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Vice-Reitor ‘Timothy Martin Mulhol EDITORA UNIVERSIDADE DE BRASILIA Diretor Alexandre Lima (CONSELHO EDITORIAL Presidente Emanuel Araijo Alexandre Lima Alvaro Tamayo: Aryon Dall’Igna Rodrigues Dourimar Nunes de Moura Emanuel Aratijo Euridice Carvalho de Sardinha Ferro Liicio Benedito Reno Salomon Marcel Auguste Dardenne Sylvia Ficher Vilma de Mendonca Figueiredo : Volnei Garrafa Simmel ea modernidade Jessé Souza Berthold Oelze (organizadores) Tradugaio Jessé Souza Berthold Gelze Sebastidio Rios Clarissa Rios aa UnB A we te FUNDAGAO UNIVERSIDADE DE BRASILIA Reitor Lauro Morhy Vice-Reitor ‘Timothy Martin Mulholland EDITORA UNIVERSIDADE DE BRASILIA Diretor Alexandre Lima CONSELHO EDITORIAL Presidente Emanuel Aragjo Alexandre Lima Wvaro Tamayo Aryon Dall’Igna Rodrigues Dourimar Nunes de Moura Emanuel Aratijo Euridice Carvalho de Sardinha Ferro Licio Benedito Reno Salomon Marcel Auguste Dardenne Sylvia Ficher Vilma de Mendonga Figueiredo Volnei Garrafa O dinheiro na cultura moderna (1896) ‘sesse formular a contradigao da época mo- derma, especialmente em oposicdo & época medieval, ent&o poderia tentar como se segue: Na Idade Média, 0 homem encontrava-se encadeado numa relago com uma comunidade ou com uma pro- priedade feudal, com uma associagio, ou com uma corporagdo; sua personalidade era incorporada nos circulos de interesses préticos ou sociais, O carster destes cfrculos era formado pelas pessoas que 0s constitufam de maneira imediata. Esta unidade foi destruida pela época modema, Por um lado, ela possibilitou a autonomia da personalidade'e dev a ela uma liberdade de movimentos interna e externa incomensurével. E deu, por outro lado, em compensago, um cardter objetivado incomensuravel aos contetidos préticos de vida, Na técnica, nas organizagdes de cada tipo, nas empresas e nas profissdes impde-se cada vez mais 0 dominio das proprias leis das coisas, que separam tudo isso das miiances de personalidades sin- gulares — como, tendencialmente, a nossa imagem da natureza perde mais € mais os tragos humanos em favor de uma legi objetiva. Assim, a £poca modema conseguiu separar e autonomizar ‘0 sujeito e o objeto, para que ambos realizassem o proprio desen- volvimento de forma mais pura e mais rica. Como ambos os lados do processo da diferenciagdo foram atingidos pela economia de dinheiro, 6 0 que teriios de analisar aqui. ‘A telagao entre a personalidade e as suas propriedades realiza- ist6ria alema até a altura da Tdade Média, em duas formas caracteristicas: na origem encontramos a posse da terra como se fosse uma competéncia de uma personalidade como tal. A posse resulta da filiagZo de um homem singular & sua comunidade de 2 ea ee 9 24 Simmel e a modernidade mercado. J4 no séoulo X, ‘Agora, todo direito pessoal tornou-se def e terra, Por exemplo: aquele que posst ‘pidade rural a qual pertencia nao valia m: exigia o arrendamento de uma propriedade lguém como membro completo) do que uma pessoa qualquer. Em ‘ambos os casos, porém, persistia uma est ago local entre & pessoa e a posse de terra. Por outro lado, era necessério que uma pessoa de posse, cujapropriedade se encontrava neS ‘comunidade, Pen, no entanto, periencer 2 ela (um homem livres rt cidado, ae Corporagio, etc), fosse obrigada a denominar um supstiul®, Gqual servia pessoalmente ao dono da terra emprestada e se com + eee diveitos e 05 deveres de um servidor cortesio Ses entre personalidades e relacdes ob- jomia-naturat — famente qué itativa em si mesma do pde uma distancia entre pes- Soa e posse, fornaido's relagdo entre amas mediada- Ela diferen- saa em isso, a relagio anteriormente to fatima entre element pessoais € locas, de tal modo que posso receber hoje em pest. as minhas encomendas de wrens americanos, de hipesces orueguesas e de minas de ouro afticanas. Aceitamos