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adriano@ufpr.br
UFCE
Fortaleza (CE)
Julho de 2009
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Resumo: O discurso oficial do Estado Novo inspirou a concepção e a criação das Interventorias
Federais e dos Departamentos Administrativos dos estados. Esses aparelhos, e em especial os
Departamentos Administrativos, foram uma manifestação eloqüente da ideologia autoritária e da
sua forma de conceber e exercer a política. Por outro lado, eles são também o canal privilegiado
por onde a ideologia de Estado se manifesta. Esse aspecto, que a relação linear postulada entre
discurso, instituições e práticas administrativas negligencia, é inclusive mais importante para
entender o sucesso do autoritarismo no Brasil. A comunicação apresenta alguns elementos
empíricos para entender porque os Departamentos Administrativos podem ser, nesse contexto, o
meio eficiente de integração entre as oligarquias tradicionais e as idéias do regime estadonovista.
Palavras-chave: Estado Novo; Departamentos Administrativos; ideologia autoritária.
Abstract: The official discourse of the Estado Novo inspired the conception and creation of the
Administrative departments of the states and the Federal Interventorships. These apparatus and
especially the Administrative departments had been an eloquent manifestation of the authoritarian
ideology and its form to conceive and exercise politics. On the other hand, they were also the
privileged canal through which the state ideology manifests itself. This aspect, which is unseen by a
linear interpretation of the relation among discourse, administrative practices and institutions, is
even more important to understand the success of the authoritarianism in Brazil. The
communication presents some empirical elements to understand why the Administrative
departments can be, in this context, the efficient way of integrating the traditional oligarchies and
the ideas of the estadonovista regimen.
Key Words: Estado Novo; Administrative departments; authoritarian ideology.
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Adriano Codato é Doutor em Ciência Política pela Universidade Estadual de Campinas
(UNICAMP), professor de Ciência Política na Universidade Federal do Paraná.
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Introdução
hierarquia política. Dessa perspectiva, esse aparelho pode ser visto não como
instância de produção da ideologia de Estado, mas de impressão da fórmula
política sobre a consciência da elite e de reprodução dessa ideologia através da
propagação dos encômios oficiais.
Para os nossos propósitos, vale todavia a pena ler uns trechos da longa
oração do Ministro onde nega legitimidade aos reclamantes das “liberdades
públicas e privadas” (os signatários do Manifesto dos Mineiros) e esclarece seu
novo ponto de vista sobre a temporada histórica que atuou como quadro
destacado do velho Partido Republicano Paulista:
protagonista, na chave crítica da ideologia predominante. Tudo o que foi dito dos
mineiros poderia ser dito pelo Ministro dos paulistas e de si próprio, ou de
qualquer grupo político estadual.
A versão burocrática desse louvor ao Estado Novo pode ser lida nos
discursos e nos artigos de Marrey Junior, antigo prócer do Partido Democrático de
São Paulo. Vejamos um trecho particularmente representativo.
que sou membro, e onde, sem a cediça retórica parlamentar, se fizeram as leis
necessárias, como efetivamente se fiscaliza a vida financeira do estado e dos
municípios. [...] Até 1930, eram os governos notoriamente discricionários.
Praticava-se a mentira constitucional ao lado da evidente hipertrofia do poder
Executivo. Imperava a desordem orçamentária. [...] [Hoje] cabe ao Departamento
Administrativo o direito de representar contra as irregularidades que verificar. Não
há, pois, motivo para a falsidade orçamentária. [...] No Departamento
Administrativo poucos cidadãos desempenham a função de que nem sempre bem
se capacitavam deputados, senadores e vereadores. A criação do Departamento
Administrativo realça o governo de sua excia. o sr. Presidente – pois que substitui
com vantagem e relativo pequeno dispêndio as Câmaras em que pacatos
conservadores ou dispersivos livre-atiradores – sem maior exame e quase sempre
sem discussão aproveitável – aprovavam a obra pessoal e imperativa dos chefes
eventuais do poder Executivo (MARREY Junior, 1943:9-12).
Como político de profissão, a forma ideal de colar no regime e, por essa via,
garantir o exercício regular da (própria) profissão política, é cavar para si um
espaço onde a política negue, de forma retórica, e oculte, de maneira eficiente, a
própria política.
Conclusões
Referências
CARONE, Edgard. (1982). A Terceira República (1937-1945). 2 ª ed. São Paulo: Difel.
EAGLETON, Terry. (1997). Ideologia: uma introdução. São Paulo: Editora da Universidade
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LOSSO, Tiago Bahia. (2006). Estado Novo: discurso, instituições e práticas administrativas. Tese
(Doutorado em Ciências Sociais). Universidade Estadual de Campinas. Campinas (SP).
MARREY Junior, J. A. (1943). No Departamento Administrativo de S. Paulo: discursos e pareceres.
São Paulo: Revista dos Tribunais.
PARANHOS, Adalberto. (2007). O roubo da fala: origens da ideologia do trabalhismo no Brasil. 2ª.
ed. São Paulo: Boitempo.
TELLES, Goffredo Teixeira da Silva. (1940). Discurso pronunciado na 188ª. Sessão Ordinária do
DAESP em 31 dez. 1940. DAESP, Anais de 1940, vol. II (Sessões), 2ª. parte.
WRIGHT MILLS, C. (1981). A elite do poder. 4ª ed. Rio de Janeiro: Zahar.