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ficha técnica
Setembro de 2004

Título
Os Furtado de Mendonça portugueses.
Ensaio sobre a sua verdadeira origem

Autores
Manuel Abranches de Soveral
Manuel Lamas de Mendonça

Propriedade da edição
Manuel Abranches de Soveral
Manuel Lamas de Mendonça

Edição, criação gráfica e paginação


Manuel Abranches de Soveral

Contactos
masmedia@netcabo.pt

Impressão
Greca Artes Gráficas

Tiragem
250 exemplares

ISBN
972-97430-7-X

Depósito legal
216384/04

Imagem da capa
Campa armoriada de Duarte Furtado de Mendonça no convento do Espinheiro
d
nota prévia

E ntendemos dar a conhecer previamente este ensaio aos últimos autores


que publicaram trabalhos sobre os Furtado de Mendonça portugueses.
Trabalhos nos quais foram seguidas as teses tradicionais que, em nosso enten-
der, ne-cessitavam de ser revistas. Porque a Genealogia é composta de muitos
contributos e o debate necessário e frutuoso é aquele que recai sobre dados
seguros e a interpretação que deles possamos ter, não sobre mal-entendidos,
quiproquós e outros ruídos de comunicação, pedimos àqueles autores um
comentário técnico que pudesse desde já relançar o debate nos termos que
importam à prossecução da investigação nesta matéria, que não temos a preten-
são de considerar encerrada com o trabalho que ora se publica. Cortesia e dis-
cussão despreconceituada de ideias e perspectivas são, portanto, partes inte-
grantes do nosso conceito de ética. E é com muito prazer que apresentamos
esse comentário, que a fidalguia e honradez dos seus autores fizeram em termos
que tanto nos honram.

«O ensaio que ora se apresenta é um caso exemplar de investigação históri-


ca e genealógica.
Na verdade, tendo em atenção a questão suscitada pela atribuição de natu-
reza científica à Genealogia, este ensaio demonstra claramente, pela investi-
gação que lhe subjaz, pela disciplina e pelos métodos utilizados, tratar-se de
um verdadeiro trabalho científico.
Ao rigor na interpretação das fontes primárias, acresce a inteligência e imagi-
nação dos raciocínios dedutivo e indutivo, conduzindo a conclusões que só
não serão definitivas pela própria natureza da investigação.
Mas este trabalho revela também uma audácia e segurança invulgares, ao
pôr expressamente em causa a tese histórica sobre a origem dos Mendonça
Furtado portugueses, que, na sua formulação mais elaborada, tem pelo me-
nos 4 séculos, ao longo dos quais foi defendida pelos mais conceituados his-
toriadores e genealogistas ibéricos.
Por outro lado, o ensaio que se propõe constitui um salutar desafio para
aqueles que como nós subscreveram até agora a tese avançada por Luis de
Salazar y Castro, no século XVII, e reformulada, nos nossos dias, pelo acadé-
mico Juan Mujica.
De facto, interessados no apuramento da verdade histórica, ganhámos com
este ensaio renovado alento para intensificar a investigação sobre o tema sub
judice, com vista a confirmar, complementar ou integrar as conclusões suge-
ridas.
Por todas estas razões, foi com grande satisfação que aceitamos o honroso
convite para nos pronunciarmos sobre este trabalho de investigação que é já,
sem dúvida, um marco notável na bibliografia da especialidade, pelo que re-
presenta como salto de qualidade e como lufada de ar fresco e estimulante
nos ambientes, por vezes, "fechados" da História e Genealogia em Portugal.

Dom Filipe Folque de Mendóça


Luís Bivar de Azevedo

Do
Instituto Dom João VI .»

Queremos também agradecer aqui a todos quantos de alguma forma nos ajuda-
ram neste trabalho, e expressamente à "confraria de medievalistas da Torre do
a
Tombo", destacando os contributos de Luís Filipe de Oliveira, Mário Farelo, Marta
Correia Castelo Branco, João Luís Fontes Inglês, João Soalheiro e Luís Rêpas.

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d
1 O estado da questão
Os Furtado portugueses. Gerações de genealogistas que se ocuparam da li-
1.1 nhagem dos Furtado portugueses, e de historiadores que, pontualmente, referi-
ram ou abordaram episódios relacionados com personagens desta gens, fazem de Fernão
Furtado, indirectamente documentado como vassalo do infante D. Dinis a 21.10.1278, o gene-
arca dos deste apelido em Portugal. Pode considerar-se um consuetudo, um hábito, ou um
dado que centenas de anos deram por adquirido. No entanto, é facto que nas fontes primá-
rias se documentam indivíduos que usam este apelido em datas muito anteriores.
Esta constatação não é propriamente uma novidade. Já Alão de Moraes1 inicia o seu título
de Furtados com um Pêro Furtado, do qual refere existir menção no cartório do convento de
S. Bento de Avé Maria das freiras do Porto. Este autor, geralmente considerado cuidadoso,
aponta concretamente uma escritura de venda, lavrada em Fevereiro da era de 1130 (ano de
1092), na qual Egas Vermuiz, Rabaldo Vermuiz, Maria Vermuiz, Onega Vermuiz e Salvador
Vermuiz vendiam uma herdade em Midunceli a este Pêro Furtado e a sua mulher Marinha
Gilibertiz. Segundo este mesmo autor conservar-se-ia no dito cartório o testamento do su-
pracitado Pêro Furtado, documento que mencionaria sua mulher Marinha Gilibertiz e a filiação
dele num Fernão Peres Furtado.
Procuramos essa carta de venda entre os documentos do cartório do convento de S. Bento
de Avé Maria que se conservam na TT. Efectivamente, o convento de S. Bento de Avé Maria,
do Porto foi incorporando documentação oriunda de outras casas religiosas, como S. Salva-
dor de Vila Cova de Sandim, Santa Maria de Tarouquela, Tuias e São Cristóvão de Rio Tinto.
Com a reorganização dos fundos, esses cartórios conventuais voltaram a ser individualizados,
recebendo de volta documentação que andava dispersa. Mas a nossa procura não teve
sucesso para a data apontada. Contudo, dado que noutros casos relativos às cópias feitas
pelo convento de Avé Maria parecia ter sido feita já a actualização da era de César, o que le-
vou a que depois os investigadores a fizessem 2ª vez, poderia Alão ter feito o mesmo? Fez!
Entre a documentação que regressou ao convento de S. Cristóvão de Rio Tinto (Porto) con-
tava-se, não de 1092 mas de 1142, precisamente essa carta de venda que permitiu a Cristó-
vão Alão de Moraes iniciar em Pêro Furtado o seu título de Furtado da Pedatura Lusitana.
Era de 1180 (1142), Fevereiro 22. Egas Vermuiz, Rabaldo Vemuiz, Maior Vemuiz, Onega
Vermuiz e Salvador Joanes vendem a Pêro Furtado e a sua mulher Marinha Gilibertiz um
casal junto a Medancelhe confrontando de uma parte com Baguim e de outras com a Maia
e com Santagões, tudo em Rio Tinto. «…Et indiuidue trinitatis. Placuit nobis Egas uer-
muiz et rabaldo uermuiz et maior (uerm)uiz et onega uermuiz et saluador johanniz ut
faceremus uobis petro furtaado et uxori uestre marine gilibertiz sicut et facimus cartu-
lam uenditionis pura mente et bona voluntate de hereditate nostra silicet quam habe-
mus in uilla que uocatur midunceli id est unan casalem et sicut diuitur ex una parte cum
baguim et ex alia cum amaia et cum celtaganes et ex alia parte (cum) sumido campania
et cum illo monasterio de riuulo tinto. Vendimos uobis predictam hereditate per illis ter-
minis et locis et antiquis intus et extra et quicquid ad eam pertinet per ubi illam potueris-
tis inuenire pro qua accepimus a uobis XII morabitinos tantum nobis et uobis bene com-
placuit et dempcio apud uobis nihil remansit prodare Ita ut dehodie die et tempore sit de
iure nostro abrasa et in nostro dominio tradita et confirmata habeatis uos illam firmit[er]
in perpetuum siquis tamen quod fieri credimus minime uenerit tam de nostris quam [de
uestris] uis nostri ? de extraneis aut nos uel aliquis in uoce nostra ad irrumpendum uel
cntradicendum hanc cartulam uenditionis et nos autorgare uel defendere noluerimus
uel nom potuerimus que pariamus uobis ulus? semini uestro predictam hereditatem
duplatam uel quantum fuerit melioratam et insuper trecentos soldos et hec carta sem-
per sit firma. Facta carta uenditionis mense februario. Era Ma Ca LXXXa Nos supra nom-
inati silicet egas uermuiz et rabaldo uermuiz et maior uermuiz et onega uermuiz et sal-
vador johanniz uobis petro furtado et uxori uestre marine gilibertiz coram idoneis testi-
bus hac cartulam manus nostras ROBORAMUS Qui presentes fuerunt Pelagius teste. Pe-
trus teste. Suarius teste ; Martinus notuit ».
Segundo Alão, existia no mesmo cartório o testamento do supracitado Pêro Furtado, onde
se documentava que do casal tinha sido filho Fernão Peres Furtado.
Não localizamos ainda esse testamento, mas não vemos razões para duvidar da sua veracida-
de, sendo levados a admitir que possa estar correcta a dedução com que o autor prossegue:
«Entendemos que deste Fernão Peres Furtado é descendente Fernão Furtado, em quem
o Conde D. Pedro dá princípio a esta família, no tít 36 ao que me movo, por que me cons-
tou, pelas partilhas que fizeram seus filhos, que o dito Fernão Furtado era Sr. da herdade
de Manhucelos que acima dizemos que comprou Pêro Furtado; e falando-se em outras
herdades da herança diz que as houvera o dito Fernão Furtado (de ganância et haeredi-
tate suorum parentum), donde se colige que os seus pais eram herdados em Portugal e
que neste reino viveram.»
Conseguimos efectivamente documentar um Fernão Peres Furtado que, em Março de 1237,
testemunhou um escambo entre o prior e clérigos de S. Cristóvão de Coimbra e Lourenço So-
-ares e sua mulher Domingas Peres, de certos bens situados nessa cidade 3. Todavia, 94 anos
separam a compra efectuada por Pêro Furtado desta menção documental a um Fernão Peres
Furtado, aparentemente demasiado tardia para se referir ao filho desse Pêro Furtado e de Ma-
rinha Gilibertiz, embora no campo incómodo das conjecturas não se possa afastar completa-
mente a hipótese da existência de um laço de parentesco entre eles.
E forçoso nos é reconhecer que não se encontram referências à herdade em Medancelhe
(Rio Tinto), em nenhum dos numerosos documentos que consultámos, relativos ás heranças
dos irmãos Furtado, filhos do Fernão Furtado e de sua mulher Guiomar Afonso (de Resende).
Fernão Furtado que, até prova em contrário, aceitamos que seja o vassalo do infante D. Dinis.
Além de que uma coisa é Manhucelos (Amarante) e outra Medancelhe (Rio Tinto).
a
Mas importa ressalvar que uma das lacunas das fontes investigadas consiste, precisamente,
em só termos tido acesso às heranças em Resende e Pinho que chegam aos Furtado por via
de sua mãe (Resende), e de sua avó paterna (Pinho). Não encontramos, o que não significa
que não existam, ou possam ter existido, documentos respeitantes à herança paterna dos ir-

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d
mãos Furtado. Sendo também certa a ligação destes Furtado ao Porto, como se depreende
das supracitadas confrontações.
Não há assim razão, bem pelo contrário, para duvidar da informação de Alão. Pelo que Pedro
Furtado e Marinha Gilbertiz foram pais de Fernão Peres Furtado, devendo este ser o marido
da documentada Maria Mendes e portanto pai do bispo D. Paio Furtado.
Com efeito, entre 1214 e 1246 foi bispo de Lamego um D. Paio Furtado, prelado activo que,
entre muitas outras referências em fontes primárias, se documenta como filho de uma Maria
Mendes, proprietária em Soutelo do Douro. A este propósito, o padre Miguel de Oliveira, na
sua História Eclesiástica de Portugal, adianta que o antecessor de D. Paio Furtado no bispado
de Lamego se encontra documentado a usar também o apelido Furtado. Mas, uma vez mais,
não tivemos acesso ás fontes em que se terá estribado o padre Miguel de Oliveira para pro-
duzir esta afirmação, que não consta de outras fontes bibliográficas, antes pelo contrário.
De Pedro Furtado e de sua mulher Marinha Gilibertiz podem ainda ser parentes os Furtado de
Alenquer, mas neste ponto da investigação nada permite afastar a hipótese de que estes úl-
timos não constituam uma gens diversa, eventualmente descendente de um genearca que ti-
vesse Furtado como nome próprio, como mencionaremos adiante.
Estes Furtado de Alenquer, documentados em período anterior aos de Pinho/Resende, cons-
tituíam um núcleo já enraizado no poder concelhio no começo do séc. XIII, pouco depois das
investidas almohadas de 1181-1195, e logo a seguir à convocatória efectuada em 28.5.1199 por
D. Sancho I aos alvazis de Lisboa, Santarém e Alenquer, a fim de se escolherem e demarca-
rem as terras a atribuir a colonos francos recém-chegados a Portugal.4
Se tivermos presente que D. Teresa Godins, mulher de Lourenço Gonçalves Magro e mãe do
deão de Lisboa Egas Lourenço Magro, no seu testamento, lavrado em Leiria em 10.9.1298,
contempla com vinte libras um Domingos Furtado5, é difícil não ser tentado a admitir que es-
tes Furtado se encontram distribuídos ao longo de um itinerário Coimbra-Lisboa já no século
XIII. Acresce que este Domingos Furtado deve ser o Domingos Godins, dito Furtado, o que o
indicia como irmão da dita D. Tereza Godins.
1301, Março - Domingos Godiz, dito Furtado, e seu filho Vasco Domingues, vendem a Ni-
colau Domingos clérigo umas suas heranças em 3 lugares do termo de Montemor-o-Ve-
lho: Borralha, Damim queti dei (sic), Socada, Requeijada, a par da Valla (ou do valle).6
Poderá este Vasco Domingues ser o Vasco Domingues, dito Furtado, que a 5.6.1334 residia
em Frielas (Loures), de que falaremos adiante? A coincidência onomástica é grande e a cro-
nologia perfeitamente aceitável. E ter um primo-direito deão da Sé de Lisboa daria certamen-
te a Vasco Domingues, dito Furtado, inegável ascendência social, se é que já não a tinha. Ora,
dada a relação deste Vasco Domingues com Frielas, onde as suas propriedades confinavam
com as de Afonso Furtado, parece-nos, conforme também adiante detalharemos, que talvez
possa apresentar-se como a melhor hipótese de reconstituição da ascendência deste capi-
tão-mor do mar de D. João I, com quem, nas genealogias de Quinhentos, se inicia o título
Furtado. E é tentador pensar que aquele Domingos Godiz ou Domingos Furtado fosse pai do
Domingos Domingues Furtado, morador em Lamego, já falecido em 1322, o que indicia afi-
nal uma ligação aos mais antigos Furtado, entre os quais pontifica o referido D. Paio Furtado,
justamente bispo de Lamego.
1322, Novembro - In nomine Domini amen. Eu Affonso Dominguiz solteiro filho que fui
de Domingos Dominguez Furtado morador que foi na rua Capateira do Castelho de Lame-
go a vos Francisco Stevães e a vossa mulher Maria Annes faço carta de vendiçom e de per-
duravil firmidoem de huua casa com todas sas perteenças que eu ei na rua Capateira do
Castelo de Lamego como parte com as casas que forom d'Olho de Cabra que ora som de
Domingos Periz e de Constança Dominguez e com Domingos Silvestre por preço que de
vos recebemos convem a saber XXX ta libras e por revora huum par de çapatos ca a tanto
a mim e a vos approuge e do preço a mim nom remanhesceu nehuua rem por dar quem
contra a parte veher Dos soldos lhi pecte e este nosso fecto permanhesca per sempre em
sa fortaleza Fecta a carta VI dias de Novembro Era de mol trezaentos LX anos. Testemu-
nhas: Domingos Abril, Pero Dominguez çapateiros, Pero Eannes boffon do Castelho de
Lamego e outros. E eu Rodrig'Abril tabelliom de Lamego a mandado das dictas partes
esta carta fiz e meu sinal hi pugi. AIN/TT - Sé de Lamego, Compras, vendas..., m.5, nº 70.
Sendo que estes Furtado, assim ligados a Lamego, Leiria, Montemor-o-Velho e Lisboa, podem
ser parentes do seguinte Lourenço Furtado, ligado a Coimbra/Soure/Pombal:
1308, Junho, 2, Soure. João Anes, dito Loução, procurador de Gil Eanes e de Avizaboa
Peres su mulher, vizinhos e moradores em Pombal, vendem a João Peres que oord (sic?)
e sua mulher D. Estevainha, moradores e vizinhos de Coimbra todas as casas que o casal
tem em Soure as quais partem com muro e da outra parte, com Lourenço Furtado por 23
Libras de dinheiro português.7
Mas é forçoso reconhecer que, perante as informações disponíveis, os Furtado estremenhos
também podem ter tido a sua origem nos Furtado do Porto (Pêro Furtado/Marinha Gilibertiz),
descendo ao longo de um conhecido itinerário medieval Porto/Lisboa, para se fixarem inicial-
mente em Alenquer, que à época se encontrava em repovoamento, e prosseguindo em di-
recção ao Sul para Fielas e Loures. Não poderíamos adiantar, neste momento, por manifesta
falta de elementos conclusivos, mais do que uma intuição pessoal e, certamente, prematura.
Esta presença estremenha começa a documentar-se com João Furtado, alvazil de Alenquer
em Fevereiro de 12028; com Pedro Furtado, alvazil em Alenquer, que em Dezembro de 1221
testemunha a doação feita pela infanta D. Sancha e sua irmã D. Teresa das suas três partes da
azenha de Pedro Soares ao convento se Santa Maria de Celas de Alenquer9; e com João Peres
Furtado, que em Novembro de 1221 testemunha uma doação feita pela dita infanta D. San-
cha, com o consenso de sua irmã D. Teresa, de três partes do reguengo que possuía no termo
de Alenquer à igreja de Santa Maria de Celas de Alenquer10. E de novo João Peres Furtado,
alvazil, que nessa mesma data de Dezembro de 1221 testemunha a doação feita pela infan-
ta D. Sancha, com o consenso de sua irmã D. Teresa, das suas três partes da azenha de Pedro
Soares, junto à ponte nova de Alenquer11. E ainda, outra vez, um João Furtado que em Junho
de 1222 testemunha uma venda feita por Ausenda Mendes, com seus filhos Domingos e Paio
a
Peres, de um quinhão nos moinhos de Gonçalo David, no rio de Alenquer12. Este João Furta-
do tanto pode ser o mesmo de 1202 como um seu filho, ou mesmo o João Peres Furtado su-
pracitado. E documentamos ainda um Martinho Furtado, também ele alvazil13, ligado ao po-
der concelhio de Alenquer em 21.4.1263.
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d
Devemos sublinhar que os Furtado devem ter abandonado Alenquer (fixando-se nos arre-
dores de Lisboa?), uma vez que não os encontramos aí referidos na documentação dos sécu-
los XIV/XV. A estes regressaremos quando adiante se analizarem os Furtado estremenhos.
Importa ainda não esquecer que Junho de 1261 se encontra documentado no livro de D. João
de Portel um Domingos Furtado que testemunha a venda de uma casa em Santo Estêvão, em
Lisboa, que fez dona Ausenda a D. João de Portel14. E já no início do século XIV é possível do-
cumentar uma Furtado a residir em Lisboa:
1319, Abril, 11, Lisboa, Alcáçova - Maria Domingues, mulher que foi de João Martins Cas-
tel Mendo, já falecido, e testamenteira de Nicolau Domingos, dito Besugo, seu genro, já
passado, deu possessão de uma casa com seu sótão e sobrado em Lisboa, na Lagara, fre-
guesia de S. Vicente, casa essa que foi da Furtada.15
A tudo isto acresce que o apelido Furtado foi adoptado ainda durante a Idade Média por
membros de outras comunidades, como se conclui da seguinte carta de aforamento:
1397, Abril, 15, Évora - A favor de um contemporâneo de Afonso Furtado, de seu nome
Mafamede Furtado, ao qual foi efectivamente emprazada uma tenda, no arrabalde da
Mouraria, em Lisboa. Essa tenda partia com uma outra tenda do rei, que trazia aforada
Mafamede Ferreira, com a tenda de Mafamede Alfacar, e com ruas públicas, e por ela pa-
garia Mafamede Furtado anualmente dez libras em moeda antiga.16
Finalmente encontra-se, abarcando uma área geográfica em princípio contígua áquela onde
viveram os Furtado de Resende e Pinho, um extenso documento com dezenas de profissões
religiosas, que se iniciam em finais do século XII. Aí se documenta que João Furtado profes-
sou no convento de cónegos regrantes de Santo Agostinho de Santo André de Ancede (Bai-
ão), talvez na 1.ª metade do século XIII.17 E outros mais, estamos em crer, irão surgindo, à me-
dida que se for realizando uma sistemática investigação prosopográfica das fontes que sub-
sistem.
Exceptuando o núcleo mais coeso dos Furtado da Estremadura, trata-se, é evidente, de refe-
rências isoladas, dispersas por uma área geográfica relativamente extensa ao longo de um
lapso de tempo considerável e sem dados adicionais que permitam estabelecer qualquer cor-
relação ou nexo entre elas. Mas a própria dispersão geográfica, o escalonamento no tempo
e o diferenciamento do status (um membro do círculo áulico confirmante de um foral, um bis-
po e dois alvazis) são susceptíveis de indiciar que podemos estar em presença de (pelo menos)
uma antiga linhagem que se terá difundido a partir de um berço duriense.

Fernão Furtado não era de Alava. Como veremos ao longo deste trabalho,
1.2 foi construída para o Fernão Furtado, vassalo do infante D. Dinis em 1278, uma
ascendência que, através de um indocumentado entronque castelhano (invocou-se uma ale-
gada escritura de 1242), o ligava ao tronco principal dos poderosos Hurtado de Mendoça de
Alava. Este entronque castelhano tinha a virtude de explicar um facto inusitado. Precisamen-
te, que só após centenas de anos, em que membros desta linhagem portuguesa se encon-
tram perfeitamente referenciados e documentados nas fontes primárias apenas com o apeli-
do Furtado, apareçam na geração dos filhos de Afonso Furtado, anadel-mor dos besteiros
do conto de D. Fernando e D. João I, e capitão-mor do mar deste último monarca, membros
da linhagem a usar o apelido composto Furtado de Mendonça ou só Mendonça. Este uso
apenas se documenta em 1435, com o supracitado Afonso Furtado de Mendonça, filho legí-
timo e sucessor do capitão Afonso Furtado.
Como demonstraremos, o entronque castelhano do Fernão Furtado vassalo do infante D. Di-
nis em 1278 (se é que se trata do mesmo Fernão Furtado, marido de Guiomar Afonso e pai
dos irmãos Furtado com os quais se articula esta linhagem) documenta-se como totalmente
inaceitável nos termos em que tem sido reiteradamente descrito.
E, não tendo sido possível estabelecer qualquer ligação entre os Furtado portugueses anteri-
ores ao capitão Afonso Furtado, sendo que tudo aponta noutro sentido, parece legítimo in-
terrogarmo-nos sobre as razões e as circunstâncias em que irrompe, contra toda a lógica
aparente, o apelido composto Furtado de Mendonça em Portugal.
Documentamos um primeiro casamento do capitão Afonso Furtado, anterior a 1369, com
Maria Miguéis, senhora que viria a morrer em 1401, ano em que o seu marido teria aproxi-
madamente 54 anos de idade e havia já legitimado, em 1390, três filhos bastardos nascidos
durante a constância do seu matrimónio, e havidos em mulheres solteiras, que não se docu-
mentam com o apelido Mendonça.
Terá o capitão Afonso Furtado casado uma segunda vez com uma senhora descendente dos
Mendoça castelhanos, segunda mulher essa que seria, precisamente, a mãe de Afonso Fur-
tado de Mendonça? Adiante veremos esta hipótese.
Mas desse segundo casamento não guardaram memória os genealogistas e, mais importan-
te, não o encontramos até hoje inequivocamente referido na, relativamente abundante, do-
cumentação que recolhemos sobre o capitão do mar de D. João I.
Parece assim lícito abrir a questão da origem dos Mendonça portugueses.

A secundarização do fundador. Nascido ainda durante o reinado de D. Afon-


1.3 so IV, muito provavelmente em 1347, na mesma ocasião em que a peste negra
chega a Portugal e desarticula a sociedade, certamente extinguindo ramos de linhagens e se-
parando outras, Afonso Furtado permanece uma figura mal conhecida e que bem merece-
ria uma biografia aprofundada.
Criado na corte de D. Pedro I, que, como ele próprio confessa pela pena de Fernão Lopes,
lhe deu «estado», e tudo quanto possuía, em 1382 iria participar activamente e desde o pri-
meiro momento nas guerras fernandinas e ser nomeado anadel-mor dos besteiros do conto
em data anterior a 1381.
Em 1369 era escudeiro, vassalo do rei, vizinho de Lisboa e proprietário no termo do Lumiar.
a
Mantinha relações com parentes que residiam em Frielas, reguengo régio onde existia uma
residência real e onde habitaram temporariamente D. Dinis, D. Afonso IV, D. Pedro I e D. Fer-
nando I. Os seus parentes, aí fixados mesmo antes do nascimento de Afonso Furtado, per-
tenciam à oligarquia local e encontram-se documentados como alvazis de Frielas e fazendo

11
d
parte de um núcleo de indivíduos de nome Furtado documentados em Santarém e Loures,
que as genealogias não mencionam.
Participou na revolução de 1383, ano em que foi nomeado, também ele, alvazil pelo conce-
lho de Lisboa e confirmado pelo rei, e a sua acção militar, diplomática e no domínio da "infor-
mação militar" e da justiça encontra-se amplamente documentada e testemunha um papel
saliente que o leva a Inglaterra, onde se encontra ao serviço da coroa britânica entre Novem-
bro de 1388 e Abril de 1389, e ao reconhecimento das defesas da praça de Ceuta, já em ida-
de avançada.
Apesar dos seus feitos, do valimento e das mercês régias, de cargos militares da maior impor-
tância que ocupa até à sua morte, de bens comprovadamente dispersos por vários conce-
lhos e do casamento com uma possível parente de João Esteves o Privado e de Estêvão Vas-
ques Filipe, figuras a que os historiadores têm prestado uma maior atenção, as fontes genea-
lógicas referem-no obliquamente, de passagem, arrumando-o com a menção de ter sido ca-
pitão do mar de D. João I.
E, no entanto, é com este Afonso Furtado que a linhagem inicia uma ininterrupta ascensão
social que justificaria que lhe fosse dado o mesmo relevo e tratamento que é dispensado aos
verdadeiros genearcas da maioria das casas da aristocracia áulica18 da segunda dinastia. Ao
invés, o ênfase linhagístico foi deslocado para as suas relações de parentesco com o, relati-
vamente mais obscuro, ramo dos Furtado de Pedrozelo, descendentes do Fernão Furtado,
vassalo do infante D. Dinis em 1278 e, por genealogias bem posteriores, alegado neto de es-
tirpes régias castelhanas.
Não deixa de ser curiosa e pouco habitual esta secundarização do verdadeiro fundador da
linhagem na sua posição de família da «primeira nobreza de corte»19, a menos que tenha
sido intencional. E não ressalta menos curioso que a tal ponto se tenha esbatido a memória
da ascendência do glorioso anadel-mor dos besteiros e capitão-mor de Portugal (como tam-
bém se encontra documentado), que volvidos pouco mais de cem anos após a sua morte, e
em vida de poderosos descendentes seus, conselheiros régios, aposentadores, ou ligados,
embora por bastardia, à Casa Real, os nobiliários coevos das famílias de corte iniciem o seu
título de Furtados e Mendoças com o próprio Afonso Furtado, ou se vejam obrigados a justi-
ficar de modo inconsistente e pouco convincente (como adiante demonstraremos) o seu en-
tronque nos Furtado de Pedrozelo, alegada porta de acesso para um suposto entronque na
estirpe régia castelhana e nos míticos senhores da Biscaia.

Furtado também é patronímico. Se na previsível ascendência imediata do capi-


1.4 tão-mor Afonso Furtado este nome já se fixara, permanece até a dúvida se na
origem não teria sido um patronímico. Porque, convém não esquecer, Furtado/Hurtado foi
também um nome próprio ou prenome, e portanto também um patronímico, cuja fixação, da-
da a invulgaridade do nome, foi certamente prococe.
Em regra, quando nos documentos do séc. XII e XIII Furtado aparece só assim, é nome pró-
prio. Deve, por exemplo, ser o caso do Furtado que figura entre os confirmantes do foral de
Balneos (Banhos, Lafões, actual Vouzela) em 1152, que parece ser o mesmo que ainda vivia
em 1190 e era irmão de um Pedro Pais.
1174, Agosto - Furtado testemunha carta de venda de Justa Eanes com seu f.º Perroth a
D. Joâo, prior e convento do mosteiro de Santa Cruz de Coimbra de uma almuinha em
Coselhas (Coimbra).20
1174, Setembro - D. Furtado testemunha carta de Venda de Pedro Gonçalves e Domin-
gas Gonçalves à Sé de uma casa junto ao rivulum de Balneis.21
1180, Agosto - D. Furtado testemunha o testamento de Maria Rodrigues, com sua filha
Domingas Peres fazem para salvação das suas almas ao MSCCoimmbra, e ao prior D. João
e a seus freires de uma vinha no termo de Coimbra no lugar dito Vale de Ficulnea.22
1190 - D. Furtado testemunha uma carta em que o rei D. Sancho manda aos crúzios pos-
se (?) de umas casas sitas junto ao mosteiro.23
1205, 5 idus Maio - Pedro Pais, germanus de D. Furtado, testemunha uma sentença do
concelho de Coimbra a favor do MSCS contra o mosteiro de S. Jorge a par da mesma rela-
tiva a um açude em Geesta.24
1205, Outubro - Pedro Pais. germanus de D. Furtado, testemunha doação de D. Toda ao
seu neto Fernão Martins de um casal no termo de Riba de Vizela, no lugar dito Vila Fria.25
Trata-se certamente do Furtado Peres, filho de Pedro Godesteo, padroeiro da igreja de Santo
André de Canidelo, que em 1171 é objecto de um contrato entre seu pai Pedro Godesteo e o
bispo e cónegos da Sé do Porto. Neste acordo, em troca de uma doação, o bispo e os cóne-
gos comprometiam-se a nomear Furtado Peres cónego da Sé do Porto e, quando completa-
da a sua educação e fosse de idade para isso, seria nomeado abade da igreja de Santo André
de Canidelo, estando previsto nas clausulas cominatórias o recurso ao rei no caso de incum-
primento por parte do bispo e Cabido.26
E ainda o «Dominus» Furtado, que testemunha em Julho de 1188 uma carta pactionis et firmi-
tudinis feita por Martinho Peres e Gonçalo Mendes a D. Pedro, prior de Santa Cruz de Coimbra
e a todos os seus cónegos da herdade de Treixedo, em Ravanel, Andraluzadil (sic)28, provavel-
mente o mesmo, que em Fevereiro de 1192 vende por 58 maravedis e meio a João Fróias, prior
do mosteiro de Santa Cruz de Coimbra e a todo o seu convento, uma herdade no Calhariz, si-
ta junto a uma parte que deu Paio Leitão.29 Bem como o Furtado que figura como alvazil de
Coimbra em 1179, num documento do convento de S. Jorge de Coimbra.27
E a verdade é que, se ao presumível tronco dos Hurtado castelhanos (Furtado na sua pre-
sença em Portugal) se podo aceitar a origem do nome numa alcunha assumida, já nada nos
pode levar a aceitar, não só sem provas como até com provas negativas em contrário, que
os Furtado portugueses não tenham a sua origem num patronímico, à imagem de outras famí-
lias da nossa nobreza medieval, como é o caso paradigmático dos Guedes.
a
13
d
2 Os palimpsestos genealógicos
O Sísifo das representações simbólicas. A história das mentalidades tem-se
2.1 debruçado sobre o estudo da nobreza, no quadro de uma abordagem sistemáti-
ca de um estamento que ocupou, durante um determinado lapso de tempo, uma posição su-
perior na hierarquia social, estando dotado30 de um estatuto privilegiado nos campos jurídi-
co (não pagamento de tributos, leis próprias e excepções à lei geral), militar (porte de armas,
enquadramento de, ou em, grupos armados), administrativo-judicial (administração do terri-
tório, aplicação da justiça, recrutamento de funcionários palatinos no campo da centralização
da administração monárquica), e económico-social (detenção da propriedade fundiária, do-
mínio sobre homens e sobre territórios, controle sobre as acessibilidades e determinados fac-
tores de produção).
Esta posição de destaque era transmitida hereditariamente (não parece oportuno enveredar,
nesta introdução sumária, pela destrinça entre a concepção agnática e a concepção cognáti-
ca dessa mesma transmissão), através do sangue, assegurando a manutenção de uma supe-
rioridade social congénita aos «filhos de algo», superioridade essa inerente e intrínseca ao seu
grupo familiar, embora estratificada numa hierarquização de sub-categorias, que, aliás, se irão
manter quase sempre fluidas e intermutáveis.
Esse estatuto, no quadro da mobilidade social, não poderia deixar de gerar, sempre que as
circunstâncias objectivas o permitiam, dois movimentos de sinal contrário. De um lado, as vá-
rias iniciativas ou políticas de integração de indivíduos e linhagens em ascensão no estamen-
to da nobreza, ou a sua progressão no seio da hierarquia interna da mesma. Do outro, a re-
sistência que essas tentativas suscitavam por parte daqueles que, à luz do respectivo quadro
de mentalidades, mitos, representações e normas, tanto explicitas como implícitas, tentavam
manter restrito e coeso o seu estamento privilegiado e as redes de interesses e solidariedades
que os ligavam contra a intrusão dos arrivistas.
Não é evidente que a história permita evidenciar que a natureza humana tenha conhecido mu-
danças substanciais e essenciais no atinente às razões profundas que regem comportamen-
tos em função de objectivos que, genericamente e latu sensu, terão permanecido imutáveis.
Assim sendo, tanto o tropismo que rege a procura individual de ascensão aos segmentos pri-
vilegiados de todas as sociedades, como a sua integração num quadro cíclico abrangente de
movimentações colectivas, suscitaram sempre a resistência e o contra-ataque das velhas oli-
garquias.
Se bem que esta visão seja um pouco linear para a época, ainda impregnada de práticas feu-
dais, onde as famílias e os poderes se organizavam sobretudo em hierarquias deste tipo, ten-
do os «poderosos» sempre atrás de si um rol enorme de «criados», escudeiros, cavaleiros, cli-
entes e apaniguados, cuja ascensão procuravam beneficiar. Por outro lado, o regime de privi-
légios percorria transversalmente a sociedade, não sendo minimamente exclusivo da nobre-
za e dos poderosos. É pacífico considerar-se que, nesta época, não é possível falar em
classes como depois se entenderam. E que o grande factor da ascensão popular e burguesa
foram os próprios reis, ao chamarem para a sua Casa e serviço muita dessa gente, nobilitan-
do-a, expressamente nalguns casos, ou deixando que em duas ou três gerações de serviço
se instalassem paulatinamente entre a nobreza. O título de vassalo do rei, que no séc. XIII era
praticamente exclusivo da nobreza, passou a ser dado nos séculos XIV e XV a todos os servi-
dores régios, nobres ou não.
Como quer que seja, a dinâmica característica da mobilidade social tem como resultante que
cada novo estamento, e mais tarde ordem e classe (sem entrar no problema da taxinomia) pri-
vilegiadas, acabam não só por integrar membros oriundos das oligarquias que substituíram,
como por adoptar algumas das representações simbólicas e comportamentos que estrutu-
ravam as velhas elites. O que não deixa de ser natural, uma vez que, na verdade, não existiu
uma brusca substituição, mas uma verdadeira assimilação, paulatina e parcelar.
Este fenómeno de assunção, por parte dos novos integrantes das elites, de representações
simbólicas e estéticas próprias do património da oligarquia a que chegam, frequentemente
reflectem simbologias e valores aparentemente desligados do contexto em que sobrevivem
e que, para serem compreendidas, necessitam de análise e reflexão diacrónicas.
A abordagem, numa perspectiva científica do estudo da nobreza, inicia-se, entre nós, com
Alexandre Herculano, através da heurística das fontes e a constituição de corpus documen-
tais, designadamente procedendo ao recenseamento e sistematização das fontes primárias
e às primeiras análises dos palimpsestos em que se tinham ido convertendo os LL. A estes tra-
balhos se vieram juntar, ainda no decurso do século XIX, investigações efectuadas, entre ou-
tros, por Braamcamp Freire. Já no século XX, com maior abrangência, a equipa liderada por
José Mattoso iria motivar novas gerações de investigadores dentre as quais sobressaíram, pa-
ra citar apenas alguns, Augusto Botelho da Costa Veiga, Luís Krus, José Augusto de Sotto
Mayor Pizarro, Bernardo Vasconcelos e Sousa e Nuno Gonçalo Freitas Monteiro. Mas outros
há, igualmente importantes, como é o caso, nomeadamente, de Almeida Fernandes.
A utilização do método prosopográfico de recolha metódica e sistemática de todas as infor-
mações disponíveis sobre categorias de indivíduos, reunindo determinada, ou determinadas,
características comuns (tempo, espaço, parentesco, condição, poder e função) iria propor-
cionar resultados patentes nos trabalhos de Maria Leonor Garcia da Cruz, Armando Luís de
Carvalho Homem, Luís Filipe Oliveira, Maria José Pimenta Ferro, Mafalda Soares da Cunha,
Leontina Ventura, Fátima Regina Gonçalves, Miguel Gomes Martins, e Luís de Soveral Varella,
nomes retirados de entre uma bem mais vasta plêiade de investigadores de quem somos tri-
butários.
E foi precisamente a leitura de José Mattoso31, de José Augusto de Sottomayor Pizarro32, de
Maria Leonor Garcia da Cruz33, Bernardo Vasconcelos e Sousa34, Maria José Pimenta Ferro35,
Fátima Regina Gonçalves36 e de Mafalda Soares da Cunha37, que nos ajudaram a delimitar o
âmbito da questão Mendonça Furtado. Tanto no enquadramento da necessidade de refundir
a
as origens de uma linhagem em ascensão desde a revolução de 1383 como, sobretudo, des-
de o nascimento de D. Jorge, filho bastardo de D. João II e de D. Ana de Mendonça (neta de
Afonso Furtado de Mendonça), frustrado herdeiro do trono e tronco da poderosa Casa dos
Lencastre, de modo a legitimá-la de acordo com as representações da mitologia fundacional