eit forma de posse, eficaz 2 distincia, como se fosse ums dade. Mas state se tomnou possivel desde que o dinero se impos entre Posse « proprietério, separando-0s ¢ ligando-os sresca fongo, 0 dinheiro confere, por um lado, um. caréter ny pessoal mente desconhecido, «toda atividade econdrie, por outro lado, ‘aumenta, proporcionalmente, & autonomia e a inde- pendéncia da pessoa, A relago entre a personalidade e a comuni- Bendenmeenvolveu-se de maneira semelhante. A corporacio ava 6 Bomem por inteiro, uma corporaséo vo era urna mera associagdo de individuos que se Timitava wettuar dos simples interesses de seus membros, mas sim Ws ¢O oimidade de vida, seja em aspectos tEenicos, socais, eligiostt os, seja em outros aspectos a mas. Mesmo que €st2 associ: © dinheiro na cultura moderna 25 medieval tenha se 1 tenha se dedicado a interesses especificos, ela exis- te porém, diretamente nos seus membros, os quai privados de os, ram complement shores por ontrariament ; irariamente a esta forma unifieadora, a economia do di- vimeras.associagGes, qile somente ‘as de seus membros apontam de lucro, Isso possibilita, por uma parte, idades da associagao, isto 6, 0 seu ie de colaboragio pessoal, de lagos constrangedores, todo, princi exigem contribuigdes monet para um tre A 8 we propitri posse — e assou a proprcionar & ambas uma mia recfproca e uma possibilidade de desenvolvimento, se mostra totalmente objetiva e indepen- enquanto este no faz parte com uma soma de dinheiro. que 0 dinl sé he ir mais € thais coisas cad i sees r s cada ver mail fas. E exatamente esta auséncia de um cardter espectfico a n posses o seus servgasimensos, gerando uma comuni- 5 de individuos e grupos que normalmente i sua separaglo e dist€ncia mitua em tod > : separa em todos 0s outros aspectos. F ma-se, ento, um novo fio cond ‘de vida que lutor pat ti ees para os contetidos de vida que ia de mostrar dois exemplos qu mente a sutileza da fronteira pos: parecem apresentar itada pelo dinheiro. na 4 Franga, sindicatos de associagtes ‘tfabalhistas de um mesmo 26 Simmel ea modernidade género, de maneira que cada associagdo contribufa para um nico fundo sindical a partir do seu fundo sindical comum. Aquele fundo era dedicado as compras em atacado, & concessio de créditos 20 consumidor, ete.; mas ndo era a finalidade dos sindicatos unir as suas associagdes numa associagZo tinica, pois cada uma destas, devia manter a sua organizagio especifica. Este caso histérico é muito significativo, dado que os trabalhadores desta época estavam tomados por uma verdadeira paixo de formar associagdes. Eles tinham de ter motivos muito fortes para esta distancia miitua, re- Jeitando a fusio to facil naquela situag3o. Mas, mesmo com bons motivos para 2 separago, encontraram uma chance de usar a uni- dade de seus interesses, reforcando-os por meio da posse conjunta de dinheiro E mais: 0 sucesso da associagdo “Gustav-Adolph”, esta grande comunidade de ajuda as comunidades protestantes pobres, teria sido impossivel sem o caréter objetivo das contribui- Ges monetirias, que disfargava as diferencas confessionais dos contribuintes. Na medida em que o d fazia com que este projeto comum de luteranos, de reformados e de unidos [os trés ramos principais da igreja protestante alema) — que nao aceitariam nenhum outro motivo para se unir — se realizasse, ele servia como cimento ideal € intensificava o sentimento de companheirismo entre todos os envolvidos. Podemos generalizar que 0 sindicato, organizagao praticamente desconhecida na Idade Média, 0 qual concentrava, por assim dizer, 0s aspectos impessoais dos individu- 6s para a realizagio de uma aco, nfo teria tido seu enorme suces- 80 sem 0 concurso do dinheiro. Foi o dinheiro que nos ensinow como reunir sem nada perder de especifico e préprio da personal dade — uma forma de unio que é, hoje em