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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS

Faculdade de Direito

Steevan Tadeu Soares de Oliveira

A TROPA DE CHOQUE E A EFETIVIDADE DO DIREITO DE REUNIÃO

Belo Horizonte
2016
Steevan Tadeu Soares de Oliveira

A TROPA DE CHOQUE E A EFETIVIDADE DO DIREITO DE REUNIÃO

Dissertação apresentada ao Programa de


Pós-Graduação em Direito, da Faculdade de
Direito, da Universidade Federal de Minas
Gerais – UFMG, como requisito parcial à
obtenção do título de Mestre em Direito.

Linha de Pesquisa: História, Poder e


Liberdade

Orientadora: Profa. Dra. Mônica Sette Lopes

Belo Horizonte
2016
Oliveira, Steevan Tadeu Soares de
O48t A tropa de choque e a efetividade do direito de reunião /
Steevan Tadeu Soares de Oliveira. - 2016.

Orientadora: Mônica Sette Lopes


Dissertação (mestrado) – Universidade Federal de Minas
Gerais, Faculdade de Direito

1. Direito – Teses 2. Direito de reunião 3. Poder de polícia


4. Movimento de protesto 4. Direitos humanos I. Título

CDU(1976) 342.729

Ficha catalográfica elaborada pela bibliotecária Juliana Moreira Pinto CRB 6/1178
UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS

Steevan Tadeu Soares de Oliveira

A TROPA DE CHOQUE E A EFETIVIDADE DO DIREITO DE REUNIÃO

Dissertação apresentada ao Programa de


Pós-Graduação em Direito, da Faculdade de
Direito, da Universidade Federal de Minas
Gerais, como requisito parcial à obtenção do
título de Mestre em Direito.

Aprovada em: ____/____/_____

________________________________________________________________
Orientadora: Profa. Dra. Mônica Sette Lopes

________________________________________________________________
Professor Convidado:

________________________________________________________________
Professor Membro:

Belo Horizonte
2016
Dedico esta obra a Tadeu e Marlene,
por renunciarem à própria vida para
proporcionar vida mais digna aos filhos...
AGRADECIMENTOS

Este trabalho é fruto de um longo período de estudos, investigações e


amadurecimento: em bibliotecas, nas salas de aula, em conversas com amigos e,
sobretudo, nas ruas. Uma empreitada na tentativa de estabelecer pontos de
contatos entre a vida acadêmica no Mestrado em Direito na Universidade Federal de
Minas Gerais (UFMG) e minha prática profissional no Batalhão de Choque da Polícia
Militar de Minas Gerais (PMMG). No transcurso dos dias, pude contar com a
colaboração de muitas pessoas e, por isso, seria inviável mencionar todos. Mesmo
reconhecendo essa impossibilidade, não posso deixar de dizer alguns nomes.
Mônica Sette Lopes, por abraçar uma angústia que era inicialmente minha,
pelos diálogos fundamentais na transformação de um amontoado de dúvidas neste
texto, por ter me dado voz e me mostrar que o importante era contar as histórias.
Márcio Luís de Oliveira, pela amizade, estímulo e apoio nos primeiros passos
quando nem eu mesmo fazia ideia de qual caminho seguir. Daniela de Freitas
Marques, pelas aulas e conversas, e por fazer com que o prazer pela literatura
virasse alguma coisa maior e inexplicável. Cel Helbert, pelas aulas sobre polícia e
sobre vida, e por ministra-las em um ambiente leve e de amizade. Cel Carvalho, pela
confiança, pelas oportunidades e pela forja. Ten-Cel Ederson Ataíde, uma mistura
de pai, amigo e chefe, pelo apoio e leitura empolgada dos fragmentos durante a
escrita. Aos professores Miracy Barbosa de Sousa Gustin, Fabiana de Menezes
Soares e Gláucio Ferreira Maciel Gonçalves, que participaram das bancas de
qualificação e avaliação do texto e, portanto, contribuíram com a escrita deste livro.
À Turma da Mônica, junção improvável de onde surgiram amizades preciosas,
na qual encontrei os interlocutores Eder Santana e Luana Magalhães. Aos amigos
do Grupo de Estudos em Direito Internacional dos Direitos Humanos da UFMG, em
especial aos amparos de sempre, Bruno Soares, Daniel Cerqueira, Diego Valadares,
Fabrício Prado, Henrique Napoleão, Isabel Machado, Juliana Alcântara, Guilherme
Vinseiro, Rafael Dilly, Thiago Noce e Lívia Lages. No Programa de Pós-Graduação
em Direito da UFMG, aos amigos que fiz durante o curso, como Luiz Fernando e
Caio Cordeiro, e também à equipe da Secretaria, sobretudo Wellerson, sempre
paciente e atencioso. A Patrícia e Lília Finelli, pelo apoio na organização do trabalho
na corrida contra o tempo. A todos os irmãos de farda da Polícia Militar, com os
quais pude contar durante dificuldades e contratempos quando o mundo da vida
colocava à prova os caminhos teóricos, especialmente aos militares que integram a
Equipe de Instrução do Batalhão de Choque, que têm dado continuidade e
desenvolvido a missão de aproximar a polícia da comunidade. A FAPEMIG, pelo
auxílio financeiro que contribui com a aquisição de muitos dos livros utilizados. Do
período em Belfast, no qual algumas convicções encontraram suporte, mesmo em
uma cultura diferente e com tensões mais agudas, gostaria de agradecer a Neil
Jarman, Dominic Bryan, Nigel Grimshaw e aos funcionários do Parades
Commission, pelos diálogos prazerosos e enriquecedores. Aos familiares e amigos,
por entenderem as ausências durante um longo período. Por último e mais
importante, meus pais Tadeu e Marlene, Nathália Marteletto, e também Sandra e
Arlom, por serem os mais próximos em um momento difícil que coincidiu com a
escrita deste texto.
“Como eu não sei rezar, só queria mostrar meu olhar, meu olhar, meu olhar...”

Renato Teixeira
RESUMO

Em decorrência do aumento do número de protestos e da escalada do uso da


violência e da força nesse contexto, torna-se inadiável analisar criticamente as
intervenções estatais em manifestações públicas. Contudo, estudar o tema por um
viés exclusivamente conceitual do direito de reunião pode não ser suficiente para
compreender o problema. Na presente dissertação, examina-se o fenômeno jurídico
em sua conformação a partir da prática policial do autor, que expõe os desafios à
efetividade dos direitos humanos no Estado Democrático de Direito em sociedades
plurais e heterogêneas. Nessa empreitada, realiza-se uma investigação acerca do
exercício concreto do direito de reunião e dos conflitos dele decorrentes a partir das
funções legislativa, judicial e executiva do Estado, utilizadas como eixos temáticos
para se analisar os limites e possibilidades de solução dos desacordos em cada uma
dessas vias no ambiente dos protestos populares. Utiliza-se como referência
principal o direito de reunião no ordenamento jurídico brasileiro, perquirindo-se a
relação entre o direito positivo e a realidade fática por meio de pesquisa-participante,
registros legisprudenciais, matérias de jornal, boletins de ocorrência policial,
jurisprudência e material bibliográfico. Perpassando toda a discussão, revela-se a
participação da polícia na construção do sentido normativo do direito de reunião e a
necessidade de uma intervenção estatal coordenadora dos diversos interesses, mas
não ausente da regulação social.

Palavras-chave: Polícia. Direito de Reunião. Protestos Populares. Manifestações


Públicas. Tropa de Choque.
ABSTRACT

In consequence of increasing protests number and widespread violence in this


context, it has become unpostponable critically analyze State interventions in public
demonstrations. However, study the theme only by conceptual approach maybe is
not enough to comprehend the problem. This research explores the legal
phenomenon in its concrete application from the perspective of author’s police
enforcement practice, what exposed the challenges of human rights effectiveness in
democracies within plural and heterogeneous societies. In this effort, the
investigation about protests and conflicts that arises from it was realized following
legislative, judicial and executive State functions, used as themes to analyze limits
and possibilities of resolving disagreements in public gatherings in each one of this
ways. The main standard was the right of assembly in Brazilian law, and the nexus
between law in books and law in action was explored by participant observation,
lawmaking process, newspapers, police reports, case laws and bibliography.
Through whole debate was revealed that police takes part in right of assembly
concrete definition and the necessity of State intervention as coordinator of many
interest, but not out of social regulation.

Keywords: Police. Right of Assembly. Protest. Public Demonstration. Riot Police.


LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS

ADI – Ação Direta de Inconstitucionalidade


AIB – Ação Integralista Brasileira
ALERJ – Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro
ANL – Aliança Nacional Libertadora
APM – Academia de Polícia Militar
CIDH – Comissão Interamericana de Direitos Humanos
CMBH – Câmara Municipal de Belo Horizonte
CPE – Comando de Policiamento Especializado
CRFB/88 – Constituição da República Federativa do Brasil de 1988
CTB – Código de Trânsito Brasileiro
CUT – Central Única dos Trabalhadores
IAB – Instituto dos Advogados Brasileiros
MP – Medida Provisória
OAB – Ordem dos Advogados do Brasil
OAB-RJ – Ordem dos Advogados do Brasil – Seccional do Rio de Janeiro
OSCIP – Organização da Sociedade Civil de Interesse Público
PL – Projeto de Lei
PM – Polícia Militar
PMMG – Polícia Militar de Minas Gerais
STF – Supremo Tribunal Federal
TJ – Tribunal de Justiça
UFMG – Universidade Federal de Minas Gerais
LISTA DE FIGURAS

Figura 1 – Charge de Henfil no período das Diretas Já: soberania popular e


as manifestações. .................................................................................... 32
Figura 2 – Passageiros vão a pé para Aeroporto de Viracopos................................ 36
Figura 3 – Marcha simbólica de sapatos em Paris ................................................... 45
Figura 4 – Divergência entre socialistas e anarquistas em manifestação na
Praça da Liberdade (BH – 7/9/2013)........................................................ 48
Figura 5 – Os conflitos nas Charges: PM – Polícia Militante .................................... 51
Figura 6 – Os Conflitos nas Ruas: confronto entre manifestantes em Brasília
2015. ........................................................................................................ 51
Figura 7 – Planta da capital mineira de 1895: destaque para as formas geográficas
da nova capital. ........................................................................................ 64
Figura 8 – Protestródomo e a medição das re-voltas ............................................... 69
Figura 9 – Protestródomo e o descontrole no chão de Brasília ................................ 70
Figura 10 – Taxistas em manifestações contra o Uber paralisando ruas do Rio de
Janeiro: multados em Medida Provisória declarada inconstitucional
pela autoridade que editou a norma......................................................... 76
Figura 11 - Resistência Popular à Vacinação Obrigatória nas Charges dos
Jornais ...................................................................................................... 88
Figura 12 - Capa do Jornal Folha de São Paulo de 12 de junho de 2013. ............... 96
Figura 13 - Protesto com pessoas com rostos tampados no Rio de Janeiro,
um mês após a proibição da conduta .................................................... 122
Figura 15 – Coronel da Polícia Militar é agredido por manifestantes em
25 de outubro de 2013 ........................................................................... 124
Figura 16 – Polícia garantindo o direito de manifestação dos neonazistas. ........... 129
Figura 17 - Tropa de Choque da Brigada Militar do Rio Grande do Sul
garantindo o Direito de ir e vir, segundo o TJ-RS. ................................. 144
Figura 18 – Protesto do Movimento 15-M ............................................................... 153
Figura 19 - Grito Mudo dos Manifestantes em Madrid ............................................ 168
Figura 20 – Uso diferenciado da força .................................................................... 171
Figura 21 - Foto do trânsito desviado e proteção policial a abraço simbólico
na Praça Sete......................................................................................... 186
LISTA DE QUADROS

Quadro 1 – Normas antimáscaras em Porto Alegre e Santa Maria ........................ 105


SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ....................................................................................................... 13
2 SITUANDO O DIREITO DE REUNIÃO NO MUNDO DA VIDA ............................. 22
2.1 Dificuldades na aplicação do direito nas ruas ........................................... 22
2.2 Anverso e reverso do direito de reunião .................................................... 26
2.2.1 Relevância do direito de reunião em contextos democráticos ....... 26
2.2.1.1 Para uma política de baixo para cima .................................... 26
2.2.1.2 As múltiplas faces do direito de reunião ............................... 31
2.2.2 O “Lado B” ........................................................................................... 35
2.2.2.1 Quando o exercício do meu direito afeta o do outro ............ 35
2.2.2.2 Direito e divergências no tempo e no espaço ....................... 41
2.3 A metáfora da guerra de todos contra todos e o direito como
decidibilidade ................................................................................................ 48
3 OS CONFLITOS E A LEI: POSSIBILIDADES E IMPOSSIBILIDADES ............... 57
3.1 Pode uma lei regulamentar o direito de reunião?...................................... 57
3.2 Quem pode regulamentar o direito de reunião? ........................................ 63
3.3 Concorrência de direitos fundamentais ..................................................... 71
3.4 A participação da polícia na construção do sentido normativo............... 79
4 OS CONFLITOS E A LEI: LEGISPRUDÊNCIA E A APLICAÇÃO DA LEI
PELA POLÍCIA ..................................................................................................... 81
4.1 Legisprudência no passado e a Revolta da Vacina: o que a lei e
a polícia conseguem controlar?.................................................................. 81
4.2 Legisprudência no presente e junho de 2013: o que a lei e a polícia
conseguem controlar? ................................................................................. 93
4.2.1 A proibição das máscaras e a produção legislativa nas
Câmaras Municipais e nas Assembleias Legislativas.................. 101
4.2.2 As manifestações e a retórica da criminalização no
Congresso Nacional ........................................................................ 115
4.3 As leis e as ruas .......................................................................................... 124
5 OS CONFLITOS E A DECISÃO JUDICIAL ........................................................ 126
5.1 A Doutrina do Fórum Público na Suprema Corte dos Estados
Unidos.......................................................................................................... 130
5.2 A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal ....................................... 134
5.2 Jurisprudência nos Tribunais de Justiça ................................................. 143
5.3 Uma resposta que se dá no caso concreto .............................................. 150
6 OS CONFLITOS E A POLÍCIA ............................................................................ 159
6.1 Escrito e espada.......................................................................................... 159
6.2 Uma polícia do Estado................................................................................ 160
6.3 Solução que não soluciona........................................................................ 162
6.4 Força policial: entre a estrita legalidade e a legitimidade....................... 168
6.5 Uma polícia para aplicação do Direito ...................................................... 178
6.6 Os protestos e a normatividade de tessitura aberta ............................... 182
6.7 A sombra do Leviathan .............................................................................. 187
7 CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................. 196
REFERÊNCIAS ....................................................................................................... 198
13

1 INTRODUÇÃO

Em Londres, no dia seguinte à votação popular que levou à saída do Reino


Unido da União Europeia, pessoas marchavam pelas ruas do centro da cidade
contra o resultado do referendo.1 Nos Estados Unidos, as noites seguintes a vitória
de Donald Trump para a Casa Branca foram marcadas por protestos de pessoas
que rejeitavam o resultado das eleições em diversas cidades do país.2 Se em algum
momento da história da humanidade os meios institucionalizados foram suficientes
para garantir legitimidade e a aceitação das deliberações públicas, protestos como
os narrados acima evidenciam que, hodiernamente, mesmo as eleições diretas
asseguram muito pouco.
Assiste-se à mudanças nos padrões de participação social nos governos em
diversos lugares do mundo: manifestações estudantis no Canadá e no Chile; o
movimento dos Indignados na Espanha; a Primavera Árabe nos países do norte da
África e no Oriente Médio; o Occupy Wall Street em Nova Iorque. Pessoas nas ruas
exigindo mudanças parecem ser cada vez mais regra do que a exceção. Em
praticamente todos esses eventos uma instituição pública se mostrou crucial para
estabilizar ou solapar as democracias: as forças policiais. E é dessa atividade cada
vez mais comum que parece surgir as maiores e mais severas críticas às polícias.
A dificuldade em construir consensos é, com efeito, um dos fatores que mais
desafiam a atividade policial. Exemplo retirado dos protestos no Brasil em junho de
2013 ilustram os desacordos e suas consequências: um canal de televisão filmava o
protesto com pessoas dispersas pela rua; um grupo de aproximadamente oito se
aglomerava na tentativa de impedir que um dos motoristas arrancasse com o carro
que até então estava parado no semáforo.3 Acreditavam que a força do conjunto
seria maior do que a do motorista sozinho. Ao perceber que os manifestantes se
juntavam para ocupar o caminho pelo qual passaria, o motorista acelerou e os
atropelou. A força do motorista no carro foi maior do que a dos oito manifestantes
justapostos. Sobre os fatos, apenas dois comentários no site, mas suficientes para
se perceber paixões e desencontros. Enquanto o primeiro dizia que “a polícia tinha

1
IT’S our future: Youg protesters march against EU referendum result. Metro, 24 jun. 2016. Disponível
em: <http://metro.co.uk>. Acesso em: 4 jul. 2016.
2
PROTESTO contra Trump no Oregon termina em violência. Carta Capital, 11 nov. 2016. Disponível
em: <http://www.cartacapital.com.br>. Acesso 11 nov. 2016.
3
MOTORISTA se irrita com manifestação na Av. Paulista. BOL vídeos, 12 jun. 2013. Disponível em:
<http://videos.bol.uol.com.br>. Acesso em: 4 jul. 2016.
14

que prender esses manifestantes que depredam a cidade”4, o seguinte afirmava:


“tem que prender esse motorista irresponsável [...]”5.
Quem está mais errado: os que se unem no intuito de forçar outros a
permanecerem parados ou aquele que também pela força tenta fazer valer seu
direito? É justo uma pessoa ficar paralisada em razão de um protesto que não quer
participar? Seria efetiva uma manifestação sem transtornos para as demais
pessoas? A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 (CRFB/88)
prevê o direito de se manifestar e também o de ir e vir, mas onde está a linha entre
um e outro? Qual o papel da polícia nesse contexto? Foi a partir de perguntas como
essas que surgiram as angústias do autor, policial-militar lotado na tropa de choque,
que se propõe a observar a atividade que exerce pelas lentes da Teoria do Direito e
a analisar os conceitos jurídicos a partir de casos concretos.
Dois personagens da obra O visconde partido ao meio, de Ítalo Calvino6,
talvez possam servir de mote a esta dissertação. Um deles é o Dr. Trelawney, um
inglês que fora médico a bordo de um navio toda a vida, fez expedições grandes e
perigosas, mas do mundo jamais viu nada, pois ficava jogando vinte-e-um trancado
em uma sala da embarcação. Quando o navio em que estava naufragou, tornou-se
médico em Terralba, mas preocupava-se somente com suas descobertas científicas.
Tinha aversão a sangue e não se importava com os doentes; enquanto buscava
uma forma de agarrar e conservar fogos-fátuos, demonstrava sua ojeriza às
pessoas, correndo dos leprosos ou tocando os doentes com a ponta dos dedos. O
outro personagem é Pedroprego, sério mestre carpinteiro que construía as mais
belas, engenhosas e perfeitas forcas sem pensar a que se prestavam todo ofício e
diligência empenhados na precisão científico-matemática das engrenagens que
criava e fazia funcionar. Entre o médico contemplativo e o artesão que age de forma
tão mecânica como os cadafalsos que cria; entre o pensamento sem compromisso
com a prática e a prática desligada do pensamento, tenta-se um encontro na boa e
velha mediania aristotélica.
O relato acima do motorista que atropela os manifestantes revela os riscos de
se conceder a defesa das próprias liberdades exclusivamente aos interessados. A
combinação de elementos como a falta de alteridade, as emoções humanas, o calor

4
Ibid.
5
Ibid.
6
CALVINO, Ítalo. O visconde partido ao meio. São Paulo: Companhia das Letras, 1996.
15

dos acontecimentos e o desejo obstinado pode levar a condutas inconsequentes ou


a juízos sinceros, mas parciais. Talvez notando isso, os revolucionários franceses do
século XVIII fizeram constar no artigo 12 da Declaração dos Direitos do Homem e do
Cidadão de 1789 que “a garantia dos direitos do homem e do cidadão necessita de
uma força pública [...]”7. Assim, reconheceram que os direitos escritos na Declaração
dependiam de uma força pública para não serem palavras ao vento, somente texto
sem reflexo na realidade ou ao alvedrio de quem circunstancialmente pudesse ser
mais forte.
Portanto, o que diziam era que a efetividade dos direitos dependia dessa
força pública. Todavia, há, de modo geral, certa negligência. Conforme pontua
Cláudia Mauch, “apesar de ser uma das instituições do Estado mais presentes na
vida social brasileira, a polícia continua a ser, no entanto, provavelmente a menos
conhecida”8. Recente florescer nos últimos 20 anos, na avaliação de Elizabeth
Leeds9, como objeto de estudo na História e na Sociologia, ainda não encontrou eco
equivalente nas ciências jurídicas: o momento no qual o Direito realiza-se por
intermédio da instituição policial ainda é bastante desconhecido. Segundo Ferrajoli,
uma das razões para isso seria:

[...] uma bizarra hierarquia nobiliárquica estabelecida a partir do direito


romano entre as diversas ordens e ramos dos estudos jurídicos: antes de
todos o direito civil, depois o direito público, depois o penal e apenas por
último o direito e a praxe de polícia, quase a dizer que, quanto mais o direito
é contaminado pela violência e nele é difícil e incerta a legitimação, tanto
10
menos será meritório de estudo e de reflexão teórica e axiológica.

Assim, força ou coerção seriam apenas sinais gráficos ou fonemas, sem


muita relação com a realidade extratextual, como se o fenômeno jurídico se
reduzisse apenas a sua face formal, escrita. Sua tradução para a vida, seus
desdobramentos ou a preocupação sobre como elementos da realidade podem lhe
condicionar de maneira decisiva, seria qualquer outra coisa que não o Direito. Dessa
forma, o Direito parece acontecer somente nas salas fechadas, nos livros, nos autos,
7
FRANÇA. Embaixada da França no Brasil. A Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão.
Disponível em: <http://www.ambafrance-br.org/A-Declaracao-dos-Direitos-do-Homem>. Acesso em:
4 jul. 2016.
8
MAUCH, Cláudia. Ordem pública e moralidade: imprensa e policiamento urbano em Porto Alegre na
década de 1890. Santa Cruz do Sul: EDUNISC/ANPUH-RS, 2004. p. 22.
9
LEEDS, Elizabeth. Prefácio. In: LIMA, Renato Sérgio; RATTON, José Luiz (Orgs.). As Ciências
Sociais e os pioneiros nos estudos sobre crime, violência e direitos humanos no Brasil. São Paulo:
Fórum Brasileiro de Segurança Pública, Urbania, ANPOCS, 2011. p. 7.
10
FERRAJOLI, Luigi. Direito e Razão: teoria do garantismo penal. 4. ed. São Paulo: Editora Revista
dos Tribunais, 2014. p. 708.
16

abstratamente, longe da vida das pessoas, do mundo; como um jogo de baralho, no


qual os argumentos são as cartas com as quais os jogadores disputam a vitória em
uma brincadeira para o autoentretenimento, à maneira do médico-cientista de
Calvino, a brincar de vinte-e-um enquanto a vida acontece lá fora.
Nesse contexto, os fatos não formalizados seriam não direito ou sequer
existiriam; como se ensina nas faculdades: “quod non est in actis non est in mundo”
– o que não está nos autos não existe11. As ações policiais não sintetizadas em
processos criminais apenas excepcionalmente encontram lugar nas salas de aula ou
nas pesquisas jurídicas. E isso tem reflexos: a visão bipartida e assistemática que
geralmente se ensina nas faculdades de Direito, de que existiriam no Brasil duas
instituições policiais, uma administrativa e outra processual penal, só muito
remotamente encontra eco na realidade: na realidade do direito brasileiro, durante
os protestos a Polícia Militar (PM) acompanha as manifestações com a missão de
garantir os direitos constitucionais envolvidos no cenário a partir do texto da
Constituição e do entendimento dos tribunais; podendo se deparar com situações
nas quais lavra um auto de infração de trânsito de natureza administrativa; realiza
uma prisão com base nos Códigos Penal e de Processo Penal, arrola testemunhas,
faz o enquadramento preliminar fato-tipo; podendo lhe ser apresentada uma liminar
judicial de natureza cível; tendo que lidar com legislação federal, estadual e
municipal que se contradizem; e, se utilizar força, ter como parâmetro o Direito
Internacional12 e os próprios manuais. Todo esse cipoal, muitas das vezes
interpretado no instante da decisão, no calor ou no frio das ruas e das paixões
humanas, com o risco do erro, sem chance de recurso ou efeito suspensivo para a
ação desencadeada.
Esse é o tema da investigação. O recorte temático é, portanto, o direito de
reunião.13 A análise está no âmbito da efetividade ou eficácia social, que opera na

11
DINIZ, Maria Helena. Dicionário Jurídico. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2005. v. 4. p. 25.
12
OLIVEIRA, Steevan Tadeu Soares de. O uso da força pela Tropa de Choque sob o prisma do
Direito Internacional dos Direitos Humanos. In: CAPUCIO, Camilla et al. (Orgs.). A proteção do
indivíduo e da coletividade. Belo Horizonte: Arraes Editores, 2013. (Direito Internacional no Nosso
Tempo, v. 2). p. 137-151.
13
Também denominado direito de protesto ou de manifestação, tomados aqui como sinônimos, dá-se
preferência a direito de reunião, tendo em vista que a Constituição da República Federativa do Brasil
de 1988 (CRFB/88) o escolhe: “Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer
natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do
direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: […] XVI -
todos podem reunir-se pacificamente, sem armas, em locais abertos ao público, independentemente
17

relação entre a norma escrita e o fato; na materialização dos preceitos normativos.14


Dessa forma, trata-se de um enfoque na realização do texto constitucional na vida
das pessoas, de como o direito escrito funciona ou não funciona, consciente de que
pode haver uma distância entre o texto e o que empiricamente se vê nas ruas para,
assim, tentar desvendar alguns possíveis entraves na conformação do jurídico na
realidade social. Consequentemente, a vertente teórico-metodológica empregada é
a jurídico-sociológica, que se preocupa com a facticidade do Direito e suas relações
contraditórias.15
Nesse recorte dos protestos populares, a noção de Direito da qual se vale é
de António Manuel Hespanha16, que o apresenta em uma perspectiva realista. Parte-
se da premissa de que o direito de reunião não se resume ao texto constitucional,
mas pode ser observado caleidoscopicamente, “[...] de mais sítios e de sítios mais
improváveis que o habitual”17. Assim, foi utilizada documentação indireta e direta
para levantamento dos dados18: além da leitura da Constituição de 1988, buscou-se
o que é o direito de reunião nas leis infraconstitucionais, nas discussões legislativas,
na jurisprudência dos tribunais, nos feitos do Ministério Público, nos manuais da
polícia e nas condutas humanas por meio de notícias de jornais, boletins de
ocorrência e relatos de pesquisa-participante, sobretudo tendo por referência a
concreção do direito na prática policial, um lugar ainda inusitado na Academia como
ponto de observação do fenômeno jurídico.
Portanto, tenta-se ir além de algumas leituras que, ao (não) explicarem o que
é o direito de reunião, apenas repetem a previsão constitucional e não percebem o
descompasso entre uma escolha pela interpretação literal do texto e o contexto que
o envolve, presente nos julgados, nas leis e nas ruas. Dessa forma, assim como
pouco se conhece sobre a instituição policial, são também escassas a pesquisa e a
jurisprudência sobre o direito de reunião. Não se pode afirmar que essa dupla

de autorização, desde que não frustrem outra reunião anteriormente convocada para o mesmo local,
sendo apenas exigido prévio aviso à autoridade competente;” (BRASIL, 1988)
14
FERRAZ JUNIOR, Tércio Sampaio. Introdução ao estudo do Direito. 8. ed. rev. ampl. São Paulo:
Atlas, 2015, p. 159-160. BARROSO, Luís Roberto. O Direito Constitucional e a Efetividade de suas
normas: limites e possibilidades da Constiuição Brasileira. 8. ed. atual. Rio de Janeiro: Renovar,
2006. p. 82-83.
15
GUSTIN, Miracy Barbosa de Sousa; DIAS, Maria Tereza Fonseca. (Re)Pensando a pesquisa
jurídica. 4. ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2013. p. 22.
16
HESPANHA, António Manuel. O caleidoscópio do direito – o direito e a justiça nos dias e no mundo
de hoje. 2. ed. Coimbra: Almedina, 2009.
17
Ibid., p. 9
18
MARCONI, Marina de Andrade; LAKATOS, Eva Maria. Fundamentos de Metodologia Científica. 5a.
ed. São Paulo: Atlas, 2003. p. 174-196.
18

omissão seja a causa dos diversos problemas que surgem nas ruas, entretanto é
certo que sinaliza o potencial ainda desperdiçado da contribuição que investigações
acadêmicas podem ensejar à concreção do direito na prática policial.
Trata-se de tema delicado, seja no Brasil ou em outros países, tanto que o
Police Executive Research Forum reconhece que talvez não exista desafio maior
para policiais em contextos democráticos do que atuar em manifestações públicas.19
Não obstante, cada vez mais a polícia é chamada a simultaneamente garantir o
direito de reunião e prevenir ações violentas que possam ocorrer durante os
protestos. Para se ter uma ideia, em Portugal no ano de 2009 as forças de
segurança realizaram 167 operações para garantir o exercício do direito de reunião;
em 2012, esse número ultrapassou a barreira de três mil operações anuais e desde
então nunca mais retornou aos padrões anteriores20, tendo o cenário se tornado
uma das principais preocupações das polícias lusitanas em 2015, em virtude de
manifestações de extrema-direita.21
Para explorar o tema, a estratégia metodológica principal foi a pesquisa-
participante, na qual o pesquisador integra o campo investigado.22 O autor é, desde
2002, integrante da Polícia Militar de Minas Gerais (PMMG), e, durante cinco anos,
entre dezembro de 2009 e dezembro de 2014, trabalhou no Comando de
Policiamento Especializado (CPE)23. Nesse período, desenvolveu diversas
atividades relacionadas a protestos e manifestações, sendo duas delas de maior
relevância para esta pesquisa: (a) o comando de tropa de choque, a pé ou com

19
WEXLER, Chuck. Foreword. NARR, Tony et al. Police Management of Mass Demonstrations:
Identifying Issues and Successful Approaches. Washington: Police Executive Research Forum,
2006. p. i.
20
PORTUGAL. Relatório Anual de Segurança Interna 2009. Lisboa: Sistema de Segurança Interna,
2010; PORTUGAL. Relatório Anual de Segurança Interna 2010. Lisboa: Sistema de Segurança
Interna, 2011; PORTUGAL. Relatório Anual de Segurança Interna 2011. Lisboa: Sistema de
Segurança Interna, 2012; PORTUGAL. Relatório Anual de Segurança Interna 2012. Lisboa: Sistema
de Segurança Interna, 2013; PORTUGAL. Relatório Anual de Segurança Interna 2013. Lisboa:
Sistema de Segurança Interna, 2014; PORTUGAL. Relatório Anual de Segurança Interna 2014.
Lisboa: Sistema de Segurança Interna, 2015; PORTUGAL. Relatório Anual de Segurança Interna
2015. Lisboa: Sistema de Segurança Interna, 2016.
21
PORTUGAL. op. cit., 2016, p. 77; 81.
22
GUSTIN; DIAS. op. cit., p. 90.
23
Em Minas Gerais, a concepção operacional da polícia é pautada pela divisão territorial do Estado
em Regiões de Polícia Militar (RPM). De modo geral, cada Região subdivide-se em Batalhões, que
são numerados cronologicamente de acordo com sua criação e, por sua vez, subdivididos em
Companhias. Assim, o espaço geográfico é fragmentado nas RPMs, que têm como atribuição as
atividades policiais-militares. Em recobrimento a todas as demais regiões, existe o Comando de
Policiamento Especializado (CPE), que, não tendo uma área específica para atuar, apoia os demais
comandos, sobretudo em ocorrêcias típicas de unidades especiais, como Batalhão de
Radiopatrulhamento Aéreo (Btl RpAer), Batalhão de Operações Policiais Especiais (BOPE) e
Batalhão de Choque (BPChoque).
19

cães24 e (b) a docência em cursos básicos e avançados sobre operações de


choque25 da Academia de Polícia Militar (APM).
Simplificadamente, pode-se afirmar que, na atuação ante manifestações
públicas, predomina na doutrina policial no Brasil a conduta operacional das tropas
de choque como uma unidade que fica aquartelada26 e, após uma situação de atos
de violência, atua tendo por objetivo principal a dispersão.27 Todavia, em grande
parte do período da pesquisa-participante, implementou-se uma mudança em Minas
Gerais. O Batalhão de Choque28 não mais esperava surgir uma situação na qual
fosse necessário o uso de força, ao contrário, procurava-se aproximar dos
organizadores dos protestos, mesmo quando não notificado sobre o evento, para
estabelecer diálogos e acordos com os manifestantes acerca da utilização dos
espaços públicos. Assim, foi possível observar e interagir com manifestantes,
lideranças e afetados pelos protestos, até mesmo antes de seu início, o que
habitualmente não aconteceria com os integrantes das tropas de choque se fosse
seguida fielmente a doutrina de choque predominante.
Cabe ressaltar que a investigação feita para esta pesquisa não se restringiu à
observação participante e, complementarmente, utilizou-se documentação indireta.
O caminho percorrido foi análogo à maneira como tradicionalmente, ao menos
desde Kelsen29, se tenta explicar o Direito; da norma mais abstrata para a de maior
concreção: Constituição, leis, decisões judiciais e a decisão do policial na rua.

24
Comando de turno operacional e de Pelotão de Choque do atual Batalhão de Polícia de Choque
(BPChoque) e de Pelotão de Choque com cães da Companhia Independente de Policiamento com
Cães (ROCCA – Rondas Ostensivas Com Cães).
25
Cursos básicos entendidos como os treinamentos voltados para praças ou oficiais sem experiência
na área de Controle de Distúrbios, tais como os cursos de Controle de Distúrbios Civis (CDC),
Operações de Controle de Distúrbios (OCD) e Policiamento em Praças Desportivas. Por sua vez, os
cursos avançados seriam as capacitações voltadas para militares na função de comando de tropa,
tais como OCD Multiplicador e Intervenções Estratégicas em Movimentos Sociais.
26
Permanecer no interior dos quartéis aguardando acionamento.
27
Cf. entre outros, SÃO PAULO. Polícia Militar. Manual de Controle de Distúrbios da Polícia Militar. 3.
ed. São Paulo: Setor Gráfico do CSM/M Int, 1997; DORECKI, André Cristiano. LIMA, Alexsandro
Rodrigo R. Manual de Controle de Distúrbios Civis. Curitiba: Associação da Vila Militar/Polícia Militar
do Paraná, 2000; DISTRITO FEDERAL. Polícia Militar. Manual de Operações de Choque (M-2-PM).
2. ed. Brasília: Polícia Militar do Distrito Federal, 2012; ESPÍRITO SANTO. Polícia Militar. Manual de
Operações de Choque. Vitória: Polícia Militar do Espírito Santo, 2012; MINAS GERAIS. Polícia
Militar. Caderno doutrinário 10: Operações de controle de distúrbios. Belo Horizonte: Academia de
Polícia Militar, 2013; RIO GRANDE DO NORTE. Polícia Militar. Manual Técnico: Operações de
Choque. Natal: Polícia Militar do Rio Grande do Norte, 2013.
28
O Batalhão de Choque em Minas Gerais foi criado no ano de 1979; em 1997, passou a se chamar
Batalhão de Polícia de Eventos (BPE) e, em 2014, resgatou-se a primeira designação.
29
KELSEN, Hans. Teoria Pura do Direito. São Paulo: Martins Fontes, 2015.
20

Seguiu-se a trilha das funções legislativa, judicial e executiva do Estado. No


Capítulo 2, o tema é discutido a partir da ótica do conflito de direitos e de como a
Constituição de 1988, em virtude da generalidade e abstração de seu texto, não é
capaz de proporcionar um entendimento preciso sobre a real extensão do direito de
reunião ante os conflitos de direitos que ele gera. Aliadas à vagueza do texto, as
divergências características das sociedades heterogêneas e plurais formam um
contexto ainda mais difícil para a decisão dos conflitos nas ruas.
A discussão acerca da legislação infraconstitucional é realizada nos capítulos
3 e 4. Inicialmente discute-se a regulamentação do direito de reunião pela via
legislativa. Em seguida, demonstra-se a concorrência de direitos e as antinomias
que surgem no Direito brasileiro em virtude da forma assistemática como o tema é
tratado e da crença de que a lei e a sanção são suficientes para a solução dos
conflitos sociais. Ainda no eixo legislativo, são debatidos alguns aspectos que
evidenciam a impossibilidade de se conter a dinâmica das manifestações populares
em leis rígidas, com enfoque a partir da teoria da legislação.
No capítulo cinco, propõe-se estudar o tema pelo viés do Judiciário. Uma
rápida análise dos precedentes da Suprema Corte Americana, tribunal com vasta
jurisprudência sobre o tema, é realizada juntamente com o estudo de alguns casos
do Supremo Tribunal Federal e dos Tribunais de Justiça dos Estados brasileiros.
Nesse campo, investiga-se como – e se – as decisões judiciais têm solucionado os
problemas que surgem nas ruas.
Em seguida, avalia-se a possibilidade de fixar o sentido da norma no
Legislativo e no Judiciário apenas, ou se haveria margem de apreciação da polícia
no caso concreto, o que é examinado com maior ênfase no capítulo seis, no qual se
apresenta as dificuldades de legitimação da força policial, ainda que legal, e os
entraves que uma aplicação rígida do texto normativo podem gerar. No último
capítulo, 7, tecem-se breves considerações finais como fechamento do trabalho.
Assim, a partir das narrativas de casos concretos ocorridos no Brasil e em
outros países, busca-se ao longo do trabalho identificar o ponto de contato entre o
direito de reunião e os vários outros direitos fundamentais que com ele podem colidir
ou concorrer. Nesse esforço, observa-se que intervir para a efetividade dos direitos
fundamentais é mais complexo do que a leitura do texto distante da realidade
sugere. No encadeamento para a concreção, entendida nos termos de Karl Engisch
21

como acomodação do direito à realidade30, descortinam-se aspectos da aplicação do


Direito pela polícia, sua imediatidade, seus conflitos, suas tensões, e os riscos de
uma decisão que envolve a vida de várias pessoas.

30
No original: “[...] ‘concreción’ en cuanto acomodación del derecho a las realidades […]” (ENGISCH,
Karl. La idea de concreción en el derecho y en la ciencia jurídica actuales. Granada: Comares,
2004. p. 192)
22

2 SITUANDO O DIREITO DE REUNIÃO NO MUNDO DA VIDA

2.1 Dificuldades na aplicação do direito nas ruas

Faixas, cartazes e cornetas marcavam a manifestação de aproximadamente


cem pessoas, em 9 de julho de 2013. O entusiasmo e a cantoria ajudavam os
participantes a manter a convicção de que permaneceriam no local, mesmo que
contrariando a polícia. Não queriam confronto físico, mas também não estavam
dispostos a cumprir a ordem de dispersão. O fato ocorreu na Avenida Cristiano
Machado, uma das principais de Belo Horizonte. Descrito assim, nada de muito
diferente de outros tantos relatos de exercício do direito de reunião veiculados na
mídia, segundo os quais manifestantes pacíficos são impedidos de exercer seu
direito por uma polícia arbitrária.
A economia de palavras, porém, pode deixar de fora aspectos relevantes para
a compreensão do caso. A manifestação havia se iniciado por volta das 22h30 e
prometia ir noite adentro em frente a um famoso hotel da cidade. Ali estava
hospedada uma equipe argentina que se encontrava em Minas Gerais para disputar
uma partida decisiva do mais importante campeonato de futebol da América Latina:
a Copa Libertadores da América. A centena de torcedores em frente ao hotel
entoava o hino e canções do Atlético Mineiro. As palmas marcavam o ritmo e
aumentavam o volume do barulho. Juntamente com as cornetas e gritos dos que ali
estavam reunidos, foguetes eram estourados, tudo com o objetivo de atrapalhar o
sono dos hermanos na véspera do jogo. Para os fanáticos por futebol, a rivalidade
histórica entre Brasil e Argentina não cabe dentro das quatro linhas, e passar para a
próxima etapa da competição justificaria utilizar engenhos não previstos no
regulamento desportivo. Havia algo além de simplesmente vencer uma partida de
futebol. Era uma obstinação de permanecer ali e incomodar os rivais em virtude do
título inédito em disputa, a esperança em conquistar um título que o arqui-inimigo
Cruzeiro já possuía e a chance concreta da taça na fase seguinte. Todos esses
aspectos aguçavam ainda mais a disposição dos manifestantes de não desistirem
da agitação.
A Avenida parecia o próprio estádio de futebol. O incômodo foi tanto que
diversos vizinhos do hotel não conseguiram dormir naquela noite de terça-feira e
acionaram a Polícia Militar (PM) para resolver o impasse. Um jornalista argentino
que também estava no hotel comparou a confusão com o ambiente mais amistoso
23

do jogo da semana anterior, na cidade de Rosário, Argentina31, e culpou a PM


mineira na rede social Twitter: “pelo que me contaram, em Rosário, a polícia fez seu
trabalho. Eu não estive presente, por isso não sei. Aqui a PM não faz nada”
(tradução nossa)32.
Mas o que os vizinhos, os funcionários do hotel, a equipe e a imprensa
argentina esperavam da polícia naquele local sabendo que o direito de reunião é
garantido constitucionalmente? Segundo o texto da Constituição da República de
1988 (CRFB/88), em seu art. 5º, inciso XVI:

XVI - Todos podem reunir-se pacificamente, sem armas, em locais abertos


ao público, independentemente de autorização, desde que não frustrem
outra reunião convocada para o mesmo local, sendo apenas exigido prévio
33
aviso à autoridade competente.

Formalmente, os aficionados pelo Atlético-MG cumpriam todas as exigências


legais do dispositivo acima transcrito. O ato era em espaço público, os torcedores
não estavam armados nem usavam de violência, e não havia outra manifestação no
mesmo local. Portanto, era necessário apenas um simples aviso, que, pela
literalidade do texto, não comporta uma resposta negativa da polícia nem exigências
quanto à forma, conteúdo ou tempo de antecedência. Na ótica estrita do preceito
destacado, o aviso poderia ser oral e realizado apenas alguns segundos antes do
início da reunião.
Todavia o revés é percebido quando outros elementos são incorporados à
narrativa. Os vizinhos que desejavam dormir e telefonaram para a polícia; os atletas
e a delegação da equipe que precisavam descansar para uma partida que
certamente seria das mais importantes de suas carreiras; os outros hóspedes e
funcionários do hotel; os torcedores do time argentino e patrocinadores, que, mesmo

31
Em 2 de julho de 2013, o Atlético-MG foi até a cidade de Rosário para disputar a primeira partida
das semifinais da Copa Libertadores da América. Na cidade argentina, também houve concentração
de torcedores, entretanto, pacíficos, em ambiente amistoso e com objetivo de tirar fotos e de tietar
os jogadores brasileiros, conforme se pode ver em: LACERDA, Bernardo. Argentinos vão ao hotel
do Atlético-MG em Rosário para tietar Ronaldinho Gaúcho. Portal UOL, Futebol, Libertadores, 2 jul.
2013. Disponível em: <http://esporte.uol.com.br/futebol/campeonatos/libertadores/ultimas-
noticias/2013/07/02/hotel-do-atletico-mg-atrai-argentinos-mas-atletas-se-isolam-em-rosario.htm>.
Acesso em: 4 mar. 2015.
32
No original: “por lo que me contaron, en Rosario la policía hizo su trabajo. Yo no estuve, así que no
lo se. Aquí la PM no hace nada.” (CASAR, Alejandro. Twiter: @acasar. Belo Horizonte, 9 jul. 2013.
Disponível em: <https://twitter.com/acasar>. Acesso em: 4 mar. 2015)
33
BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil, de 5 de outubro de
1988. Diário Oficial da União, 5 out. 1988. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm>. Acesso em: 16 jun.
2016.
24

não presentes no contexto fático, esperavam um bom rendimento dos jogadores em


campo, que, por sua vez, decerto, teriam suas performances prejudicadas em
virtude da falta ou da má qualidade do sono; cada um com seus motivos para se
sentirem desrespeitados e, por isso, contrários ao ajuntamento ruidoso de
torcedores na avenida. Se para os torcedores que estavam na rua a intromissão da
polícia poderia ser vista como autoritarismo diante do direito de reunião, os afetados
pela manifestação depositavam nessa mesma ação policial a confiança da
salvaguarda de seus direitos dentro das regras do Estado Democrático de Direito.
Olhar apenas para a literalidade do inciso XVI, do art. 5º, da CRFB/88, pode
levar a crer que não haveria respaldo jurídico para alguma medida policial. Autores
importantes para o direito brasileiro como José Afonso da Silva afirmam que a
polícia não pode intervir no exercício do direito de reunião, pois esse tem como
único limite que a reunião seja sem armas.34 E por isso declara o constitucionalista
que o lugar para a realização de manifestações é de livre escolha dos próprios
manifestantes, e autoridade alguma tem o poder de alterá-lo.35
Entretanto essa leitura negligencia outros dispositivos fundamentais para a
análise do caso. O fato de várias pessoas reivindicarem uma intervenção policial
para conseguirem descansar ou dormir pode indicar que é um exame superficial da
questão a afirmativa de que o único limite do direito de reunião é que esta aconteça
sem armas. O relato do vivido demonstra que os conflitos em sede do direito de
reunião escapam a uma leitura estreita de um único dispositivo constitucional, tendo
em vista sua insuficiência para solucionar os problemas que se apresentam no
momento de sua concreção. Outras expectativas também afirmadas
constitucionalmente podem estar em jogo.
Aplicar normas jurídicas não é exercício de mera subsunção lógica, não é ato
mecânico.36 A dedução, inferência da regra geral para o caso particular37, é
indispensável para o Direito, mas insuficiente, conforme Arthur Kaufmann:

Se fosse possível obter o direito de forma puramente dedutiva, então


haveria de facto, para cada questão jurídica uma só resposta certa. Mas
isto, dado que não dispomos da capacidade do Hércules dworkiniano, não é

34
SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional positivo. 29. ed. rev. atual. São Paulo:
Malheiros Editores, 2007. p. 264-265.
35
Ibid. p. 266.
36
ASCENSÃO, José de Oliveira. O Direito: introdução e teoria geral. 13. ed. Coimbra: Almedina,
2013. p. 595.
37
KAUFMANN, Arthur. Filosofia do Direito. 4. ed. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2010. p.
111.
25

possível. Pelo menos nas ciências normativas não basta a dedução apenas.
Isso seria uma perspectiva demasiado unilateralmente normativista (que se
encontra de forma extrema em Kelsen) e que não considera de forma
38
suficiente o mundo dos factos.

Para Kaufmann, a busca do sentido possível da palavra não se dá de modo


unívoco, nem equívoco, mas sim análogo.39 A analogia entre duas coisas de planos
distintos – texto e realidade – jamais pode proporcionar um resultado seguro e sim
juízos problemáticos.40 As situações da vida precisam ser consideradas, o que
demonstra a necessidade de um momento indutivo que vá do caso concreto à
norma.41 A subsunção operada unicamente no sentido do inciso XVI para o caso em
análise omite outros direitos que também incidem na realidade e que o atrito com as
demais pessoas tornou evidentes.
Assim, afirmar de forma veemente e vaga que a Constituição garante o direito
de reunião não é suficiente para analisá-lo em sua complexidade. O cenário na
Avenida Cristiano Machado em Belo Horizonte exigia dos policiais percepção mais
cuidadosa, sob o risco de tomarem uma decisão equivocada em relação à qual não
haveria reparação possível. Cada situação tem sua história e contingências a
exigirem tratamento peculiar, e todos esses aspectos precisam ser apreciados por
quem aplica o Direito. Para Mônica Sette Lopes:

[...] quando se pretende conhecer uma determinada faixa da vida ou como


as realidades conformam um determinado âmbito do operável, é essencial
que todos os aspectos problemáticos sejam trazidos à luz. Por isto, para
mudar o direito, é preciso mais que simplesmente interpretá-lo. É preciso
conhecê-lo onde seus caminhos se estrangulam, onde ele não funciona
exatamente como se pretenderia a partir de uma análise meramente
42
conceituadora.

Faz-se necessário, portanto, ir além da análise trivial para perceber os


problemas na aplicação do Direito e perquirir as possíveis causas. No caso em tela,
o ir às ruas contribui para identificar onde os caminhos do direito se estrangulam.
Esse descer à prática ajuda a perceber que o que parece sereno na letra da lei pode
esconder conflitos no mundo fático, e que o reconhecimento da importância do
direito de reunião para as democracias não pode negligenciar o fato de que outras

38
KAUFMANN, Arthur. Filosofia do Direito. 4. ed. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2010. p.
115.
39
Id. Analogía y naturaleza de la cosa: Hacia una teoría de la compresión jurídica. Santiago: Editorial
Jurídica de Chile, 1976. p. 40.
40
Ibid. p. 43.
41
Ibid. p. 117.
42
LOPES, Mônica Sette. A equidade e os poderes do juiz. Belo Horizonte: Del Rey, 1993. p. 42.
26

pessoas eventualmente possam ser afetadas pelo exercício desse direito, sob pena
de o direito não servir à sua função estabilizadora de fixar e garantir as expectativas
das pessoas.43
Portanto, parece não ser possível construir uma solução jurídica para a
questão dissociada do problema a ser resolvido e sem testar os sentidos e
resultados possíveis, conforme indica Luís Roberto Barroso.44 Por esse prisma mais
amplo, nota-se que, para encontrar uma resposta adequada, é preciso trazer à lume
mais que um único preceito normativo, mas também as múltiplas perspectivas
acerca do problema e seus efeitos.

2.2 Anverso e reverso do direito de reunião

2.2.1 Relevância do direito de reunião em contextos democráticos

2.2.1.1 Para uma política de baixo para cima

O descaso do poder público com a região próxima ao Morro Alto, em


Vespasiano, Minas Gerais, é conhecido desde o surgimento clandestino e
desorganizado do bairro. Transitar pelas ruas sem pavimento e com iluminação
precária faz parte do cotidiano dos moradores. Em algumas ruas de terra batida, o
piso completamente irregular torna impossível utilizar carro. Nas ruas mais
íngremes, até mesmo o deslocamento a pé pode ser uma aventura. O transporte
público é precário, atendendo a poucas ruas, e o saneamento básico não existe em
todos os domicílios.
Os anos de 2010 e 2011 demonstraram que a falta de água se tornaria outro
problema no dia a dia dos moradores do bairro. Com o acelerado aumento de
pessoas na região em virtude do crescimento do vetor norte da Região
Metropolitana de Belo Horizonte (RMBH), a estrutura de distribuição de água, que já
era insuficiente, se tornou ainda mais precária. Em uma das vezes em que não caía
sequer gota d’água nos reservatórios das casas, os dias passavam e a negligência
das autoridades evidenciava-se a cada tentativa inócua dos moradores de buscarem
uma saída pelas vias disponíveis. A situação se arrastou por sete dias, período no

43
HESPANHA, António Manuel. O caleidoscópio do direito – o direito e a justiça nos dias e no mundo
de hoje. 2. ed. Coimbra: Almedina, 2009. p. 209.
44
BARROSO, Luís Roberto. Curso de Direito Constitucional contemporâneo: os conceitos
fundamentais e a construção do novo modelo. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2011. p. 309.
27

qual atividades essenciais como fazer comida, utilizar o banheiro, lavar louças e
roupas ficaram comprometidas.
Apesar da diferença de ambientes, a ausência de alternativas para a solução
remete à análise feita por David Harvey em texto sobre o movimento Occupy Wall
Street, que aconteceu em 2012 em Nova Iorque. Segundo o autor, “uma vez que
todos os outros canais de expressão estão fechados para nós pelo poder do
dinheiro, não temos outra opção a não ser ocupar os parques, praças e ruas de
nossas cidades [...]”45.
Ainda que distantes da bolsa de valores de Nova Iorque, os moradores do
Morro Alto parecem ter despertado consciência semelhante. A proximidade do bairro
com a rodovia MG-10 guarda potencial reivindicativo considerável. Atualmente essa
rodovia é um importante elo na mobilidade urbana ao ligar o centro de BH ao
Aeroporto Internacional de Confins e à Cidade Administrativa, sede do governo
estadual. Assim, após uma semana sem esse serviço essencial, mesmo diante da
tendência de situações extremas serem pouco favoráveis a protestos46, os
moradores viram no fechamento da MG-10 uma forma de pressionarem as
autoridades e exigirem novamente água para seus lares.
O jurista português Sérvulo Correia afirma que o direito à manifestação não é
um direito de participação política e, por isso, os manifestantes não podem querer
substituir os mecanismos democráticos representativos ou sobrepor-se a eles47; a
influência dos protestos é somente indireta e, além disso, não podem pretender
identificar-se com o povo em sua totalidade. Entrementes, quando se observa o que
de fato acontece nas ruas, parece fazer mais sentido o pensamento oposto, que vê

45
HARVEY, David. Os rebeldes na rua: o Partido de Wall Street encontra sua nêmesis. In: HARVEY,
David et al. Occupy: Movimentos de protestos que tomaram as ruas. São Paulo: Boitempo, 2012. p.
61.
46
Em pesquisa sobre ativismo em protesto e privação relativa, Clarice Mendonça e Mario Fuks
concluíram que: “A situação de extrema insatisfação com a vida parece mesmo ser pouco favorável
à participação em protestos. As causas desse fenômeno ainda necessitam ser averiguadas. Pode
ser que as pessoas muito insatisfeitas vislumbrem poucas chances de melhoria das suas condições
e, por isso, não encontrem motivação para reivindicá-las publicamente. Ou, ainda, que essas
pessoas estejam mesmo em condições de extrema vulnerabilidade social, em que condições
básicas de vida não estão disponíveis, não dispondo dos recursos necessários à participação”.
(MENDONÇA, Clarice; FUKS, Mario. Privação relativa e ativismo em protestos no Brasil: uma
investigação sobre o horizonte do possível. Opinião Pública, Campinas, v. 21, n. 3. p. 626-642, dez.
2015. p. 637).
47
CORREIA, Sérvulo. O direito de manifestação: âmbito de proteção e restrições. Coimbra:
Almedina, 2006. p. 39.
28

nos protestos uma ferramenta política.48 Nesse sentido, o direito de reunião tem se
mostrado um meio de os cidadãos reprovarem os atos dos governantes e exigirem
novos rumos, como aconteceu em dezembro de 2015 em São Paulo, quando
diversas manifestações de rua e ocupações de escolas conseguiram fazer com que
o governo estadual desistisse de um projeto para a educação que estava sendo
implementado.49 Nas manifestações durante a Copa das Confederações no Brasil, o
“não vai ter Copa” falado nas ruas não se concretizou, mas conseguiu impedir
naquele momento o aumento da tarifa dos transportes públicos.50 Os protestos na
Tunísia entre 2010 e 2011 fizeram com que o ditador Ben Ali abandonasse o país51;
na Finlândia, em 2009, entre as conquistas dos manifestantes estava a antecipação
das eleições52. Diversos outros exemplos poderiam ser utilizados para demonstrar
que os protestos têm sido eficazes na interferência dos rumos políticos dos
governos; ademais, restringir a democracia aos mecanismos representativos é fazer
tabula rasa da noção de soberania popular. Exatamente por ser uma ferramenta
política é que qualquer relativização do direito de manifestação deve ser observada
com receio.
Quando as vias democrático-formais parecem insuficientes para a efetivação
dos anseios populares e ocorre um descompasso entre o que querem os cidadãos e
as medidas efetivamente adotadas pelas autoridades, o direito de reunião permite
que a democracia seja de fato um processo dinâmico, ao impedir que medidas
sejam impostas verticalmente, de cima para baixo. Portanto, quanto menos
responsivo aos anseios sociais é um governo, mais importante parece ser o direito
de reunião, pois por meio dele os espaços públicos são apropriados pelas pessoas
para o exercício da democracia em oposição ou em complementariedade às vias
48
VIRCHOW, Fabian. Capturing the streets: Marches as a political instrument of the extreme right in
contemporary German. In: REISS, Matthias (Ed.). The street as stage: Protest marches and public
rallies since the nineteenth century. Oxford: Oxford University Press/The German Historical Institute
London, 2007. p. 301. TARTAKOWSKY, Danielle. Is the french manif still specific? Changes in
french street demonstration. In: REISS, Matthias (Ed.). The street as stage: Protest marches and
public rallies since the nineteenth century. Oxford: Oxford University Press/The German Historical
Institute London, 2007. p. 306.
49
GASPARI, Elio. Viva a garotada da Escola Fernão Dias. Folha de S. Paulo, São Paulo, Coluna Elio
Gaspari, 10 jan. 2016. Disponível em:
<http://m.folha.uol.com.br/colunas/eliogaspari/2016/01/1727809-viva-a-garotada-da-escola-fernao-
dias.shtml>. Acesso em: 11 jan. 2016.
50
SAKAMOTO, Leonardo. Em São Paulo, o Facebook e o Twitter foram às ruas. In: HARVEY, David
et al. Cidades Rebeldes: Passe livre e as manifestações que tomaram as ruas do Brasil. São Paulo:
Boitempo, 2013. p. 97.
51
CASTELLS, Manuel. Redes de indignação e esperança: Movimentos sociais na era da internet. Rio
de Janeiro: Zahar, 2013. p. 29.
52
Ibid. p. 40.
29

formais institucionalizadas. Conforme pontua Luciana Tatagiba, “as mobilizações


coletivas são eventos que rompem o jogo político rotineiro”53. Assim, viabilizam a
participação social permanente fazendo com que a escolha dos governados não se
reduza apenas ao voto periódico e o mandato não seja como um cheque em branco,
que a autoridade pode preencher como bem entender.
O incremento de atos dessa natureza fez com que Nova Iorque, ainda no fim
do século XIX e início do XX, criasse um modelo de permissões legais para
manifestações.54 Atualmente, com o respaldo da Suprema Corte, os protestos nas
vias de trânsito de veículos dependem de autorização55, e mesmo aqueles que
acontecem em parques, praças e passeios, podem sofrer restrições56 de tempo,
lugar e modo57. Nos modelos que exigem autorização, como o de Nova Iorque ou
Londres58, parece haver ênfase maior às ferramentas institucionalizadas, como o
voto, por exemplo, para a participação política do cidadão. Contudo, casos como o
da falta de água durante uma semana na periferia de Vespasiano põem em relevo o
fato de que a democracia formal e as agências estatais não atendem de forma
correspondente a todos os estratos sociais. O modelo institucionalizado pode levar à
perpetuação de desigualdades estruturais ou gerar consequências injustas e
maléficas.59 Para essas hipóteses, o ativismo político pode ser fundamental, pois o
mundo real da política tende a beneficiar os mais poderosos60, e um dos fatores para
que isso ocorra é o acesso que estes possuem ao processo deliberativo,

53
TATAGIBA, Luciana. 1984, 1992 e 2013. Sobre ciclos de protestos e democracia no Brasil. Política
e sociedade, Florianópolis, v. 13, n. 28, set./dez. 2014. p. 39.
54
EL-HAJ, Tabatha Abu. The neglected right of assembly. In: RUSSEL, Margaret M. (Org). The First
Amendment: Freedom of assembly and petition – its constitutional history and the contemporary
debate. New York: Prometheus Books, 2010. p. 205.
55
Cf., entre outros, KELLER, Lisa. Triumph of order: Democracy & public space in New York and
London. New York: Columbia University Press, 2009; e ALMEIDA, Fernando Dias Menezes de.
Liberdade de reunião. São Paulo: Max Limonad, 2001. p. 158-159.
56
Os constitucionalistas utilizados como referência neste trabalho divergem quanto ao emprego da
palavra ‘restrição’ ou ‘relativização’ de direitos fundamentais. Enquanto autores como Paulo
Gustavo Gonet Branco e Gilmar Mendes (Curso de Direito Constitucional. 7. ed. rev. atual. São
Paulo: Saraiva, 2012) falam em restrições aos direitos fundamentais, Márcio Luís de Oliveira (A
Constituição juridicamente adequada: Transformações do constitucionalismo e atualização
principiológica dos direitos, garantias e deveres fundamentais. Belo Horizonte: Arraes Editores,
2013.) adota a terminologia relativização. Como para o recorte aqui proposto a diferença não tem
efeitos na prática, adotou-se livremente uma ou outra como sinônimos.
57
A jurisprudência da Suprema Corte americana será analisada no item 5.1 do trabalho.
58
KELLER, op. cit. 2009.
59
YOUNG, Iris Marion. Desafios ativistas à democracia deliberativa. Revista Brasileira de Ciência
Política, Brasília, n. 13. p. 187-212, jan./abr. 2014. p. 196.
60
Ibid. p. 188.
30

conseguindo influenciar as decisões conforme seus interesses.61 Na percepção de


Iris Young62, reconhecer a complementariedade entre a via da democracia
deliberativa e o ativismo é a melhor opção para a teoria e a prática democrática.
No pensamento de Manuel Castells, uma vez que as relações de poder são
constitutivas da sociedade, as instituições refletem os valores e interesses de quem
detém o poder. Entretanto, como as sociedades são contraditórias e conflitivas, há,
além do poder, um contrapoder. Portanto, o entendimento do que são o Estado e
outras instituições que regulam a vida das pessoas perpassa a interação entre poder
e contrapoder.63 Assim, em um tecido social marcado pela segregação e
desigualdade, a interrupção da MG-10 foi o caminho encontrado para permitir
igualdade material no jogo democrático: o poder de cima para baixo é mitigado pelo
contrapoder, que atua em sentido contrário.
Zygmunt Bauman tem reflexões pertinentes sobre a questão. Para o autor, as
redes protetoras pré-modernas foram diluídas na modernidade, fazendo com que a
solidariedade existente fosse substituída pela competição individual.64 Com a
dissolução dos laços individuais, a segurança passou a depender mais da vigilância
do ambiente. Assim, trincheiras fortificadas, destinadas a separar e distanciar,
tornaram-se um dos traços mais visíveis das cidades contemporâneas.65 Mas as
cercas têm dois lados, o que é fora para um é dentro para o outro, e vice-versa. De
um lado dos muros, estão os que possuem recursos, que, ao mesmo tempo que se
conectam às comunicações globais, não se identificam com o local onde vivem.66 Do
outro lado, os mais pobres são forçados a permanecer no local onde estão e a
continuarem dependentes da rede de vínculos sociais. Paradoxalmente, no mundo
do capital livre, os mais carentes estão inevitavelmente atados ao solo, fazendo com
que a imobilização, principal medida da privação social67, seja característica
marcante desse estrato social, em oposição ao andar de cima, que tem todos os
passaportes e vistos necessários para se movimentarem pelo mundo. As barreiras e
o isolamento existentes entre esses grupos não são apenas de ordem geográfica,

61
Ibid. p. 199.
62
Ibid. p. 210.
63
CASTELLS, Manuel. Redes de indignação e esperança: Movimentos sociais na era da internet. Rio
de Janeiro: Zahar, 2013. p. 14.
64
BAUMAN, Zygmunt. Confiança e medo na cidade. Rio de Janeiro: Zahar, 2009.
65
Ibid. p. 62.
66
Ibid. p. 27.
67
BAUMAN, Zygmunt. A sociedade individualizada: Vidas contadas e histórias vividas. Rio de
Janeiro: Zahar, 2008. p. 53.
31

vez que fisicamente os bairros fechados onde residem os mais ricos encontram-se
dentro da cidade, mas socialmente não.68 Estes só utilizam as vias dos subúrbios
como passagens inevitáveis, ainda assim em seus carros altos, protegidos, com ar-
condicionado ligado e vidros fechados, quase completamente seguros, o que
aumenta ainda mais a distância entre esses dois mundos. Esse afastamento parece
ser ainda mais forte em cidades de países como o Brasil, segundo Bauman:

A tendência a segregar, a excluir, que em São Paulo (a maior conurbação


do Brasil, à frente do Rio de Janeiro) manifesta-se de maneira mais brutal,
despudorada e sem escrúpulos, apresenta-se – mesmo que de forma
69
atenuada – na maior parte das metrópoles.