15
d
da Reconquista.
Isto sem prejuízo da possível assumpção mimética das armas dos Lasso de la Vega Hurtado
de Mendoça, sucessivamente almirantes de Castela, condes del Real e marqueses de Santil-
lana nas primeiras quatro décadas de Quatrocentos, remontar, pelo menos, a 1435, sendo
portanto anterior ao nascimento de D. Jorge, mas curiosamente síncrono com o
culminar da ascensão dos Mendoça castelhanos, ramo de Gudalajara, que irá originar
os duques do Infantado, os condes de Priego e muitas outras casas titulares. Se bem
que a mera associação como os Hurtado de Mendonça anteriores a esta ascensão constituís-
se já um enorme salto qualitativo.
Legitimação desnecessária numa perspectiva anacrónica, mas perfeitamente inteligível uma
vez enquadrada na conjuntura sócio-política em que se desenvolveu, e no quadro da menta-
lidade da sua época. Legitimação feita utilizando todos os meios disponíveis para reescrever
a história, tendo como objectivo a "prova" de uma ascendência régia, mesmo que esta fosse
oblíqua (como também oblíquo era o entronque da segunda dinastia portuguesa, uma vez
que era por bastardia, e de incontáveis dinastias por esse mundo fora), incluindo nesses
meios a via recorrente de rescrever as origens da linhagem e do entronque genealógico do
verdadeiro genearca fundador, neste caso o primeiro Furtado português detentor de um
poder efectivo à escala nacional. Referimo-nos a Afonso Furtado, anadel-mor dos besteiros
do conto e capitão-mor do mar, ou de Portugal, como também se documenta.
Antes do mais, tal prática era não só corrente como eficaz. Isto mesmo demonstrou o mar-
quês de Castelo-Melhor a propósito dos Pimentel, curiosamente contra-parentes dos Furtado
antigos. E essa eficácia traduzia-se não apenas na satisfação do egocentrismo de indivíduos
cuja alegada preeminência social assentasse exclusivamente na representação hereditária de
verdadeiros ou alegados potentes (não já filhos de algo, mas descendentes de alguém), mas
no preenchimento das regras explícitas, e implícitas, que estruturavam e fundamentavam o
"legítimo direito" a um determinado posicionamento na hierarquia nobiliárquica, hierarquia
essa escalonada no quadro de um estamento dotado, de jure, de uma situação de privilégio.
Ou, por outras palavras, numa conjuntura sócio-política em que fosse relevante demonstrar
uma "evolução na continuidade".
Tivessem os Furtado desenvolvido as políticas consentâneas com a sua origem de linhagem,
tão antiga como a nacionalidade, evoluindo a partir do seu possível "solar" duriense, medi-
ante alianças com os de Ribadouro, Baião, Silva, Pinho, Melo e Vilela, com tudo o que isso si-
gnificava em termos de ligação efectiva ás cinco linhagens da mitologia fundacional; tives-
sem-se limitado a ascender de escudeiros de província, herdeiros, como tantos outros "cade-
tes da Gasconha", de parcos bens fundiários, até cavaleiros da Casa Real, e daí, a altos deten-
tores de cargos palatinos, que não teriam sentido a necessidade de apagar pistas ou reescre-
ver a crónica da gens. Mas o destino singular, a trajectória invulgar desta linhagem, alia-
da pela primeira vez à Casa Real, numa conjuntura peculiar, no reinado de D. João II, em se-
guida com a Casa de Bragança e, uma segunda vez, com os Bragança já convertidos em di-
nastia reinante, em plena época contemporânea tardia, terá feito nascer a necessidade po-
lítica de subalternizar a sua condição de recém-chegados ao poder com a revolução de 1383
em proveito de uma mítica ascendência régia e de entronques tornados opacos pela prática
do "apagar de pistas".
Em nosso entender não se trata apenas de uma deliberada mistificação genealógica, como
tantas outras, cuja repercussão raramente conseguiu extravasar o âmbito de um salto hierár-
quico qualitativo. Trata-se, sim, daquilo que, neste caso particular, poderemos talvez conside-
rar uma estratégia bem sucedida que se terá desenvolvido progressivamente.
Inicialmente talvez tenha sido concebida como mera colagem à sobressaliente linhagem cas-
telhana dos Hurtado de Mendoza, à qual, mais uma vez em circunstâncias peculiares, os Fur-
tado portugueses poderiam ter-se aliado nos começos de Quatrocentos.
Mas se essa aliança existiu foi convenientemente esquecida em favor de um alega-
do entronque por linha masculina. A hipotética assunção do nome, e certamente das ar-
mas dos Mendoça castelhanos terá, inicialmente, permitido aproveitar a circunstância fortui-
ta da coincidência de apelidos, para corrigir uma varonia aparentemente obscura, em favor de
uma outra, simbolicamente preferencial. E, num segundo tempo (o do nascimento de D. Jor-
ge), com a compreensível cumplicidade régia, ordenar convenientemente a ascendência ma-
terna de um potencial candidato ao trono, calando eventuais vozes discordantes de genea-
logistas rigoristas e abafando uma tradicional maledicência cortesã que, de acordo com os
textos contemporâneos, vigiava com particular atenção as precedências cortesãs, manten-
do-se atenta à pequena história das linhagens.
A corte era um meio pequeno, povoado por parentes e facções que disputavam as mercês e
o favor do soberano, recorrendo ao rumor e, como é natural, não hesitando perante a calúnia
se necessário e oportuno fosse. Disto mesmo nos dá conta o episódio do ataque à ascendên-
cia materna de D. António de Ataíde, primeiro conde da Castanheira e omnipresente valido de
D. João III.
Quem percorrer as colectâneas de anedotas da corte portuguesa de Quinhentos verificará
que quase todos os episódios que envolvem a vida de D. Jorge, filho de D. João II e de D. Ana
de Mendonça, deixam transparecer murmúrios de uma surda hostilidade. Mas não existem,
ou não as encontrámos, alusões mordazes à sua ascendência materna, como também não
as encontramos nos episódios que envolvem outros descendentes de Afonso Furtado de Men-
donça. Isto, muito embora tenham subsistido vestígios, não expurgados, de outros "escân-
dalos", como se comprova na nota de rodapé 453 de Alão de Moraes (oc, p. 223), que re-
fere:
«D. António de Mascarenhas, no títº dos Almeidas, diz que D. Pedro Fernandes de Al-
meida, Prior do Crato, tivera na mãe do Mestre D. Jorge (D. Ana de Mendonça) a D. Es-
têvão de Almeida, D. Brites e outra».
Não vem ao caso conferir neste momento se este prior do Crato teve ou não filhos de D. Ana
de Mendonça, mas apenas aflorar que Damião de Góis, escrevendo muito próximo e conhe-
a
cendo bem o círculo áulico, que lhe trouxe sérios dissabores, no seu livro de genealogias das
famílias de corte que se conserva na BNL diverge cautelosamente da versão oficial da ascen-
dência materna de D. Ana de Mendonça, fazendo-a descender, não dos Carvalhais do con-
destável mas sim dos da ilha da Madeira, ligados aos capitães do Machico, de incestuosa e

17
d
atribulada crónica, que os linhagistas ilhéus procuraram, em vão, esconder.

Provas negativas. O facto de não existirem intrigas de corte sobre a ascendên-


2.2 cia dos Furtado concorda perfeitamente com o geral conhecimento de que des-
cendiam do capitão-mor do mar de D. João I, e nada mais. Mas não teria suscitado a curiosi-
dade, a maledicência do paço, o facto de passarem a denominar-se Furtado de Mendoça sem
que se soubesse donde provinha o novo e sonante apelido? Certamente que sim, o que indi-
rectamente, pela ausência desses remoques, vem indiciar uma razão autêntica para o uso do
nome Mendonça pelo filho do capitão-mor, que só lhe poderia vir pela mãe. Sem esta ra-
zão legítima não haveria favor real ou poder Mendonça que fizesse calar a maledicência.
O Livro de Linhagens do Século XVI da BNL já deixa transparecer a posterior informação de
Damião de Góis, pois não dá o tratamento de Dona a Leonor da Silva, mulher de Nuno de
Mendonça e mãe de D. Ana. E certamente que o faz com fundamento, uma vez que nas chan-
celarias se documenta essa senhora sem o tratamento de Dona, o que não corresponderia
nem à posição do marido nem à alegada ascendência que lhe é emprestada pelos genealo-
gistas posteriores.
Poderia ficar-se um pouco com a sensação de que a figura de D. Ana de Mendonça, e tudo
o que respeitasse à sua ascendência, foi objecto de um sistemático e cuidadoso branquea-
mento. Pelo menos essa tentação é compreensível, uma vez que a totalidade dos autores
coevos que consultamos sobre esta questão preferem por o acento tónico na ilustrada no-
breza da família da mãe do bastardo de D. João II, efémero candidato ao trono, «mulher
muito fidalga e moça formosa de mui nobre geração ", como a refere, por exemplo, o
cortesão Garcia de Resende.
Sendo todavia evidente que, fosse qual fosse o critério de complacência que o cronista pre-
tendesse utilizar, a linhagem de D. Ana em termos de visibilidade na hierarquia da corte
apenas remontava ao seu bisavô paterno e não se distinguia ainda por alianças por li-
nha feminina com a nobreza titular. Além de que esses mesmos linhagistas apologéticos
evidenciavam ao mesmo tempo uma perplexa ignorância sobre as origens da linhagem ou
sobre a biografia do genearca Afonso Furtado, que não deveria ser, para quem escrevia no
século XVI, uma figura que apenas um século tivesse desbotado até ao quase anonimato. Ali
mesmo à mão de semear, para quem, como Damião de Góis, teve a seu cargo as chancela-
rias régias, estava documentação bastante para compor um pouco mais a personagem, isto
para não contar já com a CDJ (I), de Fernão Lopes.
Regressando ao Livro de Linhagens do Século XVI, escrito presumivelmente um século após
a morte do capitão do mar de D. João I, o nome da cônjuge do capitão Afonso Furtado vem
referido deste modo: «foy casado com Dona…filha de…», sendo que as reticências corres-
pondem a espaços em branco. Se Afonso Furtado foi casado apenas com Maria Miguéis, o
nome desta terá sido esquecido por não estar à altura da prosápia da linhagem em Quinhen-
tos. Se o foi também, em segundas núpcias, com uma Mendonça, esta foi omitida para não
estragar uma possível ou desejável varonia Hurtado de Mendoza.
Entre outros investigadores que se debruçaram sobre a emergência das famílias de corte da
2.ª dinastia, Maria Leonor Garcia da Cruz38 sublinhou, é certo que focando membros da car-
reira administrativa, e não tanto militar, como foi o caso do capitão Afonso Furtado, que boa
parte da nobreza de corte dos de Avis pertencia a uma nova aristocracia, integralmente saída
da revolução de 1383 ou, no melhor dos casos, com raízes que, em termos de protagonismo
efectivo, raramente se documenta antes do reinado de D. Fernando I. Se bem que este não
seja o caso, por exemplo, de João Esteves (de Azambuja), chamado «o Privado».
Estão neste caso, entre muitos outros, os Castelo Branco, os Fernandes da Silveira, os Távora,
os Almeida, os Costa e os Mascarenhas, famílias com trajectórias bem conhecidas que, no de-
sempenho de funções palatinas, irão ascender à nobreza titular e à Grandeza, entrincheiran-
do-se, por razões que se prendiam com a limpeza de sangue, no segmento endogâmico dos
puritanos, estudado por Gonçalo Freitas Monteiro no «Crepúsculo dos Grandes». A sua cé-
lere ascensão e as alianças que, não menos rapidamente, os ligaram aos descendentes das
velhas linhagens da primeira dinastia que lograram sobreviver, mantendo o prestígio e o posi-
cionamento na hierarquia nobiliárquica, não parecem contudo ter ocasionado uma necessi-
dade generalizada de mitificar as suas origens.
Traçando um paralelo com outras famílias descendentes de escudeiros e infanções durienses
que se engrandeceram com a dinastia de Avis, verifica-se que estas não sentiram a necessi-
dade de mistificar a sua genealogia. Talvez que a diferença residisse no facto de descende-
rem por varonia desses mesmos infanções e escudeiros. O primado da varonia firma-se, esta-
mos em crer, por influência inglesa bebida nos Lencaster, sendo a Lei Mental, inspirada é cer-
to por razões que se prendiam com o centralismo régio, a disposição que mais terá contribuí-
do para o abandono do cognatismo.
No caso das famílias acima referidas, os Távora são paradigma de uma linhagem descendente
de uma varonia de escudeiros durienses, o que nunca foi seriamente mistificado. Os Castelo
Branco são descendentes de uma varonia nobre, pelo menos desde o séc. XIII, pelas linhas
femininas ligados à nobreza alto-medieval. Já os Almeida, pela varonia, descendem de um ca-
valeiro-vilão do séc. XII, se bem que desde logo ligados aos Mello, de quem herdaram a no-
breza e a heráldica39. Quanto aos Mascarenhas, é possível admitir que constituam um ramo
varonil (por bastardia legitimada) dos Leitão. A origem obscura dos Silveira e dos Costa de Al-
pedrinha nunca foi esquecida, nem eles tiveram meios de a mistificar com sucesso.
Tudo isto, contrariamente com o que sucedeu no caso dos Furtado que, depois de um perío-
do vestibular em que usaram indiscriminadamente Furtado, Furtado de Mendonça ou simples-
mente Mendonça, pelo menos no atinente ao seu ramo principal, irão inclusivamente aban-
donar o apelido Furtado, e passar a utilizar quase exclusivamente o Mendoça.
Em boa verdade esse abandono do único apelido da linhagem que se documenta, em bene-
fício de outro, cujo fundamento ainda não conseguimos documentar, por ser tardio poderá
a
ter sido decidido sem intenção dolosa, na ignorância das verdadeiras raízes familiares. Ou, en-
tão, pelo que ficou dito, são por si prova de que alguma ligação aos Mendonça deverá ter
existido.E que nomeadamente explique a razão porque esse mesmo ramo principal da linha-
gem dos Furtado portugueses, agora conhecidos apenas pelo apelido de Mendoça, viria a

19
d
assumir, sem a menor justificação genealógica, como demonstrou Faustino Menendez Pidal
de Navascués 40, as armas dos de la Vega, que pertenciam exclusivamente aos descendentes
do almirante Diego Hurtado de Mendoza, por sua sua mulher Doña Leonor de la Vega, ape-
nas e tão-só o tronco dos mais destacados ramos dos Hurtado de Mendoza castelhanos.
O certo é que Duarte Furtado de Mendonça, neto do velho capitão-mor Afonso Furtado, es-
tá sepultado no convento de Nª Sª do Espinheiro com essas armas. E seu sobrinho-bisneto An-
dré Furtado de Mendonça, nascido em meados de Quinhentos, governador da Índia em 1609
e falecido no ano seguinte, aparece no seu quadro do palácio de Goa com essas mesmas ar-
mas do marquês de Santillana. Este assumir de uma heráldica que nem mesmo o entronque
castelhano poderia justificar, não é fruto de ignorância ingénua; trata-se de uma intenção
deliberada de reivindicar para os futuros chefes do nome e armas dos Furtado portugueses
uma origem comum com o ramo principal dos poderosos Hurtado de Mendoza castelhanos.
E esta, é um facto, não existe. Se bem que possam ser encontradas outras explicações,
que não justificações, como diremos adiante.
Por ironia compreensível, e seguindo o mesmo tropismo, muitos dos ramos secundários dos
Furtado de Mendonça portugueses irão apropriar-se, e ver reconhecido em sede própria, o
direito ás armas que pertenciam exclusivamente aos descendentes do almirante D. Diego Hur-
tado. Isto a despeito de ser outra a heráldica da família, consagrada no Livro do Armeiro-Mór
e na sala de Sintra, conforma adiante mais detalhadamente abordaremos.
Desconheciam todos os monarcas, reis d'armas, genealogistas e heraldistas, umas vezes per-
missivos e noutras mais rigorosos, que se tratava de uma assumpção abusiva? Nalguns casos,
talvez na maioria deles, certamente. Mas não é possível ignorar que esta assumpção das ar-
mas dos Mendoça se terá desenvolvido, ao menos parcialmente, durante o reinado de D. Afon-
so V, precisamente o mesmo monarca que, como sublinha Manuel Artur Norton41, inicia a
organização de um serviço de heráldica e faz publicar, a 21.5.1476, um regulamento do ofí-
cio do Rei d'armas Portugal.
Repetimos e insistimos, parece-nos difícil admitir que, menos de um século volvido após a sua
morte, se tivesse perdido totalmente a memória da ascendência de Afonso Furtado, o valo-
roso capitão-mor de D. João I, e mesmo o nome da senhora (ou senhoras) com quem este
teriam casado. Esquecimento voluntário? Pensamos que sim.

A falsa ascendência régia castelhana. Tem prevalecido, há séculos, entre


2.3 genealogistas, dentre os quais destacaremos a título de exemplo Diego Gutier-
rez Coronel e Luís de Salazar y Castro, a hipótese que identifica o primeiro Furtado "por-
tuguês", e suposto genearca dos desta linhagem (alegadamente aquele que é referido no
Nobiliário do Conde D. Pedro como Fernão Furtado casado com Guiomar Afonso de Resen-
de), com um Fernám Iñigues de Mendoza, filho de Iñigo Lopez de Mendoza 42 e de D. Leonor
Hurtado, nascido nas Vascongadas, que teria passado a Portugal, hipoteticamente em Maio
de 1253, integrado na comitiva da princesa D. Beatriz, futura mulher de D. Afonso III.
Salazar y Castro foi mais longe, convertendo a hipótese em tese ao citar (sem transcrever,
cotar, ou, sequer mencionar a fonte), como prova, um escritura de 1242 que confirmaria esta
filiação.
Esta cronologia é muito incómoda para o suposto jovem integrante da comitiva de D. Beatriz
que, onze anos antes dessa viagem, já constava de escrituras. E, mais incómoda se torna se
tivermos em conta que a mesma personagem é geralmente aceite como sendo o Fernão
Furtado que, em Novembro de 1278 é referenciado como um dos mancebos que integrava a
casa do então ainda infante D. Dinis
José Mattoso (Nobreza Medieval Portuguesa) comenta mesmo que dos vassalos de D. Dinis,
referidos na fonte primária onde se colheu a informação, «apenas o jovem Furtado, perten-
cia à nobreza antiga, mas era justamente um castelhano». Sem no entanto citar a fonte des-
ta informação, pelo que é lícito pensar que aqui apenas seguiu Salazar e Castro. O que, na
verdade, é pouco para fundamentar uma excepção...
Também Sotto Mayor Pizarro (Linhagens Medievais Portuguesas) o refere como «Fernão Fur-
tado de Alava», mas seguindo também as fontes genealógicas correntes. E Faustino Menen-
dez Pidal de Navascués (Las Armas de los Mendoza) aceita igualmente a mesma tese.
Juan de Mujica, autor que se debruçou sobre os manuscritos inéditos de Salazar y Castro para
escrever a sua «Casa de Viscaya e sus linages», confirma expressamente que o terceiro filho
de Iñigo Lopez de Mendoza e de D. Leonor Furtado foi o «Férnan que produjo la ilustre rama
de Portugal», mas esta "confirmação" não vem acompanhada de qualquer prova documen-
tal, pelo que o fenómeno deve ser o mesmo.
Luís Bívar de Azevedo (História e Genealogia dos Mendoça Furtado Alcaides-Mores de Mou-
rão) analisa a cronologia deste entronque, opinando que o genearca dos Furtado e Mendon-
ça portugueses seria, não o Férnan Iñigues Furtado acima referido, mas um seu filho, de quem
contudo não há qualquer notícia. E muitos outros autores repetem versões idênticas ou simi-
lares. Mas todos eles têm em comum o facto de não se apoiarem em documentação, mais
propriamente em fontes primárias irrecusáveis.
Genealogistas investigadores que tenham manifestado reservas quanto a esta ascendência
dos Furtado e Mendonça portugueses, apenas Alão de Morais e Braancamp Freire, que ci-
tam a documentação em que baseiam as suas dúvidas. Com o distinguo que Alão, apoiado
em Lavanha (presumível responsável pelas interpolações seiscentistas no texto do LL) dá o
Afonso Furtado anadel mor dos besteiros e capitão-mor do mar de D. João I como filho do
Fernão Furtado senhor da honra de Peroselo, no julgado de Penafiel, apontando-o, como ve-
remos correctamente, como tendo casado com Maria Migueis, enquanto Braancamp, ainda
mais cauteloso, refere que o capitão do mar «parece ter sido filho desse Fernão, senhor da
honra de Pedrosêlo», e nem lhe refere a mulher, apenas os bastardos legitimados, que quase
todos os autores passaram em silêncio.
Relembramos que os mais conhecidos nobiliários portugueses quinhentistas que tivemos en-
sejo de consultar, ou deduzem os Furtado e Mendonça portugueses somente a partir do ca-
a
pitão do mar de D. João I ou, como faz Damião de Góis, perdem-se numa tentativa confusa
de o ligar aos Hurtado de Mendoza castelhanos.
Mas as fontes primárias, como veremos, dizem-nos algo muito diferente.

21
d
3 O que dizem as fontes
Furtado que não é Mendonça é furtado? Encontra-se documentado em
3.1 Portugal, em diplomas de D. Afonso Henriques, entre Julho de 1139 e Julho de
114037, um Fernando Peres Furtado que em 1139, presumivelmente antes que D. Afonso Hen-
riques tenha começado a intitular-se rei, nas fontes se designa como «coiermano infans».
Este Fernando Peres Furtado, cuja confirmação de 7.7.1140 é seguida pela do conde D. Ro-
drigo Gonçalves (de Lara), não pode deixar de identificar-se com um sobrinho desse mesmo
conde D. Rodrigo Gonçalves de Lara e sua mulher D. Sancha Afonso. Esta senhora, filha do
imperador D. Afonso VI, era irmã inteira de D. Urraca Afonso que de D. Pedro Gonçalves de
Lara teve «a furto» Fernando Peres Furtado.
Desde logo, e salvo melhor opinião, se este Fernando Peres é o mesmo de que falam a Chro-
nica Gothorum (redigida entre 1185 e 1200) e o Chronicon Lusitano (séc. XII), não deve ter
chegado a Portugal acompanhando o seu tio D. Afonso VII, ao bafurdío de Valdevez em
25.3.114043, pela boa e simples razão de que se encontra documentado em Portugal desde,
pelo menos, Julho do ano anterior. E também não conseguimos apurar em que fontes se terá
baseado Alexandre Herculano para escrever que este Fernando Peres Furtado ficou prisionei-
ro de D. Afonso Henriques, com o qual se teria vindo a reconciliar depois do armistício de 1141,
negociado pelo arcebispo de Braga, uma vez que surge a confirmar documentos da corte por-
tuguesa em 1140.44
De facto Pedro Gonzalez de Lara e seu irmão, o conde Rodrigo Gonzalez, rebelaram-se con-
tra Afonso VII em 1130. Foram presos, tiveram os bens confiscados e seguiram para o exílio.
Pedro Gonzalez, o pai de Fernão Peres Furtado, acolheu-se à protecção de D. Afonso I de
Aragão, mas acabou por morrer nesse ano de 1130, por ocasião do cerco de Baiona. Seu
irmão, o conde Rodrigo Gonzalez, obteve perdão de D. Afonso VII em 1132, tendo-lhe sido
confiada a tenência de Toledo. Falecida a sua primeira mulher, a já referida infanta D. Sancha,
irmã de D. Afonso VII, veio a casar novamente a 5.9.1135 com D. Estefânia, filha do conde
Armengol VI de Urgel. Mas em 1137 entrou em conflito com D. Afonso VII, do que resultou
ser mais uma vez privado dos bens e exautorado das honras. De acordo com as crónicas, par-
tiu para a Terra Santa e, no regresso, não foi recebido em Leão-Castela, tendo vagueado por
Barcelona, Navarra e Valência. Segundo as mesmas fontes regressou à Terra Santa, onde viria
a morrer leproso cerca de 1143.
Seja como for, o conde Pedro Gonzalez está documentado na corte portuguesa a 7.7.1140,
na companhia do seu sobrinho órfão Fernando Peres Furtado. Este Fernando Peres, Furtado
de alcunha assumida, já em 1123 se documenta num diploma de dona Urraca, da catedral de
Leon, como «Fernandus Petri, minor filius». Terá assim nascido entre 1116 e 1118. Segundo
propõe Almeida Fernandes, é mesmo o conde D. Fernando Peres que em 1131 já confirma
um documento em Braga (teria 13 a 15 anos) e é pela última vez documentado em 1173 como
governador de Viseu e Azurara da Beira. Podendo ainda ser o D. Fernando Peres que desde
1150 aparece como «dapifer cúria regia» e em 1153 confirma uma doação à Sé de Viseu
(«domino Fernando Curie regis dapifer hoc confirmante»). Aparentemente, depois de 1173,
teria cerca de 55 anos de idade, Fernando Peres Furtado regressou a Espanha e lá casou,
tendo uma filha, D. Leonor, que, tendo casado com Iñigo Lopez de Mendoza, senhor de Ló-
dio e Zaitegui, deu origem aos Hurtado de Mendoça castelhanos, nos quais se tem procura-
do entroncar os Furtado e Mendonça portugueses.
A verdade é que, para a época em apreço, se documentam vários homónimos de posição
relevante, sendo difícil distingui-los, nomeadamente saber quando se trata de Fernando Pe-
res de Trava ou Fernando Peres Furtado. A lista é a seguinte:
1) Fernando Peres. Confirma, pelo infante D. Afonso Henriques, a doação da vila de Pa-
rada (Castelo de Paiva) em Julho de 1130; confirma o couto a Louredo (Feira) em Outubro
de 1137 (junto com outro Fernando Peres, alcaide de Coimbra); confirma doação a Santa
Cruz em Março de 1139; confirma doação ao prelado lisbonense em Novembro de 1149;
recebe de D. Afonso Henriques o couto de Moçâmedes em Maio de 1133.
2) Fernando Peres, «coiermanus de infans». Confirma couto de Cucujães em 1140.
3) Conde D. Fernando. Confirma, pelo infante D. Afonso Henriques, o testamento de Re-
galados à Sé de Braga em Julho de 1130; confirma doação de Belinho à Sé de Braga em
Março de 1134; Confirma couto à igreja de Cossorado, em Riba de Coura, em Junho de
1134; confirma em Março de 1142; referido numa doação à Ordem de Santiago em Junho
de 1172.
4) Conde D. Fernando, tenens de Viseu e Zurara. Confirma doação ao mosteiro de Ma-
ceira-Dão em Outubro de 1173.
5) Fernando Peres, alferes. Confirma doação feita pelo infante a Paio Guterres em Março
de 1137.
6) Fernando Peres, alcaide de Coimbra. Confirma o couto a Louredo (Feira) em Outubro
de 1137 (junto com outro Fernando Peres).
7) D. Fernando Peres, «dapifer curiae» ou «curie regis dafiter». Confirma doação ao bis-
po e Sé de Viseu em Março de 1150, sendo também referido como tenens de Viseu (deve
portanto ser o conde D. Fernando); referido em carta régia de Fevereiro de 1153 respei-
tante ao território lamasense; firma documento em Abril de 1151.
8) Fernando Peres (de Trava). Surge a partir de 1120 até 1130 como confirmante de vários
diplomas logo a seguir à rainha Dona Tereza; em Novembro de 1129 é dito cônsul; em 1127
é dito «dux portugalensis»; um documento de 1112 diz que foi lavrado «nos tempos da
mesma rainha e do conde chamado Fernando».
9) Fernando Peres, que terá estado com Afonso Henriques na conquista de Lisboa (1147)
e terá sido 1º regedor das Justiças do reino. Barbosa Machado diz que escreveu (copia-
a
do) a Crónica da Fundação do Mosteiro de S. Vicente dos Cónegos Regrantes.
Fica claro que o Fernando Peres Furtado residente na corte portuguesa entre 1139 e o mais
tardar 1173, não pode cronologicamente ser avô, ainda por cima materno, do alegado Fernán
que teria chegado jovem a Portugal em 1252, estaria documentado como vassalo de D. Dinis

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d
em 1278 e alegadamente «produjo la ilustre rama de Portugal».
Adiante constataremos que um descendente do frater imperatoris, por mais explicações que
se procure encontrar, teria um status incompatível com aquele que pertenceu aos netos da
portuguesa D. Sancha Pais de Agares, e não permaneceria de tal modo obscuro que ainda não
foi possível documentá-lo directamente.
Mas uma vez que Braancamp, ao estudar a honra de Resende, deixou publicadas pistas sufi-
cientes para retomar esta questão, foi esse o caminho que seguimos. Este investigador pu-
blicou no vol. IV do Archivo Histórico Português um consciencioso trabalho sobre a honra de
Resende da qual retiramos alguns marcos e dados que ajudarão a enquadrar a documenta-
ção que apresentaremos a seguir.
Na 3.ª alçada das Inquisições Gerais de D. Afonso III, em 1258, declara-se que a honra de Re-
sende pertenceu a «Meono Dono Ega» que, pelas Inquirições de 1288, sabemos haver sido
D. Egas Moniz (de Ribadouro), a quem a terra foi honrada por D. Afonso Henriques, privilé-
gio esse que foi confirmado em 1290.
Em 1258 a honra compunha-se das seguintes villae: quintã de Resende, Mirão, Vinho, Safães,
Saes, Cima de Resende, Massas, Crujeiras, Tedões, Murganhos, Ferroz, Filgueiras, Ciringos,
Veiros, Pimeiral, Rendufe, Vinhais, S. Salvador de Resende, Santo Emilião, Paredes, Novais, Ta-
buadelo, Vila Garcia e Quintã do Corgo. Uma área que, no tempo de Braamcamp, correspon-
dia a grande parte das freguesias de Cárquere, Resende e Felgueiras. As mesmas freguesias
que, no começo do séc. XVIII, compunham o concelho de Resende, no qual se fundiram a an-
tiga honra e couto, porque nele os donatários vieram a ter as duas jurisdições. Pelas confron-
tações de 1258 ficava entre os julgados de Aregos e S. Martinho de Mouros. Estendia-se des-
de as margens do Douro até um marco conhecido como a «Pedra da Prova».
Em 1340 já a varonia dos senhores da honra tinha passado dos Gasco aos Resende, e destes
aos Pimentel (para aprofundar a estratégia que presidiu à sucessão de Martim Afonso de Re-
sende, o último varão desta linhagem a deter esta honra, ver Vasconcelos e Sousa, «Os Pi-
mentéis», 2000), de uma parte partia com o julgado de Aregos e com a honra de Bena, de
Álvaro Gonçalves, daí em direcção de Monte de Mouro, de outra parte partia com S. Marti-
nho de Mouros pelos Cadavais, vindo pelo cume até à raiz do monte, e daí com a honra de
Paredes, de Lourenço Vasques da Fonseca, até entrar no Douro e, daí, pela margem do rio, até
à foz do rio Corgo.
Egas Moniz, 1º senhor da honra de Resende, morreu em 1145/6 e foi documentadamente
casado com D. Teresa Afonso, fundadora do mosteiro de Salzedo, de quem teve Afonso Vie-
gas, nascido cerca de 1123, também documentado como Moço Viegas. Atesta-o um instru-
mento de doação feito em 1165 por D. Teresa Afonso, confirmada por seus filhos e netos, en-
contrando-se, entre os primeiros, Moço Viegas. Este, com o seu verdadeiro nome de Afonso
Viegas, veio a doar quanto possuía em Canelas, território de Alvarenga, à Ordem do Templo,
por carta de 6.1.1143, sendo já casado com D. Aldara Peres.
Não foi o primogénito de D. Egas Moniz, Lourenço Viegas (o Espadeiro), que herdou a honra
de Resende, muito embora tenha doado à mesma Ordem do Templo bens em Resende. A
quintã de Resende ficou a Afonso (Moço) Viegas, bem como a honra de Mões que, em 1290,
se encontrava já dividida entre mosteiros e fidalgos da linhagem.
Registe-se que, numa lei de D. Dinis, se contém expressamente ser costume já antigo que o
filho de algo que herdava a cabeça da quintã, possuía a honra, levava as coimas, havia os ser-
viços, e metia o porteiro, mordomo e vigário. Os restantes herdeiros só haviam as herdades
que lhes ficavam em partilhas, com proibição de aí morarem ou edificarem casa. Foi o que su-
cedeu com os irmãos Furtado, herdeiros colaterais por linha feminina, tanto na honra de Re-
sende como na quintã de Pinho.
Das Inquirições de 1258 não resulta claro quem fosse nesse ano o senhor da honra de Resen-
de, mas, daquilo que os inquiridores escreveram no primeiro parágrafo, ao tratar o «moestei-
ro de Carcari» (Cárquere), estavam na posse dela os irmãos Martim Afonso e Giraldo Afonso
(de Resende), filhos de D. Afonso Rodrigues «Rendamor» ou «Rem de amor». Este D. Afon-
so Rodrigues era filho de Rodrigo Afonso «Merda Seca» e de sua mulher D. Maria Gomes da
Silva, neto paterno de D. Urraca Afonso, mulher de D. Afonso Ermigues de Baião, e esta filha
do supracitado Moço Viegas e neta de D. Egas Moniz de Ribadouro.
É certo aquele D. Afonso Rodrigues ter sido senhor da honra de Resende, uma vez que, por
instrumento de 1233, partilhou certos foros com sua irmã Maria Rodrigues, tendo morrido já
em 1258, de acordo com as inquirições.
Em 1288 era-o Martim Afonso de Resende há mais de trinta anos, e assim continuaria até,
pelo menos, 1301, de acordo com uma carta de quitação que encontrámos.
1301, Janeiro, 6, Aregos - «Saibam quantos esta carta virem que eu, Domingos, procu-
rador de Domingos Ramos, i disse e confessou por uma procuração que i havia feita por
mão de Simon Domingues, tabelião da Guarda, assinada com o seu sinal como ela pare-
cia, que ele recebeu de Martim Afonso de Resende por Domingos Ramos 50 libras das
quais era obrigado por preito, que as recebeu dele e as dava por quites. Testemunhas Gon-
çalo Martins, cavaleiro, Diogo Domingues. Feito em terra de Aregos, 1301, Janeiro, 6».

Aliás, já Vasconcelos e Sousa (2000) publicou que este Martim Afonso, fortemente endivida-
do, se havia feito, sendo velho, freire do Hospital. Não só o era, como essa situação datava
de, pelo, menos, 24.8.130145: «o honrado varão religioso e honesto D. frei Martim Afonso
de Resende, freire do Hospital, por seu procurador Martim Viegas, vizinho do Porto a pedir
mandar receber por ele, e em seu nome, o traslado das dívidas e das heranças conteúdas
em quaisquer instrumentos que perante mim ou perante outros tabeliães aparecerem». E
também a sua precária situação se documenta, com as filhas a pagarem, após a sua morte,
dívidas que tinha deixado.
No entanto, cerca de uma década antes dos documentos acima referidos, mais precisamente
a 9.12.1290, havia sido lavrado um público instrumento de partilhas em terra de Aregos que
outorgaram de uma parte Martim Afonso de Resende e sua mulher, por si, e pelos seus sobri-
a
nhos, filhos de Giraldo Afonso, já falecido (e é por esta linha que irão herdar os irmãos Furtado
alguns bens, a que se virão juntar outros, provenientes da avó paterna D. Sancha Pais de Aga-
res), e da outra os procuradores de D. Marinha Pais de Ambia. Os primeiros outorgaram na
qualidade de filhos e netos de D. Afonso Rodrigues, a 2.ª como filha de D. Maria Rodrigues.