dia, perfeitamente ‘comum para nés, mas que representa uma das mudangas e um dos progressos mais importantes da cultura. Quem lamenta o efeito separador e alienador do intercémbio monetério no deve esquecer 0 seguinte: 0 dinheiro gera uma liga- fio extremamente forte entre os membros de um setor econdmico pela necessidade de trocar dinheiro para obter valores definidos e concretos. E precisamente porque 0 dinheiro nao pode ser consu- mido imediatamente, ele aponta para Outros individuos, dos quais se pode exigir 0 que se quer consumir. Conseqiientemente, 0 ho- 0 dinheiro na cultura moderna 2 mem modero depende de um ntimero incomparavelmente maior de fomecedores e de fortes de abasiecimento do que os. homens es da antiga Germania ou, mais tarde, os servidores dependen- Sua existéncia encontra-se em cada momento numa rede de ages tecida por centenas de interesses monetérios, sem os quais, ele tampouco poderia continuar existindo como um membro de um nico afastado da circulagdo de sangue. Contribuiu para 0 10 da vida modema a nossa divisio ca pré-monetéria, obviamente as. Como comparar os 's se ainda no hd nenhum padrdo ades mais distintas? Como reali- pido sem um meio de troca que sirva e vice-versa? Na medida em que o dinheiro possibilita a divi- so do trabalho, ele encadeia os homens de maneira irresistivel, agora cada um trabalha pelo outro. Somente o trabalho de '$ gera a Unido econdmica abrangente que completa os desem- laterais do individuo.! vemos que 0 dinheiro instaura incompara- S que nos estégios da associa arbitréria, ambos louvados pelos da associagio. Por fim, 0 dinheiro estabeleceu um nivel de interesse tio co- mum e abrangente para todos os homens como nunca foi possfvel nna época da economia natural. O dinheiro garante um solo do en- 1, O pagamento em dinheiro promove a divisto de trabalho, pois, normalmente, iro para um desempenho especializado: 0 equivalente mo- inexisteeservidlo)dinheir para um Romer como um 106 Gai toda sua es- pecfieidade, mas sim para o seus desempentos na dvisio do trabalho. Por aust disso, a formagio da visio de trabalho precisa de ampliagio da exo- noma montisa e vie-vers, ‘A parr deste fat, etplicam-se as defcincss e contradigdes da celagio ‘modem com os servidores de casa (as empregadas, et) pois guise compra com dinheto, de fato, anda um homem por intro, inclusive atoalidade do seu desempento 28 Simmel e a modernidade tendimento imediato, uma tal igualdade de diretrizes que contri- buiu, certamente, de maneira decisiva, para a representagao mesma de uma idéia, como a do humai 2 qual teve, desde 0 ral — como ja se prenunciava na cultura romana no momento em que esta estava totalmente penetrada pela economia do dinheiro Assim como o dinheiro em geral fez surgir — como resulta, evidentemente, da nossa explicagio — uma proporgio radical. mente nova entre liberdade e compromisso, a reunificac¥®; énifiti- camente estreita e inevitavel, efetuada por ele provoca, por outro Jado, a conseqincia estranha de abrit.um espaco extraordina. riamente vasto para a individualidade e para o sentimento de inde- pendéncia. O homem das épocas econémicas anteriores encontra- va-se na dependéncia de poucos outros homens, mas estes outros eram individualmente bem definidos e impermutaveis, enquanto hhoje em dia dependemos muito mais de fornecedores, mas pode. ‘mos permuté-los a0 nosso bel-prazer. Precisamente uma tal relagdo tem de gerar um forte individualismo, pois nao € 0 isolamento em si que aliena e distancia os homens, reduzindo-os a si préprios. Pelo contritio, é uma forma especifica de se relacionar com eles, de tal modo que implica anonimidade e desinteresse pela individu. alidade do outro, que provoca o individualismo, Conforme a nossa caracterizacio da época moderna, a organi- 2agio monetiria possibilita, diferentemente dos tempos nos quais