Assim, a eclosão de protestos como o do Bairro Morro Alto enseja um


contato, ainda que conturbado, entre os diversos grupos da cidade e envolve mais
cidadãos no problema de existirem, no espaço compartilhado, pessoas sem o
mínimo de condições para uma vida digna, para quem as vias da democracia formal
parecem não ser efetivas. Se os dotados de recursos esperam da cidade onde
moram apenas serem deixados em paz, a interrupção do acesso ao aeroporto da
cidade os força a pensar nos problemas existentes na sociedade que é a fonte de
suas riquezas e os lembra de que a falta de água por uma semana nos bairros
marginalizados é problema de todos. Na canção da banda de música mineira Skank,
“se o país não for pra cada um, pode estar certo não vai ser pra nenhum”70.

2.2.1.2 As múltiplas faces do direito de reunião

Se, em situações como a de Vespasiano, o direito de reunião é utilizado para


vocalizar as demandas de uma comunidade marginalizada ante a omissão do poder
público, em outras ele se mostra como trincheira dos cidadãos em defesa contra as
ações ou o despotismo das autoridades, como nos casos mencionados da Tunísia
ou da reforma da educação em São Paulo. Não por menos, o direito de reunião é
um dos direitos mais caros à democracia, e entre as primeiras medidas de
autocracias está sua supressão. Talvez por isso constitucionalistas como Paulo
Gustavo Gonet Branco e Gilmar Mendes o considerem uma das três bases

68
BAUMAN, Zygmunt. Confiança e medo na cidade. Rio de Janeiro: Zahar, 2009.p. 39.
69
Ibid., p. 40.
70
ROSA, Samuel; AMARAL, Chico. Esmola. Intérprete: Skank. In: SKANK. Calango. [S.l.]: Chaos
[Sony Music], 1994. 1CD. Faixa 3.
32

estruturantes da democracia, ao lado da liberdade de expressão e do direito ao


voto.71
A soberania popular expressa nos atos políticos nas ruas é capaz de desafiar
também as autoridades não eletivas, o que pode ser visto nos protestos que têm por
alvo ações policiais ou decisões de magistrados. Outras vezes é a própria ordem
jurídico-constitucional que é contestada, como no caso da Marcha da Maconha, que
questiona a política criminal do país.72 Após ser declarada ilegal diversas vezes em
diferentes comarcas, a marcha teve a constitucionalidade garantida no Brasil pelo
Supremo Tribunal Federal (STF) por meio da Ação Direta de Inconstitucionalidade
(ADI) nº 4.274.

Figura 1 – Charge de Henfil: soberania popular e as manifestações.

73
Fonte: Henfil.

71
MENDES, Gilmar Ferreira; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de Direito Constitucional. 7. ed.
rev. atual. São Paulo: Saraiva, 2012. p. 336.
72
MARCHA da Maconha. Disponível em: <http://blog.marchadamaconha.net>. Acesso em: 20 jun.
2015.
73
HENFIL. Henfil e as Diretas Já. Zona Curva, Memória, 5 fev. 2014. Disponível em:
<http://zonacurva.com.br/henfil-e-diretas-ja/>. Acesso em: 24 mar. 2016.
33

Os motivos para protestos vão além daqueles ensejados pelas autoridades


públicas: são exemplos as manifestações contra grupos industriais ou financeiros;74
os protestos de muçulmanos na Dinamarca contra charges que ofendiam o Islã;75
protesto contra canais de imprensa no Brasil;76 e o caso do protesto em frente a uma
Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIP), em São Roque,
interior paulista, acusada de maus tratos de cachorros para fins de testes
farmacêuticos.77 Nas relações trabalhistas, combina-se o direito de reunião com o
direito de greve para pressionar empregadores e governo, estratégia que de alguma
forma remonta, no Brasil, ao período do Império, passando pelo anarco-sindicalismo
do início do século XX, movimentos sindicais dos anos 60 e 70 e ainda hoje é
utilizada.78
Segundo Norberto Bobbio, “os direitos do homem, por mais fundamentais que
sejam, são direitos históricos, ou seja, nascidos em certas circunstâncias,
caracterizados por lutas em defesa de novas liberdades contra velhos poderes
[...]”79. Nesse processo de afirmação histórica dos direitos humanos, como se refere
Fábio Konder Comparato, as marchas nas ruas foram fundamentais em diversos
momentos e lugares80, como no movimento dos abolicionistas cariocas, que
percorriam as ruas do centro da cidade entrando em lojas e residências para
angariar apoio e pressionar proprietários para a liberação de seus escravos no

74
FIESP sofre esculacho por financiamento à ditadura. Caros Amigos, Caderno Política, 9 abr. 2014.
Disponível em: <http://www.carosamigos.com.br>. Acesso em: 28 abr. 2014.
75
REPUBLICAÇÃO de charges gera protestos na Dinamarca. Estadão, 16 fev. 2011. Disponível em:
<http://www.estadao.com.br>. Acesso em: 28 abr. 2014.
76
BECKER, Beatriz; MACHADO, Mônica. Brasil entre as telas e as ruas: Produção e consumo das
narrativas jornalísticas audiovisuais sobre os protestos nacionais de junho de 2013. Discursos
Fotográficos, Londrina, v. 10, n. 17. p. 39-60, jul./dez. 2014.
77
CHAVES, Fabio. Convocação: Ocupa São Roque: protesto contra o Instituto Royal. Sábado, 19/10.
Vista-se, 16 out. 2013. Disponível em: <https://vista-se.com.br/convocacao-ocupa-sao-roque-
%E2%80%A2-protesto-contra-o-instituto-royal-%E2%80%A2-sabado-1910/>. Acesso em: 27 maio
2016.
78
Cf. entre outros: SANTANA, Marco Aurélio. Entre ruptura e a continuidade: Visões da história do
movimento sindical brasileiro. Revista Brasileira de Ciências Sociais, v. 14, n. 41. p. 103-120, out.
1999. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/rbcsoc/v14n41/1754>. Acesso em: 9 jan. 2015.;
ALVES, Giovanni. Do “Novo Sindicalismo” à “Concertação Social” – Ascensão (e crise) do
sindicalismo no Brasil (1978-1998). Revista de Sociologia e Política, Curitiba, n. 15. p. 111-124, nov.
2000; FREIRE, Américo. Grandes manifestações políticas no Rio de Janeiro. Rio de Janeiro:
ALERJ, 2002; MATTOS, Marcelo Badaró (Coord.). Trabalhadores em greve, polícia em guarda:
Greves e repressão policial na formação da classe trabalhadora carioca. Rio de Janeiro: Bom
Texto/FAPERJ, 2004; FORÇA SINDICAL. Memória sindical. Disponível em:
<http://fsindical.org.br/memoria-sindical/>. Acesso em: 12 dez. 2014.; CUNHA, Jurandir Persicchinni.
Uma história proibida pelo golpe de 1964. Memória Cult, Ouro Preto, ano V, n. 15, dez. 2015.
79
BOBBIO, Norberto. A era dos direitos. Rio de Janeiro: Elsevier, 2004.
80
COMPARATO, Fábio Konder. A afirmação histórica dos direitos humanos. São Paulo: Saraiva,
2007.
34

século XIX81; nas conquistas do voto feminino ou da jornada diária de oito horas82;
na luta de negros e mulheres pelos direitos civis nos Estado Unidos da América dos
anos 196083; ou na melhoria dos salários das polícias no Brasil em um movimento
que se iniciou em 1997 em Minas Gerais e se alastrou para outros estados da
federação84. Portanto, seja em questões locais, como a ausência de água no Bairro
Morro Alto, ou nos protestos transnacionais da Europa85, o direito de reunião tem
sido cada vez mais importante para a democracia. Por isso, alguns autores têm
utilizado a expressão “democracia de protesto” ao se referirem ao atual estágio das
democracias ocidentais.86
Sendo a história dos direitos humanos uma caminhada de lutas, disputas e
conquistas, e não de benesses ofertadas caritativamente por autoridades
indulgentes, os protestos e manifestações são de extrema importância para todos os
demais direitos constitucionais. Garantir o direito de reunião é muito mais do que
assegurar a possibilidade de as pessoas se reunirem em espaços públicos, é
também garantir a liberdade de expressão, a divergência política, a igualdade
material, a efetiva participação popular no governo e outras tantas noções
fundamentais ao Estado Democrático de Direito. Ante essa dimensão, o argentino
Roberto Gargarella considera o direito de reunião o primeiro direito, o direito a exigir
os outros direitos.87
Além de viabilizar outros direitos, a apropriação dos espaços públicos pelas
pessoas pode ser, em si, o que se busca. O binômio trabalho-moradia da cidade

81
MATTOS, Marcelo Badaró. Greves e repressão policial aos sindicatos no processo de formação da
classe trabalhadora carioca (1850-1910). In: MATTOS, Marcelo Badaró (Coord.). Trabalhadores em
greve, polícia em guarda: Greves e repressão policial na formação da classe trabalhadora carioca.
Rio de Janeiro: Bom Texto/FAPERJ, 2004. p. 25.
82
YOUNG, Iris Marion. Desafios ativistas à democracia deliberativa. Revista Brasileira de Ciência
Política, Brasília, n. 13. p. 187-212, jan./abr. 2014. p. 187.
83
ROHDE, Stephen F. Freedom of assembly. New York: Facts On File, 2005.
84
BARROS, José Márcio. Cultura e comunicação nas Avenidas de Contorno em Belo Horizonte e La
Plata. Belo Horizonte: Editora PUC-Minas, 2005.; ALMEIDA, Juniele Rabêlo de. Tropas em protesto:
O ciclo de movimentos reivindicatórios dos policiais militares brasileiros no ano de 1997. 2010. Tese
(Doutorado em História) – Faculdade de Filosofia Letras e Ciências Humanas, Universidade de São
Paulo (USP), São Paulo, 2010.
85
DELLA PORTA, Donatella; REITER, Herbert. The policing of global protest: The G8 at Genoa and
its aftermath. In: DELLA PORTA, Donatella; PETERSON, Abby; REITER, Herbert (Ed.). The policing
of transnational protest. Hampshire: Ashgate, 2006. p. 13-41.
86
RIBEIRO, Renato Janine. O Brasil e a democracia de protesto. Matrizes, São Paulo, v. 8, n. 1. p.
93-117, jan./jun. 2014.
87
GARGARELLA, Roberto. El derecho a la protesta: El primer derecho. Buenos Aires: AD-HOC,
2014.
35

fordista não é o mesmo do começo do século XX.88 E isso indica que é preciso
repensar a relação do ser humano com a cidade. Trata-se de reconhecer que os
espaços públicos não são destinados apenas à circulação de carros e pessoas, e
que o ambiente urbano deve ser explorado sob outras perspectivas, conforme já
reconheceram a Comissão Interamericana de Direitos Humanos e o Tribunal
Constitucional Espanhol.89 Esse é um novo modo de pensar a cidade, no qual a
trama urbana, marcada pela complexa teia social, muda a concepção de mobilidade:
a rua deixa de ser apenas um caminho em direção a outro lugar para ser o próprio
lugar.90 Conforme Felipe Brito e Pedro Rocha de Oliveira expõem, “a cidade não é
só o palco das lutas, mas é também aquilo pelo que se luta”91. Essa cidade pensada
como espaço de cidadania seria uma inflexão ao que Raquel Rolnik aponta como
fruto de um programa de intervenção do Estado de pensadores utópicos em prol de
uma leitura mecânica, da circulação de fluxos, da regularidade e da repetição.
Portanto, sempre que se falar em intervenção estatal ou limites ao direito de
reunião, é preciso muita prudência para não legitimar o Leviathan autoritário, que
surge como metáfora para despojar os cidadãos da regência do corpo social. Assim,
considerando a existência da força pública como uma necessidade para a garantia
dos direitos fundamentais, o papel da polícia em cenário de manifestações deve ser
o de contribuir para a efetividade desse direito, ou seja, proteger as manifestações
públicas.

2.2.2 O “Lado B”

2.2.2.1 Quando o exercício do meu direito afeta o do outro

Em 11 de dezembro de 2014, trabalhadores da construção civil fecharam a


Rodovia Miguel Melhado (SP-234), que serve de acesso ao Aeroporto de Viracopos,

88
TELLES, Vera da Silva. A cidade nas fronteiras do legal e ilegal. Belo Horizonte: Argvmentvm,
2010. p. 15.
89
COMISSÃO INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS (CIDH). Report on the situation of
human rights defenders in the Americas. OEA/Ser.L/V/II.124 Doc. 5 rev. 1. March 2006. Disponível
em: <http://www.cidh.oas.org/countryrep/Defenders/defenderstoc.htm>. Acesso em: 11 de jun. 2013.
90
SIQUEIRA, Gustavo Silveira; VASQUES, Pedro Henrique Ramos Prado. The street carnival of Rio
de Janeiro as an exercise of the right to the city. In: WORLD CONGRESS OF PHILOSOPHY OF
LAW AND SOCIAL PHILOSOPHY, 26., Belo Horizonte. Anais... Belo Horizonte: Fórum, 2013.
91
BRITO; Felipe; OLIVEIRA, Pedro Rocha de. Territórios transversais. In: HARVEY, David et al.
Cidades rebeldes: Passe livre e as manifestações que tomaram as ruas do Brasil. São Paulo:
Boitempo, 2013. (Coleção Tinta Vermelha). p. 69.
36

em Campinas, interior de São Paulo.92 A manifestação, que durou cerca de duas


horas, teve como causa a negociação salarial para o término do contrato das obras
de um novo terminal no aeroporto. Em virtude da interrupção do trânsito, algumas
pessoas que se deslocavam para voos tiveram que descer dos veículos em que
estavam e caminhar 4 (quatro) quilômetros até o local de embarque.93 A paralisação
ocorreu apesar da liminar expedida no dia anterior pela 5a Vara do Tribunal de
Justiça (TJ) de São Paulo, que proibia que manifestações fechassem o acesso ao
aeroporto devido aos danos causados aos usuários.

Figura 2 – Passageiros vão a pé para Aeroporto de Viracopos

94
Fonte: Denny Cesare.

Outras pautas como falência de empresa, desapropriação de terra e


paralisações de advertência95 também já motivaram o fechamento do trânsito no

92
Cf. entre outros, PROTESTANTES liberam acesso ao Aeroporto Viracopos: Manifestação dos
funcionários da construção civil do novo termina pede negociação salarial. Bom Dia Online, Caderno
Notícia, 11 dez. 2014. Disponível em: <http://www.redebomdia.com.br>. Acesso em: 6 mar. 2016.;
MANIFESTAÇÃO fecha principal acesso a Viracopos por duas horas. Destak Jornal, Caderno
Notícias, Campinas, 11 dez. 2014. Disponível em: <http://www.destakjornal.com.br>. Acesso em: 6
mar. 2016.
93
PROTESTO fecha acesso ao Aeroporto de Viracopos em Campinas: Manifestação interrompe
trânsito na rodovia Miguel Melhado (SP-234). Portal G1, Caderno Campinas, Notícia, 11 dez. 2014.
Disponível em: <http://g1.globo.com>. Acesso em: 6 mar. 2016.
94
PROTESTO fecha acesso ao Aeroporto de Viracopos em Campinas: Manifestação interrompe
trânsito na rodovia Miguel Melhado (SP-234). Portal G1, Caderno Campinas, Notícia, 11 dez. 2014.
Disponível em: <http://g1.globo.com>. Acesso em: 6 mar. 2016.
37

mesmo local. Há registros de protesto em que madeiras, pneus, móveis e sacos de


lixo foram incendiados, impossibilitando a utilização da via por 5 (cinco) horas até
que a polícia interviesse por meio da força.96
Uma abordagem unicamente teórica torna difícil captar divergências como as
suscitadas no caso do Aeroporto de Viracopos, que são percebidas mais facilmente
por quem vive esse conflito nas ruas. A realidade concreta não pode ser desprezada
pelo jurista em sua análise, pois, assim, corre-se o risco de falar sobre um mundo
que só existe no papel ou na própria imaginação. O exercício de um direito
constitucional não elimina a possibilidade de conflito com outro direito que, a priori,
possui a mesma hierarquia.
Os bens juridicamente tutelados no plano constitucional se contrapõem e
alguns convivem em tensão permanente. Em leitura menos cautelosa ou abordagem
mais especulativa, pode ser até possível pensá-los harmonicamente, mas no
exercício concreto todos os elementos negligenciados vêm à tona e entram em rota
de colisão. Isso ocorre porque o texto constitucional pretende regular uma variedade
de situações; dessa forma, é característica de seus preceitos serem escritos em
grau de abstração e generalidade maiores que os demais enunciados normativos.97
E isso não ocorre apenas com o direito de reunião. Muitos outros exemplos expõem
os antagonismos que o texto da CRFB/88 pode abarcar: em notícia jornalística que
fale sobre a intimidade de alguém, existe uma tensão entre a liberdade de imprensa
e o direito à privacidade; o mesmo acontece com a proteção das terras indígenas e
o desenvolvimento socioeconômico; um discurso que ultraje os negros ultrapassa o
liame da liberdade de expressão e entra na seara do racismo; no caso dos

95
Cf. entre outros, MANIFESTANTES interditam rodovia que dá acesso ao aeroporto de Viracopos.
Agência Brasil, Caderno Notícia, 4 jul. 2013. Disponível em:
<http://memoria.ebc.com.br/agenciabrasil/noticia/2013-07-04/manifestantes-interditam-rodovia-que-
da-acesso-ao-aeroporto-de-viracopos>. Acesso em: 6 mar. 2016.; SAMPAIO, Lucas. Manifestação
em Campinas complica trânsito em Viracopos. Folha de São Paulo, Caderno Cotidiano, 30 ago.
2013. Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2013/08/1334447-manifestacao-em-
campinas-complica-transito-em-viracopos.shtml>. Acesso em: 6 mar. 2016.; PROTESTO bloqueia
rodovia que liga Campinas a Viracopos: Segundo a Polícia Rodoviária cerca de 100 pessoas
carregavam cartazes. Diário do Poder, Caderno Notícia, 23 fev. 2016. Disponível em:
<http://www.diariodopoder.com.br/noticia.php?i=49678266580>. Acesso em: 6 mar. 2016.
96
MANIFESTAÇÃO bloqueia por 5h acesso ao aeroporto Viracopos.: pneus, madeiras, sacos de lixo
e móveis abandonados foram incendiados no meio da estrada para impedir a passagem de
veículos. Gazeta do Povo, Caderno Vida e Cidadania, 4 jul. 2013. Disponível em:
<http://www.gazetadopovo.com.br/vida-e-cidadania/manifestacao-bloqueia-por-5-h-acesso-ao-
aeroporto-de-viracopos-bll2irv9qt959fv3bq8e86yby>. Acesso em: 6 mar. 2016.
97
SUNSTEIN, Cass R. Designing Democracy: What Constitutions Do. Oxford: Oxford University
Press, 2001. p. 56; HESPANHA, António Manuel. O caleidoscópio do direito – o direito e a justiça
nos dias e no mundo de hoje. 2. ed. Coimbra: Almedina, 2009. p. 711.
38

funcionários públicos, a informação sobre seus salários, algo pessoal, passa a ter
interesse coletivo; o proprietário de um imóvel possui limitações à reforma da própria
casa se sobre ela incidir interesse relativo ao patrimônio histórico-cultural, entre
outros. À medida que se garante um direito, se restringe o outro. Portanto, é preciso
perceber que as Constituições afirmam preceitos divergentes e até mesmo
contraditórios.
Assim como o direito de reunião está previsto na CRFB/88, também está o
direito de ir e vir (inciso XV, do art. 5o). Todavia, as implicações de um protesto vão
além do direito de locomoção. Uma manifestação que inviabilize o fluxo de veículos
pode afetar o direito à saúde ou à vida de uma pessoa a caminho do hospital, seja
em ambulância ou carro particular; um protesto ruidoso pode impedir que pessoas
descansem, estudem ou trabalhem; a paralisação do tráfego de veículos pode levar
à deterioração de cargas perecíveis, ao fechamento do comércio ou à inviabilização
do acesso a escolas, universidades, local de trabalho ou residência. Em julgado no
STF Gilmar Mendes menciona o caso de reuniões de igrejas protestantes-
pentecostais, que têm o costume de ligar aparelhagem de som e podem acabar
incomodando os vizinhos dos templos.98
Esses conflitos são naturais para a ciência do Direito, estão marcados em sua
gênese: a razão de existir o Direito decorre da inevitabilidade da divergência no seio
social. Assim, a afirmação de que o âmbito de proteção do direito de reunião é o que
decorre unicamente de uma interpretação literal do enunciado normativo do inciso
XVI, art. 5o, da CRFB/88, não encontra suporte no Direito Constitucional, pois, se
assim fosse, se negariam diversos outros direitos também expressos na
Constituição.
A questão fica ainda mais complicada quando se considera que os direitos
fundamentais que as instituições públicas devem garantir aos cidadãos vão além do
rol dos direitos previstos no texto da Constituição de 1988, pois, como lembra Sílvia
Loureiro, aquela não é uma relação exaustiva.99 O conceito materialmente aberto de
direitos fundamentais no Direito Constitucional brasileiro faz com que existam

98
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Ação Direta de Inconstitucionalidade 1969/DF. Reqtes.:
Partido dos Trabalhadores – PT; Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura –
CONTAG; Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação – CNTE; Central Única dos
Trabalhadores – CUT. Rel.: Min. Ricardo Lewandowski. Julg. 28/06/2007, DJ 31/08/2007. Disponível
em: <http://www.stf.jus.br>. Acesso em: 04 fev. 2016.
99
LOUREIRO, Sílvia Maria da Silveira. Tratados Internacionais sobre Direitos Humanos na
Constituição. Belo Horizonte: Del Rey, 2005. p. 72.
39

direitos que pertencem ao corpo constitucional mesmo não constando na literalidade


dele,100 e que, em virtude de sua natureza constitucional, também precisam ser
compatibilizados com os expressamente previstos.
Diversos documentos internacionais de direitos humanos já incorporados ao
Direito interno, como a Convenção Americana,101 proíbem interpretação que utilize
os direitos previstos nos próprios tratados para restringir direitos. Trata-se da
primazia da norma mais protetiva, como explicam autores como Cançado
Trindade,102 Flávia Piovesan103 ou Valério Mazzuoli.104 Segundo esse preceito,
quando houver divergência entre normas, deve-se aplicar aquela mais benéfica à
pessoa. Entretanto esse postulado hermenêutico refere-se aos casos em que um
mesmo direito é garantido por mais de uma norma e indaga-se qual parâmetro
deverá ser adotado. Assim, uma Corte Internacional não pode deixar de aplicar, por
exemplo, uma lei nacional se ela for mais benéfica à vítima ao argumento de que no
plano internacional o parâmetro é mais restritivo. Portanto, a primazia da norma mais
benéfica é insuficiente para a fundamentar a decisão que deve ser tomada quando
dois direitos de pessoas distintas se conflitam. Os casos como o do Aeroporto de
Viracopos em São Paulo ou o dos torcedores do Atlético na porta do hotel em Belo
Horizonte evidenciam que, em algumas circunstâncias, o exercício do direito de
reunião colide frontalmente com outros, sendo impossível no mundo da vida garantir
todos, a todas as pessoas, em amplitude máxima. Por isso é lugar-comum entre os
juristas dizer que nenhum direito é absoluto.
Não se trata de negar a força normativa da Constituição105 ou a eficácia
imediata dos direitos fundamentais.106 Canotilho denomina esse fenômeno de

100
SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais. 10. ed. Porto Alegre: Livraria do
Advogado, 2011. p. 78.
101
BRASIL. Decreto nº 678, de 6 de novembro de 1992. Promulga a Convenção Americana sobre
Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica), de 22 de novembro de 1969. Diário Oficial da
União, 9 nov. 1992. Disponível em: <https://www.planalto.gov.br>. Acesso em: 15 jun. 2016.
102
TRINDADE, Antônio Augusto Cançado. Tratado Internacional dos Direitos Humanos. v. 1. Porto
Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 1997.
103
PIOVESAN, Flávia. Direitos humanos e o Direito Constitucional internacional. 11. ed. rev. atual.
São Paulo: Saraiva, 2010. p. 105.
104
MAZZUOLI, Valério de Oliveira. A influência dos tratados internacionais de proteção aos direitos
humanos no Direito interno brasileiro e a primazia da norma mais favorável como regra de
hermenêutica internacional. Revista de Direito Comparado, Belo Horizonte, Faculdade de Direito da
UFMG, v. 5. p. 215-243, ago. 2000. p. 221.
105
HESSE, Konrad. A Força Normativa da Constituição. Porto Alegre: Sérgio Antonio Fabris Editor,
1991.
106
SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais. 10. ed. Porto Alegre: Livraria do
Advogado, 2011.
40

colisão de direitos107, que ocorre quando o exercício de um direito entra em choque


com o exercício de direitos de outras pessoas, momento no qual deve ser utilizada a
concordância prática ou harmonização entre os direitos, que impõe a combinação
dos bens em conflito, de forma a se evitar o sacrifício total de um em relação ao
outro.108 Dessa forma, deve-se buscar garantir cada um dos direitos na maior
extensão possível. Pesquisa realizada na jurisprudência da Corte Constitucional
alemã, na tentativa de sistematizar o assunto, indica que apenas a ponderação
realizada no caso concreto pode esclarecer uma solução adequada para esses
conflitos, o que significa dizer “uma ponderação que leve em conta todas as
circunstâncias do caso em apreço”.109 Assim, a posição de António Manuel
Hespanha, para quem o jurista é um técnico especializado na concordância prática
das divergências, revela-se oportuna.110
Portanto, investigar o caso concreto, suas peculiaridades, suas contingências,
as histórias daquele conflito, das pessoas nele envolvidas, é fundamental na busca
dessa concordância. Mônica Sette Lopes, no programa de rádio Direito é Música,
joga luzes na questão:

O direito tem muito a ver com a história das pessoas, de cada pessoa, de
cada empresa. Ele não é apenas uma armação seca distante da vida. Acho
uma delícia, então, comparar o direito com uma estrada, como se ele fosse
um personagem a carregar as pessoas, a ser carregado por elas também,
numa recíproca interminável. Ele próprio tomado da vida das pessoas, da
vida de cada um que penetra seus processos pelo escorregão do conflito,
pela beleza que é a descoberta da justiça no acerto das diferenças que
podem existir um dia e deixar de existir no outro, para voltar depois de
algum tempo de outro jeito, num outro lugar, vinculado a outra história, a
outras pessoas. O movimento da vida é também o movimento do direito, é
matéria prima dele, matéria prima da ciência que quer entender como o
direito é, como ele funciona, como ele atinge a aplicação na realidade. Se
antigamente a pretensão do meio ambiente não era um problema, hoje é.
Se antigamente se admitia a escravidão, hoje não se admite. Se
antigamente havia quem não era reconhecido pelo pai, hoje também há. E o
lugar de chegada, aquele em que tudo ficará bem e todos serão felizes e
que o direito será espontaneamente cumprido nas suas leis e decisões,
111
esse ainda demora a acontecer.

107
CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional e teoria da Constituição. 7. ed.
Coimbra: Almedina, 2003. p. 1.270.
108
Ibid.. p. 1.225.
109
MENDES, Gilmar Ferreira; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de Direito Constitucional. 7. ed.
rev. atual. São Paulo: Saraiva, 2012. p. 273.
110
HESPANHA, António Manuel. O caleidoscópio do direito – o direito e a justiça nos dias e no
mundo de hoje. 2. ed. Coimbra: Almedina, 2009. p. 157.
111
LOPES, Mônica Sette. Programa n. 541. Apresentadora: Mônica Sette Lopes. In: RÁDIO UFMG.
Direito é Música. Belo Horizonte: Rádio UFMG, 12 dez. 2015. Programa de rádio. Disponível em:
<www.radiojustica.jus.br>. Acesso em: 2 nov. 15.
41

Dessa impossibilidade de conhecer o direito distante da vida das pessoas


decorre a necessidade de buscar da forma mais ampla possível as questões que
podem estar envolvidas na aplicação do Direito Constitucional quando o conflito se
instala e o mundo da vida exige uma resposta. Por isso, para descobrir a justiça no
acerto das diferenças, é fundamental compreender a importância do direito de
reunião para os sem-alternativas como os do caso do bairro Morro Alto, trazendo
para o debate, ao mesmo tempo, a perspectiva dos afetados por uma manifestação.

2.2.2.2 Direito e divergências no tempo e no espaço

A resposta para essas questões de conflitos entre direitos não estão prontas
nas constituições. Não há no texto o indicador cabal de quando o exercício de um
direito constitucional deixa de ser mero uso e passa a ser abuso para que a polícia
aja. Não existe uma régua precisa que indique onde se situa esse limite. E isso tem
implicações relevantes. Luís Roberto Barroso destaca que o grau de generalização
do texto constitucional transfere parte da criação do direito para o intérprete, que
aplica o enunciado à luz do problema a ser resolvido.112 Essa abertura ou vagueza
de sua linguagem faz com que a interpretação constitucional extrapole a
argumentação puramente dogmático-analítica,113 que foca no aspecto formal do
Direito.114 Por isso, resolver o conflito no plano da validade ou da vigência da norma
não está em questão. O que se pretende demonstrar é a existência de diversos
direitos constitucionais, todos de mesmo nível, e que, na medida em que se garante
um, compromete-se outro.
Mesmo que existam diferentes direitos afetados pelas manifestações de rua,
parece ser na disputa pela utilização do espaço público que o conflito ganha mais
relevo e intensidade. Veja o exemplo de Belo Horizonte: em 1940, possuía 207.236
habitantes, já o censo de 2000 indicou 2.238.526115 . Se se considerar os outros 34
municípios na RMBH, o número absoluto de habitantes aumenta ainda mais.
Segundo dados oficiais, em janeiro de 2001, a frota registrada em Belo Horizonte

112
BARROSO, Curso de Direito Constitucional contemporâneo: os conceitos fundamentais e a
construção do novo modelo. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 199.
113
Ibid.. p. 273.
114
FERRAZ JUNIOR., Tércio Sampaio. Introdução ao Estudo do Direito. 8. ed. rev. ampl. São Paulo:
Atlas, 2015. p. 64.
115
BRASIL. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Tendências demográficas: uma
análise da população com base nos resultados dos censos demográficos de 1940 e 2000. Rio de
Janeiro: IBGE, 2007. p. 28.
42

era de 706.480 veículos, em dezembro de 2015 foi de 1.714.233; a quantidade mais


que dobrou somente nos últimos 15 anos116. Levando em consideração a
quantidade de pessoas e de veículos, comparando-a com a época em que as ruas
centrais hoje utilizadas foram projetadas, a situação apresenta-se caótica. E todo
esse aglomerado de pessoas, com origens, valores e objetivos distintos encontra-se
em um mesmo e relativamente pequeno espaço. Ao estimular a pluralidade
democrática, as possibilidades de conflitos potencializam-se e, para Márcio Luís de
Oliveira:

[...] numa sociedade democrática – que se funda na coexistência de


múltiplos modos de vida e de interesses – os princípios que integram o
núcleo jurídico-constitucional são qualitativa e progressivamente mais
diversificados do que em sociedades culturalmente mais homogêneas e
ortodoxas. Consequentemente, nas sociedades democráticas a
117
possibilidade de concorrência entre princípios jurídicos é bem maior.

Nesse contexto de pluralidade de visões de mundo, o que é motivo de


celebração para uns pode ser causa de protesto para outros. Em 2001, a greve de
perueiros que lutavam pela regularização de seus serviços teve como ponto crucial a
ocupação da Praça 7, em Belo Horizonte, por aproximadamente 70 vans, impedindo
o trânsito em 150 quarteirões.118 Em 1997, a regularização dos perueiros em São
Paulo foi motivo de protestos de motoristas de ônibus contrários à medida. A
manifestação durou 4h30min e deixou, considerando apenas um terminal e uma
praça da cidade, 20 mil pessoas sem ônibus na capital paulistana.119
Pressupor uniformidade e homogeneidade é ilusão, pois como pontua
Bauman; “a humanidade contemporânea fala por meio de muitas vozes e sabemos
que continuará a fazer isso por um longo tempo. A questão central é como reforjar
essa polifonia em harmonia e impedir que se degenere em cacofonia”.120 O desafio
que se apresenta, portanto, é a busca da harmonia na diversidade em espaços cada

116
BRASIL. Departamento Nacional de Trânsito (DENATRAN). Frota de veículos. Disponível em:
<http://www.denatran.gov.br/frota.htm>. Acesso em: 13 jan. 2015.
117
OLIVEIRA, Márcio Luís de. A Constituição juridicamente adequada: Transformações do
constitucionalismo e atualização principiológica dos direitos, garantias e deveres fundamentais. Belo
Horizonte: Arraes Editores, 2013. p. 217-218.
118
Cf. CONFRONTO de perueiros e PM em Belo Horizonte. Estadão Brasil, 19 jul. 2001. Disponível
em: <http://www.estadao.com.br>. Acesso em: 12 abr. 2015; RESTRIÇÃO da Justiça a perueiros
provocou manifestação em BH. Folha de S. Paulo, Caderno Cotidiano, 19 jul. 2001. Disponível em:
<http://www.folha.uol.com.br>. Acesso em: 12 abr. 2015.
119
SCHNEIDER, Luciana. Manifestação deixa 20 mil sem ônibus. Folha de S. Paulo, Caderno
Cotidiano, 20 março 1997. Disponível em: <www.folha.uol.com.br>. Acesso em: 12 abr. 2015.
120
BAUMAN, Zygmunt. A modernidade líquida. Rio de Janeiro: Zahar, 2001. p. 123.
43

vez mais escassos, nos quais novos agentes e fatores assomam-se em ritmo
exponencial.
Se por um lado a obstrução do trânsito pode ser de extrema importância para
os que vivem às margens do progresso, da cidadania e dos direitos, e por isso
decidem ignorar o fluxo de uma cidade, que por sua vez os ignora, por vezes são
eles também os mais prejudicados por protestos. Em 2011, um grupo de
aproximadamente 20 estudantes secundaristas fechou por um tempo considerável a
Avenida Amazonas, uma das principais da capital mineira, em virtude do término do
contrato de trabalho de um professor temporário da escola. Como o protesto
aconteceu por volta das 17h30min, milhares de cidadãos ficaram enclausurados, em
pé, no ambiente quente e abafado dos ônibus lotados, mesmo após um dia
exaustivo de trabalho. Ainda que a pauta de uma manifestação possa ser
extremamente importante, é preciso considerar a precariedade dos transportes
coletivos, a opção equivocada dos governantes pelo transporte individual e a
pluralidade da visão de mundo na qual as pessoas não concordam sobre o que é ou
não importante, assim como podem divergir sobre participar ou não da reivindicação.
Inviabilizar materialmente o exercício dos direitos de outras pessoas por meio
de protestos é, em alguma medida, querer estabelecer a efetividade do direito pelas
próprias mãos e uma forma de se valer do outro como meio para as próprias
demandas, o instrumentaliza, portanto, para os objetivos elegidos individualmente ou
por um grupo específico. Universalizar a lógica por trás dessa conduta é, no mínimo,
um risco para o Estado Democrático de Direito. “Vontade do povo” é um ponto
controverso, tendo em vista a impossibilidade de se definir “quem é o povo” ou
“quem pode falar pelo povo”. Os jovens estudantes que interrompiam o trânsito ou
os trabalhadores que queriam o trânsito livre de interrupções? Por isso, se o
exercício do direito de reunião não importava antes em conflitos entre as pessoas,
hoje talvez possa importar e, por isso, não se pode esquecer que o Direito, como
toda obra humana, reflete as condições históricas de seu tempo, o que exige a
busca por uma forma de lidar, de conviver com esse conflito, sem que as
manifestações se resumam a disputas de força física.
Se, por volta das décadas de 1920 e 1930, as marchas mostravam-se
essenciais para a divulgação da mensagem dos manifestantes por onde
44

passavam,121 atualmente diversos recursos tecnológicos podem contribuir com esse


papel. A internet e as redes sociais alteraram a forma como as pessoas interagem
no ambiente social, constituindo-se em alguns dos fatores que fizeram surgir o
ativismo on-line, protesto em rede122 ou ciberativismo123. Além de conseguirem
mobilizar e dar mais visibilidade para as manifestações físicas, que passaram a
alcançar maior impacto político,124 devem ser ressaltados outros dois tipos de
protestos que envolvem apenas os meios eletrônicos, como as campanhas
promovidas na internet e o hacktivismo, conforme classificação de André Lemos.125
Os recursos tecnológicos possibilitam aos protesto on-line mais fácil adesão, maior
propagação e, consequentemente, mais celeridade nos impactos quando
comparados às formas tradicionais. Portanto, dispositivos criados recentemente
podem, na atualidade, ser tão ou até mais eficazes para a mobilização ou mudança
social do que ferramentas do início da Revolução Industrial, como os boicotes e os
locautes. Não por menos, pesquisa da Datafolha, ainda em 2011, indicou que para
71% dos jovens brasileiros a internet é instrumento de mobilização social.126 Após o
impulso das redes sociais aos protestos de junho de 2013, é pouco provável que
alguém duvide disso.
Outras vezes, atos que não acontecem nas ruas conseguem mais visibilidade
que os que afetam a mobilidade urbana. Em Paris, novembro de 2015, autoridades
locais derrogaram o direito de reunião temporariamente; em resposta, os ativistas
organizaram a marcha dos sapatos e conseguiram, dentro dos limites impostos pelo
poder público, a atenção da imprensa internacional ao colocarem 20 mil sapatos na
Praça da República – Place de la République127 (Figura 3). Assim, a criatividade foi o

121
REISS, Matthias. Marching on the capital: National protest marches of the British unemployed in
the 1920s and 1930s. In: REISS, Matthias (Ed.). The street as stage: Protest marches and public
rallies since the nineteenth century. Oxford: Oxford University Press/The German Historical Institute
London, 2007. p. 155.
122
RECUERO, Raquel; ZAGO, Gabriel, BASTOS, Marco Toledo. O discurso dos #ProtestosBR:
Análise de conteúdo do Twitter. Galáxia, São Paulo, n. 28. p. 199-216, dez. 2014.
123
ARAÚJO, Wilian Fernandes. Ciberativismo: Levantamento do estado da arte na pesquisa no
Brasil. In: SIMPÓSIO NACIONAL ABCiber, 5., Florianópolis/SC. Anais… Florianópolis/SC:
UDESC/UFSC, 16 a 18 nov. 2011.
124
SCHERER-WARREN, Ilse. Manifestações de rua no Brasil 2013: Encontros e desencontros na
política. Caderno CRH, Salvador, v. 27, n. 71. p. 417-429, maio/ago. 2014.
125
LEMOS, André. Ciberativismo. Correio Brasiliense, Caderno Pensar, 15 nov. 2003. Disponível em:
<http://www.facom.ufba.br/ciberpesquisa/lemos/ciberativismo.pdf>. Acesso em: 15 fev. 2016.
126
LIMA, Daniela. Internet é arma política para 71% dos jovens. Folha de São Paulo, Caderno Poder,
13 jun. 2011. Disponível em: <http://www.folha.uol.com.br >. Acesso em: 15 fev. 2016.
127
20 MIL sapatos marcham por Paris. Observador, Cimeira do Clima 2015, 29 nov. 2015. Disponível
em: <http://observador.pt/2015/11/29/20-mil-sapatos-marcham-pelo-clima-em-paris/>. Acesso em:
27 abr. 2016.
45

elemento que conseguiu atrair a atenção para a causa. Portanto, interromper o fluxo
de pessoas e a dinâmica da cidade não é, necessariamente, a única ou a melhor
forma de realizar uma manifestação.

Figura 3 – Marcha simbólica de sapatos em Paris

128
Fonte: AFP/Getty Images.

Uma resposta que permita conviver com a diversidade sem suprimi-la não
pode negligenciar que as manifestações de rua durante a década de 1970 traziam
menos conflitos que o fechamento dos centros urbanos das metrópoles de hoje, ao
mesmo tempo que se deve ter de forma clara que protestos de rua continuam sendo
fundamentais para a democracia. Como lembra Bernardo Sorj, “dois milhões de
assinaturas virtuais, no melhor dos casos, viram notícias de jornal, ao passo que
dois milhões de pessoas nas ruas podem derrubar governos”.129 Desconsiderar
qualquer dessas faces dos protestos constitui análise parcial.
No atual cenário de pluralidade de valores, de luta pelo espaço público, de
metrópoles sufocantes e de divergências que parecem insuperáveis, questões como

128
FALCÃO, Catarina. 20 mil sapatos marcham pelo clima em Paris (os do Papa também).
Observador, 29/11/2015. Disponível em: <http://observador.pt/2015/11/29/20-mil-sapatos-marcham-
pelo-clima-em-paris/>. Acesso em: 27 abr. 2016.
129
SORJ, Bernardo. Entre o local e o global. In: FIGUEIREDO, Rubens (Org.). Junho de 2013: A
sociedade enfrenta o Estado. São Paulo: Summus, 2014. p. 91.
46

a localização, o horário, a duração ou o modo passam a ter peso maior no debate


sobre as manifestações que interferem na dinâmica da cidade.
Essa preocupação não é sem motivo. Ao mesmo tempo que protestos em
avenidas, ruas e rodovias podem ser a única maneira de dar visibilidade a
determinadas causas, o exercício do direito de reunião pode irromper ou fomentar
conflitos. O contexto fático pode demonstrar que os antagonismos que envolvem a
concretude do direito de reunião podem ir além de meramente atrapalhar o fluxo de
carros, pessoas e mercadorias.
As diferenças e indiferenças podem elevar a conflituosidade ao nível de
agressões mútuas e até mesmo à morte. Em Ribeirão Preto, 2013, um motorista
acelerou o carro entre os manifestantes e matou um jovem de 18 anos que estava
no protesto.130 No Rio Grande do Sul, no mesmo ano, um motorista, ao tentar furar o
bloqueio de um protesto, foi apedrejado pelos manifestantes e também veio a
óbito.131 Ainda em 2013, após a interdição da via por onde passava um
caminhoneiro, ele tentou evitar o protesto dirigindo por local não permitido pela
legislação e atropelou dois adolescentes, um deles morrendo no local.132 Em Goiás,
duas mulheres foram atropeladas e morreram quando interditavam uma via com
pneus em 24 de junho de 2013133. Na mesma época no Piauí um taxista atropelou
estudante de 14 anos que estava protestando134. Em Porto Alegre, 2014, em
manifestação contra a falta de luz, um homem com asma morreu após ficar seis
horas preso no protesto e não conseguir sair nem receber atendimento médico.135
Em Guarulhos, 2014, uma jovem que realizava protesto em rodovia morreu
atropelada por um motorista de caminhão que jogou o carro contra os

130
MONTEFELTRO, Michel. Jovem morto em protesto de 2013 ganha busto com nome errado em
SP. Portal G1, Ribeirão Preto e Franca, 18 jun. 2014. Disponível em: <http://g1.globo.com>. Acesso
em: 26 abr. 2016.
131
AZEVEDO, Lucas. Caminhoneiro é morto após furar bloqueio grevista no RS; é a 1ª vítima em três
dias de protesto. Uol Notícias, Caderno Cotidiano, 4 jul. 2013. Disponível em:
<http://noticias.uol.com.br>. Acesso em: 26 abr. 2016.
132
CAMINHONEIRO pega acesso proibido e atropela dois jovens em Guarujá, SP. Portal G1, Santos
e Região, 27 jun. 2013. Disponível em: <http://g1.globo.com>. Acesso em: 26 abr. 2016.
133
RESENDE, Paula. Duas mulheres morrem atropeladas em protesto na BR-251, em Cristalina.
Portal G1, Goiás, 24 jun. 2013. Disponível em: <http://g1.globo.com>. Acesso em: 18 out. 2015.
134
ESTUDANTES convocam novas manifestações em Teresina. Jornal Luzilândia, 24 jun. 2013.
Disponível em: <http://www.jornaldeluzilandia.com.br/txt.php?id=24763>. Acesso em: 18 out. 2015.
MAIA, Rômulo. Taxistas prestam solidariedade a Paulo Patrick. Portal O Dia, Piauí, 8 jul. 2014.
Disponível em: <http://www.portalodia.com/noticias/piaui/taxistas-prestam-solidariedade-a-paulo-
patrick-176140.html>. Acesso em: 18 out. 2015.
135
MARTINS, Cid. Homem morre de asma ao ficar preso em ônibus durante protesto. Gaúcha,
Notícia Aberta, 24 dez. 2014. Disponível em: <http://gaucha.clicrbs.com.br>. Acesso em: 18 out.
2015.
47

manifestantes.136 Em 2015, no Rio Grande do Sul, um caminhoneiro tentou evitar


protesto de sua própria categoria, mas foi perseguido por manifestantes em uma
caminhonete, tendo como desfecho o tombamento do caminhão em um declive às
margens da BR.137 Em Sergipe, no mesmo ano, um protesto que cortou o trânsito
em um trecho de descida de uma BR levou a acidente no qual um caminhão bateu
em onze carros. Destes, oito pegaram fogo e uma mulher, um homem e uma criança
morreram carbonizados.138 Em Belo Horizonte, 2015, um homem que se encontrava
em um ônibus teve parada cardíaca e morreu; o atendimento médico foi prejudicado
em virtude do fechamento das ruas por manifestantes pacíficos.139
Todos esses casos ocorreram no curto intervalo entre 2013 e 2015. Muitos
outros exemplos poderiam ser encontrados nas páginas dos jornais ou narrados por
aqueles que vivenciam esses conflitos cotidianamente. Entretanto, por vezes
passam despercebidos na velocidade da vida e na pressa com que as pessoas
correm os olhos pelos jornais, mas para os filhos, pais, amigos das vítimas, não são
apenas estatísticas. Em certo sentido, tanto o motorista que tenta impor seu direito
de ir e vir quanto o manifestante que quer sobrepor seu direito de reunião aos
demais parecem seguir unicamente suas próprias vontades. Essas situações, que
beiram ao absurdo de tão humanas que são, sinalizam que o reconhecimento do
ativismo em detrimento das vias institucionais também deve possuir limites e que
nem sempre é possível deixar unicamente a cargo dos próprios interessados a
solução dos impasses.
Se, em ambiente de divergência, a busca por uma composição no exercício
do direito de reunião parece cada vez mais necessária, essa solução tende a ser
mais urgente quanto mais se polariza ou violento se torna o conflito.

136
MULHER morre atropelada por caminhoneiro em São Paulo. Jovem Pan, Caderno Polícia, 7 abr.
2014. Disponível em: <http://jovempan.uol.com.br>. Acesso em: 26 abr. 2016.
137
CAMINHONEIRO quebra clavícula após furar bloqueio de manifestantes e tombar veículo no
Oeste de SC. Diário Catarinense, Caderno Notícias, 21 fev. 2015. Disponível em:
<http://dc.clicrbs.com.br>. Acesso em: 26 abr. 2016.
138
PROTESTO do MST provoca morte de 3 pessoas em Sergipe. O Estado, Fortaleza, Caderno
Nacional, 12 mar. 2015. Disponível em: <http://www.oestadoce.com.br/nacional/protesto-do-mst-
provoca-morte-de-3-pessoas-em-sergipe>. Acesso em: 18 out. 2015.
139
SEGUNDO protesto contra aumento das tarifas de ônibus de BH transcorre de forma pacífica.
Itatiaia, 14 ago. 2014. Disponível em: <http://www.itatiaia.com.br>. Acesso em: 24 abr. 2016.
48

Figura 4 – Divergência entre socialistas e anarquistas em manifestação na Praça da


Liberdade (BH – 7/9/2013)

Fonte: Arquivo pessoal.

2.3 A metáfora da guerra de todos contra todos e o direito como decidibilidade

Ambientes polarizados ou altamente divergentes tornam mais difícil e


improvável a compatibilização de direitos pela polícia. Em 2010, na Sérvia, a polícia
não foi capaz de evitar que uma centena de pessoas se ferisse numa reação popular
a um protesto LGBT.140 Provavelmente o resultado seria ainda mais grave se não
houvesse a proteção da polícia aos que divergiam dos valores morais da maior parte
da população.
No período entre a Primeira e a Segunda Guerras Mundiais, confrontos entre
manifestantes fascistas e socialistas foram registrados em países como Suíça141 e
Brasil, onde partidários da Ação Integralista Brasileira (AIB) e da Aliança Nacional
Libertadora (ANL) se enfrentavam pelas ruas do Rio de Janeiro.142
Em julho de 2015, a disputa em torno do aplicativo Uber gerou cenas de
agressão e violência em diversos lugares do país. “Pela quarta vez em apenas cinco
dias, taxistas de Belo Horizonte e motoristas do aplicativo Uber entraram em

140
NÚMERO de feridos em protesto contra parada gay sobe a 95 na Sérvia. Portal G1, Caderno
Mundo, Notícia, 10 out. 2010. Disponível em: <http://g1.globo.com>. Acesso em: 17 fev. 2013.
141
KOLLER, Christian. Demonstrating in Zurich between 1830 and 1940: From bourgeois protest to
proletarian street politics. In: REISS, Matthias (Ed.). The street as stage: protest marches and public
rallies since the nineteenth century. Oxford: Oxford University Press/The German Historical Institute
London, 2007. p. 207.
142
FREIRE, Américo. Grandes manifestações políticas no Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: ALERJ,
2002. p. 61.
49

confronto na capital”,143 afirmava uma notícia que relatava fechamentos de trânsito e


confrontos na capital mineira e outras cidades do Brasil e do mundo sobre o mesmo
assunto. Outro jornal, alguns dias antes, relatou as diversas interrupções no trânsito
por protestos e a briga generalizada que ocorreu quando taxistas marcharam
livremente até um local onde estavam motoristas do Uber e os agrediram. Na
notícia, imagens de carros depredados, latarias arranhadas e a indignação de um
taxista: “Não tem como continuarmos assim. Não dá mais. Ou se toma uma solução
ou ficamos à mercê de que esse problema termine em morte qualquer dia”144. A
espera do taxista por uma solução é por uma resposta como política pública,
sobretudo que lhe agrade. Enquanto o processo deliberativo democrático não
soluciona o impasse, o problema persiste nas ruas desafiando a polícia a resolvê-lo.
Talvez a resposta esperada pelo taxista não encerre o conflito, podendo até
potencializá-lo, tendo em vista a possibilidade de desagradar um dos lados. Afirmar
que uma manifestação com histórico de confrontos, como a dos taxistas contra os
motoristas de Uber, não pode ser relativizada quanto ao local de realização pela
polícia é fechar os olhos para a realidade e ignorar que a CRFB/88, assim como
prevê o direito de reunião, também tutela a integridade física das pessoas e atribui à
PM a preservação da ordem pública no art. 144.145 Assim, no caso mencionado,
uma intervenção da polícia para impedir que a marcha dos motoristas de taxi
alcançasse e agredisse os motoristas de Ulber não seria arbitrária.
No Rio de Janeiro, em 2013, o presidente da Assembleia Legislativa do
Estado do Rio de Janeiro (ALERJ), estimou, além dos danos históricos
irrecuperáveis, em 2 milhões de reais os prejuízos financeiros da depredação ao
patrimônio histórico-cultural durante protesto na região do Paço Imperial. A
depredação se encerrou após a intervenção da tropa de choque.146 Em análise
sobre esse contexto, Tatagiba pontua:

143
UBER quer reagir a agressões. O Tempo, Belo Horizonte, 7 jul. 2015, Caderno Cidades. p. 28.
144
CONFUSÃO e quebradeira. Super Notícia, Belo Horizonte, Caderno Cidades, 4 jul. 2015. p. 3.
145
“Art. 144. A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é exercida
para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, através dos
seguintes órgãos: […] § 5º Às polícias militares cabem a polícia ostensiva e a preservação da ordem
pública; aos corpos de bombeiros militares, além das atribuições definidas em lei, incumbe a
execução de atividades de defesa civil” (BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República
Federativa do Brasil, de 5 de outubro de 1988. Diário Oficial da União, 5 out. 1988. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br>. Acesso em: 16 jun. 2012).
146
MANIFESTAÇÕES no centro: presidente da ALERJ calcula prejuízos de até R$ 2 milhões: outros
prédios históricos foram danificados no protesto. R7 Notícias, Caderno Rio de Janeiro, 18 jun. 2013.
Disponível em: <http://noticias.r7.com>. Acesso em: 13 set. 2014.
50

O jogo está sendo jogado e a atual incapacidade das elites políticas e dos
partidos políticos de esquerda de dialogar com esse novo e complexo ator
coletivo e buscar encaminhar suas demandas por dentro das instituições
sugere que a radicalização, a polarização e o uso da violência como
147
estratégia vieram para ficar.

Profética a análise da cientista política quando se observa o quadro de 2015,


que se arrastou e se agravou em 2016. Em novembro de 2015, confrontos de
manifestantes favoráveis e contrários ao governo federal em frente ao Congresso
Nacional resultaram em briga generalizada e tiro disparado por um apoiador da
intervenção militar no país, que acabou preso pela polícia. Quando a confusão
acabou, novo protesto ocorreu em frente ao Senado Federal e integrantes da
Central Única dos Trabalhadores (CUT) tentaram arrancar uma faixa que pedia o
impeachment da Presidente, gerando novo tumulto. Nesse segundo protesto, outra
pessoa também estava de posse de arma de fogo e efetuou três disparos.148
Protestos e confrontos tornaram-se assuntos banais no bate-papo dos
brasileiros. Leonardo Avritzer lembra que, desde as Diretas Já em 1984, e o fim da
interdição das manifestações, a mobilização popular havia ficado restrita ao campo
da esquerda.149 As manifestações de junho de 2013 romperam esse monopólio, que
durou quase trinta anos. Com o passar dos dias, o que era pluralização de pautas
virou polarização.150 Diogo Salles brinca com a sigla PM. Segundo ele, a tropa de
choque da Polícia Militar (PM) foi substituída por outra PM, a Polícia Militante; na
arte do chargista, as mascotes dos dois partidos que venceram praticamente todas
as eleições presidenciais pós-Constituição de 1988 usam equipamentos como
choqueanos para o confronto (Figura 5). Entretanto, protestos, manifestações e a
violência recíproca podem sair do mundo das charges e fazerem da rua palco
(Figura 6).

147
TATAGIBA, Luciana. 1984, 1992 e 2013. Sobre ciclos de protestos e democracia no Brasil. Política
e Sociedade, Florianópolis, v. 13, n. 28, set./dez. 2014. p. 59.
148
CONFRONTO tem tiro e dois presos. O Tempo, Belo Horizonte, 19 nov. 2015b, Caderno Política.
p. 8.
149
AVRITZER, Leonardo. Os impasses da democracia no Brasil. Rio de Janeiro: Civilização
Brasileira, 2016. p. 16.
150
Ibid.. p. 72.
51

Figura 5 – Os conflitos nas Charges: PM – Polícia Militante

151
Fonte: Diogo Salles.

Figura 6 – Os Conflitos nas Ruas: confronto entre manifestantes em Brasília 2015

152
Fonte: Antônio Cruz.

151
SALLES, Diogo. PM: Polícia Militante. O Estadão, São Paulo, Trágico e Cômico, 7 fev. 2012.
Disponível em: <http://blogs.estadao.com.br/tragico-e-comico/2012/02/07/pm-policia-militante/>.
Acesso em: 27 out. 2015.
52

As imagens brasileiras, no entanto, não são as únicas representativas


desses conflitos. Em Belfast, Irlanda do Norte, cidade com menos de 280 mil
habitantes em 1995, a rivalidade entre dois grupos étnicos resultou em uma semana
de manifestações violentas e custo estimado de 30 milhões de libras.153 Em Los
Angeles, 1992, a distância entre negros e brancos, e entre a polícia e a sociedade,
desdobrou-se na revolta que parou a cidade e teve como outras consequências a
morte de 54 pessoas, mais de 200 feridos e mais de 800 prédios queimados.154
Na Inglaterra, em 2011, a falta de habilidade da polícia transformou uma
manifestação pacífica em dias de tumultos em Londres e cidades vizinhas. Ante os
distúrbios, fizeram-se necessárias convocações especiais do Parlamento, o retorno
antecipado das férias do Primeiro-Ministro e a cassação coletiva de férias de todos
os policiais. Em menos de uma semana, a desordem resultou em 5 mortes, dezenas
de feridos e milhares de pessoas presas; destas, por volta de 1.500 foram
condenadas pela justiça. Ao todo, estima-se prejuízo de 200 milhões de libras
esterlinas devido aos prédios incendiados, lojas saqueadas e a paralisação da
economia.155
Na perspectiva do Estado Democrático, à qual o Brasil se filia já no preâmbulo
da Constituição de 1988, questão complexa é a relativa aos grupos em que a
violência não é apenas uma estratégia, mas faz parte de suas identidades, como as
coletividades nazifascistas156 ou os black blocs. Se, dentro da ótica do direito
positivo, a reunião pacífica é uma exigência peremptória e isso não abre muitos
espaços para divergências hermenêuticas, no mundo fático o objetivo da polícia de
compatibilizar direitos e empregar a força como último recurso fica, na prática,
inviabilizado.

152
In: CAZARRÉ, Marieta. Tumulto leva à prisão de dois policiais civis durante marcha em Brasília.
Agência Brasil, Notícia, 18/11/2015. Disponível em: <http://agenciabrasil.ebc.com.br>. Acesso em:
13 maio 2016.
153
JARMAN, Neil. Another Form of troubles: Parades, protests, and the Northern Ireland peace
process. In: REISS, Matthias (Ed.). The street as stage: Protest marches and public rallies since the
nineteenth century. Oxford: Oxford University Press/The German Historical Institute London, 2007.
p. 258.
154
CANNON, Lou. Official negligence: how Rodney King and the riots changed Los Angeles and the
LAPD. Boulder: Westview Press, 1999. p. xix.
155
ENGLAND Riots. BBC News, United Kingdom, 29 out. 2012. Disponível em:
<http://www.bbc.co.uk>. Acesso em: 11 de mai. 2013. UK RIOTS 2011. The Guardian. Disponível
em: <http://www.guardian.co.uk>. Acesso em: 11 maio 2013.
156
REICHARDT, Sven. Fascist marches in Italy and Germany: Squadre and SA before the seizure of
power. In: REISS, Matthias (Ed.). The street as stage: protest marches and public rallies since the
nineteenth century. Oxford: Oxford University Press/The German Historical Institute London, 2007.
p. 169-189.
53

Esses exemplos de polarização e violência revelam uma consequência


bastante problemática do conflito de direitos. Bobbio, ainda no século XX, pontuou
que o desafio dos direitos humanos não estava mais atrelado a saber quais ou
quantos eram os direitos, mas se conectaria ao problema da tutela efetiva, da
garantia desses direitos.157 Durante certo período, acreditou-se que as ameaças a
essa efetividade decorriam unicamente do Estado-opressor, em virtude de sua
supremacia na relação com os indivíduos. Assim, historicamente foram sendo
estabelecidas barreiras para a proteção do polo hipossuficiente. Essa ameaça ainda
persiste, mas a afirmação de que somente o Estado é capaz de violar os direitos
humanos é limitada, pois os indivíduos também interferem reciprocamente nas
esferas juridicamente tuteladas uns dos outros, ensejando a discussão sobre o
alcance ou eficácia horizontal dos direitos humanos. Esses desafios que envolvem a
tensão entre liberdade e segurança são objeto de reflexão de Bauman, para quem:

Durante a maior parte da história moderna, o principal perigo para a


democracia foi corretamente visto nas restrições impostas sobre a liberdade
humana pelos poderes de polícia das instituições a cargo da “segurança
assegurada coletivamente”. Parece que hoje a democracia está ameaçada
principalmente pelo lado oposto: é a segurança garantida coletiva que deixa
muito a desejar – sendo abandonada de maneira gradual como um objetivo
válido de política pública desacreditado como um valor que vale a pena
defender [...] o principal perigo tanto para a liberdade como para a
segurança, está em abandonar a busca por tal coexistência ou mesmo em
158
diminuir a energia com que tal busca é conduzida.

O tema, sobretudo no contexto do exercício do direito de reunião, exige muita


cautela, mas isso não pode implicar, para a teoria do direito, seu não enfrentamento.
Defender a liberdade plena e absoluta para todos é uma crença pueril na
possibilidade de uma vida em sociedades complexas e plurais sem o mínimo de
restrições. O caso concreto, consideradas todas as suas nuances, é que pode
indicar se essa intervenção caracteriza-se ou não como uma ingerência abusiva.
Dificilmente um grupo que tenha seu direito de protesto relativizado pela polícia
afirmará que a intervenção foi proporcional e razoável, até porque, se concordasse
com o limite, muito possivelmente a presença da polícia não se faria necessária.
Outra vez trazendo o pensamento de Bauman:

157
BOBBIO, Norberto. A era dos direitos. Rio de Janeiro: Elsevier, 2004. p. 45.
158
BAUMAN, Zygmunt. A sociedade individualizada: vidas contadas e histórias vividas. Rio de
Janeiro: Zahar, 2008. p. 75-76.
54

Na luta pelo poder, queremos sempre que o outro lado seja mais “ordeiro”,
mais previsível; são sempre os passos dados pelo outro que desejamos
tornar rotineiros e despidos de todos os elementos de contingência e
surpresa, enquanto deixamos para nós o direito de não observar a rotina de
159
nos movermos erraticamente.

Lisa Keller, ao se debruçar sobre a história dos protestos em Nova Iorque e


Londres, aponta como um dos fatores que fez possível a preeminência dessas duas
cidades no contexto mundial foi o estabelecimento sólido da ideia de ordem pública
ao custo de certos limites à liberdade. Para a autora, enquanto cidades como São
Paulo, Johannesburgo e Cidade do México falharam na tentativa de desenvolver
uma adequada estrutura de ordem, em Singapura a prosperidade e a segurança
foram instituídas em prejuízo das liberdades individuais, e em Hong Kong foi
alcançada em razão do empoderamento da polícia. Nesse contexto, para a autora,
Londres e Nova Iorque tiveram um modelo mais moderado, pois seguiram um
caminho intermediário que garantiu a liberdade suficiente à democracia, ao mesmo
tempo que estabeleceram regras para um dia a dia ordenado. Assim, os cidadãos
possuem estabilidade e certeza, afastando-se o clima de caos.160 Essa restrição à
liberdade de reunião e de expressão não foi uma atitude unilateral dos governantes.
Nas palavras da autora, “conseguiu-se isso por meio de um processo consensual,
no qual as ‘regras’ não foram impostas de fora, mas foram resultado de um processo
negociado entre moradores e o governo”.161 Assim, a democracia, como ideal, foi
temperada pela realidade da vida das cidades.162
Ao mesmo tempo que o ativismo político e a possibilidade da ruptura das
regras postas são imprescindíveis à democracia, a liberdade pensada
desconsiderando sua dimensão relacional – liberdade em relação ao outro – é um
entrave ao jogo democrático. Liberdade plena para todos é o mesmo que liberdade
para ninguém, um quadro de anomia. A convivência em sociedade exige que as
condutas dos cidadãos não dependam unicamente de seus desejos; não se trata de
uma questão de foro íntimo nem se pode prescindir da alteridade. A liberdade, se

159
Ibid., 2008, p. 47-48
160
KELLER, Lisa. Triumph of order: Democracy & public space in New York and London. New York:
Columbia University Press, 2009. p. xiv.
161
No original: “this was achieved through a consensus process, in which ‘rules’ were not imposed
from the outside but were the result of a negotiated process between resident and government”
(KELLER, Lisa. Triumph of order: Democracy & public space in New York and London. New York:
Columbia University Press, 2009. p. 129).
162
Ibid.. p. 223.
55

compreendida como a possibilidade de se fazer tudo o que se quer, é uma força


autodestrutiva para o tecido social. Conforme pontua Ralf Dahrendorf:

[...] um dos tormentos da anomia é que ela representa maus presságios


para a liberdade. Enquanto persiste, cria um estado de medo e pede um
estado tirânico como remédio. Uma vez surgido um problema hobbesiano
163
de ordem, a solução também tende a ser hobbesiana.