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d
Os documentos. Para melhor nos entenderemos, aqui ficam alguns sumários
3.2 e documentos relevantes para o estudo da questão, apresentados por ordem
cronológica, cuja análise se fará adiante.
1 - 1293, Março, 3, Banhos, Lafões - D. Sancha Pais de Paredes, viúva de Martim de Freitas,
afora a Martim Soares e sua mulher Marinha Domingues, filhos e netos, um casal em Paredes
(Cambra) pelo quinto de pão e vinho e do linho e da lenha, um quarteirão de eiradiga o meio
milho e o meio centeio e, pelo Natal, uma espádua de porco de XII costas e dois capões e XX
ovos, e pelo dia de S. João, a pedido do mordomo uma fogaça de centeio, um pão-de-leite
e um meio alqueire de manteiga bem como as jeiras como as deram a Estêvão Peres e a Lou-
renço Eanes cavaleiros, do seu herdamento…manda e outorga que no caso de quererem
vender a presente carta …a vendam a tal homem que seja obediente e vassalo de D. Sancha
e não cavaleiro nem dona nem escudeiro nem nenhuma pessoa religiosa. Entre as testemu-
nhas o filho primogénito do seu 2.º casamento, Estêvão de Freitas, cavaleiro, Lourenço de Pi-
nho e Martim Furtado e Gonçalo Peres, escudeiros de Freitas, Pedro Juyaaez, Vicente Perez
e João Pães, homens de dona Sancha.46
2 - 1307 Marco, 9, Nisa (?) / Muja (?) - Carta régia de D. Dinis, dirigida a Pedro Estevães, mei-
rinho-mor de Além Douro, ordenando-lhe que fosse aos lugares onde se situavam os bens e
heranças que foram de D. Afonso Rodrigues (o Rem de Amor, senhor da honra de Resende,
descendente dos de Baião) e averiguasse, juntamente com os herdeiros de Geraldo Afonso
(de Resende, pai da Guimar Afonso, mulher de Fernão Furtado) e de Martim Afonso (irmão
primogénito do antecedente), a parte do quinhão que por direito pertenceu a Geraldo Afonso,
e o partisse por tal forma a que Rui Furtado, escudeiro, e seus irmãos, herdeiros, recebessem,
como Rui Furtado lhe pedira a ele, D. Dinis, a sua parte da herança.47 «Sabham quantos este
teor desta carta virem e leer ouvyrem que Eª Mª CCCª xlvª anos xiij dias de Novembro en na
quintaa de Vila Moura Martim Veegas abade da eigreja de Gaton mostrou h6a carta d'el rey
da qual o teor a tal he. Dom Deniz pela graça de Deus rey de Portugal e do Algarve a vós
Pero Stevaiz meu meyrinho mayor alen Doyro saude. Sabede que Roy Furtado escudeyro my
disse por sy e por seus hyrmaaoos que eles queryam partir bens 48 e heranças que foram de
dom Afonso Rodriguiz per razom de Giraldo Afonso com herees de Martim Affonso e disse
my que eles querem partir esses bees e heranças assy como devem e sen eixeco e sen ban-
dorya e sem outra volta nenh6a por que vos mando que vaades aqueles logares hu son os dic-
tos bees e heranças que foram do dicto Afonso Rodriguiz e fazede y chegar os outros here-
os e sabede o quinhon que hy Giraldo Afonso deve a aver desses bees e fazede-os logo par-
tir de guiza que nom aja hy outro eixeco e fazede que o dicto Roy Furtado e seus hyrmaaos
ajam a sa parte que devem a aver dos dictos bees e heranças (....) o fazede que cada h6a das
partes aja seu dereyto e que nom aja antre eles outra volta nem outro eixeco unde al nom
façades. E o dicto Roy Furtado tenha ende esta carta dada en (...) 49 nove dias de Março el rey
o mandou pelo bispo do Algarve Lourenço Stevaiz de Beja a fez era de mil trezentos e qua-
renta e cinqui anos. A qual carta mostrada Vaasco Rodriguiz escudeyro por abadadessa (sic)
de Tarouquela e por sa hyrmãa dona Mayor Martinz pidiu ende o teor. Testemunhas Giral
Dominguiz coyrato Joham Migeez d'Amaranty Affonso Eanes e outros e eu Pero Lourenço
tabaliom de nosso senhor el rey en terra de Bayam e de Penaguyam a pitiçom do dicto Va-
asco Rodriguiz esta carta trasladey e meu sinal hy pugy (sinal do tabelião) que tal he».
3 - 1307, Novembro, 13, Quinta de Vila Moura - Na sequência do documento anterior,
Martim Viegas, abade da igreja de Gatão mostrou uma carta de D. Dinis, da qual Vasco Rodri-
gues, escudeiro, pediu o traslado para a abadessa de Tarouquela e para sua irmã Mor Martins.
4 - 1309, Janeiro, 28, Granja de Frariz - Manda de Sancha Pais de Paredes .50 «Sabham todos
que en presença de mjm Gonçalo Gonçalvjz Tabalion del Rey na marante e das testemunhas
adeante scriptas Steuam martijnz Priol Crasteyrodo moesteiro de freyxeno mostrou e peran-
te mjm leer fez huma manda feyta per mha maano e de meu sinal asinaada da qual o teor
atal he. In dominj nomine amen. Eu Sancha Paaez de Paredes en meu siso comprido e en to-
do meu entendimento faço e ordinhom estabelesco mha manda e meu Testamento en esta
maneyra do corpo e da Alma. Primeyramente mando o meu corpo soterrar no moesteiro de
sam Saluador de freyxeno e mando hj comigo a mha azemela e huma cocedra e huum alma-
draque e dous lençoes e huma colcha e huum chumaço. Item mando que dem os meus eyxe-
cutores aa obra de freyxeno vijnte maravedis. Item mando o meu casal de Paredes que em
comprey de Tarejga fernandiz mha coyrmaa e o que ey en san colmado en terra de Panoyas
ao conuento de freyxeno e que mjm cantem huma missa de cada dia por mha alma e de Mar-
tim de freytas pera senpre. En outra parte mando ao conuento do moesteyro de Çete o ca-
sal da deuessa pera senpre que iaz en huroo que digam missas por mha alma e de Martim
de freytas como virem que he bem. e que aquilo que Martim de freytas mandou que lho
compram come contyudo no seu Testamento. En outra parte mando a Sancha steuez qua-
reenta libras. En outra parte mando a Giumar Rodrigit dez libras. En outra parte mando a
Martim Anes dez libras. En outra parte a Johane eanes dez couedos de valençinha ou de san
toome. En outra parte a Johane seys libras. En outra parte a Martim filho Cinque libras. En
outra parte a Lourenço Alma seys libras. En outra parte aa filha de mha ama de Moos seys
libras. En outra parte mando que aqueles que eu leyxo en feyto de mha alma que aa queles
a que virem que deuem a fazer bem que mjm seruirom que lho façam pelo meu auer. En ou-
tra parte mando que todos aqueles que veerem e diserem que de mjm am que queyxume
também por herdamento come por mouil que lho coregam os meus eyxecutores pelo meu
auer e eles façam uerdade. E mando e outorgo que se alguma manda pareçer ou carta ou
stromento ou plazom ou promitimento que eu fezesse que nom valha saluo esta manda
doira que eu faço, E esta mando e outrogo e Dou por firme e por stauil e todalas outras dou
por casadas e por nenhumas saluo aquesta que mando que ualha pera senpre e faço e ordi-
nhom e outorgo por meus Testamenteyros e por meus eyxecutores Steuam de freytas meu
filho e dom Joham martijnz, Priol de freyxono (sic) e Steuam martijnz coonigo dese moestey-
ro e meu primo coyrmaao e rogolhis pola fiança que eu en eles ey que façam prol de mha
Alma e pagem as mhas mandas e as mhas diuidas pelo meu auer. Item mando a san Ooem
de Gatom dez maravedis por muyto que ende ouue e polas dizimas que lhj non dey tam
conpridamente como deuera. Item mando que mjm pagem o dom a bragaa logo en tal gis-
a
sa que nom penhorem o moesteyro de freyxeno por ele. E mando e outorgo que se meus
filhos ou meus Netos ou algem da mha parte veer que esta mha manda queyra contradizer
ou enbargar per alguma maneyra mando que os meus eyxecutores filhem toda a mha terça
e a mha quinta do meu auer e façam ende comprir todalas mhas mandas e pagar as mhas

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d
diuidas e do al que ficar façam prol de mha alma asy como eu deles fyo. E se algem ueer de
qual quer parte que esta mha manda ou parte dela quiser britar per alguma razom peyte aos
meus eyxecutores mil [maraue]lhis de pe e outros tantos a quem se uez for dada e a manda
seya firme e sta[uil] pera senpre. Fecta foy na grania de frariz vijnte e oyto dias de janeyro Ea
de mil e trezentos e quareenta e sete anos Testemunhas que forom presentes Domingos
abril clerigo de freyxeno, Gonçalo Dominguiz, Pero de sandim de frariz, Gonçalo iohanis, fi-
lho de Joham dominguiz de ribeira, Domingos iohanis de çidadela e outros. Eu Gonçalo gon-
çaluiz Tabaliom da marante e de Geestaço e de Gouuea a estas cousas fuy presente e per
mandado da dicta Sancha paaez esta manda sçrevy e en ela meu sinal pugj que tal he En
testemoyno de uerdade a qual manda per luida per mjm dicto Tabaliom o dicto Steuam
martijnz pediu o tralhado foy na marante xiij dias de feuereyro era de mil e trezentos e qua-
reenta e oyto anos. Testemunhas que me queriom de Geestaço fernam gomez mercador,
Martim martijnz que mostra os moozinhos e outros e eu ... tralhado sçriuy e en ele meu si
[Sinal de tabelião] nal pugj que tal he».
5 - 1315, Maio, 23, à porta do convento de Arouca - Os escudeiros Fernão Furtado, Rui Fer-
nandes e Afonso Fernandes dão em partilhas à irmã Maior Furtado, monja no convento de
Arouca, todos os direitos e bens que lhes ficaram da avó, D. Sancha Pais (de Agares, também
documentada como Sancha Pais de Paredes) na quintã de Pinho, julgado de Lafões.51
6 - 1317, Fevereiro, 29 - A abadessa de Tarouquela e sua irmã Mor Martins doam em herda-
mento para sempre todos os direitos que detêm na quinta de Vila Moura (estão descrimina-
dos) a seu sobrinho Vasco Martins (filho de sua irmã Constança Martins e de Martim Vasques
Pimentel, que na falta de herdeiros por linha varonil adoptará e apelido de Resende e virá a
suceder na maior parte dos bens da honra - Vasconcelos e Sousa, Pimenteis, 2000, pp. 201
e seguintes). Testemunha Rui Fernandes Furtado.
7 -1317, Agosto, 19 - «Em nome de deus amen. Saibam todos os que em presença de mim
Estêvão dePedroso, tabelião publico na cidade do Porto, e das testemunhas ... Roy Fernan-
dez, dicto Furtado, escudeiro, mostrou e por mim dito (expressão utilizada quando, anterior-
mente, no documento, se referiu o nome ou qualidade) tabelião ler fez um instrumento feito
por Afonso Domingues, tabelião...e do seu sinal assinado segundo (a)parecia do qual instru-
mento o teor de verbo a verbo é tal Saibam quantos este instrumento virem que na Era de
trezentos e cinquenta e cinco anos, (1317) dez e nove dias de Agosto na cidade de Lisboa,
no paço em que os tabeliães da dita cidade...presença de João Pires, publico tabelião da dita
cidade e das testemunhas que adiante estão escritas Afonso Fernandes Furtado mostrou e...
tabelião um rolo escrito em pergaminho do qual o teor tal é: era de mil trezentos e cinquen-
ta e quatro anos (1316) em Lisboa...agosto, perante os Ouvidores da corte foram mostra-
dos instrumentos e cartas das quais os teores tais são: Sciunt que omnes que suc...erant
quod ego donus Alfonsus Roderici facio partitia cum mea hermana dona Maria Roderici de
hereditate nostra (ó Matoso, tem a certeza da sucessão agnática?) qua habemos in Resen-
dum s... ex casales et de istos casales fuenront montes (sic) dono Alfonso s... casale en quo
Pelagio eo cullo (sic) aliud i Miran in quo hanbet (sic) Petri Ramiriz altero (?) ego Johanes Pu-
meiral Villa Moura Gonsalvu Ioaniz altero Gunsalvo Veegas et me medio casale. Ista partiz-
iu est facta pervostrum mandatum et per vestrum cléricum nominatum doni Yoani factus
penus (sic) mense Julii sub Era Milésima duocentásima et Lxxj (1233, eram vivos e provavel-
mente jovens D. Afoso Rodrigues de Baião e sua irmã D. Maria Rodrigues) Reynante Rege San-
ciu in Portugaliae Episcopo Lamecense Dom Pelagio, qui presentes fueront et hoc tiudi-
verunt (sic) Laurentio Martini Freire testis Pelagio Menendi testis Nuno Pelagii testis Francis-
cus? Menendi testis. Roderico Domenici testis, gunçalvo Petri testis. Nos supra qua scriptum
nostrum irrumpere tentaverint quantum que fuerunt tantum i duplum comprovat. Petrus
scripsit. E doutro teor que tal é: Conheçam todos que em presença de mim Roy Domingues,
publico tabelião de nosso Senhor el Rei de Portugal e de Algarve em terra de Regas (Régua?)
e das testemunhas que adiante são escritas. Era de mil trsentos e vinte e oito anos tres dias
por andar de dezembro (3.12.1290) Martim Affonso de Reesendi e sa molher dona Maria Ro-
drigues partirom com Martim Fernandez e Ioam Fernandez, procuradores de dona Maria Pa-
ez de Anhia, e na qual partiçom ficou Martim Affonso e sa molher de suso dita por si e por
seus sobrinhos filhos de Girald'Affonso en aquela partiçom que foi de don Afonso Rodri-
guez seu padre en no meio do pááço contra o fundo como leva toda a porta com seu alpen-
dre e com sas duas camaras e con a casa da cozinha e com as cortes e com toda a partiçom
da vinha como jaz contra si e com todo o terrenho que é contra Santa Maria como está tapa-
do e com o seu pombal e com o campo de aquém do ribeiro como esta tapado e com a leira
d'além do ribeiro que foi vinha velha como está marcado, e o casal de Miram e o do Pumey-
ral em que mora Affonso Veegas. En outra parte ficarom os dictos procuradores de dona Ma-
ria Paez en a meada de... Maria Rodrigues e no meio do Paaço de la porta acima con o al-
pender de cima e abrem lhe en i a porta a esse paaço en esse (alpender) ... mia e ficou lhe i a
cortizela com todas as suas árvores e com outra partiçom de vinha como está contra si com
todo lo campo que está sobre ..d'Eiras como parte con os Galegos e con a adega e com e
com o lagar e com a casa que foi de Martim Afonso e com todo o campo que i está d... além
salvo a leira de cima que ficou con a outra partiçom assi como é demarcada e o casal de Es-
têvão Rapado com o casal de Maria E o casal de Domingos Cosâes ficou a esses ditos procu-
radores pelo casal do Covelo que mandou do Afonso Rodrigues por sa alma a Carcari e o
campo das árvores da quintã de Resendi com sa fruita por saída de todalas cousas. E parti-
rom em Vila Moura e caiu aos ditos procuradores por razão de dona Maria Rodrigues o paaço
novo con a cozinha e a meia de vinha contra fundo como é demarcado eo casal de Pedro
Paez e o meio do moinho e o campo todo detrás esse paaço de suso dito e o meio do casal
da quintã E caiu en esses procuradores de suso ditos o casal de Estêvão Ioanes com todalas
casarias e com todos os terrunhos rotos e por romper salvo o dos casais e silvam que man-
dou don Affonso Rodriguez por sa alma E deu a Martim Affonso por razão de don Affonso
Rodrigues seu padre por si e por seus sobrinhos filhos de Girald' Affonso o outro paaço mais
velho com sa camara e com a partição da vinha como é demarcado e con o casal de Gonsal-
vio e o meio do casal da Quintã e o lagar de permeio. E caiu aos procuradores de suso ditos
meio donamado e as meias das pesqueiras e a meia da portagem e o meio de todalas cousas
a
que pertencem à dita Quintã de Reesendi aquela em que ficou don Affonso Rodriguez e e
dona Maria Rodriguez sa irmã. Testemunhas Martim Rodriguez Porcalho Martim Paez cléri-
go de Reesendi Martim Ioanes Pintoral Martim Paez. As quais mostradas e lidas per dante os

29
d
ditos Ouvidores Nuno Gonçalves Camelo pediu que lhi mandassem per sa autoridade o tres-
lado delas, E eu, Gil Martins d´Evora per seu mandado tresladei. O qual treslado lido, estan-
do presentes Rodrigo Anes que o dito rolo trazia e o dito Afonso Fernandez...tabelião que
lhi tornasse o dito treslado em publica forma. E eu deixo a ele escrito com a minha mão sinal
que tal é Testemunhas Pedro Giraldes Martins Vila Chã escrivães Lourenço Paez Afonso Do-
mingues e outros. A qual escritura sobredita Afonso Fernandez deu a mim Afonso Domin-
guez, tabelião del rei em Vila Real que desse ende o treslado a Roy Fernandez seu irmão Esto
foi na dita vila treze dias de Fevereiro da Era de 1358 anos (1320). Testemunhou Roy Fernan-
dez e outro. O qual instrumento pelo dito Roy Fernandez mostrado e per mi dito tabelião lido,
João Vasques escudeiro que presente estava pediu a mim sobredito tabelião que lhe i desse
o teor do dito instrumento ao meu sinal e o dito Roy Fernandez o mandou dar. Esto foi feito
na cidade do Porto sobredita dez e nove dias do mês de Fevereiro era de 1358 (1320). Tes-
temunhas que foram presentes: Martim d'Arouca tabelião Esteveanes dito clérigo Domin-
gos Lourenço corrector e Fernam Giraldes alfaime da dita cidade e Vicente Anes abade que
se dizia da igreja de s... de Fradelos do arcediago de Vermuim no arcebispado de Braga e
outros. E eu, Estêvão de Pedroso tabelião sobredito que a todo esto fui presente o dito ins-
trumento a rogo do dito João Vasquez e e per mandado do dito Roy Fernandez em publica
forma de verbo a verbo tresladei e este instrumento ende com minha própria mão escrevi e
de neu sinal assinei em testemunho da verdade que é tal».52 O documento original foi lido e
apresenta alguns, irrelevantes, erros de transcrição.
8 - 1318, Maio, no Chão do Paço de Resende - Martim Gil, vassalo d'el rei, julgou que os For-
tados (sic) filhassem a sua parte da herança que era aquela sobre a qual os herdeiros de Mar-
tim Afonso não punham contenda, e advertiu-os expressamente de que se os Fortados (en-
tendem que) devem ter maior parte na dita herança que se lhes dá sem contenda que o pos-
sam demandar por onde devem. Presente Martim Anes, procurador da abadessa de Tarou-
quela e de sua irmã Mor Martins.53 Era de mil e trezentos e cinqueenta e seis anos onze dias
de Maio em no chaão do Paaço de Resendy julgou Martim Gil vasalo del rej que os Fortados
filasem sa parte da dicta erança quanto era do quilho sobre que lhis os hereos de Martim Af-
fonso nom poem contenda e guardou his spersamente todo o seu dereito que os dictos For-
tados se moor parte devem aver da dicta erança que esto que lhas da sem contenda que o
posam demandar per u devem e como devem da qual sentença nenh6a das partes nom ape-
lou e pedio ende Martim Anes procurador da abadessa de Tarouquela e de sa irmãa Moor
Martinz a mim Pedr'Eanes tabaliom em Aregos e em Resendy fecto foy em na era e dia so-
bredicto. Testemunhas Martim Gil vasalo del rey e Gil Perjs seu scriuam Joham Rodriguiz e
Domingos Migueiz (sinal do tabelião), clerigos e outros.
9 - 1321, Agosto, 21, em Freixeo, ante a porta do mosteiro de Freixeo - Pedro de Vigo, ho-
mem e procurador de Maria de Freitas, mulher que foi de Rui Lourenço de Portocarreiro, em
seu nome, doa a D. Teresa de Freitas, monja do mosteiro de Arouca, sua irmã, todas as her-
dades, foros, «triudos», serviços, porções, direitos e direituras que a dita Maria de Freitas tem
e de direito deve ter por qualquer razão em Paredes de Cambar, em todo o vale de Lafões e
em seus termos. Por esta carta mete-a em posse das ditas coisas, como se já houvesse 3 anos
e 3 dias que estivesse em posse pacífica. Isto lhe faz de sua boa fé(e) livre vontade e porque
era verdade e talam da dita Maria de Freitas e porque lhe mandou que assim lho fizesse e por-
que lhe deu o que ela, dita D. Teresa (de Freitas), tinha de direito no vale de Freitas. Testemu-
nhas: frei João do Souto, frei Gil, Lourenço Mendes, Gonçalo Silvaa, escudeiros de Rui Furta-
do, e Rui Furtado.54 In Dei nomine ámen. Sabham todos que en pressença de mym Gonçale
Anes publico tabaliom de nosso senhor el rey em Celoruyco deBasto e das testemunhas que
adeante som scritas Petro de Vigo, procurador de Maria de Ffreytas molher que ffoy de Ruy
Lourenço de Portocarreyro mostrou e per mym leer ffez hua procuraçom ffeyta e assignaaa-
da per mão d'Affonso Martinz tabaliom del rey em terra de Regelados da qual o teor tal he:
Sabham todos quantos esta procuraçom virem que eu Maria de Ffreytas, molher que ffuy
de Ruy Lourenço de Portocarreyro ffaço meu procurador como melhor pode e deve ser Petro
de Vigo meu homem e quen ele ffezer aportador ou aportadores desta procuraçom que ele
por mym e em meu nome possa demandar e tyrar e receber todos meus dereytos em todo-
los lugares cada hu hos eu ey e devo d'aver de dereyto asy de herdamentos come de eygre-
jas e moesteyros come de todalas outras coussas que ssejam em qualquer logar pêra quitar
e dar por quites aqueles de que em meu nome receber e pêra emprazar e partyr e marcar e
scanbho ffazer e pêra vender e apehorar e rrendar dos meus herdamenntos e beens (todos)
ou parte deles cada hu eu os ouver e devo d'aver de dereyto e ffazer carta ou cartas e stro-
me(n)tos prazos ou ffirmydões em qualquer maneyra que el mandar ffazer per qualquer ta-
balyom que a dicta procuraçom vyr a qual eu outorgo e mando que as ffaça e ponha em seu
registo como ffor seu costume pêra demandar e deffender todolos preytos e demandas que
eu ey e a mym ffezerem ou eu quisser fazer asy ssobre movyl come sobre raiz perante qual-
quer juiz ou juízes ou meyrynhos ou justyças em qualquer maneyra que lhy preyto avenha
asy clesyastycas come sagraaes come alvydros pêra demandar responder deffender pidyr
procuradores 55 ffazer soestabelecer sentença ou sentenças ouv(i)r apellar apelaç(o)es ou
apelaçom segir revogar se mester ffor e despoys da revogaçam hoffizeo da procuraçom em
ssy de cabo ffilhar cada que quisser u vyr que lhy faz mester pêra jurar em mha alma jura-
mento em qualquer maneyra que o dereytomandar e da outra parte ho rreçeber e pêra ffa-
zer e dizer todalas coussas e cada hua delas que verdadeyro e lidimo cumprido procurador
pode e deve ffazer que eu ffarya e dirya se per mha pessoa presente ffosse e o ffezesse ou
dissesse. Eu ey e averey fforte e stavyl pêra todo sempre aso hobrigaçom de todolos meus
beens e ffirme todalas coussas e cada hua delas e por esto ser certo rogey e mandey Affonso
Martinz tabaliom del rey na terra de Regelados que me ffezesse esta procxuraçom, ffeyta
foy em Moos a porta de eygreja dez e sete dias d'Agosto Era de mil trezentos e cyncoenta e
nove anos. Testemunhas: Joham Vycente, Petro Ryal, Domingos do Barrho mancebo da ey-
greja de Moos e outros. Eu Affonso Martinz já dicto que esta procuraçom a rrogo e per man-
dado da dicta Marya de Ffreytas com mha mão propya escrevy aqui meu signal puge em ela
que tal he em testemunho de verdade que tal he. A qual perliuda per mym dicto tabalyom
o dicto Petro de Vygo procurador susodicto em nome da dicta Maria de Ffreytas e em sseu
nome come sseu procurador per poder da dicta procuraçom encomendou e mandou a mym
a
dicto tabalyom que ffezesse hua carta de donatio em esta fforma. In Dey nomine ámen. Eu
Pedro de Vigo, homem e procurador que ssom da dicta Maria de Ffreytas em logo e em no-
me da dicta Maria de Ffreytas e per poder da dicta procuraçom ffaço carta de pura doaçam

31
d
a vos dona Tareya de Ffreytas monga do moesteyro d'Arouca e quen a vos aprouger e vossa
vontade ffor de todalas herdades e fforos e triudos e sserviços e porções e dereytos e derey-
turas que a dicta Maria de Ffreytas a e de dereyto deve d'aver per qualquer razom em Pare-
des de Canbar em todo o vale de Laffões e em seus termhos pr u os eu ey e de dereyto devo
de haver e os ela melhor poder aver que ela e quen ela quisser e por bem tiver hos aja pera
ssenpre livremente e sem contenda nenhua. E logo a per esta carta meto m corporavyl po-
syssom das dictas coussas que lhy doo e desuesto a dicta Maria de Ffreytas das dictas cous-
sas e revesto a dicta dona Tareya sa irmaa em ela e meto-a em corporavyl posissom come
sse já ouvese três anos e três dias que en pose pacyffyca estevesse. Esto lhy ffaço de mha
boa lyvre vontade e talam da dicta Maria de Ffreytas e porque me mandou que assy lho ffe-
zesse e porque lhy deu o que ela dicta dona Tareya avya de dereyto no vale de Freytas pola
coussa obrigo todolos beens da dicta Maria de Ffreytas assy movys come raiz que deffenda
e lyvre esta doaçam a dicta dona Tareya de quem quer que lha embargue e demande per
qualquer razom que nom seja per dona Tareyga. E nenguum non poder hyr contra esto so
pea de cem morabitinos e todavya a doaçam estar ffirme e valyossa como dicto he perasem-
pre e nem outras pesoas nehuas non yrem contra esto so pea de quinhentos a caber e valer
e per esto ser certo mandey e rogey a Gonçale Anes tabalyom susodicto que escrevesse esta
carta, Ffeyta ffoy em Freyxeo ante a porta do moesteiro de Ffreyxeo vinte e huum dia d'Agos-
to Era de mil e trezentos e cynquenta e nove anos. Testemunhas; ffrey Joham do Ssouto,
ffrey Gil, Lourenço Mendiz e Gonçalo Silvaa escudeyros de Ruy Ffurtado e Ruy Furtado e
outros.
10 - 1322, Janeiro 21, em Agares - Rui Fernandes Furtado por si, e Afonso Rodrigues na quali-
dade de procurador de Leonor Furtada, sua mulher, quitam D. Aldonça Martins, abadessa de
Tarouquela e sua irmã Mor Martins de todos os direitos que têm e entendem haver contra elas
dos bens que foram de D. Afonso Rodrigues por razão de Geraldo Afonso, avô deles, e con-
firmam as partilhas que Pedro Esteves entre Rui e Leonor e elas, e dão por nulas as feitas por
Martim Gil entre uns e outros no que respeita aos bens de Vila Moura, por cem libras que de-
las receberam.56 «Sabham quantos este stromento virem e lerem e ouvirem que em presen-
ça de mim Doming'Eanes tabaliom d'el rey en terra de Sanfiinz e de Benviver e das testemu-
nhas adeante escritas em Rocas qas (sic) Afonso Rodriguiz mostrou e ler fez per mim dicto
tabaliom h6a procuracom que se dizia fecta de mão d'Afonso Dominguiz tabaliom de Pa-
noias e asiinada do seu sinal segundo a mim parecia e recontava na dicta procuraçom que
Leonor Fernandiz Furtada fazia e ordinhava e estabelecia per seu procurador lydemo e avon-
dodo geeral Afonso Rodriguiz meu marido procurador desta procuracom per sy e reconta-
va antre as outras cousas que lhe dava poder pera vender e doar e emprazar partir demar-
car marcos meter sortes de dar e escambyar e obrigar e recontava na dicta procuracom que
avia a dicta Leonor Fernandiz firme e estavil sobrigaçom de todos seus be0s em nas cousas
suso dictas fose feyto e procurado e em cada h6a delas recontava que fora fecta em Agares
quinze dias de janeiro era de mil e trezentos e sasenta anos testemunhas Lourenço Martinz
cavaleiro e Fernam Periz Lourenço Mendiz e outros. Eu tabaliom sobredicto per poder da di-
cta procuracom este stromento escrevy eu Roy Fernandiz Furtado eu Affonso Rodriguiz so-
bredicto conhocemos e confessamos que damos por quites dona Aldonça Martinz abades-
sa de Tarouquela e Mor Martinz sa irmã de todo o derecto o que avemos e entendemos aver
contra elas dos be0s que foram de don Affonso Rodriguiz em que nós aviamos parte per ra-
zom de Girald'Affonso noso avoo e outrossy as damos por quites de todolos novos e fruy-
tos per qu'elas a nós eram teudas segundo era conteudo na manda de seu padre Martim
Afonso e outrossy outorgamos e avemos por firmees as partycões que fez Pero Stevez antre
nós e elas asy co'e conteudo nas escrituras que yaa fectas das particões que o dicto Pero
Stevez fez e damos por nen6as as que fez Martim Gil antre nós e elas nos dictos b0es em Vi-
la Moura e esto fazemos por que somos bem entregues pela dicta partiçom que fez o dicto
Pedro Estevez antre nós e elas no dicto logo de Vila Moura e por cem libras que delas rece-
bemos e nós damos por bem entreges de todo que nonca as posamos demandar tambem
movil com'a raiz e outrossy a dicta abadesa e a dicta Mor Martinz deram por quites o dicto
Roi Fernandiz e Afonso Rodriguiz e a dicta Leonor Fernandiz da sa parte da loriga e da cepa
que continha na manda de Martim Afonso e todas as dictas partes prometeram e outor-
garom a nom ir contra as dictas cousas so pea de mil libras e quem for contra as dictas cou-
sas que petem outra parte querendo paz as dictas mil libras. Fecto foy no dicto logo vinte e
h6m dia de Janeiro Era de mil e CCC e sasenta anos. Testemunhas Lourenço Periz Afonso
Anes Domingos Mourenlhe e Bartolomeu Dominguiz d'Ansede Martim Rodriguiz e outros.
Eu tabaliom sobredicto qu'estas cousas presente foy e este stromento escrevy e meu sinal
que fiz que tal [sinal do tabelião] he. Em testemunho de verdade».
11 - 1322, Fevereiro, 7, mosteiro de Arouca - Mor Fernandes [Furtado], monja do mosteiro
de Arouca, com licença de dona Aldonça Eanes, abadessa desse mosteiro, quita dona Aldon-
ça Martins, abadessa de Tarouquela e Mor Martins, sua irmã, de todos os direitos que devia
haver dos bens que foram de dom Afonso Rodrigues, aos quais tinha direito por via de Geral-
do Afonso, seu avô, ratificando, ainda, o instrumento de partilhas que fizera com as ditas se-
nhoras.57 «En nome de Deus amen. Sabham quantos este estrumento virem e leer ouvyrem
que eu Moor Fernandiz monja do moesteyro d'Arouca per outorgamento de dona Aldonça
Anes abbadessa e do convento do dicto moesteyro conhosco e confesso que dou por quites
dona Aldonça Martijnz abbadesa de Tarouquela e Moor Martijnz sa hyrmaã de todo o de-
reyto que avemos e entendemos a aver contra elas dos beens que forom de dom Afonsso
Rodriguiz en que nós avyamos parte per razom de Girald'Afonso nosso avoo e outrossy as
damos por quites de todolos novos e fruytos per que elas a nós eram teudas segundo era
conteudo na manda de seu padre Martim Affonso. E outrossy outorgamos e avemos por fir-
mes e por estavys as partições que fez Pero Estevaez antre nós e elas assy como he conteu-
do nas escripturas que hy a feytas das partições que o dicto Pero Estevaez fez. E damos por
nenh6as as que fez Martim Gil antre nós e elas nos dictos be0s en Vila Moura e esto faço
porque somos bem entregues pela dicta partiçom que fez o dicto Pero Stevaez antre nós e
elas no dicto logo de Vila Moura e por viinte e cinquo libras que eu delas reçebi e me dou
por bem entregue de todo que nunca as possa demandar tam bem do movil como da rayz
a
e prometo e outorgo a nom viir nem hyr contra as dictas cousas so pena de mil libras e quen
for contra as dictas cousas peyte a outra parte querente paz as dictas mil libras ou a quem der
sa voz e o stromento seja en sa força duradoyro. Feyto foy esto no moesteyro d'Arouca sete
dias do mes de fevereyro era de mil e trezentos e seseenta anos. Os que presentes forom

33
d
Martim Gomez, escudeyro morador no b...go d'Arouca e Pero Fernandiz do canpo e Lou-
renço Paiz clerigo moradores a par do moesteyro d'Arouca testemunhas. E eu Johan
'Estevaez publico tabalyom en terra de Arouca que a rogo e per mandado da dicta Moor
Fernandiz monja do dicto moesteyro d'Arouca e per outorgamento da dicta dona Aldonça
Anes abbadessa e do convento do dicto moesteyro de Arouca este estormento com mha
mão propria escrevi e hy meu sinal pugj en testemoyño (sinal do tabelião) 58 de verdade que
tal he».
12 - 1322 Abril, 15, Arouca - Mor Furtado, monja do mosteiro de Arouca, com licença de
dona Aldonça Eanes, abadessa desse mosteiro, quita dona Aldonça Martins, abadessa de
Tarouquela e Mor Martins, sua irmã, de todos os direitos que devia haver dos bens que foram
de dom Afonso Rodrigues, aos quais tinha direito por via de Geraldo Afonso, seu avô, ratifi-
cando, ainda, o instrumento de partilhas que fizera com as ditas senhoras59. «Sabham quan-
tos este estromento virem e ouvyrem que eu Moor Furtada monja do moesteyro d'Arouca
per lecença de dona Aldonça Anes abadessa do dicto logo d' Arouca conhosco e confesso
que dou por quites dona Aldonça Martijnz abadessa de Tarouquela e Moor Martijnz sa yr-
maã de todo o dereyto que eu hey e entendo a aver contra elas dos beens que forom de
dom Afonsso Rodriguiz en que eu avya parte per razom de Girald'Afonso meu avoo e ou-
trossy as dou por quites de todolos novos e fruytos por que elas a mim eram teudas segun-
do era conteudo na manda de seu padre Martim Afonso e outrossy outorgo e hey por firme
e estavel as partições que fez Pedro Estevaez antre mim e elas assy como he conteudo nas
escripturas que hy ha feytas que o dicto Pero Estevaez fez das partições e dou por nenh6as
as que fez Martim Gil antre mjm e elas nos dictos be0s en Vila Moura e esto faço porque soo
bem entregue pela dicta partiçom que fez o dicto Pero Stevaez e por trinta libras que eu de-
las reçebi e por viinti que mandey dar a meu hyrmão e fazem assy cinquenta libras das quaes
cinquenta libras me dou por ben entregue e por pagada e dou-me por bem entregue que
nunca as possa demandar tam bem movil como de rayz aa dicta abadessa e aa dicta Moor
Martijnz e prometo a nunca hyr contra estas cousas suso dictas so pena de mil libras. Feyto
foy este estromento no moesteyro de Arouca quinze dias do mes d'Abril da era de mil e
trezentos e seseenta anos. Os que presentes forom Martim Lourenço (?) 60 abade de San
Salvador d'Arouca e Cristouam Domingiz seu capelam e Johane Eanes de Ba(...) 61 c(...) 62
teyro testemunhas e outros. E eu Johan'Estevaez publico tabalyom en terra de Arouca que
a rogo e per mandado da dicta Moor Furtada e per lecença e per mandado da dicta dona Al-
donça Anes abadessa do dicto moesteyro d'Arouca este estromento com mha mão propia
escrevi e hy meu sinal pugy en testemoyño de verdade que tal he (sinal do tabelião 63)».
13 - 1340, Setembro, 23, mosteiro de Arouca - Instrumento de partilhas feito entre D. Teresa
de Freitas, abadessa de Tarouca, e Mor Furtado, monja do dito mosteiro e sobrinha da dita
dona abadessa, pela qual dividem entre si certas herdades situadas em Pinho (de jusão) e Pi-
nho (de susão) ( Pinho de baixo e Pinho de cima, no julgado de Lafões) que herdaram de dona
Sancha Pais avó dela abadessa.64 «Sabham todos que em presença de mim Johanne Steueez
publico tabalyom d'el rey en terra e no couto d'Arouca e en seus termhos e das testemunhas
adeante escriptas dona Tareyja de Freytas abbadessa e o convento do moesteyro d'Arouca
per sy da h6a parte e Moor Furtada monja do dicto mosteiro e sobrinha da dicta dona abba-
dessa per lecença da dicta dona abbadessa da outra de seus prazeres de sas liivres voon-
tades fezerom sa partiçom antre sy firme e duradoyra pera todo sempre das herdades que
às dictas dona abbadessa e Moor Furtada a anbas acontecerom en sa partiçom e que anbas
tragen juntamente as quaes herdades som em Pynho de jusaao e em Pynho de susaao do
julgado de Lafões as quaes herdades e possisões lhis acontecerom en sa partiçom de parte
de dona Sancha Paez madre da dicta dona abbadessa a qual partiçom fezerom en esta guy-
sa convem a saber que a dicta dona abadessa aja en sa partiçom o casal de Pynho de susaao
en que ora mora Steuam Dominguiz e o casal de Pynho de Jusaao en que morou Penas Alvas
os quaes casaes a dicta dona abbadessa deve d'aver pera todo sempre com todas sas entra-
das e saydas e perteenças e prestanças suas em chaão en monte e en fonte a rroto e por ar-
ronper e todas sas auguas e pacigoos e montados e manynhos e devesas e testadas e outras
proees e com todalas outras cousas que os dictos casaes e herdamentos perteeçem e de de-
reyto deuem perteeçer e per huus melhor poder aver e achar e con todalas rendas fruytos
novos e novidades dos dictos casaes e herdamentos e con todos os outros seus dereytos jey-
ras e luytosas e pobraduras e ermaduras dos dictos casaes e de cada huu deles fazendo das
dictas cousas e de cada h6a delas toda sa propria e livre voontade pera todo sempre come
de seu herdamento proprio. E outrossy que a dicta Moor Furtada aja en sa partiçom o casal
de Pynho de Jusaao do dicto julgado en que ora mora Penalvo e o casal do dicto logo de Py-
nho de Susaao en que mora Lourenço Periz e pacigoos montados e manynhos e devesas e
testadas e outras proes e com todalas outras cousas que aos dictos casaes e herdamentos
perteençen e de dereyto devem perteençer per huus melhor poder auer e achar e con toda-
las rendas fruytos novos e novidades dos dictos casaes e herdamentos e com todolos outros
seus dereytos e jeyras e luytosas e pobraduras e hermaduras dos dictos casaes e de cada h6u
deles fazendo das dictas cousas e de cada h6a delas toda sa propria vontade pera todo sem-
pre come de seu herdamento proprio e as dictas dona abbadessa e Moor Furtada outorga-
rom e firmarom a dicta partiçom por boa e por igual a cada h6a das dictas partes e por sen
engano nenh6u e a ouuerom e outorgarom por firme e por estavel pera todo sempre e ou-
trossy quiserom e outorgarom e prometerom as dictas partes a nunca se chamarem a erro
nem a engano nen a uiirem contra a dicta partiçom per sy nem per outrem nem a torvarem
nem britaren per neh6a maneyra que qualquer das partes que contra esto veese e o nom
quisesse conprir e atender que peyte aa parte que o quiser conprir e aguardar mil libras de
pena a qual levada ou nom a dicta partiçam seja firme e duradoyra pera todo sempre. En
testemoyno desto mandarom a mim dicto tabbalyom que fezesse ende esta carta de par-
tiçom so meu sinal e outorgarom que a dicta dona abbadessa seelasse a dicta carta de par-
tiçom do seu seelo e do convento do dicto moesteyro os quaes seelos forom postos na dicta
carta de partiçom en presença de mim dicto tabalyom presentes e outorgantes a dicta dona
abbadessa e a prioressa e soprioressa e h6a peça de bõas donas monjas do dicto moestey-
ro. Feyto foy esto no dicto moesteyro d'Arouca viinte e tres dias do mes de Setenbro da era
de mil e seteenta e oyto anos. Os que presentes foram don Bartolameu procurador do dicto
a
monsteiro e Bernal Gonçalviz abbade de Sam Salvador d'Arouca e Gil Vaasquiz clerigo do
dicto moesteyro e Martim Meendiz oveençal do dicto moesteyro e Lourenço Stevez Ayras
Gonçalviz e Martim Cristovees homees do dicto abbade testemunhas. E eu dicto tabalyom