cada relago extema era simultaneamente pessoal, uma disting2o mais pura entre a ago econdmica objetiva do homem e a sua colo- ragio individual, 0 seu proprio ego, que agora se afasta daquelas relagdes e quase se retira em diregZo as suas esferas mais intimas. As correntes da cultura moderna deséguam em duas direges aparentemente apostas: por um lado, na nivelago e coWiensagz, no estabelecimento de circulos sociais cada vez mais abrangéhites or meio de ligages com 0 mais femoto sob condigoes iguais; por outro lado, no destaque do mais individual, na independéncia da Pessoa, na autonomia da formacdo dela, E ambas as diregBes sf0 transportadas pela economia do dinheifo que possibilita, por um Jado, um interesse comum, um meio de relacionamento e de comu- nicagZo totalmente universal e efetivo no mesmo nivel e em todos 0 dinheiro na cultura moderna 29 os lugares, possibilitando & personalidade, por outro lado, uma reserva maximizada, permitindo a individualizagio e a liberdade, Esta ditima consequiéncia carece ainda de uma prova. A ex- press ¢ a abstragao do desempenho por meio do dinheiro eram percebidas, desde 0 inicio, como instrumento e apoio da liberdade a lei romana decidia se alguém obrigado a ido poderia se recusar a cumprir o dever por meio” r, Mesmo contra a vontade dos credo- ento do seu valor em dinhei- we seria possivel descartar-se Reconhecendo isso, chamava-se liberdade pessoal” na érea do direito reco, realizava-se, freqiientemente, a libera~ idotes dependentes. Os artesdos, dependentes de uma res medievais, chegaram muitas.vezes.& liberdade, ‘orrendo 0 caminho em que, primeiramente, se limitavam os is servigos, depois fixavam-se (codificavam-se) e, finalmente, mse em tribulos monetérios. Resultou, conseqiien- we progresso em direcdo & liberdade, quando os século XIII, puderam substituir 0 hadores por meio de paga- nente, encontrava-se entre os es de Joseph II, os quais eram dedicados & igurago da emancipago dos camponeses, um decreto que permitia e até prescrevia que eles pagassem os seus deveres e tri- bbutos naturais em dinheiro. ‘A substituigao do desempenho pessoal pelo pagamento em di- iro liberta, de repente, a personalidade da cadeia especifica posta pela obrigacio de trabalho: agora ndo era mais a atividade concreta pessoal que 0 outro podia reivindicar, mas, sim, somente o resultado impessoal desta atividade. - No pagamento em dinheiro, a personalidade ndo se dé mais a i mesma, mas sim a algo totalmente abstrato ¢ livre de toda rela- do interna com 0 individuo. Este motivo, porém, pode também fazer com que a substituigao do desempenho pelo dinheiro provo- que uma opressio. A privagao de direitos dos sécios de Atenas comegava com a substituigdo dos tributos anteriores em say e “haws 30 Simmel e a modernidade tripulagdes pelos pagamentos em dinheiro; esta aparéncia de uma iberagdo de sua obrigacao puramente pessoal continha, porém, a renincia a uma atividade politica auténoma e a uma importancia que s6 deve seni , com um desempenho ym forgas reais. Sob uma economia m la, freqiientemente, deste aspect que OS deveres, dos quais nos livramos comprando, existem mui- tas vezes ainda di Ficagdes mais sutis que abandona- ‘mos junto com eles. Como, neste caso, uma duplicidade de conseqiiéncias resulta da doagio de dinheiro, o mesmo sé observa também na Fecepca0 nda. Por um lado, sentimos a transformagao de uma posse em dinheiro como se fosse uma libertagdo. Por meio do dinheiro, conseguimos dar ao valor do objeto qualquer forma de- , enquanto este era preso, anteriormente, a uma forma defi- Wigdes da sua conservagao_¢ vezes uma tal liberdade significa ao mesmo.tempo uma auséncia de contetidos da vida e um afrouxamento da sua substén- Cia. Por isso, a mesma legislacao do século passado, que pei substituigo dos servigos de camponeses por