em todas as possibilidades para escolher um bom filme ou série,
ou pensar em um bom livro para ler. Dessa forma, vamos iniciar aqui, uma coluna de
indicações do Refrata, para divulgar o entretenimento e a possibilidade de olhares e
sabedorias que a arte pode nos oferecer, e te poupar de cair na indecisão, facilitando
algumas escolhas para curtir um bom momento de descanso!

SÉRIE: MANIAC
Maniac se passa em uma distopia próxima, onde
a trama gira em torno de dois personagens,
Owen Milgrim um jovem solitário e frustrado e
Annie Landsberg uma dependente química com
alguns problemas familiares, e ambos buscam
alguma forma de sanar suas dores de perdas e
frustrações que a vida adulta proporcionou. O
desenrolar da série se inicia quando os dois
personagens aceitam participar de um
experimento para um medicamento, este
prometendo acabar com todas as dores humanas
consideradas (arbitrariamente pela sociedade)
“desnecessárias”. O interessante da série, além da
sacada de questionar o que é o sofrimento
humano e até que ponto podemos extingui-lo, é
a maneira que a narrativa se coloca e como ela se
aprofunda na subjetividade dos personagens,
que no desenvolver da história, descobrem mais
de si mesmos ao lidar com seus próprios
sentimentos, algo que vai muito além de uma
receita de remédio.

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