Em algum ponto existe um limite a partir do qual os efeitos adversos de poder


fazer tudo o que se quer sobrepujam os benefícios.164 Na metáfora de Dahrendorf,
ao se buscar Rousseau, encontra-se Hobbes.165
A pesquisa de Keller sobre a história dos protestos de duas grandes cidades
mundiais e a filosofia de Dahrendorf encontram eco nas leituras freudianas de
Bauman. Para o sociólogo polonês, há um preço a pagar por se viver em sociedade,
e, nas tensões entre comunidade e indivíduo e entre liberdade e segurança,
qualquer escolha que se faça se ganha e se perde alguma coisa: “a liberdade sem
segurança não tende a causar menos infelicidade do que a segurança sem
liberdade”.166 Nesse impasse, com toda sua fragilidade e deficiências, o Direito pode
surgir como uma esperança, uma necessidade para a vida compartilhada, para
minimamente salvar as relações da barbárie, da injustiça, na metáfora utilizada por
Lopes no programa Direito é Música, uma luz no fim do túnel, a Lanterna dos
Afogados, como na música de Herbert Viana de mesmo nome.167
Como saber tecnológico, o Direito cuida de regras para a tomada de decisão
para a convivência vista como um campo de conflitos intermitentes.168 A decisão,
momento no qual uma possibilidade é escolhida em detrimento de outras, tem por
finalidade a absorção da insegurança. Para Tércio Sampaio Ferraz Jr.:

Absorção da insegurança significa, pois, que o ato de decidir transforma


incompatibilidades indecidíveis em alternativas decidíveis, ainda que, num
momento subsequente, venha a gerar novas situações de incompatibilidade
eventualmente até mais complexa que as anteriores. Absorção de
insegurança, portanto, nada tem a ver com a ideia mais tradicional de
obtenção de harmonia e consenso, como se em toda decisão estivesse em
jogo a possibilidade de eliminar-se o conflito. Ao contrário, se o conflito é

163
DAHRENDORF, Ralf. A lei e a ordem. Rio de Janeiro: Instituto Liberal, 1997. p. 14.
164
Ibid.. p. 42.
165
Ibid.. p. 41.
166
BAUMAN, Zygmunt. A modernidade líquida. Rio de Janeiro: Zahar, 2001. p. 58.
167
LOPES, Mônica Sette. Programa n. 637. Apresentadora: Mônica Sette Lopes. In: RÁDIO UFMG.
Direito é Música. Belo Horizonte: Rádio UFMG, 15 ago. 2014. Programa de rádio. Disponível em:
<www.radiojustica.jus.br>. Acesso em: 2 nov. 15.
168
FERRAZ JUNIOR, Tércio Sampaio. Introdução ao estudo do Direito. 8. ed. rev. ampl. São Paulo:
Atlas, 2015. p. 272.
56

incompatibilidade que exige decisão é porque ele não pode ser dissolvido,
não pode acabar, pois então precisamos de decisão, mas de simples opção
que já estava, desde sempre, implícita entre as alternativas. Decisões,
portanto, absorvem insegurança, não porque eliminam o conflito, mas
169
porque transformam.

Com essa consciência da fragilidade do Direito, da imprecisão constitucional


acerca dos limites do direito de reunião e da existência da divergência política em
sociedades plurais, serão analisadas no próximo capítulo as possiblidades das
soluções jurídicas – legislativa e judicial – para os antagonismos em sede do direito
de reunião.

169
Ibid., p. 274.
57

3 OS CONFLITOS E A LEI: POSSIBILIDADES E IMPOSSIBILIDADES

Os Estatutos do Homem (Ato Institucional Permanente)


A Carlos Heitor Cony

[...]

Artigo XII

Decreta-se que nada será obrigado


nem proibido
tudo será permitido
inclusive brincar com os rinocerontes
e caminhar pelas tardes
com uma imensa begônia na lapela.

Parágrafo único
Só uma coisa fica proibida:
amar sem amor.
170
[...]”

3.1 Pode uma lei regulamentar o direito de reunião?

A literatura, a poesia e a arte ajudam a compreender o humano na medida em


que revelam as paixões humanas. Daniela Marques explica:

A literatura cuida dos grandes problemas humanos, das grandes questões:


das dores, dos sofrimentos, das falhas humanas, das misérias, das virtudes.
E o direito é um amálgama da vida, é um conhecimento antes de tudo
cultural. E o direito cuida de problemas humanos: da relação do homem
171
com ele mesmo, do homem com o outro, do homem em sociedade.

No belo da poesia de Thiago de Mello que serve de mote a este capítulo,


caminha-se em um mundo no qual nada é obrigado nem proibido. Tudo é permitido.
Inclusive brincar com rinocerontes. Mas esse é o mundo da possibilidade infinita, do
onírico, da fantasia. E o mundo tal qual conhecemos, ou pelo menos a maior parte
das pessoas, possui muitas barreiras, para uns em maior quantidade que para
outros. A vida é vivida ante o que está posto, em face da realidade empírica com a
qual precisamos lidar. O amor idealizado do cavaleiro andante à musa de seus
sonhos pode se frustrar no mundo real, caso sua bela e doce amada não exista ou
não retribua o afeto. Carlos Drummond de Andrade mostra isso: “João amava
Teresa que amava Raimundo que amava Maria que amava Joaquim que amava Lili

170
MELLO, Thiago de. Os estatutos do homem. Santiago do Chile, abr. 1964. Disponível em:
<http://www.jornaldepoesia.jor.br/tmello.html#estat>. Acesso em: 23 jun. 2016.
171
COSTA, Arthur Barretto de Almeida. Entrevista com Daniela de Freitas Marques. Alethes, v. 4, n.
6. p. 474-486, jul./dez. 2014. Disponível em: <http://periodicoalethes.com.br/media/pdf/6/periodico-
alethes-edicao-6.pdf>. Acesso em: 7 mar. 2016. p. 475.
58

que não amava ninguém [...]”.172 A poesia do itabirano não é sobre como o mundo
deveria ou poderia ser, mas sobre como ele é. E no mundo da vida, pluricultural
como se tem revelado, as pessoas divergem sobre quem amar, como amar e sobre
quase tudo que se possa conceber. Nessas divergências, como fatos da vida, o
papel da teoria crítica, segundo Boaventura de Sousa Santos, seria o de
compreender o que está empiricamente dado, mas sem reduzir a realidade ao que
existe. Para o sociólogo português, “o desconforto, o inconformismo ou a indignação
perante o que existe suscita impulso para teorizar a superação”.173 Assim, ainda que
se tenha como ponto de partida a impossibilidade de um mundo ideal, perfeito, da
liberdade absoluta, isso não elimina a busca por algo melhor do que o que está
posto. Se o mundo da vida é marcado pela divergência, pelo dissenso, pelos
desencontros, Vinícius de Morais ensina que a vida é a arte de construir pontes, de
fazer encontros: “A vida é a arte do encontro, embora haja tanto desencontro pela
vida”174 . Nos desencontros da vida se encontra a matéria prima do Direito; é a partir
das diferenças que o jurista trabalha para tentar contribuir para uma vida
compartilhada possível.
Como mostrado no capítulo anterior, a generalidade e abstração do texto
constitucional não entregam para a sociedade uma resposta pronta sobre os limites
concretos do direito de reunião. Em uma sociedade plural e heterogênea, para
algumas pessoas o direito ao descanso após um dia de trabalho é mais importante
que a luta por melhores salários da categoria profissional que está lhe prejudicando
o retorno para casa. Nesta disputa, tanto o trabalhador que quer usar a rua para ir
para a casa quanto o que quer usá-la para protestar conseguem fundamentar na
Constituição de 1988 os respectivos interesses e divergem sobre a real extensão do
direito de reunião. Essas divergências morais e políticas é que fazem, segundo
Jeremy Waldron, as leis serem necessárias.175
Após os atos de violência nos protestos no contexto da Copa das
Confederações em 2013 no Brasil, a ALERJ buscou regulamentar o direito de
reunião. Foi aprovado o Projeto de Lei (PL) nº 2.405/13, que deixava fora do âmbito

172
ANDRADE, Carlos Drummond de. 100 Poemas. Tradução/Traducción Manuel Graña Etcheverry.
Belo Horizonte: Editora UFMG, 2002.
173
SANTOS, Boaventura de Sousa. A crítica da razão indolente: Contra o desperdício da experiência.
4. ed. São Paulo: Cortez, 2002. p. 23.
174
MORAES, Vinícius; POWELL, Baden. Samba da bênção. Intérprete: Vinícius de Moraes. In:
VINÍCIUS DE MORAES. Como dizia o poeta. Rio de Janeiro: Som Livre, 2001. 1CD. Faixa 5.
175
WALDRON, Jeremy. Law and Disagreement. Oxford: Oxford University Press, 1999. p. 39.
59

de proteção das reuniões o anonimato e, para isso, proibia o ocultamento do rosto


durante as manifestações.176 A Ordem dos Advogados do Brasil do Rio de Janeiro
encaminhou ofício ao Governador expondo os motivos da inconstitucionalidade do
ato normativo e solicitou que não o sancionasse. Segundo a OAB-RJ, a proposta
seria de evidente inconstitucionalidade, visto que destinada a restringir o livre direito
de manifestação:177 “Como é notório, não pode o legislador infraconstitucional criar
restrições a institutos constitucionalmente previstos, que não estejam
178
expressamente ressalvadas pelo próprio texto constitucional”. Mesmo diante da
intervenção da OAB-RJ, o Chefe do Executivo sancionou a norma, que foi
promulgada como Lei Estadual nº 6.528/13.179
A Ordem e um partido político arguíram junto ao Tribunal de Justiça do Rio de
Janeiro (TJRJ) a inconstitucionalidade da Lei. O Instituto dos Advogados Brasileiros
(IAB) atuou como amicus curiae na ação proposta pela OAB-RJ. O IAB defendia a
inconstitucionalidade material e formal da lei; no parecer do Instituto, “[...] somente
caberia norma de contenção por lei, quando o próprio texto constitucional assim
determina [...]”.180 Em outro excerto, “a norma estadual somente pode alargar
direitos fundamentais, sem violar a Constituição estadual e federal, mas nunca
limitando direitos expressos”.181
No plano da teoria dos direitos fundamentais, a posição defendida pela OAB-
RJ e pelo IAB é uma noção muito cara à efetividade desses direitos. A incorporação
de direitos subjetivos no plano constitucional é o que se designa constitucionalização
e tem como corolário sua não disponibilidade ao legislador ordinário.182
Entretanto, para compreender como ocorrem as limitações aos direitos
fundamentais, uma explicação teórica se faz necessária. Os direitos fundamentais

176
RIO DE JANEIRO (ESTADO). Assembleia Legislativa. Projeto de Lei nº 2.405/13. Regulamenta o
artigo 23 da Constituição do Estado. Diário Oficial do Estado, 30 ago. 2013. Disponível em:
<http://www.alerj.rj.gov.br>. Acesso em: 6 nov. 2015.
177
ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL. Seccional do Rio de Janeiro – OAB-RJ. Ofício nº
124/2013, de 11 de setembro de 2013. Disponível em: <http://www.oabrj.org.br/arquivos/files/-
Upload/mascaras_oficio.pdf>. Acesso em: 11 jun. 2016. p. 2.
178
Ibid.. p. 3.
179
RIO DE JANEIRO (ESTADO). Lei nº 6.528, de 11 de setembro de 2013. Regulamenta o artigo 23
da Constituição do Estado. Diário Oficial do Estado, 12 set. 2013. Disponível em:
<http://www.alerj.rj.gov.br>. Acesso em: 6 nov. 2015..
180
INSTITUTO DOS ADVOGADOS BRASILEIROS – IAB. Parecer. Indicação n. 051/2013. Rel.: Leila
Maria Bittencourt da Silva. Disponível em: <http://www.calepino.com.br/~iabnac/IMG/pdf/doc-
15434.pdf>. Acesso em: 11 jun. 2016. p. 2-3.
181
Ibid.. p. 7
182
CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional e teoria da Constituição. 7. ed.
Coimbra: Almedina, 2003. p. 378.
60

podem ser recortados, como afirma Canotilho, por três formas distintas.183 A
primeira, conhecida como restrição constitucional imediata, são as realizadas
diretamente pela Constituição. Como exemplo, cita-se a liberdade de expressão na
CRFB/88: “Art. 5o [...] IV – É livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o
anonimato”. Ao mesmo tempo que estabelece como direito a conduta de manifestar
o próprio pensamento, a Constituição dispõe que fazê-lo de forma anônima está fora
do âmbito de proteção da norma. A Constituição mesmo, portanto, define esse
limite. A segunda possibilidade abarca as limitações fixadas por leis previstas
expressamente no texto constitucional, que ocorre quando a regulamentação
infraconstitucional vem mencionada de forma literal. Na CRFB/88, temos como
exemplo o inciso VII, art. 5o: “é assegurada, nos termos da lei, a prestação de
assistência religiosa nas entidades civis e militares de internação coletiva”.184 Nessa
modalidade, lei regulamentadora irá esclarecer o âmbito de garantia constitucional
efetiva. A terceira e última hipótese, na tipologia de Canotilho, são as restrições
operadas por lei, mas sem autorização expressa na Constituição, que são
denominadas restrições não expressamente autorizadas e são postuladas em
virtude da necessidade da resolução de conflitos de direitos. O jurista português
esclarece essa terceira forma de restrição de direitos:

Trata-se de restrições ao conteúdo juridicamente garantido de um direito


sem qualquer autorização constitucional expressa. Estamos perante os
casos mais difíceis quer em sede de legitimidade constitucional
(justificação) quer no plano da modelação concreta do âmbito de proteção e
do conteúdo juridicamente garantido. De qualquer modo, também aqui
podem existir mediações restritivas. Não se compreenderia, por exemplo,
o 185
que o direito de manifestação (art. 45 , 2) embora consagrado no texto
constitucional sem quaisquer restrições constitucionais directas e sem
186
autorização de lei restritiva, não pudesse ser restringido por lei [...].

Portanto, em determinados casos, mesmo inexistindo previsão literal de lei


restritiva, é equivocado dizer que são irrestringíveis pela via legislativa. Apesar de

183
CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional e teoria da Constituição. 7. ed.
Coimbra: Almedina, 2003. p. 450.
184
BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil, de 5 de outubro de
1988. Diário Oficial da União, 5 out. 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em:
16 jun. 2016.
185
“Artigo 45. Direito de reunião e de manifestação 1. Os cidadãos têm o direito de se reunir,
pacificamente e sem armas, mesmo em lugares abertos ao público, sem necessidade de qualquer
autorização. 2. A todos os cidadãos é reconhecido o direito de manifestação.” (PORTUGAL.
Constituição (1976). Constituição da República Portuguesa, de 2 de abril de 1976. Disponível em:
<http://www.parlamento.pt/Legislacao/Documents/constpt2005.pdf>. Acesso em: 19 jul. 2015)
186
CANOTILHO, op. cit., loc. cit.
61

não ter sido diretamente mencionado pelo constituinte no preceito que estabeleceu o
direito, a admissibilidade da limitação se dá em virtude da salvaguarda de outros
direitos ou bens também previstos na Constituição.187 No país de Canotilho, pelo
menos desde a Constituição de 1838, já se vislumbrava a necessidade de
regulamentar o exercício do direito de reunião.188
Trata-se de uma questão lógica, de coerência do sistema. Por exemplo: a
determinação judicial que imponha restrições de lugares a que se possa ir,
consubstanciada na medida cautelar de proibição de ausentar-se da Comarca (art.
319 do Código de Processo Penal brasileiro)189 colide frontalmente com o direito de
locomoção definido no inciso XV do art. 5o da CRFB/88,190 porque no inciso que
estabelece o direito de ir e vir não há previsão de relativizá-lo por força de lei
infraconstitucional. Todavia, se fundamentada no Código de Processo Penal, a
ordem do magistrado não pode ser considerada inconstitucional, ao argumento de
que a Constituição garante que é livre a locomoção no território nacional sem
qualquer outro impedimento. Somente se consegue deslindar a real extensão do
direito de locomoção em interpretação sistemática.
A regulamentação seria o meio de proporcionar densidade normativa ao
preceito e, assim, proporcionar sentido mais concreto ao texto constitucional. Isso
ocorre porque o caráter geral e indeterminado das normas constitucionais faz com
que elas se abram à mediação legislativa concretizadora.191 E ante a interpretação
sistêmica necessária para compreender o texto constitucional, o papel do Poder
Legislativo não pode ser o de repetir a literalidade da Constituição. Na empreitada
regulamentadora, o legislador agasalha uma perspectiva criadora do direito, na qual
deve balancear os princípios constitucionais e levar em consideração todos os
interesses relevantes para encontrar uma solução aceitável. Nas palavras de Jan
Sieckmann:

187
CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional e teoria da Constituição. 7. ed.
Coimbra: Almedina, 2003. p. 1.277.
188
BAPTISTA, Eduardo Correia. Os direitos de reunião e de manifestação no Direito português.
Coimbra: Almedina, 2006. p. 26.
189
“Art. 319. São medidas cautelares diversas da prisão: [...] IV – Proibição de ausentar-se da
Comarca quando a permanência seja conveniente ou necessária para a investigação ou instrução;”.
(BRASIL. Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941. Código de Processo Penal. Diário Oficial
da União, 13 out. 1941. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em: 12 dez. 2014)
190
“Art. 5º. [...] XV - é livre a locomoção no território nacional em tempo de paz, podendo qualquer
pessoa, nos termos da lei, nele entrar, permanecer ou dele sair com seus bens;” (BRASIL.
Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil, de 5 de outubro de 1988. Diário
Oficial da União, 5 out. 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em: 16 jun. 2012)
191
CANOTILHO, op. cit., p. 1.181.
62

[…] legislar num Estado Democrático de Direito consiste em uma grande


extensão, em particular como aplicação de direitos fundamentais, em
implementação do direito constitucional. Neste contexto, implementação
significa, não apenas aplicação de normas constitucionais, mas um criativo
e construtivo processo de estabelecer normas baseada em uma
192
ponderação de princípios constitucionais. (tradução nossa)

Por vezes, análises jurídicas menos empíricas não conseguem perceber os


problemas na aplicação do direito. É no mundo da vida que a ausência da menção
expressa pela CRFB/88 inevitavelmente surge e muitas vezes com um grau de
conflituosidade ou violência extremo, como já demonstrado no capítulo 2. Portanto,
os argumentos utilizados pela OAB-RJ e pelo IAB de que a ausência de previsão
expressa na Constituição impede a regulamentação não se sustenta, pois existem
limites aos direitos fundamentais que não decorrem diretamente da Constituição (ex
constitutione) nem de reserva de lei restritiva expressamente prevista. Momento no
qual o Legislativo pode contribuir para o processo de concreção da norma ao
realizar as diversas noções presentes na Constituição, com certa margem de
criatividade na elaboração da lei, mas sem fugir do quadro de possibilidades
delimitado por ela.
Admitir a possibilidade de relativizações dos direitos fundamentais não pode
ser, por outro lado, defender que qualquer limitação é justificável. Portanto, o
impasse não está na impossibilidade formal de limitá-los, o problema da limitação
está em outro lugar, nas palavras de Robert Alexy:

O conceito de restrição a um direito parece familiar e não problemático. Que


direitos tenham restrições e que possam ser restringidos parece ser uma
ideia natural, quase trivial [...] o problema parece não estar no conceito de
restrição a um direito fundamental, mas exclusivamente na definição dos
193
possíveis conteúdo e extensão dessas restrições [...].

A objeção a ser suscitada está no campo do limite da relativização. A partir de


que momento uma restrição descaracterizaria o próprio direito? Qual seria o núcleo
essencial que, se ultrapassado, comprometeria materialmente o direito de reunião?

192
No original: “[...] legislation in a democratic constitutional state consists to great extent, and in
particular as far as fundamental rights apply, in the implementation of constitutional law. In this
context, implementation means, not mere application of constitutional norms, but a creative or
constructive process of establishing norms based on the balancing of constitutional principles.”.
(SIECKMANN, Jan. Legislation as implementation of constitutional law: A foundation for the demand
of legislative rationality. In: WINTGENS, Luc J; OLIVER-LALANA, A Daniel. (Ed.) The rationality and
justification of legislation: Essays on legisprudence. Cham: Springer, 2013. p. 108)
193
ALEXY, Robert. Teoria dos Direitos Fundamentais. São Paulo: Malheiros, 2012. p. 276.
63

3.2 Quem pode regulamentar o direito de reunião?

A possibilidade de se regulamentar infraconstitucionalmente o direito de


reunião, conforme realizado pelo Estado do Rio de Janeiro, traz consigo a dúvida
sobre a competência legislativa. Direitos fundamentais são temáticas material e
formalmente reservadas à Constituição, todavia o grau de detalhes que a vida
concreta exige pode sugerir ressalvas a uma Constituição muito analítica em virtude
da extensão que esta ganharia. Assim, o texto constitucional define os órgãos
legitimados para realizar a mediação legislativa concretizadora por meio do sistema
de competência legiferante.
A forma federativa de Estado adotada pelo Brasil resulta em uma
descentralização política entre os entes federados, o que por vezes torna a
competência legislativa tema de análise não muito simples e não isento da
possibilidade de antinomias. O texto da CRFB/88, no inciso I do art. 23, dispõe que é
competência comum entre União, Estados, Distrito Federal e Municípios zelar pela
guarda da Constituição, das leis e das instituições democráticas. Além disso, o § 3o
do art. 24 define que, na ausência de lei federal com normas gerais, os Estados
exercerão a competência legislativa plena para atender às suas peculiaridades.194
Na situação da lei fluminense discutida anteriormente, o argumento exposto no
projeto de lei foi o de que a norma pretendia regulamentar o direito de reunião
previsto no art. 23 da Constituição do Estado.195 Assim, em tese, não haveria
problema de a ALERJ regulamentar o direito previsto na constituição do próprio
Estado.
Ir um pouco além na discussão sobre competência legislativa pode tornar o
tema mais intrincado. O conflito entre a ordenação social e a liberdade de reunião
estabeleceu-se também na Câmara Municipal de Belo Horizonte (CMBH). Na capital
mineira essa é uma tensão que remonta à sua criação, conforme lembra José

194
BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil, de 5 de outubro de
1988. Diário Oficial da União, 5 out. 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em:
16 jun. 2016.
195
“Art. 23 – Todos podem reunir-se pacificamente, sem armas, em locais abertos,
independentemente de autorização, desde que não frustrem outra reunião anteriormente convocada
para o mesmo local, sendo exigido apenas o prévio aviso à autoridade. § Único – A força policial só
intervirá para garantir o exercício do direito de reunião e demais liberdades constitucionais, bem
como para a defesa da segurança pessoal e do patrimônio público e provado, cabendo
responsabilidade pelos excessos que cometer.” (RIO DE JANEIRO (ESTADO). Lei nº 6.528, de 11
de setembro de 2013. Regulamenta o artigo 23 da Constituição do Estado. Diário Oficial do Estado,
12 set. 2013. Disponível em: <http://www.alerj.rj.gov.br>. Acesso em: 6 nov. 2015)
64

Márcio Barros.196 A origem da capital, na virada do século XIX para o XX, já


evidenciava o projeto modernista de cidades ideais. O caos e o crescimento
desordenado dos centros urbanos até então existentes seriam superados pela
ciência libertadora. O controle do espaço urbano por meio do planejamento retilíneo,
calculista, matemático e de formas geométricas foi uma tentativa de impor a
concepção técnico-científica sobre a desordem natural. O intuito era implementar um
modelo idealizado de cidade e de civilização sob o primado da racionalidade, no
qual a lógica matemática probabilística geraria a previsibilidade e segurança
necessárias para a vida em espaços compartilhados. Os nomes sequenciados das
ruas paralelas e perpendiculares em Belo Horizonte são sintomáticos desse
elemento norteador da fundação do que seria a nova capital do estado.

Figura 7 – Planta da capital mineira de 1895: destaque para as formas geográficas


da nova capital.

197
Fonte: Comissão Construtora da Nova Capital.

Alguns anos após seu centenário, a tensão entre regular e emancipar se


manifestou em iniciativa legislativa sobre a ordenação do espaço urbano da cidade.
Sua externalização no Legislativo municipal evidencia que o binômio ordem-

196
BARROS, José Márcio. Cultura e comunicação nas Avenidas de Contorno em Belo Horizonte e La
Plata. Belo Horizonte: Editora PUC-Minas, 2005.
197
COMISSÃO CONSTRUCTORA DA NOVA CAPITAL. Planta geral da cidade de Minas. Aprovada
pelo Decreto nº 817, de 15 de abril de 1895. Arquivo Público Mineiro. Disponível em:
<http://www.siaapm.cultura.mg.gov.br>. Acesso em: 03 jun. 2016.
65

desordem ainda é uma questão latente para a capital mineira, assim como talvez
seja para toda e qualquer grande cidade.
Em 22 de agosto de 2011, foi apresentado à CMBH o PL nº 1.896, de 2011. A
proposta tinha o escopo de criar o Parlatório Democrático do Município em uma
praça pública para a realização de manifestações. Em contrapartida, proibia as
manifestações públicas nas ruas e avenidas compreendidas dentro da Avenida do
Contorno, no horário das 6h às 20h. A distinção entre o interior ordenado da Avenida
do Contorno e seu exterior suburbano e negligenciado estava presente na criação
no século XIX198 e parece voltar no século XXI sob nova roupagem. Em fragmento
da justificativa do PL:

Desta forma, garante-se o direito de ir e vir do cidadão, inclusive no que diz


respeito às ambulâncias, Corpo de Bombeiro e outros serviços essenciais à
população. Além disso, as manifestações dentro da Avenida do Contorno e
nas ruas e avenidas compreendidas dentro do perímetro desta Avenida
serão permitidas fora do horário estipulado: após as 20:00 até às 06:00 h.,
terminando com o caos que compromete o trânsito.
Cumpre ressaltar que as manifestações populares são importantes, mas há
outras formas de manifestação popular, igualmente nobres, desde que
verdadeiras. As manifestações podem ocorrer, mas com verdade, com
respeito, com educação. Assim, damos o exemplo e determinamos o tom do
diálogo necessário de forma pacífica e democrática, em busca do bem
199
comum.

A proposta de ordenação do espaço urbano atinge o âmago do debate


apresentado no capítulo 2: o conflito de direitos e o que revela Guilherme Wisnik200 ,
o lugar privilegiado que os espaços centrais das cidades ocupam na discussão
sobre o ativismo urbano. Nesse contexto, na solução apresentada em BH, os
embates para os protestos seriam encerrados via ordenação pela lei municipal.
O PL foi encaminhado para análise de 4 (quatro) Comissões da CMBH. A
primeira, Comissão de Legislação e Justiça, perdeu o prazo por falta de quórum
para a reunião. Após novo prazo, decidiu-se pela constitucionalidade, mas pela
ilegalidade em virtude de haver lei municipal que atribui ao Prefeito a competência
para administrar os bens do município. A Comissão de Meio Ambiente e Política

198
BARROS, José Márcio. Cultura e comunicação nas Avenidas de Contorno em Belo Horizonte e La
Plata. Belo Horizonte: Editora PUC-Minas, 2005, p. 139.
199
BELO HORIZONTE. Câmara Municipal. Projeto de Lei nº 1.896/2011, de 22 de agosto de 2011.
Dispõe sobre a instituição de Parlatório Democrático no Município e dá outras providências. Inicial.
Disponível em: <http://www.cmbh.mg.gov.br>. Acesso em: 11 maio 2015. p. 2.
200
WISNIK, Guilherme. O ativismo urbano e o valor e uso do espaço público. Folha de São Paulo,
Caderno Ilustríssima, 15 nov. 2015. Ilustração Marina Rheingantz. Disponível em:
<http://www.folha.uol.com.br>. Acesso em: 1º dez. 2015.
66

Urbana rejeitou a proposta ao afirmar, em síntese: “[...] não vemos com bons olhos a
instituição de um espaço para a manifestação da democracia, pois esta
manifestação independe de delimitação territorial”. Na Comissão de
Desenvolvimento Econômico, Transporte e Sistema Viário, o projeto também foi
rejeitado, ao argumento central de que “a matéria está por demais contida na
legislação municipal e constitucional pertinente à matéria”. A Comissão de Direitos
Humanos e Defesa do Consumidor perdeu o prazo em virtude de não emissão do
parecer pelo relator. Em nova abertura de prazo, o projeto foi rejeitado com o
argumento central de que os objetivos da manifestação não serão alcançados se as
manifestações ficarem restritas ao local definido no PL, além disso, pontuou a
relatora que “o direito de reunião é uma manifestação coletiva da liberdade de
expressão e qualquer tipo de censura consiste em violação do direito fundamental
consagrado na Constituição Federal”. Após as rejeições, o autor do PL apresentou
recurso em março de 2012, entretanto, encerrou-se a legislatura sem sua
apreciação no Plenário, o que resultou no arquivamento em 2 de janeiro de 2013.201
Instigante perceber o trâmite legislativo. Além do arquivamento pela falta de
análise, durante o processo metajurídico o prazo de manifestação não foi cumprido
por duas das quatro comissões pelas quais tramitou, exatamente aquelas nas quais
deveriam ser debatidas questões atinentes à justiça e aos direitos humanos. Esses
entraves podem ser sintomas das controvérsias que o tema gera, do receio de ser
encarado como censura e dos desafios de se fazer o encontro dos desencontros
sobre os limites entre uso e abuso do direito de reunião.
Os argumentos utilizados de impossibilidade normativa de qualquer tipo de
limitação ou que a densificação existente no Brasil é suficiente, entre outras
questões, despertam a atenção para a qualidade jurídica da norma: além da
preocupação acerca da competência (who) e do conteúdo (which, what) da
regulamentação, o modo (how) como a norma é produzida também deve ser
analisado, sendo essa a preocupação de Luc Wintgens, quando sugere termos mais
limitados para a presumida racionalidade do legislador e, consequentemente, da

201
BELO HORIZONTE. Câmara Municipal. Projeto de Lei nº 1.896/2011, de 22 de agosto de 2011.
Dispõe sobre a instituição de Parlatório Democrático no Município e dá outras providências.
Tramitação. Disponível em: <http://www.cmbh.mg.gov.br>. Acesso em: 11 maio 2015.
67

legislação.202 O receio de Wintgens mostra-se pertinente no caso da CMBH; por


vezes, os argumentos apresentados parecem ser fruto mais de convicções e
paixões pessoais que de um debate franco do problema que precisa ser enfrentado.
Sobre a possibilidade de o município regulamentar a matéria, três das quatro
comissões que emitiram parecer sobre o PL nº 1.896/11, direta ou indiretamente,
deixaram subentendido que uma lei municipal poderia restringir o direito
constitucional de reunião, ainda que, por outro motivo, optasse por não o fazer. A
possibilidade da regulamentação utilizada está fundamentada em virtude da
perspectiva utilizada: não se discutia sobre limites a direitos constitucionais, mas sim
sobre a forma de utilização de algumas ruas da cidade, logo, encontraria respaldo
constitucional no inciso I do art. 30 da CRFB/88, que reserva ao Município legislar
sobre assuntos de interesses locais.203
Por ter sido arquivado devido ao término de legislatura, o Regimento Interno
da Câmara determina que seja mantida a tramitação mediante um novo projeto com
a mesma pauta,204 o que aconteceu por meio do PL nº 281/2013. No novo-antigo PL,
decidiu-se pelo parecer de três comissões. A primeira análise foi no âmbito da
Comissão de Legislação e Justiça, tendo sido o mais elaborado de todos os
pareceres até então, seja pelo volume de páginas, seja pelo encadeamento entre a
discussão e a fundamentação jurídica do que se pontuava. Em apertada síntese, o
parecer foi pela constitucionalidade da iniciativa, pelo já mencionado preceito
constitucional que atribui ao município a competência para legislar sobre assuntos
locais, bem como pela regimentalidade do processo. Todavia, decidiu-se pela
ilegalidade do PL em virtude da existência de lei municipal que já dispunha sobre o
tema. Na Comissão de Meio Ambiente e Política Urbana, o projeto também foi
considerado ilegal por ferir a legislação municipal. Até 23 de maio de 2016, data do

202
WINTGENS, Luc J. The rational legislator revisited. Bounded rationality and legisprudence. In:
WINTGENS, Luc J; OLIVER-LALANA, A Daniel. (Ed.) The rationality and justification of legislation:
Essays on legisprudence. Cham: Springer, 2013.
203
BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil, de 5 de outubro de
1988. Diário Oficial da União, 5 out. 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em:
16 jun. 2016.
204
“Art. 104 – A proposição que não for apreciada até o término da legislatura será mantida em
o
tramitação. § 1 – Os projetos mantidos em tramitação continuarão esta da fase em que estavam
quando do término da legislatura, com as seguintes exceções: I – se terminada a discussão, mas
ainda não votado o projeto, aquela será reaberta.” (BELO HORIZONTE. Câmara Municipal.
Resolução nº 1.480, de 7 de dezembro de 1990. Contém o Regimento Interno da Câmara Municipal
de Belo Horizonte, de 7 de dezembro de 1990. DOMG, 8 dez. 1990. Disponível em:
<http://www.cmbh.mg.gov.br>. Acesso em: 11 maio 2015)
68

último acompanhamento, o PL ainda aguardava a análise da Comissão de Direitos


Humanos e Defesa do Consumidor para então ser votado no plenário.205
Em quase cinco anos, mesmo distantes dos conflitos que afloram nas ruas, os
legisladores municipais não conseguiram encontrar os termos para lidar com as
diversidades de uma sociedade plural. Ante essa constatação, o que se pode, em
termos realistas, esperar da atuação concreta do direito pela polícia no instante da
decisão imediata? O que esperar das paixões humanas quando a polícia mantém
milhares de pessoas em congestionamentos para proteger manifestações ou
quando, em sentido contrário, relativiza o direito de reunião ao interferir em um
protesto para evitar agressões mútuas ou para impedir que pessoas morram em
virtude do trânsito prejudicado?
Portanto, às vésperas do término de outra legislatura,206 o PL parece
caminhar para um novo encerramento-abertura, pairando sobre os moradores da
capital a possibilidade da regulamentação do direito de reunião nos termos
mencionados. A proposta belo-horizontina de restringir as manifestações públicas a
determinado espaço não foi a primeira e provavelmente não será a última. A ideia foi
veiculada em outros lugares, como São Paulo em 1995,207 no Rio de Janeiro em
2014,208 nos Jogos Olímpicos de Pequim 2008,209 em Jacarta em 2010210 etc.
A criação de dispositivo espacial para protestos chegou a ser tema de
concurso de arquitetura. Três estudantes da Universidade Federal de Minas Gerais
(UFMG) venceram a disputa com o Protestródomo; segundo uma das alunas, “o
nosso projeto surgiu como uma ironia à proposta do concurso. Um protesto não

205
BELO HORIZONTE. Câmara Municipal. Projeto de Lei nº 281/2013, de 2 de janeiro de 2013.
Dispõe sobre a instituição do Parlatório Democrático no Município e dá outras providências.
Tramitação. Disponível em: <http://www.cmbh.mg.gov.br>. Acesso em: 23 maio 2016.
206
Estão previstas para outubro de 2016 eleições para prefeito, vice-prefeito e vereador, encerrando
o período de 4 anos compreendido na legislatura 2012-2016.
207
CARLOS, Ana Fani Alessandri. A (re)produção do espaço urbano. São Paulo: Editora da
Universidade de São Paulo, 1994. p. 70 apud MAGALHÃES, Fabiano Rosa de. Estratégias de rua:
manifestações político-sindicais do Sindicato dos Bancários na Praça Sete de Belo Horizonte. 186 f.
Dissertação (Mestrado em Ciências Sociais) – Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais da
Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2008. p. 78.
208
MANIFESTANTES interditam rodovia que dá acesso ao aeroporto de Viracopos. Agência Brasil,
Caderno Notícia, 4 jul. 2013. Disponível em: <http://www.ebc.com.br>. Acesso em: 6 mar. 2016.
209
MINUZZI, Evelize Dorneles; MARIN, Elizara Carolina; FRIZZO, Giovanni Ernst. As manifestações
sociais como contratendência ao espetáculo olímpico de entretenimento planetário. Motrivivência,
Florianópolis, UFSC, ano XXV, n. 41. p. 27-41, dez. 2013. Disponível em:
<https://periodicos.ufsc.br/index.php/motrivivencia/article/view/2175-8042.2013v25n41p27/25811>.
Acesso em: 06 mar. 2016. p. 35.
210
INDONÉSIA: Jacarta cria o “protestródromo”. Jornal do Brasil (JB), Caderno Internacional,
Notícias, 4 fev. 2010. Disponível em: <http://www.jb.com.br>. Acesso em: 6 mar. 2016.
69

pode ser feito em um espaço fechado. A ideia do protesto é o descontrole”.211 Na


concepção das vencedoras, o espaço funcionaria como uma broca que fura o solo,
sem controle ou direção, conforme os manifestantes gritam e se agitam, causando
giros que seriam quantificados em re-voltas por minuto.

Figura 8 – Protestródomo e a medição das re-voltas

212
Fonte: Foto de Lígia Machado Pinto.

211
HARNIK, Simone. Estudantes vencem concurso de arquitetura com ‘protestródromo’: alunos da
UFMG imaginaram uma estrutura de protestos em Brasília. Portal G1, Caderno Notícias, Vestibular,
10 out. 2010. Disponível em: <http://g1.globo.com>. Acesso em: 17 fev. 2013.
212
HARNIK, Simone. Estudantes vencem concurso de arquitetura com ‘protestródromo’: alunos da
UFMG imaginaram uma estrutura de protestos em Brasília. Portal G1, Caderno Notícias, Vestibular,
10 out. 2010. Disponível em: <http://g1.globo.com>. Acesso em: 17 fev. 2013.
70

Figura 9 – Protestródomo e o descontrole no chão de Brasília

213
Fonte: Foto de Lígia Machado Pinto.

No projeto criativo e lúdico das estudantes mineiras, há uma reflexão muito


séria e profunda sobre o direito de reunião: a noção do protesto como descontrole. A
democracia tem um elemento anárquico, de descontrole, de ingovernável, que, se
aniquilando, compromete a própria democracia. Nas palavras de Jacques Rancière:

A palavra democracia não foi inventada por um acadêmico preocupado em


distinguir por meio de critérios objetivos as formas de governos e os tipos de
sociedades. Ao contrário, foi inventada como termo de indistinção, para
afirmar que o poder de uma assembleia de homens iguais só pode ser
confusão de uma turba informe e barulhenta, que equivalia dentro da ordem
214
social ao que é o caos dentro da ordem da natureza.

Dessa forma, ao se adotar a democracia como pressuposto, a dialética entre


a emancipação do ser humano e a regulação do espaço urbano para permitir a vida
em sociedade revela-se a cada passo um cenário desafiador e que parece não
permitir uma resposta válida para todas as pessoas, em todos os tempos e em todos
os lugares.
O PL apresentado em BH, como uma resposta fixa imposta de cima para
baixo, que tenta conter com precisão matemática a vida, as paixões humanas e o
descontrole democrático, muito dificilmente será cumprido espontaneamente. Se
aprovado nos termos expostos, apenas transferirá para a polícia a obrigação de
cumprir uma lei não aceita pelos destinatários, que são os que desejam manifestar.

213
Ibid.
214
RANCIÈRE, Jacques. Ódio à democracia. São Paulo: Boitempo, 2014. p. 117.
71

Como pontua Henri Lefebvre, “o urbano é assim, mais ou menos, a obra dos
citadinos em lugar de se impor a eles como um sistema: como um livro já
acabado”.215

3.3 Concorrência de direitos fundamentais

No capítulo 2, enfatizou-se o conflito no exercício concreto do direito de


reunião. Conforme apresentado, à medida que se garante um direito, limita-se outro,
e a Constituição não oferece resposta pronta em relação a onde termina um e
começa o outro. Uma tensão indefinível a priori, com a qual se precisa con-viver.
Outra discussão de matiz constitucional também pode ajudar a compreender a
complexidade da atuação da polícia nas manifestações no Estado Constitucional
Democrático: a concorrência de direitos.
O protesto pelas ruas de uma cidade pode ser estudado juridicamente por
várias perspectivas. Simultaneamente, a conduta é subsumível em pelo menos três
direitos previstos no art. 5o da CRFB/88: inciso IV, liberdade de expressão; inciso
VX, direito de ir e vir; e no inciso XVI, direito de reunião. Quando uma conduta pode
ser subsumida no âmbito de proteção de diversos direitos, ocorre o que se
denomina concorrência de direitos. Canotilho explica: “A concorrência de direitos
fundamentais existe quando um comportamento do mesmo titular preenche os
pressupostos de facto (Tatbeständ) de vários direitos fundamentais”.216 Nessa
situação, questionar-se-ia qual a norma aplicável, tendo em vista que cada um
desses direitos possui contingências que lhes são próprias e uma disciplina
específica.
Os constitucionalistas têm elaborado teorias para indicar um caminho menos
traumático nessas decisões, como a solução pela especialidade do Direito, a teoria
da prevalência dos direitos fundamentais menos limitados ou, ainda, a hipótese da
existência de elementos mais distintivos de um em relação ao outro.217 São úteis,
todavia não isentas de objeções nem irrefutáveis, e exigem um raciocínio jurídico
mais refletido e elaborado, incompatível com o imediatismo da resposta que as
circunstâncias fáticas demandam do policial, e que este, portanto, muitas vezes não
tem condições de oferecer.
215
LEFEBVRE, Henri. Direito à cidade. São Paulo: Centauro, 2001. p. 72.
216
CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional e teoria da Constituição. 7. ed.
Coimbra: Almedina, 2003. p. 1.268.
217
Ibid.. p. 1.269-1.270.
72

A concorrência entre as liberdades de expressão e de reunião pode ilustrar a


temática. Apesar de não estarem previstos no direito de reunião limites ao conteúdo
dos protestos, os limites à liberdade de expressão são, para alguns autores,
aplicáveis também ao direito de reunião. Nas palavras de José Luiz Quadros de
Magalhães:

A reunião pública, como direito individual fundamental, é meio de


manifestação do pensamento e do exercício da liberdade de expressão, e
não pode ser utilizada com finalidades contrárias aos Direitos Humanos.
Dessa forma, uma reunião pública que vise à divulgação de teses racistas é
ilegal, pois os participantes de tal manifestação pública cometem crime
218
previsto na Constituição, punido com pena de reclusão nos termos da lei.

Assim, o direito de reunião encontraria restrições na liberdade de expressão,


embora a CRFB/88 seja omissa a esse respeito. Basear-se apenas no inciso XVI do
art. 5o não seria suficiente para demonstrar a licitude de intervenção, por exemplo,
em protesto racista, o que leva Magalhães a adotar uma interpretação sistemática
da Constituição.
O mesmo ocorre com o direito de ir e vir. Porém, assim como o conflito de
direitos entre os protestos e a liberdade de locomoção tem suscitado divergências
mais agudas, esse mesmo binômio encontra na concorrência de direitos implicações
mais profundas na dogmática jurídica.
A liberdade de locomoção é tema de muitas normas infraconstitucionais
regulamentadoras. No perspectiva do uso das vias terrestres, além de leis existem
resoluções, portarias, deliberações e uma ampla gama de atos normativos que
resultaram no que se convencionou chamar Direito de Trânsito. A concorrência com
o direito de reunião fica evidente na Lei nº 9.503/97, o Código de Trânsito Brasileiro
(CTB). A lei regulamenta não apenas o uso das vias públicas utilizando-se os meios
de transportes, mas também o pedonal:

Art. 1º O trânsito de qualquer natureza nas vias terrestres do território


nacional, abertas à circulação, rege-se por este Código.
§ 1º Considera-se trânsito a utilização das vias por pessoas, veículos e
animais, isolados ou em grupos, conduzidos ou não, para fins de circulação,

218
MAGALHÃES, José Luiz Quadros. Direito Constitucional. Tomo I. Belo Horizonte: Mandamentos,
2000. p. 108.
73

parada, estacionamento e operação de carga ou descarga. (grifos


219
acrescidos)

Pelo fragmento, percebe-se que pessoas em grupo andando a pé em vias de


trânsito devem obedecer ao disposto no Código. O art. 68 ajuda a compreender
como deve acontecer essa circulação de pedestres:

Art. 68. É assegurado ao pedestre a utilização dos passeios ou passagens


apropriadas das vias urbanas e dos acostamentos das vias rurais para a
circulação, podendo a autoridade competente permitir a utilização de parte
da calçada para outros fins, desde que não seja prejudicial ao fluxo de
pedestre.
[...]
§ 2o Nas áreas urbanas, quando não houver passeios ou quando não for
possível a utilização dele, a circulação de pedestres, na pista de rolamento,
será feita com prioridade sobre os veículos, pelos bordos da pista, em fila
única, em sentido contrário ao deslocamento de veículos, exceto em locais
proibidos pela sinalização e nas situações em que a segurança ficar
220
comprometida. (grifos acrescidos).

Portanto, há uma afetação de bem público que define como deve ser seu uso,
definindo que os pedestres devem andar nos passeios. Em uma manobra
hermenêutica, se poderia afirmar que a lei assegura os passeios aos pedestres, mas
não proíbe que eles utilizem as pistas de rolamento. Todavia, a lei veda
expressamente a utilização destas pelo pedestre, inclusive impondo multa:

Art. 254. É proibido ao pedestre:


I – permanecer ou andar nas pistas de rolamento, exceto para cruzá-las
onde for permitido;
II – cruzar pistas de rolamento nos viadutos, pontes, ou túneis, salvo onde
exista permissão;
III – atravessar a via dentro das áreas de cruzamento, salvo quando houver
sinalização para esse fim;
IV – utilizar-se da via em agrupamentos capazes de perturbar o trânsito, ou
para a prática de qualquer folguedo, esporte, desfiles e similares, salvo em
casos especiais e com a devida licença da autoridade competente;
V – andar fora da faixa própria, passarela, passagem aérea ou subterrânea;
VI – desobedecer à sinalização de trânsito específica [...]
Infração – leve;

219
BRASIL. Lei nº 9.503, de 23 de setembro de 1997. Institui o Código de Trânsito Brasileiro. Diário
Oficial da União, 24 set. 1997. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em 26 set.
2013.
220
BRASIL. Lei nº 9.503, de 23 de setembro de 1997. Institui o Código de Trânsito Brasileiro. Diário
Oficial da União, 24 set. 1997. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em 26 set.
2013.
74

Penalidade – multa, em 50% (cinquenta por cento) do valor da infração de


221
natureza leve. (grifos acrescidos)

Além de proibir a utilização das faixas de rolagem individualmente ou em


grupo, percebe-se pelo menos outras duas questões: a imposição de multa ao
pedestre que não obedecer à regra; e que os eventos a serem realizados em vias
públicas, que possam perturbar ou interromper a livre circulação de veículos ou
pedestres, como os desfiles e similares, dependam de autorização. A necessidade
de autorização é afirmada também no art. 95:

Art. 95. Nenhuma obra ou evento que possa perturbar ou interromper a livre
circulação de veículos e pedestres, ou colocar em risco sua segurança, será
iniciada sem permissão prévia do órgão ou entidade de trânsito com
222
circunscrição sobre a via.

Percebe-se que, pela Lei nº 9.503/97, a utilização das faixas de trânsito por
pessoas está sujeita a autorização, o que é diferente do mero aviso mencionado no
direito de reunião. Como se verá no capítulo 5, esses preceitos do CTB já foram
utilizados por tribunais para impor limites a protestos. Assim, caberia a indagação se
tais preceitos são inconstitucionais ou se, ao assegurar o direito de reunião, a
CRFB/88 o estaria garantindo apenas em lugares não proibidos pelo CTB, como
praças, parques, calçadões e outros lugares destinados aos pedestres. Se essa
interpretação for tida por constitucional, teria como consequência a desnecessidade
de autorização para manifestações realizadas em praças e similares, porém, caso
se deseje realizar ato que interfira no fluxo de veículos, seria preciso a autorização
do órgão com circunscrição sobre a via, conforme expresso no CTB. Assim, haveria
no Brasil um modelo semelhante ao de Nova Iorque, respaldado pela Suprema
Corte norte-americana,223 que proíbe protestos nas vias de trânsito destinadas aos
veículos. Porém, como se verá no capítulo 5, essa antinomia nunca foi enfrentada
pelo Supremo Tribunal Federal.
A interpretação favorável à aplicação do CTB parece ter sido o
posicionamento do governo e do Congresso federais em 2015. Após um período de
intensa greve e manifestações de caminhoneiros contra o governo federal, em prol
do aumento do valor dos fretes e contra o aumento do preço dos combustíveis, em

221
Ibid.
222
Ibid.
223
Objeto de estudo no Capítulo 5.
75

novembro de 2015224, a Presidência da República editou a Medida Provisória (MP)


nº 699. A MP do governo federal visava punir quem utilizasse de veículo com a
intenção de prejudicar a circulação nas vias públicas. Entretanto, no Congresso, as
sanções propostas pela Presidência foram tidas como abusivas e por isso reduzidas:
a multa de 30 vezes o valor da multa gravíssima foi reduzida para 20 vezes; foi
retirada a penalidade de apreensão do veículo; excluiu-se a penalidade de
recolhimento do documento de habilitação; suprimiu-se a penalidade de proibição de
utilizar incentivos creditícios para aquisição de veículos para os que cometessem a
infração; a multa aos organizadores da manifestação foi reduzida de 100 vezes o
valor da infração gravíssima para 60 vezes225. A MP nº 699/15 foi convertida no
Projeto de Lei de Conversão nº 4, de 2016, e criou a infração de trânsito prevista no
Art. 253-A:

Art. 253-A – Usar qualquer veículo para, deliberadamente, interromper,


restringir ou perturbar a circulação na via sem autorização do órgão ou
entidade de trânsito com circunscrição sobre ela:
Infração gravíssima;
Penalidade – multa (vinte vezes) e suspensão do direito de dirigir por doze
meses;
Medida Administrativa – remoção do veículo.
o
§ 1 Aplica-se a multa agravada sessenta vezes aos organizadores da
conduta prevista no caput.
o
§ 2 Aplica-se em dobro a multa em caso de reincidência no período de
doze meses.
o
§ 3 As penalidades são aplicáveis a pessoas físicas ou jurídicas que
incorram na infração, devendo a autoridade com circunscrição sobre a via
restabelecer de imediato, se possível, as condições de normalidade para a
226
circulação na via.

224
CAMINHONEIROS fazem protestos e bloqueiam rodovias no Brasil. Folha de S. Paulo, Caderno
Mercado, 9 nov. 2015. Disponível em: <http://www.folha.uol.com.br>. Acesso em: 26 abr. 2016.
225
A redação original da MP diferenciava-se em alguns pontos da que se converteu em lei no
Senado, sendo a proposta original ainda mais severa quanto às penalidades. Na redação da MP nº
699: “Art. 253-A – Usar veículo para, deliberadamente, interromper, restringir ou perturbar a
circulação na via: Infração gravíssima; Penalidade – multa (trinta vezes), suspensão do direito de
dirigir por doze meses e apreensão do veículo; Medida Administrativa – recolhimento do documento
de habilitação, remoção do veículo e proibição de receber incentivo creditício por dez anos para
o
aquisição de veículos. § 1 Aplica-se a multa agravada cem vezes aos organizadores da conduta
o
prevista no caput. § 2 Aplica-se em dobro a multa em caso de reincidência no período de doze
meses” (BRASIL. Medida Provisória nº 699, de 10 de novembro de 2015. Altera a Lei nº 9.503, de
23 de setembro de 1997, que institui o Código de Trânsito Brasileiro. Diário Oficial da União, 11 nov.
2015.. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em: 26 set. 2015).
226
BRASIL. Lei de Conversão nº 4/2016. Altera a Lei nº 9.503, de 23 de setembro de 1997, que
institui o Código de Trânsito Brasileiro. Disponível em: <http://www.camara.gov.br>. Acesso em: 19
maio 2016.
76

A penalidade instituída em Medida Provisória passou a ser aplicada para


quem incorresse no tipo descrito no caput do art. 253-A, tendo sido empregada,
entre outas situações, no protesto de taxistas contra o Uber, no Rio de Janeiro, em
1º de abril de 2016.

Figura 10 – Taxistas em manifestações contra o Uber paralisando ruas do Rio de


Janeiro: multados em Medida Provisória declarada inconstitucional pela autoridade
que editou a norma

227
Fonte: Agência Brasil.

Quando enviada a MP para sanção presidencial, a própria autoridade que


propôs a infração de trânsito, mesmo após a redução das penalidades no

227
AGÊNCIA BRASIL. Taxistas que bloquearam ruas foram multados em 5,7 mil. O Tempo, Capa, 3
abr. 2016. Disponível em: <http://www.otempo.com.br>. Acesso em: 20 maio 2016.
77

Congresso, afirmou que se tratava de grave ofensa às liberdades de expressão e de


manifestação. Nas razões do veto, em 4 de maio de 2016:

Os dispositivos representariam grave ofensa às liberdades de expressão e


de manifestação, direitos constitucionalmente assegurados e que só
admitiriam restrição em situação de colisão com outros direitos
constitucionais. Além disso, busca-se regular o exercício daqueles direitos
em diploma reservado a regular o trânsito, estranho portanto ao seu
228
conteúdo.

A multa de 1º de abril no Rio de Janeiro revela aspectos preocupantes do


tema estudado. Como se viu, a Presidência da República editou medida provisória
alterando o Código de Trânsito e, antes da conversação em lei do ato normativo, e
mesmo após a mitigação das penas pelo legislativo, a autoridade que editou a
norma a achou abusiva e a vetou. Entretanto, pelo fato de as medidas provisórias
entrarem em vigor logo após sua edição, diversas pessoas foram punidas pela
norma que não se converteu em lei, trazendo transtornos operativos para processar
e recolher a injusta multa, posteriormente para as análises de recursos, devolução
dos valores pagos, bem como os possíveis reflexos no Judiciário. Além dos
transtornos burocráticos à Administração, por trás da propositura verifica-se a
aceitação dos preceitos do CTB que regulamentam as manifestações em vias
públicas pelo Congresso Nacional.
Outro problema que se revela é o da hiperinflação legislativa e suas
antinomias. Na Exposição de Motivos da MP, quando a autoridade que editou a
norma ainda não considerava a infração uma grave ofensa à liberdade de
expressão, ressaltou-se: “Ao instituir essa nova infração, a proposta visa promover
desincentivo à prática intencional de ações que ocasionem prejuízos a uma
municipalidade ou região [...]”.229 Assim, desafiou-se novamente o intérprete sobre a
discussão da competência municipal para legislar sobre assuntos locais. Em cidades
como Belo Horizonte, cuja utilização das vias públicas é também regulamentada no
Código de Posturas, e cuja legislação municipal autoriza os protestos nas faixas de
rolamento, a antinomia fica patente:

228
BRASIL. Mensagem nº 194, de 4 de maio de 2016. Mensagem de veto à Lei n 13.281, de 4 de
maio de 2016. Diário Oficial da União, 5 maio 2016. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br>.
Acesso em: 19 maio 2016.
229
BRASIL. EMI nº 00237/2015 MJ MCIDADES. Exposição de Motivos da Medida Provisória nº 699.
Brasília, 10 nov. 2015. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em: 18 mar. 2016.
78

Seção II
Da Passeata e Manifestação Popular
Art. 58 - A realização de passeata ou manifestação popular em logradouro
público é livre, desde que:
I - não haja outro evento previsto para o mesmo local;
II - tenha sido feita comunicação oficial ao Executivo e ao Batalhão de
Eventos da Polícia Militar de Minas Gerais, informando dia, local e natureza
do evento, com, no mínimo, 24 (vinte e quatro) horas de antecedência;
230
III - não ofereça risco à segurança pública.

Portanto, na concorrência entre os direitos constitucionais de reunião e de


locomoção surgem outras dúvidas para as quais existem argumentos com lastro
constitucional para ambos os lados e que se desdobram em leis que se contradizem.
O grau de complexidade que a questão ganha remete ao pensamento de François
Ost:

Observar-se-á, por outro lado – a objeção é decisiva – que a codificação


contemporânea poderia revelar-se uma operação tão vã quanto o
enchimento do tonel das Danaídes, na medida em que a própria matéria
231
codificada não para de se escoar e se transformar.

Na prática, a segurança jurídica prometida pelo Direito positivo não se


concretizou. No recorte do direito de reunião, pode-se afirmar que as leis em vigor,
além de não proporcionarem balizas mais seguras ao aplicador da norma ante a
generalidade e abstração do texto constitucional, potencializam os impasses
existentes ou criam novos, piorando o cenário. Em decorrência das antinomias,
medidas completamente distintas adotadas pela polícia podem encontrar suporte no
Direito positivo, ou, por outro lado, viabilizar a menção a essas mesmas normas
contra os policiais, na tentativa de se demonstrar que suas ações foram ilegais.
Talvez tão problemático quanto lidar com os conflitos nas ruas seja lidar com o
Direito positivo e suas incoerências e contradições.
A possiblidade de aplicar diversos dispositivos legais em protestos ultrapassa
a antinomia entre o CTB e as leis municipais que tentam regulamentar o uso do
espaço urbano, posto que outros preceitos do Direito positivo concorrem e
descrevem condutas que podem ocorrer durante manifestações públicas.

230
BELO HORIZONTE. Prefeitura de Belo Horizonte. Lei nº 8.616, de 14 de julho de 2003. Contém o
Código de Posturas do Município de Belo Horizonte. Disponível em: <http://www.pbh.gov.br>.
Acesso em: 11 maio 2013.
231
OST, François. O tempo do direito. Lisboa: Instituto Piaget, 2001. p. 301.
79

3.4 A participação da polícia na construção do sentido normativo

A possibilidade de subsumir o comportamento em mais de um enunciado


normativo possui numerosos desdobramentos na prática. Conforme já demonstrado,
alguns autores afirmam que a tutela jurídica dos protestos não pode servir para
encampar violações aos direitos fundamentais de outras pessoas. Exemplo nesse
sentido seria o de que o direito de reunião encontraria limites nos crimes contra a
honra: se no exercício do direito de reunião um manifestante ofender a dignidade de
outra pessoa, em virtude de raça ou cor, se estará diante da conduta tipificada como
injúria qualificada, descrita no § 3o do art. 140 do Código Penal.232 Assim, o policial
seria omisso caso não interviesse em tal situação de abuso do direito.
As questões envolvendo a aplicação do direito pela polícia no caso concreto e
sua interface com o processo penal são pouco notadas no Direito se for pensada a
extensão de seus reflexos. Os debates acadêmicos dão pouca ênfase ao tema,
passam ao largo do impacto da análise do policial ante o fato concreto e de como
esse primeiro enquadramento fato-tipo muitas vezes condiciona todo o trâmite
jurídico-processual, que a partir do policial na rua se inicia. Entre as instituições que
compõem o sistema de justiça criminal, a força pública é a que está mais próxima do
contexto fático da inobservância da norma pelas pessoas. Por vezes, a distância tão
ínfima proporciona ao policial presenciar a conduta ou até mesmo interferir no curso
dos acontecimentos. Isso faz com que todas as paixões e sentimentos humanos,
como raiva, medo, obstinação ou ira, interfiram de forma irretratável no quadro que
se desenha. Apesar disso, a atividade da polícia ostensiva é a menos disciplinada
ou estudada pelo processo penal. Os dispositivos do Código de Processo Penal, que
é a lei que trata da aplicação da lei penal, cuidam mormente da fase processual e
alguns poucos artigos especificamente das atividades da polícia investigativa.
Portanto, a aplicação do Direito Criminal pela polícia ostensiva, face do sistema
criminal que lida cotidianamente com os cidadãos nas ruas, é realizada em um limbo
em que se aplicam incidentalmente e por analogia os dispositivos do Código de
Processo Penal. Todas essas incertezas e aberturas interferem na definição do
sentido concreto do Direito Penal na própria atuação da polícia, revelando que, em
geral, o exercício do poder de polícia em sua prática precisa ser melhor estudado na

232
BRASIL. Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940. Código Penal. Diário Oficial da União,
de 31 dez. 1940. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em: 5 out. 2015.
80

perspectiva do fenômeno jurídico que ali se realiza. Assim, a aplicação do Direito


Penal na atuação da força de polícia, embora negligenciado, é um tema
extremamente delicado, em especial durante o acompanhamento de manifestações
e protestos.
A interseção entre Direito Penal, liberdade de expressão, direito de reunião e
participação da polícia no sentido normativo tem um caso ilustrativo na Suprema
Corte dos Estados Unidos – Texas v. Johnson, 491 U.S. 397/1989.233 Em protesto
na cidade de Dallas, em 1984, Gregory Lee Johnson queimou a bandeira dos
Estados Unidos. A polícia prendeu Johnson em virtude de uma lei do Texas que
proibia o ultraje à bandeira americana (desecration), interpretando, assim, que a
queima da bandeira seria uma ofensa ao símbolo nacional. O caso chegou à
Suprema Corte, que decidiu que a conduta de colocar fogo na bandeira não estava
entre as proibidas na lei,234 iniciando um dos mais intensos casos de disputa entre o
Legislativo e o Judiciário.235 Em resposta, no mesmo ano, 1989, o Congresso
Nacional promulgou o Flag Protection Act, que explicitamente estabelecia como
crime a queima da bandeira americana.236
Eduardo Correia Baptista sintetiza os efeitos dessa lei nas ruas da seguinte
maneira: “[...] sua mera adopção fez com que pessoas em protestos queimassem
bandeiras, tendo-se a lei convertido objectivamente num incentivo à prática do crime
que visava evitar”.237 A nova lei foi posteriormente declarada inconstitucional no caso
United States v. Eichman, 496 U.S. 310/1990, que, por sua vez, resultou em
proposta de emenda constitucional pelo Congresso.238 O fato de uma lei aplicada
pela polícia ou da simples promulgação de uma lei gerar mais protestos e conflitos
que, em tese, deveria solucionar é sintomático dos limites do Direito estatalista no
estabelecimento da ordem e de uma solução imposta verticalmente.

233
UNITED STATES. Supreme Court. Texas v. Johnson, 491 U.S. 397. (1989). Disponível em:
<https://www.law.cornell.edu/supremecourt/text/491/397>. Acesso em: 13 maio 2016.
234
O caso foi novamente debatido em 2005 com proposta de emenda constitucional. Cf.: SENATOR
Clinton, in pander mode. New York Times, The Opinion Pages, 7 Dec. 2005. Disponível em:
<http://www.nytimes.com>. Acesso em: 13 maio 2016).
235
Para estudo das divergências entre Legislativo e Judiciário na conformação do direito, cf. as
seguintes obras: MENDES, Conrado Hübner. Direitos fundamentais, separação de poderes e
deliberação. São Paulo: Saraiva, 2011; MENDES, Conrado Hübner. Controle de constitucionalidade
e democracia. Rio de Janeiro: Elsevier, 2008.
236
CLARK, John A.; McGUIRE, Kevin T. Congress, the Supreme Court and the flag. Political
Research Quarterly, v. 49, i. 4. p. 771-781, Dec. 1996.
237
BAPTISTA, op. cit., p. 265.
238
CLARK; McGUIRE, op. cit.
81

Por mais que legalidade seja uma noção extremamente relevante para o
Direito, as paixões humanas e o improviso da vida escapam à escrita hermética,
sobretudo quando a regulamentação desconsidera a importância do
comprometimento social para efetividade da norma.
A esse respeito, a história dos protestos no Brasil tem dois casos
emblemáticos, a Revolta da Vacina de 1904 e as Manifestações de 2013. Ambos
ricos em questões sobre os limites da lei para a solução de controvérsias no Estado
Democrático de Direito, sobretudo com o enfoque legisprudencial e da aplicação do
direito pela polícia, merecendo, portanto, capítulo autônomo para análise.

4 OS CONFLITOS E A LEI: LEGISPRUDÊNCIA E A APLICAÇÃO DA LEI PELA


POLÍCIA

4.1 Legisprudência no passado e a Revolta da Vacina: o que a lei e a polícia


conseguem controlar?