dinheiro, proibia, simultaneamente, aos senhores forgar os camponeses a esta subs. igdo. Parecia, & primeira vista, que ndo haveria um tratamento injusto do camponés se os senhores comprassem dele, por um pre- 0 adequado, os seus direitos a terra (para afasté-lo do territ6rio da fazenda); no entanto, a terra significava, para o camponés, ainda luma outra coisa que o mero valor da posse; esta era, para ele, a hance de uma atividade centro de interesses, uma orien- taco do contetido de vida, a qual ele perdia no momento em que wrocava dinheiro por terra. Os pagamentos freqiientes aos cam, neses, no século XVII, deram-lhes uma liberdade vam-lhes 0 impagével, que proporcionou, antes de tudo, o valor de liberdade: objeto fundamental da atividade pessoal. Isso é, por sua vez, 0 notvel em uma cultura baseada no dinheiro como, por exemplo, 2 Atenas e a Roma tardias além do mundo modemo: 0 dinheiro na cultura moderna 31 mais coisas podem ser compradas com dinheiro, alcanga- inheiro, apresentando-se este, conseqtientemente, como vel no fluxo fugaz das aparéncias, e por causa disso no 105 em consideracdo, freqiientemente, que os objetos da tran- ida tém aspectos que no podem (0 facilmente, que se wvalente exato ¢ total do objeto. Encontra- ivo profundo para o cardter proble- sfagdio da nossa época. jetos perde a sua importincia psico- monetéria. O célculo necessaria- 105 que 0 miicleo € 0 sentido da vida ve7, das nossas mios; as satisfagbes defi nos: sentimos, enfim, que todo esforgo e a pena. época jd se encontra inteira- onde existe uma apro- 105, com certeza, uma dos valores feresse a um mero mais ou me- vo. Sé os primeitos satisfazem os nossos desejos de ira definitiva as coisas mesmas séo também desvalorizadas, num coisas corresponde ao mais baixo entre elas € ‘0 mais alto para o nivel do mais baixo. de cada nivelagio, dado que ela conduz, ime- lugar do elemento mais baixo. lescer, mas quase nunca o inferior se Assim, o valor mais especifico das re) aA 32 Simmel e a modernidade coisas fica prejudicado pela possibilidade constante da transforma: 40 do mais heterogéneo em dinheiro. E a lingua tem razio, por isso, quando chama de “impagavel” o que € muito especial e assi- nalado. A arrogincia blasé de nossas classes que tém dinheiro é somente um Feflexo psicolégico desse fato. Eis por que elas tém, agora, ui instrumento que permite, apesar da Sua indiferenga uni, forme, comprar 0 mis variado e o mais especial. E a sensibilidade suuil para as atragbes especificase individuais das coisas atrofia-se mais e mais, porque a pergunta sobre o valor qualitativo est cada vex mais reprimida, nessas classes, pela pergunta sobre o valor quantitativo, pois exatamente isso € a artogancia blasé: n&o reagir mais as diferengas e propriedades especificas dos objetos com uma graduagdo correspondente da sensagio, mas. sim senti-las de ma- aera nivelada e, por isso, com uma coloragao abafada sem ampli- tudes significantes de contrastes. ter nivelador que o di- coisas — ou seja, 0 mais perde sua importancia anterior para certas relagdes elevadas: a multa penal, por exemplo, mitou a sua area de atuagdo. O direito da Germénia antiga costu- mava expiar 0s delitos mais graves, até o assassfnio, por meio de dinheiro. A peniténcia religiosa podia ser substitufda, a partir do século XVII, pelo dinheiro, enquanto os direités modérnos Teser- vam a multa para 08 crimes que so relativamente leves. Iss0'ndo com sua crescente dinheiro: precisamente por med mais, sen- do por isso ainda 1 ncterizado, nfo pode mais servir para a 5 © excepci- onais, nas quais 0 sio atingidos. O di as ético-religiosas sobre s essencial da personalidade . Por exemplo, as exigénci- 1S quais repousava a sango penal da Igreja, precisamente porque tudo pode ser comprado com dinheiro 0, coincidem duas correntes impor- endo apesar disso. Neste p tantes do