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d
a rogo e per mandado e per outorgamento das dictas dona abbadessa e convento e da dicta
Moor Furtada presente fuy e este stromento [sinal do tabelião] e outro tal semelhavel h6u do
outro com mha maão propria escrevi e en cada h6u deles meu sinal pugi en testemoyno de
verdade que tal he».
14 - 1367, Janeiro, 27, Mosteiro de S. Pedro de Cete - «Sabham [todos] que este prazo ui-
rem e [ouuirem] que Martim Martijnz abbade do moesteyro de Cetj e o Conuento desse lo-
gar fazemos prazo a uos Steuam Lourenço e a primeira molher que ouuerdes liidima duum
nosso Casal que auemos em Barros no julgado de Lousada [fregue]sai de san tome de Bi-
taraes so tal condiçon qie uos o aydej uagante de Lourenço martijnz uosso padre e que no[s
des]des cada ano de cabedal pam segundo iij modios e tres quarteyros feytos pela nossa
teeiga. Direitas tri .... quarteiro iij patos iij capoes? iiij galinhas xx ovos? ... de xij costas e du-
um ano lençom de bragal quando for o abbade p[...] uerdade fazer desly seruiço Coleita del
Rej E dardes cada ano vj puças? De vinho feytis per nosso moordomo e aduzerdes o pam e
o vinho e todolo dereyto ao moesteyro. Isto fezemos a uos por seruiço que de uos recebe-
mos conuem a saber por entrada xv maravedis e por N. J maravedi em? E disto nom ficou
nada por dar Ayades uos o dicto casal com todas sas perteenças e morar delos por uosas pes-
soas e serdes obedintes ao moesteyro com todos sues dereytos e as Luytodas pagadas assy
come de custome fiquem o Casal liure e in paz ao mosteyro e Se alguum ueer da nossa parte
ou da uossa que este prazo queira britar peyte quinhentos soldos de portugueses e o prazo
ualer feyto foy isto en Cetj. xviij dias andados de janeyro Ea Ma CCCa LXVIJ. Testemunhas
Domingos Piriz, cozineyro dos frades; Francisco alinteyro; Pedro furtado e outros. E nos ab-
bade e Conuento suso dictos que este prazo partido por abc mandamos fazer com nossas
maaos proprias o reuoramus».65

O que se deduz dos documentos. Os irmãos Rui Fernandes Furtado, Afonso


3.3 Fernandes Furtado, Fernão Furtado, Mor Furtado e Leonor Furtado, herdaram
bens e direitos que tinham pertencido a D. Afonso Rodrigues de Resende, «o Rem de Amor»,
senhor da honra de Resende, casado com D. Maior Pires Portugal (Quartela). Este D. Afonso
era filho de D. Rodrigo Afonso de Baião, o «Merda Seca» ou «Merda Assada», e de sua mu-
lher D. Maria Gomes da Silva, e neto paterno de D. Afondo Ermiges de Baião e de sua mu-
lher D. Urraca Afonso de Ribadouro, herdeira da honra de Resende, filha D. Afonso Viegas e
neta de D. Egas Moniz, o Aio, que fora senhor da dita honra.66
Estes bens foram herdados pela linha de Giraldo Afonso (de Resende), avô deles. Este Giraldo
Afonso, um dos quatro filhos do supracitado casal D. Afonso Rodrigues e D. Maior Pires, cujos
bens foram feitas partilhas em 29.12.1290, casou com D. Teresa Soares de Melo (Riba de Vi-
zela) e foram pais de Guiomar Afonso (de Resende), que genealogicamente é dada como mu-
lher de um Fernão Furtado, o que parece confirmar-se pelo apelido e patronímico dos cinco
irmãos, filhos de ambos.
Por outro lado, os supracitados irmãos Furtado herdaram bens na quintã de Pinho (Lafões),
pela linha de sua avó D. Sancha Pais de Agares, mulher de Martim de Freitas. Esta D. Sancha
Pais usa depois o chamadouro «de Paredes», com que aparece nomeadamente na manda,
certamente devido a ser senhora do casal de Paredes, que comprou a Tereza Fernandes, sua
prima-direita.
Pelo exposto, é certo que esta inquestionável avó D. Sancha Pais não podia ser avó mater-
na. O que significa que só poderia ser avó paterna, tendo casado em primeiras núpcias com
um Furtado, necessariamente pai do Fernão Furtado casado com Guiomar Afonso (de Re-
sende), progenitores dos irmãos Furtado. Este Fernão Furtado é portanto ascendente dos
Furtado de quem os genealogistas têm feito descender o Afonso Furtado, anadel-mor dos
besteiros do conto e capitão do mar. Portanto, Fernão Furtado não veio para Portugal,
como dizem essas genealogias tardias baseadas em Salazar y Castro. Era portu-
guês, documentalmente filho de uma portuguesa.
Cai assim por terra a tese castelhana. E nada nos aponta, ou sequer permite supor, que o
desconhecido pai não fosse também dos Furtado portugueses que, como vimos, desde o
séc. XII se documentam em Portugal, alguns inclusivamente referenciados na zona de Lafões.
Bem pelo contrário, parece irrecusável que se D. Sancha Pais de Agares tivesse sido casada
pela primeira vez com um Hurtado de Mendoça descendente do frater imperatoris, ou sim-
plesmente com um Mendoza de Alava, ou precisamente de Zaitegui, o insofismável parente
(certamente filho) desse seu virtual marido castelhano não figuraria no supracitado docu-
mento nº 1, de 1293, como escudeiro de Freitas. Nem tão-pouco esse desconhecido e por-
ventura breve 1º marido passaria tão despercebido, ao ponto de não deixar um único rasto
documental directo.
A mãe de Fernão Furtado, portuguesa das terras de Lafões, foi D. Sancha Pais de Agares ou
de Paredes, que parece filha de D. Paio de Agares, que identificamos com aquele que é men-
cionado no LL (Guedões/Bobadela, 30BA4) como pai de uma Marinha Soares de Agares, mu-
lher de Pêro Eanes do Monte, se bem que a irregularidade do patronímico desta Marinha nes-
ta época possa colocar dúvidas à filiação.
Tudo indica, inclusive o patronímico, que D. Sancha foi irmã de Rui Pais de Agares, que casou
com Mor Esteves, neta de Mem Gonçalves da Fonseca, proprietários em Pinho. Para que os
netos herdassem bens na quinta de Pinho esta D. Sancha teria de ser neta materna de Nuno
Peres, senhor da quintã de Pinho no início do século XIII, que doou casais ao mosteiro de
Santa Cruz de Lafões. Embora ainda insuficientemente documentada, esta ascendência da
mãe do Fernão Furtado (marido de Guiomar Afonso) surge como bastante consistente.
Mas que bases cronológicas dispomos?
Vimos no documento nº 1 que D. Sancha estava viva em Março de 1293 e que uma das teste-
munhas do mesmo era Estêvão de Freitas, cavaleiro, que julgamos poder identificar com o fi-
lho primogénito do seu segundo casamento. E que fez manda a 28.1.1309, tendo filhos e ne-
tos, deixando testamenteiro o dito seu filho Estêvão de Freitas e, além do prior, o cónego Es-
têvão Martins, seu primo-direito, parentesco contudo que lhe devia vir do 2º marido Martim
a
de Freitas, como se sabe de uma família que era senhora de Cete e padroeira do respectivo
mosteiro.
Na dita manda é ainda referida uma prima-direita, Tereza Fernandes, a quem comprou o ca-
sal de Paredes, prima essa que parece mais do seu sangue. Este documento, infelizmente,

37
d
não é propriamente um testamento. É uma «manda», sobretudo centrada nas condições do
seu sepultamento, nos bens de alma e certas doações a homens e mulheres que certamente
pertenciam à sua «criação». Não há portanto aí a divisão dos seus bens pelos filhos, que nem
sequer são referidos, com excepção de Estêvão de Freitas, mas apenas como testamenteiro
destas vontades de sua mãe. Não terá portanto existido um testamento e os seus bens foram
naturalmente partilhados pelos filhos, o que nomeadamente conduziu às partilhas que fazem
a 23.9.1340 sua filha e sua neta, ambas freiras em Arouca.
Temos também o referido escudeiro de Freitas chamado Martim Furtado, muito provavel-
mente um parente do seu 1.º marido, senão mesmo seu filho, mas natural ou de anterior ca-
samento, uma vez que não era filho de D. Sancha. Na verdade, parece mais um bastardo do
marido de D. Sancha, nascido cerca de 1265. E talvez fosse pai do Pedro Furtado que teste-
munha em 1367 em Cete, como se disse domínio dos Freitas, bem assim como de outros Fur-
tado, conforme se refere adiante.
Ora, sendo o filho primogénito do 2º casamento de D. Sancha o cavaleiro que testemunha
em 1293, parece aceitável que o primeiro marido, N…Furtado, tivesse morrido ao redor de
1270. Esta cronologia admite que o Fernão Furtado, filho do seu 1º casamento, fosse o mes-
mo Fernão Furtado que, em 1278, integrava o grupo dos jovens vassalos do infante D. Dinis.
Nascido ao redor de 1251/5, Fernão Furtado teria casado com Guiomar Afonso cerca de 1283.
Esta cronologia admite que o Rui Furtado, que em 1307 pediu a D. Dinis para serem feitas par-
tilhas (pelo menos a mãe já teria morrido), pudesse ter nascido cerca de 1276, sendo maior
e órfão pelo menos de mãe quando se iniciou o processo da herança de Resende.
Do conjunto da informação disponível é possível organizar a proposta de reconstituição
genealógica que segue.
Os Furtado co-herdeiros de Resende e Pinho

1 N..... Furtado, n. cerca de 1210/15, talvez o Fernão Peres Furtado que em 1237 testemu-
nhou um escambo entre o prior e clérigos de S. Cristóvão de Coimbra e Lourenço Soares
e sua mulher Domingas Peres, de certos bens situados nessa cidade. O nome e a sua presen-
ça na Beira são indícios a considerar. C. cerca de 1250 com D. Sancha Pais de Agares, que
depois casou com Martim de Freiras, c.g. Esta D. Sancha terá n. cerca de 1235, vivia já viúva
de Martim de Freitas em 1293 e fez «manda», tendo filhos e netos, a 28.1.1309. As partilhas
de seus bens, que fazem sua filha (do 2º casamento) e sua neta (do 1º casamento), ambas
freiras em Arouca, é só de 23.9.1340, mas terá falecido antes, pois em 1340 teria mais de
100 anos de idade. Esta Sancha devia ser irmã de Rui Pais de Agares que casou com Mor
Esteves da Fonseca, neta de Mem Gonçalves da Fonseca. A quintã de Pinho, em S. Pedro do
Sul (Lafões), que tinham os netos desta Sancha, é uma boa pista para a sua filiação. Com
efeito, a quintã de Pinho era nos princípios do séc. XIII de um Nuno Peres que doou vários ca-
sais ao mosteiro de Santa Cruz de Lafões.67 Deste foi filho sucessor João Nunes de Pinho.
Muito provavelmente, Sancha Pais, filha de um Paio (Soares?) de Agares, era neta materna
daquele Nuno Peres, e é por aí que seus netos eram co-herdeiros da quintã de Pinho. Tanto
mais que, como ficou dito, devia ser irmã do Rui Pais de Agares que casou com uma Fonse-
ca, estes também proprietários em Pinho. Fernão Peres Furtado, possivelmente este N... Fur-
tado, seria talvez filho ou sobrinho do bispo de Lamego (1211) D. Paio Furtado, que faleceu a
2.12.1246, do qual apenas se documenta que era filho de uma Maria Mendes, que vivia em
Soutelo do Douro, onde era proprietária. Devendo esta Maria Mendes ser casada com o Fer-
não Peres Furtado, filho de Pedro Furtado e sua mulher Marinha Gilibertiz. Deste N… Furtado
(talvez o referido Fernão Peres Furtado) devia ser filho (natural ou de um 1º casamento) um
Martim Furtado, escudeiro de Freitas, que testemunha em 1293 juntamente com Estêvão de
Freitas, como ficou dito. E deste Martim deve ser filho o Frei Álvaro Martins Furtado, da Or-
dem de Santiago, que testemunha em 1346 o testamento de Rui Martins Boi Louro, cavaleiro,
o Pedro Furtado que testemunha em 1367 em Cete, o João Furtado, que era cavaleiro da Or-
dem de Cristo em 1360, e ainda o Vasco Peres Furtado, cónego da Sé de Braga, que em 1369
testemunha o testamento de Senhorinha Anes, viúva do dito Rui Martins Boi Louro. A ser as-
sim, dado o patronímico deste Vasco Peres, indicaria que o foi buscar ao avô, como nesta
época já por vezes acontecia. E isto poderia significar que N… Furtado seria de facto o referi-
do Fernão Peres Furtado, documentado em 1237, o que sublinha a hipótese de ser neto de
Fernão Peres Furtado e bisneto de Pedro Furtado. O pai de N… Furtado (Fernão Peres Fur-
tado) seria assim um Pedro Furtado (como o avô), irmão do bispo, ambos filhos de Fernão Pe-
res Furtado e netos de Pedro Furtado e de Marinha Gilibertiz. Mas como este virtual Pedro
Furtado só se documenta indirectamente no patronímico de Fernão Peres Furtado, que aqui
identificamos como N… Furtado, permanece a hipótese de ser mesmo filho do bispo, que
a
assim lhe daria o nome e patronímico do avô.
1.1. Fernão Furtado (que nesta hipótese teria usado o prenome do pai), n. em Portugal cerca
de 1251, que terá fal. cerca de 1315. Deve ser o Fernão Furtado que a 1.10.1278 foi toma-
do para a Casa de Dom Dinis, como vassalo, com a soldada anual de 300 libras em panos.

39
d
C. cerca de 1280 c. Guiomar Afonso de Resende, que terá fal. antes de 19.8.1317, data
em que seu filho pede traslado das partilhas de seu avô materno. Guiomar era filha de Ge-
raldo Afonso de Rezende, falecido com partilhas de 3.2.1290, e neta paterna de Afonso
Rodrigues de Rezende, «o Rem de Amor», co-senhor da honra de Rezende, que já tinha
falecido em 1258.
1.1.1. Afonso Fernandes Furtado, n. cerca de 1275 e fal. antes de 16.1.1342, co-herdeiro da
quintã em Pinho (S. Pedro do Sul, Lafões), onde aparece como escudeiro a 23.6.1310.
Ainda era escudeiro a 19.8.1317 quando pediu traslado da partilha de 3.2.1290, feita
por morte de seu avô materno Geraldo Afonso de Rezende. Poderia ser o Afonso Fur-
tado que em 1329 era comendador de Messagena na Ordem de Santiago. No entan-
to é de estranhar que, a ser o mesmo e não um homónimo, os genealogistas ignoras-
sem a sua pertença à Ordem de Santiago. E a ser freire de Santiago como teria casa-
do em época anterior à autorização pontifícia que dispensou os freires do celibato?
Parece no entanto possível, se não estamos a incorrer em anacronismo, que tivesse
uma comenda sem ser freire, e como tal não figura no documento em apreço. Mas
o mais provável é que o comendador fosse seu sobrinho Afonso Furtado, refeferido
adiante. Afonso Fernandes Furtado c. antes de 18.11.1319 c. Maria Gonçalves de Mo-
reira, que já viúva, com sua filha Leonor, a 16.1.1342 obtêm do rei confirmação da
honra de Louredo, na terra de Panóias, que era de seu pai. Maria Gonçalves era filha
de Gonçalo Rodrigues de Moreira, fal. depois de 1290, senhor nomeadamente da
torre de Moreira, em Stª Mª de Moreira (Cabeceiras de Basto) e da aldeia de Vila Seca
e quintã de Sanfins do Douro, ambas no julgado de Panóias, e de sua 2ª mulher Maria
Martins de Leiria (Urgeses).
1.1.1.1. Leonor Furtado, n. cerca de 1320, que a 16.1.1342 teve com sua mãe a honra
de Louredo.
1.1.1.2. Senhorinha Afonso Furtado, n. cerca de 1321 e c. cerca de 1342 c. Estêvão Dias
de Avelar, n. cerca de 1317 e fal. depois de 1393, senhor de juro e herdade de
Povolide (10.12.1385), senhor de Avelar, etc.
1.1.1.2.1. Beatriz Esteves de Avelar, n. cerca de 1345, que instituiu capela em Bus-
telo e c. cerca de 1366 c. Gonçalo Pires Alcoforado, n. cerca de 1335,
senhor da honra de Alcoforado e padroeiro do mosteiro de Bustelo,
infanção padroeiro do mosteiro de Grijó (1365). C.g. conhecida.
1.1.2. Rui Fernandes Furtado, n. cerca de 1276 e fal. antes 9.1.1342. Escudeiro em 1310 e ca-
valeiro em 1321. Foi co-herdeiro da quintã de Pinho. Era escudeiro e talvez morador
no Porto quando, com seu irmão mais velho Afonso Fernandes Furtado, a 13.2.1320
requer traslado da partilha de 3.2.1290 feita por morte de seu avô materno Geraldo
Afonso de Rezende. Em 1322, D. Aldonça e D. Mor Martins de Rezende acertam he-
ranças com os seus primos Rui, Leonor e Mor Fernandes Furtado, comprando por 150
libras de ouro todo o direito que eles tinham aos bens de Afonso Rodrigues de Baião,
pela parte de seu avô Geraldo Afonso. Rui Fernandes Furtado c. cerca de 1307 c. Leo-
nor Martins, senhora da honra de Pedroso (Penafiel), filha de Martim Gil de Vilela e
sua mulher D. Inez Fernandes Leitão; neta paterna de Gil Martins de Ataíde, senhor
da honra de Vilela, e de sua mulher Elvira Anes Tenro, filha esta de João Pires Tenro,
senhor da honra de Perozelo, falecido depois de 1258, e de sua mulher Alda Martins
Botelho, já viúva de Fernão Raimundes «de Canedo».
1.1.2.1. Fernão Furtado, n. cerca de 1308, que era escudeiro quando a 9.1.1342 teve
confirmação da honra de Perozelo, em sucessão a sua mãe. Ele, a mãe Leonor
Martins, e o irmão Afonso Furtado, constam da lista de cavaleiros e escudeiros
naturais do mosteiro de Mancelos inserta no tombo que, em 1339, D. Afonso
IV mandou fazer ao corregedor Vasco Anes de Casais, publicada por Luís de
Mello Vaz de Sampaio. Vem solteiro no conde D. Pedro e de facto não deve ter
casado nem tido geração.
1.1.2.2. Afonso Furtado, com comedoria no mosteiro de Mancelos com seu irmão, con-
forme referido acima. Deve ser este o comendador de Messejana documenta-
do em 1329, o que sublinha a ideia de que não teve geração. Não é referido pe-
lo conde D. Pedro.
1.1.2.3. Inez Rodrigues, referida no conde D. Pedro, certamente a filha de Leonor Mar-
tins e irmã de Rui e Afonso Furtado que consta da lista de naturais do mosteiro
de Pedroso em 1363, sem que lhe apontem marido. Terá fal. solt.
1.1.3. Fernão Fernandes Furtado, n. cerca de 1279, documentado em Lafões a 23.5.1315.
Não terá tido geração.
1.1.4. Leonor Fernandes Furtado, n. cerca de 1281, que se documenta a 22.5.1322 casada
com Afonso Rodrigues. Documentada também a 22.1.1322. Ignoramos se teve gera-
ção.
1.1.5. Mor Fernandes Furtado, monja em Arouca. Co-herdeira da quintã de Pinho, doc. a
23.5.1315. Fez partilhas com sua tia do bens da avó paterna D. Sancha a 23.9.1340.
1.1.6. Gonçalo Furtado, referido pelo conde D. Pedro, que o diz s.g. Não se documenta.
1.1.7. Estêvão Furtado, referido pelo conde D. Pedro, que o diz s.g. Não se documenta.

a
41
d
4 A origem de Afonso Furtado
Os esquecidos Furtado de Loures, Frielas e Azóia. Paira sobre a ascendên-
4.1 cia directa do capitão Afonso Furtado a mesma imprecisão que já observámos a
propósito do entronque castelhano do alegado genearca Fernão Furtado. Não só ninguém
lhe documenta os pais, como o geral dos autores fá-lo casado com uma mulher de que se não
encontra rasto nas fontes primárias, ignorando um casamento que se encontra amplamente
documentado nas mesmas. Casamento esse de que, aparentemente, já não havia memória
na geração de netos e genealogistas que, todavia, o sabiam descendente por linha varonil do
mesmo Fernão Furtado de régia ascendência... Memória selectiva que o valoroso capitão-mor
não merecia.
O nobiliário quinhentista mais relevante para as famílias de corte deste período, o chamado
Livro de Linhagens do Séc. XVI, cujo autor se desconhece, mas que deverá ter sido compila-
do e redigido cerca de uma centena de anos após a morte do capitão Afonso Furtado, tem
um capítulo intitulado «titolos dos Furtados e Mendoças». Desde logo parece insólito o uso
de «titolos» no plural e do «e» a separar os nomes, ao contrário da fórmula utilizada no pará-
grafo anterior do «titolo dos Freyres de Andrade».
O título de «Furtados e Mendoças» deste nobiliário inicia-se com o capitão Afonso Furtado,
sem uma palavra sobre a sua origem e sem lhe nomear a mulher. O livro de Genealogias de
Damião de Góis, ligeiramente posterior, afina pelo mesmo diapasão, embora já com uma
confusa e prolixa introdução sobre os Hurtado de Mendoça castelhanos que se pretendem
ligar aos portugueses. O que equivale a constatar que, não obstante a posição des-
tacada que a família tinha já atingido, se desconheciam então as suas depois ale-
gadas origens reais.
Todavia, a maioria dos autores genealógicos posteriores, até à actualidade, não hesita em dar
este Afonso Furtado como filho de Fernão Furtado, senhor da honra de Pedrozo (ao qual não
nomeiam mulher), neto de Rui Fernandes Furtado e de sua mulher Leonor Martins (de Vilela)
e bisneto de Fernão Furtado e de sua mulher Guiomar Afonso (de Resende), de quem já nos
ocupámos.
Quer-nos parecer que a fonte onde foram beber esta "certeza" foi uma nota à margem du-
ma das versões do LL do conde D. Pedro. Falecido em 1354, D. Pedro terminou esta linhagem
em Fernão Furtado e seu irmão Afonso (alegado pai do capitão-mor do mar de D. João I), e
nas suas primas direitas, filhas de Afonso Fernandes Furtado. Mas, em nota à margem, pre-
sumivelmente do séc. XVII, provavelmente do punho do próprio Lavanha, pode ler-se:
«Deste Fernan Hurtado fue hijo, segun la mejor opinion, Alfonso Hurtado de Mendoza,
Capiam Mayor del mar.»

Registe-se que o autor da nota, que não está seguro do entronque, se escuda numa opinião
abalizada que não objectiva e acrescenta Mendonça a Afonso Furtado, quando nunca o do-
cumentamos usando o apelido composto, nem como tal aparece nas genealogias anteriores.
Alão de Moraes sublinha precisamente isto e cita esta mesma fonte ao escrever:
«João Baptista Lavanha, nas Notas ao Conde D. Pedro, plana 199, letra C, diz que, con-
forme a melhor opinião foi seu filho (de Fernão Furtado, senhor da honra de Pedroselo)
Afonso Furtado de Mendonça, que segue.»
Mas ao tratar deste último, acrescenta: «segundo outra memória seria filho 2º de Rui Fur-
tado, irmão deste Fernão Furtado». Retenha-se que, ao contrário dos outros genealogistas,
Alão de Moraes refere que o capitão Afonso Furtado fora casado com Maria Miguéis, como
o autor viu numa outra «cópia».
Já Braamcamp Freire é mais cauteloso ao escrever que «de Fernão Furtado, senhor da honra
de Pedrosêlo, parece haver sido irmão Afonso Furtado (o capitão mor do mar); pelo menos,
e isso é certo, a um Fernão Furtado e a um Afonso Furtado, irmãos, mandou D. Afonso IV
dar ração no convento de Mancelos», apoiando-se em frei Francisco Brandão para esta últi-
ma afirmação. Mas, ao identificar o Afonso Furtado, irmão de Fernão Furtado, com o homó-
nimo capitão-mor do mar, cai também num desses anacronismo que tão justamente critica.
Resumindo, sublinha-se que os genealogistas de Quinhentos ignoram a filiação do capitão do
mar. Dos investigadores posteriores, os mais cautelosos hesitam entre fazê-lo filho de Fernão
Furtado de Pedroso ou identificá-lo com um seu irmão Afonso, não estando Braamcamp se-
guro de que se trate dos dois homónimos que tiveram ração em Mancelos. Os genealogistas
modernos parecem ter optado por encerrar estas dúvidas, "estabelecendo" que o capitão
Afonso Furtado foi filho de Fernão Furtado de Pedroso.
Convém ainda não esqueçer que Alão teve acesso a uma memória onde Afonso Furtado é
dado, correctamente, como tendo casado com Maria Miguéis. Ou seja, a "memória" do ca-
pitão do mar não se tinha perdido tão completamente como poderíamos admitir. Pelo me-
nos alguns documentos conservavam dados correctos que mais ninguém viu. Ou mais nin-
guém quis aprofundar.
Mas o que dizem as fontes disponíveis? Vejamos:

1 - 1382. Relato da crónica de D. Fernando. Fernão Lopes, CDF, Cap. CXLII, pp. 79/80. Por
ocasião da prisão do mestre de Avis e de Gonçalo Vasques de Azevedo, no Paço dos Estaus,
à Praça Grande (junto à actual praça do Giraldo) em Évora, Afonso Furtado, escudeiro e ana-
del-mor aproximou-se do mestre e disse-lhe:
«Senhor um grande e bom quando é preso, não o é senão por grande coisa; e posto que
vós não saibais porque sois preso e entendeis que o sois sem causa, parece-me bem que
não aguardeis o fim deste feito. Vós sabeis bem como el rei D. Pedro vosso padre me cri-
ou e pôs em estado e me deu tudo quanto hei e ainda que eu de el rei D. Fernando, vosso
irmão, recebesse muitas mercês, mais tenho e sou a amar mais as coisas de el rei vosso
padre e pôr o corpo e quanto eu tenho por elas; maiormente por vós, que sois seu filho»,
a
etc.
2 - 1339. Na «Colecção Genealógica» do Padre Manuel Betancourt (BNL, Mss. 1343-6), já
publicada por Luís de Mello Vaz de São Payo (As Distracções de D. António Caetano de Sou-
sa, in Armas e Troféus, IV série -Tomo I - , Lisboa, 1979, p.41), há uma lista que D. Afonso IV

43
d
teria mandado fazer dos naturais do mosteiro de Mancelos, pelo corregedor Vasco Anes dos
Casais, onde estão agrupados em ricos-homens e ricas-donas (12), infanções e infançoas
(131) e cavaleiros e donas donzelas (214). Entre os cavaleiros e donas donzelas pode ler-se:
«122-4 Leonor Martins, mer que foi de Rui Furtado e Fernão Furtado e Afonso Furtado
seus filhos; esta parece ser f.ª de Martim Regadas era f.º de Martim Gil Vilela».
3- 1363, Fernão Furtado, sua irmã, e Leonor Martins sua mãe, constam de uma lista de natu-
rais do mosteiro agostinho de Pedroso.68

O capitão-mor não era dos de Pedrosêlo. Da análise do primeiro texto que


4.2 ficou atrás, deduz-se que Afonso Furtado, criado por D. Pedro I e a quem este deu
estado, terá nascido aproximadamente entre 1347 e 1348, no preciso momento em que a
peste negra chegou a Portugal, com todas as suas consequências de desestruturação da so-
ciedade e mobilidade acrescida das famílias e dos indivíduos.
O Afonso Furtado de 1339 não era, nem podia ser, como vimos, o homónimo capitão-mor
de D. João I. Braamcamp já fala com dúvida («parece») desta identificação, dando contudo
como certa a informação de frei Francisco Brandão, segundo a qual aquele Afonso Furtado
tinha com seu irmão comedoria no mosteiro de Mancelos, informação que tem certamente
origem em Manuel Betancourt.
É certo que Rui Fernandes Furtado, já referido no n.º 2 supra, casou com Leonor Martins e,
como se diz na dita lista, já tinha morrido em 1339. Este casal teve, pelo menos dois filhos e
uma filha. Fernão Furtado, certamente o primogénito porque vem em primeiro lugar na lista
de Mancelos, sendo escudeiro obteve a 9.1.1342 sentença favorável aos privilégios inerentes
à honra de Pedrosêlo (Pedroso), por ele então possuída e que se situava na freguesia de San-
ta Maria de Pedrosêlo, no julgado de Penafiel de Sousa. Esta honra de Pedrosêlo provinha de
uma quinta que fora de João Pires Tenro e, em 1290, ao tempo das Inquirições de D. Dinis, era
possuída por Alda Martins (Botelho), viúva daquele cavaleiro, com o qual tinha casado em se-
gundas núpcias.
Em 14.1.1342, quando se publicaram as sentenças de D. Afonso IV, a quinta estava repartida,
pelo menos, entre Fernão Furtado e Beringeira Anes, viúva e herdeira no prédio de Fernão
Vasques Peixoto.
Este Fernão Furtado havia-a herdado por sua mãe, Leonor Martins, possível filha de Martim
de Regadas, segundo a opinião de Manuel Betancourt, mas seguramente neta de Gil Eanes
de Ataíde (dito de Vilela) e de sua mulher D. Elvira Anes, esta última filha de João Pires Tenro
e de Alda Martins, acima referidos. Alguns nobiliários fazem-no casado com uma Isabel Osório
que, por contágio, também aparece referida como mulher do capitão-mor Afonso Furtado.
De Afonso Furtado, seu irmão, constatamos apenas que já não é referido em 1363 em Pedro-
so, como também não o são as hipotéticas mulheres e filhos de qualquer um dos fi-
lhos de Leonor Martins.
Os bens de Penafiel, que eram de Rui Fernandes Furtado, parecem ter ficado todos para os
Alcoforado. Com efeito, Senhorinha Afonso Furtado, filha de Afonso Fernandes Furtado e de
Maria Gonçalves de Moreira (portanto sobrinha de Rui Fernandes Furtado e de sua mulher
Leonor Martins) casou, cerca de 1342, com Estêvão Dias de Avelar, senhor de juro e herdade
de Povolide (12.10.1385) e de Avelar. Deste casal nasceu Beatriz Esteves de Avelar, sobrinha-
-neta do dito Rui, e casada com Gonçalo Pires Alcoforado. Esta Beatriz Esteves de Avelar, que
instituiu uma capela em Bustelo cerca de 1366, era muito herdada em Penafiel, sem que se
perceba donde lhe vinham esses bens a não ser dos primos Furtado, que teriam morrido sem
geração.
E, como vimos, Afonso Furtado já tinha falecido em 1363, sem geração, pois não aparece em
Pedroso, nem ele nem descendência. E o mesmo acontece em relação a seu irmão Fernão,
que nas mesmas listas não surge nem com mulher nem com filhos.
A irmã referida em Pedroso é certamente a Inês Rodrigues mencionada pelo conde D. Pedro,
que não aparece em Mancelos em 1339, ou por ser ainda demasiado nova ou por falha na
cópia de Manuel Betancourt. Em Pedroso, em 1363, já surge a referência a «uma filha», sol-
teira pois não lhe é indicado marido, que assim deve ter permanecido, pois não há notícia de
nenhum casamento.
Em suma, não é de supor, bem antes pelo contrário, que qualquer destes irmãos tivesse
tido descendência. O que, conjugado com o facto de não se conhecerem herdamen-
tos que o capitão Afonso Furtado pudesse ter recebido por esta linha, nos faz concluir
que o capitão-mor do mar de D. João I não descendesse nem de Fernão Furtado de Pê-
roselo nem do seu irmão Afonso Furtado, mas sim dos Furtados de Loures, onde era
proprietário, e surge em conexão com Pêro Afonso Furtado, de Frielas.

Os Furtado da Estremadura portuguesa. Fernão Furtado, seu irmão Afonso


4.3 e sua irmã terão nascido entre 1308 e 1320. Em 27.5.1329 encontra-se documen-
tado em Alcácer do Sal, no capítulo geral da Ordem de Santiago, um Afonso Furtado, comen-
dador de Messejana.69
Em limite, podia tratar-se do Afonso Furtado, irmão de Rui Fernandes Furtado, mas isso não
parece muito aceitável, sobretudo porque este comendador devia ser freire da Ordem de
Santiago, portanto não casado, nem podia ser viúvo pois sua mulher sobreviveu-lhe. Por ou-
tro lado, o comendador podia ser o Afonso Furtado que aparece, entre os cavaleiros, na lista
de Mancelos de 1339, o que apontaria o seu nascimento o mais tardar para 1309.
Contudo, um Afonso Furtado surge em 2.2.1346 70, conjuntamente com um Álvaro Furtado,
freire da Ordem de Santiago, quando ambos testemunham uma compra efectuada por Fer-
não Rodrigues Pacheco, prior da igreja de Santa Maria da alcáçova de Santarém e cónego de
Lisboa. O que de alguma forma indicia que fossem próximos, muito provavelmente irmãos,
tanto mais que este Afonso Furtado deve ser o comendador na mesma ordem. Poderiam ser
a
filhos de Leonor Fernandes Furtado, n. cerca de 1281, que se documenta a 22.5.1322 casa-
da com Afonso Rodrigues?
É que este Álvaro Furtado parece ser o que a 16.1.1342 testemunhou a confirmação da hon-
ra de Louredo a Maria Gonçalves de Moreira, viúva de Afonso Fernandes Furtado e a Leonor

45
d
Furtado, filha de ambos.
Mas também poderá não ser, pois documenta-se 71 um Álvaro Martins Furtado que testemu-
nha a 24.5.1346 o testamento de Rui Martins Boi Louro, cavaleiro, e um Vasco Peres Furtado
que a 4.4.1369 testemunha o testamento de Senhorinha Anes, a viúva do dito Rui Martins Boi
Louro. Estes dois Furtado, claramente ligados, parecem irmãos, apesar de usarem diferentes
patronímicos, o que nesta época já acontece. O certo é que Álvaro Martins Furtado parece
filho daquele Martim Furtado, escudeiro de Freitas, que testemunha em 1293 juntamente com
Estêvão de Freitas, como ficou dito. Se Vasco Peres Furtado também é filho deste Martim,
isso significa que o avô teria usado o patronínico Peres. E se Martim Furtado era filho natural
(ou de um 1º casamento) do desconhecido marido de D. Sancha Pais de Agares, como tudo
indica, então é provável que este desconhecido marido fosse Peres Furtado. Ou Vasco, como
o neto que lhe seguiu o patronímico, ou Fernão, como o filho que teve de D. Sancha. O que
nos remete quer para o Fernão Peres Furtado documentado em 1237, que apontámos como
o possível marido de D. Sancha, quer para seu avô homónimo, filho de Pedro Furtado e Ma-
rinha Gilibertiz.
Mas tudo isto é muito condicional. Tanto mais que ainda aparece um Rui Furtado, escudeiro,
referido em data posterior a 1397:
«A 6 do dito mês (Março de 1397?) Rui Gonçalves chegou onde chamam a Murteira (t
de Tomar) e, em nome de Vasco Martins Leitão, de quem é procurador, tomou posse de
uma vinha que aí está, que lhe foi mostrada por João Afonso Gamito, morador na vila de
Tomar, que estava presente, o qual disse que fora do dito Vasco Martins (Leitão) e que a
trazia a terço. Esta vinha confrontava de uma parte com Rui Furtado, escudeiro…» 72
E há o Rui Furtado, integrado no conto plebeu, uma vez que sofreu pena infamante. Trata-se
do Rui Furtado, um dos matadores de Lopo Fernandes, que por esse homicídio foi enforca-
do.73
O certo é que as transacções efectuadas por aquele prior de Santa Maria da Alcáçova vão-
-nos permitir reconstituir um núcleo de Furtados que não consta das genealogias desta linha-
gem. Mas permanece em aberto uma hipótese de ligação entre os Furtado de Alenquer/Lou-
res e os de Resende e Pinho, embora, com a documentação conhecida, não seja admissível es-
pecular sobre a natureza da mesma, tanto mais que os Furtado de Loures se documentam cer-
ca de duas gerações antes dos Furtado de Pinho/Resende.
Regressando a Santarém, no mesmo ano e mês do documento que acima referimos, a 18 e 21
de Maio 1346 74, um Afonso Álvares, criado de Afonso Furtado (que julgamos poder identi-
ficar com segura probabilidade com o Afonso Furtado que testemunhou, meses antes, a outra
transacção em Santarém) compra por 300 libras em dinheiro português os bens que Estêvão
Anes Espinho e sua mulher Constança Domingues possuíam em Santiago de Tremes, termo
de Santarém.
Mas este criado de Afonso Furtado não passava de um intermediário, uma vez que se docu-
menta, apenas uma semana mais tarde (24.5.1346) 75 o instrumento de posse dado por Afon-
so Álvares, criado de Afonso Furtado, a Fernão Rodrigues, prior da igreja de Santa Maria da
alcáçova de Santarém, daqueles mesmos bens comprados a Estêvão Anes Espinho e sua mu-
lher. E sucede que neste instrumento de posse figura, como testemunha, um Domingos Lou-
renço, de Azóia.
Parece evidente, neste contexto, que o Domingos Lourenço, identificado como morador em
Azóia em 1346, seja o mesmo Domingos Lourenço casado com Maria Anes Furtado, ambos
moradores em Santa Iria de Azóia, aos quais anos antes, em 17.11.1334, o arcebispo de Braga
D. Gonçalo Pereira passara uma procuração relativa ao emprazamento de uma propriedade
que tinha em Vale de Caves, a que chamam a Atougueira.76
Não restam assim dúvidas sobre a existência de outros Furtado, ignorados pelos genealogis-
tas, que mantinham estreitas relações com Fernão Rodrigues (Pacheco), prior da igreja de San-
ta Maria de Alcáçova, em Santarém, e cónego de Lisboa, o mesmo que, em 1353, tinha um
escudeiro chamado Diogo Furtado.77
De registar que há uma ligação deste prior, documentado como irmão de Lopo Fernandes
(Pacheco), com a região de Lafões (actual Vouzela) na qual viveu D. Sancha Pais de Agares,
bem como Martim Furtado, escudeiro de Freitas. É o que se depreende da carta de venda
que fez em 5.6.1345 Fernão Rodrigues, prior da igreja de Santa Maria da alcáçova, em San-
tarém, a Estêvão Coelho e sua mulher Senhorinha Afonso, de toda a herdade que tinha da
banda de Valadares, documento que se conservava em S. Cristóvão de Lafões.
Seria tentador admitir que existisse uma relação anterior, estabelecida nas terras de Lafões,
entre este prior e o novo ramo de Furtado de que temos vindo a referir diversos membros. E
mesmo concluir que, atenta a origem geográfica comum e a coincidência do apelido, estes
últimos seriam parentes próximos dos de Resende e Pinho. Mas Valadares (freguesia de S. Pe-
dro do Sul) está documentada como pertencendo integralmente nesta época ao mosteiro de
S. Cristóvão de Lafões. Nesta situação, a posse de uma herdade por parte do cónego e prior
Fernão Rodrigues (Pacheco) não tem valor genealógico que permita estabelecer uma cone-
xão com os de Pinho. Fernão Rodrigues não teria assim a raiz da herdade, mas apenas direi-
tos de prazo, ou domínio útil, que teria vendido, assim se compreendendo que o instrumen-
to de venda tivesse ficado no tombo do mosteiro. No entanto, existe outra explicação para
que o documento acabasse por ir parar ao tombo de S. Cristóvão de Lafões. Essa explicação
compromete a hipótese de que Fernão Rodrigues detinha apenas o domínio útil da herdade.
E reside na hipótese dessa propriedade integrar um núcleo de bens que o comprador (Es-
têvão Coelho) acabaria por doar ao mosteiro de S. Cristóvão de Lafões. Mas, a haver ligação,
porque motivo as fontes genealógicas que se ocuparam, com alguma minúcia e fidelidade,
da descendência de Fernão Furtado e de sua mulher Guiomar Afonso, ignoraram este ramo?
É uma pergunta a que não sabemos responder sem admitir que possa ter-se verificado um
esquecimento voluntário.
Como quer que seja, é possível proceder ao levantamento de outros Furtado relacionados
com aqueles que se documentam em Santarém e, expressamente, com o capitão-mor Afon-
a
so Furtado. Trata-se dos Furtado que, documentadamente desde 1202, residiam nas zonas
contíguas de Alenquer e de Loures (Frielas, Azóia e Lumiar) e que já afloramos ao referir o Do-
mingos Lourenço, marido de Maria Anes Furtado, e Domingos Godins, dito Furtado, e seu fi-
lho Vasco Domingues.