Olhar para o passado é um bom meio de iluminar o futuro. Nicolau Sevcenko,


na apresentação de seu livro sobre a Revolta da Vacina, lembra que na Grécia
antiga hístōr era a designação do homem culto enquanto historíā seria o
aprendizado pelo relato do hístōr.239 Assim, aprender com a história, por meio da
narrativa dos casos é, pelo menos desde a Grécia Antiga, a atitude de quem busca
sabedoria para lidar com as contingências da vida e com os desafios do presente.
Analisar a Revolta da Vacina a partir de concepções teóricas de hoje mostra-
se relevante na medida em que joga luzes importantes para a discussão aqui
realizada: tópicos como efetividade de atos normativos, uso da força pela polícia na
aplicação da lei e participação popular nas decisões do governo se entrelaçaram em
um contexto no qual a população carioca se apropriou das ruas da cidade. Uma
normatividade criada pelo Estado excluindo a opinião das pessoas, seus valores e
costumes, tentou ser convertida em realidade pela polícia e enfrentou grande
resistência popular. Ainda que cientificamente fundamentada, a regulamentação
operada desconsiderou o envolvimento e convencimento das pessoas e se
desdobrou em uma das maiores tragédias na história das manifestações do Brasil,

239
SEVCENKO, Nicolau. Revolta da Vacina: Mentes insanas em corpos rebeldes. São Paulo:
Scipione, 1993. p. 3.
82

que só teve fim quando os governantes desistiram da intenção inicial de vacinação


compulsória.
A proclamação da República no Brasil foi marcada por várias ironias e
contradições, tendo se iniciado com a destituição do provavelmente primeiro e maior
republicano brasileiro, Dom Pedro II, que contava com imenso carisma e apoio
popular.240 Na bandeira, o lema de raízes comteanas241 diz muito da elite política da
época e deixava claro o paradigma norteador que projetavam para o novo Brasil.
Todavia, o incremento da representatividade que se espera da transição de uma
monarquia para uma república não se concretizou na vida das pessoas. Em certo
sentido, ocorreu o oposto; a República resultou no esvaziamento dos canais efetivos
de participação do povo no poder.242
A situação na capital federal era ainda mais delicada em virtude da distância
entre governo e comunidade local, que decorria de múltiplos fatores, entre eles a
nomeação pelo presidente de prefeitos e chefes de polícia levados de outros
estados para o Rio de Janeiro. Os presidentes colocavam nessas funções pessoas
de sua confiança que vinham das respectivas bases territoriais, muitas vezes
escolhidas meritocraticamente, mas sem representatividade. José Murilo de
Carvalho explica:

Não por acaso, muitos dos chefes do governo municipal no período em foco
foram médicos ou engenheiros [...] Muitos destes técnicos eram
republicanos [...] chegados ao poder, do espírito republicano guardavam no
máximo alguma preocupação com o bem público, desde que o público, o
povo, não participasse do processo de decisão. O positivismo, ou certa
leitura positivista da República, que enfatizava, de um lado, a ideia de
progresso pela ciência e, de outro, o conceito de ditadura republicana,
contribuía poderosamente para o reforço da postura tecnocrática e
243
autoritária.

Assim, a república neutralizou a participação política na capital: “na república


que não era, a cidade não tinha cidadãos”.244 O presidente Campos Sales –

240
Cf. CARVALHO, José Murilo de. Perfis brasileiros: D. Pedro II. Coordenação Elio Gaspari e Lilia M.
Schwarcz. São Paulo: Companhia das Letras, 2007.
241
Alusão a Augusto Comte, sociólogo francês que viveu de 1798 a 1857. O pensador defendia a
sociologia, ou física social, como uma ciência capaz de explicar as leis universais da sociedade
assim como procedia as ciências naturais com o mundo físico. Ao se descobrir tais leis seria
possível, para Comte, interferir e controlar os fenômenos que nos rodeiam e melhorar o bem-estar
da humanidade. (GIDDENS, Anthony. Sociología. 4. ed. Madrid: Alianza Editorial, 2001. p. 34-35)
242
Cf. CARVALHO, José Murilo de. Os bestializados: o Rio de Janeiro e a República que não foi. 3.
ed. São Paulo: Companhia das Letras, 2015.
243
Ibid., p. 35.
244
Ibid., p. 162.
83

1898/1902 – conseguiu produzir superávit primário, mas a custo da insatisfação


geral.245 Rodrigues Alves, seu sucessor – 1902/1906 –, manteve a mesma política
financeira e enfatizou as obras públicas. Para implementar a reforma urbana da
capital, prometida ainda na posse, ”conseguiu poderes quase ditatoriais para o
engenheiro Pereira Passos, nomeado prefeito, e para o Médico Oswaldo Cruz,
nomeado diretor do Serviço de Saúde Pública”.246
Na época, a cidade possuía estrutura de água e esgoto deficiente e toneladas
de lixo compunham o cenário nas ruas. Conforme a elite procurava bairros mais
distantes, os casarões centrais tornavam-se casas de cômodo, cortiços ou outras
espécies de habitações coletivas, sobretudo para escravos recém libertos e
imigrantes pobres com o sonho de “fazer a américa”, que se amontoavam em
pequenos espaços sem condições mínimas de higiene. A soma de fatores permitia
um ambiente ideal para a proliferação de ratos, que eram comprados pelas
autoridades municipais como tentativa de conter sua propagação e contabilizados
em relatórios publicados pelos jornais. A estratégia adotada pelas autoridades
fomentou o surgimento de criadores dos pequenos mamíferos, que objetivavam
lucrar com tal venda, o que fez com que Marcos Bretas encontrasse nos registros
policiais da época pessoas qualificadas com o inusitado ofício de compradores de
ratos,247 o que evidencia as dificuldades da Administração Pública para implementar
certas medidas, ainda que necessárias.
Não por menos, o que hoje reconhecemos como “Cidade Maravilhosa” era
chamada “Cidade Pestilenta” ou “Tumulo dos Estrangeiros”.248 Em decorrência
desse cenário, representantes diplomáticos ingleses recebiam adicional de
insalubridade para vir a terras cariocas249 e a agência de turismo europeia prometia:
“Viaje direto para a Argentina sem passar pelos perigosos focos de epidemias do
Brasil”.250

245
Ibid., p. 92.
246
Ibid., p. 93.
247
BRETAS, Marcos Luiz. Ordem na cidade: o exercício cotidiano da autoridade policial no Rio de
Janeiro: 1907-1930. Rio de Janeiro: Rocco, 1997. p. 21.
248
RIO DE JANEIRO (CIDADE). Secretaria Especial de Comunicação Social. Caderno Memórias:
1904 – Revolta da Vacina. A Maior Batalha do Rio. Rio de Janeiro: Prefeitura da Cidade do Rio de
Janeiro, 2006. p. 22.
249
CARVALHO, José Murilo de. Os bestializados: o Rio de Janeiro e a República que não foi. 3. ed.
São Paulo: Companhia das Letras, 2015. p. 19.
250
RIO DE JANEIRO (CIDADE). op. cit., p. 26.
84

Assim, a nomeação do jovem egresso do Instituto Pasteur, de Paris, para a


Saúde Pública possuía objetivo claro. A ideia era implementar avanços técnico-
científicos para a população, ao transformar a cidade com ares coloniais, infestada
por febre amarela, febre tifoide, peste bubônica, tuberculose e varíola, em uma
metrópole higienizada. Um processo bem-intencionado que resultaria em melhorias
para a população tendo à frente o reconhecido sanitarista Dr. Osvaldo Cruz, que
chegou a afirmar: “dêem-me liberdade de ação e eu exterminarei a febre amarela
dentro de três anos”.251 O desejo de progresso resultou no estabelecimento de um
arranjo jurídico que viabilizaria ao cientista a transformação perquirida sem influência
política. Situação extrema que, na lógica técnico-científica, carecia de medidas
certas, firmes e enérgicas.
A febre amarela e a peste bubônica foram os primeiros desafios. Na
empreitada, brigadas sanitaristas visitavam casas para limpar, desinfetar, exigir
reformas, realizar interdições e remover doentes. Em virtude das resistências, as
brigadas eram acompanhadas de soldados da polícia.252 As medidas higiênicas
eram impostas verticalmente, desconsiderando a opinião dos afetados ou a tentativa
de convencê-los. Entre o conhecimento científico de estirpe europeia e a ignorância
dos analfabetos brasileiros, era nítido quem haveria de ceder: a ordenação social
pela norma estatal deveria submeter a autonomia individual, ainda que isso
acontecesse na dependência total da força policial para proporcionar eficácia à lei.
A prática legiferante foi uma das ferramentas utilizadas pelas autoridades
públicas: promulgavam-se regulamentações como o Código de Posturas de 1890
que, ao dispor sobre casas de aluguel, impunha a obrigação “[...] de caiar as
paredes duas vezes por ano, azulejar cozinhas e banheiros, arejar quartos com
aparelhos de ventilação, limitar o número de hóspedes [...] melhoramentos até hoje
inexistentes em muitas residências”.253 A postura das autoridades ficou conhecida
como “ditadura sanitarista”254 e José Murilo de Carvalho traz outros exemplos:

Proibiu cães vadios e vacas leiteiras nas ruas; mandou recolher a asilos os
mendigos; proibiu a cultura de hortas e capinzais, a criação de suínos, a
venda ambulante de bilhetes de loteria. Mandou também que não se
cuspissem nas ruas e dentro dos veículos, que não se urinasse fora dos

251
Ibid.. p. 24.
252
CARVALHO, José Murilo de. op. cit., 2015. p. 94.
253
CARVALHO, José Murilo de. Os bestializados: o Rio de Janeiro e a República que não foi. 3. ed.
São Paulo: Companhia das Letras, 2015. p. 34.
254
SEVCENKO, Nicolau. Revolta da Vacina: Mentes insanas em corpos rebeldes. São Paulo:
Scipione, 1993. p. 52.
85

mictórios, que não se soltassem pipas. Muitas dessas posturas eram


simples reedições de medidas anteriores que, ao bom estilo brasileiro, não
tinham pegado. Não se sabe ao certo quantas das novas pegaram. Mas,
desta vez, a população já se dera conta de que pelo menos o esforço de
255
aplicação da lei seria muito maior.

A reforma urbana parisiense realizada pelo Barão Haussmann ecoou nos


trópicos. A reordenação do espaço urbano, de cunho higienista-científico, seria a
ponte entre o passado colonial e o futuro que os avanços tecnológicos da
modernidade anunciavam. Como lembra José Márcio Barros, “a utopia modernista,
ancorada no princípio do modelo único com validade internacional, acreditava poder
resolver os antagonismos da metrópole através da reordenação do espaço
habitado”.256
A vacinação contra a varíola, portanto, encaixava-se em um projeto mais
amplo de progresso, que passava pela modernização do porto, reestruturação de
casarões e alargamento de ruas. Para isso, foram realizadas desapropriações e
demolições para as quais não existiam instrumentos jurídicos efetivos257 nem
possibilidade de recurso à justiça comum para intervir nas ações do Município. Os
efeitos colaterais do projeto recaíam sobre a população carente de forma mais
onerosa: além de serem os mais prejudicados com a política de austeridade
econômica da presidência, os afetados pelas remoções eram os mesmos que
sentiam mais severamente os impactos da especulação imobiliária decorrente da
destruição das moradias na região central da cidade.
A vacinação contra varíola era o terceiro foco de ação do médico Oswaldo
Cruz. O procedimento era obrigatório desde 1837, com multa aos responsáveis caso
a criança não fosse vacinada até os 3 meses de idade. Entretanto, tratava-se de
mais uma lei dotada dos atributos de validade formal e material, mas sem eficácia.
Apesar de já existir a obrigação legal, o Governo decidiu pela criação de uma nova
lei, reiterando a obrigatoriedade. O texto de apenas dois artigos foi aprovado no
Congresso Nacional: o primeiro estabelecia a obrigatoriedade; o segundo colocava a
regulamentação nas mãos do governo sem condicionantes ou limites.258 O próprio

255
CARVALHO, José Murilo de. op. cit., 2015. p. 95.
256
BARROS, José Márcio. Cultura e comunicação nas Avenidas de Contorno em Belo Horizonte e La
Plata. Belo Horizonte: Editora PUC-Minas, 2005. p. 82.
257
SEVCENKO, Nicolau. Revolta da Vacina: Mentes insanas em corpos rebeldes. São Paulo:
Scipione, 1993. p. 46.
258
CARVALHO, José Murilo de. Os bestializados: o Rio de Janeiro e a República que não foi. 3. ed.
São Paulo: Companhia das Letras, 2015. p. 96.
86

Oswaldo Cruz se incumbira de elaborar tais regras e tinha como suporte o


conhecimento científico e o exemplo de países como Alemanha, Itália e França, que
haviam adotado medidas semelhantes.259
Aspectos morais também estavam imbricados no contexto e, como lembra
Nicolau Sevcenko, na obra de Machado de Assis os braços de Capitu foram
proibidos de aparecer nus em público pois maculavam a honra da família e a
reputação do marido.260 Logo, a vacinação seria uma ofensa ao chefe da casa, em
virtude da desonra de esposa e filha se desnudarem na frente de estranhos.
Tornando ainda mais delicada a atmosfera, surgiu o boato de que a vacina seria
inoculada nas nádegas, mesmo nas mulheres.261
A indiferença com a participação popular na escolha do conteúdo normativo
estava presente até em relação à elite intelectual. O erudito Rui Barbosa, conhecido
como Águia de Haia, declarava medo de introduzir no próprio sangue o vírus
condutor da moléstia.262 Assim, de uma afirmação científica, fez-se decisão política a
ser imposta pela lei mediante a força policial.
Wintgens demonstra que a separação entre direito e política resultou no
desinteresse da teoria do direito sobre o processo de criação das leis.263 A escolha
do conteúdo normativo era fruto da soberania e, assim, interessaria à política. Em
uma perspectiva distinta, a legisprudência, ou teoria da legislação, preocupa-se com
o conteúdo da norma.264 Nos quadros da legisprudência, o contraditório tem papel
crucial na definição do ato normativo, porque a ausência do processo dialógico na
construção da lei fragiliza sua informação, conhecimento e compreensibilidade pela
sociedade. Sobre essa questão, Fabiana Soares afirma:

[...] o contraditório torna-se vital e, por imperativo lógico, deve ser


repensado no contexto de formação da lei, com a mesma importância e
vivacidade com o qual é identificado nos processos judiciais ou mesmo nos

259
SEVCENKO, op. cit., p. 14.
260
Ibid.. p. 15.
261
RIO DE JANEIRO (CIDADE). Secretaria Especial de Comunicação Social. Caderno Memórias:
1904 – Revolta da Vacina. A Maior Batalha do Rio. Rio de Janeiro: Prefeitura da Cidade do Rio de
Janeiro, 2006. p. 20.
262
SEVCENKO, Nicolau. Revolta da Vacina: Mentes insanas em corpos rebeldes. São Paulo:
Scipione, 1993. p. 15.
263
WINTGENS, Luc J. Legisprudence as a new theory of legislation. Ratio Juris, v. 19, n. 1. p. 1-25,
March 2006. p. 1.
264
WINTGENS, Luc J. The rational legislator revisited. Bounded rationality and legisprudence. In:
WINTGENS, Luc J; OLIVER-LALANA, A Daniel. (Ed.) The rationality and justification of legislation:
Essays on legisprudence. Cham: Springer, 2013. p. 1-32.
87

procedimentos administrativos (disciplinares ou não): é neste ponto que a


265
participação popular emerge como privilegiada situação dialógica.

Não se tentou integrar o senso comum e o senso técnico na norma, pois


acreditava-se que o conhecimento científico, por si só, legitimava a iniciativa
legislativa e o rigor em sua aplicação. O conhecimento científico, de fato, pode ser
tido como importante para a qualidade da lei, mas sozinho é um critério insuficiente.
A cultura e o contexto social não podem ser desprezados na criação da
normatividade pelo Estado.266
A postura dos agentes públicos foi acompanhada da resistência popular às
medidas compulsórias de profilaxia e manifestou-se em expressões artísticas como
charges dos jornais e marchinhas populares. Luciana Nascimento e Francisco Silva
lembram que a contestação veio também por meio da “desconstrução do discurso
médico pela galhofa”267. Os autores utilizam a canção Vacina Obrigatória, de 1904,
para analisar a conjuntura na qual, entre outros aspectos, destaca-se a obstinada
resistência popular à ação da autoridade municipal:

Anda o povo acelerado com horror a palmatória / Por causa dessa


lambança da vacina obrigatória / Os manatas da sabença estão teimando
desta vez / Em meter o ferro a pulso bem no braço do freguês / E os
doutores da higiene vão deitando logo a mão / Sem saber se o sujeito quer
levar o ferro ou não / Seja moço ou seja velho, ou mulatinha que tem visgo /
Homem sério, tudo, tudo leva ferro, que é servido. / Bem no braço do Zé
povo, chega um tipo e logo vai / Enfiando aquele troço, a lanceta e tudo o
mais / Mas a lei manda que o povo e o coitado do freguês / Vá gemendo na
vacina ou então vá pro xadrez.
[...]
Eu não nesse arrastão sem fazer o meu barulho / Os doutores da ciência
terão mesmo que ir no embrulho / Não embarco na canoa que a vacina me
268
persegue / Vão meter ferro no boi ou nos diabos que os carregue.

A resistência à vacina não estava apenas na fuga, mas também no


enfrentamento, se necessário fosse. O direito ordena e promove mudanças na
sociedade ao mesmo tempo em que sofre influxos dela, mas, nessa dinâmica, “não

265
SOARES, Fabiana de Menezes. Teoria da legislação: Formação e conhecimento da lei na idade
tecnológica. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 2004. p. 27.
266
CHANG, Cheoljoon. Legisprudence in the Korean context: a practical approach focusing on the
confuncian effects on rationality. In: WINTGENS, Luc J; OLIVER-LALANA, A Daniel. (Ed.) The
rationality and justification of legislation: Essays on legisprudence. Cham: Springer, 2013. p. 65.
267
NASCIMENTO, Luciana Marino do; SILVA, Francisco Bento da. De protestos e levantes: As
revoltas da vacina e da chibata na música popular. Recorte, Revista Eletrônica do Programa do
Mestrado em Letras: Linguagem, Discurso e Cultura/UNINCOR, Três Corações, v. 9, n. 2, 2012. p.
3.
268
SCHUELER, Paulo. Revolta sonora: Oswaldo Cruz, as vacinas e a ironia dos carnavais. Fundação
Oswaldo Cruz (FIOCRUZ), Caderno Notícias, 4 fev. 2015. Disponível em: <https://portal.fiocruz.br>.
Acesso em: 26 abr. 2016.
88

se sustenta o uso exclusivo da força como instrumento de adesão às normas”.269 E,


naquele contexto histórico, José Murilo de Carvalho destaca que: “mesmo que a
autoridade o desejasse, seria impossível a aplicação estrita da lei”.270 Assim, parecia
se revelar um cenário no qual o uso da força física contra os moradores da cidade
seria a única forma de garantir a eficácia da legislação. Considerando o nível de
analfabetismo da época, as charges desempenhavam um papel relevante nos
processos de comunicação, e sugeriam que somente a força da polícia sustentaria a
força da lei:

Figura 11 - Resistência Popular à Vacinação Obrigatória nas Charges dos Jornais

271
Fonte: J. Carlos.

269
SOARES, Fabiana de Menezes. Teoria da legislação: Formação e conhecimento da lei na idade
tecnológica. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 2004. p. 37.
270
CARVALHO, José Murilo de. Os bestializados: o Rio de Janeiro e a República que não foi. 3. ed.
São Paulo: Companhia das Letras, 2015. p. 159.
271
RIO DE JANEIRO (CIDADE). Secretaria Especial de Comunicação Social. Caderno Memórias:
1904 – Revolta da Vacina. A Maior Batalha do Rio. Rio de Janeiro: Prefeitura da Cidade do Rio de
Janeiro, 2006. p. 16
89

Mas nada disso importava. Segundo Nicolau Sevcenko, havia uma


insensibilidade política que pretendia uma campanha objetiva, célere e eficaz, sem
se preocupar com o contexto social de aplicação da lei.272 Era a tradução do lema
republicano de controle, cientificismo, ordenação e progresso para o campo social.
Assim, a causa imediata do protesto foi a vacinação, mas um ambiente muito mais
complexo engendrou a Revolta da Vacina.
A lei havia sido aprovada em 31 de outubro e estava pendente de
regulamentação. Um furo, como se diz no meio jornalístico, trouxe com
exclusividade, no jornal A Notícia de 9 de novembro de 1904, a minuta do ato
regulamentador de Oswaldo Cruz.273 A surpresa com que a notícia pegou a
população é sintomática da inexistência de canais de diálogo para a população na
produção normativa e dos pressupostos que norteavam os trabalhos de confecção
do ato legiferante, postura contrária ao que se denomina atualmente como princípio
da publicidade e da soberania do povo na escolha do conteúdo normativo.274
Ademais, evitar a todo custo os desacordos e divergência na elaboração
legisprudencial é o antípoda do que se preceitua como boa técnica legística, que
defende o processo de construção da lei como o caminho para permitir a
coexistência de desacordos dentro da sociedade.275
A minuta do ato normativo que vazou na imprensa tentava uma
regulamentação plena da sociedade, pois exigia a vacinação periódica e a
revacinação caso a pessoa não conseguisse comprovar formalmente que havia sido
vacinada; determinava o comparecimento obrigatório ou condução forçada para a
análise dos efeitos da imunização dias após o procedimento; previa punição para
quem tentasse tornar a inoculação não proveitosa; constava ainda a proibição de:
realizar contrato de trabalho, fazer concurso, ser nomeado, tornar-se eleitor, alugar
aposentos, embarcar, desembarcar, viajar ou se matricular em diversos
estabelecimentos, caso a determinação fosse desrespeitada. Até o amor seria
proibido:

272
SEVCENKO, Nicolau. Revolta da Vacina: Mentes insanas em corpos rebeldes. São Paulo:
Scipione, 1993. p. 17.
273
RIO DE JANEIRO (CIDADE). op. cit., p. 52.
274
SOARES, Fabiana de Menezes. Teoria da legislação: Formação e conhecimento da lei na idade
tecnológica. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 2004.
275
SHIM, Woomin. Disagreement and proceduralism in the perspective of legisprudence. In:
WINTGENS, Luc J; OLIVER-LALANA, A Daniel. (Ed.) The rationality and justification of legislation:
Essays on legisprudence. Cham: Springer, 2013. p. 131.
90

Art. 28 – Ninguém poderá contrair casamento sem apresentar os atestados


o o
que provem o cumprimento disposto nos arts. 1 e 2 .
§ Único: Os Escrivães das Pretorias serão passíveis de multa de 50$ por
276
infração do presente artigo.

Para conseguir eficácia, a regulamentação determinava que escolas,


colégios, orfanatos, asilos, construções e indústrias possuíssem livros com
assinaturas dos visitantes, constando a data da vacinação ou revacinação e o
número do registro dos atestados de vacinação. Tudo isso com sanções para a
pessoa, o responsável, os empregadores, os comandantes, os diretores ou para os
que negligenciassem a regra, com multas que dobravam de valor em casos de
reincidência. A regulamentação descrevia do tipo de vacina que seria utilizada ao
cometimento de crime para o médico que atestasse falsamente a vacinação,
deixando os casos omissos para o diretor-geral da Saúde Pública, o próprio
Oswaldo Cruz, que poderia adotar as providências que julgasse necessárias no
interesse da saúde pública.
Assim, pode-se afirmar que a regulamentação tinha o escopo de fortalecer as
prerrogativas dos encarregados do procedimento e colocaria toda a cidade à mercê
dos funcionários e policiais a serviço da Saúde Pública.277 Por meio de uma tentativa
de regulamentação plena, a prática costumeira da cidade de desenvolver táticas de
desordem para fazer frente à ordem estatal parecia poder ser, no caso da vacinação
compulsória da varíola, subjugada pela determinação da autoridade sanitária.278
No dia seguinte à notícia do jornal, 10 de novembro, ajuntamentos de
pessoas e agitações populares começavam a tomar corpo no centro da cidade. A
oposição monarquista, a divergência republicana e as lideranças sindicais
aproveitaram-se do momento para seus intentos e fomentaram a população a
rebelar-se, mas perderam o controle da situação.279 Segundo Sevcenko:

276
RIO DE JANEIRO (CIDADE). Secretaria Especial de Comunicação Social. Caderno Memórias:
1904 – Revolta da Vacina. A Maior Batalha do Rio. Rio de Janeiro: Prefeitura da Cidade do Rio de
Janeiro, 2006. p. 101.
277
SEVCENKO, Nicolau. Revolta da Vacina: Mentes insanas em corpos rebeldes. São Paulo:
Scipione, 1993. p. 52-53.
278
CARVALHO, José Murilo de. Os bestializados: o Rio de Janeiro e a República que não foi. 3. ed.
São Paulo: Companhia das Letras, 2015. p. 159.
279
SEVCENKO, op. cit., p. 10 e 28.
91

A polícia, informada e com determinações expressas de proibir e dispersar


quaisquer reuniões públicas, tratou de prender os oradores improvisados,
280
sofrendo então a resistência da população, que a atacava a pedradas.

O gatilho para os dias de caos e desordem foi a tentativa de prisão pela


polícia de um estudante que realizava uma meeting – como se dizia nos jornais e
jurisprudência da época o que hoje conhecemos como direito de reunião – no largo
São Francisco. A atuação da polícia foi seguida de reação dos estudantes e se
desdobrou, com o passar dos dias, em ataques a quartéis e delegacias de polícia,
com postes vergados, árvores arrancadas, arrebatamento de presos, bondes
incendiados, barricadas para o enfrentamento contra as forças do Estado, casas de
armas saqueadas, paralelepípedos arrancados e utilizados nas depredações; “[...]
colunas dos lampiões de gás foram quebradas e enormes chamas lambiam os ares
[...]”.281 Os necrotérios ficaram cheios e os carros de funerárias só conseguiam se
deslocar escoltados pela cavalaria. Quanto mais se tentava impor a lei e a ordem,
mais violento ficava o cenário.
Pela Constituição, havia legalidade na atuação policial para intervir no direito
de reunião para manter a ordem pública.282 Todavia, ao realizar prisões, a polícia era
hostilizada pela população, e “começam a cair os feridos, o sangue mancha os
calçamentos das ruas, o tumulto se generaliza. Tiros e pedradas, partidos da
população acossada, chovem sobre a brigada de policiais”.283
As agências policiais cariocas não conseguiam levar a cabo a lei. Guarda
Nacional, Marinha, Unidades do Exército do interior do Rio de Janeiro, de São Paulo
e até da mineira São João del-Rei foram convocadas para apoiar. No esforço para
conter a agitação popular, segundo Nicolau Sevcenko, embarcações de guerra da
marinha foram utilizadas para bombardear regiões costeiras.284
Curiosamente, os manifestantes bradavam “Morte à Polícia!” que tentava
aplicar a lei, ao mesmo tempo que vociferavam “Vida longa à República”, razão
inicial de todo o problema. No mesmo sentido, os registros históricos indicam poucos

280
Ibid.. p. 18.
281
CARVALHO, José Murilo de. op. cit., 2015, p. 104.
282 o
Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil, de 24 de fevereiro de 1891, Art. 72, § 8 ,
“A todos é lícito associarem-se e se reunirem livremente e sem armas; não podendo intervir a
polícia senão para manter a ordem pública”. (BRASIL. Constituição (1891). Constituição da
República dos Estados Unidos do Brasil, de 24 de fevereiro de 1891. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao91.htm>. Acesso em: 20 set. 2015)
283
SEVCENKO, Nicolau. Revolta da Vacina: Mentes insanas em corpos rebeldes. São Paulo:
Scipione, 1993. p. 19.
284
Ibid.. p. 21.
92

casos de hostilidade ao Departamento de Saúde Pública. Apenas dois episódios


foram identificados e em ambos não é muito claro se foram dirigidos contra os
agentes de saúde ou se simplesmente estavam no lugar errado, na hora errada. Em
um deles, o agente estava em meio a um confronto entre a polícia e os
manifestantes e no outro um veículo do departamento de saúde pública foi virado
juntamente com vários outros carros.285 Assim, vê-se que as pessoas hostilizavam a
polícia que tentava aplicar a lei e enquanto deixavam no esquecimento as
autoridades responsáveis pela situação.
Somente após revogado o ato normativo findaram-se os protestos, tão
naturalmente quanto surgiram.286 Dados da época indicam 945 presos e 23
mortos;287 contudo, autores afirmam que seria impossível calcular tais números por
causa das mortes que aconteceram em razão de deportações e degredos.288 Pelo
menos 461 pessoas289 tiveram o que para Luciana Nascimento teria sido o
desdobramento mais cruel, seja pela distância, seja pelas condições financeiras dos
punidos, pois determinava uma viagem sem volta para a floresta amazônica e outras
regiões distantes.290 Nesse período, a disputa entre Brasil e Bolívia pelo território do
Acre, valorizado pela exploração da borracha, havia se encerrado com o
reconhecimento da soberania brasileira pela via negocial no Tratado de
Petrópolis.291 Assim, a República que recebera “Vivas!” durante a revolta precisava
limpar a capital do país e povoar a extremidade ocidental do nação, tarefas
realizadas com o degredo de muitos dos manifestantes.
A ausência de um efetivo princípio representativo no processo de criação da
lei e o uso da força na sua aplicação para tentar manter a ordem não foram sem
preço. O desprezo à participação popular devidamente informada na confecção do
arcabouço normativo foi repetido na inobservância do contexto social de aplicação
da lei pela Administração que deveria fazer a lei virar realidade na vida das pessoas.

285
MEADE, Teresa. Civilizing Rio: Reform and resistance in a Brazilian City 1889-1930. University
Park/PA: The Pennsylvania State University Press, 1999. p. 104.
286
SEVCENKO, op. cit., p. 21.
287
CARVALHO, José Murilo de. Os bestializados: o Rio de Janeiro e a República que não foi. 3. ed.
São Paulo: Companhia das Letras, 2015. p. 117-118.
288
SEVCENKO, op. cit., p. 70.
289
CARVALHO, op. cit., 2015, p. 117.
290
NASCIMENTO, Luciana Marino do. Avessos da Belle Époque: Os revoltosos da vacina deportados
para a Amazônia. Recorte, Revista Eletrônica do Programa do Mestrado em Letras: Linguagem,
Discurso e Cultura / UNINCOR, Três Corações, v. 10, n. 2, 2013. p. 6.
291
FAUSTO, Boris. História do Brasil. 2. ed. São Paulo: Editora da USP, 1995. p. 248.
93

Quando se centrou exclusivamente no aspecto formal do direito, o rigor


científico foi rejeitado pela população com o mesmo vigor com que tentava ser
implementado. Entretanto, foi com a coerção policial para implementar as ações
excludentes e autoritárias dos governos federal e municipal que os dias de caos se
iniciaram.
Na tentativa frustrada das forças de segurança de impor a lei e a ordem do
Estado, a polícia personificou o inimigo que precisava ser combatido pelos
manifestantes, que chegaram a esquecer a causa de toda indignação. Assim, a
história utilizada como espaço de reflexão pulsa questões que até hoje desafiam a
compreensão de como o Direito funciona na tradução da dogmática normativa para
sua repercussão concreta na vida das pessoas no cenário dos protestos populares.

4.2 Legisprudência no presente e junho de 2013: o que a lei e a polícia


conseguem controlar?292

Grandes protestos marcaram o mundo entre os anos 2010 e 2013. Alguns


dizem que são um movimento único293 outros afirmam não existir paralelos entre
eles.294 Evitando a discussão ontológica se seriam ou não faces do mesmo ato
global, cotejá-los indica uma série de características comuns que suscitaram um
padrão emergente no qual noções como horizontalidade, autonomia, comunicação e
espontaneidade são palavras-chave para sua compreensão.295 No Brasil, a faísca se
deu em junho de 2013, em um protesto organizado pelo Movimento Passe Livre
(MPL) em virtude do aumento das passagens de ônibus em São Paulo.
Manifestações contra aumento do transporte público urbano no Brasil
possuem uma longa história.296 Em 28 de dezembro de 1879, aproximadamente

292
Versão preliminar desse tópico foi publicada anteriormente em uma obra coletiva de professores e
alunos do Programa de Pós-graduação em Direito da UFMG (PPGD/UFMG).
293
ZIZEK, Slavoj. O violento silêncio de um novo começo. In: HARVEY, David et al. Occupy:
movimentos de protesto que tomaram as ruas. São Paulo: Boitempo, Carta Maior, 2012. p. 15-30.
ZIZEK, Slavoj. Problemas no paraíso. In: HARVEY, David et al. Cidades rebeldes: Passe livre e as
manifestações que tomaram as ruas do Brasil. São Paulo: Boitempo, Carta Maior, 2013. p. 101-109.
294
RESENDE, André Lara. O mal-estar contemporâneo. Valor Econômico, Cultura, 5 jul. 2013.
Disponível em: <http://www.valor.com.br>. Acesso em: 12 abr. 2015. MACEDO, Roberto. Uma visão
econômica e política dos protestos juninos. In: FIGUEIREDO, Rubens (Org.). Junho de 2013: A
sociedade enfrenta o Estado. São Paulo: Summus, 2014. p. 39-60.
295
CASTELLS, Manuel. Redes de indignação e esperança: movimentos sociais na era da internet.
Rio de Janeiro: Zahar, 2013.
296
Cf., entre outros, MATTOS, Marcelo Badaró. Greves e repressão policial aos sindicatos no
processo de formação da classe trabalhadora carioca (1850-1910). In: MATTOS, Marcelo Badaró
(Coord.). Trabalhadores em greve, polícia em guarda: greves e repressão policial na formação da
classe trabalhadora carioca. Rio de Janeiro: Bom Texto/FAPERJ, 2004. p. 39-40; CARVALHO, José
94

5.000 pessoas fizeram caminhada com destino à residência do Imperador para


protestarem contra um tributo que majorava o preço das passagens dos bondes. O
ato foi interrompido pela polícia, entretanto, quatro dias depois, quando a lei entraria
em vigor, protestos nas ruas do centro do Rio de Janeiro levaram ao uso da força
pela polícia, culminando no que ficou chamado de Revolta do Vintém. Naquela
época, os desdobramentos foram bondes arrancados dos trilhos, mortes, feridos e a
revogação do imposto pelo parlamento algum tempo depois. Se a causa foi
semelhante à de 2013, os efeitos imediatos parecem não ser distintos.
Integrantes do MPL indicam que os protestos em São Paulo se inserem em
uma tradição que perpassa a Revoltada do Buzu em Salvador, em 2003, e pela
Revolta da Catraca em Florianópolis, em 2004, anteriores, portanto, à oficialização
do movimento em 2005, em Porto Alegre. Assim, na expressão do próprio
Movimento, as movimentações não começavam em Salvador, nem terminariam em
São Paulo.297 Entretanto, o ato paulistano foi capaz de acender uma onda de
manifestações pelo país não vista desde os cara-pintadas do Fora Collor em 1992, e
que o histórico do movimento não poderia sugerir.
Pesquisa do Latin American Public Opinion Project/Americas Barometer em
2012 indicava o Brasil como um dos países de menor participação em protesto das
Américas, ficando na 20a colocação entre 26 países pesquisados.298 Corroborando
estes dados, levantamento de opinião do IBOPE e da Confederação Nacional das
Indústrias às vésperas dos protestos demonstravam alto índice de aprovação do
governo e uma aceitação pessoal da presidenta contabilizada em 79%, índice ainda
maior que o dos antecessores Lula e Fernando Henrique Cardoso.299 Portanto,
pouco razoável supor que algum especialista relativamente bem informado projetaria

Murilo de. Os bestializados: o Rio de Janeiro e a República que não foi. 3. ed. São Paulo:
Companhia das Letras, 2015. p. 70 e 134.
297
MOVIMENTO PASSE LIVRE. Não Começou em Salvador, não vai terminar em São Paulo.
HARVEY, David et al. Cidades rebeldes: passe livre e as manifestações que tomaram as ruas do
Brasil. São Paulo: Boitempo, 2013. (Coleção Tinta Vermelha) p. 13-18.
298
SELIGSON, Mitchell A.; SMITH, Amy Erica; ZECHMEISTER, Elizabeth. The political culture of
democracy in the Americas, 2012: Towards equality of opportunity. [S.l.]: Latin American Public
Opinion Project / Americas Barometer / Vanderbilt University, 2012.
299
CAMPANERUT, Camila. Dilma é aprovada por 79% e supera Lula e FHC, diz CNI/IBOPE. UOL,
Caderno Política, 19 mar. 2013. Disponível em: <http://noticias.uol.com.br>. Acesso em: 22 abr.
2016.
95

a insatisfação generalizada meses depois, que chegou a colocar nas ruas, em um


único dia, mais de um milhão de pessoas em 75 cidades.300
Se os dados não permitiam antever o que estava por vir, a tentativa pela
polícia de conter e impor certo padrão de conduta, semelhante à Revolta da Vacina
de 1904, parece ter sido a centelha para a dimensão que o protesto alcançou.
Lincoln Secco apresenta dados interessantes: os dois primeiros atos do MPL
arregimentaram a tradicional capacidade do movimento, por volta de 3 mil pessoas.
Segundo o autor, “o quarto ato [13 de junho] ainda foi pequeno, mas a repressão
policial desencadeou uma onda de solidariedade ao MPL, o que levou ao ato
seguinte cerca de 250 mil pessoas”.301
O pensamento de que a notoriedade e a nacionalização dos protestos de
2013 decorreram da reação policial é compartilhado por diversos autores.302 Ao
estudar a onda de grandes protestos pelo mundo entre os anos de 2010-2013,
Manuel Castells afirma que, “de fato, em todos os casos, as imagens da violência
policial ampliaram a simpatia dos cidadãos pelo movimento, assim como o
reativaram”.303
Se por um lado a ação da polícia é capaz de acender a fagulha, por outro, é
preciso perceber que a vontade de reprimir os atos podia ser percebida em diversos
âmbitos. Reduzir a intenção de conter os protestos apenas à polícia pode esconder
outras questões. Tiago Marin e Gustavo Massola demonstram que, às vésperas da
ação policial que desencadeou todo esse efeito, havia um clamor midiático pela
“Retomada da Paulista” e de que “Chegou a hora do Basta” face aos protestos que
estavam parando a capital.304 Morgenstern lembra que as queixas da imprensa
decorreram dos reflexos do trânsito interrompido em vias e horários importantes na

300
IZIQUE, Cláudia. Não foi só pelos 20 centavos. FIGUEIREDO, Rubens (Org.). Junho de 2013: A
sociedade enfrenta o Estado. São Paulo: Summus, 2014. p. 19.
301
SECCO, Lincoln. As jornadas de junho. In: HARVEY, David et al. Cidades rebeldes: Passe livre e
as manifestações que tomaram as ruas do Brasil. São Paulo: Boitempo, 2013. p. 73.
302
Cf. entre outros, AVRITZER, Leonardo. Os impasses da democracia no Brasil. Rio de Janeiro:
Civilização Brasileira, 2016. p. 71; TATAGIBA, Luciana. 1984, 1992 e 2013. Sobre ciclos de
protestos e democracia no Brasil. Política e Sociedade, Florianópolis, v. 13, n. 28, set./dez. 2014. p.
36, RIBEIRO, Renato Janine. O Brasil e a democracia de protesto. Matrizes, São Paulo, v. 8, n. 1. p.
93-117, jan./jun. 2014. p. 96; MARIN, Tiago Rodrigo; MASSOLA, Gustavo Martineli. As
manifestações de junho de 2013 em São Paulo e a alteridade urbana: contribuições para a
psicologia social. Mnemosine, Rio de Janeiro, v. 10, n. 2. p. 30-55, 2014. p. 32; MORGENSTERN,
Flávio. Por trás da máscara: Do passe livre aos black blocs, as manifestações que tomaram as ruas
do Brasil. 2. ed. Rio de Janeiro: Record, 2015.
303
CASTELLS, Manuel. Redes de indignação e esperança: movimentos sociais na era da internet.
Rio de Janeiro: Zahar, 2013. p. 168.
304
MARIN; MASSOLA. op. cit., p. 38-39.
96

dinâmica do trânsito de São Paulo e por causa da intensa violência dos


manifestantes do MPL nos primeiros protestos de junho.305 A capa do jornal Folha
de São Paulo de 12 de junho de 2013, anterior à intervenção policial que teria
colocado a população contra o Estado, ilustra esses dois aspectos:

Figura 12 - Capa do Jornal Folha de São Paulo de 12 de junho de 2013.

306
Fonte: Folha de São Paulo.

305
MORGENSTERN. op. cit., p. 21.
306
JORNAL Folha de São Paulo. Edição de 12 de junho de 2013. Disponível em:
<http://acervo.folha.uol.com.br/fsp/2013/06/12/2/>. Acesso em: 24 jun. 2016.
97

Não era apenas a imprensa que estava contra os protestos. A cronologia dos
fatos elaborada por Cláudia Izique evidencia como as manifestações foram
enfrentadas por autoridades públicas de âmbito municipal, estadual e federal, à
esquerda e à direita, com certa insensibilidade política e com discurso de que não
iriam transigir ante os protestos.307
Ao mesmo tempo que havia, inicialmente, a demanda pela intervenção
policial, uma pesquisa da Datafolha expõe que o crescimento da percepção de que a
polícia era mais violenta do que deveria foi acompanhado pelo aumento do número
de pessoas que apoiavam a luta contra o aumento da passagem,308 ainda que a
intervenção policial tenha ocorrido no mesmo sentido das falas dos governantes, da
mídia e até mesmo de parcela da população. O aspecto da força ou violência na
intervenção da polícia nos protestos serão analisados no Capítulo 6, bastando, por
agora, perceber que uma das poucas afirmações que se pode fazer sobre o tema é
que a intervenção policial ou a forma como ela ocorreu foram capazes de aumentar
o apoio popular aos protestos.
Entretanto, percebeu-se também que a crítica à ação da polícia foi
acompanhada da contraditória crítica a sua omissão. “A polícia já estava sabendo e
nada fez para proteger as lojas que estavam no caminho dos manifestantes”,309
afirmou o gerente de uma das concessionárias da Av. Antônio Carlos que tiveram 16
milhões de prejuízos durante um único protesto, em uma única rua em Belo
Horizonte. A diferença na percepção sobre o que acontecia refletiu até no nome
dados aos protestos: o que para uns era “Jornadas de Junho”, outros viram como
“Junho Negro”. O patrimônio público também foi afetado, os prejuízos ao Paço
Imperial no Rio de Janeiro e a outros prédios públicos ou de valor histórico são
provas nesse sentido.
Outras incoerências marcaram os protestos que lutavam por transporte
público gratuito e de qualidade, mas deixavam estações de metrô, coletivos e pontos
de ônibus totalmente destruídos. E, se a intervenção policial foi capaz de difundir em
âmbito nacional os protestos, a ausência da polícia parece ter contribuído para a
307
IZIQUE, Cláudia. Não foi só pelos 20 centavos. FIGUEIREDO, Rubens (Org.). Junho de 2013: A
sociedade enfrenta o Estado. São Paulo: Summus, 2014. passim.
308
PROTESTOS sobre aumento na tarifa dos Transportes II, PO813688. DataFolha, , 18 jun. 2013.
Disponível em: <http://media.folha.uol.com.br/datafolha/2013/06/19/protestos-aumento-tarifa-ii.pdf>.
Acesso em: 3 nov. 2015. p. 27 e 29.
309
OLIVEIRA, Marcello. Concessionárias de veículos têm prejuízos de R$ 16 milhões após ações de
vandalismo em manifestação. Vrum Website, 28 jun. 2013. Disponível em:
<http://estadodeminas.vrum.com.br>. Acesso em: 24 jun. 2016.
98

propagação de cenas de destruição, como se verá adiante. Assim, as manifestações


de 2013 dão sinais de que é preciso encontrar, entre esses extremos – imposição
estatal e total omissão –, a forma com a qual a polícia precisa lidar com os protestos.
Embora a questão do transporte público tenha se caracterizado como pauta
principal,310 querer dar uma unidade coerente aos protestos de 2013 poderia resultar
em frustação face à pluralidade de agendas trazidas pelos manifestantes, a
quantidade de pessoas com valores distintos e as diversas fases dos protestos ao
longo do ano. As manifestações abrigaram contradições internas como a presença
de anarquistas e fascistas, de “micareteiros” a engajados, de forças progressistas a
tendências conservadoras. Ao mesmo tempo que pessoas gritavam “sem violência!”,
outros defendiam e empregavam a violência física como meio de protesto. Ilse
Scherer-Warren exemplifica:

[...] de um lado jovens do MPL defendendo políticas de sentido


emancipatório e lutando por mudanças sistêmicas e político-culturais; de
outro, alguns grupos de jovens médicos se opondo a uma política pública
(Mais Médico) a favor de populações carentes, para defender o status quo e
311
interesses corporativistas da classe [...].

Se em grandes protestos como as Diretas Já da década de 1980 ou as lutas


sindicais dos anos 1970 existiam objetivos e lideranças facilmente distinguíveis, à
medida que os atos de junho de 2013 aumentavam tais elementos se perdiam em
uma nebulosa de possibilidades. Com a babel que se formou, o próprio MPL
anunciou que não convocaria novas manifestações.312
O cenário desconhecido, a proporção adquirida e a expansão instantânea
colocaram polícia, mídia, governantes e população sem entender muito bem o que
acontecia. Nesse embaraço, após alguns dias de confusões e severas críticas à PM
paulista, relatos de pesquisadores que acompanhavam em campo os protestos
mostram que houve tentativa de empregar apenas a Guarda Civil Metropolitana e
uma espécie de autocontrole pelos próprios manifestantes. O resultado foram
saques a lojas, vandalismo e o enfraquecimento do apoio aos protestos:

310
OLIVEIRA, Adriano; COSTA, Simara; NETO, Luma. As manifestações de junho de 2013 à luz da
opinião pública: causas, significados e mudanças de opinião. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE
PESQUISA, 6., 2014. Disponível em:
<http://www.cenariointeligencia.com.br/files/abep14012013.pdf>. Acesso em: 16 abr. 2016.
311
SCHERER-WARREN, Ilse. Manifestações de rua no Brasil 2013: Encontros e desencontros na
política. Caderno CRH, Salvador, v. 27, n. 71. p. 417-429, maio/ago. 2014. p. 419.
312
IZIQUE, Cláudia. Não foi só pelos 20 centavos. FIGUEIREDO, Rubens (Org.). Junho de 2013: A
sociedade enfrenta o Estado. São Paulo: Summus, 2014. p. 19.
99

[...] diante da Prefeitura Municipal, não raro, quando alguém era visto
pichando os arredores da região, barulhos de explosões eram ouvidos sem
que nenhum policial estivesse agindo. Também neste cenário, alguns
poucos presentes na manifestação em frente à Prefeitura atacaram-na com
o intuito de destruição, enquanto lojas do centro da cidade eram saqueadas.
[...] Neste dia o vandalismo mostrou-se como um arbitrário midiático:
fenômenos distintos e complexos eram agrupados em um único corpo de
discurso e depredações, saques a lojas e resistências em combate eram
313
compreendidos como sendo a mesma coisa.

Nesse recuo da polícia, a adoção da violência como estratégia de alguns


grupos parece ter retirado a legitimidade e o apoio social do movimento como um
todo, por meio de um processo no qual os meios de comunicação tiveram
participação fundamental. A ambiguidade dos protestos também refletiu na mídia: foi
observadora, participante e motivo de protestos;314 contribuiu para divulgar e para
criminalizar os protestos.315 Inicialmente, pedia a repressão aos movimentos, mas
logo houve uma inflexão, mudando de lado,316 para depois dar sinais de que não
sabia como lidar com o que se passava.317 A partir de certo momento os
manifestantes começaram a ficaram isolados318 e pesquisas mostram que o apoio
da opinião pública aos protestos começou a cair consideravelmente e, em outubro,
54% dos entrevistados acreditavam que as manifestações traziam mais prejuízos do
que benefícios para os moradores de São Paulo.319
Essas observações não podem servir para uma demonização da mídia. Os
meios de comunicação sofrem influências políticas, de anunciantes e da lógica de
mercado, na tentativa de vender seu produto: a notícia. Se vendem é porque há
alguém que compra, ainda que com algum condicionamento. Assim, é preciso
destacar também que há certa escolha do expectador-leitor sobre qual informação
procura e o que deixa de lado. Beatriz Becker e Mônica Machado, em pesquisa
sobre como a TV e a audiência construíram os protestos de junho de 2013,

313
MARIN, Tiago Rodrigo; MASSOLA, Gustavo Martineli. As manifestações de junho de 2013 em São
Paulo e a alteridade urbana: contribuições para a psicologia social. Mnemosine, Rio de Janeiro, v.
10, n. 2. p. 30-55, 2014. p. 45.
314
BECKER, Beatriz; MACHADO, Mônica. Brasil entre as telas e as ruas: produção e consumo das
narrativas jornalísticas audiovisuais sobre os protestos nacionais de junho de 2013. Discursos
Fotográficos, Londrina, v. 10, n. 17. p. 39-60, jul./dez. 2014. p. 48.
315
GOHN, Maria da Glória. A sociedade brasileira em movimento: vozes das ruas e seus ecos
políticos e sociais. Caderno CRH, Salvador, v. 27, n. 71. p. 431-441, maio/ago. 2014. p. 439.
316
Ibid.. p. 44.
317
SCHERER-WARREN, Ilse. Manifestações de rua no Brasil 2013: Encontros e desencontros na
política. Caderno CRH, Salvador, v. 27, n. 71. p. 417-429, maio/ago. 2014. p. 420
318
GOHN, op. cit., p. 434.
319
DATAFOLHA. Termômetro Paulistano – Manifestações. PO813712, de 25 de outubro de 2013.
Disponível em:<http://media.folha.uol.com.br/datafolha/2013/10/28/manifestacoes-2013-10-27.pdf>.
Acesso em: 24 jun. 2016. p. 10.
100

expuseram a estratégia discursiva da dicotomia entre manifestantes pacíficos e


baderneiros violentos presente nas enunciações dos telejornais.320 Como lembra
Denis McQuail, “a mídia, em grande medida, serve para constituir nossas
percepções e definições da realidade social”.321
Na completa ausência de alternativas de como lidar com o que se via nas
ruas, o binômio pacíficos-violentos permitiu canalizar todo e qualquer debate que
poderia ter sido feito. Atribuiu-se uma unidade a todos manifestações, todas as
pautas, em todas as cidades e aos distintos momentos que aconteceram após junho
de 2013 pelo país, o que denota forma simplista de lidar com o que ocorreu. Kleber
Mendonça e Flora Daemon apontam a regularidade na grande mídia em prol de um
recorte midiático com ênfase na tônica dos relatos que, pautada pelo senso comum
da violência crescente, acabou por reduzir a pluralidade de leituras e legitimar
gestos repressores.322
A queda do apoio às manifestações parece ter ocorrido, portanto, em
processo de construção de uma leitura unívoca por meio da eleição de um inimigo
comum. Identificou-se um elemento que se fez notar em grande parte dos protestos
no exterior e que também se repetiu no Brasil. Assim, ainda sem se compreender o
que acontecia, qual deveria ser o papel do Estado, da polícia e das leis, ou mesmo
sem notar a diferença entre manifestações e violência, o fenômeno complexo foi
sintetizado no discurso comum da violência dos rostos tampados. Sem alternativas
para lidar com a violência nos protestos e ante a necessidade de solução rápida que
atendesse às expectativas populares majoritárias, como um náufrago à procura de
qualquer objeto que não seja ele mesmo para colocar todas as esperanças, foram
eleitas as máscaras.
Na Revolta da Vacina, não se levou em conta a opinião das pessoas na
escolha do conteúdo normativo e o Estado tentou mudar a realidade social pela lei
sustentada na força da polícia. Nas Manifestações de 2013, seguindo
incondicionalmente o clamor público pela repressão aos protestos, novamente fiou-
se na lei como elemento suficiente para resolver o problema da violência nas ruas e
320
BECKER, Beatriz; MACHADO, Mônica. Brasil entre as telas e as ruas: produção e consumo das
narrativas jornalísticas audiovisuais sobre os protestos nacionais de junho de 2013. Discursos
Fotográficos, Londrina, v. 10, n. 17. p. 39-60, jul./dez. 2014.
321
McQUAIL, Denis. Teorias da Comunicação de Massa. 6. ed. Porto Alegre: Penso, 2013. p. 84.
322
MENDONÇA, Kleber; DAEMON, Flora. Os outros da rua: O acontecimento discursivo das
manifestações de 2013. Dossiê, ano 11, v. 11, n. 30, p. 37-55, jan./abr. 2014. Disponível em:
<http://revistacmc.espm.br/index.php/revistacmc/article/download/676/pdf>. Acesso em: 25 abr.
2016.
101

diversas normas proibindo máscaras ou até mesmo criminalizando seu uso em


eventos públicos surgiram por todos os cantos do país como solução para os
conflitos, conforme será apontado a seguir.

4.2.1 A proibição das máscaras e a produção legislativa nas Câmaras


Municipais e nas Assembleias Legislativas

Em pesquisa Datafolha323 de setembro de 2013, nove em cada dez


entrevistados se diziam contrários às máscaras em manifestações. Todavia, Estado
Democrático de Direito não é simplesmente a vontade da maioria, essa é apenas
sua face quantitativa. Há questões de princípios que precisam ser protegidas, o que
quer dizer que a maioria não pode tudo. Márcio Luís de Oliveira esclarece:

Se a democracia assenta-se no consenso majoritário e de inclusão em meio


ao dissenso, o constitucionalismo estabelece as premissas fundamentais
tanto para o consenso quanto para o dissenso: o reconhecimento e a
observância dos direitos, garantias e deveres fundamentais dos indivíduos e
324
da sociedade.

Assim, democracia é também a observância de certos direitos, garantias e


deveres. No Capítulo 3, a análise sobre a lei antimáscaras no Rio de Janeiro325
ateve-se ao aspecto jurídico-formal. Tentou-se pontuar que, ao contrário do que
pode parecer em uma leitura mais superficial do inciso XVI, do art. 5º, da CRFB/88,
o direito de reunião comporta regulamentação legal. Materialmente, por outro lado, a
discussão é mais complexa. A limitação de direitos fundamentais deve observar o
limite dos limites, que se entende por violado quando a limitação ou restrição
ultrapassa o núcleo essencial do direito no que tange à clareza, determinação,
generalidade ou é desproporcional.326
A validade jurídica da norma depende também de seu conteúdo, portanto, até
mesmo a atividade do legislador de criação da lei deve ter limites materiais e passa

323
DATAFOLHA. Termômetro Paulistano – Manifestações. PO813705, de 11 de setembro de 2013.
Disponível em: <http://media.folha.uol.com.br/datafolha/2013/09/16/relatorio-manifestacoes-11-
09.pdf>. Acesso em: 24 jun. 2016.
324
OLIVEIRA, Márcio Luís de. A Constituição juridicamente adequada: Transformações do
constitucionalismo e atualização principiológica dos direitos, garantias e deveres fundamentais. Belo
Horizonte: Arraes Editores, 2013. p. 124.
325
RIO DE JANEIRO (ESTADO). Lei nº 6.528, de 11 de setembro de 2013. Regulamenta o artigo 23
da Constituição do Estado. Diário Oficial do Estado, 12 set. 2013. Disponível em:
<http://www.alerj.rj.gov.br>. Acesso em: 6 nov. 2015.
326
MENDES, Gilmar Ferreira; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de Direito Constitucional. 7. ed.
rev. atual. São Paulo: Saraiva, 2012. p. 241.
102

a ser entendida como aplicação dos direitos fundamentais por meio de um


balanceamento de princípios constitucionais.327 Se, por um lado, o uso da máscara
é, em si, uma forma de expressão que pode ser um sinal de liberdade com relevante
carga simbólica para uma democracia, por outro, a psicologia social traz evidências
robustas acerca de fenômenos de ordem psíquica que deixariam os seres humanos
mais propensos ao comportamento desviante.328 Assim, a proposta de regulamentar
o uso de máscaras em manifestação parece ser um tema complexo para se analisar.
Entretanto, o tema foi tratado por alguns legisladores brasileiros com uma celeridade
temerária.
O Rio de Janeiro foi pioneiro na aprovação de lei antimáscaras ainda em 11
de setembro de 2013.329 Entre a apresentação do projeto e a aprovação da lei
passaram-se apenas 13 dias. Mesmo ante à pressão popular que se fazia presente
e à inexistência de condições ideais para a confecção da lei, conforme demonstra
Wintgens330 , as limitações à liberdade precisam ser justificadas e a racionalidade da
legislação não pode ser presumida. Andrej Kristan resumiu as bases para a análise
do teste de justificação da ação legislativa331, dentre elas a de que a justificativa
legal deve demonstrar que o conteúdo escolhido pela lei alcança a finalidade
estabelecida e que outras alternativas menos restritivas não seriam suficientes.
Nesse sentido, deveriam ter sido apresentados, entre outros pontos, os fundamentos
que ligam as máscaras à violência nos protestos e evidenciado que outras medidas
se mostravam inócuas. Todavia, a justificativa pontuou apenas que:

O Povo do Estado do Rio de Janeiro tem ministrado preciosas lições de


cidadania, quando exerce seu direito constitucional de manifestação de
pensamento. Infelizmente, há aqueles que, mascarados e armados se
infiltram nessas reuniões públicas a fim de cometer crimes. É, portanto,

327
SIECKMANN, Jan. Legislation as implementation of constitutional law: A foundation for the
demand of legislative rationality. In: WINTGENS, Luc J; OLIVER-LALANA, A Daniel. (Ed.) The
rationality and justification of legislation: Essays on legisprudence. Cham: Springer, 2013. p. 108.
328
Cf. entre outros, KASSIN, Saul; FEIN, Steve; HAZEL, Rose Markus. Social psychology. 8. ed.
Belmont: Wadsworth, 2011; MCKINLAY, Andrew; MCVITTIE, Chris. Social psychology and
discourse. Malden: Wiley-BlackWell, 2008; TUFFIN, Keith. Understanding critical social psychology.
London: Sage Publications, 2005.
329
RIO DE JANEIRO. Lei Estadual nº 6.528, de 11 de setembro de 2013. Regulamenta o art. 23 da
Constituição do Estado. Diário Oficial, 12 set. 2013. Disponível em: <http://www.alerj.rj.gov.br>.
Acesso em: 24 jun. 2016.
330
WINTGENS, Luc J. Legisprudence as a new theory of legislation. Ratio Juris, v. 19, n. 1. p. 1-25,
March 2006. p. 11.
331
KRISTAN, Andrej. Three grounds for tests of the justifiability of legislative action: Freedom,
representative democracy, and rule of law. In: WINTGENS, Luc J; OLIVER-LALANA, A Daniel. (Ed.)
The Rationality and justification of legislation: Essays on legisprudence. Cham: Springer, 2013.
(Legisprudence Library, v. 1). p. 55.
103

dever do Parlamento elaborar uma Lei que proteja essas magníficas


demonstrações de civilidade, que não podem ser manchadas por aqueles
332
que não querem nem conseguem viver sob regime democrático.

Assim, aspectos da psicologia social não foram sequer mencionados, bem


como também não foram apresentadas ou refutadas outras ações ou procedimentos
que poderiam ser adotados antes da proibição legal. Portanto, ainda que a vedação
possa encontrar respaldo científico, na perspectiva legística o projeto apresentado
possui falhas que colocam em dúvida a validade da legislação.
Se a celeridade do processo suscita questionamentos sobre a qualidade do
debate, estudá-lo mais detidamente reforça a suspeição. Nesse exíguo tempo de
processo metajurídico transcorrido em regime de urgência, das treze propostas de
alterações ao projeto que foram enviadas antes da votação, apenas duas foram
incorporadas. Todavia, mesmo as propostas recusadas não trariam grandes
alterações na norma. Como exemplo das mudanças indeferidas, tem-se o acréscimo
de parágrafo que previa o dever de se observar a Constituição do Estado ao se
cumprir a lei e a sugestão de se modificar a ementa. Durante a votação, outros três
parágrafos foram acrescentados ao projeto inicial, entretanto, o escrutínio evidenciou
baixa qualidade técnica na redação333 e alterações irrelevantes.334
Se a qualidade na redação da norma pode ser questionável, o envolvimento
democrático em sua elaboração também não foi dos melhores. Mesmo com a
exploração midiática das cenas de violência, instituições importantes no debate
posicionaram-se contrárias à utilização dessa estratégia como meio legítimo para
proporcionar mais segurança nas manifestações. Além da OAB e da IAB, como já

332
ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DO RIO DE JANEIRO. Projeto de Lei nº 2.405/2013. Regulamenta o
art. 23 da Constituição do Estado. Disponível em: <http://www.alerj.rj.gov.br>. Acesso em: 24 jun.
2016.
333
Na versão final da norma verificam-se dois parágrafos com redação praticamente idênticas que
poderiam ser fundidos em apenas um sem dificuldades. O § 2º, art. 3º da Lei dispõe que “Para os
fins do inciso V do caput, a comunicação deverá ser feita à delegacia cuja circunscrição se realize
ou, pelo menos, inicie a reunião pública para a manifestação de pensamento”, enquanto o § 4º da
lei tem a mesma redação, porém, diz que a comunicação deverá ser feita ao batalhão, vejamos: “§
4º - Para os fins do inciso V do caput deste artigo a comunicação deverá ser feita ao batalhão em
cuja circunscrição se realize ou, pelo menos, inicie a reunião pública para a manifestação do
pensamento.” Assim, vê-se que o objetivo é que a mesma comunicação seja feita às Polícia Civil e
Militar.
334
O § único, art. 2º do PL tinha a redação “É vedada qualquer forma de anonimato no exercício do
direito constitucional à reunião pública para manifestação de pensamento”, tendo sido alterado na
versão final para “é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato”. Além de não
dispor de alteração de conteúdo, constata-se que a nova redação é mera repetição do inciso IV, art.
5º da Constituição da República de 1988, portanto, duplamente inútil.
104

demonstrado, acadêmicos,335 movimentos sociais e ONGs336 foram contrários à lei.


Ainda que se tenha a percepção de que um consenso pode ser impossível e
exatamente por isso há o procedimento de votação, a não apresentação dos
argumentos para a medida e os poucos dias de debate podem ter sido insuficientes
para que o processo legislativo incorporasse a divergência existente e encontrasse o
caminho da coabitação dos desacordos sociais, tarefa atribuída ao processo de
criação da lei.337
Assim, foram insuficientes as tentativas de construção de consensos
possíveis, as estratégias de convencimento e a busca pela aceitação social do ato
normativo durante o processo de elaboração legislativa, necessidades estabelecidas
pela teoria da legislação e que contribuem para o nível de eficácia social da
norma.338 Ainda assim, posteriormente, o TJ-RJ decidiu, no sentido da opinião
pública majoritária, pela constitucionalidade da medida.339
Com a reiteração das imagens da violência nas manifestações e com o
exemplo da legislação fluminense, uma avalanche de proposições semelhantes se
espalhou pelo país. O texto aprovado no Rio em menos de duas semanas e com
críticas à sua validade, passou a servir de modelo para diversos projetos de lei em
outros Estados e Municípios.
No Rio Grande do Sul, a pulsão para legislar foi intensa. Alguns dias após ser
atacado o prédio onde residia o prefeito de Porto Alegre, foi apresentado na
Assembleia Legislativa (AL) o Projeto de Lei 283/13, que visava proibir o anonimato
em manifestações públicas no Estado.340 Paralelamente, proposta semelhante

335
TEIXEIRA, Fábio. Lei contra máscaras no Rio é inconstitucional, diz OAB-RJ. O Globo, Rio de
Janeiro, 10 set. 2013. Disponível em: <http://oglobo.globo.com>. Acesso em: 31 ago. 2015.
336
LAUREANO, Maximiano. Proibição do uso de máscaras nos protestos viola direito à livre
manifestação. Vozes das Comunidades, Rio de Janeiro, 23 set. 2013. Disponível em:
<http://vozesdascomunidades.org>. Acesso em: 31 ago. 2015.
337
SHIM, Woomin. Disagreement and proceduralism in the perspective of legisprudence. In:
WINTGENS, Luc J; OLIVER-LALANA, A Daniel. (Ed.) The rationality and justification of legislation:
Essays on legisprudence. Cham: Springer, 2013. p. 131.
338
SOARES, Fabiana de Menezes. Legística e desenvolvimento: A qualidade da lei no quadro da
otimização de uma melhor legislação. Revista da Faculdade de Direito da UFMG, Belo Horizonte, n.
50. p. 124-142, jan./jul. 2007. p. 129.
339
Em sessão que julgou ações propostas pela OAB/RJ e Partido da República (PR),
respectivamente nos processos 0052756-30.2013.8.19.0000 e 0053071-58.2013.8.19.0000. Cf.: LEI
fluminense que proíbe máscaras em manifestações é constitucional. Migalhas, 11 nov. 2014.
Disponível em: <http://www.migalhas.com.br>. Acesso em: 1º jul. 2016.
340
ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DO RIO GRANDE DO SUL. Projeto de Lei nº 283/2013. Disponível
em: <http://www.al.rs.gov.br>. Acesso em: 24 jun. 2016.
105

surgiu na Câmara de Vereadores da capital,341 de forma que o prefeito que teve sua
residência alvo do vandalismo foi o mesmo que promulgou lei municipal sobre o
tema em abril de 2014.342
Um mês e dez dias após a aprovação da lei porto-alegrense a Câmara
Municipal de Santa Maria aprovou legislação praticamente idêntica:343

Quadro 1 – Normas antimáscaras em Porto Alegre e Santa Maria


Município Porto Alegre Santa Maria
Data
26 de setembro de 2013 27 de fevereiro de 2014
Propositura
Data
2 de abril de 2014 12 de maio de 2014
Aprovação
Art. 1. Ficam os cidadãos proibidos de Art. 1. Ficam os cidadãos proibidos de
utilizar máscara ou qualquer meio capaz utilizar máscara ou qualquer meio capaz
de ocultar o rosto com o propósito de de ocultar o rosto, com o propósito de
impedir sua identificação em impedir sua identificação, em
manifestações públicas no Município de manifestações públicas, no Município de
Porto Alegre. Santa Maria.
Art. 2 O direito constitucional do cidadão à Art. 2 O direito constitucional do cidadão à
participação em reunião pública para participação em reunião pública para
Fragmento
manifestação de pensamento será manifestação de pensamento será
do Texto
exercido: exercida:
I – pacificamente; I – pacificamente;
II – sem o porte ou o uso de quaisquer II – sem o porte ou o uso de quaisquer
armas; armas;
III – sem o uso de máscaras ou qualquer III – sem o uso de máscaras ou qualquer
meio capaz de ocultar o rosto ou dificultar meio capaz de ocultar o rosto ou dificultar
sua identificação; sua identificação;
[...] [...]
Fonte: elaboração pelo autor, com base na legislação indicada.