desenvolvimento hi primitiva, compensar com va, por um lado, 0 seguinte: 0 individuo, como tal, ainda no se destacava muito no seu valor, ¢ ainda nao era percebido como se 0 dinheiro na cultura moderna 33 comparavel ¢ insubstituivel, como aconteceu mais tarde s ele se destacou do grupo de maneira mais decisiva e indi- ada; e significava, por outro lado, que o dinheiro ainda nao ’o indiferente, tio apartado de todo significado qualitativo A dliferenciagio progressiva do homem e a indiferenga progressiva ) dinheiro coincidem, de modo a tomar a expiagdo do assassinio, io de dinheiro, impossivel. 1 erosio e da deteriorago do dinheiro pelo circulo erescenie | s equivalentes resulta uma segunda conseqiéncia extrema- jrtante da dominagio do sistema monetério na mesma nndo se percebe que o dinheiro é meramente um meio para s bens — pensa-se nele como se fosse um bem auténo- toda sua significago advém do fato de ser um ele- na seqiiéneia que leva a um fim e a um consumo s. Do mesmo modo que a maioria dos homens modemos \ ter diante dos olhos, na maior parte da vida, o ganho de ro como motivago mais prOxima, forma-se a idéia de que iva na vida so ligadas, certa forma de dinheiro, O dinheiro, monigéo, toma-se, intima- \strago mor- s homens de mado uma certa Quando as a no dinhei nega a revelar o seu cardter e insatisfatério ra elevada, pois ela con- 19s dos homens no so ago imediata como. primitivos; 0s prop6sitos tor icados, dificeis e remotos que eles ‘Simmel e a moderhidade ee eka an, 34m construczo composta de meios e instrumentos ‘0 composto de m Préximo, chega, porém, o perigo de petdes a si ‘© de meios © de esquecer, com isso, a finali- aitécnica de todos os aspectos da ema de meios e de instrumentos puros [Ano mais complicada, sofisicada e diferenciada ela € quanto mais parece uma finalidade isfatéria que no se coloca Mm persistindo, como exigéncias que se autofun, ‘© aqueles fins cairam no esquecimento hi tempo ou tomaram-se ilus almente, como parece, a tensio, de esperanga 'e de pressio ni ¥ tivessem a chegar — a coisa Principal, o definitivo, o'sentida pré- brie © © Ponto central da vida e das coisas. Este sentimenn, ; certamente, do supercrescimento dos meios (0 constran- setlor da nossa técnica complicada de viver, de consoars ‘meios gobre meios até chegarmos as suas devidas finalidadee originais Estas fi is deslocam-se, cada vez mais, do hotizonte de consciéncia e, finalmente, afundam,se sob este. Nenhum outro elemento tem, neste processo, uma importancia maior que 6 dinhet- fo. Nunca antes aconteceu que um objeto de valor meramente eeea a Ssumisse o papel de um fim satsfat6rio por si meena — seja aquela sat orice ou verdadeira — com tanta forga, nia na situaco geral da vida, ue © dinheiro assume por meio do cres leangéveis por ele istadia a ic08 da Vida moderna 0 dinheiro na cultura moderna 35 inheiro abriu, para o homem singular, a chance & satisfagio seus desejos numa distincia muito mais préxima e mais tentagdes. Existe a pos: tador. E porque, quan- tomam-se aleangéveis, o 0 resto seria mais fécil de alcangar que la felicidade, porém, aumenta o desejo nente remoto e proibido que acende a mas, mas sim o que néo é pos- proximar-se cada vez mais — como igo monetiria. O desejo enorme do ue se mostra niio menos em Kant do hauer, no menos na democracia social do que no crescente atual, alimenta-se, obviamente, do poder e iro. A “aspiracio” especificamente modema de ira vez, a devogdo e 0 desejo fe da alma, enquanto as religies 36 Simmel e a modernidade anteriores ligavam a disposigZo religiosa a lugares e horas defini- das. Assim também o desejo de dinheiro é 0 estado permanente da alma na economia de dinheiro completamente instalada. Por isso, 0 psiedlogo nao deve negligenciar aquela queixa co- mum que acusa 0 dinheiro por ser.o deus da. nossa época, E claro que ele s6 