47
d
Ora, a 5.6.1334 residia em Frielas (Loures) um Vasco Domingues, dito Furtado 78, que foi tes-
temunha de uma carta de venda nas casas de Gomes Peres, tabelião.79 Parece tratar-se do
filho de Domingos Godins, já referido.
É de salientar ainda que existia nesta época em Frielas um paço real onde D. Dinis erigira em
1313 a capela de Santa Catarina, com capelão e missa quotidiana. Nesta residência habitaram,
embora por curtas temporadas, D. Dinis, D. Afonso IV, D. Pedro I e D. Fernando I, em cujo rei-
nado e durante a primeira guerra Fernandina (1369) foi incendiado pelas tropas castelhanas.
S. Julião de Frielas, Santa Iria de Azóia e, de certo modo, o Lumiar, eram no século XIV po-
voações muito próximas, situadas a NO do casco urbano de Lisboa, na zona de Loures. E na
Estremadura é possível inscrever um quadrilátero limitado a Noroeste por Torres Vedras, a
Nordeste por Alenquer, a Sudueste por Sintra e a Sudeste por Lisboa. O rio Tejo, que acom-
panha a orla Leste deste espaço, penetrava neste período profundamente no interior, como
em S. Julião do Tojal, junto a Frielas, ancoradouro natural que escoava os excedentes cere-
alíferos estremenhos e ribatejanos e, em parte, na baixa de Loures, criando o então chama-
do «mar de Loures». Aqui as águas do rio misturavam-se com as águas salgadas do mar, per-
mitindo a criação de salinas que estavam na base de uma das mais importantes exportações
portugueses da alta Idade Média.80 Pelo solo fértil e carregado de aluvião do longo vale que
separava Loures de Frielas passava um dos itinerários Lisboa-Alenquer que ligava a capital ao
norte do país. Tratava-se de um dos eixos Norte-Sul mais frequentados desde o séc XIII até ao
XV, e Alenquer era um dos seus pontos de passagem obrigatória
Estamos em crer que, ao menos como hipótese, seja de contemplar a possibilidade de que
um ramo dos Furtado portuenses, distinto dos durienses, se tenha deslocado em direção a sul,
onde os encontramos radicados e, como alvazis, integrados na oligarquia concelhia de Alen-
quer, desde os primeiros anos do séc. XIII até 1263, e, uma geração mais tarde, se documen-
tam na Azóia e em Frielas.
Referimos no início deste trabalho João Furtado, o primeiro que encontramos, em Fevereiro
de 1202, a testemunhar, como alvazil, face à igreja de Santa Maria de Alenquer, a renuncia
que Domingos Peres fez de todo o direito que tinha na herdade de Alenquer. É extremamen-
te provável que se trate do mesmo alvazil João Furtado, de Alenquer, que em Junho de 1221
testemunha uma doação feita por D. Sancha. Neste caso, não parece excessivamente arris-
cado admitir que se trate de um parente próximo (pai, tio ou irmão) de um Pedro Furtado,
também alvazil de Alenquer, que em Dezembro de 1221 testemunha uma doação de D. San-
cha. Sendo que este Pedro, até pelo patronímico, podia ser pai de João Peres Furtado, tam-
bém alvazil de Alenquer, que em Junho daquele mesmo ano testemunha outra doação feita
por D. Sancha. E que de um destes descendesse esse outro alvazil de Alenquer, Martinho
Furtado, que a 21.4.1263 testemunha a doação que João Fernandes de Água Alta faz ao mos-
teiro de Alcobaça de uma herdade no braço do Camarnal, termo de Alenquer.
Por outro lado, encontramos a residir na Azóia o casal Domingos Lourenço e Maria Anes Fur-
tado em conexão com o Afonso Furtado, colaço do prior de Santa Maria da alcáçova de San-
tarém. Iremos documentar não apenas outro Furtado dessa zona e período, mas encontrá-
-lo explicitamente ligado ao capitão Afonso Furtado que, embora residisse em Lisboa, pelo
menos desde 1369, era proprietário no Lumiar antes que D. João I lhe doasse uma quinta nes-
se mesmo lugar.
1364, Janeiro, 7, Domingo, em Frielas, reguengo d'el rei - Na casa do dito João da Gaia
e sua mulher, que parte com Mem Agudo e com a rua da Corredoira, testemunhou Pedro
Afonso Furtado.81 De sublinhar que este João da Gaia pode estar relacionado com o Do-
mingos da Gaia que a 9.1.1303 derimiu com o mosteiro de Celas uma questão relaciona-
da com os moinhos que ele e sua mulher tinham mandado construir no Freixial, em Alen-
quer, onde documentamos prováveis antepassados de Pedro Afonso Furtado.82
1371, Dezembro, 28, na Corredoura (Loures) - Ante as casas de João da Gaia, «encou-
teiro»,83 marido de Sancha Martins Alão, filha de Martim Soares Alão, casal que também
residia em Canelas, testemunha Pêro Afonso Furtado, morador de Frielas.84
Três anos volvidos, a 14 de Setembro, o mesmo Pedro Afonso Furtado volta a testemunhar,
desta feita dentro das casas do mesmo João da Gaia, que actua como procurador de Álvaro
Afonso, alcaide de Loulé.85 E por ocasião da troca que faz um raçoeiro de S. Julião de Frielas
com outro de Santo Antoninho de Lisboa, testemunha Pêro Afonso Furtado, alvazil de Frielas,
e João Lourenço Sobradam, tabelião, criado de Afonso Furtado, vassalo del rei.86
1379, Janeiro, 7 - Diz-se: «perante Gil Afonso, alvazil de Frielas, João Lourenço Sobra-
dam, tabelião, criado de Afonso Furtado, anadel-mor e vassalo d'el rei ».87
1381, Fevereiro, 7, Frielas, em concelho - Perante Pedro Afonso Furtado e Lopo Afonso,
alvazis de Frielas, apareceu uma nota do testamento de Maria Afonso, mulher que foi de
Pêro Anes Perro, moradora que foi de Frielas, já falecida.88
Este conjunto de indivíduos de nome Furtado, todos a viver na região de Loures/Alenquer
desde pelo menos os finais do séc. XII, e muito ligados ao cargo de alvazail, podem ser todos
oriundos de um mesmo tronco.
Resta, finalmente, apurar o status destes Furtado de Loures e Alenquer. Fidalgos, não eram,
pois nenhum é, nos documentos, apresentado como tal. Ser um dos alvazis de Frielas ou Alen-
quer não é também sinal de destacada nobreza, antes participação nas oligarquias concelhias,
como aliás sucedia com alguns dos outros Furtado.
É certo que tinham «criados», ou seja, que tinham casa suficientemente rica para ter criação.
Mas isso não significa nobreza e muito menos fidalguia. O primeiro que se documenta como
escudeiro (o que aliás, só por si, não é sinal inequívoco de nobreza) é justamente o capitão
Afonso Furtado. Teria sido nobilitado por Dom Pedro, como de alguma forma sugere o texto
de Fernão Lopes? Ou a nobreza já lhe vinha do pai, que gozava de suficiente confiança régia
para integrar (em que posição?) uma "embaixada", como refere Azurara?

Uma grande figura esquecida. Afonso Furtado foi, como temos vindo a
4.4
a
referir, uma figura proeminente do reinado de D. João I, que os genealogistas
quase ignoraram e a historiografia praticamente esqueceu. O capitão-mor do mar, que supo-
mos nascido cerca de 1347/8, ainda no reinado de D. Afonso IV, terá privado de perto com
D. Pedro I, que lhe deu «estado». Pertenceu muito provavelmente a este ramo dos Furtado

49
d
de Loures, com os quais aparece documentalmente associado, e casou em Lisboa, onde teve
as suas casas de morada em S. Pedro de Alfama, ao redor de 1368, como se depreende do
documento 89 que a seguir se apresenta resumido:
1369, Junho, 12, Lisboa - Saibam quantos esta carta virem que eu João Fustel 90 vizinho
da cidade de Lisboa como procurador que sou de Afonso Furtado, escudeiro, vassalo
d'el rei e vizinho da dita cidade por poder duma procuração da qual o teor é o que adian-
te se segue E eu Maria Migéis mulher do dito Afonso Furtado, por mi(m) e em meu no-
me havendo e consirando serviço de deus e prol das almas do dito Afonso Furtado e de
mi(m) Maria Migueis fazemos livre e pura doação a qual mandamos que valha como do-
ação feita entre vivos, vel casi mortos deste dia para todo o sempre à igreja de S. Pedro
de Alfama da dita cidade de Lisboa na pessoa de vós João Lourenço prior da dita igreja,
e a vós João Domingues, raçoeiro dela E de um pardieiro que foi casa em que morou
Constança Afonso, já passada, que o dito Afonso Furtado e eu Maria Miguéis havíamos
na dita cidade, na freguesia da dita igreja nos paços que chamam do infante que parte
com pardieiros da igreja de S. Bartolomeu e com casas da dita igreja de S. Pedro e com
a rua publica (…) Á dita igreja em doação o dito pardieiro com todas as suas entradas e
saídas e direitos e pertenças com tal condição que o prior e os raçoeiros da dita igreja (…)
digam para sempre em cada um ano na dita igreja quatro aniversários pela alma do dito
Afonso Furtado e da dita Maria Miguéis E em estes dias que se seguem convém a saber:
começarão logo pelo dia de S. João Baptista, outro pelo dia do pão de deus (1 de No-
vembro), outro por dia de Natal e outro por dia de Páscoa logo seguintes E assi de aí em
adiante (…) por o dito dia convem a saber : dizerem senhas missas oficiadas em cada um
dos ditos dias per as almas dos sobreditos E outorgam que em a dita igreja e prior e be-
neficiados deala deste dia em diante pera todo o sempre hajam e logrem (…) e a ele e
em elhe e a quem lhe aprouver como de sua própria possessão. E obrigamos os bens do
dito Afonso Furtado e da dita Maria Miguéis defendermos e empararmos o dito pardi-
eiro de quem lho demandar cumprindo eles a dita confissão e o dito João Lourenço, pri-
or, e o dito João Domingues, raçoeiro, em ela tão somente residentes em este tempo e
em ela por nós e por os outros raçoeiros que depois de nós i forem. Louvamos e outor-
gamos as ditas coisas e cada uma delas e recebemos em nós o dito pardieiro com suas
cláusulas e condições sobreditas. E obrigamo-nos por nós e por eles. E obrigamo-nos a
dizer em cada um ano os ditos quatro aniversários na dita igreja e nos ditos dias pela gui-
za que dito é. Se não que em diante as (…) a salvo com as custas e despesas que per a
dita razão fizerdes e com 5 soldos cada um dia de pea sob o obrigamento dos bens da
dita igreja que para isto obrigamos. E logo o dito João Fustel mostrou uma procuração
feita e assinada por mim Gonçalo Domingues, tabelião de Lisboa da qual o o teor é: Sai-
bam quantos esta procuração virem que eu Afonso Furtado, escudeiro, vassalo d'el rei
morador e vizinho da dita cidade de Lisboa faço meu procurador João Fustel, morador e
vizinho da dita cidade e mostrador desta procuração que por mim e em meu nome possa
vender bens móveis e de raiz, receber os frutos novos e direitos e rendas deles e vindi-
mar e colher o vinho das minhas vinhas e entregar e o dar a qualquer pessoa que os eu
ou ele vendermos. E para arrendar emprazar e aforar e escambar os ditos bens e dar parte
deles a quem por bem tiver e com quaisquer condições quiser e obrigar os meus bens (…)
trautar e defender esses bens. E receber todalas dívidas que me devem e dar por quite e
por livre do que receber que consta desta doação, e les dar o que eu hei e daqui em diante
(…) com quaisquer pessoas e essas pessoas contra mim por qualquer razão e por qual-
quer cousa que seja perante El Rei e perante quaisquer juízes que qualquer desses feitos
devam conhecer e citar demandar defender dizer responder e pedir Receber compor e
prometer e jurar em minha alma qualquer juramento que em direito for conteúdo e lhe
for demandado e leixar a parte adversa. Se cumprir e filhar vogados e suestabelecer pro-
curador e os revogar quando quiser e depois da procuração é oficiada procuração asi
Sentenças ouvir protestar apelar aguarar seguir renonçar e submeter e dizer nos ditos
feitos todas as coisas à ordem do juiz como eu poderia fazer e dizer se por mi presente
fosse e fizesse e dissesse ainda que tais cousas seja mesteres especiais e eu o hei todo por
firme e estável sob obrigamento dos meus bens que por esta obrigo relevando de acor-
dos encargos e satisfações como o direito quer. Feita procuração na dita cidade de Lis-
boa, nas casas de morada do dito Afonso Furtado 20 dias de Maio era de 1407. Tes-
temunhas Pêro Domingues corrector; Domingues Giraldes de (Tabaneez), João Anes do
dito logo, ortiz Sanchez de Bilbau, mercador, Vasco Afonso do Bombarral e Martim Anes
seu criado, Álvaro Gonçalves e outros
Foi este o primeiro documento respeitante ao futuro capitão-mor e anadel-mor Afonso Fur-
tado que conseguimos encontrar, a par do seguinte:
Lorvão, letra da segunda metade de Trezentos, não datado - Rol dos foros que pagam
ao vestiário do mosteiro de Lorvão. Item me deve Maria Nicolas, ama de Afonso Furtado
morador em Lisboa, de uma vinha que trás em Almada, 50 reis. 91
Esta Maria Nicolas deve ser a seguinte:
1345, Março, 24 - D. Pedro, prior, e o convento do mosteiro de S. Vicente de Fora em-
prazam a Domingos Fernandes «Salta Panascos» e a sua mulher Maria Nicolas, esta que
agora havedes, e a uma outra pessoa, casas na freguesia do dito mosteiro contra o paga-
mento anual ao hospitaleiro do convento de uma renda de 4 libras a pagar por dia de S.
João Baptista.92
Nas chancelarias de D. Pedro I e de D. Fernando I não descobrimos nada.
Afonso Furtado teria, em 1369, vinte e um ou vinte e dois anos e muito provavelmente seria
recém-casado. Apresenta-se como escudeiro e vassalo régio. É certo que, não tendo encon-
trado mercês régias anteriores a esta data, continuamos a ignorar o que se deve entender do
testemunho do mesmo Afonso Furtado quando afirma que D. Pedro I, de quem fora criado,
lhe deu estado. Ou seja: se os direitos e rendas referidos na doação supra, bem como as vi-
nhas (no Lumiar) igualmente mencionadas, lhe viriam por herança, dote ou doação régia. Re-
gressaremos a esta questão ao analisar a localização dos bens fundiários de Afonso Furtado.
a
Mas importa sublinhar desde já o carácter insólito da doação de 1369, uma vez que é feita
por dois jovens recém-casados que se ocupam de aniversários perpétuos por sua alma quan-
do estão na força da vida. Teria o casal, ou algum dos cônjuges, sido atingido por doença gra-
ve (peste?), o que se poderia inferir da expressão «doação entre vivos, vel quasi mortos»?

51
d
Ou teria Afonso Furtado passado procuração de plenos poderes a João Fustel, na qual se in-
cluía a gestão do seu património, antevendo uma ausência física prolongada e arriscada? É
que, meses depois, no âmbito da 1ª guerra fernandina, vamos encontrar Afonso Furtado e
Estêvão Vasques Filipe integrados no contingente comandado por Gomes Lourenço do Ave-
lar que em 1370 defendeu Ciudad Rodrigo contra as tropas castelhanas.93
As ligações entre Afonso Furtado e Estêvão Vasques Filipe (cuja mulher admitimos pudesse
ter sido sobrinha de Maria Miguéis, mulher de Afonso Furtado) seriam constantes 94 ao longo
da vida do segundo, que morreu muito antes do capitão do mar.
Voltamos a encontrar o casal Afonso Furtado/Maria Miguéis seis anos mais tarde:
1375, Novembro, 2 95 - Na cidade de Lisboa, e nas casas de morada de Afonso Furtado,
escudeiro, vassalo d'el rei e anadel-mor do dito Senhor no Reino de Portugal, ele e sua
mulher Maria Miguéis, moradores na cidade de Lisboa, dão em escambo a João Esteves
e a sua mulher Margarida Pires, moradores no Paço do Lumiar, todos os direitos e proprie-
dades que têm no dito lugar, onde chamam a Fonte Santa, recebendo em troca duas cou-
relas de vinha, forras e isentas, que João Esteves e sua mulher têm a par do dito lugar do
Lumiar, atrás das casas da dita aldeia, contra a Ameixoeira, que partem com Gil Anes, cam-
bador, com o Gago e com Barbara Peres. Testemunharam Lopo Taveira, anadel-pequeno,
e Gil Esteves Fariseu, escudeiro.96

Confirma-se assim que Afonso Furtado, certamente devido à sua participação nas guerras
fernandinas (alguns autores referem que terá comandado uma galé no desastre de Saltes),
foi nomeado anadel-mor dos besteiros do conto no reinado de D. Fernando I, antes do Ou-
tono de 1375. O que confirma o depoimento do próprio quando afirmava ter recebido mer-
cês de D. Fernando.
Supomos que as courelas de vinha escambadas com João Esteves se tenham vindo a juntar
às outras vinhas referidas na procuração de 1369, talvez no âmbito de uma política de em-
parcelamento de bens fundiários no Lumiar e Loures.
1381, Junho, 7 - Afonso Furtado, escudeiro e anadel-mor dos besteiros do conto nomeia
João Esteves «Mosca» porteiro dos besteiros do conto de Lisboa.97

No ano seguinte, em 1382, tem lugar o episódio ocorrido em Évora com o mestre de Avis, já
relatado atrás.
1383, Setembro, 12 - Afonso Furtado e Estêvão Vasques Filipe foram nomeados pelo con-
celho de Lisboa meirinhos encarregados do policiamento da cidade. O rei confirmou a no-
meação na data em epígrafe.98
Ainda nesse ano, após a morte de D. Fernando, estando em Alenquer a rainha D. Leonor Teles,
e receando perder o controle do castelo de Lisboa, falou com seu irmão D. João Afonso Telo,
que era alcaide-mor da cidade, onde tinha muitos e bons vassalos, tendo deliberado que lhes
dissessem para ocupar a fortaleza com os seus escudeiros. Foi enviado com essa missão Afon-
so Anes Nogueira, que também se encontrava em Alenquer e era vassalo de D. João Afonso.
Mas quando aquele chegou à capital foi-se dando conta que muitos daqueles com que devia
falar tinham já tomado partido pelo mestre de Avis. «E quamdo fallou com Estevam Vaas-
quez Philipe, desi com Affonso Furtado, e com Amtom Vaasquez, e outros boõs da cidade,
e os achou mudados do que cuidou que tiinha em elles, nom o quis dizer a mais. E foisse pê-
ra sua pousada, e corregeosse o melhor que pode, e lamçousse no castello pella porta da
treiçom, com huus dez ou doze escudeiros».99
Confirmava-se assim o preito de lealdade que Afonso Furtado tinha feito em Évora, um ano
antes, ao mestre de Avis. E certamente que o contributo de Estêvão Vasques Filipe e de Afon-
so Furtado, meirinhos responsáveis pelo policiamento de Lisboa, foi relevante durante a sub-
levação da cidade.
1384, Maio, 14 100 - Afonso Furtado, que comandava a galé Santa Clara, zarpou com a
flotilha enviada ao Porto, pouco antes do cerco de Lisboa, para a buscar reforços. Foi um
daqueles que Fernão Lopes 101 referiu como tendo desembarcado para participar no ata-
que às tropas galegas que sitiavam o Porto. Em seguida, a flotilha, onde também se en-
contrava Gil Esteves Fariseu (que encontrámos em 1375 a testemunhar o escambo de pro-
priedades no Lumiar), passou a correr as costas da Galiza, onde incendiaram navios, re-
ceberam resgates e atacaram povoações.
A 18 de Junho desse mesmo ano deparamos com Afonso Furtado, ainda na galé Santa Clara,
a tomar parte na batalha naval do Tejo que permitiu o abastecimento da cidade de Lisboa, con-
forme relata Braamcamp Freire. E a 27 de Agosto estavam as galés portuguesas encalhadas
na Ribeira, junto aos muros de Lisboa, como relata Fernão Lopes: «As gallees huas com ou-
tras jaziam bem juntas, e todas tiinham os remos varados, e cada huu fidalgo cuidando de
sua, nas quais sempre leixavam gemtes de rreguardo como melhor emtemdiam».
Nesta situação as surpreenderam as galés castelhanas que, protegidas por besteiros e batéis
com homens de armas, rumando para a praia, aproaram às portuguesas praticamente inde-
fesas, ferindo e fazendo debandar os poucos homens que as guarneciam. O mestre de Avis
acorreu ao combate, animando os reforços que com ele estavam a entrar nas galés e a defen-
dê-las. A crónica de D. João I destaca o seguinte episódio: «Huua gallee em que emtrou Af-
fomso Furtado jazia de traves e nõ ao lomgo; e duas gallees veherom por afferrar com ella;
e elle fez fazer bamda comtra terra, e a bamda comtra o mar estava alta, e as duas gallees
lhe derom com as proas no costado; e a gallee se deffemdeo mui bem, porque tiinha a bam-
da sobelles, e ferio assaz das outras gallees, e nom foi tomada».
A gratidão do mestre de Avis não tardou a manifestar-se.
1384, Outubro, 9 - Doação, em satisfação dos serviços prestados por Afonso Furtado
(por nos ajudar a defender que não caíssem estes reinos em sujeição d'el rei de Castela
querendo conhecer e galardoar ao dito Afonso Furtado com graças e mercês), de duas
quintas confiscadas a Gonçalo Vasques de Azevedo, na Ulmeira e na Telhada, e de uma
terceira, situada no Paço do Lumiar, que fora de Vasco Porcalho.102
Em Abril de 1385 Afonso Furtado participou nas cortes de Coimbra 103, e na sequência destas
a
Estêvão Vasques Filipe assumia o cargo de anadel-mor dos besteiros do conto, que manterá
até à sua morte, ocorrida em 1394, enquanto Afonso Furtado passa a ocupar o cargo de ca-
pitão-mor do mar 104. A partir de 1394, Afonso Furtado passará a acumular o cargo de capi-
tão-mor do mar com o de anadel-mor dos besteiros de conto.

53
d
Miguel Gomes Martins, no seu já referido trabalho sobre Estêvão Vasques Filipe, opina que
este último ofício apenas terá sido exercido nominalmente por Afonso Furtado, uma vez que,
na prática, teria sido desempenhado por Vasco Fernandes de Távora, sobrinho do mesmo
Afonso Furtado. Salvo melhor opinião, e considerando embora que em 1395 Afonso Furtado
se aproximava dos cinquenta anos, idade que, à época, dificultaria um pouco as deslocações
que julgamos inerentes ao exercício efectivo do cargo de anadel-mor dos besteiros, para
mais em acumulação com as funções de capitão-mor do mar, esta questão apresenta alguns
contornos pouco claros.
Antes do mais, se o sobrinho de Afonso Furtado vem inequivocamente referido como Vasco
Fernandes de Távora nas Ordenações Afonsinas, que são bem posteriores, nas fontes primá-
rias contemporâneas surge como Vasco Fernandes de Tavolla, o que está longe de ser a mes-
ma coisa, tanto mais que não há notícia de nenhum Távora com este nome e nesta época.
Esta família começa a evidenciar-se com um fidalgo alto-duriense chamado Pedro Lourenço
de Távora, que se distinguiu nas guerras fernandinas. Pedro Lourenço teve apenas dois filhos,
ainda relativamente jovens quando, já órfãos, em 1381 herdaram os senhorios que seu pai
tivera do rei D. Fernando. Destes dois irmãos, Rui e Pedro Lourenço, só o último teve gera-
ção do seu casamento com a herdeira dos Azambuja (filha do segundo casamento de João
Esteves, o Privado). Os filhos deste casal, nascidos após 1383, são bem conhecidos e não
usaram o patronímico Fernandes.
Admitimos que este Vasco Fernandes, portanto mais Tavolla (Tábua) do que Távora, pudesse
ter nascido de um desconhecido Fernão (...) e de uma irmã da 1.ª mulher do dito Privado. A
outra irmã seria Maria Miguéis, mulher de Afonso Furtado. Registe-se, em apoio desta hi-
pótese, que o companheiro de cargos e combates de Afonso Furtado, o já referido Estêvão
Vasques Filipe, tinha casado com a única filha do 1.º casamento de João Esteves, o Privado,
sem geração dela. É assim possível que Vasco Fernandes fosse sobrinho de Maria Miguéis,
mulher de Afonso Furtado e, por consequência, irrelevante para a clarificação da linhagem
dos Furtado. Mas também podia ter casado com uma sobrinha Furtado de Afonso Furtado,
sendo assim, na mesma, identificado como seu sobrinho.
Pelo texto das Ordenações Afonsinas 105 que transcrevem diplomas de D. João I, ficamos a
saber que em Novembro de 1410 este monarca nomeou Vasco Fernandes (aí de Távora),
referido como «nosso vassalo» e sobrinho de Afonso Furtado «Nosso Capitam e Anadel Mo-
or», e João de Basto, apontador e escrivão dos besteiros do conto. Nesse texto refere-se ex-
pressamente que «o Nosso Capitam e Anadel Moor sele com o seu selo» todas as cartas e
alvarás respeitantes aos besteiros do conto, e leve, do dito ofício, «todalas proees e derei-
tos».
De facto, pelo menos até 1410 (e por esta altura Afonso Furtado andaria já nos 63 anos),
parece arriscado deduzir que o seu exercício do cargo de anadel-mor fosse apenas nominal.
Talvez essa situação se tenha verificado a partir de 1417, ano em que D. João I mandou orga-
nizar um rol dos besteiros do conto, tarefa que Afonso Furtado, então com cerca de setenta
anos, apenas teria supervisionado.
1423, Junho, 23 - Nomeado Álvaro Vasques de Almada como «capitam moor da nossa
frota polla guiza que o era Gonçalo Tenreiro no tempo d'el rei D. Fernando e per guiza
que o foi Affomso Furtado em nosso tempo».
Desta nomeação conclui Braamcamp Freire que Afonso Furtado já tinha morrido. Embora
provável, esta dedução não é segura e liga-se com outra questão. É que Afonso Furtado de
Mendonça, o único filho legítimo do capitão Afonso Furtado que se documenta, parece ter
nascido cerca de 1411 ou 12, sendo certo que em Junho de 1436 já estava casado com a 1ª
mulher 106, e sendo seguro que faleceu em 1474 ou 75, teria portanto 63 ou 64 anos de idade.
Ora, na Chancelaria de D. Duarte está uma carta de 13.12.1433, na qual um tal João Martins,
almocreve, morador em Pedrógão Grande, que tinha o ofício de porteiro dos besteiros do
conto, cargo para que pedia e obteve confirmação, apresentando para tanto a nomeação
feita, no reinado de Dom João I, por «basco ferrnandez de tavolla, anadall moor que foj dos
beesteiros do conto em nome d afomso furtado, asijnada per ell e aselada do seu seello».
Desta carta, expressamente referida como do reinado de Dom João I, não se faz contudo
referência à data.
Confirmando-se assim a informação (posterior) das Ordenações Afonsinas, não se consegue
porém confirma a data de 1410 aí referida. Por outro lado, sendo certo, como se documen-
ta na citada confirmação de 13.12.1433, que Vasco Fernandes de Tavolla já então não ocupa-
va (interinamente) o cargo, fica-se também sem saber quando deixou de o fazer. É certo que
Afonso Furtado de Mendonça, filho do velho capitão Afonso Furtado, já ocupava este cargo
justamente em Novembro de 1433, mas não aparece antes desta data. Como terá nascido
em 1411 ou 12, é de aceitar que Afonso Furtado de Mendonça só tenha assumido o cargo com
pelo menos 21 anos de idade, ou seja, em 1431 ou 32, e que até então, desde 1410, se man-
tivesse interino Afonso Fernandes de Tavolla, tanto mais que não há outra nomeação para o
cargo.
Embora seja conhecido, mas tem sido mencionado fora do contexto, convém recordar que
em 1444 se avizinha a ruptura, consumada em 1445, entre o regente D. Pedro e o seu meio-
-irmão D. Afonso, conde de Barcelos e 1.º duque de Bragança. E é apenas em 14 de Abril
desse mesmo ano, num período em que se testam fidelidades, e contam as lanças, que o re-
gente entende oportuno "regularizar" a situação do anadel-mor dos besteiros do conto.
«D. Afonso etc…a quantos esta carta virem fazemos saber que nós contando fazer gra-
ça e mercê a Afonso Furtado de Mendonça anadel-mor dos nossos besteiros do conto
hemos por bem e damos-lhe que tenha e haja de nós desde o 1.º de Janeiro que agora
foi desta presente era, e de agora em diante em cada um ano com o dito ofício de tença
2571 reais brancos e uma peça de (pano) de Chipre outro tanto como seu padre que seu
ofício havia e mandamos pagar em quartos do ano e o dito aufira em toda a nossa alfân-
dega em cada hum ano ser dado da nossa fazenda. E porém mandamos ao vedor da
nossa fazenda e escrivão e a outros quaisquer que disto houverem de ver que em cada
um ano será dada para que lhe paguem o dinheiro e o pano».
a
Não restam dúvidas de que, não obstante Afonso Furtado de Mendonça exercer, ao menos
nominalmente, o ofício há mais de onze anos, só nessa ocasião foi julgado oportuno regu-
larizar a situação.