Pela comparação, verifica-se a identidade dos excertos. Em Santa Maria, a


norma foi aprovada por unanimidade e sem nenhuma alteração no projeto inicial.
Sob a ótica da legisprudência material, a reprodução de PL idênticos por câmaras
distintas traz preocupações ao expor a fragilidade do debate parlamentar na
elaboração do direito positivo e a ausência de uma discussão substancial sobre o
conteúdo normativo, que deveria ocorrer no Legislativo. Ademais, essa postura fere

341
CÂMARA MUNICIPAL DE PORTO ALEGRE. Projeto de Lei nº 312/13. Proíbe os cidadãos de
utilizarem mascara ou qualquer meio capaz de ocultar o rosto com o propósito de impedir sua
identificação em manifestações públicas no município de Porto Alegre e normatiza o direito
constitucional dos cidadãos à participação em reuniões públicas. Diário Oficial da Assembleia
Legislativa, 8 nov. 2013. <http://www.camarapoa.rs.gov.br>. Acesso em: 23 jun. 2016.
342
PORTO ALEGRE. Lei Municipal nº 11.596, de 2 de abril de 2014. Proíbe os cidadãos de utilizarem
máscara ou qualquer meio capaz de ocultar o rosto com o propósito de impedir sua identificação em
manifestações públicas no Município de Porto Alegre e normatiza o direito constitucional dos
cidadãos à participação em reuniões públicas. DOPA, 3 abr. 2014. Disponível em:
<http://www.portoalegre.rs.gov.br>. Acesso em: 23 jul. 2016.
343
CÂMARA MUNICIPAL DE SANTA MARIA. Lei nº 5.864/14. Disponível em: <http://www.camara-
sm.rs.gov.br>. Acesso em: 6 jun. 2016.
106

o que há de mais fundamental na existência do legislativo municipal: o olhar para a


realidade local naquilo que ela difere do resto.
A também gaúcha Pelotas foi brindada com lei sobre o tema. PL de novembro
de 2013 levou ao surgimento da Lei nº 6.083, em janeiro de 2014. Apesar de não ser
espelho das normas de Porto Alegre e de Santa Maria, tem conteúdo bastante
similar.344
A lei da AL-RJ ainda serviu de modelo para o PL 238/2013 apresentado na
Câmara Municipal de outro município gaúcho, Caxias do Sul, que repete ipsis litteris
quase a totalidade da norma fluminense.345 Um dos poucos pontos não reproduzidos
é que a lei fluminense coloca a exigência de se comunicar o protesto à delegacia da
Polícia Civil e ao Batalhão da PM da área onde irá ocorrer a manifestação. Na
contramão do esperado, a lei de Caxias do Sul repetiu a vaga expressão
constitucional “autoridade competente” como destinatário do prévio aviso. Assim,
manteve a indefinição de quem seria a autoridade para o recebimento da
comunicação sobre o protesto, falhando na regulamentação do direito de reunião, já
que não realizou a densificação normativa que deveria ser o objetivo da norma.
Da mesma forma irrompeu em Passo Fundo o entusiasmo legiferante para
proibir as máscaras em protestos. Após arquivado o PL, pedido de desarquivamento
trouxe novamente a discussão à tona, o que culminou em sua aprovação em 9 de
setembro de 2015, sem nenhuma alteração no texto inicial.346
Na cidade gaúcha Novo Hamburgo surgiu o PL nº 146/2013 que terminou
arquivado em dezembro de 2013 ao argumento de inconstitucionalidade.347 Em maio
de 2014 o autor do projeto apresentou novamente o tema no PL nº 71/2014,

344
Art. 1. Fica proibido, em logradouros públicos, o uso de máscaras ou quaisquer peças que cubram
o rosto do cidadão com o propósito de impedir sua identificação no âmbito do Município de
Pelotas/RS.
Art. 2. O direito Constitucional de reunião pública para manifestação de pensamento será exercido:
I – de forma pacífica;
II – sem o porte ou uso de quaisquer armas;
III – sem o uso de máscaras nem quaisquer peças que cubram o rosto do cidadão ou dificultem sua
identificação; [...] (PELOTAS. Lei nº 6.083, de 30 de janeiro de 2014. Disponível em:
<http://www.pelotas.rs.gov.br>. Acesso em: 24 jun. 2016)
345
CÂMARA MUNICIPAL DE CAXIAS DO SUL. Projeto de Lei nº 238/2013. Disponível em:
<http://www.camaracaxias.rs.gov.br>. Acesso em: 24 jun. 2016.
346
PASSO FUNDO. Lei nº 5.157, de 29 de outubro de 2015. Disponível em:
<https://leismunicipais.com.br/a2/rs/p/passo-fundo/lei-ordinaria/2015/516/5157/lei-ordinaria-n-5157-
2015-dispoe-sobre-a-proibicao-do-uso-de-mascaras-ou-de-qualquer-outro-objeto-que-dificulte-a-
identificacao-das-pessoas-em-manifestacoes-publicas-no-municipio-de-passo-fundo?q=5157>.
Acesso em: 24 jun. 2016.
347
CÂMARA MUNICIPAL DE NOVO HAMBURGO. Projeto de Lei nº 146, de 30 de setembro de
2013. Disponível em: <http://portal.camaranh.rs.gov.br>. Acesso em: 24 jun. 2016.
107

assinado em conjunto com outro parlamentar, com a mesma proibição e texto de


justificativa idêntico.348 O PL recebeu parecer de inconstitucionalidade pelo
procurador da Câmara Municipal, mas ainda assim foi ao plenário, tendo sido
aprovado e encaminhado para o Prefeito para sanção. Na prefeitura, outra vez
recebeu parecer de inconstitucionalidade, dessa vez pela procuradoria do município,
e não foi sancionado pelo prefeito. O veto do prefeito foi derrubado na Câmara e a
proposição convertida em lei em agosto de 2014.349
Na cidade vizinha Campo Bom, nem o ambiente harmonioso das
manifestações impediu o surgimento de PL para proibir o uso de máscaras em
manifestações.350 Desconsiderando que, para a legisprudência, a criação de regras
jurídicas é alternativa válida somente quando a interação social e a comunicação
entre os indivíduos falham,351 os vereadores aprovaram a proibição sob o argumento
de mitigar a violência, mesmo tendo sido pacíficas as manifestações na cidade.352
Assim como em Passo Fundo, o projeto de lei de Porto Alegre parece ter sido
utilizado como molde, pois apresentam a mesma redação. Até a justificativa é
idêntica, omitindo-se no projeto de Campo Bom apenas uma frase que na
justificativa do projeto de lei porto-alegrense fazia menção àquela cidade. Após
aprovada na Câmara, a iniciativa foi barrada pelo prefeito. Seu veto, com o
argumento de inconstitucionalidade, não foi questionado por nenhum dos
vereadores.353
Assim como em Campo Bom/RS, o medo referente a algo distante foi
utilizado em Pernambuco para legitimar a necessidade de proibição das máscaras
em manifestações. No dia seguinte à morte de Santiago Andrade, cinegrafista que
cobria protestos no Rio de Janeiro, surgiu em Pernambuco lei antimáscaras que

348
CÂMARA MUNICIPAL DE NOVO HAMBURGO. Projeto de Lei nº 71, de 19 de maio de 2014.
Disponível em: <http://portal.camaranh.rs.gov.br>. Acesso em: 24 jun. 2016.
349
CÂMARA MUNICIPAL DE NOVO HAMBURGO. Lei Municipal nº 2.741, de 1º de setembro de
2014. Disponível em: <http://portal.camaranh.rs.gov.br>. Acesso em: 24 jun. 2016.
350
CÂMARA MUNICIPAL DE CAMPO BOM. Projeto de Lei Municipal nº 14, de 16 de setembro de
2014. Disponível em: <http://www.camaracb.rs.gov.br>. Acesso em: 24 jun. 2016.
351
ISOLA-MIETTINEN, Hannele. The principled legislative strategy: Rationality of legal principles in
the creation of law? In: WINTGENS, Luc J; OLIVER-LALANA, A Daniel. (Ed.) The rationality and
justification of legislation: Essays on legisprudence. Cham: Springer, 2013. p. 49.
352
PROIBIÇÃO de máscaras em manifestações na pauta em Campo Bom. Jornal Repercussão,
Campo Bom, Coluna Geral, 29 maio 2014. Disponível em: <http://www.jornalrepercussao.com.br>.
Acesso em: 31 ago. 2015.
353
SPENGLER, Mauri. De 18 a 24 de julho de 2014. A Gazeta, Campo Bom, Coluna Rebatendo, 24
jul. 2014. Disponível em: <http://www.agazetacb.com.br>. Acesso em: 31 ago. 2015.
108

fundamentava a necessidade da norma no caso carioca.354 A distância de 2.300


quilômetros em relação ao local da morte não mitigou o impulso legislativo, o que é
um indicativo da transferência do medo ou síndrome da violência urbana,355 na qual
um elemento objetivo acontecido em determinado lugar afeta a sensação de
segurança de pessoas em lugar distinto. Tal fenômeno foi explicado por Amauri
Meireles e Lúcio Emílio Espirito Santo ainda na década de 80 do século passado.356
Outro estado do sul do país atingido pelo frenesi legislativo foi Santa Catarina.
Com texto idêntico ao projeto de lei fluminense e, portanto, semelhante a vários
outros projetos país afora, surgiu em terras catarinenses o Projeto de Lei nº
376/2013.357 Por sua vez, na Câmara Municipal de Joinville, surgiu o PL 53/2014.358
Igualmente seguindo o molde da lei do Rio de Janeiro, foi aprovada no Mato
Grosso a Lei nº 10.191, em 26 de novembro de 2014.359 Na justificativa, a
depredação da Assembleia mato-grossense em 20 de junho de 2013 foi um dos
fatores que motivaram a propositura.
No mesmo dia em que foi assinada a lei fluminense, surgiu no Espírito Santo
projeto com redação extremamente semelhante. Quatorze dias após a proposição, a
autora pediu o arquivamento do projeto, o que foi deferido pelo presidente da
assembleia legislativa. No interior do Estado, em Cariacica, também surgiu projeto
de lei360 que foi aprovado em 2015361 com conteúdo semelhante à lei fluminense.

354
PERNAMBUCO. Assembleia Legislativa. Projeto de Lei Ordinária nº 1.830/2014. Disponível em:
<http://www.alepe.pe.gov.br>. Acesso em 21 jun. 2016.
355
MEIRELES, Amauri. O tempo e a violência. Belo Horizonte: Gráfica Belo Horizonte, 2007. p. 91.
356
MEIRELES, Amauri; ESPÍRITO SANTO, Lúcio Emílio do. A síndrome da violência urbana. O
Alferes, Belo Horizonte, n. 7. p. 95-119, set./dez. 1985.
357
ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DE SANTA CATARINA. Projeto de lei nº 376.8/2013, de 17 de
setembro de 2013. Disponível em: <http://www.alesc.sc.gov.br>. Acesso em: 25 jun. 2016.
358
CÂMARA MUNICIPAL DE JOINVILLE. Projeto de Lei Ordinária nº 53, de 18 de março de 2015.
Disponível em: <http://www.cvj.sc.gov.br>. Acesso em: 25 jun. 2016.
359
MATO GROSSO. Lei nº 10.191, de 26 de novembro de 2014. Dá efetividade ao exercício do
direito de reunião e manifestação pública. Disponível em: <http://www.pjc.mt.gov.br>. Acesso em:
25 jun. 2016.
360
CÂMARA MUNICIPAL DE CARIACICA. Projeto de Lei CM nº 029/2014. Dispõe sobre a proibição
do uso de máscaras ou qualquer outra forma de ocultar o rosto do cidadão com o propósito de
impedir-lhe a sua identificação em manifestações no âmbito do município de Cariacica e dá outras
providências. Disponível em: <http://www.camaracariacica.es.gov.br>. Acesso em: 1º jul. 2016.
361
Aprovação mencionada no sítio do partido do vereador que propôs a medida mas não se
conseguiu a confirmação no portal da Câmara Municipal. Cf.: APROVADO projeto de Sérgio Camilo
que proíbe o uso de máscaras em manifestações populares em Cariacica. PRB Website, 14 mar.
2015. Disponível em: <http://www.prb10.org.br>. Acesso em: 1º jul. 2016.
109

Em Alagoas, foi sancionada sem modificação no projeto inicial a Lei Estadual


nº 7.692/15,362 com texto praticamente idêntico ao da norma fluminense. O projeto
foi defendido pelo líder do Governo na Assembleia e recebeu críticas da oposição.363
Entretanto, vereador do mesmo partido que alegava a inconstitucionalidade em
Alagoas fez a propositura em Novo Hamburgo/RS,364 o que parece evidenciar que
ser favorável ou não à proibição parece estar vinculado à posição dos atores no
cenário político e não a uma razão ideológica ou à efetiva preocupação com o tema
da segurança nas manifestações. Nesse sentido, pode-se supor que os legisladores
não reconheciam o acerto ou erro da proposição em decorrência do conteúdo da
norma, mas sim em virtude de uma disputa partidária, o que faz perpetuar jogo de
soma zero no qual a aprovação de uma lei apresentada por um lado pode ser
percebida como derrota para o outro.
No Paraná, tanto a Assembleia Legislativa quanto a Câmara da capital
tiveram PL para proibir o uso de máscaras em manifestações públicas. Curitiba teve
seu projeto de lei apresentado em junho de 2014 (PL nº 158/2014)365 e, no mês
seguinte, foi a vez de surgir a proposição na Assembleia Legislativa do Paraná (PL
nº 324/2014)366. O PL estadual recebeu parecer de inconstitucionalidade pela
Comissão de Constituição e Justiça e foi arquivado.
A grande quantidade de leis praticamente idênticas, quase todas surgidas no
intervalo de um ano, pode suscitar algumas questões relativas aos respectivos
processos de elaboração. A aprovação célere, a tramitação urgente ou a partir da
reprodução de lei aprovada em regime de urgência, sem lastros em pesquisas ou
estudos; a ausência de um efetivo debate parlamentar que pode ser evidenciada
pela aprovação das leis sem nenhuma alteração no projeto inicial e pela cópia de
textos de outras casas legislativas, atingem um ponto de extrema relevância para a

362
ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DE ALAGOAS. Lei Estadual nº 7.692, de 8 de abril de 2015.
Disponível em: <http://www.al.al.leg.br> Acesso em: 24 jun. 2016
363
CINARA, Gilca. Governo sanciona lei e uso de máscara em manifestações públicas fica proibido
em Alagoas. Cada Minuto, 14. abr. 2015. Disponível em: <http://www.cadaminuto.com.br>. Acesso
em: 27 maio 2016.
364
DERRUBADO veto do prefeito: usar máscara em protesto está proibido em Novo Hamburgo.
Martin Behrend Website, 26 ago. 2014. Disponível em: <http://www.martinbehrend.com.br>. Acesso
em: 1º jul. 2016.
365
CÂMARA MUNICIPAL DE CURITIBA. Projeto de Lei Ordinária nº 005.00158.2014, de 20 de junho
de 2014. Restringe o uso de máscara, venda ou qualquer cobertura que oculte a face em eventos
multitudinários. Disponível em: <http://www.cmc.pr.gov.br>. Acesso em: 1º jul. 2016.
366
ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO PARANÁ. Projeto de Lei nº 324, de 7 de julho de
2014. Regulamenta, no âmbito do estado, os direitos e deveres individuais e coletivos que
especifica. Disponível em: <http://www.alep.pr.gov.br>. Acesso em: 1º jul. 2016.
110

teoria da legislação que não se preocupa apenas com o texto final da lei, mas
também com a forma na qual as normas são feitas.367
Em Minas Gerais, a proibição de máscaras em ambientes com aglomerações
de pessoas já havia ocorrido meses antes dos protestos de 2013. No ritmo do lema
“Caiu no Horto está morto”, alusão ao bairro do estádio de futebol no qual o Atlético-
MG realizou a maior parte dos jogos na conquista do título da Libertadores da
América em 2013, os torcedores começaram a ir para o evento com a máscara da
personagem “Morte”, do filme Pânico.368 Assim, ainda no início do ano, valendo-se
do seu poder de polícia e de preceitos do Estatuto do Torcedor,369 a Polícia proibiu a
entrada de máscaras nos Estádios.
Após os protestos da Copa das Confederações, no mesmo ano, o impulso
que ecoava pelo país reverberou no legislativo mineiro. Em um intervalo de 30 dias,
três projetos de lei sobre a proibição do uso de máscaras em manifestações foram
propostos apenas na AL-MG. O primeiro (PL nº 4.474/2013) foi apresentado em
regime de urgência. Neste, observa-se uma redação distinta das demais propostas
que se via pelo país, entre elas a previsão de multa pecuniária para os que não
obedecerem a ordem policial para retirar a máscara.370 Entretanto, os parlamentares
pareceram não acompanhar as proposições de seus pares. Mesmo já existindo o PL
visando impedir o uso de máscaras nas manifestações, na semana seguinte foi
apresentado o PL nº 4.516371 e três semanas depois o PL nº 4.596,372 que em quase
sua totalidade tem a mesma redação do projeto da AL-RJ e dos demais que o
replicam. Cabe ainda a menção de que o autor do projeto surgido por último é do

367
WINTGENS, Luc J. The rational legislator revisited. Bounded rationality and legisprudence. In:
WINTGENS, Luc J; OLIVER-LALANA, A Daniel. (Ed.) The rationality and justification of legislation:
Essays on legisprudence. Cham: Springer, 2013. p. 13.
368
CRAVE, Wes (Direção). Pânico (no original, Scream). 1997. Trailer disponível em:
<http://www.adorocinema.com/filmes/filme-11091/>. Acesso em: 25 jun. 2016.
369
Art. 13-A, I. (BRASIL. Lei nº 10.671, de 15 de maio de 2003. Dispõe sobre o Estatuto de Defesa do
Torcedor e dá outras providências. Diário Oficial da União, 16 maio 2003. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br>. Acesso em: 25 jun. 2016)
370
ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DE MINAS GERAIS. Projeto de Lei nº 4.474, de 10 de setembro de
2013. Restringe o uso de máscara, venda ou qualquer cobertura que oculte a face em eventos
multitudinários e dá outras providências. Disponível em: <https://www.almg.gov.br>. Acesso em: 25
jun. 2016.
371
ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DE MINAS GERAIS. Projeto de Lei nº 4.516, de 19 de setembro de
2013. Proíbe o uso de máscara ou de qualquer adereço que oculte o rosto e impeça a identificação
de cidadão em manifestações públicas. Disponível em: <http://www.almg.gov.br>. Acesso em: 25
jun. 2016.
372
ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DE MINAS GERAIS. Projeto de Lei nº 4.596, de 12 de outubro de
2013. Dispõe sobre a realização de protesto e manifestações no estado de minas gerais. Disponível
em: <http://www.almg.gov.br>. Acesso em: 25 jun. 2016.
111

mesmo partido do autor do primeiro projeto, o que parece indicar que não há diálogo
sobre os temas nem quando os parlamentares pertencem à mesma sigla partidária.
O primeiro dos projetos foi sancionado cinco dias após a abertura da Copa do
Mundo FIFA de 2014.373
Assim como no Rio Grande do Sul, em Minas, o ímpeto de legislar ganhou o
interior. Em setembro de 2014 o município de Juiz de Fora, na zona da mata
mineira, promulgou a Lei nº 13.029, que proibia a utilização de artifícios para impedir
a identificação dentro de repartições públicas.374 No caso da lei juiz-forana,
aparecem sintomas do não amadurecimento suficiente da discussão parlamentar,
pois, nos meses seguintes foi promulgada a Lei nº 13.175, que estendeu a proibição
da primeira norma às ruas e avenidas da cidade.375
Na também mineira Governador Valadares surgiu o Projeto de Lei nº 098/14,
que em duas discussões e duas votações, todas no mesmo dia, foi aprovado por
unanimidade em 15 de agosto de 2014, transformando-se na Lei nº 6.566.376 Deve-
se reconhecer a possibilidade de diálogos entre os parlamentares fora das sessões,
todavia parece ser mais caso de o rito na criação da lei ter sido adotado pelos
vereadores apenas como uma formalidade a ser cumprida.
Outra cidade do interior de Minas Gerais com proposição sobre a proibição de
máscaras em manifestações foi Três Corações, que teve PL em 2014.377
Os casos das cidades mineiras de Governador Valadares e de Juiz de Fora
explicitam ainda um aspecto inquietante da hipertrofia legislativa. Em ambos, a
proibição municipal de se ocultar a face nos protestos ocorreu quando já em vigor lei
estadual que proibia a conduta. Assim, as leis municipais proibiam conduta
expressamente já proibida por norma estadual. Esse fato aponta para a conclusão
373
ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DE MINAS GERAIS. Lei nº 21.324, de 17 de junho de 2014.
Restringe o uso de máscara, venda ou qualquer cobertura que oculte a face em eventos
multitudinários. Diário do Executivo de Minas Gerais, 18 jun. 2014. Disponível em:
<http://www.almg.gov.br>. Acesso em: 25 jun. 2016.
374
CÂMARA MUNICIPAL DE JUIZ DE FORA. Lei nº 13.029, de 24 de setembro de 2014. Dispõe
sobre a proibição do uso de máscaras e capuzes nas manifestações em repartições públicas
municipais e dá outras providências. Diário Regional, 25 set. 2014. Disponível em:
<http://www.camarajf.mg.gov.br>. Acesso em: 25 jun. 2016.
375
JUIZ DE FORA. Lei nº 13.175, de 21 de junho de 2015. Dispõe sobre a alteração da redação do
art. 1º da Lei n. 13.029, de 24 de setembro de 2014. Diário Oficial Eletrônico, 22 jul. 2015.
Disponível em: <http://www.jflegis.pjf.mg.gov.br>. Acesso em: 25 jun. 2016.
376
CÂMARA MUNICIPAL DE GOVERNADOR VALADARES. Com aprovação da CM vira lei a
proibição de máscaras em manifestações. Disponível em: <http://camaragv.mg.gov.br>. Acesso em:
25 jun. 2016.
377
USO de máscaras em manifestações é proibido em Três Corações. Marreta na Bigorna Website,
15 mar. 2014. Disponível em: <http://amarretanabigorna.blogspot.com.br>. Acesso em: 25 jun.
2016.
112

de que os vereadores desses municípios não observaram as leis já existentes no


ordenamento jurídico, nem o impacto da legislação no mundo da vida. A constatação
pode evidenciar algo além da simples negligência do caráter sistêmico do Direito.
Em realidade, ao menos outras duas críticas podem surgir. A primeira parece
ser o caso de uma exibição de prodigalidade legiferante. Diante da pressão da mídia
acerca da violência nos protestos, os parlamentares apressaram-se em aprovar leis
com o objetivo de mostrarem produtividade. Assim, faz sentido o alerta de Fabiana
Soares,378 de uma necessidade nefasta de o legislativo exibir uma produção de
proposições legislativas em detrimento de outros aspectos importantes da atividade
parlamentar. A segunda é a preocupação em expor que estão fazendo algo acerca
do problema, desconsiderando se a medida é necessária ou apta a alcançar os
objetivos mencionados na justificativa legal. Em suma, a real necessidade da
intervenção legislativa não foi nem sequer avaliada.
Em Goiás, o PL nº 299 foi apresentado à Assembleia Legislativa em setembro
de 2013.379 Após aprovação preliminar foi arquivado em fevereiro de 2015. No mês
seguinte foi desarquivado para ser novamente arquivado em junho do mesmo ano.
Na Assembleia Legislativa de São Paulo (ALESP), foi apresentado o PL nº
631 em 13 de setembro de 2013. Na semana seguinte foi requerida a urgência na
tramitação.380 Entretanto, em 12 de fevereiro de 2014, dois dias após a morte de
Santiago Andrade, ainda sem ser debatido ou arquivado o projeto inicial, surgiu já
em regime de urgência o PL nº 50/2014381 com redação idêntica ao primeiro.382
Outra curiosidade é que o segundo projeto tem autoria coletiva, sendo um dos

378
SOARES, Fabiana de Menezes. Legística e desenvolvimento: A qualidade da lei no quadro da
otimização de uma melhor legislação. Revista da Faculdade de Direito da UFMG, Belo Horizonte, n.
50. p. 124-142, jan./jul. 2007. p. 131.
379
ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DO ESTADO DE GOIÁS. Processo nº 2013004177. Dispõe sobre a
proibição no âmbito do estado de Goiás do uso de máscaras em manifestações que impeçam a
identificação do usuário e dá outras providências. Data Autuação: 08/11/2013. Disponível em:
<http://al.go.leg.br>. Acesso em: 1º jul. 2016.
380
ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DO ESTADO DE SÃO PAULO. Projeto de Lei nº 631, de 13 de
setembro de 2013. Assegura no Estado os direitos e garantias individuais e coletivos previstos nos
incisos IV e XVI do artigo 5º da Constituição Federal. Disponível em: <http://www.al.sp.gov.br>.
Acesso em: 24 jun. 2016.
381
ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DO ESTADO DE SÃO PAULO. Projeto de Lei nº 50, de 12 de
fevereiro de 2014. Regulamenta, no âmbito do Estado, os direitos e deveres individuais e coletivos
que especifica. Parecer nº 1062, de 2014, de relator especial pela Comissão de Justiça e Redação.
Disponível em: <http://www.al.sp.gov.br>. Acesso em: 24 jun. 2016.
382
Entre os dois projetos foram insignificantes, no que tange o conteúdo, as alterações: onde se lia no
art. 1º “nos termos de que dispõe os incisos IV e XVI” passou a constar “nos termos dos incisos IV e
XVI”; onde se via no artigo 3º “A proibição constitucional de se portar” passou a ser “A proibição
constitucional de portar”, entre outras alterações semelhantes.
113

autores o proponente do primeiro projeto. Ou seja, sem se discutir a primeira


proposta, a matéria foi reapresentada tendo vários coautores que não assinaram o
projeto inicial. O segundo projeto foi convertido em lei em 29 de agosto de 2014 sem
alterações.383 Novamente, a necessidade de demonstrar produtividade salta aos
olhos. Parece não haver outra razão para a nova propositura, senão o fato de ter
como autores outros parlamentares e aumentar seus respectivos índices de
produção legiferante.
Mesmo tramitando o PL na Assembleia Legislativa, vereador paulistano do
mesmo partido do deputado que propôs o projeto na ALESP apresentou na Câmara
Municipal o PL nº 657/13,384 dois dias após o surgimento do projeto de lei estadual.
A proibição municipal foi aprovada nas duas votações que ocorreram, tendo a última
acontecido em maio de 2015, nove meses após a mesma proibição ter sido
aprovada no âmbito estadual. Quando enviado para a sanção do executivo, o
prefeito vetou a norma em virtude de a conduta já ser proibida por lei estadual.
Resta novamente evidenciado o descuido dos legisladores. O reconhecimento do
direito vigente, tecnicamente definido como reconstrução da cadeia de fontes,385 é
um dos passos elementares na feitura da norma; entretanto, parece ser dispensável
para alguns parlamentares.
No Estado de São Paulo, o entusiasmo igualmente se expandiu para o
interior. Apesar de a conduta ser proibida por norma estadual, no município de
Piracicaba surgiu o PL nº 417/13386 e em Ribeirão Preto foi aprovada a Lei municipal
nº 13.217/14,387 que proíbe o uso de máscara ou outro tipo de ocultação do rosto no
interior da Câmara Municipal. A Câmara Municipal de Barueri aprovou a Lei nº

383
ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DO ESTADO DE SÃO PAULO. Lei nº 15.556, de 29 de agosto de
2014. Restringe o uso de máscaras ou qualquer paramento que oculte o rosto da pessoa em
manifestações e reuniões, na forma que especifica, e dá providências correlatas. Diário Oficial
Estadual, 30 ago. 2014. Disponível em: <http://www.al.sp.gov.br>. Acesso em: 25 jun. 2016.
384
CÂMARA MUNICIPAL DE SÃO PAULO. Projeto de Lei nº 567, de 12 de setembro de 2013.
Dispõe sobre a proibição do uso de máscaras e capuzes nas manifestações em próprios municipais.
Disponível em: <http://www.camara.sp.gov.br>. Acesso em: 25 jun. 2016.
385
SOARES, Fabiana de Menezes. Legística e desenvolvimento: A qualidade da lei no quadro da
otimização de uma melhor legislação. Revista da Faculdade de Direito da UFMG, Belo Horizonte, n.
50. p. 124-142, jan./jul. 2007. p. 137.
386
CÂMARA MUNICIPAL DE PIRACICABA. Projeto de Lei nº 417, de 12 de dezembro de 2013.
Proíbe o uso de máscara ou qualquer outra forma de ocultação da identidade do cidadão nas
manifestações públicas realizadas em próprios públicos municipais. Disponível em:
<http://www.camarapiracicaba.sp.gov.br>. Acesso em: 25 jun. 2016.
387
RIBEIRÃO PRETO. Lei nº 13.217, de 4 de abril de 2014. Dispõe sobre a proibição do uso de
máscaras e capuzes nas manifestações realizadas nas dependências da câmara municipal de
ribeirão preto e dá outras providências. Disponível em: <http://www.ribeiraopreto.sp.gov.br>. Acesso
em: 25 jun. 2016.
114

2.298, em 12 de novembro de 2013, vedando o uso de máscaras, capuzes e


bandeiras em manifestações realizadas em prédios públicos.388 No mesmo mês foi
apresentado PL em São José do Rio Preto, tendo sido aprovado em julho de
2014.389 O Município de Sorocaba, por sua vez, aprovou a Lei nº 10.809, em maio
de 2014, proibindo máscaras ou qualquer forma de ocultamento do rosto em
manifestações em locais aberto ao público.390
Assim, diversas cidades paulistas aprovaram ou debateram acerca da
proibição de conduta que norma estadual já proibia. Cabe ressaltar que as Câmaras
Municipais, via de regra, não disponibilizam informações suficientes na internet
acerca do processo legislativo. Quando possuem sítio eletrônico, muitas vezes não é
possível acessar o projeto de lei, analisar as alterações sugeridas ou o registro das
votações. De um modo geral são divulgados, quando muito, apenas os textos da lei
aprovada. Portanto, as pesquisas empíricas acerca da realidade do processo de
elaboração legislativa no país são imensamente dificultadas, tendo em vista que
uma análise mais ampla exigiria a presença física, ainda que por amostragem, em
grande parte dos municípios e Assembleias Legislativas do Brasil. Nesse sentido,
se, com poucas informações, já se consegue identificar a proliferação das leis, a
baixa qualidade das normas e a ausência de uma democracia efetiva no trâmite
metajurídico, tal situação ficaria ainda mais exposta se fosse possível uma análise
mais completa e metodológica da situação.
Mesmo diante de tantas normas criadas acerca da proibição de se usar
máscaras em protestos, acredita-se que o impulso legislativo só não foi maior
porque em algumas unidades da federação a polícia ou o Governo anunciaram

388
BARUERI. Lei nº 2.298, de 26 de novembro de 2013. "Proibição do uso de máscara, capuz e
bandeira nas manifestações em prédios municipais do município". Disponível em:
<https://leismunicipais.com.br/a/sp/b/barueri/lei-ordinaria/2013/230/2298/lei-ordinaria-n-2298-2013-
probicao-do-uso-de-mascara-capuz-e-bandeira-nas-manifestacoes-em-predios-municipais-do-
municipio>. Acesso em: 25 jun. 2016.
389
CÂMARA MUNICIPAL DE SÃO JOSÉ DO RIO PRETO. Projeto de Lei nº 268/2013. Proíbe os
cidadãos de utilizarem máscara ou qualquer meio capaz de ocultar o rosto com o propósito de
impedir sua identificação em manifestações públicas no Município de São José do Rio Preto.
Publicado em Jornal D’Hoje, em 15 jul. 2014. Disponível em:
<http://www.saojosedoriopreto.sp.leg.br>. Acesso em: 1º jul. 2016.
390
CÂMARA MUNICIPAL DE SOROCABA. Lei nº 10.809, de 7 de maio de 2014. Diário Oficial do
Município, 7 maio 2014. Disponível em: <http://www.camarasorocaba.sp.gov.br>. Acesso em: 1º jul.
2016.
115

previamente que prenderiam quem estivesse usando máscara, mesmo não existindo
lei sobre a proibição. Foi o caso, por exemplo, do Distrito Federal391 e do Recife.392
Portanto, o que se vê é que, nos meses seguintes aos grandes protestos que
marcaram a Copa das Confederações de 2013, houve intenso impulso legislativo no
sentido de proibição do uso de máscara e ocultamento do rosto durante
manifestações. Parcela considerável dos projetos apresentados foram cópias de
outros, não observaram diversos aspectos da legisprudência e foram aprovados sem
efetivo debate acerca do tema. Ademais, diversos elementos no processo de
aprovação das normas evidenciam que a preocupação não parece ter sido a
questão da segurança nas manifestações, mas apenas a produção de lei para
mostrar que os parlamentares não estavam inertes frente ao clamor público. Sobre
essa produção frenética de leis em nosso país, é pertinente o alerta de Letícia
Camila dos Santos, para quem:

Beneficiado por um sistema de regras que lhe investem de prerrogativas


para atuar, o agente político membro do Poder Legislativo goza de uma
confiança presumida que impediu o nosso sistema, até hoje, de
responsabilizá-lo pela produção de leis de pouca ou de péssima qualidade,
393
ou ainda, pela produção excessiva de leis.

Se o panorama sobre o impulso legislativo nas câmaras de vereadores e nas


assembleias legislativas evidenciam um impulso legislativo excessivo e leis de
qualidade questionáveis, natural que se levantem dúvidas acerca desse cenário no
Congresso Nacional.

4.2.2 As manifestações e a retórica da criminalização no Congresso Nacional

Se, no âmbito dos municípios e estados, a ausência de informações dificulta


um rigor estatístico e uma amostra suficiente para observações mais generalizáveis,
esse não é o caso do Congresso Nacional. No Senado Federal e na Câmara dos
Deputados os recursos telemáticos permitem um quadro mais preciso da produção
legislativa. Na pesquisa realizada, apesar da diferença de recursos disponíveis para

391
ALENCASTRO, Catarina. Mascarados serão presos em manifestações de 7 de setembro em
Brasília. O Globo, Rio de Janeiro, 5 set. 2013. Disponível em: <http://oglobo.globo.com>. Acesso
em: 31 ago. 2015.
392
LINS, Letícia. Após confusão, Recife proíbe mascaras em protestos. O Globo, São Paulo, 22 ago.
2013. Disponível em: <http://oglobo.globo.com>. Acesso em: 31 ago. 2015.
393
SANTOS, Letícia Camila dos. Análise da decisão judicial no quadro da legisprudência: O diálogo
das fontes do direito. 2011. 173 f. Dissertação (Mestrado em Direito) – Faculdade de Direito,
Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Belo Horizonte, 2011. p. 94.
116

se estudar os diversos níveis do legislativo no país, os dados empíricos coletados no


âmbito federal coincidem com os encontrados esparsamente nos municípios e
estados. Destarte, tornam-se mais conclusivas as observações realizadas.
Após os protestos de 2013, surgiram na Câmara dos Deputados 18 (dezoito)
projetos de lei394 que tocam o tema da violência nas manifestações395 e outros 4
(quatro) projetos no Senado.396 Em contraste a estes 22 (vinte e dois) projetos, antes
de 2013 apenas uma proposição foi encontrada no Congresso Nacional. Trata-se do
PL nº 2.044 de 1999,397 que foi arquivado com dois argumentos principais: que não
poderiam haver outras restrições além das expressamente previstas na CRFB/88, e
que a intervenção punitiva penal deve ser remédio extremo. No voto do relator:

[...] se a pessoa pratica o crime com o rosto coberto, isto constitui apenas
um meio de não ser identificado, para fugir à ação da Polícia, porém, os
valores protegidos são outros, como a integridade das pessoas e em
398
relação a isto o Código Penal já dispõe convenientemente.

Se o primeiro ponto foi refutado no Capítulo 3, o segundo apresenta


argumento com forte respaldo na dogmática penal399 .
Todavia, ambos os argumentos foram igualmente desprezados e, após um
lapso temporal de mais de uma década sem que o assunto despertasse o interesse
dos legisladores, 20 projetos de leis sobre o tema surgiram no Congresso no
intervalo de 10 meses, compreendidos entre maio de 2013 e fevereiro do ano
seguinte. Ao invés de debater os projetos que surgiam, acrescentando ou
394
São os projetos de lei nº 5.531/13; 5964/13; 6.198/13; 6.277/13; 6.307/13; 6.347/13; 6.461/13;
6.500/13; 6.532/13; 6.614/13; 7.101/14; 7.121/14; 7.134/14; 7.157/14; 7.158/14; 7.188/14; 8.251/14
e 876/15.
395
São os projetos de lei nº 300/13; 404/13; 451/13 e 508/13.
396
Alguns projetos de lei tramitando no Congresso Nacional, ainda que eventualmente possam ter
certa relação temática com o objeto da pesquisa, não foram considerados integrantes do universo
da pesquisa: o PLS 728/11, apesar de discorrer sobre o direito de greve durante a Copa do Mundo
foi proposto ainda em 2011, da mesma forma os projetos 707/2011 e 762/2011 que tem como mote
o terrorismo; também sobre o terrorismo surgiu o PL 499/13, apesar dos tipos penais abertos, ao
menos expressamente não foi seu objetivo as máscaras ou violência nas manifestações; o PLS
236/12 não foi tomado em conta pela pesquisa pois sua temática é mais ampla, trata-se do novo
Código Penal, além de ter sido proposto igualmente em 2012; e, por último, o PL 28/2014 que visa
alterações no Estatuto do Torcedor. Assim, caso fossem considerados, o frenesi legiferante-
criminalizador poderia mostrar-se ainda mais intenso.
397
BRASIL. Projeto de Lei nº 2.044, de 1999. Considera crime a ocultação do rosto com mascaras ou
outros meios, pelos participantes de passeatas e demais manifestações públicas. Disponível em:
<http://www.camara.gov.br>. Acesso em: 25 jun. 2016.
398
BRASIL. Projeto de Lei nº 2.044, de 1999. Considera crime a ocultação do rosto com mascaras ou
outros meios, pelos participantes de passeatas e demais manifestações públicas. Relatório na
Comissão de Constituição e Justiça e de Redação, rel. deputado Coriolano Sales. Disponível em:
<http://www.camara.gov.br>. Acesso em: 25 jun. 2016.
399
FERRAJOLI, Luigi. Direito e Razão: teoria do garantismo penal. 4. ed. São Paulo: Editora Revista
dos Tribunais, 2014. p. 426 et. seq..
117

modificando elementos, os legisladores preferiram oferecer para a sociedade leis de


suas próprias autorias.
Outra semelhança foi a utilização da morte de Santiago Andrade como
estímulo para o impulso legislativo já intenso. Ao levar os fatos para o público, a
notícia precisa despertar interesse, impressionar, impactar, vender. Conforme
pontuou Luana Magalhães Cunha ao estudar a relação entre direito e mídia, tendo
por recorte os crimes de homicídio, “com o intuito de instigar o leitor, o jornalista
elege aquilo que lhe parece mais atrativo [...]”.400 Há um notório recorte feito pela
mídia para enfatizar os atos violentos. A espetacularização da morte e da violência
nas manifestações desdobrou-se em clamor público, o que dificulta que se entenda
de forma mais sensata e racional o que se passa. Assim, a realidade foi mediada
pelos jornais e enfatizou-se a violência, o crime. Pois, “o crime vende: vende filmes,
livros, jogos, e também vende jornais”.401
Dessa forma, construiu-se a percepção de que apenas por violência e
confrontos foram marcados os protestos de 2013. Como resultado, nas duas
semanas posteriores à morte cerebral do cinegrafista surgiram 6 (seis) projetos de
lei somente na Câmara dos Deputados, que tinham como foco as manifestações.402
O gráfico abaixo mostra o número de proposições legislativas que possuem como
pauta a violência nas manifestações, no qual se vê o mês da morte do cinegrafista,
fevereiro de 2014, com a maior quantidade de projetos de lei apresentados:

400
CUNHA, Luana Magalhães de Araújo. O direito produto da notícia: a morte estampada nos jornais.
2014. Dissertação (Mestrado em Direito) – Faculdade de Direito, Universidade Federal de Minas
Gerais (UFMG), Belo Horizonte, 2014. p. 30.
401
Ibid.. p. 11
402
Dentre esses, 4 (quatro) fazem menção expressa ao nome do cinegrafista na justificativa do texto
normativo; preceitos de direito criminal também aparecem em 4 (quatro) dos projetos.
118

Gráfico 1 - Quantidade Mensal de Proposições Legislativas sobre Violência em


Manifestações, de julho 2013 a março 2015, na Câmara dos Deputados.

0
jul/13

set/13

nov/13
dez/13
jan/14

nov/14
fev/14
ago/13

out/13

mar/14

jun/14
jul/14

set/14

jan/15
fev/15
mar/15
abr/14
mai/14

ago/14

out/14

dez/14
Fonte: elaborado pelo autor, com dados da Câmara dos Deputados.

Se muito do que se viu nas Câmaras de Vereadores e Assembleias


Legislativas parece se repetir na Câmara dos Deputados, um elemento novo surgiu:
a questão criminal. Respeitando a competência privativa da União de dispor sobre
direito penal,403 não foram encontradas nos municípios e estados propostas de
tipificação criminal. Entretanto, no Congresso Nacional não faltaram projetos que
desconsideraram o caráter subsidiário deste ramo do direito e o fracasso das prisões
para o controle do comportamento desviante404 e que, conforme Ferrajoli, “uma
política penal de tutela de bens tem justificação e credibilidade somente quando é
subsidiária de uma política extrapenal de proteção dos mesmos bens”.405

403
Art. 22, I, da CRFB/88.
404
BATISTA, Nilo. Introdução crítica ao direito penal brasileiro. 12. ed. rev. atual. Rio de Janeiro:
Renavam, 2011; ZAFFARONI, Eugênio Raúl. Em busca das penas perdidas: a perda de
legitimidade do sistema penal. Rio de Janeiro: Renavam, 1991.
405
FERRAJOLI, Luigi. Direito e Razão: teoria do garantismo penal. 4. ed. São Paulo: Editora Revista
dos Tribunais, 2014. p. 434.
119

Entre os 18 (dezoito) projetos de lei da Câmara dos Deputados, 14 (quatorze)


fazem do direito penal estratégia de mitigação da violência em protestos,406
enquanto, no Senado, 3 (três) dos 4 (quatro) contêm disposições criminais.
Essa estratégia de criação de novos tipos penais ou aumento do rigor
punitivo, tão comum em nossa história mesmo não alcançando resultados práticos,
sempre vem à tona quando o tema segurança pública afeta a mídia de massa.
Marcos Rolim, ao discorrer sobre as estratégias adotadas no Brasil para a
contenção da violência afirma:

O que se observa, invariavelmente, é uma forte pressão para que se faça


mais do mesmo [...]. Os gestores, então, em vez de alterarem o discurso,
falam as mesmas coisas só que em um tom cada vez mais estridente.
Assim, as “políticas de segurança” reconhecidamente fracassadas
costumam ser retomadas com mais ânimo e alarde a cada nova gestão [...]
407
e tudo, rigorosamente tudo o que importa, permanece como está.

A fala de Marcos Rolim é também sustentada por pesquisa realizada por Luís
Wanderley Gazoto, que demonstrou que aproximadamente 80% das leis afetas ao
direito penal que surgiram no Congresso Nacional desde a criação do Código Penal
até o ano de 1998 criavam crimes, aumentavam penas ou restringiam direitos
penais, fenômeno denominado de populismo penal.408 Ao estudar essa postura do
legislador brasileiro, Gazoto afirma que “os únicos que obtêm vantagens com o
populismo penal são os políticos e aspirantes a políticos”.409
Em face do medo, em razão de circunstância em que se aflora a violência ou
em momentos nos quais essa é explorada pela mídia, alguns parlamentares
apressam-se em oferecer leis incriminadoras como solução no intuito de demonstrar
para a sociedade que não estão inertes. Se não houver resultado, a culpa passa a
ser da polícia, que não consegue prevenir, e do judiciário, que não mantém as

406
Na leitura dos projetos verifica-se que 11 (onze) criaram tipos ou contravenções penais, ou então
tornam condutas relativas a protestos como qualificadoras de crime ou causa de aumento de pena,
dando ensejo ao que comumente se denomina aumento do rigor penal; outros 02 (dois) projetos
realizam a interpretação autêntica ao estabelecerem que determinadas condutas durante protestos
caracterizam tipos penais já existentes; 01 projeto remete à possibilidade de responsabilização
criminal dos organizadores do evento em determinadas circunstâncias.
407
ROLIM, Marcos. A síndrome da rainha vermelha: Policiamento e segurança pública no século XXI.
Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2006. p. 44.
408
GAZOTO, Luís Wanderley. Justificativas do Congresso Nacional Brasileiro ao rigor penal
legislativo: o estabelecimento do populismo penal no Brasil contemporâneo. 377 f. Tese (Doutorado
em Sociologia) – Instituto de Ciências Sociais, Departamento de Sociologia, Universidade de
Brasília (UnB), Brasília, 2010. p. 210.
409
Ibid.. p. 295.
120

pessoas no cárcere. Como o problema persiste, os motivos que legitimam o voto nos
candidatos que fazem da violência plataforma de campanha também continuam.
No caso das leis antimáscaras, o viés eleitoreiro parece saltar aos olhos
quando se observa o processo metajurídico de tramitação dos projetos. Por se tratar
de matéria idêntica ou correlata, 14 (quatorze) projetos foram apensados e
tramitavam conjuntamente, todavia, pelo menos 8 (oito) requerimentos foram
apresentados pelos autores dos projetos objetivando a desapensação.410 Se, por um
lado, tais ações podem ser tentativas de conferir celeridade à um projeto no qual se
acredita, por outro, pode ser uma repetição do que aconteceu nos estados e
municípios, onde surgiram elementos para se afirmar que os legisladores
preocupam-se com “suas próprias leis”, o que é sintomático do enfoque na
produtividade legislativa e não no efetivo debate acerca do tema.
Outra característica que se pode observar no contexto do impulso legislativo
decorrente das manifestações de 2013 é que, tanto integrantes da bancada do
governo, quanto da oposição, propuseram PL.411 Assim, outra vez mais, em regra
geral, parece que a divergência ideológica fica em segundo plano quando se discute
a criação de tipos penais ou enrijecimento de penas.
À conclusão semelhante chegou Ricardo Sontag quando estudou o perfil
ideológico-partidário entre os propositores de PL após os ataques do Primeiro
Comando da Capital (PCC) em São Paulo. Pelos dados analisados pelo autor, não
há grande distinção entre os partidos quando se trata de enrijecimento de penas:
“direita, esquerda, centro, todos apresentaram praticamente o mesmo nesse
tema”.412 Assim, a tendência geral parece ser a de não debater o projeto do
concorrente e materialmente propor a mesma pauta, além de poucos sinais de
preocupação efetiva e fundamentada com o fenômeno que se tenta regular.
Ao se analisar o conteúdo dos projetos, outras críticas afloram, como o
desprezo às noções de bem jurídico e lesividade que deveriam nortear o que deve e
o que não deve ser crime quando se propõe penalizar o uso de máscara sem que

410
Os requerimentos solicitavam diretamente a desapensação ou o desarquivamento do projeto que
não estavam arquivado, estavam apenas tramitando conjuntamente: 575/2015, 291/2015, 225/2015,
9686/2014, 101/2015, 527/2015, 8873/2013, 9686/2014.
411
Parlamentares dos seguintes partidos propuserem leis sobre a temática após os protestos de
2013: PR, PMDB, DEM, PP, PSDB, PSD, PSOL, PSC.
412
SONTAG, Ricardo. O excesso como medida: Os projetos de enrijecimento após os “ataques do
PCC” e a cultura punitiva contemporânea. Espaço Jurídico: Journal of Law, Chapecó, v. 8, n. 1. p.
47-60, 2007. p. 52.
121

essa conduta afete diretamente qualquer bem tutelado pelo Direito413. A tipificação
da conduta de usar máscara em protesto realiza o que se denomina crime de perigo
abstrato ou presumido, no qual há um resultado lesivo hipotético, tendo em vista que
a conduta carece de materialidade e, em si, não viola bem jurídico algum. Sobre
esses crimes, cabe ressaltar que a dogmática penal mantém certa reserva acerca de
sua constitucionalidade, pois, muitas das vezes, são apenas condutas-meio para
outros delitos.414
A leitura dos PL e suas justificativas ainda expõe assertivas que beiram as
aberrações jurídicas, como o reconhecimento manifesto da função meramente
simbólica do delito que se propõe criar, por exemplo, na justificativa do PL 6.614/13,
na qual se afirma:

Nossa proposta estabelece uma nova contravenção penal que pune a


utilização de qualquer tipo de cobertura que oculte a identidade da pessoa
durante eventos públicos. Não somos ingênuos a ponto de acreditarmos
que alguém que está disposto a tumultuar uma manifestação legítima será
intimidado por uma breve pena sobre a utilização de máscaras ou
415
capacetes [...].

Dessa forma, verifica-se que nos termos propostos não há uma diferença
muito grande entre os projetos surgidos no Congresso Nacional e os apresentados
nos municípios e estados. A ressalva deve ser feita para o conteúdo criminal, que
surge apenas no Congresso. Além disso, cabe mencionar que, nos projetos de lei
originados no Senado, há uma tendência a justificativas um pouco mais elaboradas,
com estudos de caso acerca do assunto a ser regulamentado e argumentos
técnicos-científicos, em que pese o resultado compartilhar o mesmo ímpeto
criminalizante.
Passados três anos da euforia legiferante,416 os diversos projetos no
Congresso Nacional ainda tramitam, o que evidencia a dificuldade de enfrentar o
problema, e que provavelmente o frenesi causado pelas máscaras passou. Pesquisa
jurídica pautada não no plano dogmático-normativo, mas sociologicamente, no que
de fato tem acontecido nas cidades e estados que aprovaram a proibição das

413
Proposta presente nos projetos de lei 6.198/13, 6.461/13 e 6.614/13.
414
FERRAJOLI, Luigi. Direito e Razão: teoria do garantismo penal. 4. ed. São Paulo: Editora Revista
dos Tribunais, 2014. p. 438-439
415
BRASIL. Projeto de Lei nº 6.614/2013. Esta Lei proíbe a utilização de máscaras, capacete de
motociclista ou cobertura que impeça a identificação da pessoa durante manifestações públicas.
Disponível em: <http://www.camara.gov.br>. Acesso em: 25 jun. 2016.
416
Último acompanhamento realizado em 26 de junho de 2016.
122

máscaras, poderia contribuir com a discussão. Como lembra António Manuel


Hespanha, uma forma sensata para estudar as fontes do direito é a observação
empírica, pois a vigência não garante a validade jurídica de uma norma.417 Assim,
fotos de protestos presentes em jornais logo após a proibição da conduta podem
indicar a efetividade da medida para operar mudanças na realidade.

Figura 13 - Protesto com pessoas com rostos tampados no Rio de Janeiro, um mês
após a proibição da conduta.

418
Fonte: Isabela Marinho.

417
HESPANHA, António Manuel. Pluralismo Jurídico e Direito Democrático. São Paulo: Annablume,
2013. p. 77.
418
MARINHO, Isabela. Protesto no Centro do Rio reivindica direito a manifestação. G1, 31 out. 2013.
Disponível em: <http://g1.globo.com>. Acesso em: 26 jun. 2016.
123

Figura 14 – Manifestação estudantil em Abril de 2016 pelas ruas de São Paulo,


destaque para as pessoas com rostos tampados mesmo vigendo proibição legal.

419
Fonte: André Lucas/C.H.O.C Documental

Com efeito, imagens como a do dia 25 de outubro de 2013, quando o Coronel


Reynaldo Simões, uma autoridade pública, distante de sua tropa, foi agredido por
diversas pessoas mascaradas e sem máscaras, não podem ser aceitas no contexto
do Estado Democrático de Direito. Assim, a relação entre o anonimato e o
comportamento desviante precisa ser melhor compreendida e seriam levianas
respostas apriorísticas sobre o tema. Todavia, para enfrentar o tema é preciso
perceber e analisar a eficácia – ou sua falta – das leis que pretendiam proibir o uso
de máscaras em manifestações. Análise essa que não pode se furtar a perceber a
necessidade de reflexões sobre a crença no poder da abstração da lei na solução
dos conflitos humanos em detrimento de medidas mais efetivas e concretas. Como
diz Mônica Sette Lopes, “qualquer solução que se centre na lei e na sanção como

419
In: CONTRA a máfia da merenda, os estudantes de SP ocuparam o Centro Paulo Souza. Vice, 28
abr. 2016. Disponível em: <http://www.vice.com>. Acesso em: 26 jun. 2016.
124

meio de afastar o conflito, e apenas neles, estará fadada ao mais fragoroso


insucesso”.420

Figura 15 – Coronel da Polícia Militar é agredido por manifestantes em 25 de


outubro de 2013

421
Fonte: Nelson Antoine.

4.3 As leis e as ruas

Analisar o processo legislativo brasileiro, não da perspectiva de


fundamentação legal, mas de sua prática concreta, da forma como acontece nas
casas legislativas, proporciona a construção de um quadro mais realista e a
consciência da distância entre o modelo idealizado e o que se tem no mundo da
vida. Nessa perspectiva da criação da lei e de sua aplicação pela polícia, a Revolta
da Vacina de 1904 e as Manifestações de 2013 propiciam reflexões instigantes. Se,
no começo do século, tentou-se uma ordenação científica da sociedade pautada
pelo rigor metodológico, alijando a população do processo, em 2013 a opinião
pública ditou as ações do legislativo no ritmo do imediatismo midiático, e isso muitas
vezes em detrimento do conhecimento jurídico-científico prudente.

420
LOPES, Mônica Sette. Programa n. 346. Apresentadora: Mônica Sette Lopes. In: RÁDIO UFMG.
Direito é Música. Belo Horizonte: Rádio UFMG, 18 nov. 2014. Programa de rádio. Disponível em:
<www.radiojustica.jus.br>. Acesso em: 2 nov. 15.
421
ANTOINE, Nelson. In: PROTESTO em São Paulo. Folha de São Paulo, 26 out. 2013. Disponível
em: <http://fotografia.folha.uol.com.br/galerias/20148-protesto-em-sao-paulo#foto-330236>. Acesso
em: 26 jun. 2016
125

Tanto em 1904 como em 2013, a tentativa de impor ordem por parte da


polícia foi rechaçada pela população, e em ambos os casos a vontade estatal
mostrou-se limitada, incapaz por si só de solucionar os problemas sociais
apresentados. Seja no Brasil de 1904 ou nos Estados Unidos do Flag Protection Act,
a lei não só foi inócua na solução do que se pretendia regular como foi fator decisivo
para que os protestos acontecessem e para o grau de violência observado. Em
sentido semelhante, apesar do frenesi legislativo, não se pode afirmar que, em 2013,
leis tenham solucionado a questão dos atos violentos em manifestações.
Assim, não sendo possível deduzir exclusivamente da legislação e nem a ela
unicamente confiar a solução para os conflitos e respostas para a efetividade do
direito de reunião, no próximo capítulo serão estudadas as repercussões de
reuniões públicas nos precedentes judiciais.
126

5 OS CONFLITOS E A DECISÃO JUDICIAL

Em 1994, uma divergência sobre manifestação envolveu o obelisco de Belo


Horizonte – mais conhecido pela alcunha “Pirulito da Praça Sete”. O caso é
lembrado por Fabiano Rosa Magalhães em dissertação sobre manifestações
político-sindicais neste local, que é simbólica e estrategicamente privilegiado para
protestos na capital mineira, sendo conhecido como o “coração da cidade”.422
Naquele ano, o Sindicato dos Estabelecimentos Bancários de Belo Horizonte
e Região (SEEB-BH) decidiu realizar um protesto no qual colocaria uma camisinha
gigante no obelisco da cidade, devido à sua forma fálica. Ainda antes de realizar o
ato, integrantes dos partidos e grupos que compunham o Sindicato se posicionaram
contra a estratégia.423 Após a colocação da camisinha no pirulito, o Bispo Dom
Serafim enviou carta à direção do Sindicato criticando o evento, pelo “desrespeito
aos valores cristãos e familiares da maioria [...]”424 da população da cidade. Em
resposta, a presidente do SEEB-BH enviou correspondência para a arquidiocese,
defendendo a necessidade de despertar a atenção dos belo-horizontinos para os
mecanismos de transmissão e prevenção da AIDS.425 A camisinha continuou sendo
colocada e tirada anualmente no Pirulito até 1999, quando o Instituto Estadual do
Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais (IEPHA) mudou seu parecer sobre a
possibilidade de utilização do monumento para tal fim.426
No caso de Belo Horizonte, a divergência moral restringiu-se à troca de cartas
entre opositores na disputa pelo espaço urbano, mas, por vezes, o conflito extrapola
a troca de palavras e os desencontros chegam ao Judiciário. Um caso mais
complexo foi levado à Suprema Corte dos Estados Unidos no ano de 1977,427
quando foi anunciada para o dia primeiro de maio uma passeata no subúrbio de
Chicago, Illinois, em uma vila de nome Skokie. Provavelmente, o protesto

422
MAGALHÃES, Fabiano Rosa de. Estratégias de Rua: manifestações político-sindicais do Sindicato
dos Bancários na Praça Sete de Belo Horizonte. 2008. Dissertação (Mestrado em Ciências Sociais)
– Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais da Pontifícia Universidade Católica de Minas
Gerais, Belo Horizonte, 2008. p. 88.
423
Ibid. p. 137.
424
Ibid.. p. 180.
425
Ibid.. p. 182.
426
Ibid.. p. 138.
427
US SUPREME COURT. National Socialist Party of America v. Village of Skokie 432 US 43 (1977).
Justia Website. Disponível em: <https://supreme.justia.com/cases/federal/us/432/43/case.html>.
Acesso em: 24 jun. 2016.
127

aconteceria sem grandes problemas se o ato não fosse uma manifestação


neonazistas e o local uma comunidade predominantemente judia.
Estima-se que, à época, um a cada seis428 ou dez429 moradores da região
eram sobreviventes do Holocausto. Howard Reich, um escritor que viveu a infância
na comunidade, faz o relato de como as sombras da experiência dos campos de
concentração eram marcantes no cotidiano familiar:

Em nossa casa, meu pai nunca dormia sem acordar várias vezes, em seus
sonhos matando nazistas, dizia ele. Minha mãe raramente dormia na cama,
ao contrário, sentava no escuro, no chão de nossa sala, espreitando para
fora da janela, como a manter uma vigília para perigos à frente. Minha irmã
e eu não éramos autorizados a tomar banho de chuveiros - apenas de
banheira - e me levou anos para entender o medo dos chuveiros de meus
430
pais.

As cicatrizes do passado não deixavam os que escaparam da morte


esquecerem os horrores dos campos nazistas e todas as lembranças ressurgiram
com a manifestação anunciada. A Prefeitura autorizou o protesto, mas voltou atrás
após grupos judeus exigirem a proibição do ato. A American Civil Liberties
Association (ACLU), reconhecida organização que luta pelos direitos civis, se
posicionou, para surpresa de muitos, a favor do grupo nazista, ao argumento de
defesa da liberdade de expressão. Com esse posicionamento, a ACLU perdeu cerca
de trinta mil associados.431 Tal impacto significante, especialmente no caso de uma
organização que vive de doações, evidencia a proporção que o caso tomou.
De um lado, defenderam-se conteúdos não aceitos pela maioria; de outro,
entendeu-se que o discurso de ódio não é tutelado constitucionalmente. Na
observação de Stephen Rohde:

[...] o caso verificaria se os direitos constitucionais pertencem apenas


àqueles que defendem pontos de vista aceitáveis ou também para aqueles

428
WINKLER, Joe. When the nazis came to Skokie. Jewish Telegraphic Agency, 20 June 2013.
Disponível em: <http://www.jta.org/2013/06/20/news-opinion/the-telegraph/nazis-marching-through-
skokie>. Acesso em: 12 dez. 2015.
429
HOROWITZ, Irving Louis; BRAMSON, Victoria Curtis. Skokie, the ACLU and the endurance of
democratic theory. Law and Contemporary Problems, n. 43. p. 328-349, Spring 1979. Disponível em:
<http://scholarship.law.duke.edu/lcp/vol43/iss2/17/> Acesso em: 15 fev. 2016. p. 329.
430
No original: “In our house, my father never made it through a night's sleep without waking up
several times, in his dreams killing Nazis, he said. My mother rarely slept in bed, instead sitting in the
dark on our living room floor, peering out the window, as if keeping a vigil for dangers ahead. My
sister and I were not allowed to take showers — only baths — and it took me years to understand my
parents' fear of them.” (REICH, Howard. Reawakening the ghosts of Skokie. Chicago Tribune,
Entertainment, 16 Jan. 2013. Disponível em: <http://www.chicagotribune.com>. Acesso em: 12 dez.
2015.
431
ROHDE, Stephen F. Freedom of assembly. New York: Facts On File, 2005. p. 85.
128

que levantam questões que são detestáveis e contrárias as mais enraizadas


432
opiniões da maioria dos americanos. (tradução nossa)

O banimento da marcha foi mantido na primeira instância e, na ocasião, a


Village of Skokie aprovou leis que requeriam um aviso prévio de 30 dias antes de
protestos, proibiam a exibição de símbolos ofensivos e a disseminação de qualquer
material que pudesse incitar o ódio em razão de raça, nacionalidade ou religião. A
Corte do Estado de Illinois não aceitou o recurso da ACLU por questões
processuais.433 O caso chegou até a Suprema Corte, que assegurou o direito de
qualquer um que seja restringido preventivamente de ser ouvido imediatamente,
considerando essa oitiva garantia constitucional e remeteu os autos à Regional, para
julgamento. Em seguida, a Corte regional analisou o mérito, concedeu a tutela
requerida pela ACLU e definiu como ilegal o ato da prefeitura que proibia a marcha e
a exibição da suástica. Assim, a realização dos protestos foi garantida pelo
Judiciário, com todos os símbolos que remetiam os sobreviventes aos horrores que
viveram na Europa.
O sentimento geral na comunidade era a determinação de pararem à força e
não aceitar a entrada da marcha nas ruas. Nas palavras de uma liderança local:
“Quando alguém quer marchar em sua cidade, com a intenção anunciada de matá-
lo, não há quase nada para se discutir”.434 Diante do diálogo impossível, tornava-se
previsível o desfecho da marcha nazista pelas ruas de Village of Skokie.
Após a decisão judicial favorável, os neonazistas decidiram realizar o ato,
mas em outro lugar, tendo a marcha acontecido em um parque de Chicago, sob a
indignação de manifestantes contrários.435 Na imagem a seguir é possível ver a linha
de policiais junto à população apenas por meio das pontas dos quepes, protegendo
a manifestação nazista ao fundo:

432
No original: “[…] it would test whether constitutional rights belongs only to those who espouse
acceptable views or also to those who stand for things that are hateful and contrary to the deepest
held views of a majority of Americans.” (ROHDE, Stephen F. Freedom of assembly. New York: Facts
On File, 2005. p. 85).
433
Ibid., p. 85.
434
No original: “When someone wants to come marching into your town, with the announced intention
to kill you, there was hardly anything left to discuss.” (REICH, Howard. Reawakening the ghosts of
Skokie. Chicago Tribune, 16 Jan. 2013. Disponível em: <http://www.chicagotribune.com>. Acesso
em: 12 dez. 2015.
435
HOROWITZ, Irving Louis; BRAMSON, Victoria Curtis. Skokie, the ACLU and the endurance of
democratic theory. Law and Contemporary Problems, n. 43. p. 328-349, Spring 1979. Disponível em:
<http://scholarship.law.duke.edu/lcp/vol43/iss2/17/> Acesso em: 15 fev. 2016. p. 330.
129

Figura 16 – Polícia garantindo o direito de manifestação dos neonazistas.