pode constatar este fato e descobrir relagdes. significativas entre ambas as apresentagSes de Deus porque é um privilégio da psicologia no cometer blasfémias. A idéia da exis. téncia de Deus tem a sua esséncia mais profunda na reunido de todos 0s conjuntos ¢ de todas as diferengas, ou seja, como bem exprimiu Nicolaus Cusanus, pensador notavelmente modemo do fim da dade Média: na Coincidentia oppositorum. Da idéia da Feconciliagdo e da reunido de todas as heterogeneidades e de todas as diferencas nao reconciliadas no deus resultam a paz, a seguran- mento que acompanham a apre- s. No d dos sentimentos sem diivida, alguma se- cada vez mais a expresstio abgoluta- © 0 equivalente de todos os valores, supera, numa meramente abstrata, toda variedade dos objetos. Ele se tora ual as coisas mais distintas, mais heterogéneas, mais Temotas encontram o seu elemento comum e se tocam. Com isso, xem o dinheiro consegue, de fato, esta superagdo do singular concede esta confianca na sua onipoténcia, como se fosse o princt. pio mais alto que nos proporcionaria, momento, aquele singular e inferior por meio da sua capacidade de se transformar nele (no singular). Aquela seguranca e trangjiilidade que a posse de dinheiro faz sentir, aquela convicgo de possuir com ele o cen. t1o de valores, contém, de forma psicologicamente pura, quer di- zet, de qualidade formal, o centro da equagao que justifiea, de ‘maneira mais profunda, a queixa j4 mencionada, de que o dinheiro seja o Deus da época moderna, Da mesma fonte nascem, também, tragos caracteristicos do homem modemo que levam a uma outta diregdo e se encontram ge dagui: a economia monetéria exige operagdes matemsticas as no comportamento”social do dia @ dia. A vida de © centr 0 dinheiro na cultura moderna at hes ns € preenchida de tais operagdes, como taxar, estimar, cal- © reduzir valores qualitativos a valores quantitativos. Isso i para o carter racional e calculador da época moderna em sigdo as épocas anteriores, que tinham um cardter mais is emocional, mais dirigido ao todo. A invasio da_ ria tinha de implantar nos contetidos de vida uma muito maiores, 0s quais ensinavam a or até as suas diferengas minimas as coisas em suas inter-relagdes dro geral da moeda € um paralelismo as relagdes econdmicas da vida Aros conteiidos progridem com a am- ia! monetiria — mas sem promover um estilo so da vida. O uso sempre crescente de moedas */ a diregao, proclamando a ampliagao da ecs- © ano 1759, 0 Banco Central da Inglaterra abaixo de 20 libras esterlinas. Desde esterlinas, Outro fato ainda mais si- 1s notas circulavam 51 dias antes de 25% de de que cada um tem ditheiro.trocadp?na mprar, rapidamente, quaisquer voisas pequenas, | © desejo espontineo, tem de motivar indistrias que dade do dinheiro em eral vai contribuir, com certeza, para umrés- 0 na formagdo externa, especialmente ha moderna, e para um mimero crescente de para “decorar” (ausgestalten) a vida exatidao que a divulga- igamente a divulgacao ‘es internas do homem 38 Simmel e a modernidade meio do seu cardter objetivo e indiferente, pelo qual ele se oferece, do mesmo modo e sem relagio interna, no s6 & aco mais nobre Como também 2 ago mais baixa — uma certa leveza e irresponsa. bilidade do agit, que é inibido, com freqiiéncia, quando falta a mera intermediacao do dinheiro, por meio da estrutura peculiar dos objetos e da relacao individual do agente com eles. Assim aconte. ceu que geralmente honestas partic param das “fundamentagdes” mais sinistras. Muitos homens agem com maior irresponsabilidade e ambivaléncia quando se trata de assunfos meramente monetérios, enquanto seria de sua disposigao wm comportamento eticamente orientado em outras.situagGes. © resultado finalmente obtido, 0 dinheiro, ndo deixa ver nada de s8es € situagBes so marcadas, inte- n elas de tipo factual ou de tipo bio