55
d
Não sendo fácil distinguir nas fontes primárias o capitão Afonso Furtado do seu filho homóni-
mo, que só em 1435 surge documentado como Afonso Furtado de Mendonça, parece certo
que o velho capitão já tinha falecido em 1433 (se vivesse teria então cerca de 86 anos de
idade, tendo em conta o nascimento estimado em 1347), pelo que tem de ser o seu filho o
Afonso Furtado anadel-mor dos besteiros do conto referido numa carta de privilégio 107 de
D. Duarte de 21.11.1433 para os moradores de uma herdade do termo de Santarém, chama-
da Vila de Rei, de que era proprietária Catarina de Bairros.
Regressando à carreira do capitão Afonso Furtado, no ano imediato ás cortes de Coimbra va-
mos documentá-lo a 25.6.1386, logo após a assinatura do tratado de paz e amizade com a
Grã-Bretanha (9.5.1386), comandando uma frota de naus e galés de Lisboa que zarpou com
destino a Plymouth, onde John of Gaunt, duque de Lencaster, embarcou duas mil lanças, três
mil besteiros e muita peonagem com destino à Cornualha, onde os aguardava Lourenço Anes
Fogaça, e depois à ria de Betanza, na Galiza, e à Corunha.108 Quando o duque chegou ao
Tejo, Afonso Furtado fazia parte da comitiva com que D. João I o foi receber. Preparava-se o
tratado de aliança de Novembro de 1386 e o casamento com D. Felipa de Lencastre.
1387, Maio, 27 - São referidas nas confrontações dum instrumento de emprazamento do
mosteiro de Odivelas, propriedades do capitão Afonso Furtado na zona de Loures.109
Temos visto referido que o capitão teria sido agraciado pelo duque de Lencaster com o Livery
Collar. É inegável que esteve por mais de uma vez em Inglaterra e privou de perto com John
of Gaunt, cujas tropas transportou, ou ajudou a transportar, mas o certo é que aqueles que
têm referido essa mercê não indicam a fonte onde foram colher tal informação. Em contra-
partida, devemos ao investigador brasileiro Manoel César Furtado uma informação muito cu-
riosa: Afonso Furtado permaneceu em Inglaterra entre Novembro de 1388 e, pelo menos,
Junho de 1389. Desta feita não (apenas?) numa missão da coroa portuguesa, mas ao serviço
do rei de Inglaterra e por ele remunerado.
1389, Junho, 27 Southampton - Indenture, notarially attested, between William de For-
the, a Baron of the Exchequer, and others, and Alfonso Furtado, captain of the Portu-
guese galleys lately in the service of the King of England, wereby the said Alfonso ack-
nowledges the receipt from John de Thorp, collector of customs at Southampton, of wa-
ges, victuals & c. during the period from 1388, November, 1, to 1389, April, Southam-
pton.110
Mas o tratado de Windsor estipulava que apenas os primeiros seis meses de servico seriam
pagos pelo rei de Portugal, e todo o servico adicional das galés seria pago pelo rei de Ingla-
terra. Com base nesta clúsula, que nos foi ressalvada pelo mestre António Maria de Castro
Henriques, parece legítimo admitir que Afonso Furtado se encontrasse em Inglaterra pelo me-
nos desde seis meses antes da data indicada
A 25.10.1390 o rei legitima Fernando, Fernão e Rodrigo, filhos de Afonso Furtado, capitão-mor
de Portugal (sic), havidos respectivamente em Marina Gonçalves, Catarina e Maria Gonçal-
ves, solteiras, durante a constância do seu matrimónio com Maria Miguéis .111 Registe-se que
a legitimação régia, em geral, colocava os visados em pé de igualdade com os outros her-
deiros quanto à sucessão de bens.112
De um destes filhos legitimados deve ser neto o Afonso Furtado, escudeiro, morador na vila
de Ourém quando a 12.4.1473 foi nomeado juiz das sisas desta vila, dizendo-se na nomea-
ção que já ocupara anteriormente este cargo, o que revela que já não seria novo. E talvez
também o João Furtado, publico tabelião em Évora, documentado em 8.11.1497.113
Daquela Catarina (hipoteticamente a Catarina de Bairros senhora da quinta de Vila de Rei, no
termo de Santarém cujos moradores receberam carta de privilégio em 1433) dizem alguns
que seria filha Catarina Furtado de Mendonça, 3ª mulher de Bartolomeu Perestrelo, 1º capi-
tão donatário da ilha do Porto Santo, o que não seguimos, como adiante se verá.
Meses depois, em 8.8.1391, o monarca fazia doação temporária da lezíria de Alfirmara a
Afonso Furtado.114 Na investigação efectuada, que certamente não despistou senão uma
parcela da documentação relativa ao capitão Afonso Furtado existente nas fontes primárias,
só o voltamos a encontrar quatro anos depois.
1395, Novembro, 19 - No mosteiro de Odivelas, em cabido, a abadessa D. Aldonça Pi-
mentel e o convento desse mosteiro emprazaram por três vidas a João Peres, clérigo, mo-
rador na freguesia de Loures, uma série de propriedades. Uma das courelas emprazadas
jazia onde chamavam a Carreira das Cabras, e partia por todos os cabos com Afonso Fur-
tado, enquanto outras confrontavam com Vasco Domingues. Recorde-se que já mencio-
námos um Vasco Domingues, dito Furtado, a residir em Frielas (Loures) em 1344. Pode
tratar-se de simples coincidência, mas o facto de se tratar da zona de Loures permite pen-
sar que se trata do mesmo.
Constata-se que, até agora, os bens fundiários do capitão se concentravam no Lumiar, na zo-
na de Loures, e no Ribatejo, sendo que estas últimas parecem ter-se ficado a dever, ao me-
nos parcialmente, a doações régias. A estes núcleos será necessário acrescentar proprieda-
des urbanas nas freguesias de S. Pedro de Alfama e na da Sé.
Registe-se que, em toda a documentação estudada, não encontrámos nem uma menção
que referisse bens em Pêroselo (ou Pedroselo, ou Pedroso ou Penafiel) ou em qual-
quer dos núcleos patrimoniais que terão pertencido aos irmãos Fernão e Afonso
Furtado, seus alegados ascendentes.
Trinta e dois anos após a data presumida do seu casamento, e contando cerca de cinquenta
e quatro anos, Afonso Furtado enviuvava.
1401, Agosto. Claustro da Sé de Lisboa - Perante o bacharel em degredos Afonso Anes,
vigário geral do arcebispo D. João, compareceram as partes a saber: Lourenço Gomes có-
nego da Sé e prior de Santo Estêvão, em nome da sua igreja, como autor, e Lopo Mendes
de Vasconcelos, comendador do mosteiro de Santos da Ordem de Santiago, em seu no-
me e da sua comenda, para dirimir um pleito sobre as dízimas e direitos da capela e ermi-
da de Santa Maria do Paraíso edificada «pêra os ditos tempos» na qual os fiéis faziam as
suas orações, ofereciam esmolas e alguns escolhiam para sua sepultura oferecendo ofer-
a
tas de pão, vinho e candeias. Tais ofertas levavam-nas a igreja e os seus beneficiados co-
mo de seus fregueses enterrados em sua freguesia … mais dizia (o prior de Santo Estê
vão) que no ano da era de 1439 (1401) foram levados à dita capela com o corpo da mu-
lher de Afonso Furtado, capitão, que aí fora enterrada, 50 cestos com pão, 50 almudes

57
d
de vinho e 50 «stadaees» de cera, e que essa oferta o comendador fizera embargar, tur-
vando e molestando a dita igreja sobre a sua posse. E pedia que por sentença se declaras-
se a dita ermida dentro da freguesia de Santo Estêvão, e que aquelas ofertas, no valor es-
timado de 2.000 libras, o real por 3,5 libras, lhe fossem restituídas.115
No ano seguinte a ter enviuvado:
1402, Fevereiro, 8 - D. João I voltava a recompensar o seu capitão-mor da frota e anadel-
-mor dos besteiros, doando-lhe em perpétuo umas casas em Lisboa, junto a outras que
Afonso Furtado possuía já na freguesia da Sé.116
Porventura as mesmas casas que seu filho Afonso Furtado de Mendonça viria a herdar.
1460, Julho, 11, na cidade de Lisboa - São referidas umas casas em Lisboa, freguesia da
Sé, cerca da praça dos Escanos, forras e isentas, que partem com casas de Fernão da Fon-
seca, genro «d'Armam Boutim», com casas da Sé, que trás Fernão Lopes, escrivão do
paço da madeira e detrás com pardieiros de Afonso Furtado e com a rua pública que vem
da Sé para S. João da Praça.117
1466, Setembro, 1, no mosteiro de Odivelas, em cabido - Emprazamento de umas casas
em Lisboa em que agora a dita Maior Vicente, que estão acerca de onde mora Pêro Ro-
drigues de Castro (que partem de uma parte com casas de Fernão da Fonseca e da outra
com a mulher que foi de Fernão Lopes e entestam detrás com Afonso Furtado e diante
com a rua publica.118
1404, Dezembro, 21 - Surgem, em confrontações contidas num traslado de 21.9.1459,
três marinhas de sal, situadas abaixo do Lavradio (Ribatejo), pertencentes ao capitão Afon-
so Furtado.
1409, Outubro, 15 - Acha-se referência a uma outra propriedade sua, situada por detrás
da igreja do Lumiar.119
1412, Dezembro, 15 - Testa no paço do Lumiar João Afonso de Lisboa, mestre da nau do
capitão Afonso Furtado. Não conseguimos apurar se esta nau era de "serviço", inerente
ao cargo de capitão-mor da frota, ou propriedade de Afonso Furtado.
1414, Abril, 3 - A última mercê régia registada na chancelaria de D. João I: a doação de
uma lezíria junto a Santa Maria de Valada (Ribatejo).120
Data deste período a missão de recolha de informações sobre a praça de Ceuta que D. João I
confiou a D. Álvaro Gonçalves Camelo, prior do Hospital, e a Afonso Furtado, capitão-mor do
mar. Admitida a hipótese de organizar uma expedição que tivesse como objectivo a conquis-
ta dessa praça norte-africana, era fundamental proceder sigilosamente à recolha de informa-
ções, de forma a não levantar suspeitas. O estratagema utilizado foi o de enviar uma embai-
xada com o propósito oficial de pedir a mão de Branca, rainha viúva da Sicília, para o infante
D. Pedro. Publicitado ao que iam, puderam as galés de Afonso Furtado fazer aguada em Ceuta
e proceder a um minucioso reconhecimento do ancoradouro e da praça. O episódio é bem
conhecido e, se nele nos detemos, é porque existem no relato que nos transmitiu Gomes Ea-
nes de Azurara elementos a ter em consideração.
Mas, preambularmente, algumas considerações sobre o mérito do texto em apreço. Da Cró-
nica da Tomada de Ceuta 121, escrita quase quarenta anos após os factos relatados, não so-
breviveu nenhum autógrafo do cronista, e em todos os manuscritos conhecidos se podem de-
tectar correcções e aditamentos. Não vimos esses manuscritos e, portanto, desconhecemos
se o episódio em análise foi objecto de rasuras e acrescentos. No entanto, uma apreciação su-
perficial do texto leva-nos a admitir que seja, globalmente, do punho de Azurara. O pendor
insolitamente profético das falas e da actuação atribuída ao capitão Afonso Furtado coadu-
na-se com o perfil do cronista sobre o qual escreveu Mateus Pisano, humanista e preceptor
do futuro D. Afonso V, dizendo que se tratava de um bom gramático, notável astrólogo e
grande historiógrafo. Mas esse mesmo pendor pode tê-lo levado a ampliar, distorcer ou mes-
mo recriar os eventos narrados. É pois com alguma reserva que aceitamos o teor encomiás-
tico da narrativa, sem todavia recusarmos que possa ter sido construído sobre eventos reais.
Deste texto interessa-nos reter que D. João I, após ter escutado as razões aduzidas pelos in-
fantes seus filhos em favor da expedição, considerou necessário fazer um levantamento pré-
vio das fortificações da praça de Ceuta, bem como dos ancoradouros e regime de ventos e
marés do seu porto. Nesta convicção e «consirando acerca disto quaes pessoas lá posso me-
lhor enviar, porquanto cumpre que sejam homens discretos e entendidos e taes que possam
bem todo prover segundo é necessário pêra tal caso, e não me parece que tenha outros,
que o melhor possam fazer, que o prior do Hospital e o capitão Afonso Furtado, a saber o
prior pera divisar a cidade e o capitão pera divisar o mar com todas as outras cousas que a
ele pertencem (…)».
É incontroverso que o capitão Afonso Furtado, que exerceu vitaliciamente o cargo de capi-
tão-mor do mar, gozava da confiança de D. João I nos assuntos respeitantes à marinharia,
mas também que era considerado pessoa capaz de se desempenhar de uma missão altamen-
te confidencial. Quer dizer que aliava a uma reconhecida competência técnica uma confian-
ça pessoal do monarca.
Não obstante a chefia da embaixada ter sido confiada ao prior do Hospital, Álvaro Gonçalves
Camelo, o capitão partilhou a responsabilidade de um sigilo de que nem os próprios membros
do Conselho régio tinham notícia, ou sequer suspeita, como expressa, sem margem para
ambiguidades, o cronista Azurara.
A intervenção de Afonso Furtado, na câmara real do paço de Sintra, quando chegou a altura
de apresentar o relatório da missão, suscitou a ironia do monarca português que, respon-
dendo ao pedido do prior do Hospital, aparentemente insólito, de areia, favas e fita (para fi-
gurar a implantação da praça de Ceuta e suas fortificações) lhe observou: «Cuidaes que não
temos aqui o capitão (Afonso Furtado) com as suas profecias».
Essas mesmas profecias sobre o destino manifesto da dinastia de Avis no atinente à expan-
são africana podem, em boa verdade, ter sido ampliadas e compostas já reinado de D. Afon-
so V, para se ajustarem ao papel providencial que a ideologia oficial assumiu desde D. Duarte.
a
Mas custa-nos aceitar que não tenham sido construídas sobre um esqueleto factual, ou des-
cartar liminarmente que Afonso Furtado não possa ter sido influenciado pela corrente messi-
ânica que terá precedido e acompanhado as teses de movimento joaquinita em Portugal.122
Nesta ordem de ideias, julgamos que deve ser ponderado o seguinte excerto da fala de Afon-

59
d
so Furtado quando este apresentou o seu relatório sobre os resultados da sua missão de
espionagem em Ceuta: «Isto sei eu por um maravilhoso acontecimento que me aconteceu
quando era moço, do qual sempre trouxe mui grande lembrança pelos maravilhosos azos
que sempre depois acerca d'ello vi seguir, e porque vem a propósito, não é mau de o sa-
berdes pela guiza que me aconteceu, e foi assim que el rei D. Pedro vosso pae, cuja
alma Deus haja, mandou meu padre fora deste reino com uma sua embaixada, e co-
mo quer que eu fosse moço de poucos dias, levou-me porém meu padre comsigo
pêra ver terras e aprender, e seguindo nós assim nossa viagem chegámos nós a um
porto acerca de um lugar d'África a que chamam Ceuta (…)».
Cronologicamente pode admitir-se que este episódio se tenha verificado entre 1357 e 1360.
Nada suporta esta hipótese, mas quer-nos parecer que, atenta a carreira naval de Afonso Fur-
tado, essa "embaixada" em que terá participado o pai do capitão-mor do mar se possa iden-
tificar com o envio, ao abrigo do tratado de 1358, de dez galés e uma galeota comandadas
pelo almirante Peçanha para uma campanha de três meses no Mediterrâneo, missão que per-
mitia a esta flotilha fazer aguada em Ceuta. Por essa altura Afonso Furtado contaria cerca de
10 anos de idade, o que se ajusta ao teor do seu relato.
Qualquer que tivesse sido o seu papel nessa embaixada, a acreditar no relato, o pai de Afon-
so Furtado não era certamente um desconhecido para D. Pedro I que lhe criou o filho e lhe
deu «estado». O que, obviamente, não autoriza a depreender que gozasse do estatuto de
fidalgo. Mas não deixa de ser intrigante que Gomes Eanes de Azurara (ou alguém que pos-
teriormente lhe corrigiu o texto já na óptica da posição que o seu filho Afonso Furtado de
Mendonça ocuparia na corte de D. Afonso V), ao enumerar os principais participantes na
expedição a Ceuta, refira o capitão Afonso Furtado (de Mendonça, o que é manifesto ana-
cronismo, porquanto se trata da única menção que conhecemos onde o capitão-mor do mar
figura com o apelido composto que nunca usou), logo a seguir ao almirante Lançarote Pe-
çanha e ao marechal Gonçalo Vaz Coutinho, e antes do alferes João Gomes da Silva, do
conde de Viana e de D. Álvaro Pires de Castro, entre muitos outros fidalgos de boa linhagem
e superior jerarquia. Tratar-se-ia de uma hierarquia de função, como a primazia do almirante
faz supor? É possível, mas ainda assim dá uma ideia do relevo do cargo de capitão-mor do
mar.
1419, Abril, 6 - numa carta de privilégio para oito lavradores da sua quinta a par de Sar-
rilhos (aldeia Galega do Ribatejo) surge ainda Afonso Furtado (que contaria cerca de 72
anos) referido como anadel-mor dos besteiros e apurador dos homens do mar (sic).123
Não nos repugna admitir, e vai de encontro ao bom senso, que o capitão-mor do mar e ana-
del-mor dos besteiros do conto Afonso Furtado pudesse ter morrido, como admite Braam-
camp Freire, ao redor de 1422, contando cerca de 75 anos de uma vida cheia, da qual nos
limitamos a recolher superficialmente algumas datas, factos e episódios. Pelo menos não con-
seguimos encontrar em fontes credíveis nada que o refira como estando ainda vivo em datas
posteriores. Não são dados tão minuciosos como gostaríamos, mas estamos em crer que
restituem uma personagem bem mais rica e marcante do que aquela que se oculta por de-
trás das referências lacónicas e dispersas que lhe têm sido dedicadas.
Aceitamos pois que o capitão Afonso Furtado morreu na supracitada data, ou próximo dela.
É portanto outro o Afonso Furtado de cuja morte foi acusado o judeu Judas Godim, ferreiro,
que recebeu carta de perdão a 2.11.1456, desde que servisse 3 anos em Ceuta124, talvez filho
ou mesmo neto de um dos seus filhos legitimados. Como não podem restar dúvidas de que
o Afonso Furtado referido em 1439 (e portanto o referido em 1454) não era o capitão-mor
mas já seu filho legítimo Afonso Furtado de Mendonça.
1439, Fevereiro, 4 - Refere-se um Afonso Martins, escudeiro, vassalo d'el rei (o mesmo
estatuto com que encontrámos o capitão Afonso Furtado em 1369) e criado de Afonso
Furtado, e menciona-se que este último tinha bens que confrontavam com uma quinta
(de vinhas, pomar e tintal) situada entre o Paço e o Lumiar, que ficara em partilhas a Gon-
çalo do Rego, alcaide (pequeno) da vila de Santarém.125
1454, Dezembro, 12 - Carta de segurança a Afonso Fernandes, morador no Lumiar, cri-
ado de Afonso Furtado.126
A propósito, documentam-se também outros criados de Afonso Furtado de Mendonça, na-
turais ou moradoras em locais cuja relação com as regiões onde se localizavam os bens con-
hecidos de seu pai é difícil de averiguar.
1462, Março, 3 - Carta de privilégio de Fernão Rodrigues, morador em vila Franca de Xira,
caseiro de Afonso Furtado de Mendonça, do Conselho.127
1462, Abril, 29 - Carta de perdão a Álvaro Figueira, criado de Afonso Furtado, morador
no bairro da Figueira, termo de Alcobaça.128
Enfim, de tudo o que ficou dito até ao momento podemos assentar num vasto conjunto de
factos que nos permitem, sobre os Furtado de Loures, aparentar a proposta de reconstitu-
ição genealógica que segue.

a
61
d
FURTADO de Loures
Hipótese de reconstituição genealógica

1 Godinho (Furtado?), virtual, tendo apenas em conta o patronímico dos filhos. Terá nas-
cido cerca de 1180/90. Podia ser filho de um Furtado de nome próprio, usando portanto
este patronímico. Por outro lado, podia ter tido a alcunha de Furtado, o que se adequa me-
lhor ao «dito Furtado» com que o seu proposto filho é designado. Podia ainda ser filho ou
neto dos já referidos Pedro Furtado e Marinha Gilbertiz.
1.1. D. Tereza Godins, n. cerca de 1220, que fez testamento lavrado em Leiria em 10.9.1298.
C.c. Lourenço Gonçalves Magro.
1.1.1. Egas Lourenço Magro, deão da Sé de Lisboa.
1.2. ?Domingos Furtado, n. cerca de 1222, contemplado no testamento de D. Tereza Godins
com 20 libras. Deve ser o Domingos Godins, «dito Furtado», que em 1301, com seu filho
Vasco Domingues, vendem umas heranças no termo de Montemor-o-Velho. E o Domin-
gos Furtado morador em Lisboa que em 1661 testemunhou a venda de uma casa em San-
to Estêvão.
1.2.1. ?Maria Domingues, n. cerca de 1250, que, já viúva de João Martins Castel Mendo, a
11.4.1319, sendo testamenteira de Nicolau Domingos, dito Besugo, seu genro, já fale-
cido, deu possessão de uma casa com seu sótão e sobrado em Lisboa, na Lagara, fre-
guesia de S. Vicente, casa essa que «foi da Furtada», provavelmente uma referência
a sua mãe ou a sua proposta tia D. Tereza Godins.
1.2.2. Vasco Domingues, n. cerca de 1251 e fal. depois de 1334. Com seu pai, em 1301 ven-
dem umas heranças em Montemor-o-Velho. Deve ser o Vasco Domingues, «dito Fur-
tado», que era morador em Frielas (Loures) quando em 1334 testemunha um acto no-
tarial.
1.2.3. ?Domingos Domingues Furtado, morador que foi na rua da Capateira, junto ao cas-
telo de Lamego, já fal. em 1322 quando seu filho Afonso Domingues, solteiro, vende
uma casa que tinha naquela rua.
1.3. ?João Godins (Furtado), n. cerca de 1224, por enquanto virtual e fundado apenas no pa-
tronímico da proposta filha. Não podia ser o João Peres Furtado, alvazil de Alenquer, que
já referimos constar da documentação convento de Celas, em Coimbra, entre 1221 e 1229.
Menos provável, mas ainda assim possível, é a hipótese de Maria Anes Furtado ser mes-
mo filha de Domingos Furtado, que neste caso teria casado com uma Maria Anes. Mas
esta irregularidade onomástica não é própria da época em causa, além de já propormos
uma filha Maria para Domingos.
1.3.1. ?Maria Anes Furtado, n. cerca de 1275, moradora em Stª Iria de Azoia (Loures) com
seu marido quando em 1334 tinha, em prazo do arcebispo D. Gonçalo Pereira, umas
propriedades em Vale de Caves, a que chamam Atougueira. Terá sido ama de Fernão
Rodrigues Pacheco, prior de Santa Maria da alcáçova de Santarém, uma fez que seu
proposto filho Afonso era colaço deste. C.c. Domingos Lourenço, que ainda vivia em
1346, quando testemunha em Santarém, justamente num documento em que tam-
bém consta seu proposto filho Afonso Furtado.
1.3.1.1. ?Constança Domingues, que com seu marido Estêvão Anes Espinho em 1346
vendem por 300 libras em dinheiro português os bens que têm em Tremês, ter-
mo de Santarém, onde viviam, sendo testemunha desta venda um «criado» de
Afonso Furtado.
1.3.1.2. ?Afonso Furtado, n. cerca de 1297 e documentado em 1346, através de um seu
«criado» que dá posse em Santarém a Fernão Rodrigues Pacheco, prior de S.ta
Maria da alcáçova de Santarém, irmão de Lopo Fernandes, de uns bens na fre-
guesia de Santiago de Tremes, sendo testemunha Domingos Lourenço da Azoia
(pai deste Afonso Furtado). Não pode ser este o homónimo documentado co-
mo comendador de Messejana, pois aparece pouco depois sem esta qualida-
de. Terá participado com o almirante Peçanha numa campanha de três meses
no Mediterrâneo. Tudo indica que c.c. uma Constança Afonso, cujas vinhas e
pardieiros em S. Pedro de Alfama (Lisboa) o capitão Afonso Furtado doa em 1369
à respectiva igreja, na pessoa do prior e de João Domingues, adiante. Tendo em
conta a hipótese, já adiantada, de que o capitão Afonso Furtado fez seu testa-
mento sendo recém-casado, e sendo estes os únicos bens que então tinha, é
forte indicio que de que seu pai ainda era vivo e só sua mãe tinha falecido, da
qual os herdara.
1.3.1.2.1. ?Afonso Furtado, n. cerca de 1347 em Frielas, criado de Dom Pedro I,
que lhe deu «estado», que em 1375 já era anadel-mor de besteiros e
vassalo de Dom Fernando. Em 1369, sendo escudeiro, vassalo d'el rei e
vizinho e morador na cidade de Lisboa, já estava casado com Maria Mi-
guéis, fal. em 1401 e sepultada na capela e Santa Maria do Paraíso, em
Alfama. Provavelmente esta Maria Miguéis nasceu no Porto e era tia da
mulher de Estêvão Vasques Filipe, que também foi anadel-mor de Bes-
teiros, e irmã de Inez Migueis, 1ª mulher de João Esteves, o Privado, em
cujo testamente se documenta que era natural do Porto e irmã de uma
Margarida Miguéis, então aí moradora. Afonso Furtado c. 2ª vez cerca
de 1411, teria já 64 anos de idade, c. D. Maria de Mendonça, já viúva, de
quem teve apenas Afonso Furtado de Mendonça, como adiante propo-
mos. Teve ainda três bastardos, legitimados por carta real, nascidos du-
rante o 1º casamento.
1.3.1.2.2. ?Pedro Afonso Furtado, um dos alvazis de Frielas em 1379.
1.3.1.2.3. ?Vasco Afonso, que em 1369 vivia no Bombarral.
1.3.1.2.4. ?Gil Afonso, um dos alvazis de Frielas em 1379.
1.3.1.2.5. ?Lopo Afonso, um dos alvazis de Frielas em 1381.
1.3.1.3. ?Diogo Furtado, que em 1353 era escudeiro de Fernão Rodrigues Pacheco, pri-
a
or de Santa Maria da alcáçova de Santarém (de quem sua proposta mãe foi ama).
1.3.1.4. ?João Domingues, raçoeiro (recebia ração) da igreja de S. Pedro de Alfama em
1369.

63
d
5 D. Maria de Mendonça
Convenientemente «furtada»? Ao contrário do que muitos pensam, mesmo
5.1 no séc. XV o facto de se usar um nome de família nobre não significava neces-
sariamente que se pertencesse a essa linhagem. A documentação primária quatrocentista
está pejada de exemplos que o comprovam. Por outro lado, sobretudo após o séc. XV, veri-
fica-se a extensão de nomes por simpatia ou osmose. Isto é: dentro da mesma parentela,
mais ou menos distante, vemos alguns ramos adoptar nomes e armas que em rigor apenas
pertencem a um determinado ramo e não aos que os adoptam, porventura convencidos de
que também tinham essa origem.
De que forma estes factos se podem aplicar à família em estudo? Terão os Furtado portugue-
ses, como atrás se aventou, acrescentado o Mendonça129 por osmose com os poderosos e
ilustres Hurtado de Mendoza castelhanos? Ou tinham uma justificação?
Antes de tentar responder a esta questão, uma outra prévia se levanta: terão todos os Men-
donça portugueses a mesma origem?
É compreensível que as genealogias, sobretudo as tardias ou viciosas, procurassem ligar to-
dos os Mendonça ao ilustre tronco castelhano, fazendo-o às vezes da forma mais tosca e
contra todas as evidências documentais. Mas será essa a verdade? Só para dar um exemplo:
será que nenhum Mendonça português pode descender de Joçefe de Mendonça, mouro,
morador na cidade de Granada, a quem Dom Afonso V passou, a 24.9.1475, carta de segu-
rança para si e todos os seus empregados, para que pudesse vir comerciar em Portugal?
Tanto quanto se sabe, os mais antigos Mendonça que aparecem em Portugal descendem de
Fernán Arraes de Mendoza, fronteiro-mor da Andaluzia contra Portugal, que depois das pa-
zes de 1339 se estabeleceu no Algarve. Deste deve ter sido filho ou neto um Gonçalo de
Mendonça, nascido em Faro, onde prestou grandes serviços após a morte do rei Dom Fer-
nando.
Face ao conjunto de evidências já adiantado, parece certo que o velho capitão Afonso Fur-
tado casou 2ª vez com uma senhora Mendonça, tendo deste matrimónio tardio apenas um
filho, Afonso Furtado de Mendonça. Como já ficou dito, não é de admitir uma despudorada
apropriação do nome e armas Mendonça passasse despercebida na corte de então e não
deixasse, no mínimo, de provocar chistes corrosivos, tanto mais apetecíveis quanto é fácil o
trocadilho entre Mendonça e furtado…
Quem seria esta senhora Mendonça? Para tentar encontrar algum indício, comecemos por
analisar o nome das filhas de Afonso Furtado de Mendonça. A mais velha, D. Violante No-
gueira, comendadeira de Santos, é claramente uma homenagem à mãe, neta do celebrado
Doutor João das Leis. Mas a filha segunda chamou-se D. Maria de Mendonça, o que nesta
época constitui um forte indício de que sua avó paterna também assim se chamou.
Mas que D. Maria de Mendonça viveu em Portugal na primeira metade do séc. XV? Docu-
mentalmente apenas encontramos uma D. Maria de Mendonça, a cujo pedido D. Afonso V
perdoa, a 25.5.1469, um ano do degredo a Sebastião do Couto, seu «criado», dos dois anos
a que fora condenado para a cidade de Ceuta.
«Sebastião do Couto nos enviou dizer que ele fora degredado para a cidade de Ceuta
por 2 anos por algumas coisas em que fora achado culpado segundo mais cumprida-
mente se continha no livramento que dele houvera do qual degredo tinha já cumprido
um ano segundo ver poderíamos por certo (alvará) do conde de Vila Real capitão por nós
na dita cidade de licença de três meses para enderençar (sic) perdão...ir cumprir em o ou-
tro ano. E porquanto se sentia muito pobre e gastado do tempo que estivera na dita ci-
dade nos pedia por mercê e pelo (amor) de Deus que lhe relevassemos o outro ano que
ainda tinha por servir e nós vendo o que nos assim dizer e pedir enviou vista a sentença
de livramento que perante nós foi apresentada e assim o alvará do conde de Vila Real pe-
lo qual se mostrou servir um ano do dito degredo em a dita cidade de Ceuta e querendo-
-lhe fazer graça e mercê pelo de D. Maria de Mendoça que nos por ele requereu temos
por bem e relevamos-lhe o dito ano de degredo que ainda tinha por servir e cumprir dos
ditos dois anos e o havemos por relevado dele e queremos que o não sirva mais. Lisboa,
1469, Maio, 25, por Pedro Machado.»
Dois anos depois, a 17.10.1471, o rei nomeia Sebastião do Couto, escudeiro de Afonso Fur-
tado, do seu Conselho, para escrivão das sisas régias de Veiros em substituição de Álvaro Gil
que o perdera porque se fez procurador na correição do mestrado de Avis, e não exercendo
o dito ofício ter colocado em seu lugar Gil Vasques sem licença régia.130
Como parece evidente que se trata do mesmo, temos, assim, que Sebastião do Couto era
«criado» de D. Maria de Mendonça pelo menos desde o início de 1468, e que em 1471 era es-
cudeiro de Afonso Furtado de Mendonça. Não se encontra mais documentação relevante,
mas este estes dois documentos residuais, aparentemente irrelevantes, permitem-nos afinal
reconstruir a verdade dos factos.
Estabelecemos com eles, desde logo, uma evidente relação entre D. Maria de Mendonça e
Afonso Furtado de Mendonça. Verificamos, também, que esta D. Maria teria que ter em 1468
idade suficiente para ter «criados», termo que então não significava serviçal contratado mas
pessoa que foi criada (educada) na casa de outra. Tendo em conta que Sebastião do Couto
já era maior em 1468 e escudeiro e escrivão das sisas em 1471, não pode ter nascido depois
de 1445. Logo, D. Maria de Mendonça não poderia ter nascido depois de 1430 e naturalmen-
te terá nascido muito antes, uma vez que é evidente que terá falecido entre Maio de 1469 e
Agosto de 1471. Só assim se justifica que o seu «criado» Sebastião do Couto tenha passado
a escudeiro do filho, Afonso Furtado de Mendonça.
Fica desta forma excluída a hipótese de se tratar da D. Maria de Mendonça filha de Afonso
Furtado de Mendonça, que só nasceu depois de 1446, pelo que em 1468 teria no máximo
22 anos, idade insuficiente para ter já um «criado» maior de idade. Por outro lado, um «cri-
a
ado» da filha não passa a escudeiro do pai. Nem se aceita que uma jovem de 22 anos, sendo
o pai vivo, e pro-vavelmente vivendo em sua casa, pudesse ter influência suficiente para
pedir ao rei perdão para um seu «criado».
Tudo indica, portanto, que a 2ª mulher do velho capitão Afonso Furtado foi esta D. Maria de

65
d
Mendonça, falecida em 1469 ou 1470. Mas quem seria ela, claramente da alta fidalguia, co-
mo se evidencia pelo uso do Dona, então dado a muito poucas senhoras?
Uma genealogia quinhentista visiense, manuscrita131, deixa-nos uma informação fundamen-
tal: a propósito de um Lopo da Ventura e Queiroga que foi casar a Viseu nos finais do séc.
XV, refere o autor que ele era filho de Gonçalo da Ventura e Queiroga, fidalgo da Casa de
Dom Afonso V e seu aposentador-mor, «como se vê do alvará feito no ano de 1478»132,
acrescentando que foi sepultado no mosteiro de S. Francisco de Marvila, em Santarém, em
túmulo com as armas dos Queiroga (Quiroga, família galega). Este Gonçalo, prossegue o au-
tor, casou com D. Elvira Gomes de Mendonça, e era filho de Rodrigo Álvares de Queiroga
(Quiroga), da cidade de Tui, e de sua mulher D. Maria de Mendoça.
Convém aqui sublinhar duas coisas. Primeiro, que o autor, como é próprio do seu século, é
muito cuidadoso a dar o tratamento de Dona, mas que expressamente dá este tratamento às
duas referidas senhoras Mendonça. Segundo, que sobre a origem destes Queiroga e Men-
donça não acrescenta mais nada nem estabelece qualquer relação quer com os Furtado de
Mendonça portugueses quer com os Hurtado de Mendoza castelhanos. Mas é evidente,
pela quantidade de pormenores que dá, que estava muito bem informado quer sobre o dito
Lopo da Ventura e Queiroga quer sobre seu pai. Sendo de salientar que o autor viveu duas
escassas gerações depois daquele Lopo e que, por outro lado, não tinha com estes Queiroga
e Mendonça qualquer laço familiar.
Sobre a família próxima de Lopo Álvares da Ventura e Queiroga, o autor deixa contudo mais
alguma informação: diz que era irmão de Bernardino Gomes de Mendonça, fidalgo e cape-
lão da rainha Dona Leonor, que foi também mestre-escola da Sé do Porto e abade das igre-
jas de Queiram e Campia. Acrescentado que este Bernardim teve um filho chamado Tristão
de Mendonça, que foi comendador de Campia na Ordem de Cristo.133
Estranhamente, contudo, o autor não refere uma informação134 que certamente está na ori-
gem do facto daquele Lopo ter ido casar a Viseu com uma filha e herdeira do poderoso D. Pe-
dro Anes de Mesquita, deão, chantre, arcediago e cónego da Sé de Viseu. É que este Lopo
era sobrinho paterno de outro Lopo Álvares da Ventura, que já era prior do Cabido da Sé de
Viseu quando a 24.7.1459 recebe prazos em Stª Cristina, S. Miguel, Ranhados, Barrelas, Frá-
guas e Vale.
Temos assim notícia credível de uma D. Maria de Mendonça que pode ser a documentada
acima, tanto mais que não aparece nenhuma outra. Mas esta conclusão, por exclusão de par-
tes, dificilmente seria aceitável se não existisse mais nenhum indício. A verdade é que existe,
e muito forte!
Nuno Furtado de Mendonça, o filho mais velho de Afonso Furtado de Mendonça, acompa-
nhou Dom Afonso V na expedição a Castela e lá morreu ainda novo, em 1476, deixando fi-
lhos menores. De facto, a 18.7.1476 sua viúva Leonor da Silva teve mercê das tenças anuais
do marido, assentes no almoxarifado de Santarém. Ora, este Nuno era fidalgo do Conselho
e aposentador-mor do reino. Como seu pai já tinha falecido no ano anterior (1475), e seu fi-
lho era menor, quem sucedeu no cargo foi justamente Gonçalo da Ventura e Queiroga,
que nesta proposição seria seu tio. Este Gonçalo teria 67 anos de idade em 1476 e deverá ter
Desenho do selo do 1º marquês de Santillana (à esquerda), esquartelado em aspa de Mendoza
e la Vega, existente num documento firmado em Madrigal a 30.1.1440 com o rei e outros nobres.
Vide «Pruebas de la Casa de Lara», de Salazar y Castro, e «El Marqués de Santillana. Biografía y
documentación», de Rogelio Pérez Bustamante e Juan Manuel Calderón Ortega.
As armas estão aqui correctamente ordenadas, com uma banda, apesar da excessiva dimensão do
perfilado, que dá a impressão de duas bandas. Já o mesmo não se passa no túmulo de Duarte
Furtado de Mendonça (à direita), não só pelo uso da contra-banda mas também por estar
apresentada de forma que parecem três. Esta inversão da banda também se verifica
na Sala de Sintra. Acresce que no túmulo tem
AVE MARIA GRACIA e no selo AVE MARIA GRATIA PLENA.

ocupado o cargo até 1479, quando terá atingido os 70 anos, ao tempo a idade de aposenta-
doria. Deve então ter sido nomeado aposentador-mor do reino D. Henrique Henriques, se-
nhor das Alcáçovas, pois já o era a 12.9.1483 quando Dom João II lhe devolveu o dito senho-
rio. Sendo certo que este D. Henrique Henriques, quando a 1.1.1476 recebeu a comenda de
Colos na Ordem de Santiago, já era aposentador-mor, mas da Casa do príncipe Dom João.
Cargo que acumulava com o de almotacé da cidade de Évora, para o qual foi renomeado,
juntamente com seu cunhado Aires de Miranda, por carta de Dom Afonso V de 23.10.1475.
Resta ainda a questão de perceber porque o autor visiense se refere a um alvará de 1478 co-
mo o da nomeação de Gonçalo da Ventura e Queiroga para o cargo de aposentador-mor,
a
se seu proposto sobrinho faleceu em meados de 1476. Esta pequena disparidade nas datas
pode contudo ser explicada pelo facto de em 1476 Dom Afonso V se encontrar na campa-
nha contra Castela e em 1477 ter enviado de França, onde estava, uma carta a seu filho di-
zendo que queria retirar-se para Jerusalém e ordenando-lhe que se proclamasse rei, o que

67
d
este fez de imediato. Contudo, no final desse mesmo ano, Dom Afonso V regressa a Portugal
e Dom João II restituiu-lhe o trono. É portanto muito natural que Gonçalo da Ventura e Quei-
roga, que teria ficado como aposentador-mor após a morte do sobrinho em 1476, tenha per-
dido o cargo momentaneamente como subida ao trono de Dom João II, tendo-o recupera-
do depois quando, no final de 1477, Dom Afonso V reassumiu o reino, sendo formalmente
renomeado no início de 1478 e ocupado o cargo ou até fazer 70 anos ou até à morte de Dom
Afonso V em 1481.

A questão cronológica. Para que o referido Lopo Álvares da Ventura já fosse


5.2 prior do Cabido da Sé de Viseu em 1459, terá naturalmente nascido o mais tar-
dar em 1420. Temos, ainda, que o referido D. Pedro Anes de Mesquita nasceu cerca de 1417,
em 1440 já era capelão da Sé de Viseu, e se documenta que sua filha estava casada com o
dito Lopo Álvares da Ventura e Queiroga em 1507, já o pai dela tinha falecido. Temos, por
outro lado, a informação circunstanciada, relatada pelo referido autor visiense, de que este
Lopo esteve no serviço da rainha Dona Leonor e depois no de seu irmão Dom Manuel I, e
que, em 1496, «por provisão sua foi às partes do Alentejo a fazer baptizar os meninos judeus
de sete anos mais para baixo conforme a lei que este Rei passou e lhe foi desfazer as sino-
gas que pelo reyno tinhão e as mesquitas dos mouros, fazendo-lhe mercê da terça parte de
tudo o que carregasse e assim mais foi a Castela fazer trazer armas e cavalos para a con-
quista de Africa com licença dos Reis Católicos».
De toda esta envolvente cronológica se conclui que Lopo Álvares da Ventura e Queiroga nas-
ceu o mais tardar em 1465, tendo casado cerca de 1498. Convirá ainda aqui referir que, de
sua mulher Joana de Mesquita, Lopo Álvares teve três filhos, a saber: D. Jerónimo de Mes-
quita e Mendonça, Dom prior de Barcelos e leitor apostólico do reino, Lopo Álvares da Ven-
tura, cónego da Sé de Viseu, e D. Joana de Mesquita e Mendonça, herdeira, c.g. nos senho-
res de Nespereira e Gumirães e na principal fidalguia de Viseu.135
Temos, portanto, que o pai e tio de Lopo Álvares, os citados Gonçalo da Ventura e Queiroga
e Lopo Álvares da Ventura, terão nascido entre as datas limite de 1400 e 1420. O que permite
perfeitamente um 2º casamento do capitão Afonso Furtado, viúvo desde 1401, com D. Ma-
ria de Mendonça, também ela já viúva de Rodrigo Álvares de Queiroga.
Esta D. Maria de Mendonça seria assim a «Dona …» que o cuidadoso Livro de Linhagens do
Séc. XVI aponta como mulher de Afonso Furtado e mãe de Afonso Furtado de Mendonça,
tanto mais que se verifica que a 1ª mulher, Maria Miguéis, não tinha Dona nem podia
cronologicamente ser a mãe de Afonso Furtado de Mendonça. E desta forma se ex-
plica naturalmente o Mendonça do filho e a inexistência de remoques na corte a
propósito do uso deste nome.
Provavelmente o velho capitão Afonso Furtado conheceu D. Maria de Mendonça, jovem viú-
va com dois filhos crianças, no processo que conduziu ao acordo de paz com Castela firma-
do em 1411, em que naturalmente participou como capitão-mor de Portugal, e com ela casou
nesse mesmo ano, trazendo-a para Lisboa, dela tendo Afonso Furtado de Mendonça, nasci-
do ainda nesse ano ou em 1412, assim pouco mais novo do que seus meios-irmãos do 1º
casamento da mãe, que naturalmente com ela vieram para Portugal.
D. Maria de Mendonça teria assim nascido cerca de 1391, casado a 1ª vez na Galiza cerca de
1408 e a 2ª vez com o capitão Afonso Furtado em 1411, vindo a falecer em 1469 ou 70, com
quase 80 anos de idade. Pertencia inegavelmente à alta nobreza e é seguramente a ela que
se deve quer a fulgurante ascendência social dos Furtado de Mendonça quer o nome e armas
de Mendonça por eles usados, sem remoque algum da atenta corte.