436
Fonte: Victora Bekiempis.

Os estudos jurídicos, por vezes, desprezam os reflexos das leis e das


decisões judiciais na vida das pessoas, mas, se o Direito pretende contribuir para o
convívio social, é preciso que ele seja analisado em toda sua complexidade e isso
se torna possível ao colocar na mesa todas as cartas: as tensões latentes, as
histórias dos conflitos ou a forma como a polícia pode cumprir determinadas ordens
judiciais. Todas as consequências devem ser ponderadas em busca da melhor
forma de acomodar os conflitos. Assim como é questionável a possibilidade de não
cumprimento de decisão judicial por falta de meios do Executivo, também não
parece ser a melhor alternativa retirar de forma imprudente policiais de outros
bairros para viabilizar protesto de dez ou vinte pessoas, em virtude da animosidade
que a realização dele em um lugar específico pode fomentar, como provavelmente
aconteceria com os neonazistas em Skokie. Para conseguir proteger a marcha
nazista, deveria ser levado em consideração, além do número de manifestantes, em
especial a quantidade e a disposição para o confronto daqueles contrários ao
protesto, o que demonstra a dificuldade que envolveria a realização da ordem
judicial. São questões que análises jurídicas apartadas da vida real não conseguem
perceber.
Olhar para o Direito no mundo dos fatos ainda aponta outros desafios para as
intervenções jurídico-formais em manifestações. Conforme lembra Marc Galanter:

[...] é preciso notar que os tribunais apenas resolvem uma ínfima parte de
todos os conflitos cuja resolução lhes é pedida. É preciso dar-se conta,

436
BEKIEMPIS, Victora. Why the ACLU is right to represent the Ku Klux Klan. The Guardian Website,
29 jun. 2012. Disponível em: <http://www.theguardian.com>. Acesso em: 23 jun. 2016.
130

também, que esses próprios conflitos apenas constituem uma ínfima parte
de todos os conflitos de interesses cuja resolução se possa conceber pedir
ao tribunal e uma parte ainda menor do conjunto de litígios que se
437
produzem na sociedade.

Pequena parcela dos encontros ou desencontros em sede do direito de


reunião alcançam as vias formais do Judiciário. Mesmo assim, quando isso ocorre,
não são poucos os óbices para os efeitos práticos das medidas concedidas. O caso
das Marchas da Maconha438 em São Paulo são emblemáticos nesse sentido, pois,
tanto a Marcha do ano de 2009439 quanto a de 2010440 foram proibidas em primeira
instância e analisadas pelo Tribunal de Justiça apenas quando já haviam perdido o
objeto. A dinâmica da vida e dos protestos exigem uma resposta imediata, para a
qual a via judiciária pode mostrar-se inadequada. Além disso, a decisão de primeira
instância que proibia o ato não evitou que conflitos ocorressem,441 o que também
pôde ser percebido pela incapacidade da decisão do Supremo Tribunal Federal,442
que deu entendimento favorável à marcha, de garantir que nos anos seguintes as
marchas fossem pacíficas como espera a Constituição.443
As observações evidenciam a necessidade de uma polícia que saiba lidar
com os protestos e seus conflitos, tendo em vista a pouca efetividade da via judicial.
Portanto, os julgados parecem ter maior utilidade em suas contribuições a futuras
decisões da polícia do que propriamente com o caso em questão.

5.1 A Doutrina do Fórum Público na Suprema Corte dos Estados Unidos

Nos capítulos 2, 3 e 4, a análise do direito de reunião foi realizada tendo por


referência os textos da Constituição e das leis, que podem não coincidir com a

437
GALANTER, Marc. A justiça não se encontra apenas nas decisões dos tribunais. HESPANHA,
Antonio Manuel Hespanha. Justiça e Litigiosidade: história e prospectiva. Lisboa: Fundação
Calouste Gulbenkian, 1993. p. 67.
438
Nome pelo qual ficaram conhecidas as manifestações que questionam a proibição dos derivados
da cannabis.
439
SÃO PAULO. Tribunal de Justiça. Mandado de Segurança 0103416-72.2009.8.26.0000
(990.09.103416-9). Relator: Maria Tereza do Amaral. São Paulo, 17 de mar. 2010. Disponível em:
<http://www.tjsp.jus.br>. Acesso em: 24 jun. 2016.
440
SÃO PAULO. Tribunal de Justiça. Mandado de Segurança 0235543-37.2010.8.26.0000
(990.10.235543-8). Relator: Sérgio Ribas. São Paulo, 22 de jul. 2010. Disponível em: <
https://www.tjsp.jus.br>. Acesso em: 24 jun. 2016.
441
ABOS, Márcia. Marcha da Maconha acaba em conflito com a Polícia Militar. O Globo Website, 21
jun. 2011. Disponível em: <http://oglobo.globo.com>. Acesso em: 24 jun. 2016.
442
Ver à frente, tópico 5.3, sobre a decisão do STF na ADPF nº 187.
443
TOMÉ, Pedro Ivo. Policiais e manifestantes entram em conflito, mas Marcha da Maconha segue.
Folha de São Paulo, 8 jun. 2013. Disponível em: <http://www.folha.uol.com.br >. Acesso em: 24 jun.
2016.
131

concreção do direito. Na função jurisdicional, a pluralidade abstrata e genérica das


leis dá lugar a uma decisão específica, na qual o direito legislado é aplicado às
circunstâncias fáticas. Por isso, consubstancia-se em uma expressão do fenômeno
jurídico com maior grau de certeza, diz Mônica Sette Lopes.444
Nos sistemas jurídicos fundados nos séculos XIX e XX, o Poder Judiciário era
um órgão secundário.445 Apesar de a história do constitucionalismo e do controle de
constitucionalidade não se confundirem, por vezes, ambas se cruzam. Para o atual
estágio do constitucionalismo, o precedente da Suprema Corte estadunidense
Marbury v. Madison446 é um marco na prevalência do controle judicial sobre o
legislador.447 Pelo menos, desde então, ao decidir um caso em particular, a corte
constitucional americana define o real sentido dos direitos constitucionais.
Valendo-se dessa supremacia na interpretação da Constituição, a Suprema
Corte Americana produziu julgados que buscam densificar os reais contornos do
direito fundamental de reunir-se em prol de determinada causa. Vale notar que o
processo de independência das trezes colônias britânicas na América do Norte foi
marcado por protestos e reuniões de colonos.448 Portanto, o exercício do direito de
reunião antecede a própria Constituição. Talvez, por isso, a previsão do direito de
reunião na Primeira Emenda da Constituição dos Estados Unidos da América, ao
invés de descrever a garantia do direito de reunião, utilize a expressão contrária,
proibindo que o Congresso faça normas que o restrinjam: “O Congresso não deverá
fazer leis [...] cerceando a liberdade de expressão ou de imprensa; ou o direito do
povo se reunir pacificamente [...]” (tradução nossa).449
A partir de uma série de precedentes,450 a Suprema Corte desenvolveu o que
se denomina doutrina do fórum público,451 que teve destacado impulso durante a

444
LOPES, Mônica Sette. A equidade e os poderes do juiz. Belo Horizonte: Del Rey, 1993. p. 29.
445
OLIVEIRA, Márcio Luís de. A Constituição juridicamente adequada: Transformações do
constitucionalismo e atualização principiológica dos direitos, garantias e deveres fundamentais. Belo
Horizonte: Arraes Editores, 2013. p. 141.
446
US SUPREME COURT. Marbury v. Madison, 5 US 137 (1803). Justia Website. Disponível em:
<https://supreme.justia.com/cases/federal/us/5/137/case.html>. Acesso em: 26 jun. 2016.
447
MENDES, Conrado Hübner. Controle de Constitucionalidade e Democracia. Rio de Janeiro:
Elsevier, 2008. p. 14.
448
ROHDE, Stephen F. Freedom of assembly. New York: Facts On File, 2005. p. 3-7.
449
No original: “Congress shall make no law [...] or abridging the freedom of speech, or of the press;
or the right of the people peaceably to assemble [...]” (UNITED STATES. Constitution of United
States. Disponível em: <http://www.senate.gov/civics/constitution_item/constitution.htm>. Acesso
em: 29 abr. 2016)
450
Cf. entre outros, De Jonge v. Oregon 299 US 353 (1937), Hague v. Committee for Industrial
Organization 307 US 496 (1939), Thornhill v. Alabama 310 US 88 (1940), Cox v. Louisiana 379 US
536 (1965), Gregory v. City of Chicago 394 US 111 (1969), Police Department of the City of Chicago
132

luta pelos direitos civis nos Estados Unidos nas décadas de 60, 70 e 80 do século
XX.452 Nesse esquema teórico, os espaços públicos são divididos em três categorias
quanto à sua utilização costumeira. Os primeiros são os tradicionalmente
reconhecidos como fórum público (traditional public forums), como ruas, parques
abertos e passeios, nos quais o governo não pode restringir protestos com base no
conteúdo da fala, embora possa impor limites razoáveis de tempo, lugar e modo às
manifestações. A segunda categoria seria composta pelos lugares reconhecidos
como fóruns púbicos limitados (limited public forum), que são aqueles previamente
restritos, por exemplo, em horário ou propósito da atividade, como aeroportos,
lugares de reuniões das universidades e teatros municipais. Desde que abertos ao
público, mantêm-se os mesmos parâmetros da primeira categoria. Os lugares não-
públicos (nonpublic forum) estariam abarcados pelo terceiro tipo, caracterizando
aqueles que não são designados nem tradicionalmente utilizados para a liberdade
de expressão. Nestes, o governo pode fazer outras restrições além das anteriores,
de acordo com a finalidade do lugar se, por exemplo, a manifestação atrapalhar o
funcionamento regular do local.
Assim, os precedentes da Suprema Corte reconhecem a possibilidade de o
governo regular o uso dos lugares sob sua circunscrição, o que viabiliza a exigência
de autorização prévia para protestos em certos espaços, como o já mencionado
modelo de Nova Iorque, estudado por Lisa Keller.453
Em seus julgados, a corte constitucional americana busca estabelecer um
equilíbrio caso a caso entre o poder do Governo de intervir no direito de reunião e os

v. Mosley 408 US 92 (1972), Davis v. Massachusetts 167 US 43 (1897), Cornelius v. NAACP Legal
Defense & Education Fund, Inc. 473 US 788 (1985).
451
Cf., entre outros, SNYDER, John V. Forum over substance: Cornelius v. NAACP Legal Defense &
Education Found. Catholic University Law Review, v. 35, i. 1. p. 307-333, Fall 1985; McPHAIL, Clark;
SCHWEINGRUBER, David; McCARTHY, John. Policing Protest in the United States: 1960-1995.
DELLA PORTA, Donatella; REITER, Herbert. (Org). Policing protest: The control of mass
demonstrations in western democracies. Minneapolis: University of Minnesota Press; DELLA
PORTA, Donatella; REITER, Herbert. (Org). Policing protest: The control of mass demonstrations in
western democracies. Minneapolis: University of Minnesota Press, 1998; INAZU, John D. The First
Amendment’s public forum. William & Mary Law Review, v. 56, i. 4. p. 1159-1197, 2015. Disponível
em: <http://scholarship.law.wm.edu/wmlr/vol56/iss4/5>. Acesso em: 22 fev. 2016.
452
McPHAIL, Clark; SCHWEINGRUBER, David; McCARTHY, John. Policing Protest in the United
States: 1960-1995. DELLA PORTA, Donatella; REITER, Herbert. (Org). Policing protest: The control
of mass demonstrations in western democracies. Minneapolis: University of Minnesota Press;
DELLA PORTA, Donatella; REITER, Herbert. (Org). Policing protest: The control of mass
demonstrations in western democracies. Minneapolis: University of Minnesota Press. p. 57.
453
KELLER, Lisa. Triumph of order: Democracy & public space in New York and London. New York:
Columbia University Press, 2009.
133

direitos da Primeira Emenda, ao invés de negar tal possibilidade. Em síntese de


John Snyder, a doutrina do fórum público é:

[...] um dispositivo usado para avaliar a constitucionalidade da regulação na


atividade expressiva nas propriedades do Governo, equilibrando os direitos
da primeira emenda contra o poder do Governo para restringir o uso da
propriedade de acordo com sua finalidade. Sob a análise da doutrina do
fórum público, o poder do Governo para regular o discurso depende em
grande medida do grau em que esse discurso iria interferir no uso que o
Governo pretende para a propriedade e a natureza pública e não-pública da
454
propriedade.

Em uma visão geral, pode-se afirmar que há uma especial consideração com
a liberdade de expressão, como visto no caso da manifestação neonazista relatada
anteriormente. Nesse sentido, a Suprema Corte deixa expressa a inadmissibilidade
de restrições baseadas no conteúdo das mensagens. Em alguns casos, a corte
decidiu se a fundamentação do Governo para restringir a reunião se baseou de fato
na doutrina do fórum público ou se, por trás da aparente justificativa, ocorreu uma
restrição à liberdade de expressão, como no caso Brown v. Louisiana455. Nesse
precedente, cinco jovens foram presos quando faziam um protesto silencioso na sala
de leitura de uma biblioteca pública. A Corte considerou que, apesar de o local não
ser tradicionalmente utilizado como fórum público, o que legitimaria a restrição, o
protesto simbólico foi proibido porque os jovens eram negros, já que a utilização do
espaço foi realizada em conformidade com seu uso habitual, silenciosamente.
Julgados como este mostram que, apesar de ser instrumento para analisar se há ou
não uma violação do direito de reunião, o modelo do fórum público não é isento de
riscos. Como demonstra John Inazu, é possível esvaziar a própria ideia de protesto
utilizando argumentos a partir das restrições de tempo, lugar e modo.456
Mesmo após os anos 80, a Suprema Corte continuou detalhando sua
jurisprudência sobre o direito de reunião. Para citar apenas dois casos, em Hurley

454
No original: “[...] a device used to evaluate the constitutionality of regulating expressive activity on
government property by balancing the mandates of the first amendment against the government’s
power to restrict the use of property to its intended purpose. Under forum analysis, the government’s
power to regulate speech depends largely on the degree to which that speech would interfere with
the use the government intends for the forum property and the public and nonpublic nature of
property.” (SNYDER, John V. Forum over substance: Cornelius v. NAACP Legal Defense &
Education Found. Catholic University Law Review, v. 35, i. 1. p. 307-333, Fall 1985. p. 308)
455
US SUPREME COURT. Brown v. Louisiana 383 US 131 (1966). Justia Website. Disponível em:
<https://supreme.justia.com/cases/federal/us/383/131/>. Acesso em: 24 jun. 2016.
456
INAZU, John D. The First Amendment’s public forum. William & Mary Law Review, v. 56, i. 4. p.
1159-1197, 2015. Disponível em: <http://scholarship.law.wm.edu/wmlr/vol56/iss4/5>. Acesso em: 22
fev. 2016. p. 1180-1182.
134

vs. Irish-American Gay, Lesbian and Bisexual Group457 a Corte decidiu que os
organizadores de uma marcha podem recusar a participação de pessoas em seus
protestos; e, no Hill v. Colorado,458 manifestantes contrários ao aborto foram
proibidos de permanecer no passeio de uma clínica que realiza o procedimento,
apesar do local ser considerado fórum público.
Portanto, de um modo geral, a jurisprudência da Suprema Corte Americana
indica que são possíveis restrições ao direito de reunião por parte de autoridades
públicas no que concerne a duração/horário, ao local e aos meios utilizados pelos
manifestantes, proibindo apenas limitações quanto ao conteúdo das manifestações.

5.2 A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal

As revoltas e protestos no Brasil têm inusitado caso de ativismo judicial. A


história é narrada por Luciano Mendonça Lima em artigo sobre o movimento social e
político que aconteceu de outubro de 1874 a fevereiro do ano seguinte.459
No contexto da crise da sociedade imperial, as ações de persuasão e
repressão estatais materializavam-se em leis regulamentadoras e no combate à
vadiagem.460 Assim, criou-se um estigma entre as camadas populares, que
recebiam as novidades do governo com certa desconfiança. Quase sempre, as
mudanças anunciadas pelo Estado ocorriam em prejuízo dos mais pobres, como,
por exemplo, a Lei do recrutamento militar de 1874, percebida como instrumento
para transformar os filhos do povo em escravos.461 Outra das novidades que se via
com suspeição foi o decreto de padronização do sistema métrico decimal, que
datava de 1862, mas efetivara-se somente em 1874.
À época, a cidade de Campina Grande possuía em torno de 15 mil
habitantes em uma área na qual as noções de urbano e rural não possuía entre elas
a clivagem hoje existente. Ainda assim, era possível identificar certo núcleo urbano-

457
US SUPREME COURT. Hurley v. Irish-American Gay, Lesbian & Bisexual Group of Boston, Inc.
515 US 557 (1995). Justia Website. Disponível em:
<https://supreme.justia.com/cases/federal/us/515/557/case.html>. Acesso em: 24 jun. 2016.
458
US SUPREME COURT. Hill v. Colorado 530 US 703 (2000). Justia Website. Disponível em:
<https://supreme.justia.com/cases/federal/us/530/703/case.html>. Acesso em: 24 jun. 2016.
459
LIMA, Luciano Mendonça de. Quebra-Quilos: uma revolta popular na periferia do império. In:
DANTAS, Mônica Duarte (Org.). Revoltas, motins, revoluções: Homens livres, pobres e libertos no
Brasil do século XIX. São Paulo: Alameda, 2011. p. 449-483.
460
Ibid.. p. 454.
461
LIMA, Luciano Mendonça de. Quebra-Quilos: uma revolta popular na periferia do império. In:
DANTAS, Mônica Duarte (Org.). Revoltas, motins, revoluções: Homens livres, pobres e libertos no
Brasil do século XIX. São Paulo: Alameda, 2011. p. 456.
135

comercial característico do fim do século XIX, com pouco mais de trezentos


casebres e alguns poucos sobrados, distribuídos em três largos, quatro ruas e oito
becos.462 Havia de forma latente na cidade um clima de insubordinação, no qual
cobradores de impostos não conseguiam levar a cabo seu ofício previsto em lei e a
reclamação dos pobres sobre as últimas novidades baixadas pelo governo era
constante.463
Em 31 de outubro de 1874, após a fuga de um cobrador de tributo que não
conseguia cumprir seu dever por causa da resistência popular, a lista dos devedores
fixada em praça pública foi rasgada. Nos dias seguintes, fatos similares
aconteceram e o juiz de direito da localidade, Antonio de Trindade de Antunes Meira
Henriques, reuniu um grupo armado e conseguiu reestabelecer a ordem.
No dia 14 de novembro, um novo incidente envolvendo um coletor e um
feirante precisou de intervenção policial. O delegado chegou ao local com pouca
tolerância para o diálogo, que resultou em vários populares feridos e na lesão das
três praças de polícia da cidade e do próprio delegado.464 Segundo Luciano Lima, ao
saber do ocorrido, o magistrado “[...] se dirigiu ao palco dos acontecimentos para
persuadir os ‘cidadãos de bem’, no sentido de colaborarem para o restabelecimento
da ordem pública, o que depois de muito esforço parece ter conseguido”.465
Apesar do momentâneo apaziguamento, atos semelhantes voltaram a
acontecer, e em 21 de novembro um líder do movimento foi chamado até a casa do
vigário onde se encontrava o juiz, o próprio vigário e outras autoridades locais.
Enquanto a negociação acontecia na casa do líder religioso, os distúrbios se
espalhavam na rua e os populares gritavam palavras de ordens como “abaixo os
impostos e viva a religião católica”, ao mesmo tempo em que quebravam todos os
pesos e medidas do novo modelo estabelecido pelo Império, como de as camadas
populares demonstrarem sua recursa aos novos padrões.
A situação escapou ao controle das autoridades e até presos da cadeia
pública foram arrebatados. Os policiais da guarda dos presos entregaram as armas
e juntaram-se aos revoltosos. Outro grupo saía pela rua bradando viva à República e
desafiando as autoridades. Durante a noite, o proativo juiz organizou uma fuga da
cidade. Com a cidade entregue aos populares, grupos de pessoas entraram em

462
Ibid.. p. 459.
463
Ibid.. p. 457.
464
Ibid.. p. 462.
465
Ibid.. p. 462.
136

cartórios, na casa do juiz e na loja maçônica para queimar livros e papéis.466


Adentraram também na câmara municipal, onde ficavam guardados os novos
padrões de pesos e medidas, e não deixaram pedra sobre pedra. Sem as antigas
autoridades, os sediciosos recusavam-se a usar o que chamavam de medidas
estrangeiras e voltaram a comprar e vender com os pesos e medidas antigos.
Campina Grande foi epicentro dos fatos, mas os distúrbios se espalharam por 78
vilas ou cidades de quatro províncias do Império: Paraíba, Pernambuco, Rio Grande
do Norte e Alagoas.467
Na Revolta que ficou conhecida como Quebra-Quilos, segundo Luciano
Lima, o espírito reformador das leis escritas foi rechaçado pela população,
acostumada a certos padrões de vida comunitária:

O Quebra-Quilos, antes de tudo, uma espécie de reação das populações


pobres e livres contra um surto de modernização que naquele momento se
processava e que se expressava num conjunto de medidas de caráter
racionalizador. Este processo – comandando por setores ligados à própria
burocracia do Estado imperial e segmentos das elites proprietárias –
alterava aspectos significativos da vida cotidiana das populações pobres do
campo e da cidade. [...] Nesse contexto, ia se estabelecendo um processo
de tensão cada vez mais crescente entre uma ordem burocrática e letrada,
e um mundo tradicional ainda fortemente caracterizado pela oralidade e
informalidade. É, portanto, sintomática a ação dos populares quebrarem os
pesos e medidas, queimarem uma série de papéis e hostilizarem algumas
468
autoridades.

Se, nesse raro caso de ativismo do juiz de direito, a ordenação estatal, os


policiais e o próprio magistrado foram rechaçados pela população, alguns anos após
a Revolta do Quebra-Quilos a tendência ao minimalismo ou formalismo nos
precedentes do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre o direito de reunião começou
a se formar.
Fazer um levantamento acerca da jurisprudência do direito de reunião no
Brasil conduz à percepção já indicada por Fernando Dias Menezes de Almeida
acerca do número reduzido de casos existentes. Segundo o autor, a principal
explicação seria a solução imediata que a situação exige e, consequentemente, a
inadequação prática da tutela judicial.469

466
LIMA, Luciano Mendonça de. Quebra-Quilos: uma revolta popular na periferia do império. In:
DANTAS, Mônica Duarte (Org.). Revoltas, motins, revoluções: Homens livres, pobres e libertos no
Brasil do século XIX. São Paulo: Alameda, 2011. p. 462-467.
467
Ibid.. p. 453, 452, 468.
468
Ibid.. p. 469.
469
ALMEIDA, Fernando Dias Menezes de. Liberdade de reunião. São Paulo: Max Limonad, 2001. p.
291-292.
137

Após estudar os precedentes, Fernando Almeida dividiu em quatro linhas a


jurisprudência: a) reuniões de caráter político, do início do século XX; b) reuniões de
caráter religioso, no início do século XX; c) reuniões do Partido Comunista, da
década de 1940; e d) jurisprudência após 1950. Considerando o direito de reunião a
partir da atuação concreta da polícia, os julgados investigados pouco contribuem
para definir de forma precisa os contornos e limites do direito de reunião nos
conflitos atualmente enfrentados nas ruas das grandes cidades, sobretudo se
considerarmos que tais precedentes precisariam ser analisados sob as luzes da
Constituição de 1988.
Alguns casos ganharam mais notoriedade. Um deles foi o Habeas Corpus
(HC) nº 936 de 1897, que foi impetrado em virtude do fechamento policial do Centro
Monarquista de São Paulo, ao argumento de ser esta uma entidade subversiva.
Conforme lembra Maria Fernanda Salcedo Repolês, foi alegada violação ao direito
de reunião, porém, a decisão da autoridade policial foi mantida pelo STF, que
considerou o Centro como perigoso à segurança dos poderes instituídos da recém
implantada república.470
Outro caso que também ficou famoso foi o das eleições presidenciais de
1919. No HC nº 4.781 de 1919, Ruy Barbosa conseguiu a ordem para assegurar seu
direito de reunião na campanha eleitoral, ante a negativa de autoridades estaduais,
que tentaram impedi-lo de realizar comícios na Bahia. Nesse caso, o STF assegurou
que Ruy Barbosa e seus correligionários poderiam se reunir em praças, ruas, teatros
e lugares públicos.
Apesar das muitas dúvidas sobre o regime jurídico dos protestos no Brasil,
mesmo em julgados mais recentes, posteriores à Constituição de 1988, o STF
parece privilegiar a discussão em torno do conteúdo das manifestações, em
detrimento de outros pontos da dogmática do direito de reunião. A Ação de
Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) nº 187, que ficou conhecida
como “Marcha da Maconha”, exemplifica tal postura. Nesse caso, o Supremo decidiu
que as manifestações que expressarem mensagem favoráveis à descriminalização
do uso e consumo de drogas não configuram o crime de apologia, como decidia
considerável parcela dos juízes e desembargadores. Portanto, de forma objetiva,

470
REPOLÊS, Maria Fernanda Salcedo. Quem deve ser o Guardião da Constituição? Do Poder
Moderador ao Supremo Tribunal Federal. Belo Horizonte: Mandamentos, 2008. p. 89-91.
138

pode-se dizer que foi estabelecida a constitucionalidade de protestos sobre política


criminal.
Exceção, em certo sentido, parece ser a ADI nº 1.969-DF, na qual a
discussão sobre o modo e o lugar do exercício do direito de reunião, assim como a
forma de regulamentação, apareceram. A partir da competência para expedir atos
normativos,471 o governador do Distrito Federal publicou o Decreto nº 20.007/99, que
proibia quaisquer manifestações na Praça dos Três Poderes, na Esplanada dos
Ministérios e na Praça do Buriti.472 Contra o ato, foi ajuizada a ADI nº1.944-DF,
prejudicada pela perda do objeto em virtude de um novo ato do governador que
tornava sem efeitos o primeiro.
O novo decreto, nº 20.010/99, além de revogar o anterior, mencionava em
seus considerandos que a norma precedente precisava ser revista, a fim de
balancear o direito de reunião com outros preceitos democráticos e
473
infraconstitucionais. Reduzindo a proibição do primeiro decreto, o novo ato
normativo vetava apenas manifestações com carro de som ou assemelhados, ao
invés de proibir quaisquer manifestações nos lugares mencionados, como fazia o
anterior, embora tenha mantido a dimensão especial do decreto revogado.474 Contra
esse novo decreto foi ajuizada a ADI nº 1.947.

471
“Art. 100. Compete Privativamente ao Governador do Distrito Federal: [...] VII – sancionar,
promulgar e fazer publicar as leis, bem como expedir decretos e regulamentos para sua fiel
execução” (DISTRITO FEDERAL. Lei Orgânica do Distrito Federal, de 8 de junho de 1993. Diário
Oficial do Distrito Federal, 9 jun. 1993. Disponível em: <http://www.senado.leg.br>. Acesso em: 24
jun. 2016)
472 o
“Art. 1 – Fica vedada a realização de qualquer manifestação pública, exceto as de caráter cívico-
militar, religioso e cultural, nos locais a seguir descritos: I – Praça dos Três Poderes; Esplanada dos
o
Ministérios; Praça do Buriti. Art. 2 – Este decreto entra em vigor na data de sua publicação”
(DISTRITO FEDERAL. Decreto nº 20.007, de 14 de janeiro de 1999. Disciplina as manifestações
públicas em locais que menciona. Diário Oficial do Distrito Federal, 15 jan. 1999. Disponível em:
<http://www.tc.df.gov.br>. Acesso em: 24 jun. 2016)
473 o
“Considerando que o disposto no art. 5 , XVI, da Constituição Federal há que ser exercitado em
conjunto com a legislação infraconstitucional; Considerando, também, que a questão da livre
reunião merece um disciplinamento, de molde a que esteja sempre presente o respeito mútuo, sem
que seja agredido os postulados básicos da democracia; Considerando, finalmente, que o Decreto
n. 20.007, de 14 de janeiro de 1999, está a merecer uma revisão para que se possa adequá-la aos
ditames dos supracitados considerandos” (DISTRITO FEDERAL. Decreto nº 20.010, de 20 de
janeiro de 1999. Disciplina as manifestações públicas em locais que menciona. Diário Oficial do
Distrito Federal, 21 jan. 1999. Disponível em: <http://www.tc.df.gov.br>. Acesso em: 24 jun. 2016)
474 o
“Art. 1 – Fica vedada, com a utilização de carro de som ou assemelhados, a realização de
manifestações públicas, nos locais abaixo descriminados: I – Praça dos Três Poderes; II –
o
Esplanada dos Ministérios; III – Praça do buriti. Art. 2 – Este decreto entra em vigor na data de sua
publicação” (DISTRITO FEDERAL. Decreto nº 20.010, de 20 de janeiro de 1999. Disciplina as
manifestações públicas em locais que menciona. Diário Oficial do Distrito Federal, 21 jan. 1999.
Disponível em: <http://www.tc.df.gov.br>. Acesso em: 24 jun. 2016)
139

Outra vez mais, antes da análise do mérito da ADI, o governador editou


novo decreto que revogava o anterior e reestabelecia a restrição ao direito de
reunião. Todavia, no novo ato, Decreto nº 20.098, o conteúdo jurídico da restrição
era, grosso modo, o mesmo do ato anterior.475 Esse último foi o objeto da ADI nº
1.969, que teve o mérito finalmente analisado.
Assim, em apenas dois meses, o governo do Distrito Federal editou três
decretos sobre a regulamentação do direito de reunião. No primeiro, proibia qualquer
manifestações nos lugares mencionados, independentemente da duração dos
protestos ou do modo como ocorreriam. O segundo, tendo por base os mesmos
lugares, permitia protestos, mas proibia que fossem utilizados carros de som. Se do
primeiro para o segundo Decreto alterou-se o conteúdo do ato, o que poderia levar a
crer que a revogação não foi feita para prejudicar a análise do mérito da questão
pelo STF, do segundo para o terceiro o argumento da chicana ganhou força, o que
parece ter refletido na análise da ação.
O julgado teve como relator o ministro Ricardo Lewandowski, para quem a
redação dos limites e condições do direito de reunião na CRFB/88 foi
parcimoniosa,476 ressaltando que o direito de reunião, apesar de extremamente
importante para uma democracia, não é absoluto.477 O conflito de direitos como
fundamento para relativização do direito de reunião é exposto pelo relator ao
destacar que manifestações sonoras nas imediações de hospitais podem prejudicar
a saúde e a recuperação de pacientes. Nesses casos, restringir carros, aparelhos e
objetos sonoros seria razoável.478 Todavia, o ministro afirma que, no caso em

475 o
“Art. 1 – Fica vedada a realização de manifestações públicas, com a utilização de carros,
aparelhos e objetos sonoros na Praça dos Três Poderes, Esplanada dos Ministérios e Praça do
buriti e vias adjacentes.” (DISTRITO FEDERAL. Decreto nº 20.098, de 15 de março de 1999.
Disciplina as manifestações públicas em locais que menciona. Diário Oficial do Distrito Federal, 16
mar. 1999. Disponível em: <http://www.tc.df.gov.br>. Acesso em: 24 jun. 2016)
476
“A chamada Constituição cidadã, promulgada em 1988, na senda aberta pelas cartas anteriores,
o
ao mesmo tempo em que garantiu a liberdade de reunião, no art. 5 , XVI, estabeleceu, no próprio
texto magno, de forma parcimoniosa, os limites e condições para o seu exercício, quais sejam,
‘reunir-se pacificamente’, ‘sem armas’, ‘que não frustrem outra reunião anteriormente convocada
para o mesmo local’ e o ‘prévio aviso à autoridade competente’.” (BRASIL. Supremo Tribunal
Federal. ADI nº 1.969-4/DF. Voto do Relator, Min. Ricardo Lewandowski, Tribunal Pleno, julgado em
28/06/2007, DJe-092 public 31-08-2007. Disponível em: <http://www.stf.jus.br>. Acesso em: 24 jun.
2016. p. 376-377)
477
“Não se ignora, é verdade, que a liberdade de reunião não é um direito absoluto. Nenhum direito,
aliás, o é. Até mesmo os direitos havidos como fundamentais encontram limites explícitos e
implícitos no texto das constituições” (Ibid.. p. 377)
478
“Ora, certo que uma manifestação sonora nas imediações de hospitais afetaria a tranquilidade
necessária a esse tipo de ambiente, podendo, até mesmo causar prejuízo irreparáveis aos
pacientes. Ter-se-ia, nesse caso, uma hipótese de colisão entre direitos fundamentais, na qual o
direito dos pacientes à recuperação da saúde certamente prevaleceria sobre o direito de reunião
140

análise, proibir os carros de som nas praças mencionadas seria o mesmo que proibir
as próprias manifestações.479 Lewandowski também menciona a comunicação à
autoridade competente prevista na Constituição, que serve para que a administração
pública possa se organizar de modo a não deixar que as manifestações inviabilizem
o fluxo de pessoas e veículos.480 Por fim, votou pela inconstitucionalidade do
decreto, cuja restrição havia sido inadequada, desnecessária e desproporcional face
à vontade da Constituição.481
O Ministro Eros Grau, por sua vez, afirmou que há uma inconstitucionalidade
formal no decreto, o que prejudica considerações sobre o mérito. Para esse ministro,
o direito de reunião poderia até ser regulamentado, mas apenas por lei, jamais por
ato normativo do Executivo.482
O ministro Celso de Melo em oito folhas discute a legitimidade de um dos
requerentes para a ADI, em um parágrafo parabeniza o relator, em três fala da
importância do direito de reunião e num último parágrafo acompanha o voto do
Lewandowski. Por sua vez, o ministro Ayres Brito entendeu que o próprio inciso XVI
do art. 5º já indicaria todas as condições para seu exercício.483 O ministro Cezar
Peluso, sem tecer considerações, acompanhou o relator.

com tais características. Numa situação como essa, a restrição ao uso de carros, aparelhos e
objetos sonoros mostrar-se-ia perfeitamente razoável” (Ibid.. p. 378)
479
“Na verdade, o Decreto distrital 20.098/99 simplesmente inviabiliza a liberdade de reunião e de
manifestação [...] Proibir a utilização ‘de carros, aparelhos e objetos sonoros’, nesse e em outros
espaços públicos que o Decreto vergastado discrimina, inviabilizaria por completo a livre expressão
do pensamento nas reuniões levadas a efeito nesses locais, porque as tornaria emudecidas, sem
qualquer eficácia para os propósitos pretendidos” (Ibid.. p. 379)
480
“Ademais, analisando-se a questão sob uma ótica pragmática, cumpre considerar que as reuniões
devem ser, segundo a dicção constitucional previamente comunicadas às autoridades competentes,
que haverão de organizá-las de modo a não inviabilizar o fluxo de pessoas e veículos pelas vias
públicas” (Ibid.. p. 380)
481
“A restrição ao direito de reunião estabelecida pelo Decreto distrital 20.098/99, a toda evidência,
mostra-se inadequada, desnecessária, e desproporcional quando confrontada com a vontade da
Constituição (Wille zur Verfassung), que é, no caso presente caso, a permitir que todos os cidadãos
possam reunir-se pacificamente para fins lícitos, expressando as suas opiniões livremente” (Ibid.. p.
381-382)
482
“O direito de reunião pode até ser regulamentado, mas não pode decreto, só por lei. Com relação
aos aspectos materiais, reservo-me de qualquer consideração. A razão fundamental que me leva a
votar pela inconstitucionalidade é não haver sentido na regulação da matéria por um decerto. Há
inconstitucionalidade formal, que prejudica a consideração sobre o aspecto material.” (BRASIL.
Supremo Tribunal Federal. ADI nº 1.969-4/DF. Inteiro Teor. Rel. Min. Ricardo Lewandowski,
Tribunal Pleno, julgado em 28/06/2007, DJe-092 public 31-08-2007. Disponível em:
<http://www.stf.jus.br>. Acesso em: 24 jun. 2016. p. 383)
483
“Relativamente à matéria, a Constituição brasileira é tão enfática e comprometida com a liberdade
de reunião, que chega a ser regulamentar. Num dispositivo de eficácia plena, quanto ao seu teor de
normatividade, ela não só consagra o direito de reunião como também, por conta própria, indica
todas as condições para o exercício desse direito.” (Ibid.. p. 394)
141

Em sentido contrário a Ayres Brito, o ministro Gilmar Mendes indicou


algumas questões no direito de reunião que poderiam estar pendentes de
regulamentação. Nesse sentido, afirmou a possibilidade de, eventualmente, o
legislador estabelecer algum tipo de limitação no caso de conflito de direitos e até
mesmo uma possível intervenção da polícia nessas hipóteses.484 Apontou também a
necessidade de se definir quem é a autoridade competente prevista no inciso XVI do
art. 5º,485 assim como a questão da concorrência de direitos que poderia levar a
alguma regulamentação.486 Portanto, para Gilmar Mendes, mesmo diante da
omissão do legislador constituinte, haveria reserva legal implícita, in casu.
Em seu voto, Sepúlveda Pertence afirmou que o decreto é materialmente
inconstitucional487 e que não saberia precisar se a possibilidade de lei regulamentar
significaria vedação absoluta a regulações legais.488
Os ministros Joaquim Barbosa e Marco Aurélio não estavam na sessão e a
presidente Ellen Gracie acompanhou o relator. Assim, por unanimidade, foi
declarado inconstitucional o decreto.
Mesmo não possuindo efeitos erga omnes, alguns dos argumentos
utilizados podem indicar a real extensão do direito de reunião. Além disso, temas
como conflitos e concorrência de direitos, intervenção da polícia, possibilidade e
forma de regulamentação legal das manifestações foram suscitados. Ir além da
484
“Gostaria de deixar uma ressalva para a hipótese ou necessidade de que o legislador,
eventualmente, viesse a estabelecer algum tipo de limitação. No caso, não me parece haver
nenhuma dúvida em torno do assunto, mas a própria formulação do inciso XVI, quando diz ‘desde
que não frustrem outra reunião anteriormente convocada para o mesmo local’, já sugere o problema
de uma eventual colisão, que típica dentre direitos idênticos – dois grupos adversários que se
dirijam para o mesmo local -, dada a possibilidade de conflito e necessidade de intervenção da
polícia.” (Ibid.. p. 399-400)
485
“[…] ‘sendo apenas exigido prévio aviso à autoridade competente’ tema que também pode
demandar algum tipo de disciplina.” (Ibid.. p. 400)
486
“[…] no caso das reuniões em ambiente fechado – casos especiais de determinadas igrejas -, tem
surgido o debate sobre algum tipo de limitação – e tem-se discutido muito isso – por conta dos
eventuais ou possíveis excessos sonoros. Já tivemos uma discussão no Congresso Nacional sobre
uma dessas leis de meio ambiente que, aparentemente, podia afetar o funcionamento ou a atividade
mais intensa em alguns desses locais. Neste caso, estamos a falar da liberdade de religião – claro,
liberdade de culto – e liberdade de reunião. Aqui temos uma concorrência de direitos em ambientes
fechados, ainda assim barulhentos.” (BRASIL. Supremo Tribunal Federal. ADI nº 1.969-4/DF. Inteiro
Teor. Rel. Min. Ricardo Lewandowski, Tribunal Pleno, julgado em 28/06/2007, DJe-092 public 31-
08-2007. Disponível em: <http://www.stf.jus.br>. Acesso em: 24 jun. 2016. p. 400)
487
“Não tenho dúvida de que, por decreto, por lei ou por lei complementar o que se contém nesse
decreto tudo seria inconstitucional. Nele, simplesmente se veda qualquer reunião nos locais
públicos [...].” (Ibid.. p. 401)
488
“Não quero assumir compromisso absoluto sobre se o silêncio da Constituição de 1988 – que é
eloquente em relação à Carta de 1969 e mesmo à de 1946, que deixavam um espaço aberto à lei –
significaria uma vedação absoluta de qualquer redação legal. No entanto, nos termos que está
redigido o decreto, não tenho dúvida de ser ele – como disse na liminar – rombudamente
inconstitucional.” (Ibid.. p. 402)
142

discussão sobre o conteúdo dos protestos é um avanço em termos de densificação


normativa e efetividade dos direitos fundamentais na CRFB/88. Todavia, reconhecer
o avanço não pode servir para ignorar que as questões difíceis não foram decididas,
apenas surgiram obliquamente em um voto ou outro. Na perspectiva da decisão de
mérito, definiu-se apenas a inconstitucionalidade do decreto. Assim, pode-se afirmar
que o julgamento da ADI nº 1.969 demonstrou características formalistas,
evidenciando o minimalismo judicial em oposição ao que parecer ser a tendência ao
ativismo judicial do STF.489
Segundo Bernardo Gonçalves Fernandes, o minimalismo “objetiva que a
Corte decida o caso que tem em mãos, ao invés de realizar uma tentativa de
estabelecer regras para aplicação de outros casos futuros e similares”.490 A
característica mais distintiva do minimalismo é, para Cass Sunstein, a de deixar
questões fundamentais por serem decididas.491 Se, por um lado, isso reduz o peso
das decisões judiciais e faz os erros desta seara menos frequentes e nocivos,
sobretudo por causa das imensas dificuldades que envolvem uma decisão judicial
quando há grandes divergências, por outro, não consegue evitar que decisões
tenham que ser tomadas em outro momento.
Se o direito, como ensina Tércio Sampaio Ferraz Júnior, cuida de regras
para a tomada de decisão,492 a ADI nº 1.969-DF poucas balizas oferece para os
desacordos existentes em protestos populares. A recusa em discuti-los não os
elimina das ruas, momento no qual pode ser que não exista a alternativa de
postergar a decisão. A unanimidade na votação dos ministros em um tema tão
polêmico é sintomática de que as questões problemáticas não foram enfrentadas. O

489
Autores como Luís Roberto Barroso apontam uma postura maximalista, ou ativismo judicial, da
corte constitucional brasileira, tanto em razão da extensão quanto do volume de decisões. Para ele,
o desenho constitucional brasileiro privilegia a centralidade do papel da jurisdição. Isso ocorre em
razão de uma convergência de fatores tais como: a presença do controle concentrado e difuso de
constitucionalidade simultaneamente; a constitucionalização abrangente, seguindo os modelos de
Portugal (1976) e Espanha (1978), no qual diversos conteúdos antes deixados for a, foram incluídos
nas constituições, dando ensejo a um texto analítico e ambicioso; expansão institucional do
Ministério Público para além da área estritamente penal; presença crescente da Defensoria Pública
em diferentes partes do Brasil. (BARROSO, Luís Roberto. Judicialização, Ativismo judicial e
legitimidade democrática. Revista Eletrônica de Direito do Estado, Salvador, n. 18, abr./maio/jun.
2009. p. 1-2)
490
FERNANDES, Bernardo Gonçalves. Curso de Direito Constitucional. 5. ed. rev. ampl. e atual. São
Paulo: JusPodivm, 2013. p. 206.
491
SUNSTEIN, Cass Robert. One case at a time: Judicial minimalism on the Supreme Court.
Cambridge: Harvard University Press, 2001. p. 61.
492
Cf. FERRAZ JUNIOR. op. cit., 2015. FERRAZ JR, Tércio Sampaio. A Ciência do Direito. 3. ed. São
Paulo: Atlas, 2014.
143

minimalismo na ADI nº 1.969-DF, ao tornar mais fácil a decisão judicial, mantém as


incertezas dos textos legislativos e oferece poucos parâmetros para o executivo.
Assim, do ativismo do juiz de direito da comarca de Campina Grande em
1874 ao minimalismo do STF nos tempos atuais, poucas afirmações podem ser
feitas sobre a densidade normativa do direito de reunião visto a partir de sua
concretude. Duração, horário, local e forma dos protestos no direito brasileiro são
motivos de divergências nas ruas e os conflitos chegam a levar pessoas a se
agridem e se matarem. Nesse cenário, a função estabilizadora do direito, voltada a
garantir as expectativas das pessoas em uma sociedade plural e heterogênea,493
recai em grande medida para o momento da concreção do direito na atuação policial
nas ruas.

5.2 Jurisprudência nos Tribunais de Justiça

Talvez em função da consolidação da democracia brasileira,494 nas últimas


duas décadas os questionamentos parecem começar a chegar em maior volume aos
judiciários estaduais. A questão dos conflitos de direitos envolvendo o direito de
reunião gerou um relevante precedente no Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul.
Naquele estado, protesto de professores em frente à casa da governadora em 2009
foi impugnado judicialmente por parentes desta, que alegaram que a casa não era a
residência oficial e que a manifestação, no local e da forma que aconteceu, teria sido
um constrangimento ilegal, violado a intimidade e a vida privada de sua família e
que, por isso, o direito de reunião teria sido utilizado de maneira abusiva. Em
primeira instância, os autores conseguiram indenização do sindicato dos professores
a título de danos morais. No TJ-RS, foi dado provimento à apelação do sindicato em
virtude de não terem sido comprovadas as ofensas pessoais, as palavras de baixo
calão nem o “corredor polonês” com batidas no carro quando os netos da
governadora saíram de casa para a escola, conforme alegaram seus familiares.
Para os desembargadores, foi a própria governadora que expôs os netos, ao exibi-
los junto ao cartaz com os dizeres: “Vocês não são professores, torturam crianças.
Abram alas que minhas crianças têm aula!”.

493
HESPANHA, António Manuel. Pluralismo Jurídico e Direito Democrático. São Paulo: Annablume,
2013. p. 209.
494
AVRITZER, Leonardo. Os impasses da democracia no Brasil. Rio de Janeiro: Civilização
Brasileira, 2016. p. 7-8.
144

Além disso, a casa na qual viviam foi considerada bem público em sentido
amplo e não um simples imóvel privado, mesmo a Chefe do Executivo não residindo
no Palácio do Piratini, moradia oficial do ocupante do cargo. Cabe destacar ainda
que o Tribunal considerou que a falta de prévio aviso não tornaria ilícito o ato e que
o fato de os familiares terem conseguido se deslocar após a chegada da Brigada
Militar (BM) fez com que não tenha ocorrido impedimento à liberdade de ir e vir.495

Figura 17 - Tropa de Choque da Brigada Militar do Rio Grande do Sul garantindo o


Direito de ir e vir, segundo o TJ-RS.

496
Fonte: Ronaldo Bernardi.

Em Minas Gerais, o primeiro dia de manifestações da Copa do Mundo FIFA


de 2014 foi levado ao Judiciário. Em 12 de junho, manifestantes mascarados
depredaram lojas e agências bancárias, destruíram uma viatura da polícia civil e
enfrentaram a polícia militar com pedras.497 Nos dias seguintes, a polícia adotou
estratégia de cerco aos manifestantes, que ficou conhecida como “envelopamento”.
Foi impetrada ação judicial com dois pedidos: de que a PM não impedisse as
495
RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça. Apelação Cível n. 70038377453. Relator Roberto
Carvalho Fraga. Porto Alegre, 20 de jul. 2011. Disponível em: <http://www.tjrs.jus.br>. Acesso em: 2
jun. 2015. RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça. Embargos de Declaração em Apelação Cível
n. 70044201002. Relator Roberto Carvalho Fraga. Porto Alegre, 30 de ago. 2011. Disponível em:
<http://www.tjrs.jus.br>. Acesso em: 2 jun. 2015.
496
BERNARDI, Ronaldo. Cpers promove protesto na casa de Yeda Crusius. Foto 10. Disponível em:
<http://zh.clicrbs.com.br>. Acesso em: 1º jul. 2016
497
CARMONA, Bruna. Protesto em Belo Horizonte termina com 15 detidos e 2 feridos. O Tempo, 12
jun. 2016. Disponível em: <http://www.otempo.com.br>. Acesso em: 26 jun. 2016.
145

manifestações e que não utilizasse a estratégia do cerco. Segundo informações do


TJMG,498 apenas o primeiro pedido foi concedido liminarmente, ainda assim,
enquete da imprensa mineira indicou que 79,3% dos entrevistados eram contrários à
decisão judicial que limitava a ação da PM.499 Em recurso da Advocacia Geral do
Estado (AGE), a liminar foi suspensa, sendo reconhecida a legalidade da ação da
polícia em restringir o lugar da manifestação.500 Em junho de 2016, dois anos após
as manifestações e as intervenções policiais, o processo ainda se encontrava em
tramitação.501
Em São Paulo, estado brasileiro com maior população,502 a disputa pelo
espaço reflete-se na jurisprudência de seu tribunal de justiça. A questão do trânsito
repercute tanto em julgados que envolvem as áreas centrais das cidades quanto nas
rodovias pedagiadas por meio das pessoas jurídicas concessionárias. Na capital
paulista, pelo menos desde a década de 1990, há providências judiciais a partir de
cálculos realizados pela Companhia de Engenharia de Tráfego – CET.503 Não por
menos, no estado brasileiro onde a dinâmica capitalista parece estar mais
enraizada, a empresa de trânsito converte em valores monetários o custo do
protesto pelo reflexo nos congestionamentos a partir do que denominam como
“custos operacionais e sociais”. Os primeiros levam em conta o desperdício de
combustível e desgaste dos veículos, tendo por referência os quilômetros de
retenção, a quantidade estimada de veículos e a duração do evento no computo das
horas adicionais gastas pelas pessoas afetadas. Os custos sociais, por sua vez,
relacionam-se ao salário-hora do trabalhador usuário de carro, ônibus ou caminhão.
Difícil construir pontes entre lógicas tão incomunicáveis como a que parece
estruturar essa monetarização dos protestos nas ruas e a que obstrui uma rodovia

498
MINAS GERAIS. Tribunal de Justiça. Justiça determina que PM não impeça manifestações contra
a Copa do Mundo, 25 jun. 2014. Disponível em: <http://www.tjmg.jus.br>. Acesso em: 16 maio 2016.
499
CARMONA, Bruna; ZSCHABER, Laura. Cerco da PM a manifestantes pode virar guerra de
liminares. O Tempo, 26 jun. 2014. Disponível em: <http://www.otempo.com.br>. Acesso em: 26 jun.
2016.
500
MINAS GERAIS. Tribunal de Justiça. Liminar que restringia atuação da polícia em manifestações é
suspensa, 26 jun. 2014. Disponível em: <http://www.tjmg.jus.br/portal/imprensa/noticias/justica-
determina-que-pm-nao-impeca-manifestacoes-contra-a-copa-do-mundo-1.htm#.V3hYEq5K6_0>.
Acesso em: 16 maio 2016.
501 a
MINAS GERAIS. Tribunal de Justiça. Mandado de Segurança 1874933-91.2014.8.13.0024, 7
Fazenda Estadual. Disponível em: <http://www.tjmg.jus.br>. Acesso em 20 jun. 2016
502
INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. São Paulo. Síntese. Disponível em:
<http://www.ibge.gov.br/estadosat/perfil.php?sigla=sp>. Acesso em: 1º jul. 2016.
503
ALMEIDA, Fernando Dias Menezes de. op. cit.,. p. 288.
146

por falta de água ou passarela em bairros marginalizados de uma mesma cidade,


mas, como diria Saint-Exupéry, “não é a distância que mede o afastamento”.504
Tais cálculos têm sido utilizados com certa frequência. No ano de 1995, um
protesto de alguns minutos na capital teve um custo estimado ao equivalente a US$
600.000,00.505 Mesmo julgados mais recentes utilizaram esse padrão, como em um
caso de 2009, ano no qual um protesto com 10 mil pessoas na Av. Paulista teve o
sindicato organizador e um de seus dirigentes condenados a pagar R$ 302.142,68
por danos materiais e o triplo do valor por dano moral difuso pelos transtornos
causados pela ausência de prévio aviso.506 Em Ação Civil Pública (ACP) de 2014, o
Ministério Público Estadual de São Paulo (MP-SP) considerou que os impactos na
mobilidade urbana evidenciaram o abuso do direito de reunião. Assim, foi requerida
tutela jurídica aos direitos difusos e coletivos por meio da condenação a danos
morais em um ato que envolveu greve e protesto realizado por sindicato dos
metroviários. Na fundamentação, o MP expôs, com base em dados da rede
metroviária, que pelo menos sete milhões de usuários foram prejudicados, além do
impacto ambiental em virtude do aumento do número de carros decorrente do
cancelamento do rodízio de automóveis na capital.507 Em outro caso, de 2011, o MP-
SP promoveu ACP contra um sindicato, alegando que a comunicação foi realizada
na véspera do protesto, o que contrariaria lei municipal que define cinco dias de
antecedência508 e, por isso, impediria a formação do direito de reunião. O TJ-SP,
acatando o fundamento, ainda acrescentou que a presença de policiais e agentes da
CET no local da manifestação não sanaria a ilegalidade. Os cálculos da CET de

504
SAINT-EXUPÉRY, Antoine. Terra dos Homens. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2015. p. 63.
505
ALMEIDA, op. cit., p. 289.
506
SÃO PAULO. Tribunal de Justiça. Apelação 570.835-4/8. Relator Desembargador Ênio Santarelli
Zuliani. São Paulo, 25 de jun. 2009. Disponível em: <https://www.tjsp.jus.br>. Acesso em: 2 jun.
2015.
507
SÃO PAULO. Ministério Público do Estado de São Paulo. Apelação Cível com Pedido de
Antecipação de Tutela s/n. Promotor Maurício Antônio Ribeiro Lopes. São Paulo, 10 de jul. 2014.
Disponível em:
<http://www.mpsp.mp.br/portal/pls/portal/!PORTAL.wwpob_page.show?_docname=2467164.PDF>.
Acesso em: 2 jun. 2015.
508
Em São Paulo os protestos são regulamentados pela Lei Municipal nº 12.151/96, combinada com
Decreto nº 36.767/97. A Avenida Paulista possui regulamentação específica por meio da Lei
Municipal nº 12.153/96 e do Decreto Regulamentador nº 36.329/96. Além da legislação pertinente,
há recomendações formais da Secretaria de Segurança Pública estadual, que orienta a Polícia a
não permitir manifestações na Avenida Paulista que invadam o leito carroçável e perturbem o
trânsito (PIGNATARI, Marcelo da Silva. Gestão Estratégica para Atuação da Polícia Militar em
Manifestações Públicas. Tese. Doutorado em Ciências Policiais de Segurança e Ordem Pública.
Polícia Militar do Estado de São Paulo / Centro de Altos Estudos de Segurança - CAES “Cel PM
Nelson Freire Terra”. São Paulo, 2012. p. 75)
147

volume de trânsito e quantum indenizatório foram utilizados para fixar em R$


108.679,00 a reparação.509 Em outro precedente, de 2002, também se decidiu que o
direito de reunião não se conforma sem o aviso:

A exigência de comunicação prévia não constitui mero penduricalho da


norma constitucional, mas elemento essencial na formação do direito de
reunião em local aberto ao público. É inadmissível se aceitar que a
autoridade administrativa seja surpreendida com um fato consumado e,
assim, ver-se obrigada a sair atabalhoadamente com medidas improvisadas
e empíricas para resolver desordenadamente as desordens que uma
manifestação possa acarretar à vida normal da cidade e em prejuízo do
510
bem estar de seus habitantes.

Como pode se perceber, o comportamento dos tribunais do Rio Grande do


Sul e de São Paulo parecem divergir substancialmente quanto ao papel do prévio
aviso para a licitude dos protestos, assim como da intervenção de agentes do estado
para caracterizar ou não o que ambas as cortes designam como abuso do direito de
reunião. Mesmo reconhecendo que os precedentes não vinculam o agir da
administração para outros casos, poderiam servir para reduzir as incertezas na
busca pelo sentido concreto do direito de reunião. Todavia, quando se busca um
suporte do Judiciário sobre a construção semântica do direito de reunião previsto na
Constituição, verifica-se que seus órgãos proporcionam uma resposta oscilante
conforme a região do país. Essa percepção não é estranha ao jurista; apenas indica
a impossibilidade de se buscar nos tribunais um entendimento inequívoco sobre a
interpretação do direito de reunião no direito brasileiro.
O problema da aplicação ou não das leis que regulamentam o uso das vias
públicas também ecoa no tribunal paulista.511 Em acórdão de 2001, o TJ-SP
convalidou o indeferimento do município de São José dos Campos a uma passeata
com base no poder de polícia do município e no art. 95 do CTB.512 Pela decisão, o

509
SÃO PAULO. Tribunal de Justiça. Apelação Cível 9158154-90.2005.8.26.0000. Relator
Desembargador Milton Carvalho. São Paulo, 9 de nov. 2011b. Disponível em:
<https://www.tjsp.jus.br>. Acesso em: 2 jun. 2015.
510
SÃO PAULO. Tribunal de Justiça. Apelação Cível 129.040.4/8. Relator Desembargador Ruiter
Oliva. São Paulo, 6 de ago. 2002. Disponível em: <https://www.tjsp.jus.br>. Acesso em: 2 jun. 2015.
511
Ver Capítulo 3.3 quando foi discutido a concorrência de direitos fundamentais.
512
Art. 95. Nenhuma obra ou evento que possa perturbar ou interromper a livre circulação de veículos
e pedestres, ou colocar em risco sua segurança, será iniciada sem permissão prévia do órgão ou
entidade de trânsito com circunscrição sobre a via. § 1º A obrigação de sinalizar é do responsável
pela execução ou manutenção da obra ou do evento. § 2º Salvo em casos de emergência, a
autoridade de trânsito com circunscrição sobre a via avisará a comunidade, por intermédio dos
meios de comunicação social, com quarenta e oito horas de antecedência, de qualquer interdição
da via, indicando-se os caminhos alternativos a serem utilizados. 3º A inobservância do disposto
neste artigo será punida com multa que varia entre cinqüenta e trezentas UFIR, independentemente
148

município teria indeferido o pedido dos organizadores por causa da duração e lugar
escolhidos, solicitando a estes a realização do evento em dia e horário de menor
fluxo de pedestres e veículos. O acórdão que decidiu pela aplicação do CTB
menciona o conflito de direitos constitucionais:

O exercício do direito de reunião não pode ser concretizado a ponto de


tornar-se impedimento absoluto ao direito de ir e vir das demais pessoas, ao
direito ao trabalho, ao direito de manifestação, ou seja, nenhum direito
subjetivo constitucionalmente assegurado pode ser exercido a ponto de
tornar-se impedimento absoluto ao exercício de outros direitos subjetivos
513
constitucionais.

Em agravo de instrumento de 2007, o CTB novamente foi invocado no TJ-SP


em processo no qual se pontuou que prevaleceria o interesse da coletividade
expresso em uma obra pública em detrimento das pessoas que se opunham à
construção, “[...] obrigando os réus a não realizar manifestação sem prévio aviso à
autoridade competente e prévia permissão ou licença da autoridade de trânsito,
vedado de todo modo o ingresso nos canteiros de obra”.514 Em acórdão de 2015, o
interesse dos usuários de uma rodovia também prevaleceu sobre protesto do
sindicato dos rodoviários.515
Se por um lado o TJ-SP tem fundamentado decisões na lei que regulamenta o
fluxo de pessoas e pedestres, diretriz oposta é encontrada em parecer da Comissão
Interamericana de Direitos Humanos (CIDH):

Em uma sociedade democrática, “o espaço urbano não é apenas uma área


para circulação, mas também um espaço para a participação”. Os Estados
devem garantir e não obstruir o direito de manifestantes se encontrarem

das cominações cíveis e penais cabíveis. § 4º Ao servidor público responsável pela inobservância
de qualquer das normas previstas neste e nos arts. 93 e 94, a autoridade de trânsito aplicará multa
diária na base de cinqüenta por cento do dia de vencimento ou remuneração devida enquanto
permanecer a irregularidade. (BRASIL. Lei nº 9.503, de 23 de setembro de 1997. Institui o Código
de Trânsito Brasileiro. Diário Oficial da União, 24 set. 1997. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br>. Acesso em: 24 jun. 2016.)
513
SÃO PAULO. Tribunal de Justiça. Apelação Cível 074.432-0/8-00. Relator Desembargador Álvaro
Lazzarini. São Paulo, 7 de jun. 2001. Disponível em: <https://www.tjsp.jus.br>. Acesso em: 2 jun.
2015. p. 4.
514
SÃO PAULO. Tribunal de Justiça. Agravo de Instrumento 607.853-5/6-00. Relator
Desembargadora Teresa Ramos Marques. São Paulo, 12 de mar. 2007. p. 3. Disponível em:
<https:// www.tjsp.jus.br >. Acesso em: 2 jun. 2015.
515
SÃO PAULO. Tribunal de Justiça. Agravo de Instrumento 2142035-27.2015.8.26.0000. Relator
Desembargador Rubens Rihl. São Paulo, 16 de set. 2015. Disponível em: <https:// www.tjsp.jus.br
>. Acesso em: 22 jan. 2016.
149

livremente em lugares privados, em espaços públicos e nos locais de


516
trabalho. (tradução nossa)

Mesmo diante da ínfima parte dos conflitos em protestos que chegam ao


Judiciário, as dificuldades da intervenção judicial nas divergências nesses casos
foram identificadas na jurisprudência do STF517 (e revelam-se também nos
precedentes do TJ-SP como, por exemplo, na ACP nº 074.432-0/8-00, em cujo
acórdão o Tribunal denegou a segurança obtida em primeira instância para impedir o
evento após o protesto ter acontecido.
Os óbices à resolução desses conflitos no Judiciário surgem mesmo quando
temporalmente se mostra viável o ingresso de ação judicial. É o que parece
evidenciar a tendência dos protestos atuais, que possuem como características a
falta ou pulverização das lideranças ou entidades na organização dos atos. Em
2011, o problema foi mencionado em acórdão do Tribunal paulista quando a
concessionária que administra a Rodovia Engenheiro Constâncio Cintra (SP-360)
conseguiu interdito proibitório em desfavor de uma manifestação organizada por
uma comissão contra o pedágio. No pedido liminar, a parte autora buscava que os
réus se abstivessem de realizar protesto nas rodovias, acostamentos, acessos e
instalações nos trechos sob concessão, requerendo a aplicação de multa de
R$500.000,00 por hora pelo descumprimento.
Em sede de análise da liminar, a magistrada equitativamente buscou uma
forma de conciliar o protesto e o tráfego de veículos na via. Assim, limitou o local,
determinando que a manifestação acontecesse somente no acostamento, que
deveria ser isolado e sinalizado pela concessionária para garantir a segurança dos
manifestantes, fixando multa em caso de descumprimento de quaisquer
determinações em R$10.000,00. A parte autora recorreu em virtude do atendimento
parcial de seu pleito. Na decisão do agravo de instrumento foi ressaltada a
ponderação da magistrada de primeira instância, assim como a dificuldade que
existiria para a efetividade da multa em virtude da natureza jurídica da entidade
despersonalizada que figurava como ré.
516
No original: “In a democratic society, “the urban space is not only an area for circulation, but also a
space for participation”. States must guarantee and not obstruct the right of demonstrators to meet
freely both in private and in public spaces and in workplaces.” (COMISSÃO INTERAMERICANA DE
DIREITOS HUMANOS (CIDH). Report on the situation of human rights defenders in the Americas.
OEA/Ser.L/V/II.124 Doc. 5 rev. 1. March 2006. Disponível em:
<http://www.cidh.oas.org/countryrep/Defenders/defenderstoc.htm>. Acesso em: 11 de jun. 2013. p.
52)
517
ALMEIDA, op. cit., p. 291.
150

As manifestações de 2013,518 em certo sentido, também evidenciaram essa


nova realidade, já que, a partir de determinado momento, o MPL afirmou que não
convocaria novos atos e, mesmo assim, aconteceram outros e maiores protestos,
ressaltando-se que pessoas com bandeiras partidárias tinham seus mastros
quebrados ou eram expulsas do protesto pelos próprios manifestantes. Como
pensar em efeito coercitivo de multas em manifestação horizontais, sem lideranças
identificáveis ou entidades organizadoras? Deveria a polícia qualificar todos os
milhares de manifestantes para uma eventual execução da reparação na pessoa
física de cada um dos que estavam no protesto? Estruturas rígidas parecem ser
desafiadas pela velocidade, fluidez e dinâmica das relações sociais.
Uma matéria de jornal revela cruamente o fracasso de se tentar conter o
movimento vida com o direito escrito. Manifestação que pretendia bloqueio da praça
de pedágio teve em seu desfavor liminar judicial. Na decisão da juíza da 3a Vara
Cível da Comarca de Gravataí, se ocorresse bloqueio ou ocupação da praça de
pedágio, incidiria multa de R$ 1.000 (mil reais) por hora. Apesar da determinação, os
manifestantes prometeram seguir com o protesto. Segundo um dos organizadores,
“a liminar diz que não pode haver bloqueio no perímetro de dois quilômetros do
pedágio. [...] seguiremos para algum ponto da rodovia onde iremos realizar nosso
ato”.519

5.3 Uma resposta que se dá no caso concreto

Como se tem demonstrado, Legislativo e Judiciário não são capazes de


determinar a plenitude das ações do Executivo ante manifestações públicas. Sempre
há, em menor ou maior medida, uma margem discricionária para a atuação da
polícia. Mas, e quando houver algum ponto razoavelmente claro, poderia o
comandante da força pública contrariar texto expresso da lei ou de decisão judicial?
Nos Estados Unidos da América diversas leis do final do século XVIII proibiam
negros, escravos, mulatos e mestiços de se reunirem. Em 1866, após um tribunal
(grand jury) determinar a prisão dos membros de uma reunião que lutava em favor
de voto para os negros, o comandante da tropa não autorizou o cumprimento da

518
Sobre os protestos de 2013 no Brasil confira o Capítulo 4.
519
APESAR de decisão judicial, protesto na free way está mantido. Diário de Cachoeirinha, Região,
20 nov. 2015. Disponível em: <http://www.diariocachoeirinha.com.br>. Acesso em: 15 de jan. 2015.
151

ordem. Nem a concordância entre lei e decisão do tribunal foram capazes de


prevenir a inconstitucionalidade que para os dias de hoje é patente.520
Não é preciso ir tão longe no tempo para buscar exemplos dos desafios que
envolvem a aplicação do direito pela força pública. Em 15 de maio de 2011, uma
convocatória via internet deu início a protestos que levaram milhares de pessoas às
ruas em mais de 50 cidades na Espanha.521 O movimento ficou conhecido como 15-
M, em alusão ao dia de início.522 Ao fim dos protestos em Madrid, os jovens
decidiram acampar até as eleições, dia 22, domingo seguinte. O local escolhido foi
Puerta del Sol, uma praça madrilenha que é o marco zero das estradas espanholas
e de onde também se irradiou a onda de protestos que movimentou o Reino de
España.
Por volta das 5h da manhã do dia 17, a polícia retirou os aproximadamente
200 jovens que permaneciam na praça. Como era de se esperar, os governantes
afirmaram que a força foi utilizada proporcionalmente pela polícia, enquanto os
integrantes do movimento alegavam seu abuso. Nesse cenário, um consenso
parece ser possível: a ação da polícia foi capaz de desencadear um clamor público
que na mesma tarde levou milhares de pessoas a ocuparem a praça em apoio aos
removidos.523
Apesar da ordem de retirada, as pessoas decidiram ficar e, na manhã
seguinte, dia 18, foi iniciada a organização do acampamento no centro da capital do
país com estrutura de cantina, nomeação de comissões, divisão de funções e
suporte tecnológico para computadores e internet. O fulgor das manifestações
espraiava-se ao mesmo tempo em que a polícia realizava expulsões em Valência,
Tenerife, Las Palmas e Granada.524

520
INAZU, John D. Liberty’s Refuge: The forgotten freedom of assembly. New Haven: Yale University
Press, 2012. p. 31 e 36.
521
A Cronologia dos fatos pode ser encontrada, entre outros lugares, nos sites dos jornais Domínio
Público, do El País ou na obra de Manuel Castells (CASTELLS, Manuel. Redes de indignação e
esperança: movimentos sociais na era da internet. Rio de Janeiro: Zahar, 2013. p. 198-206).
522
O movimento por vezes é referido como “Indignados”, em virtude do livro “Indignai-vos”, de
Stéphane Hessel, e também por Spanish Revolution.
523
CRONOLOGÍA de la acampada ‘indignada’ en la Puerta del Sol. Diario Público, Cuaderno
Actualidad, 31 maio 2011. Disponível em: <http://www.publico.es/actualidad/cronologia-acampada-
indignada-puerta-del.html>. Acesso em: 31 ago. 2015.
524
CASTELLS, Manuel. op. cit., p. 198.
152

A legislação eleitoral na Espanha possui restrições a atos políticos durante o


período pré-eleições525 e, em decorrência desses limites, a Junta Eleitoral Provincial
de Madrid declarou a ilegalidade dos protestos. A decisão do órgão teve o reflexo de
aumentar ainda mais a concentração de pessoas no acampamento.526 O Advogado
Geral do Estado e a Junta Provincial de Salamanca, onde também estavam
acontecendo protestos, formalizaram consulta à Junta Eleitoral Central (JEC), órgão
pacificador das decisões relativas à legislação eleitoral. No dia 19, a Junta Central
publicou o Expte. 239/200, no qual destaca que o direito de reunião deve receber
uma interpretação extensiva e favorável ao seu exercício, embora não seja irrestrito
nem sem limites. Assim, afirmando manter coerência com sua própria jurisprudência
e com a legalidade vigente, destacou que os atos que motivaram a consulta
excediam o direito de manifestação, afirmando:

Decide: comunicar a todas as Juntas Eleitorais assim como ao Advogado-


Geral do Estado que as concentrações e reuniões a que se referem a
consulta feita a esta Junta são contrárias à legislação eleitoral a partir das
zero horas de sábado 21 de maio até as 24 horas de domingo 22 de maio
527
de 2011 e, portanto, não podem se realizar.