monetério, ‘obre 0 seu relaciona- "ag0s € 0 motivos mais profundos da nossa cultura buscamos resumir 0 cardter e a grandeza da vida modema numa ica {Srmula, pode resultar aquela: os contetidos do conhe mento, da ago © da formagao ideal so transformados de um esta. do ‘substancial ¢ estével num estado de desenvolvimento, i¢80 € habilidade. Cada observagio dos destinos destes tidos de vida que se desenrolam diante dos nossos olhos ‘mostra claramente este trago de sua formagdo: estamos desistindo de verdades absolutas que estejam fora de toda evolugio, Estamos do mio, com prazer, de transformagées, do crescimento e da ica continuos do nosso conhecimento — pois isto 6, precisa mente, 0 que se mostra, continuamente, como “empiria” em todas as areas. As espécies de organismos nao valem mais como ideais eter- ‘os da criagdo, mas como pontos transitérios de uma evolucdo ad vinitum. A mesma tendéncia estende-se até a matéria morta e at icOes espirituais mais altas: a cigncia natural moderna nos 0 dinheiro na cultura moderna 39 no dissolver a rigidez da matéria num rodamoinho inces- simos, Estamos reconhecendo que os ideais dle épocas anteriores — ideais fundamentados fora da a contradi¢a0 de coisas (empiricas) — so dependen- s histéricas, na medida em que se adaptam &s suas de um grupo social desfazem-se cada vez idez de lagos e de tradigdes, como € penetrada — seja para o bem seja por meio de uma varie- wando em si mesmo, por us coisas. A este grande gue, radicalmente, a ;corpora-se o dominio sesso e sendo sustentado por ele, das, falando-se metaforicamen- 1m o seu valor correspondente num rido, solto qualquer caréter defi- Se as suas superficies de atrito no ipensagdofigualizagao. A sua cir- uma outra velocidade do que n dos exemplos. mais se da terra a partir do dominio a estabilidade a labilidade que do mundo por inteiro agarrou tam- . 0 universo econdmico, cujos aconteci- daquele movimento geral, o simbolizam e 0 a aqui € somente a observagio de que @ mesmo parecendo obedecer &s suas prépri- seguindo 0 mesmo ritmo que regula a simultneos da cultura, incluindo, tam- ideragdo do dinheiro — em diferen- rico que coloca o processo cultu- ndéncia de condigdes econdmicas — que a ca influencia, profundamente, a situagio 40 Simmel e a modernidade Psfquica e cultural de uma época, mas esta formagdo recebe, por Outro lado, o seu cardter das grandes correntes homogéneas da vida hist6rica, cujas foreas e cujos motivos sitimos s40, todavia, segre- dos divinos. Se estas igualdades formais e estas conexdes profun- das mostram a economia de dinheiro como um ramo da mesma zaiz que alimenta todas as flores da nossa cultura, ento podemos Uirar, daqui, um consolo para aquelas queixas sobre os esttagos feitos pela economia monetéria e sobre as auri sacra fames que Sio proferidas, especialmente, pelos protagonistas dos bens ideais © agradaveis, Quanto mais 0 conhecimento se aproxima daquela raiz, tanto Inais se perfilam as relagbes da economia do dinheiro nfo s6 com 08 aspectos escuros como também com o 19 da nossa cultura, com efeito de alto e com 0 mais, ie 0 dinheiro, comportando- ss, pode parecer-se com a forga as feridas A divisao do trabalho como causa da iferenciagdo da cultura subjetiva e objetiva (1900) designamos os sefinamentos, as formas espritualiza- ¢ os resultados do trabalho interior e exterior da vida Jenamos, com iss0, esses valores em uma pers- dando se sustentam por meio da iva, Para n6s, eles so conteiidos da 3s como desdobramentos eleva- is — elevados além da medida renciagio que seriam ou indicagzo ccxstir para estar pré-requisito valores da eza, antes, eles indamento, que de idéias elas te cultura. Se, por- a so igualmente produtos fa precisfo, esta frutffera, enquanto 0 ado em estatua, pois, no a caracteristica naturais da

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