Uma tangente ao marquês de Santillana? Teoricamente, D. Maria de Men-


5.3 donça podia ser uma Mendonça Arraes, que como vimos estavam no Algarve
desde meados do séc. XIV. Tanto mais que estes tinham alto estatuto, como se confirma no
caso, ainda que tardio, de Álvaro Arraes de Mendonça, escudeiro e fidalgo da Casa Real, que
a 8.4.1475 teve carta real de privilégio de fidalgo.
Há ainda outros Mendonça em Portugal na 1ª metade do séc. XV: Aires de Mendonça, es-
cudeiro e vassalo da Casa Real, que a 2.2.1450 teve de Dom Afonso V carta de privilégio para
os seus apaniguados de Rogel, e Mem Rodrigues de Mendonça, que a 9.2.1481 renunciou
ao cargo de escrivão perante o juiz do mosteiro da Vitória e de todos os feitos, crimes e cíveis,
em seu filho Fernão de Mendonça, escudeiro de D. João de Noronha.
Mas o estatuto destes é claramente inferior ao que atribuímos a D. Maria de Mendonça. Por
outro lado, o seu casamento com um fidalgo de Tui indicia mais que fosse castelhana, talvez
até do ramo Mendoza que se sabe foi para Galiza mas está mal estudado. A única pista, rela-
ciona-se com sua nora, casada com Gonçalo da Ventura e Queiroga, que como vimos se
chamou D. Elvira Gomes de Mendonça. O mais natural é que nora e sogra fossem parentes.
E sobre esta D. Elvira já há uma pista.
Gonçalo da Ventura e Queiroga pode perfeitamente ter nascido em 1409 ou mesmo 1410.
Pela cronologia do filho, dá ideia que casou tarde, lá para 1465, com cerca de 55 anos de ida-
de. Sua mulher, D. Elvira Gomes de Mendonça, pode portanto ter nascido o mais tardar em
1450, já que nesta época, sobretudo na nobreza, é normal o casamento de homens feitos
com jovens de 15 anos e até mais novas, acima dos 12 anos.
Ora, documenta-se um Gomes Soares de Mendonça, fidalgo espanhol que serviu em Portu-
gal e que a 18.8.1480, a pedido do mestre da Ordem de Santiago D. Afonso de Monroy, re-
cebe de Dom Afonso V a elevada tença anual de 60.000 reais de prata, a retirar da elevadís-
sima tença de 200.000 reais do dito mestre, como o próprio tinha pedido. Este Gomes Soa-
res de Mendonça devia estar na alta conta do mestre D. Afonso de Monroy para este assim
lhe dispensar quase um terço da sua tença. Deverá ter nascido entre 1425 e 1431, o que per-
mite perfeitamente que fosse pai de D. Elvira.
E de quem era filho este Gomes Soares de Mendonça? É sedutor pensar que podia ser filho
a
de D. Lorenzo Suárez de Mendoza, que foi conde da Corunha (Burgos) e visconde de Torija
(1469). E, portanto, neto paterno dos marqueses de Santillana e sobrinho-neto de Gómez Su-
árez de Figueiroa, de quem teria herdado o nome próprio. Seria portanto irmão de D. Bernar-
dino de Mendonça, 2º conde da Corunha (1480). Onomástica que vem reforçar a filiação de

69
d
D. Elvira em Gomes Soares, uma vez que um filho desta se chamou justamente Bernardino Go-
mes de Mendonça!
Só que D. Lorenzo Suárez de Mendoza não podia ter nascido antes de 1420, e provavelmente
só nasceu lá para 1430. Donde, se podia ser pai de Gomes Soares, nascendo este mais tarde
do que o proposto, não podia seguramente ser avô de D. Elvira. Será que esta D. Elvira em vez
de filha era irmã de Gomes Soares?
A outra hipótese é Gomes Soares de Mendonça, nascido lá para 1425, ser filho do já referi-
do Gómez Suarez de Figueiroa, senhor de Zafra, Feria e La Parra (26.2.1394, tinha 12 anos de
idade), nascido em 1382 e falecido em 1429, e de sua mulher D. Elvira Laso de la Vega, irmã
do referido marquês de Santillana, o qual por sua vez casou com uma irmã deste Gómez Su-
áres. O contracto de casamento destes irmãos foi negociado em 1408 pelo pai, o almirante
D. Diego Hurtado de Mendoza, casando o futuro marquês em 1416 com D. Catalina Suárez
de Figueiroa, irmã daquele Gómez Suárez. Deste e de sua mulher D. Elvira foi filho, entre ou-
tros, D. Lorenzo Suárez de Figueiroa, conde de Feria em 1460, senhor de Zafra, Villaba e Par-
ra, nascido em Badajoz em 1418. Esta hipótese permitia, até com mais folga, que D. Elvira fos-
se filha de Gomes Soares. E a onomástica não podia acertar melhor, uma vez que esta D. El-
vira seria assim neta paterna de outra D. Elvira, justamente Mendonça. A tudo isto acresce
que Gomes Soares seria desta forma neto paterno de D. Lorenzo Suárez de Figueiroa, mestre
da Ordem de Santiago, o que podia justificar a deferência do mestre D. Afonso de Monroy.
Por outro lado, é preciso não esquecer que estes Figueiroa eram galegos.
Que conclusão daqui podemos tirar para a filiação de D. Maria de Mendonça?
Desde logo, uma inegável prova de estatuto, se efectivamente a nora era neta ou bisneta do
almirante D. Diego López de Mondoza. Por outro lado, é natural que tenha sido D. Maria de
Mendonça a negociar este casamento do filho, que como vimos terá ocorrido cerca de 1463.
O que indicia um parentesco relativamente próximo. Não podia, é claro, ser filha do 2º casa-
mento de D. Diego, pois este só casou com D. Leonor de La Vega em 1395 e D. Maria de
Mendonça não podia ter nascido depois de 1391. Nem, de resto, se o fosse, passaria des-
percebida às genealogias ibéricas quinhentistas. Como já ficou dito, podia ser prima de D. Di-
ego, porventura bisneta ou trineta de Ruy López de Mendoza, documentado em 1255, que
tinha muitos bens em Santiago de Compostela, e de sua mulher a portuguesa D. Maria Ponces
de Baião, irmã de Pedro Ponces de Baião, que faleceu velho a 28.9.1283. Mas a melhor so-
lução aponta para que D. Maria de Mendonça fosse afinal uma desconhecida filha natural do
almirante D. Diego, havida na constância do 1º casamento ou sendo ele já viúvo, antes do 2º
casamento. O que, embora não o justificasse, explicava bem o uso pelos nossos Fur-
tado de Mendonça das armas do marquês de Santillana, desta forma meio-irmão
de D. Maria de Mendonça. Por outro lado, sendo uma filha natural ou bastarda, isso cons-
tuiria mais uma razão para que posteriormente fosse "escondida", e podia explicar porque as
genealogias e documentação espanholas dela não têm notícia.
Assim, e apesar de as genealogias espanholas não terem notícia dessa eventual bastarda,
nem constar no testamento de D. Diego, a verdade é que o almirante teve uma irmã chama-
da justamente D. Maria e era «ombre de muy sotil ingenio, bien razonado e atrevido en su
fablar, tanto que el rey don Enrique (III) se quexara de su soltura e atrevimiento» e «plu-
gieronle mucho mugeres», como diz Fernan Pérez de Guzmán na sua obra «Generaciones e
Semblanzas», escrita no século XV. Esta D. Maria de Mendonça, eventual bastarda do almi-
rante, podia ter ido para a Galiza no séquito de D. Aldonza de Mendoza quando esta foi casar
com D. Fadrique de Trastamara, senhor de Lemos (Galiza), futuro duque de Arjona e rival do
arcebispo D. Lope de Mendoza, na Galiza. E mesmo com D. Lope de Mendoza foram bas-
tantes Mendoza para Santiago de Compostela, entre os quais o ascendente dos marqueses
de Villagarcia, na Galiza, como nos salientou o Dr. José Luis Garcia de Paz, da Universidad Au-
tónoma de Madrid.
Temos, assim, que podia afinal ser bem próxima a ligação dos Furtado de Mendonça por-
tugueses aos Mendoza castelhanos e ao próprio marquês de Santillana, o que justificava o
nome e de certa forma o equívoco heráldico. Ou seja, Duarte Furtado de Mendonça, que
está sepultado no Espinheiro, campa que constitui o mais antigo documento heráldico co-
nhecido dos Furtado de Mendonça portugueses contendo as armas dos la Vega, podia afi-
nal ser sobrinho-neto do marquês de Santillana! Não descendendo, é certo, do lado la Vega,
a proximidade familiar e certamente a vontade de a sublinhar poderia com facilidade explicar
este quiproquo heráldico, porventura fruto do desconhecimento dos factos exactos. E sobre-
tudo explicava porque a sociedade de então, em geral, e a corte em particular, deixou pas-
sar este que de outra forma seria um abuso extremo, ao arrepio das leis e dificilmente esque-
cível ou calável.
O "esquecimento" de D. Maria de Mendonça, e portanto o entroncamento que ela repre-
sentava, terá surgido apenas no séc. XVI, de forma a permitir uma genealogia reescrita que,
não o afirmando, deixasse implícita uma ligação varonil aos Hurtado de Mendoça, aprovei-
tando a feliz coincidência do nome Furtado. E o «Livro de Linhagens do Séc. XVI», escrito na
segunda metade deste século, já espelha as perplexas dificuldades desta re-escrita ao deixar
o tão próximo capitão-mor Afonso Furtado casado com uma «Dona» inominada.

cd a
71
d
6 A questão heráldica
Os Furtado de Mendonça das ilhas. Temos, finalmente, uma questão lateral
6.1 mas importante a este tema: são os Furtado de Mendonça da Madeira (e depois
Açores) descendentes de Afonso Furtado de Mendonça ou não? No citado nobiliário qui-
nhentista, bem assim como no de Damião de Góis, nada se diz sobre o assunto. Mas Henri-
que Henriques de Noronha, no seu «Nobiliário genealógico das famillias q passaram a viver á
Ilha da Madeira desde o tempo do seu descobrimento q foi no anno de 1420» (1700), diz que
a mulher de Bartolomeu Perestrello, a quem chama Beatriz, era prima-direita de D. Ana de
Mendonça, a comendadeira de Santos. Também o açoreano Gaspar Frutuoso, em «Sauda-
des da Terra», obrar incontornável escrita entre 1586 e 1590, diz que a mulher de Bartolomeu
Perestrello, a quem chama Catarina de Mendonça, «era neta de uma irmã da Mãe do Mestre
de Santiago». Se este parentesco é obviamente anacrónico, nos dois casos, resulta contudo
de ambos a clara ideia de uma próxima relação familiar. Que se resolveria se Catarina fosse
irmã (meia-irmã ilegítima) do pai da mãe do mestre. Acrescenta este autor quinhentista que
a dita Catarina era irmã de Fernão Furtado de Mendonça, povoador da ilha Graciosa.
O que significa dizer que a mulher de Bartolomeu Perestrello, Catarina de Mendonça, era fi-
lha de Afonso Furtado de Mendonça, bem assim como seu irmão Fernão Furtado de Men-
donça, este referido como bastardo quando em 1475 tem foro de escudeiro fidalgo da Casa
Real com 1.500 reais de moradia. E ainda Rodrigo de Mendonça, cavaleiro da Casa Real, mo-
rador na Ilha Deserta e casado com Catarina Teixeira, de quem não tinha filhos, quando ado-
pta a 23.7.1471 sua sobrinha-neta Filipa, certamente criança, filha de sua sobrinha Catarina
Furtado (filha daquela Catarina) e de seu marido Mem Rodrigues de Vasconcellos.
É enorme a tentação de identificar estes Fernão e Rodrigo com os homónimos filhos naturais
de Afonso Furtado, o velho, que foram legitimados por carta real de 1390. Mas isso é impos-
sível, desde logo pela cronologia, o que evita outros argumentos. Em 1475 Fernão Furtado
de Mendonça, a ser o legitimado em 1390, teria no mínimo 87 anos de idade...
Para ser feito escudeiro em 1475, este Fernão terá nascido lá para 1440, uma vez que foi um
dos povoadores da ilha da Graciosa, onde chegou, já casado e com filhos, entre 1473 e 1485,
provavelmente em 1477. Rodrigo de Mendonça, para em 1471, já casado, adoptar uma so-
brinha-neta, não deverá ter nascido depois de 1431. E Catarina de Mendonça, certamente a
mais velha, deve ter nascido cerca de 1430 e casado cerca de 1446, com 16 anos, como era
então habitual, com o celebrado Bartolomeu Perestrello, senhor de Porto Santo, de quem foi
a 3ª mulher, sabendo-se que este a 8.6.1431 já estava casado com a sua 2ª mulher Margarida
Martins.
Esta cronologia permite perfeitamente que sejam, os três, filhos naturais de Afonso Furtado
de Mendonça, da mesma ou de diferentes mulheres. Tanto mais que os nomes Fernão e Ro-
drigo, já o pai, Afonso Furtado, dera aos seus bastardos. Catarina e Rodrigo terão nascido
ainda Afonso Furtado de Mendonça era um jovem solteiro. Já Fernão deve ter nascido de-
Armas dos Furtado de Mendonça portugueses conforme estão em Sintra.
In «Brasões da Sala de Sintra, III», de Anselmo Braamcamp Freire.
De salientar a contra-banda em vez da banda.

pois do 1º casamento do pai, e daí a referência documental de bastardo, nome que tecnica-
mente só se dava aos filhos naturais de pais casados.
Apesar de se documentar um Lopo Arraes (de Mendonça) na Madeira, nascido no 2º quar-
tel de quatrocentos, não julgamos que estes irmãos sejam desses Mendonça, pois essa linha
não justificava o nome Furtado. Mas é aceitável a filiação em Afonso Furtado de Mendonça,
o que justifica plenamente quer o Furtado quer o Mendonça. Aliás, um filho daquele Fernão
da ilha Graciosa, Mundos Furtado de Mendonça, que já assina como proprietário nessa mes-
ma Graciosa um documento de 2.2.1492, teve a 28.8.1519 mercê dos ilhéus da Praia e Cara-
pacho e no mesmo ano tirou carta de armas para Mendonça, a saber:
«D. Manuel por graça de Deus etc. Fazemos saber a quantos esta nossa carta de Brazão
d'armas, nobreza e fidalguia virem. Faço saber que Mundos Furtado de Mendonça mo-
a
rador nas Ilhas Terceiras nos fez petição como ele descendia da geração e linhagem
dos Mendonças d'estes Reino que n'elle são fidalgos, e por que de direito suas
armas, insígnias e mais privilégios lhe pertencem, e pedindo-nos por mercê, que por
a memoria de seus antepassados se não perder e elle poder usar, trazer e gozar das insi-

73
d
gnias e armas que seus avós por seus merecimentos ganharam, usaram e houveram e
lhe foram dadas lhe mandássemos dar nossa carta d'ellas acerca do que mandamos tirar
antiga inquirição de testemunhas por officiaes da nossa corte, porque somos certo
descendia da dita geração que n'este Reino são fidalgos muito honrados, as quaes ar-
mas estão escriptas em os nossos livros de registos das armas dos fidalgos que tem Por-
tugal nosso rei das armas principal, as quaes lhe mandamos dar em uma carta divisadas,
illuminadas com seu brazão, timbre e sineira como são, a saber: Um escudo coartellado
em campo partido em aspa, o primeiro em campo de ouro com um escudo de prata,
e o segundo verde e uma banda de vermelho perfilhada de ouro, e uma aza de ouro, e
por differença uma merleta de preto, e elmo de prata aberto e guarnecido de ouro, pa-
quife e metal e de verde, e por timbre uma aza de ouro com um cetro d'armas, as quaes
todas podem trazer, usar, gozar, e d'ellas usar e gozar, valer-se, honrar-se, d'aproveitar-
se assim e da maneira que se acharem e troxeram seus antepassados e seus antigos fidal-
gos, e com ellas possa entrar em batalhas, campos, reptpos e desafios, e em todos os mais
actos de guerra e de paz que o direito lhe der logar, e assim em seus signaes, signetes,
nas portas e janellas de suas casas e edificios, e deixal-as sobre a sua própria sepultura,
finalmente se possa servir e honrar, e aproveitar dellas, e havemos por bem e nos praz que
elle e todos seus descendentes hajam todas as honras, prorogativas, preminencias, liber-
dades, previlegios, graças e merces que devem haver os antigos fidalgos e outros de an-
tiga geração, linhagem e casa dos Mendonças, por quanto assim me praz e é mi-
nha merce e mando a todas as minhas justiças, e geralmente a todos os fidalgos de meus
Reinos e senhorios, e em particular aos d'esta geração e a todas outras quaesquer out-
ras pessoas que vivendo o suplicante a lei da nobreza lh'as deixem trazer, usar e d'ellas
gozar e assim das muitas graças e preveilegios que n'esta nossa carta se contem e as gu-
ardem e façam em tudo guardar e cumprir como nellas se faz menção, por quanto assim
nos praz e é nossa merce, como dito é, a qual lhe mandamos passar em Lisboa em o an-
no do Senhor de mil quinhentos e dezanove; feita e sobscrita por tabellião que para isto
de nós teve poder e authoridade, e por nós assignada como se segue = El Rei».
Este brasão é estranho, desde logo porque esquartela o escudo em aspa, ou seja, francha-
do, portanto com quatro quartéis, e só descreve dois. Pelo que se supõe que as armas origi-
nais dos Mendonça (em campo verde uma banda de vermelho perfilada de ouro) vão nos 2º
e 3º quartéis (os laterais), enquanto no 1º e 4º vai o escudo de prata em campo de ouro. Por
outro lado, se já as armas originais dos Mendonça juntavam cor com cor, e por isso se acres-
centou depois o perfilado de ouro, as armas do 1º quartel também juntam metal com metal.
E a que correspondem esta últimas? Em Espanha nunca os Mendoza ou os Hurtado de Men-
doza as usaram.
Acresce ainda que o escudo franchado foi, como já vimos, introduzido na família em 1440
pelo 1º marquês de Santillana (Santander), D. Iñigo López de Mendoza y la Vega, nascido em
1398, filho de D. Diego Hurtado de Mendoza, 10º senhor de Mendoza e almirante de Castela,
e de sua 2ª mulher (casados em 1395) D. Leonor de la Veja, que assim compôs o seu escudo:
no 1 e 4º Mendoza e no 2º e 3º la Veja (de ouro, com a inscrição AVE MARIA GRATIA PLENA)
As armas dos Hurtado espanhóis são dez panelas (folhas de golfão) de prata em campo ver-
melho. Antes de 1440, os Hurtado de Mendoza usavam um escudo esquartelado de Men-
doza e Hurtado, como se documenta, e que também aparece com uma bordadura de cadei-
as. Mas em Portugal, as armas dos Hurtado espanhóis (dez panelas de prata em campo ver-
melho) são atribuídas aos Arraes, com menos uma panela!
Ainda em Portugal, pelo menos desde o séc. XVI, os Furtado de Mendonça usam também
(certamente por influência do marquês de Santillana, tal como aconteceu com outros Hur-
tado de Mendoza em Espanha que dele não descendiam) um escudo franchado. No 1º e no
3º quartéis têm uma banda de vermelho, perfilada de ouro, em campo verde (Mendonça).
Mas no 2º e 4º têm um inusitado S de negro, o da direita voltado, em campo de ouro. Por
timbre têm uma também inusitada asa de águia de ouro com um S de negro. Ora, nem este
escudo com o S de negro, nem o timbre, são conhecidos em Espanha.
Mas que armas são estas, as do S negro? Como vimos, não são Furtado/Hurtado, da D. Leo-
nor Furtado casada com Diego López de Mendoza. Será que são as dos Furtado portugue-
ses, distintos dos espanhóis? Mas, se assim é, porque não vão no lugar da varonia?

A asa e o misterioso escudo de prata. Dado que justamente vão no 1º


6.2 quartel (varonia), nas armas concedidas em 1519 a Mundus Furtado de Mendon-
ça, mais natural é que as armas dos Furtado portugueses sejam o tal escudo de prata em cam-
po de ouro, eventualmente tendo por timbre o cetro de armas. Talvez umas armas que foram
concedidas ao velho capitão Afonso Furtado (a quem um cetro de armas por timbre calhava
bem), ou até a seu pai. De resto, estas armas tanto podiam ser dadas (não há registo) como
assumidas. Sabe-se que nessa época em Portugal os burgueses ricos tinham brasão de ar-
mas, à imagem do que se passava no resto da Europa. Dom Afonso V tem aliás uma lei que
proíbe os burgueses de ordenarem brasões de armas usando metais, permitindo apenas co-
res. O que significa que antes e então os burgueses ordenavam armas com metais.
De notar ainda que, nas armas atribuídas a Mundos Furtado de Mendonça, no quartel dos
Mendonça aparece uma asa de ouro (uma diferença?), que também aparece como timbre,
acrescida de um cetro de armas. Justamente o timbre depois usado pelos nossos Furtado de
Mendonça, se bem que já com um S de negro em vez do cetro de armas.136
De tudo isto, o que se pode concluir é que as armas (novas ou não) de Afonso Furtado eram
de ouro com um escudo de prata. Portanto claramente distintas das dos Furtado/Hurtado es-
panhóis, descendentes da raínha, que usavam as armas que aqui foram atribuídas erradamen-
te aos Arraes. E que sua mulher, a proposta D. Maria de Mendonça, usava as armas dos
Mendoza com uma asa de ouro sobreposta, o que claramente remete para as seis asas que
rodeiam um selo de 1391 do almirante D. Diego Hurtado de Mendoza, seu proposto pai. As-
a
sim, a asa usada na heráldica dos nossos Furtado de Mendonça é mais um indício
que apoia a hipótese de D. Maria de Mendonça ser filha do almirante.
O filho de Afonso Furtado e D. Maria de Mendonça, Afonso Furtado de Mendonça, terá as-

75
d
sim esquartelado as armas de Furtado e Mendonça (com asa de ouro), provavelmente já em
aspa, como fez o marquês de Santillana, cerca de 14 anos mais velho, que na hipótese aven-
tada seria seu tio. E são estas as armas atribuídas a seu neto madeirense Mundos Furtado de
Mendonça, conforme se usavam na «linhagem e casa dos Mendonças», de quem era «cer-
to» que descendia, conforme sem margens para dúvidas se diz na sua carta de armas.
No continente, na linha principal, talvez Nuno Furtado de Mendonça, filho sucessor daquele
Afonso, tenha deixado cair as armas dos Furtado (varonia), esquartelando, também em aspa,
os Mendonça (já sem a asa de ouro, que só se manteve no timbre), que passaram para o 1º
quartel, com as tais armas do S de negro em campo de ouro. Sendo que estas são as armas
que na reforma manuelina (Livro do Armeiro Mor, Sala de Sintra, etc.) aparecem atribuídas
aos Furtado de Mendonça portugueses, e que rapidamente se estenderam às linhas que não
descendiam de Nuno Furtado de Mendonça.
De onde vem o escudo do S, não se sabe. O investigador brasileiro Manoel César Furtado
chamou a nossa atenção para o facto de a rainha Dona Urraca, que teve ilegítimo (a furto)
Fernando Perez Furtado, ter como símbolo justamente este S. Por muito curiosa e inespera-
da que seja esta associação, não parece que possa ser justificação, uma vez que se sabe que
as armas dos Hurtado de Mendoza não têm esse S. Outros falam numa reminiscência das re-
feridas cadeias que antes de 1440 aparecem em bordadura do escudo esquartelado de Men-
donça e Furtado. Mas uma coisa é uma diferença, ou o acrescento de uma bordadura, e
outra bem diferente é um escudo de armas, o que o S em campo de ouro é. Para todos os
efeitos, do ponto de vista heráldico, este escudo, que aparece no séc. XV, ou corresponde a
uma família que se cruzou com os Furtado de Mendonça, ou trata-se de armas novas, es-
quarteladas com Mendonça, dadas possivelmente a Nuno Furtado de Mendonça.
A primeira hipótese não se vê como pode ter acontecido, uma vez que a mãe de Nuno Fur-
tado de Mendonça era Nogueira. Podiam de facto ser as armas da 2ª mulher de Afonso Fur-
tado de Mendonça, D. Beatriz de Villaragut, filha dos barões de Olocau. Mas as armas dos
Villaragut, família da Sicília que no séc. XIV foi para Palermo, não têm nada a ver com o S. E,
sobretudo, só os filhos do 2º casamento de Afonso Furtado de Mendonça descendem dela.
A outra hipótese é alguém, provavelmente Nuno Furtado de Mendonça, ter tido armas no-
vas. Há outros exemplos, como o do grande Luiz de Loureiro que a 26.7.1551 teve armas no-
vas, esquarteladas com Figueiredo, as armas da sua família. Como estas armas novas, a te-
rem sido dadas, o foram no séc. XV, antes da reforma, talvez por isso não haja registo delas.
E, neste caso de armas novas, pode ter havido uma rebuscada associação ao S de Dona
Urraca, se disso havia então conhecimento, o que muito duvidamos. Como hipótese mais pro-
vável, podia ser uma referência aos fuzis do Livery Collar que seu pai teria recebido, numa
justa homenagem ao velho capitão-mor do mar, fundador da Casa. Também é possível que
o S derive das armas dos Hurtado de Mendoza, da Casa de Sanin, na Galiza, que além do fran-
chado usavam, certamente numa reminiscência da bordadura Mendoza, umas cadeias numa
disposição que lembra o S. Mas isso apontaria, apesar deste escudo de armas da Casa de Sa-
nin ser necessariamente posterior a 1440, para que D. Maria de Mendonça fosse desta Casa
galega, o que, pelo que ficou dito, não parece.
O certo é que André Furtado de Mendonça, nascido em meados de quinhentos, governador
da Índia em 1609 e falecido no ano seguinte, bisneto de Nuno Furtado de Mendonça, apa-
rece no seu quadro do palácio de Goa com as armas do marquês de Santillana, ou seja, um
escudo esquartelado em aspa de Mendonça e la Vega, coisa a que não tinha o mínimo dire-
ito, como já Alão alerta. Poderá dizer-se que o seu quadro não é coevo e que pode tratar-se
de interferência posterior. Mas, nesse caso, porque razão seu primo-tio D. João de Mendon-
ça, governador da Índia a 29.11.1564, tem no seu quadro no mesmo palácio de Goa as
armas de Mendonça esquarteladas em aspa com as do S negro?
Mas mais importante ainda é o facto de Duarte Furtado de Mendonça, irmão de Nuno Fur-
tado de Mendonça, estar sepultado no convento do Espinheiro com o escudo de armas do
marquês de Santillana, ou seja, Mendonça e la Veja. A questão aqui é saber ao certo se este
túmulo foi feito quando da sua morte em 1494 ou posteriormente, já em meados do séc.
XVI, sendo o epitáfio portanto transcrito de um túmulo anterior. Pela aparência é difícil dizer,
pois essa diferença de cerca de 60 anos não permite conclusões definitivas.
Se a pedra tumular foi feita quando da morte de Duarte Furtado de Mendonça, e portanto
este usava as armas do marquês de Santillana, trata-se do mais antigo documento heráldico
desta família. E, sobretudo, evidencia o muito precoce uso das armas do marquês de San-
tillana, o que só é aceitável se de facto D. Maria de Mendonça fosse meia-irmã do
marquês. É evidente que o uso das armas dos la Veja continuava abusivo, mas semelhante
apropriação, tão precoce, não só já se entenderia melhor como constitui mais um fortíssimo
indício da filiação que propomos.
Por outro lado, se a pedra tumular é coeva, isso necessariamente significava que os dois ir-
mãos usavam armas diferentes: Duarte as do marquês de Santillana (nesta proposição
seu tio-avô), e Nuno as armas com os "S", como dissemos muito possivelmente armas no-
vas, provavelmente a evocar o Livery Collar do avô, o velho capitão-mor do mar. E esta dupli-
cidade manteve-se na descendência de ambos, como por exemplo demontram as sepulturas
no Espinheiro de três irmãos, netos de Duarte Furtado de Mendonça, duas armoriadas com
Mendonça e la Vega e uma com Mendonça e o S, como adiante se diz. E permanece nos
nossos dias, com os duques de Loulé a usarem Mendonça e la Vega, enquanto muitas ou-
tros ramos usam Mendonça usam o S.

cd
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d
7 Esquema genealógico
Segue um esquema genealógico das primeiras gerações Furtado de Mendonça até ao séc.
XVI, baseado no Livro de Linhagens do Séc. XVI e em Damião de Góis, com acrescentos fun-
dados em documentação primária e nas deduções acima explanadas, mas expurgado de to-
dos os acrescentos de genealogias tardias, mesmo de Alão de Morães, que não tenham
verosimilhança ou suporte documental. Como tal, este esquema pode não ser completo, mas
procura apenas ser um seguro suporte genealógico, aberto a todos os acrescentos docu-
mentados que lhe possam ser feitos.

Afonso Furtado de Mendonça, nascido cerca de 1412 e falecido pouco antes de 1475,
1 foi anadel-mor de besteiros do conto, cargo em que é nomeado, como Afonso Furtado
de Mendonça, quando a 14.4.1444 Dom Afonso V lhe doa uma tença anual de seu ofício de
2.571 reais brancos, a pagar a partir de 1 de Janeiro desse ano, tendo depois a mesma mercê,
acrescida de uma peça de Chipre, a 26.8.1451. Já era do Conselho a 19.3.1462 quando um
seu caseiro tem carta de privilégio real. A 17.9.1467 Dom Afonso V doa a Afonso Furtado,
do seu Conselho, enquanto sua mercê for, uma tença anual de 20.000 reais de prata, a par-
tir de 1 de Janeiro de 1468. Ainda vivia a 4.9.1472 quando o rei doa a Afonso Furtado, do seu
Conselho e anadel-mor dos besteiros do conto, enquanto sua mercê for, outra tença anual
de 10.000 reais de prata, a partir de 1 de Janeiro de 1473. Afonso Furtado de Mendonça c. a
1ª vez cerca de 1436, e seguramente antes de 8 de Junho deste ano, c. Constança Nogueira (a),
filha mais nova de Afonso Anes Nogueira, alcaide-mor de Lisboa e morgado de S. Lourenço,
falecido em 1426, e sua mulher Joana Vaz de Almada, e neta paterna do celebrado Doutor
João das Leis, mordomo-mor e chanceler-mor de Dom Pedro I e do Conselho de Dom Fer-
nando, administrador da capela de D. Pedro Pires, em Beja, e de sua mulher Constança Anes
Palhavã, que instituiu a capela de S. Lourenço de Lisboa, onde estão sepultados. Afonso Fur-
tado de Mendonça c. a 2ª vez cerca de 1445 c. D. Beatriz de Vilharguda (b), que o LL XVI
chama D. Beatriz de la Raguta, dizendo-a «criada» da infanta Dona Isabel (mulher do infante
Dom Pedro), e Damião de Góis chama D. Beatriz de Villaraguta, valenciana, criada da mesma
infanta e filha de António de Villaragut, senhor de Olocau, e de sua mulher D. Beatriz Parda.
Mas nós documenta-mo-la como «D. Beatriz de Vilharguda, mulher de Afonso Furtado»
quando a 20.7.1469 obtém do rei carta de aposentação para seu amo Gil Anes, vassalo,
morador no Lumiar, que não é referenciado como estrangeiro, o que pressupõe que ela já
nasceu em Portugal ou pelo menos para cá veio criança. Apesar da deturpação do nome do-
cumentado, deve de facto trata-se, como dizem as genealogias espanholas, de uma filha de
António de Villaragut, 3º barão de Olocau, e de sua mulher D. Beatriz Parda de la Casta, casa-
dos em 1423; neta paterna de Ramon de Villaragut, 2º barão de Olocau, falecido em 1417, e
de sua mulher D. Filipa de Villanova; bisneta de António de Vilaragut, 1º barão de Olocau (1388),
e de sua mulher D. Juana Mercer; trineta de Ramon de Villaragut, barão de Tripi, e de sua mu-
lher Diana Visconti; e 4ª neta de Bernardo de Villaragut, 5º visconde de Subirrats, e de sua
mulher Geralda Sarriá.

1.1. (a) Nuno Furtado de Mendonça, que segue.


1.2. (a) Duarte Furtado de Mendonça, fidalgo da Casa Real, do Conselho, n. cerca de 1438 e
fal. em 1494. Foi comendador do Torrão na Ordem de Santiago e anadel-mor de bes-
teiros. DG diz que foi comendador de Salvaterra e Santos. Ainda menor, a 24.12.1450, é
referido apenas como fidalgo quando sua ama Beatriz Anes obtém do rei uma carta de
privilégio. A 16.8.1472 já vem referido como Duarte Furtado, comendador da vila do Tor-
rão, quando Dom Afonso V lhe faz mercê de todos os bens móveis e de raiz pertencentes
a João Valadim, que os perdera. A 7.4.1475, referido como Duarte Furtado, comendador
do Torrão da Ordem de Santiago, tem do rei carta de privilégio para arrendar por três anos
a sua comenda. A 19.9.1475 já aparece como Duarte Furtado, anadel-mor dos besteiros
do conto, quando a seu pedido o rei manda que se respeite e guarde os privilégios dos bes-
teiros do conto. Ainda era anadel-mor em 1486, tendo falecido no cargo em 1494, com
cerca de 55 anos de idade. Já aparece como Duarte Furtado de Mendonça, do Conselho
e comendador do Torrão e anadel-mor, quando a 7.4.1486 recebeu de Dom João II o se-
nhorio de Vilalva, por duas vidas. Está sepultado no convento de Nª Sª do Espinheiro, em
Évora, do lado da Epístola, na capela de Stª Catarina, em túmulo com as armas do mar-
quês de Santillana (Mendonça e la Vega). Diz o epitáfio: «Aqui jaz o muyto honrado se-
ñor Duarte Furtado de Mendoca do Cõselho del rey e seu anadel mor destes reinos e fi-
nouse A.M. CCCC LRIIIJ ». A pedra tumular é em mármore branco, tal como a de sua mu-
lher, com as armas de Mello, onde se diz: «Aquy jaz a muito honrada e vjrtuosa senhora
Dona Ginevora de Melo molher que foi de Duarte Furtado D Medoca». Duarte Furtado
c. cerca de 1462 c. D. Genebra de Mello, nascida cerca de 1447, filha de Vasco Martins de
Mello, alcaide-mor de Castelo de Vide, e de sua mulher D. Isabel de Azevedo. Vasco Mar-
tins recebeu a 20.4.1450 uma tença anual de 30.000 reais de prata até perfazer as 3.000
coroas de ouro de que o rei lhe prometera pelo seu casamento com D. Isabel. É o Vasco
Martins de Mello, do Conselho e alcaide-mor de Castelo de Vide, a quem Dom Afonso V
doa 12.8.1475 o serviço novo e velho dos judeus do Crato e Nisa. E o que a 26.12.1443,
ainda não do Conselho mas já alcaide-mor de Castelo de Vide, é nomeado fronteiro-mor
desta vila. E ainda o Vasco Martins de Melo, fidalgo da Casa Real e alcaide-mor de Évora,
que a 26.12.1443 teve do rei uma tença anual de 1 conto de libras, a serem pagas do al-
moxarifado dessa cidade, como já usufruía no tempo de Dom Duarte.
1.2.1. D. Margarida Furtado de Mendonça, n. cerca de 1463, foi a 1ª mulher (casada cerca
de 1479) de Jorge da Silveira, camareiro-mor do duque de Viseu, do Conselho e guar-
da-mor do infante Dom Fernando. Destes foram filhos António da Silveira, fal. em
1530, casado com D. Ginebra de Brito (filha de Jorge de Brito e D. Violante Pereira),
a
bem como seus irmãos Vasco da Silveira, casado com D. Leonor de Mello (filha de
Garcia de Mello e D. Guiomar Henriques), e Fernão da Silveira, casado com D. Guio-
mar da Cunha (filha de Fernão da Cunha e Isabel da Fonseca), todos sepultados no
Espinheiro, no túmulo do 1º com um escudo de Silveira, Brito, Mendonça (de la Vega)

79
d
e Pereira, no do 2º com um escudo de Silveira, Mello, Mendonça (de la Vega) e Henri-
ques, e no 3º com um escudo de Silveira, Cunha (de Tábua), Mendonça (com S) e Fon-
seca. Estas armas não são dos próprios, mas aparentemente de suas mulheres, como
a ordenação mostra. Contudo, todos têm elmo, dois de frente e um (o que pela infor-
mação heráldica presumimos de Fernão, pois não tem letreiro) com elmo e timbre
(Silveira) invertidos e paquife. De registar ainda a particularidade de os dois primeiros
usarem Mendonça com la Vega e o último Mendonça com o S, o que demonstra que
então a família considerava ambas as armas, indiferentemente, como as suas.
1.2.2. Álvaro de Mendonça, comendador do Torrão. C.c. (D. Beatriz da Silva), filha de Fer-
nando Mascarenhas, comendador de Aljustrel. Este Fernando deve ser filho do Mar-
tim Vaz Mascarenhas a quem a 31.1.1444 Dom Afonso V doa, com o consentimen-
to de D. Fernão Martins Mascarenhas, comendador-mor da Ordem de Santiago, a
comenda de Aljustrel, desta ordem, que ficara vaga por morte de Martim Corrêa. Há
ainda um outro Fernão Martins Mascarenhas, fidalgo da Casa Real, a quem o rei doa
vitaliciamente a 11.10.1463 a terra de Mascarenhas, na comarca de Trás-os-Montes,
com todas as suas rendas e direitos, e que havia pertencido a Álvaro Fernandes Car-
valho, que morrera. Devendo ser este o que a 16.9.1475 é nomeado vitaliciamente
para o cargo de coudel em Alcácer do Sal, em substituição de João de Freitas. Àquele
outro Fernão Martins Mascarenhas, que também aparece com Dom, comendador-
mor da Ordem de Santiago e do Conselho, doou Dom Afonso V a 8.2.1444, pelos
serviços prestados à dita Ordem como regedor enquanto o infante Dom Fernando
não atingir a idade para o cargo, as comendas de Mouguelas, Montel e da Roliça, da
comarca de Óbidos, que se encontrava vaga por morte de Gonçalo Mendes de Vas-
concelos, com todas as casas, casais, bens, foros, rendas e direitos.
1.2.2.1. Duarte Furtado, que morreu na Índia.
1.2.2.2. Filhas «que são freiras» (LL XVI).
1.2.3. Afonso Furtado, comendador de Cardiga na Ordem de Cristo, fal. antes de 1521. C.c.
D. Violante de Souza, filha de Vasco Martins Chichorro, capitão dos ginetes d'el rei
(28.7.1467), do Conselho e capitão das galiotas reais (4.7.1481). A 26.8.1521 Dom Ma-
nuel I faz saber a «donna Violante de Souza molher q. foy de Afonso Furtado» que
segurava as arras de 5.000 coroas prometidas para o casamento de seu filho Nuno
Furtado, fidalgo da Casa Real, com D. Constança de Castro, filha de Pedro Álvares
Cabral «que Ds perdoe».
1.2.3.1. Nuno Furtado, fidalgo da Casa Real e comendador de Cardiga, que c. depois
de 26.8.1521 c. D. Constança de Castro, filha do celebrado Pedro Álvares Ca-
bral, a qual levou em dote a renda dos linhos de Torres Vedras, mas faleceu pou-
co depois de casada, antes de 1527, s.g.
1.2.3.2. Henrique Furtado, fal. solt. s.g.
1.2.3.3. Francisco de Mendonça, que c.c. Leonor Pereira, c.g. extinta.