Um partido político interpôs medida cautelar contra a decisão da JEC no


Tribunal Supremo. Na corte, foi acatada a tese do órgão ministerial (Ministerio
Fiscal) de inadmissibilidade do recurso em função da ausência de legitimidade do
partido para a causa. Segundo a imprensa, o recurso de um advogado junto Tribunal
Constitucional também foi inadmitido por não ter esgotado as vias judiciais,528

525
ESPANHA. Ley Orgánica 5/1985, de 19 de junio, del Régimen Electoral General. BOE-A-1985-
11672. Disponível em: <https://www.boe.es/buscar/doc.php?id=BOE-A-1985-11672>. Acesso em:
24 jun. 2016.
526
CRONOLOGÍA… op. cit.
527
No original: “Acuerda: comunicar a todas las Juntas Electorales así como al Abogado General del
Estado que las concentraciones y reuniones a las que se refieren las consultas elevadas a esta
Junta son contrarias a la legislación electoral desde las cero horas del sábado 21 de mayo hasta las
24 horas del domingo 22 de mayo de 2011 y en consecuencia no podrán celebrarse.” (ESPAÑA.
Junta Electoral Central. Ley Orgánica 5/1985, de 19 de Junio. Del régimen electoral general.
Disponível em: <http://www.juntaelectoralcentral.es/cs/jec/loreg>. Acesso em: 14 mar. 2016,
tradução nossa.
528
Manuel Castells diz que o Tribunal Constitucional declarou a constitucionalidade dos protestos,
sem mencionar a fonte ou em qual precedente. Consultas em noticiários e no site do próprio tribunal
não localizaram a referida decisão. (CASTELLS, op. cit., p. 199) Lluís Aguiló Lúcia afirma que
durante os atos alguns jornais equivocadamente divulgaram que o Alto Tribunal teria declarado a
constitucionalidade dos protestos que estavam acontecendo (LÚCIA, Lluis Aguiló. Sobre el acuerdo
de la Junta Electoral Central de 19 de mayo de 2011 y el Movimiento 15M. Cuadernos Manuel
Giménez Abad, n. 2. p. 65-70, Dic. 2011. p. 67). Portanto, acredita-se que Castells tenha baseado
sua fala nessas notícias inverídicas. (ELOLA, Joseba. La carga policial desata la indignación en
Barcelona. El País, España, Cuaderno Politica, 27 May 2011. Disponível em:
153

permanecendo intacto o reconhecimento da ilegalidade das manifestações. Em


assembleia, os acampados decidiram continuar,529 e protestos de apoio foram
realizados em outros 15 países enquanto 66 cidades espanholas registravam
acampamentos.530 Após a Junta Eleitoral Central declarar ilegais todas as
concentrações e reuniões convocadas para o sábado dia 21 e para o dia das
eleições, 22, a Junta da província de Madrid voltou a declarar a ilegalidade dos
protestos.531 Se o direito se esgotasse em sua face formal, não haveria dúvidas
sobre o desdobramento das decisões na atividade da polícia em prol do acatamento
da determinação judicial. Entretanto, ainda faltava uma peça no quebra-cabeças: a
realidade.

Figura 18 – Protesto do Movimento 15-M

532
Fonte: Álvaro Garcia.

Pela foto, se percebe a quantidade de pessoas na praça. Somente com


intensa carga de munições químicas, bastões de madeira, jatos de água ou

<http://politica.elpais.com/politica/2011/05/27/actualidad/1306489864_137130.html>. Acesso em: 14


mar. 2016)
529
CRONOLOGÍA… op. cit.
530
CASTELLS, op. cit., p. 199.
531
CRONOLOGÍA… op. cit.
532
GARCIA, Álvaro. Protesta del movimiento del 15-M. El País, 20 maio 2011. Disponível em:
<http://elpais.com>. Acesso em: 24 jun. 2016
154

munições de elastômero (bala de borracha) seria possível dispersar todas as


pessoas que estavam na Puerta del Sol, o que não aconteceria sem uma grande
quantidade de feridos, pisoteados e possivelmente mortos face à geografia do local
e às 25 mil pessoas que decidiram permanecer contrariando leis, precedentes e
tribunais. Os dias anteriores já haviam demonstrado que decisões verticalizadas da
polícia e dos órgãos decisórios só fizeram aumentar o número de manifestantes e o
apoio aos protestos. Em uma resposta deliberadamente ambígua segundo a
imprensa,533 na qual dizia que a polícia aplica diversas leis e decisões, o ministro do
interior, a quem a polícia está subordinada, disse que “não existe democracia se não
se cumpre as leis”,534 que “a polícia não cria problemas, os resolve. Veremos os
acontecimentos e, em função deles, a polícia tomará suas decisões”535 e ainda que
“a polícia sabe o que tem que fazer”.536
A resposta confusa do comando da polícia revela o que se tenta esconder.
Na tradução do texto escrito em leis ou decisões para a vida real, os órgãos
encarregados de aplicar a lei também interpretam a sentença escrita para traduzi-la
para uma dada realidade que não pode ser ignorada. A experiência, os
conhecimentos técnicos e táticos, assim como a própria inserção no contexto fático
permitem uma decisão a partir de elementos diferentes dos utilizados pelo
magistrado ao decidir.
Cass Sunstein e Adrian Vermeule afirmam que há uma cegueira acerca das
considerações institucionais quando se discute a interpretação do direito. Os
debates acerca da interpretação ocorrem em um elevado nível de abstração, com
considerações a partir de termos vagos como natureza da interpretação,
constitucionalismo, democracia e legitimidade.537 Entretanto, na maior parte dos
casos, tais abstrações não solucionam os problemas hermenêuticos que vêm à tona

533
BELAZA, Mónica Ceberio; GONZÁLEZ, Migual. Interior descarta el desalojo del Sol. El País,
España, 21 May 2011. Disponível em: <http://elpais.com>. Acesso em: 14 mar. 2016.
534
No original: “no existe democracia si no se cumplen las leyes” (RUBALCABA: ‘La Policía sabe lo
que tiene que hacer’. El Mundo, Cuaderno Elecciones 2011, 20 Abr. 2011. Disponível em:
<http://www.elmundo.es/elmundo/2011/05/20/espana/1305886042.html>. Acesso em: 30 maio
2016.)
535
No original: “la policía no crea problemas, los resuelve. Veremos los acontecimientos y, en función
de ellos, la policía tomará sus decisiones” (RUBALCABA: ‘La Policía sabe lo que tiene que hacer’. El
Mundo, Cuaderno Elecciones 2011, 20 Abr. 2011. Disponível em:
<http://www.elmundo.es/elmundo/2011/05/20/espana/1305886042.html>. Acesso em: 30 maio
2016.)
536
ibid.,
537
SUNSTEIN, Cass Robert; VERMEULE, Adrian. Interpretation and institutions. University of
Chicago Law and Economics Working Paper, n. 156, 2nd series, Chicago, 2002. p. 2.
155

na situação concreta. Todo leitor de um texto é um intérprete, e decisão judicial,


assim como a lei, também é texto, ainda que com grau de concreção maior quando
comparado à generalidade da lei. Para interpretá-las faz-se necessário considerar as
capacidades institucionais. Para Sunstein e Vermeule:

Como vamos insistir, debates sobre interpretação jurídica não podem ser
sensivelmente resolvidos sem atenções a essas capacidades. A questão
central não é ‘como, em princípio, pode um texto ser interpretado?’ A
questão é ao contrário ‘como podem certas instituições, com suas distintivas
538
habilidades e limitações, interpretar certos textos?’ (tradução nossa)

Esse processo concatenado de interpretação e decisão policial tem relação


direta com a efetividade dos direitos fundamentais, com o real sentido que o texto
ganha na vida das pessoas. Em observações sociológicas para compreender
empiricamente como acontece a intervenção da polícia em protestos, Donatella
Della Porta e Robert Heiter evidenciaram que olhar apenas a lei escrita é muito
pouco para explicar o que realmente acontece na prática.539 A aplicação do direito
pela polícia não é mero silogismo ou simples subsunção texto-fato, e perceber isso
explica o que aconteceu em Madri em 2011. Outros elementos interferem e
modulam a conformação do jurídico na realidade e expõem o papel da polícia na
concreção do direito. Como ensina Mônica Sette Lopes:

Há uma esfera do exercício de poder criador outorgada ao juiz e ao


funcionário, que, sem se confundir com uma autonomia plena, ganha força
no contexto da atuação estatal, exercida pelos órgãos expressamente
540
incumbidos de proceder às determinações adaptadoras.

Graças a essa atividade adaptadora do texto ao caso concreto, felizmente,


nunca será possível descobrir as proporções da tragédia que aconteceria caso a
polícia tivesse realizado a intervenção para terminar o ato, cumprindo
inconsequentemente a decisão judicial. A Revolta da Vacina de 1904541 ou o
Eldorado dos Carajás em 1996, no qual a desobstrução de uma rodovia pela polícia

538
No original: “As we shall urge, debates over legal interpretation cannot be sensibly resolved without
attention to those capacities. The central question is not “how, in principle, should a text be
interpreted?” The question instead is “how should certain institutions, with their distinctive abilities
and limitations, interpret certain texts?” (SUNSTEIN, Cass Robert; VERMEULE, Adrian.
Interpretation and institutions. University of Chicago Law and Economics Working Paper, n. 156, 2nd
series, Chicago, 2002. p. 2.
539
DELLA PORTA, Donatella; REITER, Herbert. The policing of protest in western democracies. In:
DELLA PORTA, Donatella; REITER, Herbert. (Org). Policing protest: The control of mass
demonstrations in western democracies. Minneapolis: University of Minnesota Press, 1998. p. 9-10.
540
LOPES, Mônica Sette. A equidade e os poderes do juiz. Belo Horizonte: Del Rey, 1993. p. 110.
541
Sobre a Revolta da Vacina, cf. capítulo 4.
156

resultou em 19 mortos, reclamam dos órgãos encarregados de aplicar a lei o


entendimento de que o direito deve servir à sociedade, e não o contrário. Assim, o
papel da polícia junto às manifestações para aplicar o direito ao caso concreto deve
ser o de tentar acomodar da melhor maneira o aspecto formal do direito, a partir dos
conhecimentos técnicos e táticos sobre o assunto, da experiência acumulada e de
uma previsão dos resultados possíveis.
Observar a mediação realizada pela polícia entre o texto e a realidade joga
luzes na participação das agências policiais na definição concreta do conteúdo
jurídico do direito previsto na Constituição. O exemplo da Espanha ilustra essa face
adaptadora na atuação da polícia. Mas também não é preciso ir tão longe
geograficamente para compreender como funciona o direito na tradução do texto
escrito em leis ou decisões judiciais para a realidade social e a impossibilidade de
esperar do elemento textual a resposta jurídica adequada.
Um relato da prática que se deu no ano de 2011, em Belo Horizonte,
desnuda como opera essa relação entre decisão judicial e efetividade do direito de
reunião a partir da prática policial. Uma manifestação iniciava-se na Praça Sete e, ao
serem procurados para acerto de detalhes sobre trajetória e duração, os
organizadores da marcha disseram algo semelhante a: “Não tem diálogo, polícia!
Faremos a manifestação com carro de som, queiram vocês ou não. Temos uma
liminar judicial que nos assegura a possibilidade de usar o carro de som hoje no
protesto”. A aversão por parte dos organizadores do ato não os havia deixado
perceber que os policiais procuravam apenas informar-se acerca do evento. A
combinação entre tempo e memória não permite uma reprodução fiel do que foi dito,
todavia, a negativa de diálogo e a fala lacônica percebidas pelo autor expressam a
indisposição da liderança do evento com a polícia.
Alguns levantamentos realizados conseguiram uma parte da história que até
então era desconhecida. Em um protesto do mesmo grupo que acontecera dias
antes, a polícia havia proibido a utilização do carro de som; assim, explicava-se por
que buscaram a liminar judicial e a recusa ao diálogo. Ainda que os policiais não
fossem os mesmos, a polícia era a mesma que havia impedido o carro de som no
protesto dias antes.
A marcha iniciou-se na Av. Afonso Pena, sentido Mangabeiras, região sul da
cidade. Ao passar pelo Palácio das Artes, viraram à esquerda, o que significou que a
manifestação entrara na área hospitalar da capital. O grupo de manifestantes era
157

composto por trabalhadores ligados à área da saúde e queria levar as


reinvindicações ao público que lhe interessava, que, no caso, trabalhava em
hospitais. Na porta de um estabelecimento hospitalar decidiram parar. Após alguns
minutos, uma pessoa ligada à direção do hospital procurou os policiais que
acompanhavam a marcha e solicitou que resolvessem o problema do som, pois, da
forma como estava acontecendo, a manifestação prejudicava o funcionamento
regular do hospital.
Ante o novo cenário, os organizadores do protesto foram novamente
procurados pela polícia, porém foram recebidos com o mesmo ânimo anterior: “Já foi
dito que temos uma liminar judicial sobre o carro de som e ele vai acompanhar a
marcha, da forma como quisermos e dentro do que nos garante a decisão do juiz”.
Nem a explicação do motivo para o desligamento do som foi capaz de remover a
intenção das lideranças de se abrigar na literalidade da decisão judicial em
detrimento dos atendidos no hospital e dos médicos que tentavam trabalhar.
O texto do inciso XVI, art. 5o, da CRFB/88, não responde à singularidade do
conflito que aflorava na porta do hospital da mesma forma que as alterações da
cena exigiam o acertamento do desequilíbrio não previsto pelo magistrado. A
providência do órgão judicante havia sido tomada em liminar que, conceitualmente,
ocorre a partir da fala de uma só parte, portanto, parcial, que escolhe o que se
escreve e o que se omite. A decisão do magistrado fundamentava-se apenas na
situação fática que lhe havia sido relatada por uma só parte e, como lembra Karl
Larenz, “o que no facto-típico de um juízo aparece como ‘situação de fato’ é a
situação de facto como enunciado”,542 o que impede que se encontrem todas as
possibilidades que podem surgir na vida da literalidade do texto. Os médicos, a
direção do hospital, os pacientes e seus familiares não haviam sido ouvidos, o que
fez com que o conflito talvez não fosse previsível para o magistrado, que estava
distante dos fatos.
A urgência do caso inviabilizava qualquer saída jurídico-processual para a
solução do impasse e levou ao desligamento coercitivo do aparelho sonoro pela
polícia mesmo ante a decisão judicial. Isso apesar do inconformismo dos líderes da
manifestação, que alegavam estar sendo arbitrariamente privados pela polícia de um
direito constitucional e com tutela antecipada conquistada judicialmente.

542
LARENZ, Karl. Metodologia da Ciência do Direito. 7. ed. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian,
2014. p. 391.
158

Há uma fenda no direito de reunião que se abre para a conformação de seu


sentido efetivo, que inevitavelmente se dá na prática, no convívio em sociedade, que
é onde se realiza o afazer policial. Essa abertura foi evidenciada pelo Ministro Luiz
Fux em jurisprudência do STF. Nas manifestações de 2013, os sindicatos da Polícia
Civil (Sindipol) e dos trabalhadores em educação (Sind-UTE) ameaçaram fechar as
vias de acesso ao Estádio Governador Magalhães Pinto, Mineirão, nos dias de jogos
na capital mineira. O Governo estadual impetrou ação cautelar com pedido de
proibição dos atos, que deveria se estender a todo e qualquer manifestante que
tentasse impedir o regular funcionamento de serviços públicos ou a apresentação de
espetáculos e eventos culturais em todo o Estado. Foi deferido liminarmente o
pedido, com estipulação de multa diária de quinhentos mil reais.543 O Sind-UTE
levou o caso ao STF por meio da Reclamação nº 15.887. A decisão do Tribunal de
Justiça de Minas Gerais foi cassada pelo Ministro Luiz Fux, que em sua decisão
considerou legítimas as manifestações populares, ressalvado “o poder de polícia
estatal na repressão de eventuais abusos”.544
O que o ministro expôs é que há uma apreciação dos liames entre uso e
abuso do direito de reunião que se dá fatalmente no ambiente de concreção do
fenômeno jurídico. Nesse processo de individualização da norma ao caso concreto
não há uma régua prévia que proporcione mensurar incontestavelmente a partir de
qual momento deixa-se de ser uso legítimo e passa a ser abuso. Assim, as
experiências policiais permitem um olhar privilegiado para se investigar sobre a
efetividade do direito de manifestação e dos desafios que envolvem a tentativa
estatal de lidar com os conflitos que dele decorrem, o que será objeto do próximo
capítulo.

543
MINAS GERAIS. Tribunal de Justiça. Cautelar Inominada n. 1.0000.13.041148-1/000, de 13 de
jun. 2013. Cautelar Inominada. Relator Desembargador Barros Levenhagen. Belo Horizonte,
Disponível em: <http://www.agenciaminas.mg.gov.br/media/uploads/2013/06/14/decisao-tjmg -
copa.pdf>. Acesso em: 29 set. 2013.
544
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Rcl 15887, Relator(a): Min. LUIZ FUX, julgado em 19/06/2013,
publicado em processo eletrônico DJe-120 DIVULG 21/06/2013 PUBLIC 24/06/2013. Disponível em:
<http://www.stf.jus.br>. Acesso em: 24 jun. 2016.
159

6 OS CONFLITOS E A POLÍCIA

6.1 Escrito e espada

Como se evidenciou, Constituição, lei ou decisão judicial muitas vezes não


conseguem entregar uma solução pronta para as colisões de direitos fundamentais
que se dão nas ruas. A impossibilidade de abarcar o todo da vida deixa uma
margem de apreciação jurídica para a polícia, que acaba por participar da
construção do sentido efetivo das regras e dos princípios. Essa adequação da regra
escrita ao caso concreto ocorre mesmo quando no plano dogmático-normativo
parece não haver muita divergência sobre o sentido do texto. Assim, na atuação da
polícia perfaz-se uma ponte entre o escrito e a realidade na qual o policial está
imerso, momento em que a observação das circunstâncias fáticas pode indicar que
a aplicação irrefletida do texto de uma lei ou decisão judicial talvez não seja a melhor
alternativa. Por isso, no Capítulo 2, utilizou-se o conceito de analogia em
Kaufmann,545 que explica que a correspondência entre uma situação da vida e a
regra estatal é uma relação entre dimensões distintas e, consequentemente, não
tem uma precisão matemática. Há uma acomodação do texto à realidade, quando se
deve avaliar a melhor maneira de cumprir a norma dentro do contexto normativo em
que se insere, assim como ponderou a polícia espanhola nos protestos de 2011.546
Nesse processo de individualização da norma para o caso concreto, a polícia opera
uma interpretação-aplicação do escrito a partir de elementos e condições distintas
dos percebidos e utilizados por legisladores ou magistrados, tendo como
características marcantes as contingências da realidade e a urgência de uma
decisão que se dá no próprio transcurso da ação, no imediato do movimento.
Se mesmo em casas legislativas ou nos tribunais é difícil lidar com os
conflitos e com as paixões humanas que os envolvem, na rua, onde as tensões
ficam mais agudas, os desencontros e desafios tendem a ser ainda maiores. Apesar
da complexidade e dos riscos nessa etapa de concreção do Direito, o campo de
estudo do fenômeno jurídico tem privilegiado perspectivas teóricas, excluindo da
consideração acadêmica a realidade extratextual e o contato entre a face textual do
Direito e a realidade para a qual ele se volta, conforme se pontuou na Introdução.
545
KAUFMANN, Arthur. Analogía y naturaleza de la cosa: Hacia una teoría de la compresión jurídica.
Santiago: Editorial Jurídica de Chile, 1976. KAUFMANN, Arthur. Filosofia do Direito. 4. ed. Lisboa:
Fundação Calouste Gulbenkian, 2010.
546
Confira tópico 5.3, sobre os Indignados, na Espanha.
160

Nessa omissão, o exercício da atividade policial, circunstância na qual a força pode


ser necessária para dar efetividade ao Direito, tem sido relegado. Rudolf Von
Ihering, sobre isso, alerta:

O direito não é mero pensamento, mas sim força viva. Por isso, a Justiça
segura, numa das mãos, a balança, com a qual pesa o direito, e na outra a
espada, com a qual a defende. A espada sem a balança é a força bruta, a
balança sem a espada é fraqueza do direito. Ambas se completam e o
verdadeiro estado de direito só existe onde a força, com a qual a Justiça
547
empunha a espada, usa a mesma destreza com que maneja a balança.

Assim, nesse capítulo, o foco será o manejo da espada, quando, na ação da


polícia, questões anteriormente discutidas sobre Constituição, leis e decisões
judiciais ganham vida na vida das pessoas.

6.2 Uma polícia do Estado

É lugar-comum no direito lembrar que o Brasil é legatário do sistema jurídico


romano-germânico (civil law), onde a lei tem um papel mais destacado do que no
modelo britânico (common law). Dentro desse quadro, o direito administrativo
brasileiro teve forte influência do direito francês, todavia, enquanto no modelo de
origem os institutos eram construídos jurisprudencialmente, no Brasil eles foram
positivados na legislação, conforme indica Di Pietro:

Enquanto, no direito francês, o direito administrativo era de formação


pretoriana, jurisprudencial, adaptável de forma mais flexível ao interesse
público sempre cambiante, pelo trabalho criativo da jurisdição
administrativa, no Brasil essas mesmas teorias e princípios foram
incorporados ao direito positivo [...]. Além de passar para o direito positivo,
às vezes para a própria Constituição, determinados institutos de direito
administrativo, ainda se fez legislação que, pelo excesso de formalismo,
548
contribui para emperrar o funcionamento da Administração Pública.

Assim, um certo fetichismo pela lei, bastante peculiar na cultura francesa,549


parece ter sido ainda mais desenvolvido pela administração pública brasileira, na
qual a ideia da segurança jurídica pela fixação do Direito na legislação ganhou maior
ênfase. Essa observação também parece fazer sentido na arquitetura do sistema
policial. No Brasil, as instituições policiais estão previstas no art. 144 da

547
IHERING, Rudolf von. A luta pelo direito. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1998. p. 27.
548
DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. 500 Anos de Direito Administrativo Brasileiro. Revista Diálogo
Jurídico, CAJ – Centro de Atualização Jurídica, Salvador, Bahia, n. 10, jan. 2002. Disponível em:
<http://www.direitopublico.com.br>. Acesso em 4 abr. 2016. p. 19.
549
ROULAND, Norbert. Nos confins do direito. 2. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2008. p. 159.
161

Constituição, que define que “a segurança pública, dever do Estado, direito e


responsabilidade de todos, é exercida para a preservação da ordem pública [...]”.550
A expressão ordem pública, por sua vez, é definida pelo próprio ordenamento
jurídico, no Decreto nº 88.777/1983, sendo o:

Conjunto de regras formais, que emanam do ordenamento jurídico da


Nação, tendo por escopo regular as relações sociais de todos os níveis, do
interesse público, estabelecendo um clima de conveniência harmoniosa e
pacífica, fiscalizado pelo poder de polícia, e constituindo uma situação ou
551
condição que conduza ao bem comum. (grifo nosso)

Se ordem pública se restringe apenas às leis formais, ou seja, ao próprio


direito positivo-estatal, então, o papel das polícias de preservá-la seria, nada mais,
nada menos, que sustentar a própria legislação. Assim, lei e ordem se fundem e se
confundem, e garantir a lei e a ordem poderia ser substituído por garantir a lei, sem
sofrer alteração semântica. Portanto, uma certa noção de legalidade formal e estrita,
que reduz o Direito e o fenômeno jurídico ao Estado, também é refletida no sistema
policial brasileiro.
A origem da polícia brasileira também contribui para a predominância dos
interesses dos governantes em detrimento daqueles dos governados.
Tradicionalmente, se faz uma divisão esquemática entre dois modelos
552
predominantes de polícias ocidentais quanto à origem. O francês, de polícia
controlada por um poder central e voltada para a sustentação do Rei/Estado, e o
britânico, de agência policial de bases locais e preocupada com a legitimação social
de suas ações. Assim, teríamos uma polícia do Rei, francesa, em oposição a uma
polícia dos cidadãos, inglesa. A polícia brasileira foi constituída aos moldes da
polícia francesa.553 Entretanto, como pontua o historiador Francis Albert Cotta, o

550
BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil, de 5 de outubro de
1988. Diário Oficial da União, 5 out. 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em:
16 jun. 2016.
551
BRASIL. Decreto nº 88.777, de 30 de setembro de 1983. Aprova o regulamento para as polícias
militares e corpos de bombeiros militares (R-200). Diário Oficial da União, 4 out. 1983. Disponível
em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em: 16 jun. 2016.
552
Cf., entre outros, EMSLEY, Clive. The History of Crime and Crime Control Institutions. In:
MAGUIRE, Mike; MORGAN, Rod; REINER, Robert (Coords.). The Oxford Handbook of Criminology.
2nd. Oxford: Oxford University Press, 1997. p. 57-86; MONET, Jean-Claude. Polícias e Sociedades
na Europa. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2006; BAYLEY, David H. Padrões de
Policiamento. 2. ed. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2006; COTTA, Francis
Albert. Breve História da Polícia Militar de Minas Gerais. Belo Horizonte: Crisálida, 2006;
MONJARDET, Dominique. O que Faz a Polícia: sociologia da força pública. São Paulo: Editora da
Universidade de São Paulo, 2012.
553
Cf. entre outros, SULOCKI, Victória-Amália de Barros Carvalho G. de. Segurança pública e
democracia: Aspectos constitucionais das políticas de segurança pública. Rio de Janeiro: Lumen
162

modelo luso-brasileiro atribuiu ênfase maior na ideia de ordem, vendo o conflito


como uma enfermidade a ser tratada.554 Nesses termos, ao menos no âmbito das
intenções, a desordem democrática parece estar predestinada a ser combatida pelo
rigor na aplicação da lei pela polícia.

6.3 Solução que não soluciona

A realidade de escassez e exclusão do bairro Citrolândia em Betim, Minas


Gerais, não difere muito da de outros bairros periféricos das regiões metropolitanas
brasileiras. Falta infraestrutura mínima para uma vida digna, diante da pobreza que
vai além do aspecto patrimonial. Essa comunidade traz ainda uma mácula de
abandono que a acompanha desde sua formação e Keila Auxiliadora Carvalho, na
tese Colônia Santa Izabel: a Lepra e o Isolamento em Minas Gerais (1920-1960),555
demonstra a relação entre a exclusão dos hansenianos e a origem do bairro.
Pelo menos desde a escrita da Bíblia, a hanseníase é comparada ao pecado
e ocupa o ideário popular como maldição divina, devendo o doente ser expurgado
do convívio social.556 Até pouco tempo atrás, quase não havia conhecimento
científico sobre a doença e uma das raras afirmações da Medicina era acerca do
papel do homem como vetor em sua transmissão. Essas questões de ordem
científica e simbólica fomentaram políticas higienista que isolaram os leprosos em
colônias. Assim, o preconceito e a falta de informação fizeram com que governos
segregassem os portadores da hanseníase não apenas em uma perspectiva física,
mas, também, psicológica, social e histórica.557
A política de encarceramento atingia até mesmo os filhos dos infectados, que
eram expurgados do seio familiar e levados para preventórios.558 Os parentes mais
próximos também sofriam discriminação e mudavam-se para as redondezas das
colônias profiláticas para evitar o preconceito nas cidades de origem e ficarem mais

Juris, 2007. p. 63; COTTA, Francis Albert. Matrizes do sistema policial brasileiro. Belo Horizonte:
Crisálida, 2012. p. 58.
554
COTTA, op. cit., 2012. p. 51
555
CARVALHO, Keila Auxiliadora de. Colônia Santa Izabel: a lepra e o isolamento em Minas Gerais
(1920-1960). 2012. Tese (Doutorado em História) – Instituto de Ciências Humanas e Filosofia,
Universidade Federal Fluminense (UFF), Niterói, 2012.
556
BÍBLIA. Números, 12.
557
CARVALHO, op. cit..
558
Ibid., p. 62.
163

próximos de seus familiares. Nos arredores dos doentes da Colônia Santa Izabel em
Betim surgiu uma vila chamada Saúde, mais tarde rebatizada de Citrolândia.559
Se o passado evidencia a formação a partir de políticas sanitárias
excludentes, o presente e o futuro parecem não reservar horizontes muito distintos
para a região. Localizada às margens da BR-381 e da riqueza que nela viaja entre
BH e São Paulo, os moradores sofrem, entre outras carências, com a falta de
passarelas. Idosos e crianças são as vítimas mais frequentes dos constantes
atropelamentos. Em 2010, numa sexta-feira como outra qualquer, mais uma criança
morreu atropelada enquanto tentava ir de um lado para o outro da rodovia. A
segunda em um curto intervalo de dias segundo relato dos moradores.
Após tantos casos e histórias semelhantes, a tristeza veio acompanhada de
indignação. Os moradores montaram barricadas com madeiras e pneus na rodovia e
atearam fogo ao material. Juntamente com as chamas e fumaça das labaredas,
pessoas, cartazes e faixas ocuparam a via pública. Os gritos dos atados às margens
da rodovia e do reconhecimento exigiam novos caminhos para os problemas de
sempre.
O trecho da BR-381 que une BH a São Paulo recebe o nome de Rodovia
Fernão Dias. Dados do DER-MG dão conta que, entre outros números impactantes,
43% da economia mineira e 60% da produção brasileira de ferro-gusa passam por
ali.560 A manifestação dos moradores do Citrolândia já estava interrompendo essa
dinâmica econômica por horas e horas nos dois sentidos dessa via que liga a capital
mineira ao principal polo econômico-financeiro do país. O trânsito intenso de
véspera de final de semana fez com que uma fila de dezenas de quilômetros de
carros, caminhões e ônibus se formasse logo nos primeiros minutos. Em efeito
cascata, o fluxo de veículos nos acessos à rodovia, nas ruas e até nos bairros
adjacentes restava prejudicado ou completamente obstruído. Aumentava-se
copiosamente a aglomeração de pessoas, para as quais o protesto era um estorvo
em suas vidas. Trabalhadores cansados, que em um dia normal já consomem mais
de três horas na migração pendular, teriam cada minuto das horas de manifestação
e de seus desdobramentos acrescidos ao deslocamento diário ao final do dia e da
559
LARA, Maria do Carmo. Santa Izabel e Citrolândia: uma história de resistência. Brasília: Câmara
dos Deputados. 15 mai. 2002. Pronunciamento da deputada durante sessão na Câmara. Disponível
em: < http://www.camara.leg.br>. Acesso em: 28 abr. 2016.
560
DEPARTAMENTO DE ESTRADAS DE RODAGEM DE MINAS GERAIS [DER-MG]. A Rodovia
Fernão Dias: história e importância da Fernão Dias. Disponível em:
<http://200.198.22.36/html/conheca/BR381/historia.html>. Acesso em: 10 mar. 2014.
164

semana de trabalho. Ambulâncias estavam paradas, produtos perecíveis


começavam a correr risco de deterioração, viajantes ansiosos perdiam a paciência e
revoltavam-se contra os manifestantes, não apenas no epicentro do conflito, mas em
toda a extensão do congestionamento. Caminhoneiros já com horas ou dias de
viagem também mostravam sua indignação contra o protesto que os bloqueava.
A polícia foi acionada. Juntamente com outras viaturas policiais, a tropa de
choque se fez presente. Os manifestantes recusavam-se a desobstruir a rodovia
mesmo depois da chegada da polícia. A lei não determina o emprego de força, mas
se for seguida a literalidade estrita do direito vigente, parece não deixar espaço para
outra solução, pois o art. 262 do Código Penal tipifica criminalmente a conduta de
impedir ou dificultar o funcionamento de transporte público.561 Assim, tanto os
afetados pela manifestação quanto o direito positivo respaldavam uma intervenção
policial para retirada dos manifestantes da rodovia. No intuito de reestabelecer a
dinâmica da BR-381 e legitimados pelos que não suportavam ter seus direitos
inviabilizados pelos manifestantes, decidiu-se pelo uso da força para a dispersão.
Formou-se a linha de policiais com escudos, capacetes e bastões. Pedras e
madeiras eram arremessadas contra os policiais ao mesmo tempo que bombas de
efeito moral, agentes lacrimogêneos e munições de elastômero eram utilizados para
dispersar a multidão. O combate eclodiu, a força das armas a garantir a força – ou
ausência de força – da lei e a vontade dos prejudicados pelo protesto, que eram em
maior número do que os manifestantes.
Na perspectiva do costumeiro fluxo da rodovia, a lei e a ordem estatais foram
reestabelecidos. Os moradores do Citrolândia foram calados e voltaram para as
margens, onde sempre viveram. Conseguiu-se fazer com que deixassem de
prejudicar as demais pessoas que também queriam utilizar a rodovia. Porém, nos
dias que se seguiram à intervenção policial, novos protestos, pelo mesmo motivo,
voltaram a acontecer no mesmo lugar. Nos protestos seguintes, além da revolta
contra a falta da passarela, somava-se a ira pela ação da PM, que também virara
mote das manifestações posteriores.

561
“Atentado contra a segurança de outro meio de transporte [que não seja o ferroviário, marítimo,
fluvial ou aéreo]: Art. 262 - Expor a perigo outro meio de transporte público, impedir-lhe ou dificultar-
lhe o funcionamento: Pena - detenção, de um a dois anos.” (BRASIL. Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de
dezembro de 1940. Código Penal. Diário Oficial da União, de 31 dez. 1940. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br>. Acesso em: 5 out. 2015)
165

Em tese sobre a história da polícia, Juniele Rabêlo de Almeida562 tratando de


fatos ocorridos no ano de 1997, depara-se com o relato de um ex-policial:

Eu apareci na retrospectiva, que passou no final do ano de 1996, na Rede


Globo. Fui o símbolo de violência policial do ano de 1996: por obedecer
cegamente à determinação do capitão. Foi assim: o pessoal do bairro
Citrolândia fez um movimento reivindicando uma passarela porque tinha
muita gente sendo atropelada na região (o Jésus Lima fazia parte desse
movimento). Eu estava lá para policiar e uma pessoa tentou me dar uma
paulada (mas, não acertou em mim), e eu virei uma fera: bati com o bastão.
Essa cena foi filmada e eu fui símbolo de violência na retrospectiva da Rede
Globo, no final do ano de 1996. Nós éramos treinados para ter esse tipo de
reação. O pessoal do Choque treinava a gente como se fôssemos animais.
563
Éramos treinados para ser Pit Bull, só obedecer ao dono.

Dentre as várias questões que o paralelo entre casos suscita, uma delas é a
de que o problema da falta da passarela na região já se arrasta no mínimo desde os
anos 1990, com situações de fechamentos da rodovia e enfrentamento, talvez
mudando apenas aqueles que fazem os papéis de manifestantes e de policiais. Há
duas décadas a polícia dispersa a população e ela volta a protestar no mesmo local,
pelo mesmo motivo, há duas décadas os moradores pedem passarelas e recebem
granadas.
Se por um lado a falta de passarelas não foi causada nem será resolvida pela
polícia, por outro, as consequências que podem advir de uma intervenção policial
exigem uma reflexão calma e ponderada e a clareza de que o policial não é um
autômato da lei, assim como não o é o juiz ou qualquer outro que tenha a
incumbência de aplicar a lei abstrata ao caso concreto. Da mesma forma que tem
lastro na Constituição o Código Penal que criminaliza a conduta de dificultar o
funcionamento do transporte público, há também na Constituição o direito de
reunião, que sempre acontecerá com algum transtorno para a sociedade e para os
transportes coletivos. Portanto, em situações como a de Citrolândia, o militar na
função de comando precisa considerar, no processo de tomada de decisão, a
finalidade da lei e os resultados de sua aplicação, o que se chama de teleologia da
lei.564 Assim, podem contribuir para a decisão indagações como: quais bens

562
ALMEIDA, Juniele Rabêlo de. Tropas em protesto: o ciclo de movimentos reivindicatórios dos
policiais militares brasileiros no ano de 1997. 2010. Tese (Doutorado em História) – Faculdade de
Filosofia Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo (USP), São Paulo, 2010.
563
Ibid.. p. 277.
564
Segundo José Jairo Gomes, “A técnica teleológica ou sociológica tem em mira a finalidade para a
qual a norma jurídica foi editada, os resultados que ela visa a alcançar no meio social. Há que se
indagar, pois, a razão ou a finalidade da norma para, a partir daí, estabelecer seu sentido. No
o
sistema jurídico brasileiro, por imposição do artigo 5 da Lei de Introdução ao Código Civil [,
166

juridicamente tutelados estão em questão? Qual a melhor forma de acomodar não


só uma lei, mas o Direito como um todo? Qual será o resultado de cada uma das
opções legalmente possíveis? Como lembra Hans Kelsen, o direito escrito não
oferece uma única solução correta, mas forma “[...] uma moldura dentro da qual
existem várias possibilidades de aplicação, pelo que é conforme ao Direito todo ato
que se mantenha dentro desse quadro ou moldura”.565 Nesse feixe de
possibilidades, o uso da força pode ser o único meio para uma das opções legais,
mas não a única alternativa dentro da lei. O que deve levar ao senso crítico,
questionando: quantos outros protestos acontecerão no mesmo local, pelo mesmo
motivo, com cenas semelhantes, até que se perceba que se trata de um problema a
ser resolvido pela via política e não pela força da polícia?
Como se evidenciou e será discutido melhor à frente, a retirada de pessoas
que interrompam o trânsito pode encontrar respaldo no direito positivo. Entretanto, é
preciso perceber a disfunção das intervenções policiais em protestos que voltam a
acontecer no dia seguinte, com a mesma pauta, no mesmo local. Verificar essa
realidade não é atribuir a responsabilidade de todas as mazelas às agências
policiais, mas simplesmente expor a debilidade da forma tradicional de lidar com o
conflito. Em outras atividades realizadas pela polícia, uma preocupação social mais
ampla é noção razoavelmente aceita,566 entretanto, no recorte das manifestações
públicas, parece preponderar a imagem da atividade policial como exclusivamente
reativa e fundada na crença da capacidade do texto de oferecer uma única resposta
para a ação da polícia. Assim, acaba por se negligenciar o papel instrumental do
Direito na estabilização social e a real extensão do que seja aplicá-lo ao caso
concreto na atividade policial.

atualmente designada como Lei de Introdução ao Direito Brasileiro,] o aplicador da lei deve sempre
atender aos fins sociais a que ela se destina e às exigências do bem comum.” (GOMES, José Jairo.
Direito Civil: introdução e parte geral. Belo Horizonte: Del Rey, 2006. p. 66)
565
KELSEN, Hans. Teoria Pura do Direito. São Paulo: Martins Fontes, 2015. p. 390.
566
Cf. entre outros, SKOLNICK, Jerome H; BAYLEY, David H. Policiamento Comunitário. São Paulo:
Editora da Universidade de São Paulo, 2006; OLIVEIRA, Nilson Vieira (Coord.). Policiamento
Comunitário: Experiências no Brasil 2000-2002. São Paulo: Página Viva, 2002; BRASIL. Secretaria
Nacional de Segurança Pública (SENASP). Curso Nacional de Promotor de Polícia Comunitária.
Brasília: SENASP, 2007; BRASIL. Secretaria Nacional de Segurança Pública (SENASP)/Núcleo de
Estudos da Violência da Universidade de São Paulo. Manual de Policiamento Comunitário: Polícia e
Comunidade na Construção da Segurança. São Paulo: SENASP/NEV, 2009; MINAS GERAIS.
Polícia Militar. Diretriz Para a Produção de Serviço de Segurança Pública n. 04: A filosofia de Polícia
Comunitária na Polícia Militar de Minas Gerais. Belo Horizonte: Centro de Pesquisa e Pós-
graduação, 2005.
167

Existe uma indeterminação relativa neste ato de aplicação. A ordem jurídica


parte da norma mais abstrata até alcançar concreção na vida das pessoas, por meio
de um processo no qual a norma superior determina a inferior: a Constituição vincula
a lei, que vincula a decisão judicial, que vincula a decisão do policial na rua.
Entretanto, essa vinculação do escalão superior ao inferior nunca é absoluta, pois
deixa sempre uma margem de apreciação para quem é chamado a decidir.567 Isso
ficou claro na Espanha, em 2011568: a legislação, a jurisprudência e as decisões de
órgãos locais indicavam que a manifestação em Madrid contrariava determinação
expressa em lei e em decisões judiciais; no mesmo sentido, o órgão pacificador da
jurisprudência afirmou em 19 de maio que os protestos contrariavam o direito
vigente e que a partir de zero hora de sábado, dia 21, o acampamento-protesto na
Plaza Puerta del Sol seria ilegal em virtude das eleições do dia seguinte; na sexta-
feira, às 23h59 do dia 20, os manifestantes, muitos deles com esparadrapos na
boca, acompanhavam atentamente as badaladas do relógio da praça marcarem a
ilegalidade do protesto; após 30 segundos de silêncio, uma euforia de aplausos e
gritos envolveu os 25 mil manifestantes; a excitação coletiva aos moldes da
comemoração de um gol do Real Madrid ficou conhecida como “grito mudo” e dizia
aos policiais que acompanhavam estáticos o ato: agora somos ilegais.569 Talvez, a
polícia espanhola não tenha percebido que, na verdade, não aplicava uma lei, mas
ponderava o Direito como um todo, ao decidir que naquele momento a alternativa
mais adequada era optar pelo direito de reunião, ainda que contrariando texto
expresso sobre direito eleitoral e a sentença do órgão colegiado. A solução pela
força naquela ocasião não solucionaria nada e poderia aguçar conflitos.

567
KELSEN, Hans. Teoria Pura do Direito. São Paulo: Martins Fontes, 2015. p. 388.
568
Caso estudado no capítulo 5.3.
569
BARROSO, Javier F. La república de Sol reflexiona. El País Website, 21 maio 2011. Disponível
em: <http://elpais.com/diario/2011/05/21/madrid/1305977054_850215.html>. Acesso em: 1º jul.
2016.
168

Figura 19 - Grito Mudo dos Manifestantes em Madrid

570
Fonte: Javier F. Barroso.

6.4 Força policial: entre a estrita legalidade e a legitimidade

Assim como há vestígios de problemas na forma como a polícia por vezes


atua, a perspectiva de alguns juristas também é marcada por incompreensões e por
uma análise rasa do problema. O relato do ex-policial que atuou no bairro Citrolândia
nos idos de 1996 tem indicativos de ter sido uma ação individual de agressão ao
morador. Apenas por sua fala, não se pode afirmar nem negar que havia um
contexto mais amplo de emprego da força pela polícia e resistência física dos
moradores ou se era uma atuação isolada. Ações ilegais e truculentas acontecem,
seja individualmente, por um militar que desobedece ao comando, seja pelos
comandantes, que ordenam ações que violam direitos. No caso do ex-policial, o
narrador é traído pelo próprio relato, apesar de imputar a arbitrariedade ao seu
superior, ele mesmo afirma que seguiu um instinto de revidar quem tentou lhe

570
BARROSO, Javier F. La república de Sol reflexiona. El País Website, 21 maio 2011. Disponível
em: <http://elpais.com/diario/2011/05/21/madrid/1305977054_850215.html>. Acesso em: 1º jul. 2016
169

agredir; seu dono não foi o capitão, mas o Pit Bull que parece existir dentro de cada
um: como lembra Nietzsche em Humano, Demasiado Humano, “é duvidoso que um
homem muito viajado tenha encontrado em alguma parte do mundo regiões mais
feias do que no rosto humano”.571
Condutas contrárias aos preceitos constitucionais por parte dos policiais
precisam ser enfrentadas na polícia e em todos os segmentos do Estado. A violência
policial é um problema no Brasil, mas também em todos os países europeus como
indicou a European Union Network of Independent Experts in Fundamental Rights,572
em especial ante manifestações;573 o que pode ser um sinal que polícia e violência
sejam irmãs siameses em qualquer parte do mundo, em uma relação muito mais
íntima e tensa do que se costuma admitir. Assim, pretende-se demonstrar que a
natureza da atividade policial é mais problemática do que habitualmente alguns
livros sugerem. As análises e estudos muitas vezes superficiais não permitem
enfrentar de maneira franca os entraves na prática. É preciso notar que as críticas à
utilização da força não se resumem à polícia que não cumpre a lei. Se não
bastassem os casos de truculência de policiais que agem fora da moldura permitida
pelo ordenamento jurídico, o contratempo pode estar além do binômio legal-ilegal
estabelecido pelo direito positivo. Sendo mais claro: pode estar na própria
concretização do direito estatal na vida das pessoas. Em alguma medida, as revoltas
da Vacina ou Quebra-Quilos,574 entre outros exemplos, ajudam a compreender o
impasse que pode ocorrer quando a polícia tenta levar a cabo a literalidade de uma
ordenação social que vem de cima e as pessoas recusam.
Diferentemente das funções jurisdicional e legislativa, a materialização da
coercibilidade é uma característica da atuação do executivo-polícia.575 Efetivar a
coação estatal pode ensejar o emprego de força física contra a pessoa que não
cumpre espontaneamente a norma. A aceitação obediente ao direito estatal
evidencia cada vez mais ser uma quimera. Como lembra Hespanha:

571
NIETZSCHE, Friedrich. Humano, demasiado humano: um livro para espíritos livres. São Paulo:
Companhia das Letras, 2005. p. 184.
572
UNIÃO EUROPEIA. E. U. Network of independent experts in fundamental rights (CFR-CDF).
Report on the situation of fundamental rights in European Union and its member states in 2002.
Disponível em: <http://ec.europa.eu/justice/fundamental-rights/files/cfr_cdf_2002_report_en.pdf>.
Acesso em: 1º jul. 2016. p. 57.
573
Ibid.. p. 58.
574
Respectivamente analisadas nos Capítulos 4 e 5.
575
Cf. entre outros, DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 15. ed. São Paulo: Atlas,
2003.. p. 115; MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 26. ed. rev.
atual. São Paulo: Malheiros, 2009. p. 824.
170

Independentemente do que dizem as leis, muitos creem gozar de direitos e


estar obrigados a deveres que decorrem da dignidade humana, dos
imperativos da solidariedade, dos valores culturais ou religiosos, da
576
tradição, das práticas da vida diária.

Portanto, valores culturais, práticas, religião e outros fatores influenciam as


noções de certo e errado das pessoas, que não necessariamente harmonizam-se
com a legislação, ainda que elaborada em processos democrático-representativos.
Assim, quando a resistência à regulamentação estatal se depara com a força da
polícia para dar efetividade à lei, torna-se inevitável perceber a distopia de uma
ordenação social concebida de forma dissociada dos próprios interessados, que
precisa da força para ser sustentada. Dessa forma, se a criação da lei ou a decisão
judicial comportam uma resistência no plano fático, na atuação rígida da polícia para
confirmar a lei ou a sentença, os problemas podem surgir. Enquanto a resistência ao
ato do legislativo ou do judiciário por si só não força o cumprimento da lei, em seu
encontro com a rigidez da polícia na aplicação do direito, a divergência alcança o
ponto crítico.
Para compreender o problema, algumas explicações sobre o uso da força por
agências policiais se fazem necessárias. No Rio Grande do Sul, em 2015,
manifestantes seguiram um motorista que tentava não participar de protesto de sua
categoria. Ao segui-lo, seus amigos de profissão tentavam agredi-lo e batiam na
boleia do veículo, o que acabou por dar causa ao tombamento do caminhão e à
quebra da clavícula do caminhoneiro.577 Diante de um fato tipificado como lesão
corporal,578 o dever do policial é realizar a repressão imediata caracterizada na
prisão dos agressores; fazer cumprir a lei ou executá-la, como se dizia ser a função
administrativa.579 Nesse caso, a coerção, entendida como força organizada para fins

576
HESPANHA, António Manuel. Pluralismo Jurídico e Direito Democrático. São Paulo: Annablume,
2013. p. 10.
577
CAMINHONEIRO quebra clavícula após furar bloqueio de manifestantes e tombar veículo no
Oeste de SC. Diário Catarinense, Caderno Notícias, 26 abr. 2016. Disponível em:
<http://dc.clicrbs.com.br/sc/noticias/noticia/2015/02/caminhoneiro-quebra-clavicula-apos-furar-
bloqueio-de-manifestantes-e-tombar-veiculo-no-oeste-de-sc-4704921.html>. Acesso em: 15 mar.
2015.
578
Art. 129 do Código Penal. “Lesão Corporal: Ofender a integridade corporal ou a saúde de outrem:
Pena - detenção, de três meses a um ano. Lesão corporal de natureza grave. § 1º Se resulta: I -
Incapacidade para as ocupações habituais, por mais de trinta dias; [...] Pena - reclusão, de um a
cinco anos. (BRASIL. Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940. Código Penal. Diário Oficial
da União, de 31 dez. 1940. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-
lei/Del2848.htm>. Acesso em: 5 out. 2015)
579
MEDAUAR, Odete. Direito Administrativo Moderno. 14. ed. rev. atual. São Paulo: Editora Revista
dos Tribunais, 2010. p. 49.
171

jurídicos,580 manifesta-se na prisão dos responsáveis pela lesão ao caminhoneiro


que não queria participar do protesto, ainda que isso contrarie um possível desejo de
fuga dos agressores. Para se furtar aos policiais, a pessoa pode vir a oferecer
resistência e, quanto maior essa, a tendência é ser necessária uma força maior pela
polícia. Normativas sobre o assunto costumam designar a proporcionalidade e a
necessidade como dois dos princípios do uso da força,581 a partir dos quais baliza-se
a medida em que a força pode ser empregada. O manual da PMMG sobre o assunto
traz uma imagem ilustrativa:

Figura 20 – Uso diferenciado da força

582
Fonte: Polícia Militar de Minas Gerais.

À esquerda, está o nível de resistência do abordado e, à direita, a força


correspondente admitida ao policial. Entretanto, por trás da palavra força policial há
atos físicos que causam indignação em quem os vê. Intencionalmente ou não, são

580
REALE, Miguel. Lições Preliminares de Direito. 27. ed. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 71.
581
A partir de normas de direito internacional e dos manuais das polícias-militares o Ministério da
Justiça e a Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República publicaram em dezembro
de 2010 a Portaria Interministerial 4.226, que dispõe na Diretriz 2 que os princípios da legalidade,
necessidade, proporcionalidade, moderação e conveniência devem reger o uso da força pela polícia
(BRASIL. Portaria Interministerial nº 4.226, de 31 de dezembro de 2010. Estabelece diretrizes sobre
o uso da força pelos agentes de segurança pública. Disponível em:
<http://download.rj.gov.br/documentos/10112/1188889/DLFE-
54510.pdf/portaria4226usodaforca.pdf>. Acesso em: 1º jul. 2016.).
582
MINAS GERAIS. Polícia Militar. Caderno doutrinário 01: Intervenção Policial, Verbalização e Uso
da Força. Belo Horizonte: Academia de Polícia Militar, 2010. p. 87.
172

comuns os relatos sobre ações policiais utilizarem as expressões violência policial


ou violência do Estado. Na perspectiva teórica, há uma tradição no uso da
expressão violência,583 entretanto, não se pode ignorar que na prática há, para o
receptor da mensagem, uma diferença substancial entre violência policial e força
policial. A primeira por si só, mesmo antes de se saber o que aconteceu, realiza um
julgamento negativo dos fatos. Percebendo que essa diferença reflete na opinião do
leitor-ouvinte sobre a intervenção, costuma-se distinguir uso da força e uso da
violência, designando a primeira quando a força for utilizada de modo legal e
discricionário, e a segunda expressão quando ilegal e arbitrária,584 sendo balizas
para essa aferição modelos como o mostrado acima. Assim, a análise da
juridicidade de uma ação policial, para revelar se foi configurada força ou violência, é
realizada tendo por referência os padrões referidos nas normas nacionais,585 nos
manuais das polícias586 e nos diversos instrumentos sobre uso da força existentes
no direito internacional.587 Portanto, na perspectiva técnico-dogmática, o uso de
pouca ou muita força pela polícia não é, em si, legal nem ilegal; somente
observando o contexto geral de seu emprego se torna possível tal verificação.
Para conseguir o objetivo de repressão imediata contra os manifestantes,
dentre as técnicas permitidas estão as de defesa pessoal, que podem ser, entre
outras, estrangulamentos, chutes e socos. Dessa forma, não há uma lei que ordene
ao policial utilizar tais técnicas, mas, se há resistência física de quem não cumpre a
lei, elas podem vir a ser a única ou a mais indicada opção. Embora seja agressivo
para a maior parte das pessoas ver um policial estrangulando alguém, o ato pode
não ser abusivo caso o comportamento da pessoa que cometeu a conduta torne a
medida necessária. Entretanto, mesmo que necessária e proporcional, a cena causa

583
Entre outros autores que utilização a expressão, cf. BENJAMIN, Walter. Documentos de Cultura,
Documentos de Barbárie. São Paulo: Cultrix/Editora da Universidade de São Paulo, 1986.
584
MINAS GERAIS. Polícia Militar. Diretriz Para a Produção de Serviço de Segurança Pública n. 01:
Emprego da Polícia Militar de Minas Gerais na Segurança Pública. Belo Horizonte: Centro de
Pesquisa e Pós-graduação, 2002. p. 24.
585
BRASIL. Portaria Interministerial nº 4.226, de 31 de dezembro de 2010. Estabelece diretrizes
sobre o uso da força pelos agentes de segurança pública. Disponível em:
<http://download.rj.gov.br/documentos/10112/1188889/DLFE-
54510.pdf/portaria4226usodaforca.pdf>. Acesso em: 1º jul. 2016.
586
Cf. entre outros, MINAS GERAIS. Polícia Militar. Caderno doutrinário 01: Intervenção Policial,
Verbalização e Uso da Força. Belo Horizonte: Academia de Polícia Militar, 2010.
587
Diversas normas de direito internacional tocam o tema do uso de força e armas de fogo pelas
forças de segurança. Para uma abordagem mais geral cf., entre outros, OLIVEIRA, Steevan Tadeu
Soares de. O uso da força pela Tropa de Choque sob o prisma do Direito Internacional dos Direitos
Humanos. In: CAPUCIO, Camilla et al. (Orgs.). A proteção do indivíduo e da coletividade. Belo
Horizonte: Arraes Editores, 2013. (Direito Internacional no Nosso Tempo, v. 2). p. 137-151.
173

uma aversão instintiva e natural, e um recorte no qual o agente do Estado desfere


um soco ou realiza um estrangulamento é tido como abusivo sem se analisar a
história no qual veio a acontecer. Parafraseando Ferrajoli,588 quanto mais próximo do
elemento força, mais difícil se torna legitimar o Direito, e é exatamente nesse
momento de difícil legitimação do Direito que a polícia atua.
Em um contexto de aglomeração de pessoas, essa dificuldade ganha
nuances ainda mais problemáticas. Voltando ao caso de Citrolândia, o art. 262 do
Código Penal589 incrimina duas condutas contra os transportes públicos: expô-lo a
perigo e impedir ou dificultar-lhe o funcionamento.590 Na primeira modalidade, expor
a perigo, parece ser o objetivo do legislador evitar o que aconteceu em Sergipe,
quando o fechamento da rodovia por manifestantes resultou em acidente com onze
veículos e três pessoas morreram carbonizadas.591 Na segunda possibilidade, de
impedir ou dificultar o funcionamento, a adequação típica em tese aconteceu no
caso de Citrolândia, tendo em vista que os manifestantes obstruíam transporte
público. Portanto, sendo a conduta tipificada criminalmente, se o papel da polícia for
realmente dar cumprimento irrefletido à literalidade da lei estatal, não haveria muita
dúvida sobre o que fazer. E é exatamente nesse ponto que a aplicação da lei pela
polícia exibe sua face mais embaraçosa ante multidões.
Ao se sentirem injustiçados, os moradores de Citrolândia decidiram bloquear
a rodovia, deixando, portanto, de cumprir espontaneamente a norma de não obstruir
ou interromper os transportes públicos, o que tornou necessário o acionamento da
força pública. Precipitadamente, poder-se-ia argumentar que o problema estaria no
tipo penal, que, se revogado, solucionaria a questão; entretanto, o que se quer
demonstrar é que essa é uma leitura superficial. Além do Código Penal, normas de

588
FERRAJOLI, Luigi. Direito e Razão: teoria do garantismo penal. 4. ed. São Paulo: Editora Revista
dos Tribunais, 2014. p. 718.
589
Código Penal: “Atentado contra a segurança de outro meio de transporte [que não seja o
ferroviário, marítimo, fluvial ou aéreo]: Art. 262 - Expor a perigo outro meio de transporte público,
impedir-lhe ou dificultar-lhe o funcionamento: Pena - detenção, de um a dois anos § 1 – Se do fato
resultar desastre, a pena é de reclusão, de dois a cinco anos” (BRASIL. Decreto-Lei nº 2.848, de 7
de dezembro de 1940. Código Penal. Diário Oficial da União, de 31 dez. 1940. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br>. Acesso em: 5 out. 2015)
590
BITENCOURT, Cezar Roberto. Código Penal Comentado. 8. ed. São Paulo, Saraiva, 2014. p.
1120.
591
Cf.: PROTESTO do MST provoca morte de 3 pessoas em Sergipe. O Estado Website, 12 mar.
2015. Disponível em: <http://www.oestadoce.com.br/nacional/protesto-do-mst-provoca-morte-de-3-
pessoas-em-sergipe>. Acesso em: 1º jul. 2016.
174

trânsito ou a Constituição poderiam também fundamentar a ação.592 O problema


pode não estar só no escrito, mas sim em sua aplicação concreta, na realização da
coercibilidade estatal. Deve-se notar que as tentativas das agências policiais de
aplicar a literalidade das leis pode vir acompanhada de resistência dos
manifestantes. Assim, a polícia precisa aumentar o nível de força empregado; por
sua vez, essa escalada no nível da força pela polícia desdobra-se no aumento da
resistência por parte dos manifestantes. Em consequência, cria-se um ciclo no qual
atos de força são empregados em níveis cada vez maiores, ocasionando os
cenários já conhecidos e que podem não ser aceitos pelos que veem as cenas, nem
mesmo pelos que inicialmente eram contrários aos protestos. Portanto, pode ocorrer
de a aplicação rígida do texto da lei ser enfrentada pelas pessoas, o que leva a
polícia a tentar fisicamente sustentá-la por meios das técnicas de força. Nesse
contexto, ainda que respaldada legalmente, a legitimidade da ação passa a ser
questionada em virtude da espiral de violência. Assim, não apenas as ações ilegais
são capazes de colocar a opinião pública contra a polícia, mas as ações legais tidas
por ilegítimas também.
Sob certas circunstâncias, dispersar as pessoas pode ser a única opção tática
de emprego de força,593 todavia, a dispersão possui características que causam
estorvos à sua legitimação. Os agentes químicos, para conseguirem o fim ao qual se
destinam, possuem efeitos psíquicos e fisiológicos como náuseas, vômitos,
lacrimejamento, irritação das vias aéreas, dificuldade para respirar, sensação de
queimadura, dor intensa ou terrível mal-estar passageiro.594 Sem tais efeitos que
não se consegue suportar, as pessoas não se dispersariam. Além disso, a fumaça
que uma granada lacrimogênea gera não diferencia quem está cometendo um ato
592
Ver Capítulos 2, 3 e 4 que analisam o conflito e concorrência de direitos, e evidenciam que outros
dispositivos do direito brasileiro incidem sobre as manifestações além do direito de reunião no inciso
o
XVI, art. 5 da CRFB/88.
593
Consoante o que costumeiramente os manuais das tropas de choque no Brasil denominam como
prioridade do emprego dos meios ou desdobramento geral das operações, confira, entre outros:
BRASIL. Ministério do Exército. Manual de Campanha: Polícia. Distúrbios Civis e Calamidades
Públicas (C-19-15). 3. ed. Brasília: Estado-Maior do Exército, 1973. p. 33; SÃO PAULO. Polícia
Militar. Manual de Controle de Distúrbios da Polícia Militar. 3. ed. São Paulo: Setor Gráfico do
CSM/M Int, 1997. p. 13; DISTRITO FEDERAL. Polícia Militar. Manual de Operações de Choque (M-
2-PM). 2. ed. Brasília: Polícia Militar do Distrito Federal, 2012. p. 106; ESPÍRITO SANTO. Polícia
Militar. Manual de Operações de Choque. Vitória: Polícia Militar do Espírito Santo, 2012. p. 100;
MINAS GERAIS. Polícia Militar. Caderno doutrinário 10: Operações de controle de distúrbios. Belo
Horizonte: Academia de Polícia Militar, 2013. p. 47; RIO GRANDE DO NORTE. Polícia Militar.
Manual Técnico: Operações de Choque. Natal: Polícia Militar do Rio Grande do Norte, 2013. p. 18.
594
BRASIL. Secretaria Nacional de Segurança Pública (SENASP). Curso Uso Progressivo da Força e
Tecnologias não letais: apostila de tecnologia menos letal, armamentos, equipamentos e munições
químicas. Belo Horizonte: SENASP, 2010. p. 10-14.
175

violento ou não, assim como não distingue manifestantes, meros observadores,


jornalistas ou quem, por um acaso qualquer, está passando pelo local. Por sua vez,
a munição de impacto controlado de elastômero (munição de borracha), que em
alguns casos específicos pode ser empregada por ter um grau de letalidade bem
menor, tem também uma precisão menor do que as munições reais,595 o que
aumenta a chance de acertar uma pessoa distinta da que se visava imobilizar. Deve-
se acrescentar ainda que a dispersão realizada pela força ocorre em meio a correria
e pânico, onde pessoas podem passar mal, cair, serem pisoteadas ou submetidas a
diversos outros riscos em razão da geografia do local. Dessa maneira, mesmo uma
intervenção policial inicialmente sem emprego de equipamentos ou armamentos
pode ser vista pelos que forem coagidos como abusiva, sendo recusada e
desencadeando toda a espiral da violência e a dispersão, com possibilidade de
responsabilização do Estado em virtude dos danos causados pela ação.
Portanto, assim como leis e decisões podem dar causa ou potencializar
protestos, o mesmo parece acontecer com a intervenção da polícia, ainda que
fundamentada em lei ou decisão judicial. A consciência de que a proibição e a força
podem aumentar as dimensões das manifestações ou dos distúrbios é muito anterior
aos grandes protestos do século XXI. Na verdade, desde o surgimento dos atos
coletivos que podem ser denominados como manifestações no primeiro terço do
século XIX, ações restritivas e repressivas das autoridades são associadas ao
aumento do impacto de protestos, como aconteceu na Alemanha em 1832.596 Em
1855, a investigação parlamentar que sucedeu um distúrbio no Hyde Park em
Londres chegou a afirmar que a proibição policial ao protesto garantiu que ele
acontecesse.597 No final do século XIX, a discussão novamente veio à tona quando
parecem ter havido retrocessos a uma postura mais autoritária pela polícia inglesa.
595
De um modo geral o mecanismo de disparo de uma arma de fogo obedece a seguinte lógica: após
o acionamento da tecla do gatilho (disparo) e a percussão da munição o projétil passa pelo cano da
arma onde consegue estabilidade por meio de ranhuras internas ao cano. Nessas raias o projétil
adquire um movimento de rotação que, em grande medida, é responsável pela precisão do disparo.
Assim, denomina-se o cano (alma) das armas como raiados. (MINAS GERAIS. Polícia Militar.
Manual de Armamento Convencional. Belo Horizonte: Academia de Polícia Militar, 2011. p. 96-101)
Nas operações de choque, utiliza-se a munição de elastômero (borracha) que em virtude do
material precisam de um cano sem raias (alma lisa) tendo, por isso, uma precisão menor do que a
de outras armas.
596
NORDBLOM, Pia. Resistance, Protest, and Demonstration in Early Nineteenh-Century Europe:
The Hambach Festival of 1832. REISS, Matthias (Ed.). The Street as Stage: Protest marches and
public rallies since the nineteenth century. Oxford: Oxford University Press/The German Historical
Institute London, 2007. p. 78.
597
KELLER, Lisa. Triumph of order: Democracy & public space in New York and London. New York:
Columbia University Press, 2009. p. 79.
176

Segundo Lisa Keller, à época, o antagonismo contra a polícia cresceu e “quão mais
a polícia tentava reprimir as reuniões, mais elas cresciam”.598 Segundo Nikola
Dimitrov, em estudos sobre protestos em Sofia, Bulgária, nos anos de 1996 e 1997,
percebeu-se que a intervenção da polícia em manifestações deu causa a distúrbios
não somente na capital, mas também em cidades do interior do país.599
Assim, se por um lado deixar à escolha dos próprios manifestantes se
cumprem ou não leis e decisões judiciais pode originar graves problemas práticos,
com as pessoas afetadas pelo protesto, e teóricos à noção de Estado Democrático
de Direito, por outro, a tentativa de dar efetividade ao aspecto formal do Direito pode
ter um resultado mais nefasto do que o embaraço que se tentava equacionar.
Independentemente das circunstâncias positivadas nas normas, se a polícia
empregar grande quantidade de força, ainda que necessária para as circunstâncias,
os que visualizam a cena podem vir a repudiar a ação, como pontua Mathias Reiss:

O uso da força pode aumentar o tamanho dos protestos, colocar geralmente


um número pequeno de manifestantes no papel de vítimas e assim
aumentar o suporte público para eles. Como um dos objetivos do protesto é
aumentar o apoio para uma causa particular ou para um movimento, o uso
da força pelo Estado, mesmo se provocada por comportamentos ilegais dos
600
manifestantes, pode, portanto, sair pela culatra.

Monika Dowbor e José Szwako (2013), sem desconsiderar o lado estratégico


e os objetivos de uma manifestação, procederam a uma leitura dramatúrgica dos
protestos, no qual manifestantes e policiais tentam conquistar o público. Assim, por
meio de metáforas teatrais, demonstraram que as ruas podem ser tomadas como
palcos e os protestos por episódios:

Nessa competição pela interpretação da plateia e por uma reação positiva


do público, a performance dos movimentos visa transformar aquilo que é
uma plateia desde sempre virtual (seja ela as autoridades estatais, a opinião

598
No original: “the more the police tried to repress meeting, the larger they grew.” (Ibid., p. 124)
599
DIMITROV, Nikola D. Streets of Anger: Opposition protests in Belgrade and Sofia during the Winter
months of 1996-1997. In: REISS, Matthias (Ed.). The street as stage: protest marches and public
rallies since the nineteenth century. Oxford: Oxford University Press/The German Historical Institute
London, 2007. p. 249.
600
No original: “The use of force can increase the profile of protest marches, cast the usually
structurally inferior protesters into the role of victims, and thereby increase public support for them.
As one aim of demonstrations is to increase support for a particular cause or movement, the use of
force by the state, even if provoked by lawless behavior on the part of the protestors themselves, can
therefore backfire.” (REISS, Matthias (Ed.). The Street as Stage: protest marches and public rallies
since the nineteenth century. Oxford: Oxford University Press/The German Historical Institute
London, 2007. p. 18, tradução nossa)
177

pública ou quaisquer outras personagens da sociedade civil) em um público


601
espectador cativo, um aliado.

Ao analisar uma manifestação do Movimento Passe Livre em Florianópolis em


2005, Dowbor e Szwako indicam que na luta pela opinião da audiência, “[...] a
violência é dramatizada e fornece a matéria-prima do trabalho de martirização para o
MPL, extraídas de suas interações com as forças repressivas [...]”.602 Por meio
desse recurso cênico, a “[...] violência não é, por si só, uma estratégia desse
movimento: é, antes, uma modalidade de interação pela qual e a partir da qual os
militantes se representam como personagens ‘vítimas’, isto é, vitimizados e
antagonizados por ‘vilões’”.603 Um dos motivos para isso é que, como pontua Dieter
Ruch, a mídia geralmente dá atenção aos protestos maiores ou aos que violem
regras, enquanto muitos outros protestos menores simplesmente não existem para o
grande público. 604
Nesse sentido, não se torna estranha a constatação de Birgitta Bader-Zaar ao
estudar manifestações na Alemanha no início do século XX, percebendo que
manifestantes tentavam atingir a opinião pública e o governo não pela marcha em si,
mas pelas prisões dos manifestantes.605 Algo semelhante foi notado por Flávio
Morgenstern nas manifestações de 2013 em São Paulo, para quem a combinação
entre violência policial e recorte-manipulação nas imagens das intervenções policiais
em protestos violentos foi decisiva para o apoio que os atos conseguiram país
afora.606 Com os dispositivos tecnológicos que permitem gravar e difundir em
segundos as cenas de confrontos, manipuladas ou não, com emprego pela polícia
de força legal ou ilegal, a resistência a certas ações do Estado repercute

601
DOWBOR, Monika. SZWAKO, José. Respeitável Público... Performance e organização dos
movimentos antes dos protestos de 2013. Novos Estudos - CEBRAP, São Paulo, n. 97. p. 43-55,
nov. 2013. p. 44-45.
602
DOWBOR, Monika. SZWAKO, José. Respeitável Público... Performance e organização dos
movimentos antes dos protestos de 2013. Novos Estudos - CEBRAP, São Paulo, n. 97. p. 43-55,
nov. 2013. p. 54.
603
Ibid.. loc. cit..
604
RUCHT, Dieter. On the sociology of protest marches. In: REISS, Matthias (Ed.). The Street as
stage: Protest marches and public rallies since the nineteenth century. Oxford: Oxford University
Press/The German Historical Institute London, 2007. p. 51.
605
BADER-ZAAR, Birgitta. With Banners Flying: A comparative view of women’s suffrage
demonstrations 1906-1914. In: REISS, Matthias (Ed.). The street as stage: protest marches and
public rallies since the nineteenth century. Oxford: Oxford University Press/The German Historical
Institute London, 2007. p. 108.
606
MORGENSTERN, Flávio. Por trás da máscara: Do passe livre aos black blocs, as manifestações
que tomaram as ruas do Brasil. 2. ed. Rio de Janeiro: Record, 2015. p. 168-182.
178

instantaneamente em uma proporção inconcebível anos atrás e coloca em xeque o


emprego de força, ainda que legal.
Enquanto no plano da escrita são possíveis correções e recursos
processuais, no mundo fático as consequências são irreparáveis. Não há recurso
com efeito suspensivo para uma granada de efeito moral que se lance contra um
grupo que destrói patrimônio público e na dispersão uma pessoa seja atropelada.
Portanto, a coercibilidade que é inerente ao Direito pode colocar os espectadores
contra a ação policial independentemente de sua legalidade. Além disso, pode ser
trabalhada para conseguir o objetivo do protesto: chamar atenção para a causa.
Essas questões dificultam a legitimação do uso da força e pesam no momento da
decisão de quem precisa traduzir o texto para a realidade, pois a mera noção de
legalidade estrita não garante o sucesso de uma operação policial, o que faz com
que uma dimensão consequencialista do direito ganhe ainda mais relevo.

6.5 Uma polícia para aplicação do Direito

Diante dessas dificuldades, ainda que não assumam de maneira franca,


empiricamente, algumas instituições policiais notaram que a aplicação estrita e
rígida de uma lei pode não ser o melhor caminho no trato com as manifestações
públicas. Os sociólogos Olivier Fillieule e Fabien Jobard, após estudarem a relação
entre polícia e protestos na França, afirmaram que:

Seria equivocado sustentar uma explicação sobre o tratamento de protestos


unicamente em uma análise da lei e dos meios materiais à disposição das
autoridades políticas. Na França, a prática do policiamento de
manifestações é caracterizada por dois aspectos: primeiro, uma continua
busca pela negociação e compromisso para acordo, mesmo se tal acordo
não está necessariamente baseado nas letras da lei; segundo, uma
607
subutilização de meios coercitivos.

No mesmo sentido, Donatella e Reiter afirmam que a polícia italiana tem


adotado “um modelo de negociação, baseado em uma presença mais ativa da

607
No original: "It would be misleading to base an explanation of the handling of protest solely on an
analysis of the legal and material means at the disposal of the political authorities. In France, the
practice of protest policing is characterized precisely by the two following aspects: first, the
continuous search, through negotiation and compromise, for agreement even if such agreement is
not necessarily based on the range of legal means; second, the underuse of available coercive
means” (FILLIEULE, Olivier; JOBARD, Fabien. The policing of protest in France: Toward a model of
protest policing. In: PORTA, D. D.; REITER, H. (Org). Policing protest: The control of mass
demonstrations in western democracies. Minneapolis: University of Minnesota Press, 1998. p. 75,
tradução nossa)
179

polícia com o objetivo de mediar entre os manifestantes e não-manifestantes que


sofrem os efeitos disruptivos dos protestos”.608 Exemplo semelhante se percebe no
Canadá. A polícia da cidade de Vancouver (Vancouver Police Department – VPD)
tem sido reconhecida internacionalmente como um dos melhores modelos de
policiamento em manifestações.609 Este órgão institucionalizou em suas diretrizes
que, em realidade, “[...] usa seu poder discricionário para permitir reuniões públicas
que podem violar a legislação de trânsito ou outras leis municipais [...]”.610 A partir do
exemplo de Vancouver, outras polícias canadenses também começaram a adotar
um modelo mais flexível de aplicação da lei.611 O reconhecimento e
institucionalização de colocar em segundo plano uma dada norma quando diante de
aglomerações de pessoas pela polícia de Vancouver é instigante, sobretudo quando
se percebe que a polícia que admite essa possibilidade de não aplicar a literalidade
de um texto de lei é a que tem sido elogiada internacionalmente em virtude dos
resultados alcançados. Parece ser o caso de um aprendizado a partir da prática de
que o aspecto dogmático do Direito precisa ser trabalhado no caso concreto, quando
determinada lei é articulada dentro de todo o sistema jurídico em que se insere e as
circunstâncias da realidade.
Em certo sentido, elementos para uma solução concertada na ordenação
social em manifestações também podem ser encontrados na Irlanda do Norte,612 na
Suécia,613 nos Estados Unidos,614 na Inglaterra,615 na África do Sul616 e na

608
No original: “[...] a model of negotiation, based on a more active police presence with the objective
of mediating between the demonstrators and ‘nondemonstrators’ who are said to suffer the disruptive
effects of protests” (DELLA PORTA, Donatella; REITER, Herbert. The policing of protest in western
democracies. In: DELLA PORTA, Donatella; REITER, Herbert. (Org). Policing protest: The control of
mass demonstrations in western democracies. Minneapolis: University of Minnesota Press, 1998. p.
8, tradução nossa)
609
POLICE EXECUTIVE RESEARCH FORUM. Managing major events: Best practices from the field.
Washington, D.C.: Police Executive Research Forum, 2011.
610
“In fact, the VPD uses its discretion in allowing public gatherings which may violate the Motor
Vehicle Act or municipal bylaws […]”. VANCOUVER POLICE DEPARTMENT. Public demonstration
guidelines. Vancouver: Vancouver Police Department, 2012. p. 4.
611
VANCOUVER POLICE DEPARTMENT. 2011 Stanley Cup Riot Review. Vancouver: Vancouver
Police Department, 2011. p. 26.
612
BRYAN, Dominic et al. The Flag Dispute. Belfast: Queen’s University Belfast/Institute for the Study
of Conflict Transformation and Social Justice; JARMAN, Neil. Another form of troubles: Parades,
protests, and the Northern Ireland peace process. In: REISS, Matthias (Ed.). The street as stage:
Protest marches and public rallies since the nineteenth century. Oxford: Oxford University Press/The
German Historical Institute London, 2007. p. 255-272; BYRNE, Jonny. Reflections on the Northern
Ireland experience: The lessons underpinning the normalization of policing and security in a divided
society. Belfast: Police Service Of Northern Ireland, Intercomm, SafeWorld, 2014.
613
ADANG, Otto M. J.. Reforming the Policing of Public Order in Sweden: combining research and
practice. Policing, 30 out. 2012. Disponível em:
180

Finlândia.617 Dessa forma, diversas agências policiais entenderam o que Peter


Waddington contemplou ao estudar a dinâmica entre polícia e manifestantes em
Londres: “enquanto a lei é considerada pelos legisladores como um meio de
solucionar problemas, sua aplicação pode na verdade criar grandes problemas para
a polícia”.618
Isso pode ocorrer, sobretudo, com normas rígidas, que podem criar
dificuldades de se operacionalizar na prática, como a proibição no direito brasileiro
de manifestações de caráter eleitoral-partidário com amplificadores de som a menos
de 200 metros de distância de algumas repartições públicas.619 A dificuldade passa
pela identificação de quais protestos teriam a natureza político-partidária até a
aferição precisa da metragem. Na prática, a teleologia da norma de evitar que o ato
político atrapalhe o regular funcionamento de algumas instituições pode ser
alcançada com uma distância inferior à estabelecida na lei e a tentativa da polícia de
barrar uma manifestação que se aproxime de uma sede de prefeitura pode criar
problemas ou agravar disputas e conflitos latentes. Assim, essas normas rígidas
precisam ser compatibilizadas com os princípios que lhes são superiores e o agente

<http://policing.oxfordjournals.org/content/early/2012/10/30/police.pas050>. Acesso em: 12 abr.


2016.
614
McPHAIL, Clark; SCHWEINGRUBER, David; McCARTHY, John. Policing Protest in the United
States: 1960-1995. DELLA PORTA, Donatella; REITER, Herbert. (Org). Policing protest: The control
of mass demonstrations in western democracies. Minneapolis: University of Minnesota Press;DELLA
PORTA, Donatella; REITER, Herbert. (Org). Policing protest: The control of mass demonstrations in
western democracies. Minneapolis: University of Minnesota Press, 1998; ROHDE, Stephen F.
Freedom of assembly. New York: Facts On File, 2005. p. 109.
615
WADDINGTON, David P. Policing Public Disorder: theory and practice. London: Routledge, 2012;
WADDINGTON, P. A. J.. Liberty and Order: public order policing in a capital city. London: University
College London Press; WADDINGTON, P. A. J. Coercion and Accommodation: Policing Public
Order after the Public Order Act. In: British Journal of Sociology. Vol. 45, n. 3, set., 1994b.
616
MZIRAY, Cheggy. The right to peaceful assembly and demonstration in Tanzania: A comparative
study with Ghana and South Africa. Saabrücken: LAP LAMBERT Academic Publishing, 2012.
617
FINLAND. Assembly Act, 530/1999. Disponível em: <http://www.finlex.fi>. Acesso em: 27 abr.
2016.
618
No original: “whereas the law is conceived by legislators as a means of resolving problems, its
enforcement can actually create greater problems for the police.” (WADDINGTON, P, A. J., op. cit.,
1994b. p. 381)
619
Art. 39. A realização de qualquer ato de propaganda partidária ou eleitoral, em recinto aberto ou
fechado, não depende de licença da polícia. […]§ 3º O funcionamento de alto-falantes ou
amplificadores de som, ressalvada a hipótese contemplada no parágrafo seguinte, somente é
permitido entre as oito e as vinte e duas horas, sendo vedados a instalação e o uso daqueles
equipamentos em distância inferior a duzentos metros: I - das sedes dos Poderes Executivo e
Legislativo da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, das sedes dos Tribunais
Judiciais, e dos quartéis e outros estabelecimentos militares; II - dos hospitais e casas de saúde; III -
das escolas, bibliotecas públicas, igrejas e teatros, quando em funcionamento. (BRASIL. Lei nº
9.504, de 30 de setembro de 1997. Estabelece normas para as eleições. Diário Oficial da União, 1º
out. 1997. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9504.htm>. Acesso em: 19 abr.
2015. grifo nosso)
181

público deve aplicar o Direito, e não só a literalidade de uma lei, de acordo com as
circunstâncias do caso concreto.
Perceber a função policial como aplicadora do Direito parece ter um outro
fator de estorvo no Brasil. Enquanto para o Judiciário geralmente se diz que se
aplica a lei como sinônimo de sua atribuição jurisdicional de dizer o Direito, as
polícias geralmente são vistas em uma perspectiva mais estéril, o que dificulta
assumir uma atividade de articulação de princípios constitucionais e mesmo de
composição de acordos com os manifestantes.
Na língua inglesa, costuma-se fazer alusão aos policiais como Law
Enforcement Officials.620 Naquele idioma, o ato do Estado emanado do Legislativo
que designamos por lei, é law, mas também statute ou act. Por sua vez, o termo law
é utilizado tanto na acepção de lei em sentido estrito quanto para o sistema jurídico
como um todo, semelhante ao vocábulo Direito no português.621 Na tradução de Law
Enforcement Officials para o português, consolidaram-se as expressões funcionários
encarregados de fazer cumprir a lei622 ou de aplicar a lei,623 o que tem, portanto,
uma dimensão bem mais restrita do que nos países anglo-saxões, cuja expressão
pode ser entendida com agentes encarregados de aplicar o Direito. Essa percepção
mais restrita pode fazer com que os lusófonos concebam polícia unicamente como
atividade que faz com que as pessoas cumpram as leis ou aplicadora da literalidade
das regras.
Por causa disso, em certas circunstâncias, quando na aplicação da norma é
possível prever problemas maiores do que os que se tenta resolver, pode ser mais
fácil para as polícias de matriz anglo-saxã admitir que adotam uma interpretação em
conformidade com os resultados. Dessa maneira, não é de todo despropositado que
620
Por exemplo nas versões em inglês dos tratados e normas internacionais sobre o uso da força
pela polícia. Sobre o tema, cf., entre outros, OLIVEIRA, Steevan Tadeu Soares de. O uso da força
pela Tropa de Choque sob o prisma do Direito Internacional dos Direitos Humanos. In: CAPUCIO,
Camilla et al. (Orgs.). A proteção do indivíduo e da coletividade. Belo Horizonte: Arraes Editores,
2013. (Direito Internacional no Nosso Tempo, v. 2). p. 137-151.
621
Para comparar o emprego dos vocábulos, cf. FONSECA, Luciana Carvalho. Inglês Jurídico:
tradução e terminologia. São Paulo: Lexema, 2014. E os dicionários OXFORD Advanced Learner’s
Dictionary. 8. ed. Oxford: Oxford University Press, 2010; e CASTRO, Flávio de. Compacto:
Dicionário Jurídico Inglês-Português. Rio de Janeiro: Aide, 1994.
622
REGULAÇÃO do uso da força pelos funcionários encarregados de fazer cumprir a lei. Naciones
Unidas, Derechos Humanos Website, 20 jan. 2012. Disponível em: <http://acnudh.org/pt-
br/regulacao-do-uso-da-forca-pelos-funcionarios-encarregados-de-fazer-cumprir-a-lei/>. Acesso em:
1º jul. 2016.
623
NAÇÕES UNIDAS. Código de conduta para os funcionários responsáveis pela aplicação da lei.
Adotado pela Assembleia Geral das Nações Unidas, em 17 de dezembro de 1979, através da
Resolução nº 34/169. Disponível em: <http://www.camara.gov.br/sileg/integras/931761.pdf>. Acesso
em: 1º jul. 2016.
182

um modelo negocial de polícia pareça ser mais sedimentado em países como


Inglaterra, Canadá, Estados Unidos e Irlanda do Norte. Sintomas disso podem estar
presentes na postura da polícia de Vancouver, que afirma em seu manual
(guidelines) que pode ser inviável aplicar o texto estrito da lei, e no embaraço do
comando da polícia espanhola no pronunciamento durante os protestos de 2011,624
que não cumpriu interpretação costumeira da lei nem a decisão dos órgãos
jurisdicionais enquanto afirmava que a polícia cumpriria lei e decisões dos tribunais.

6.6 Os protestos e a normatividade de tessitura aberta

Diversos sinais parecem revelar, portanto, o fracasso da tentativa de


regulamentação total e fixa dos espaços urbanos sustentada pela força policial para
controlar protestos. Como lembra Hespanha, a validade das normas jurídicas não se
estabelece de forma tão mecânica, por isso, “é hoje bem claro que a legitimação do
direito a partir de um hipotético contrato social que desse origem a uma vontade
geral é, a vários títulos, um mito”.625 A norma escrita pode vir a ser desprezada pelas
pessoas e é na atuação física da polícia para dar efetividade ao direito estatal, para
fazer as pessoas cumprirem as leis, que o desacordo pode virar violência. Leis e
decisões dos tribunais, por si sós, não materializam a coação do Direito, o que faz
com que na intervenção da polícia a recusa ao Estado aflore de forma mais
contundente, tornando a atividade policial fecunda em desencontros e contratempos.
A desobediência às regras estatais acompanha a história da humanidade,
como lembra Fernando Armando Ribeiro.626 O autor retorna à mitologia grega,
apontando o mito no qual Creonte, governante de Tebas, ordena que seja deixado
insepulto um irmão de Antígona que morrera em uma conjuração contra a cidade.
Entretanto, Antígona enterra o irmão obedecendo às leis divinas que governavam a
família, em detrimento das leis da cidade.627 A noção de justo de Antígona não
coincidiu com as regras que lhe foram impostas externamente pelas autoridades.
Todavia, o direito moderno, com sua “[...] crença na solução universal das soluções

624
A Espanha, assim como Brasil e Portugal, tem como matriz jurídica o civil law do direito
continental, o modelo de polícia francesa, e na tradução para o Espanhol a expressão Law
Enforcement Officials ficou como Código de Conductas para Funcionarios Encargados de Hacer
Cumplir la Ley.
625
HESPANHA, António Manuel. Pluralismo Jurídico e Direito Democrático. São Paulo: Annablume,
2013. p. 80.
626
RIBEIRO, Fernando Armando. Conflitos no Estado Constitucional Democrático: por uma
compreensão jurídica da Desobediência Civil. Belo Horizonte: Mandamentos, 2004. p. 18.
627
Ibid.. p. 26
183

jurídicas”,628 não se dá conta de que existem vários modos de juridicidades, e que “o


direito oficial, estatal, que está nos códigos e é legislado pelo governo ou pelo
parlamento, é apenas uma dessas formas [...]”.629 Ao se clarear tal questão,
percebe-se que o senso de juridicidade que as pessoas seguem nem sempre
coincide com o do direito formal, e tentar inserir pela força a realidade em um dado
padrão normativo rígido pode fazer com que a intervenção da polícia leve a um
resultado oposto à finalidade da lei. Assim, aplicar o Direito na atividade policial ante
as manifestações públicas exige um poder discricionário que realize conexões entre
as diversas normas e entre essas e a realidade na qual se está imerso.
A atenção às especificidades do caso na atuação da polícia pode indicar
também a necessidade de padrões normativos menos rígidos. André-Jean Arnaud
questiona esse Estado soberano, controlador pleno dos comportamentos e da
execução das regras, sugerindo um direito de “textura aberta”630 por meio de um
novo tipo de regulação social. Para o autor:

[...] estamos lidando, hoje em dia, com uma racionalidade do direito


teleologicamente lúdica – segmentada tanto nos seus lugares de produção
e de implementação, quanto pela sobrevinda de outros atores imprevistos –
e complexa, passando da negociação, nos seus modos de produção
normativa, para uma participação capaz de recolocar em questão o contrato
631
social sobre o qual repousam nossas democracias representativas.

Esse direito de textura aberta que reconhece a inadequação do controle


Estatal pleno e das regras fixas também é percebido em outros autores. A tese de
François Ost para o Direito é a de que “[...] a função principal do jurídico é a de
contribuir para a instituição do social”.632 Boaventura de Sousa Santos diz que, “na
organização política emergente, cumpre ao Estado coordenar os diferentes
interesses, organizações e redes que resultaram da desestatização da regulação

628
ARNAUD, André-Jean. O Direito Traído Pela Filosofia. Porto Alegre: Sérgio Antônio Fabris Editor,
1991. p. 246.
629
SANTOS, Letícia Camila dos. Análise da decisão judicial no quadro da legisprudência: O diálogo
das fontes do direito. 2011. 173 f. Dissertação (Mestrado em Direito) – Faculdade de Direito,
Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Belo Horizonte, 2011. p. 205.
630
ARNAUD, André-Jean. Da Regulação pelo direito na era da globalização. In: MELLO, Celso
Antônio Albuquerque. Anuário Direito e Globalização: A Soberania. Rio de Janeiro: Renovar, 1999.
p. 24.
631
ARNAUD, André-Jean. Governar Sem Fronteiras: entre globalização e pós-globalização. Crítica da
Razão Jurídica. v. 2. Rio do Janeiro: Lumen Juris, 2007. p. XX.
632
OST, François. O tempo do direito. Lisboa: Instituto Piaget, 2001. p. 13.
184

social”.633 Em sentido semelhante, Norbert Rouland, por meio da análise sobre o


pluralismo de valores que o direito deve comportar, afirma que:

[...] vários sinais parecem mostrar que as diferentes instâncias que compõe
a sociedade civil almejam diminuir, se não suprimir, o papel instituidor do
social que o Estado pretende desempenhar há dois séculos. Isso não
significa que o Estado deve desaparecer, mas, antes, modificar-se, mostrar-
se mais o agente coordenador de novas solidariedades: em suma, mais um
conciliador do que um regulador. Aqui nós nos juntaríamos às aspirações a
um direito estatal mais inspirado na ordem negociada e ao recolhimento de
um autêntico pluralismo jurídico, irredutível a uma única técnica de
634
desconcentração.

Assim, os exemplos das agências policiais que descobrem que a aplicação


rígida e automática da lei pode não ser o melhor caminho para lidar com as
manifestações públicas parecem refletir uma ordem negocial. Com a noção de
desobediência civil, até mesmo o Direito pensado em termos estatais assume a
ruptura dentro de seu poder de esgotar a regulamentação social. Segundo Fernando
Armando Ribeiro, a desobediência civil ocorre quando uma pessoa resiste ao Direito
posto, por motivo de justiça, o que se traduz em uma forma de participação não
regulamentada embora não externa ao sistema constitucional.635 Apesar de
contrariar lei válida, o autor defende que há um lastro constitucional na
desobediência civil, pois é informada pelos mesmos princípios e valores que
fundamentam o sistema jurídico-político.636 Portanto, aceitar certo nível de desordem
democrática e de desobediência às regras estatais encontra respaldo na própria
Constituição. Mais do que solucionar um problema – como se o povo na rua fosse
um problema a ser resolvido –, a decisão policial mais ajustada deve ser fruto da
aplicação do Direito entendida como a articulação de princípios e regras
constitucionais com as leis vigentes, no sentido de se evitar que as divergências se
agudizem e ganhem gravidade.
Nesse referencial, é preciso aprender a lidar com os conflitos ao invés de se
tentar eliminá-los pela lei ou pela força. Assim, o PL nº 281/13, pendente de votação
em Belo Horizonte,637 está mais próximo de um anseio controlador do que de um

633
SANTOS, Boaventura de Sousa. Poderá o direito ser emancipatório? Revista Crítica de Ciências
Sociais, Coimbra, n. 65. p. 3-76, maio 2003. p. 65.
634
ROULAND, Norbert. Nos confins do direito. 2. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2008. p. 168.
635
RIBEIRO, Fernando Armando. Constitucionalismo e Teoria do Direito. Belo Horizonte: Del Rey,
2013. p. 43.
636
RIBEIRO, Fernando Armando. Conflitos no Estado Constitucional Democrático: por uma
compreensão jurídica da Desobediência Civil. Belo Horizonte: Mandamentos, 2004. p. 218.
637
Estudado no Capítulo 3.2.
185

Direito de teor aberto; pretende mais instituir o social do que colaborar com ele. O
conteúdo da norma opera uma ordenação social hermética, que desconsidera a
participação das pessoas e a realidade dos protestos na capital mineira que
tradicionalmente acontecem onde a norma proíbe, tornando ilegais manifestações
nos bairros centrais e permitindo apenas os protestos realizados entre 20h e 6h, ou
em uma praça fechada da capital. Quais não seriam os empecilhos encontrados
pela polícia para conseguir proporcionar efetividade a tal regulamentação?
André-Jean Arnaud contribui para entender o reconhecimento do controle
excessivo do Estado quando diferencia regulação de regulamentação. Enquanto a
primeira seria “[...] uma orientação de ação no âmbito de um sistema organizado em
intercâmbio com o ambiente, e que põe em prática processos de adaptação”,638 a
regulamentação “[...] remete à autoridade suprema do Estado no seu poder de dizer
o direito”.639 Assim, ainda que se possa admitir certas restrições espaciais aos
protestos,640 a criação do Protestródromo em BH, ou Parlatório Democrático do
Município, como diz a lei, mais regulamenta do que regula e provavelmente não terá
eficácia social, a não ser sob o custo de uma ação igualmente rígida da polícia,
baseada na força.
Em sentido oposto, em alguns protestos em Belo Horizonte foi possível
perceber que um viés negocial-conciliador parece ser mais adequado do que a
ordenação verticalizada. Acordos entre polícia e manifestantes sobre o fechamento
da Praça Sete para um abraço simbólico ao obelisco da cidade geralmente levaram
a resultados positivos para os diversos interessados. Antes de realizarem a
manifestação, PM e lideranças dos movimentos pactuavam um tempo razoável para
o ato. Pelo ajustado, a polícia fechava ou desviava o trânsito para garantir a
segurança dos manifestantes que, com o apoio policial, envolviam o monumento,
faziam discursos, filmagens, fotografias e após alguns minutos retiravam-se do local,
permitindo a dinâmica rotineira do centro da cidade. Assim, evitava-se que
motoristas atropelassem manifestantes ou que ocorressem brigas entre
manifestantes e não-manifestantes, ao mesmo tempo que se garantia que os
transtornos inerentes aos protestos não fossem abusivos para os que também
queriam utilizar as vias públicas em deslocamentos. Com essa composição dos

638
ARNAUD, André-Jean. Governar Sem Fronteiras: entre globalização e pós-globalização. Crítica da
Razão Jurídica. v. 2. Rio do Janeiro: Lumen Juris, 2007. p. 66.
639
Ibid.. p. 53.
640
Ver Capítulo 2.
186

interesses em conflito, opera-se simultaneamente relativização e garantia dúplices:


garante-se o direito dos manifestantes e dos afetados pelo ato, ao mesmo tempo
que relativiza os direitos de ambos.

Figura 21 - Foto do trânsito desviado e proteção policial a abraço simbólico na Praça


Sete

641
Fonte: Andrea Carla Ferreira.

Outras vezes, observando-se o número de manifestantes e as ruas nas quais


os protestos se deslocavam, lideranças e comandantes das frações policiais
acordavam sobre trajetos ou quantidade de faixas de trânsito destinadas para os
protestos e para o fluxo de veículos. Essa normatividade de viés negocial seria uma
forma de reconhecer a autonomia do cidadão como necessidade humana
fundamental, como ensina Miracy Gustin, que considera ser autônomo aquele capaz
de fazer suas próprias escolhas, formular objetivos e meios mais adequados para

641
FERREIRA, Andrea Carla. Greve do Caixa Escolar em Belo Horizonte! CSP Conlutas Website.
Disponível em: <http://cspconlutasmg.blogspot.com.br/2012/07/greve-do-caixa-escolar-em-
belo.html>. Acesso em: 1º jul. 2016
187

alcançá-los.642 Assim, não se trata de imposição à força de interesses de


manifestantes nem de contrários aos protestos, mas de autêntica mediação
realizada pela polícia, que invoca equidade, participação popular e decisões
ajustadas aos casos concretos balizadas pelo Direito oficial, mas não unicamente
por ele.643 Igualmente, não é imposição rígida da lei pela polícia, mas normatividade
aberta, próximo ao que Boaventura de Sousa Santos define como “uma
normatividade construída a partir do chão das lutas sociais, de modo participativo e
multicultural”644 . Assim, a reflexão a partir da prática indica que o caminho mais
ajustado para a atuação policial nas manifestações parece ser mediar, reduzir o
conflito até um nível que seja aceitável para ambos os lados. E isso não está pronto
na lei, não há na norma escrita uma receita de bolo de como fazer, um passo-a-
passo a seguir.
Para uma normatividade de teor aberto, não há regra simples, rápida e segura
para a aplicação do Direito pela polícia. Trata-se de uma legalidade negociada,
efêmera, que privilegia a construção de consensos, que busca uma forma de lidar
com os conflitos e divergências não pela imposição de regras estanques, mas aberta
à participação do cidadão. Assim, admite-se que a ordem pública, função
constitucional das polícias, “[...] por ser complexa e muito abrangente, não pode ser
mantida ou preservada somente pelos organismos policiais”,645 como ensinava o
Coronel Carlos Magno Nazareth Cerqueira.

6.7 A sombra do Leviathan

Vinte e cinco de setembro de dois mil e onze. Domingo, dia de se entregar à


paixão nacional com os jogos de futebol que acontecem pelo país. Os jogos dos
times da capital mineira haviam sido transferidos para Sete Lagoas em virtude da
reforma do Mineirão e do Independência.646 A Arena do Jacaré, reformada às

642
GUSTIN, Miracy Barbosa de Sousa. Das necessidades humanas aos direitos: ensaio de sociologia
e filosofia do direito. Belo Horizonte: Del Rey, 1999. p. 31.
643
NICÁCIO, Camila Silva. Direito e Mediação de Conflitos: entre metamorfose da regulação social e
administração plural da justiça. Revista da Faculdade de Direito UFMG, Belo Horizonte, n. 59. p. 11-
56 – jul./dez. 2011. p. 35
644
SANTOS, Letícia Camila dos. Análise da decisão judicial no quadro da legisprudência: O diálogo
das fontes do direito. 2011. 173 f. Dissertação (Mestrado em Direito) – Faculdade de Direito,
Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Belo Horizonte, 2011. p. 37.
645
CERQUEIRA, Carlos Magno Nazareth. O Futuro de uma Ilusão: o sonho de uma nova polícia. Rio
de Janeiro: Freitas Bastos Editora, 2001. p. 170.
646
Os estádios Governador Magalhães Pinto (Mineirão) e Raimundo Sampaio (Independência)
ficaram fechados durante parte dos anos de 2010, 2011 e 2012 para reformas tendo em vista os
188

pressas em virtude da exigência do fechamento dos estádios da capital, foi aberta


ainda com dificuldades graves em itens básicos como instalações sanitárias e água
para os torcedores. A estrutura e a localização também não possuíam muitos itens
necessários para a segurança dos eventos.
O dia era de jogo de dois grandes clubes, Cruzeiro e Vasco. Os que não
lidam ou não conhecem sobre as torcidas e os times podem acreditar que se trata
de uma rivalidade intensa, mas rotineira, entre duas esquipes de projeção nacional.
Porém, não é bem assim. As torcidas organizadas dos times brasileiros funcionam
em um mecanismo de animosidades e amizades que ultrapassa as fronteiras das
unidades federativas. Coligações para fins de proteção unem algumas torcidas de
diferentes estados, ao mesmo tempo que colocam outras no corner oposto do
ringue. A torcida Força Jovem, do Vasco, é aliada da Galoucura, torcida do Atlético-
MG, portanto, estes recebem os amigos do Rio de Janeiro com a mesma devoção
que aqueles enfrentam os fãs do Cruzeiro quando o time mineiro vai a estádios
cariocas. Assim, logo que os torcedores do Vasco chegam em terras mineiras, são
recebidos pelos atleticanos que com eles se juntam para irem ao local da partida.
Dessa forma, o nível de conflituosidade de um jogo Cruzeiro e Vasco é, seja no Rio
ou em Minas, semelhante ao de Cruzeiro e Atlético-MG. Esse contexto faz com que
talvez não exista palavra mais adequada do que Arena, que vem da areia utilizada
no chão para absorver o sangue das lutas entre gladiadores ou animais na Roma
antiga, para designar alguns momentos que acontecem dentro e fora dos campos de
futebol.
O Cruzeiro estava em uma campanha que indicava o rebaixamento do time
no Brasileirão,647 o que tornava o jogo ainda mais dramático. No decorrer da disputa,
a torcida ficava impaciente, passando das vaias ao próprio time a gritar olé! quando
os adversários tocavam na bola. Em uma partida que terminou com a vitória dos
cariocas por 3 x 0, aconteceram brigas antes, durante e após o jogo. O posto médico
da Arena do Jacaré ficou bastante movimentado, o que era incomum para os jogos
lá realizados, sobretudo por causa do pouco público presente. A arquibancada

jogos que Belo Horizonte iria sediar na Copa das Confederações e na Copa do Mundo de Futebol.
Durante o período em que ambos os estádios da capital estavam fechados, grande parte dos jogos
com mando de campo dos times de Belo Horizonte aconteceram no Estádio Joaquim Henrique
Nogueira (Arena do Jacaré), localizado na cidade de Sete Lagoas, interior de Minas Gerais.
647
Série A do Campeonato Brasileiro de Futebol da Confederação Brasileira de Futebol (CBF).
189

contou até mesmo com briga generalizada dentro da própria torcida do Cruzeiro
quando rivalidades entre diferentes torcidas organizadas cruzeirenses afloraram.
Ao final da partida, os torcedores do Cruzeiro resolveram protestar contra os
jogadores que vestiam a camisa do time e que, para os fãs, não estavam jogando
com a mesma paixão com que os torcedores defendiam o clube. Em um local onde
o ônibus dos atletas sairia do estacionamento e precisaria fazer uma manobra,
começaram a se aglomerar torcedores mineiros. No lugar, havia grande quantidade
de materiais de construção como britas, pedras e pedaços de madeira que pareciam
ser restos de alguma obra. Próximos à centena de torcedores que já se
encontravam ali, diversos policiais militares também aguardavam a passagem do
ônibus do Cruzeiro. O cenário parecia denunciar as cenas que estavam por vir. Os
ânimos exaltados, as brigas, a rivalidade, os jogadores, as paixões e as pedras.
Inserido nesse ambiente, o militar mais antigo foi ao encontro dos torcedores
procurar pelas lideranças das torcidas presentes. Outros torcedores e câmeras
televisivos fizeram um círculo, acompanhando atentamente o diálogo que se
iniciava. A rotina de jogos já havia tornado militares da tropa de choque e as
lideranças das organizadas conhecidos uns dos outros. Enquanto o militar tentava
convencer que ali não seria nem dia nem local para manifestar a indignação, as
lideranças das torcidas afirmavam que o objetivo era um protesto pacífico, que
conseguiriam conter a torcida e apenas queriam demonstrar para os jogadores e
direção do clube que estavam insatisfeitos com o desempenho em campo. Em uma
negociação tensa, na qual parecia ser impossível um acordo, um dirigente da Máfia
Azul apontou para uma das crianças no local e disse: “O senhor acha que eu vou
querer brigar com meu filho aqui presente?”, sendo respondido de que era também
por essa e outras crianças que o protesto não poderia acontecer ali, naquele dia e
local. As sugestões de realizar o protesto no dia seguinte, com as emoções menos à
flor da pele, na porta da administração ou no centro de treinamento do clube
Cruzeiro eram todas recusadas e a torcida estava convicta de que permaneceria até
os jogadores passarem. Quando ficou evidente que não haveria acordo possível,
uma liderança dos torcedores indagou: “Então pelo visto o senhor não vai deixar a
gente manifestar?”, “Exato, hoje e aqui não vai ter esse protesto!”, respondeu o
militar.
Os militares formaram uma linha que ocupava toda a extremidade da rua e ao
avançar forçavam a saída dos torcedores. Ao perceberem que não conseguiriam
190

resistir, os fãs do cruzeiro começaram a sair enquanto xingavam o time e os policiais


que não deixaram o protesto acontecer, sendo acompanhados pela linha de policiais
que progredia juntamente com os torcedores. Alguns minutos depois surgia o ônibus
dos jogadores; realizou a manobra de saída do estacionamento e seguiu destino a
Belo Horizonte, sem o filme de violência que os elementos prenunciavam.
Propor um viés negocial e conciliador para a atuação da polícia junto aos
protestos não pode ser uma crença ingênua de que é possível operar a regulação
social unicamente pela gestão pacífica e compartilhada dos conflitos, pois, como
lembra Camila Nicácio “o excesso de mediações parece tanto desaconselhável ou
indesejável que o excesso de direito”.648 Para a autora, a proposta da mediação
ocorre como necessidade de reconfigurar o papel do Estado, e não para substituí-lo;
é a passagem de um direito simplesmente imposto para um direito que privilegie as
partes como atores.649 Assim, pode-se falar em uma normatividade na qual “[...] um
conjunto de registros normativos coexiste, em tensão, como o direito dos
códigos”.650
Manifestações como a dos taxistas que marcham até um ponto de motoristas
do Uber e os agridem; torcedores que realizam reunião sonora na porta do hotel
para prejudicar o time adversário; ou funcionários da saúde que se recusam a
desligar o carro de som na porta do hospital demonstram que a imperatividade e a
coercibilidade, apesar de problemáticas, podem ser inevitáveis. São casos que
indicam que o fenômeno jurídico não pode ser reduzido ao arbítrio individual de
parcela dos envolvidos no conflito.
Se o Direito não apenas descreve a realidade, mas também prescreve para
ela, a realização desse Direito pode ser mais conturbada do que alguns livros
sugerem. Relativizar, limitar, comprimir, ablacionar, restringir ou qualquer outra
expressão empregada, incidirá sempre em detrimento das expectativas de alguns,
que podem cumprir espontaneamente ou não o direito estatal. A relativização do
direito de reunião operada pela polícia vai de encontro às paixões e necessidades
das pessoas. A recusa em cumprir a decisão pode levar ao enfrentamento físico
que, descrito sem ornamentos, é a disputa entre duas violências na qual prevalecerá
648
NICÁCIO, Camila Silva. Direito e Mediação de Conflitos: entre metamorfose da regulação social e
administração plural da justiça. Revista da Faculdade de Direito UFMG, Belo Horizonte, n. 59. p. 11-
56 – jul./dez. 2011. p. 44.
649
Ibid.. p. 46.
650
Id.. A mediação diante da reconfiguração do ensino e da prática do direito: desafios e impasses à
socialização jurídica. Meritum, Belo Horizonte, v. 7, n. 2. p. 249-288 – jul./dez. 2012. p. 276.
191

a mais forte. Assim, é preciso perceber que, para superar a violência do particular e
para manter o Estado Democrático de Direito e suas leis, a força pode vir a ser
empregada, apesar de todos os problemas para sua legitimação, pois a polícia atua
no frágil, incerto, ou mesmo impossível equilíbrio entre a legitimidade das ruas e a
legitimidade dos representantes eleitos. Por isso, Jean-Claude Monet refere-se à
atuação da polícia em protestos como “o fio da navalha”.651
O poder de polícia permite a intervenção estatal no sentido de limitar direitos
individuais em prol da segurança, da tranquilidade e da ordem pública, e sobre o
tema dispõe o art. 78 da Lei nº 5.172/1966:

Considera-se poder de polícia atividade da administração pública que,


limitando ou disciplinando direito, interêsse ou liberdade, regula a prática de
ato ou abstenção de fato, em razão de intêresse público concernente à
segurança, à higiene, à ordem, aos costumes, à disciplina da produção e do
mercado, ao exercício de atividades econômicas dependentes de
concessão ou autorização do Poder Público, à tranqüilidade pública ou ao
652
respeito à propriedade e aos direitos individuais ou coletivos.

No plano do direito internacional, alguns tratados como o Pacto Internacional


de Direitos Civis e Políticos,653 a Convenção Europeia dos Direitos do Homem654 e a
Convenção Americana de Direitos Humanos,655 aos propor os contornos para a

651
MONET, Jean-Claude. Polícias e Sociedades na Europa. São Paulo: Editora da Universidade de
São Paulo, 2006. p. 213.
652
BRASIL. Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966. Código Tributário Nacional. Diário Oficial da
União, 27 out. 1966. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em: 1º jul. 2016.
653
Art. 21. Direito de Reunião. O direito de reunião pacifica será reconhecido. O exercício desse
direito estará sujeito apenas às restrições previstas em lei e que se façam necessárias, em uma
sociedade democrática, no interesse da segurança nacional, da segurança ou da ordem pública, ou
para proteger a saúde ou a moral pública ou os direitos e as liberdades das demais pessoas.
(BRASIL. Decreto nº 592, de 6 de julho de 1992. Atos Internacionais. Pacto Internacional sobre
Direitos Civis e Políticos. Promulgação, de 16 de dezembro de 1966. Diário Oficial da União, 6 jul.
1992. Disponível em: <https://www.planalto.gov.br>. Acesso em: 15 jun. 2016).
654
Art 11. Liberdade de Reunião e Associação. 1. Qualquer pessoa tem direito à liberdade de reunião
pacífica e à liberdade de associação, incluindo o direito de, com outrem, fundar e filiar-se em
sindicatos para a defesa dos seus interesses. 2. O exercício deste direito só pode ser objecto de
restrições que, sendo previstas na lei, constituírem disposições necessárias, numa sociedade
democrática, para a segurança nacional, a segurança pública, a defesa da ordem e a prevenção do
crime, a protecção da saúde ou da moral, ou a protecção dos direitos e das liberdades de terceiros. O
presente artigo não proíbe que sejam impostas restrições legítimas ao exercício destes direitos aos
membros das forças armadas, da polícia ou da administração do Estado. (EUROPEAN COURT OF
HUMAN RIGHTS. Covenção Europeia dos Direitos do Homem, Roma, 4 de nov. 1950. Disponível
em: < http://www.echr.coe.int>. Acesso em: 15 jun. 2016)
655
Art. 15. Direito de Reunião. É reconhecido o direito de reunião pacífica e sem armas. O exercício de
tal direito só pode estar sujeito às restrições previstas pela lei e que sejam necessárias, numa sociedade
democrática, no interesse da segurança nacional, da segurança ou da ordem públicas, ou para proteger
a saúde ou a moral públicas ou os direitos e liberdades das demais pessoas. (BRASIL. Decreto nº 678,
de 6 de novembro de 1992. Promulga a Convenção Americana sobre Direitos Humanos - Pacto de
São José da Costa Rica, de 22 de novembro de 1969. Diário Oficial da União, 9 nov. 1992. Disponível
em: <https://www.planalto.gov.br>. Acesso em: 15 jun. 2016).
192

discricionariedade estatal coloca como limites ao direito de reunião aqueles que se


façam necessários à uma sociedade democrática. A fórmula proposta visa evitar
relativizações indevidas aos direitos humanos, entretanto, ainda assim, é bastante
aberta, o que faz com que Antônio Augusto Cançado Trindade propugne por uma
interpretação necessariamente restritiva das limitações possíveis, tendo em vista a
intrínseca relação entre democracia e direitos humanos.656
Dessa forma, apesar de ser ponto pacífico na doutrina a possibilidade de
limitar os direitos individuais com base no poder de polícia,657 a regra escrita não
oferece uma baliza que consiga estabelecer previamente a partir de qual ponto a
limitação se torna abusiva. Impossível prever todos os casos, suas contingências,
suas histórias. Só é possível verificar as respostas conforme o direito diante da
situação concreta e suas especificidades. Ainda assim, mesmo uma limitação
conforme o direito, ao ser aplicada pela polícia pode ser recusada e enfrentada
pelos afetados. Portanto, o que é pacífico na doutrina pode não ser sinônimo de
pacífico no plano fático.
Como ressalta Tércio Sampaio Ferraz Junior, a ciência do direito tem em vista
a decidibilidade de possíveis conflitos,658 entretanto, a decisão no âmbito do poder
de polícia, como a envolvendo o evento em Sete Lagoas, realiza-se no calor dos
acontecimentos e das emoções humanas, sem muitas informações ou possibilidade
de postergar a resposta. Não se tem o tempo desejado para refletir sobre a
ponderação dos direitos, sobre as consequências das decisões ou mesmo sobre o
conflito que se está analisando; de um lado, o direito de reunião e a torcida que
poderia enfrentar a decisão da polícia, do outro, a integridade física de várias
pessoas e o confronto que poderia acontecer se a decisão não tivesse sido tomada.
Nem mesmo os elementos fáticos que poderiam contribuir para uma decisão mais
acertada são conhecidos no momento decisório. Alguns dias após o jogo, descobriu-
se que no dia anterior à partida os torcedores do Cruzeiro apedrejaram o portão do

656
TRINDADE, Antônio Augusto Cançado. Democracia e Derechos Humanos: el régimen emergente
de la promoción internacional de la democracia y del estado de derecho. Revista do Instituto
Brasileiro de Direitos Humanos, v.1, n.1, Fortaleza, Ceará, 1999.
657
Sobre poder de polícia, cf., entre outras obras, LAZZARINI, Álvaro. Direito Administrativo da
Ordem Pública. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1987; LAZZARINI, Álvaro. Temas de Direito
Administrativo. 2. ed. rev. atual. São Paulo: Revista dos Tribunais; 2003; CRETELLA JÚNIOR, José.
Do Poder de Polícia. Rio de Janeiro: Forense, 1999.
658
FERRAZ JUNIOR, Tércio Sampaio. Introdução ao estudo do Direito. 8. ed. rev. ampl. São Paulo:
Atlas, 2015. p. 58.
193

centro de treinamento do clube enquanto a equipe treinava,659 picharam ameaça a


dirigente em muros660 e outras brigas envolvendo cruzeirenses aconteciam em
distintos lugares enquanto tentava-se convencer os torcedores a não realizarem o
protesto.661 Tais informações, que poderiam subsidiar uma decisão mais
fundamentada, não eram do conhecimento do militar que comandava a operação
enquanto tentava negociar com as lideranças dos torcedores. Posteriormente, com a
sequência dos fatos conhecida e com o desfecho não-violento da ação, fica mais
fácil traçar retrospectivamente as consequências do que poderia ter acontecido e de
qual o caminho mais ajustado. Na hora da decisão, muitos são os riscos e poucas as
informações. Ser engenheiro de obra já pronta não é tão difícil.
Apesar das incertezas, aplicar o Direito importa tomar uma decisão. Como
lembra Celso Lafer, “a aplicação exige o poder para decidir um conflito”.662 Ao
aplicar a lei, a polícia decide, ao decidir, diz o Direito no caso concreto e com
poderes coercitivos para impor a decisão no imediato do conflito. Ainda que em uma
perspectiva distinta da realizada pelo Judiciário, a intervenção da polícia é um dizer
o Direito no e para o caso, portanto, caracteriza um juris dicere, uma jurisdição, no
sentido etimológico do termo. Um dizer/aplicar o Direito ao mesmo tempo inevitável
e problemático, em situações nas quais a regra escrita nunca conseguirá
proporcionar uma resposta definitiva previamente. Por isso, mais do que a busca
sempre inconclusa pela segurança jurídica por meio da norma que consiga
previamente fixar todas as possibilidades da vida, as evidências empíricas indicam a
necessidade de uma decisão ajustada às circunstâncias do caso concreto, um juízo
por equidade,663 que tente conciliar a ordem necessária para espaços
compartilhados sem sufocar a desordem democrática. Ralf Dahrendorf fala em
tumultos de rua e sobre a dificuldade de lidar com eles:

659
PROTESTO na Toca tem ofensas a jogadores e pedras atiradas em portão. Globo Esporte, 24 set.
2011. Disponível em: <http://globoesporte.globo.com>. Acesso em: 1º jun. 2016.
660
ARAÚJO, Guyanne. Muro da Toca da Raposa é pichado com ameaça ao presidente do Cruzeiro.
Uol Futebol, 23 set. 2011. Disponível em: <http://esporte.uol.com.br/futebol>. Acesso em: 1º jun.
2016.
661
Entre outras não registradas em Boletim de Ocorrência Policial (REDS n. 2011-001766411-001).
662
LAFER, Celso. Prefácio. In: FERRAZ JUNIOR., Tércio Sampaio. Introdução ao estudo do Direito.
8. ed. rev. ampl. São Paulo: Atlas, 2015. p. xviii.
663
Sobre equidade, cf. entre outros, ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. In: ARISTÓTELES. Os
Pensadores. v. IV. São Paulo: Abril Cultural, 1973. p. 336; LOPES., Mônica Sette. A equidade e os
poderes do juiz. Belo Horizonte: Del Rey, 1993; FERRAZ JUNIOR. op. cit., 2015. p. 267-268;
ASCENSÃO. op. cit., 2013. p. 245-249, 442-443, 504.
194

[...] esses tumultos escapam, na natureza do caso, à nossa capacidade de


lidar com eles. Na realidade, todas as formas de atos incontrolados da
massa são um lembrete da vulnerabilidade das instituições. Não devemos,
portanto, ter ilusões não há formas de impedi-los, nem um método para
interrompê-los de forma rápida, com exceção de um terror inaceitável vindo
de cima. Mais do que outros desafios à lei e à ordem, os motins de rua
664
exigem um senso institucional calmo e garantido.

Assim, nenhuma lei conseguirá estabelecer a priori a compatibilização


matemática entre os direitos dos manifestantes e os dos afetados, se são
necessários 5, 10 ou 30 minutos de fechamento das ruas; se 2 ,3 ou 4 faixas de
trânsito de uma avenida realizam a proporção numérica entre os direitos em conflito;
se 20, 50 ou 200 metros são a distância necessária para a segurança ou
funcionamento de determinado órgão. São respostas não generalizáveis. O horário,
o local, as tensões por trás do aparente, as histórias dos conflitos, a quantidade de
manifestantes e de pessoas que também querem usar o espaço público conforme
seus interesses, tudo isso interfere na ponderação, que só é possível fazer caso a
caso, e deixa claro que sempre haverá uma fresta na qual o policial será chamado a
criar o Direito para o caso concreto a partir dos elementos jurídicos formais e da
realidade na qual está inserido.
Nessa abertura para a aplicação do direito pela polícia, olhar para a realidade
deixa evidente a necessidade de um Direito construído de baixo para cima, que
convide os interessados a participarem de uma autoridade partilhada. Entretanto,
quando as circunstâncias não permitirem uma solução negocial, não é possível
esperar do Direito escrito a resposta derradeira, porque, como lembra Kaufmann, “já
não possuímos nenhuma lei – ‘lei natural’ – onde se possa ler como nos devemos
comportar independentemente das circunstâncias”.665 Daí a importância de decisão
que não busque apenas a incolumidade do direito estatal, mas, antes, o equilíbrio
das relações sociais, como aconselha Mônica Sette Lopes:

O exercício de um poder de escolha, cuja angulação varia em cada situação


de fato específica, constitui, quer se considere o legislador, o administrador
ou o juiz como agente editor da norma, um campo aberto para que se
estude o papel que o equitativo é chamado a representar. O objetivo maior
será sempre, por certo, a busca do conforto, do equilíbrio das relações
666
sociais, a que a norma jurídica objetiva reger.

664
DAHRENDORF, Ralf. A lei e a ordem. Rio de Janeiro: Instituto Liberal, 1997. p.115.
665
KAUFMANN, Arthur. Filosofia do Direito. 4. ed. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2010.p.
454.
666
LOPES, Mônica Sette. A equidade e os poderes do juiz. Belo Horizonte: Del Rey, 1993. p. 37.
195

Após a saída de jogadores e torcedores em sentidos opostos, pela avenida


lateral à Arena do Jacaré, sem a concretização do cenário de guerra anunciada, um
jornalista que acompanhava cada lance da negociação procurou o militar que
comandava a tropa. Com câmeras e microfones desligados, estendeu a mão para
cumprimentar o militar, disse: “Parabéns pela negociação, Tenente. Pena que você
estragou minha matéria”. A franqueza assusta, mas é por essa franqueza que por
vezes falta olhar para a concreção do fenômeno jurídico na atuação policial, para
quem a lei é pouco e a legitimidade é difícil, que só muito rara e excepcionalmente
conseguirá agradar a todos, mas que nem por isso precisa ser uma ação que agrade
a quase ninguém.
196

7 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Coração Blindado

Fácil falar, fazer previsões depois que aconteceu


Fácil pintar o quadro geral da janela de um arranha-céu
Sem ter que sujar as mãos, sem ter nada a perder
Sem o risco de pagar pelos erros que cometeu

Fácil achar o caminho a seguir num mapa com lápis de cor


Moleza mandar a tropa atacar da tela do computador
Sem o cheiro, sem o som, sem ter nunca estado lá
Sem ter que voltar pra ver o que restou

Com a coragem que a distância dá, em outro tempo em outro lugar


Fica mais fácil

Fácil demais fazer previsões depois que aconteceu,


Fácil sonhar condições ideais que nunca existirão
Sempre a distância, sem noção. O que rola pelo chão
Não são as peças de um jogo de xadrez

Com a coragem que a distância dá, em outro tempo em outro lugar


667
Tudo é tão fácil

As divergências e condutas violentas que podem surgir em protestos exigem


uma decisão no imediato do conflito. Em situações mais tensas, a ação policial para
dispersar manifestantes que destroem patrimônio público ou privado deve ser
avaliada com os resultados que podem advir da intervenção. Perdas materiais,
perdas humanas, a responsabilização do Estado em virtude de ter agido ou de ter
deixado de agir, a melhor técnica, a melhor tática. Tudo isso num átimo de segundo.
Em situações mais triviais, a importância de manifestações para a democracia é
ponderada com os vários direitos envolvidos: a inviabilização do trânsito no horário e
local mais delicado; os motoristas impacientes nos carros; os trabalhadores nos
ônibus lotados enfurecidos com o protesto; os serviços de urgência, entre outros.
Em qualquer hipótese, não decidir ou a simples dilação é também optar por um lado.
Não há lei, decisão judicial, régua ou fórmula matemática que consiga indicar
a solução certa previamente. A generalidade e a abstração do texto constitucional
que cobre uma enormidade de assuntos levam a contradições. É assim com uma
grande variedade de direitos fundamentais nele insculpidos, como também o é com
o direito de reunião.

667
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197

Enquanto alguns autores pregam a impossibilidade de relativizar o direito de


reunião além do literalmente descrito no inciso XVI, art. 5º, da CRFB/88, na prática
seu conteúdo é recortado por leis municipais, estaduais e federais, por decisões
singulares e por acórdãos, pela polícia e pelos próprios indivíduos nas relações
horizontais, muitas vezes esvaziando seu conteúdo jurídico e em nítida violação ao
núcleo essencial do direito de realizar protestos populares.
O tema visto do ponto de vista empírico mostra o processo de criação de leis
longe da realidade, a jurisprudência que por vezes não enfrenta os problemas e a
polícia que em algumas ocasiões consegue tornar ainda mais conturbado um
cenário já caótico. Assim, com tantos desacertos, o fantasioso seria esperar
qualquer coisa diferente dos diversos e graves problemas encontrados com extrema
facilidade na mídia, nas fotos, nos livros. Em uma sociedade marcada pela violência,
pelo individualismo, pela diferença e pela indiferença, as pontes parecem estar mais
para as utopias do que para obras construídas por engenheiros.
A legislação carrega o potencial de reduzir subjetivismos, mas, ao menos no
ambiente das manifestações públicas, deve ser antes caminho para a ordenação
social dialógica do que regulamentação a ser imposta rigidamente sobre as pessoas.
Por sua vez, os precedentes judiciais, com a oportunidade da decisão distante dos
acontecimentos, não podem se furtar a pôr o dedo nas feridas.
No exercício do poder de polícia, é sutil e fugaz a linha que separa a
dicotomia legal-ilegal e a noção de legitimidade é imprescindível para a legalidade
da ação. Entretanto, notar que os limites impostos pela lei, pela sentença ou pela
polícia ocorrem sempre em detrimento de parcela dos interessados é elementar. E
isso pode originar recusas e problemas, que apesar da obviedade, parecem ser
ignorados por algumas críticas às ações policiais. Nesse contexto, percebe-se que a
aplicação do direito pela polícia não se dá de modo automático, o texto da lei e da
decisão judicial são o começo da solução e nunca algo pronto e acabado. Para
encontrar a resposta adequada dentro do quadro de alternativas estruturado pela lei,
exige-se criatividade na articulação de todo o sistema jurídico e uma decisão que
vise reduzir as tensões, para a qual habilidades como saber escutar, saber falar,
saber mediar o conflito, são tão ou mais importantes do que saber usar a força.
198

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