1.2.4. D. Cecília de Mendonça, que c.c. João Falcão, anadel-mor de besteiros, filho de Gon-
çalo Falcão, alcaide-mor de Mourão. C.g.
1.3. (a) D. Violante Nogueira, donzela da Casa da rainha Dona Catarina, que por tanto rece-
beu uma tença anual de 20.000 reais de prata a 29.5.1471, foi a 16.3.1486 nomeada co-
mendadeira do mosteiro de Santos, da Ordem de Santiago. N. cerca de 1440 e fal. em
1508.
1.4. (b) D. Maria de Mendonça, n. cerca de 1446. Foi a 1ª mulher de João de Brito, comen-
dador, n. cerca de 1448, filho dos morgado de S. Lourenço de Lisboa e de Stº Estêvão de
Beja, sendo certamente o João de Brito, fidalgo da Casa Real, que a 1.5.1475 obtém
autorização do rei para arrendar por três anos as suas comendas.
1.4.1. Pedro de Mendonça, que c.c. D. Maria, filha de Duarte Brandão.
1.4.1.1. Francisco de Mendonça, fal. solt. s.g.
1.4.1.2. D. (Ana) de Mendonça, que c.c. seu primo Simão de Mendonça, referido adi-
ante.
1.4.2. D. Beatriz, freira (diz LL XVI).
1.5. (b) Diogo de Mendonça, fidalgo do Conselho, n. cerca de 1447 e fal. em 1516, foi alcaide-
-mor de Mourão (22.8.1476) e sucedeu ao irmão Duarte Furtado como anadel-mor dos
besteiros do conto (15.3.1494), cargo extinto em 1499, tendo por carta de 10.3.1500 re-
cebido uma tença anual de 92.000 reais, sendo 80.000 pelo ofício perdido e o restante
pelo serviço dos expulsos judeus de Mourão. É certamente o Diogo de Mendonça, fidal-
go da Casa Real, cujo criado Pedro Carvalho tem a 23.10.1475 carta de perdão da justiça
real. C.c. Beatriz Soares, filha bastarda de Fernão Soares de Albergaria, senhor do Prado,
e de Maria Gonçalves, moça solteira de Alcafache.
1.5.1. Francisco de Mendonça, que morreu em vida de seu pai, antes de 1510. C.c. D. Leo-
nor de Almeida, filha de D. Francisco de Almeida, 1º vice-rei da Índia. D. Leonor ca-
sou 2ª vez, com contracto de 20.11.1510, com D. Rodrigo de Mello, 1º conde de Ten-
túgal.
1.5.1.1. D. Beatriz de Mendonça, que c.c. Francisco de Souza, que foi vedor da fazenda de
Dom João III
1.5.1.2. D. Maria de Mendonça, que c.c. Duarte de Costa, filho de Álvaro da Costa,
guarda-roupa de Dom Manuel I.
1.5.2. Pedro de Mendonça, alcaide-mor de Mourão (14.7.1517). C.c. D. Teresa de Lima, filha
de D. Álvaro de Lima, monteiro-mor do reino.
1.5.2.1. ?Francisco de Mendonça, alcaide-mor de Mourão em 1580, quando negociou
com Castela a entrega dos castelos de Mourão, Ferreira do Alentejo e Alan-
droal.
1.5.2.2. Diogo de Mendonça, que c.c. D. Maior Manoel (de Vilhena).
a
1.5.2.2.1. D. Helena de Mendonça, que c.c. seu primo João de Mendonça, referi-
do adiante.
1.5.2.2.2. Francisco de Mendonça, em quem seguiu o cargo de alcaide-mor de

81
d
Mourão.
1.5.3. António de Mendonça, o «Martelo», que c.c. Beatriz de Abreu.
1.5.3.1. D. Antónia de Mendonça, que c.c. D. Vasco Mascarenhas.
1.5.4. Cristóvão de Mendonça , capitão de Ormuz, onde fal. em 1530.C.c. Maria de Tovar.
1.5.5. D. Isabel de Mendonça, n. cerca de 1480, c.c. D. João Manoel de Vilhena, 3º senhor
de Cheles, c.g.
1.5.6. D. Margarida de Mendonça, que depois de viúva foi camareira-mor de Dom Sebas-
tião, funções que também tinha desempenhado na corte da infanta Dona Maria, de-
pois casada com D. Filipe II. C.c. Jorge de Mello, monteiro-mor do reino (1.12.1521),
moço fidalgo da Casa Real, comendador da Ordem de Cristo, n. em Serpa cerca de
1480 e fal. cerca de 1545.
1.5.6.1. Manuel de Mello, monteiro-mor do reino (1545), moço fidalgo da Casa Real,
comendador da Ordem de Cristo, embaixador a Castela, etc., n. cerca de 1520
e fal. cerca de 1590. C.c. D. Guiomar Henriques. Teve de Maria Ferreira um filho
legitimado.
1.5.6.1.1. Jorge de Mello, familiar do Stº Ofº, fal. solt. s.g.
1.5.6.1.2. Garcia de Mello, que c.c. D. Maria de Menezes, s.g.
1.5.6.1.3. Francisco de Mello, monteiro-mor do reino, familiar do Stº Ofº (1642),
que c.c. D. Luiza de Mendonça, filha de Pedro de Mendonça e sua mu-
lher D. Maria de Mendonça, referidos adiante. C.g.
1.5.6.1.4. D. Vicência Henriques, que c.c. Luiz César de Menezes, alferes-mor do
reino.
1.5.6.1.5. (L) Jácome Ferreira de Mello, n. cerca de 1565, legitimado por Dom Fi-
lipe II, que c. a 2.1.1600 em Lisboa c. Maria de Mattos Vilasboas, c.g.
nos Mello Paes do Amaral, da casa de Santar, depois condes de Santar.
1.5.6.2. João de Mello, m.n.
1.5.6.3. António de Mello, fal solt. s.g.
1.5.6.4. D. Joana de Mello, que c.c. D. Manuel da Câmara, capitão da ilha de São Mi-
guel.
1.5.6.5. D. Isabel de Mendonça, que c.c. D. João Teles de Menezes.
1.5.6.6. D. Maria de Mendonça, que c.c. Manuel de Mello Coutinho.
1.5.6.7. Francisco de Mello, que c.c. D. Madalena de Mendonça.
1.5.6.8. Garcia de Mello
1.5.7. D. Joana de Mendoça, n. cerca de 1500 e fal. em 1580. C. em 1520 c. Dom Jaime, 4º
duque de Bragança (1496), fal. a 22.12.1532.
1.5.7.1. D. Joana de Bragança, n. em 1521 e c.c. D. Bernardo de Cardenas, marquês de
Elche.
1.5.7.2. D. Jaime de Bragança, clérigo, c.g.
1.5.7.3. D. Constantino de Bragança, 7º vice-rei da Índia, n. em 1532 e c.c. D. Maria de
Melo (Ferreira), c.g.
1.5.7.4. D. Fulgêncio de Bragança, 11º Dom prior da colegiada de Guimarães, c.g.
1.5.7.5. D. Teotónio de Bragança, arcebispo de Évora.
1.5.7.6. D. Eugénia de Bragança, n. cerca de 1529 e fal. a 12.8.1559. C., com contracto
de 14.8.1549, c. D. Francisco de Melo, 2º conde de Tentúgal (6.6.1556), fal. em
1588.
1.5.7.6.1. D. Rodrigo de Melo, n. cerca de 1551 e c.c. D. Catarina de Eça, c.g.
1.5.7.6.2. D. Nuno Álvares Pereira de Melo, 3º conde de Tentúgal, n. cerca de
1555, e c.c. D. Mariana de Castro (Altamira), c.g.
1.5.7.6.3. D. João de Bragança, n. em Água de Peixes, fal. em Évora a 4.2.1609,
religioso.
1.5.7.6.4. D. Constantino de Bragança, n. cerca de 1560, c. a 1ª vez c. D. Maria
de Mendoça, s.g., e a 2ª vez c. D. Beatriz de Castro, c.g.
1.5.7.6.5. D. Joana de Mendonça, fal. a 30.12.1616, religiosa.
1.5.7.7. D. Maria de Bragança, fal. a 6.7.1586, freira no Mosteiro das Chagas de Vila Vi-
çosa
1.5.7.8. D. Vicência de Bragança, fal. a 23.6.1603, freira no Mosteiro das Chagas de Vi-
la Viçosa (Madre Vicência do Espírito Santo).

1.6. (b) Pedro de Mendonça, fidalgo da Casa Real, n. cerca de 1448, s.g. É certamente o Pe-
dro de Mendonça cujo criado, Fernando Agea, é nomeado a 25.10.1475 juiz das sisas na
vila de Soure.
1.7. (b) João de Mendonça, «o Cação», que parece ter sido alcaide-mor de Chaves. C.c. D. Fi-
lipa de Mello, sobrinha de mulher de seu meio-irmão mais velho Duarte Furtado. Esta sua
mulher D. Filipa era filha de Vasco Fernandes de São-Paio, senhor de Vila Flor e Chacim, e
de sua mulher D. Mécia de Mello, irmã de D. Genebra, referida acima. A 2.10.1469 Dom
Afonso V privilegia Rui Gonçalves Alcoforado e a sua mulher Filipa Vasques, concedendo-
-lhes licença para vender a sua terra de Bemposta, com seus termos, direitos, rendas, tri-
butos e jurisdição cível e crime, a Vasco Fernandes de Sãopaio, do Conselho, e a sua mu-
lher D. Mécia de Melo, mediante determinadas condições. A 27.12.1479 Dom Afonso V
confirma a Fernão Vasques de Sãopaio, a pedido de sua mãe dona Mécia de Melo, viúva
de Vasco Fernandes de Sãopaio, fidalgo da Casa Real, o privilégio de nomear coudeis pa-
ra Ansiães, Vila Flor, Torre de Moncorvo, Lamas, Mós, Larinho, Castanheira e Vila Boa e
em todos os outros seus lugares, da mesma forma que tiveram seu pai (10.4.1452) e avô,
mandando o monarca que os coudeis que forem nomeados tirem carta de ofício de três
a
em três anos.
1.7.1. António de Mendonça, que c. a 1ª vez c. Beatriz de Abreu ou da Costa e a 2ª com
Margarida Pacheco.
1.7.1.1. João de Mendonça, que aparece como João de Mendonça Cação, fidalgo da

83
d
Casa Real e do Conselho, quando com sua mulher D. Helena de Mendonça, sua
prima, referida acima, vendeu a 10.5.1577, para a constituição do morgadio de
Aleixo Dias Falcão, a quinta da Gataria, no termo de Alenquer, sendo aí referi-
do que tinha casado a 1ª vez com D. Joana Manoel, com quem tinha compra-
do a dita quinta da Gataria a 18.8.1557 a Francisco de Mello Soares e sua mu-
lher D. Branca de Menezes.
1.7.1.1.1. Diogo de Mendonça, governador do Brasil em 1623. Preparou a defe-
sa da Baía contra os holandeses e foi por estes feito prisioneiro.
1.7.1.1.2. D. Mariana de Mendonça, que c.c. Pedro de Mendonça, filho de Tristão
de Mendonça e sua mulher D. Ana de Mendonça.
1.7.1.1.3. Outros, segundo Alão.
1.7.2. Nuno Furtado, fal. solt.
1.7.3. Simão de Mendonça, que foi comendador de Portalegre. C.c. («he casado» - LL XVI)
D. (Ana) de Mendonça, sua prima, filha de Pedro de Mendonça, referido acima.
1.7.4. D. Violante de Mendonça, que c.c. Aires de Souza, comendador de Alcobaça de San-
tarém
1.7.5. D. Maria, que c.c. Henrique Moniz, comendador.
1.8. ?(N) (D.) Catarina de Mendonça, filha natural não referida nos nobiliários. N. cerca de
1430, sendo seu pai ainda jovem e solteiro. C. cerca de 1446 c. Bertholomeu Perestrello,
o Velho, de quem foi 3ª mulher, n. em 1396 em Lisboa e fal. cerca de 1457 na vila da
Baleira, em Porto Santo, sendo sepultado, ao que parece, na matriz de Nossa Senhora da
Piedade. Julga-se que já esteve na conquista de Ceuta (1415). Mas parece que não parti-
cipou na "descoberta" da Madeira nem mesmo de Porto Santo. Era fidalgo da Casa do
infante Dom João quando em 1426 o infante Dom Henrique o fez capitão da ilha de Porto
Santo e encarregou do povoamento e colonização desta ilha. Mais de 20 anos depois, a
1.9.1449, já referido como fidalgo da Casa do infante Dom Henrique, teve deste o se-
nhorio da dita ilha de Porto Santo. «Eu dou carreguo a Bertholomeu perestrello, fidalgo
de minha casa da minha ylha de porto santo para que elle dito Bertholomeu perestrello
ha mantenha por mim em Justiça & direyto & morrendo elle a mim praz que seu filho
primeyro ou algum se tal for tenha este carreguo pela guisa suso dita y asy de decem-
dente em decemdente por linha dereyta... tenha. . . jurisdiçom. .. do ciuell & crime resal-
bando morte ou talhamento de membro...».
1.8.1. Catarina Furtado, n. cerca de 1447, c. cerca 1464 c. Mem Rodrigues de Vasconcellos,
c. g. conhecida.
1.8.2. Filipa de Mendonça, n. cerca de 1448, c.c. João Teixeira, filho terceiro de Tristão Vaz,
primeiro capitão donatário da jurisdição de Machico.
1.8.3. Iseu Perestrello, n. cerca de 1449 e c. cerca de 1465 c. Pedro Corrêa, cavaleiro da Ca-
sa Real e «criado» do infante Dom Henrique, que foi capitão donatário da ilha Gra-
ciosa (em 1485, mas para onde foi muito antes) e que cerca de 1458 comprou por
300 mil reais, a 30.000 reais anuais de juro, à viúva de seu futuro sogro, o senhorio da
ilha de Porto Santo, que depois perdeu a 15.3 1473 por demanda de seu cunhado
Bartolomeu Perestrello (filho do 4º casamento de Bertholomeu Perestrello, que era
criança quando sua mãe vendeu o senhorio). C. g. conhecida.
1.9. ?(N) Rodrigo de Mendonça, filho natural não referido nos nobiliários, n. cerca de 1432, ir-
mão da anterior. Era cavaleiro da Casa Real, morador na Ilha Deserta e c.c. Catarina Tei-
xeira, de quem não tinha filhos, quando a 23.7.1471 adopta sua sobrinha-neta Filipa, cer-
tamente criança, filha de sua sobrinha Catarina Furtado e de seu marido Mem Rodrigues
de Vasconcellos. S.g.
1.10. ?(N) Fernão Furtado de Mendonça, filho bastardo não referido nos nobiliários, n. cerca de
1438, já seu pai estava casado. Foi povoador da Graciosa, onde chegou casado e com fi-
lhos (menores) cerca de 1478. C. a 1ª vez, cerca de 1462, com D. Catarina de Guevara,
filha de D. Garcia Henriques, de Sevilha, ao que supomos. C. a 2ª vez, cerca de 1490, c.
Guiomar de Freitas. C.g. conhecida de ambos os matrimónios.
1.11. (N) D. Maria de Mendonça, filha natural, referida em LL XVI e DG, cujo nome e tratamen-
to de Dona se documenta na matrícula de ordens menores de seu filho. N. cerca de 1469,
teria seu pai já cerca de 57 anos de idade. C. cerca de 1488 c. Pedro Guedes, 4º senhor
de Murça, Torre de D. Chama, Água Revez e Brunhais (7.3.1512), fidalgo da Casa do duque
de Bragança, n. cerca de 1460 e fal. em 1542.
1.11.1. Simão Guedes, 5º senhor de Murça, de Torre de D. Chama, de Água Revez e Brunhais
(23.11.1542), n. cerca de 1489, que tirou ordens menores em Chaves a 20.4.1504, foi
anadel-mor de espingardeiros, capitão-mor de Chaúl, governador do Porto e vedor
da Casa da rainha Dona Catarina. C.c. D. Helena de Mendonça, filha de Henrique de
Souza, senhor de Oliveira de Azeméis. C.g. nos condes de Murça.
1.11.2. Pedro de Mendonça, que recebeu ordens menores em Chaves com seu irmão.
1.11.3. Francisco de Mendonça Guedes, que tirou ordens menores em Chaves a 11.5.1504 e
foi capitão na Índia, para onde foi em 1528 e onde faleceu.
1.11.4. Gonçalo Guedes, n. cerca de 1493, que instituiu o morgadio e capela de Nª Sª da
Conceição de Carrazedo de Montenegro. C. cerca de 1515 c. D. Isabel de Souza, se-
nhora da quinta do Pinheiro, ib, e do couto e paço de Abelhão (Vidago), filha de João
de Souza, senhor da torre de Stº Estêvão (Chaves). C.g. conhecida.

2 Nuno Furtado de Mendonça, n. cerca de 1437 e fal. novo em 1476, deixando os filhos
menores. Mais tarde foi trasladado para o mosteiro de Santos, em túmulo mandado er-
guer por sua filha D. Ana de Mendonça. A 25.1.1463, teria 25 anos de idade, é referido como
Nuno Furtado, fidalgo d'el rei, quando obtém carta de privilégio para João Galgo, besteiro
a
de polé, morador na vila de Estremoz. Já era aposentador-mor do reino a 10.3.1466, quan-
do recebeu dois terços das 2.800 coroas de ouro que o rei lhe prometera pelo seu casamen-
to. A 16.9.1473 é referido como Nuno Furtado, do Conselho e aposentador-mor, quando sua
mulher Leonor da Silva obtém do rei para seu amo Mendo Afonso carta de vassalo e de apo-

85
d
sentadoria. A 5.4.1475 já é referido como Nuno Furtado de Mendonça, aposentador-mor,
quando Dom Afonso V lhe concede licença para arrendar, por quatro anos, quaisquer rendas
e direitos. C. cerca de 1462 c. Leonor da Silva, n. cerca de 1432 (já viúva de Martim Corrêa),
que LL XVI diz filha de Fernão Martins do Carvalhal, acrescentando DG que era da Madeira
ou foi um dos seus povoadores e que Leonor era filha de sua mulher Violante Teixeira, filha
de Tristão Vaz Teixeira, 2º capitão donatário de Machico. Aquele Fernão Martins do Carvalhal
não parece assim ser o que foi alcaide-mor de Tavira pelo menos desde 1439, faleceu no car-
go em 1450 e casou cerca de 1410 com Oriana Pereira, filha do 3º casamento de Aires Gon-
çalves de Figueiredo, com geração. A 18.7.1476 Dom Afonso V doa a Leonor da Silva, mu-
lher viúva de Nuno Furtado, que fora aposentador-mor, as tenças anuais que estão assentes
no almoxarifado de Santarém, a retirar do rendimento das sisas das carnes de Tomar e das si-
sas das Pias, Olalhas e Dornes. Leonor da Silva parece ter falecido pouco depois, uma vez que
em 1477 seu filho fica com as ditas tenças. Ficaram assim seus seis filhos órfãos de pai e mãe,
tendo o mais velho cerca de 13 anos de idade. Não conheçemos nenhum inventário de me-
nores, mas o mais natural é que tenham ficado no paço, ao cuidado do rei. E assim melhor
se compreende que o príncipe Dom João, futuro Dom João II, já casado com sua prima Dona
Leonor, se tenha enamorado de uma das filhas, D. Ana de Mendonça, que na altura do "ca-
so" teria cerca de 16 anos de idade e era donzela da Casa da rainha Dona Joana, «a Exce-
lente Senhora», e nela tenha feito um filho nascido a 11.11.1481, cerca de dois meses depois
de Dom João II subir ao trono.
2.1. Jorge Furtado de Mendonça, n. cerca de 1463, que LL XVI diz que foi comendador de Si-
nes e das estradas e represas na Ordem de Santiago e camareiro-mor do mestre desta
ordem. Por morte de seu pai, sucedeu-lhe na tença de 20.000 reais de prata por mercê
de 23.1.1477. C. a 1ª vez c. D. Isabel da Cunha (a), dama da rainha Dona Leonor, filha
mais nova de João Rodrigues de Sá, camareiro-mor de Dom Afonso V, alcaide-mor do
Porto de juro e herdade (16.6.1449), etc., e de sua 3ª mulher D. Joana de Albuquerque. C.
a 2ª vez c. D. Maria de Souza (b), que DG diz filha de Nuno de Souza. C. a 3ª vez c. D. Gui-
omar da Silva (c), filha mais nova de João Freire de Andrade, 4º senhor de Bobadela, La-
gos da Beira e Ferreira (4.12.1472).
2.1.1. (a) D. Beatriz da Cunha, que c.c. D. Francisco de Noronha, n. cerca de 1482, cama-
reiro-mor do mestre de Santiago e nesta ordem comendador de Casavél e de Sines.
2.1.2. (a) D. Ana de Mendonça, que c.c. Francisco Corrêa, comendador de Colos, Alvalade
e Vila Nova de Milfontes na Ordem de Santiago, que depois foi 3º senhor de Belas.
C.g.
2.1.3. (b) António Furtado de Mendonça, que n. em Santiago do Cacém e sucedeu como
comendador das estradas e represas na Ordem de Santiago. C.c. D. Margarida de
Noronha, filha de António Pires Pantoja e sua mulher D. Beatriz de Noronha (dos da
Madeira). C.g. (Deste foi neto paterno Afonso Furtado, n. em Santiago de Cacém, que
foi familiar do Santo Ofício a 15.10.1595).
2.1.4. (b) Afonso Furtado de Mendonça, comendador de Borba e Rio Maior. C.c. D. Joana
Pereira, filha herdeira de André Pereira, comendador de Alfaiates e morgado das Co-
berturas, e de sua mulher D. Maria de Souza.
2.1.4.1. André Furtado de Mendonça, 19º governador da Índia (1609), fal. a 1.4.1610.
Consta nos livros da Casa Real com o foro de fidalgo escudeiro, como seus ir-
mãos Jorge e João, todos filhos de Afonso Furtado de Mendonça e D. Joana
Pereira. C.c. D. Isabel, c.g.
2.1.4.2. João Furtado de Mendonça, que foi governador e capitão-general de Angola
(11.10.1593), governador do Algarve (1613), presidente do Senado da Câmara
de Lisboa, membro do tribunal supremo de Portugal em Madrid e presidente
do Conselho da Índia. C. a 1ª vez c. D. Catarina Pereira, s.g. e a 2ª vez c. D. Ma-
dalena de Távora, c.g.
2.1.4.3. Jorge Furtado, s.g.
2.1.4.4. Outros, possíveis, de que fala Alão.
2.1.5. (b) D. Margarida de Souza (não referida em LL XVI nem DG), que terá c.c. Pedro Pan-
toja, irmão de sua cunhada, acima, fidalgo do Conselho, que a 4.9.1486 teve mercê
da comenda de Santiago do Cacém, a receber depois de se habilitar à Ordem de
Santiago. C.g.
2.1.6. (c) Lopo Furtado, que parece foi comendador de Loulé e c.c. D. Luiza da Silva, filha
de Jorge Barreto, comendador de Castro Verde. C.g.
2.1.7. (c) Nuno Furtado, que parece foi comendador de Rio Torto e c.c. Beatriz de Lucena.
2.1.8. (c) João Freire de Andrade
2.1.9. (c) D. Isabel, que Alão diz ter morrido sendo dama da rainha Dona Catarina.
2.1.10. (c) D. Maria, freira, segundo Alão.
2.1.11. (c) Lourenço Furtado, segundo Alão.
2.2. D. Ana de Mendonça, n. cerca de 1464 e fal. octogenária em 1545. Foi donzela da rai-
nha Dona Joana e recolheu-se no dia de Ramos de 1508 no mosteiro de Santos, receben-
do o hábito das mãos de seu filho, já então mestre da Ordem de Santiago. Foi comeda-
deira do mosteiro durante 32 anos, sucedendo no cargo a sua tia Violante Nogueira. Teve
um filho bastardo de Dom João II, como ele próprio declara no seu testamento, no qual
deixa a D. Ana um legado de 200.000 reais.
2.2.1. (N) D. Jorge de Lencastre, 2º duque de Coimbra e mestre da Ordem de Santiago
(12.4.1492), etc., n. a 11.11.1481 em Santarém e fal. 27.7.1550 em Setúbal. C.c.g. ilus-
tríssima.
2.3. António de Mendonça, n. cerca de 1466, que parece foi comendador de Veiros, Serpa e
Moura na Ordem de Aviz (LL XVI fala dele e de sua mulher no presente, pelo que ainda
estariam vivos no 2º quartel do séc. XVI). Deve ser este o António de Mendonça cujos
poemas aparecem no Cancioneiro Geral de Garcia de Resende. E o António de Mendon-
a
ça, fidalgo da Casa de D. Jorge, duque de Coimbra e mestre de Santiago e de Avis, que
foi comendador de Cano na ordem de Avis. Na visitação ordenada por D. Jorge em 1519,
são enumeradas as pratas da igreja dessa vila. E entre vários cálices marcados com as

87
d
cruzes da ordem de Avis, destacava-se um, marcado com o signal de Ave-Maria.137 Será
possível interpretar essa referência como sendo àrmas de Mendonça com o escudo dos
la Veja, neste caso usadas por este António? C. cerca de 1490 c. D. Isabel de Noronha, n.
cerca de 1470, filha dos 2ºs e últimos condes de Abranches.
2.3.1. D. Constança de Castro, «mulher que foi» (LL XVI) (de facto foi a sua 1ª mulher) de
D. Afonso de Castello-Branco, meirinho-mor do reino.
2.3.1.1. D. Maria de Castro, que c.c. D. Garcia de Menezes.
2.3.2. Luiz de Mendonça, comendador de Veiros. C.c. D. Isabel de Castro, filha de D. Diogo
de Menezes, craveiro da Ordem de Cristo. C.g.
2.3.3. Fernão de Mendonça, que Alão diz comendador de Serpa e c.c. D. Ana de Eça, c.g.
2.3.4. D. João de Mendonça, governador da Índia (29.11.1564, por se encontrar fora o 1º
indicado, D. Afonso de Noronha), fal. em 1578 (Alcácer-Quibir). Não sabemos porque
lhe é dado o título de Dom. No seu quadro no palácio de Goa tem as armas de Men-
donça esquarteladas em aspa com as do S negro, sem timbre. C.c. D. Joana de Ara-
gão.
2.3.4.1. Nuno de Mendonça, conde de Vale de Reis (16.8.1628, em uma vida), gover-
nador da Índia (14.8.1631), governador e capitão-general de Tanger, etc, fal.
em 3.3.1632, c.c.g. nesta Casa.
2.3.4.2. ?Doutor António de Mendonça, n. em Serpa cerca de 1510, que foi reitor da
Universidade de Coimbra, licenciado em Cânones e o 1º cónego doutoral da Sé
de Lisboa. Foi depois cónego da Sé de Évora e deputado da Inquisição desta
província, comissário da Bula da Cruzada e presidente da Mesa da Consciência.
Já com Dom Filipe II, foi escolhido a 3.9.1594 para reitor da Universidade de Co-
imbra, cargo que exerceu até 15.9.1597, ano em que terá falecido.
2.4. D. Maria de Mendonça, que morreu em Tomar de um desastre, referida por LL XVI mas
não por DG.
2.5. D. Joana de Mendonça, freira em Santos.
2.6. D. Isabel de Mendonça, n. cerca de 1472, que c.c. D. Pedro de Castello-Branco, que ainda
como Pedro Vaz de Castello-Branco, fidalgo do príncipe Dom João, sendo menor de ida-
de, teve a 23.2.1481 mercê real para sucedeu a seu pai como almotacé-mor do reino, fi-
cando seu irmão Martim a exercê-lo interinamente até ele fazer 18 anos. D. Pedro era ir-
mão do 1º conde de Vila Nova de Portimão.
2.6.1. D. Antónia de Mendonça, que c.c. Jorge de Mello, «o Picota».
2.6.2. D. Simão de Castello-Branco, c.c.g.

cd
Notas
1. Alão de Moraes, «Pedatura Lusitana», edição Carvalhos de Basto, Braga, 1998, vol IV, p.
220.
2. IAN/TT- convento de S. Cristóvão de Rio Tinto, m. 2, doc. 6.
3. AIN/TT, Colegiada de S. Cristóvão de Coimbra, antiga colecção especial, maço 2, n.º 18.
4. João Pedro Ferro, «Alenquer Medieval (séculos XII-XV). Subsídios para o seu estudo»,
Cascais, 1996, Patrimónia Histórica, p. 75.
5. AIN/TT, cabido da Sé de Coimbra, 2.ª incorporação, maço 86, 3 971.
6. AIN/TT Cabido da Sé de Coimbra, 2ª incorporação, maço 88, nº 4129.
7. AIN/TT Cabido da Sé de Coimbra, 2.ª incorporação, maço 89, n.º 4282.
8. AIN/TT, Alcobaça, Livro Dourado, IV, liv. 10, fl. 150-151v.
9. AIN/TT, Celas, m. 4, n.º 1.
10. Maria do Rosário Barbosa Morujão, «Um Mosteiro Cisterciense Feminino, Santa Maria de
Celas (Século XIII a XV), Coimbra», Universidade, 2001, p.182.
11. Maria do Rosário Barbosa Morujão, op. cit., p. 183.
12. AIN/TT, Celas, maço 4, n.º 2.
13. AIN/TT, Alcobaça, liv Dourado IV, liv. 10, pp. 147v -14.8.
14. AIN/TT, Livro de D. João de Portel, p. 83, doc CXVI.
15. AIN/TT, Mosteiro de S. Vicente de Fora, 1.ª incorporação, m. 6, n.º 5.
16. AIN/TT, chanc. de D. João I, liv. 2, fl. 129.
17. AIN/TT, Santo André de Ancede, maço único, nº 12.
18. Luís Filipe Oliveira, e Miguel Rodrigues, 1988.
19. Nuno Gonçalo Freitas Monteiro, 2000, pp. 34-35.
20. IAN/TT - Most de Sant Cruz de Coimb, 1.ª incorp. DP, m9, nº 6.
a
21. IAN/TT, Livro de D. João Teo-tónio, fl 85-85v.
22. IAN/TT, MSC COIMBRA, 1.ª incorp, DP, m 10, n.º 21.
23. IAN/TT - Livro de D. João Teotónio, fl 165v.

89
d
24. AIN/TT - MSC Coimbra, 1.ª inc. DP, m 15, nº 14.
25. AIN/TT - MSC Coimbra, 1.ª inc, DP, m 15, nº 16.
26. Censual do Cabido da Sé do Porto, p. 200.
27. AIN/TT - mosteiro de S. Jorge de Coimbra, m. 4, n.º 15.
28. AIN/TT, mosteiro de S.ta Cruz de Coimbra, liv 3, fl 97v.
29. AIN/TT, mosteiro de Santa Cruz de Coimbra, liv 3, fl. 96-96v.
30. Vasconcelos e Sousa, 2000, p. 18.
31. José Matoso, «Introdução ao estudo da nobreza medievas português», in A Nobreza Me-
dieval Portuguesa. A Família e o Poder, Lisboa, 1981, pp. 11-32; «A Nobreza e a Revolução
de 1383», in Fragmentos de uma Composição Medieval, Lisboa, Estampa, 1990.
32. José Augusto de Sotto Mayor Pizarro, «Linhagens Medievais Portuguesas: Genealogias e
Es-tratégias (1279-1325)», Porto, Centro de Estudos de Genealogia, Heráldica e História da
Fa-mília da Universidade Moderna, 1999.
33. Maria Leonor Garcia da Cruz, «A Governação de D. João III: A Fazenda Real e os seus Vedo-
res», Lisboa, Centro de História da Universidade de Lisboa, 2001.
34. Bernardo Vasconcelos e Sousa, «Os Pimenteis: Percurso de uma Linhagem da Nobreza Me-
dieval Portuguesa (Séculos XII-XIV)», Lisboa, Imprensa Nacional-Casa da Moeda, 2000.
35. Maria José Pimenta Ferro, «A nobreza no reinado de D. Fernando e a sua actuação em 1383
-1385», in Revista Portuguesa de História, n.º 12, Coimbra, Universidade de Coimbra, Facul-
dade de Letras - Instituto de História Económica e Social, 1983.
36. Fátima Regina Gonçalves, «O Reinado de D. Fernando no âmbito das Relações Régio-Nobili-
árquicas», Porto, Faculdade de Letras da Universidade do Porto, 1996 (Dissertação de Dou-
toramento, poli copiada).
37. Mafalda Soares da Cunha, «A nobreza Portuguesa no início do século XV: Renovação e
continuidade», in Revista Portuguesa de História, Tomo XXXI, vol. 2, Coimbra, Universidade
de Coimbra, Faculdade de Letras - Instituto de História Económica e Social, 1996, pp. 219-
252.
38. Maria Leonor Garcia da Cruz, «A Governação de D. João III, A Fazenda Real e os seus Vedo-
res», Centro de História da Universidade de Lisboa, Lisboa, 2001, pp. 37-50.
39. Manuel Abranches de Soveral, «Ascendências Visienses. Ensaio sobre a nobreza de Viseu.
Séculos XIV a XVII», Porto 2004, 2 volumes.
40. Faustino Menendez Pidal de Navascués, «Las Armas de los Mendoza», in Armas e Troféus,
Tomo VI, Lisboa, 1965, pp. 5-17.
41. Manuel Artur Norton, «A Heráldica em Portugal», DisLivro Histórica, Lisboa, 2004, pp. 175-
183
42. Senhor de Llódio e Zaitegui, combatente em Navas de Tolosa (1212). Alegado descendente
de Iñigo Lopez, conde e senhor soberano da Biscaia, conde de Durango e Najera, casado
com Leonor Hurtado, senhora de Mendivil, Escarrona, Martioda, Cueto e Beto, filha de Fer-
nán Perez Furtado, rico-homem documentado entre 1141 e 1158, mordomo-mor de D. San-
cho III de Castela. Era filho do conde D. Pedro Gonzalez de Lara, havido «a furto» da rainha
D. Urraca de Castela.
43. Rui Pinto de Azevedo, «Documentos Medievais Portugueses», vol I, Tomo I, Lisboa, Acade-
mia Portuguesa de História, 1958, doc, 174, 178 e 180.
44. Alexandre Herculano, «História de Portugal», Bertrand, Lisboa, 1980, pp. 440-442.
45. AIN/TT, OSB, convento de S. Bento de Ave-Maria, maço 1, sem número de documento pela
total desarrumação em que se encontra este maço.
46. IAN/TT, CR - Mosteiro de Arouca, gav. 6, m. 9, doc 14. Pub por Miguel Repas, «Quando a
Nobreza Traja de Branco», Leiria, Magno edições, 2003.
47. AIN/TT, Mosteiro de Santa Maria de Tarouquela, m. 12, doc s.n.
48. Segue-se supontado «que forom».
49. Nisa?/Muja?
50. IAN/TT - OSB, Mosteiro de S. Pedro de Cete, m. 4.
51. AIN/TT, Mosteiro de Santa Maria de Arouca, gav. 6, m. 9, doc. 22.
52. Publicado no Archivo Histórico Português, vol IV, pp. 39/40.
53. IAN/TT - Mosteiro de Tarouquela, Mç.14, nº 4.
54. IAN/TT, CR - Mosteiro de Arouca, gav. 6, m 9, doc 16.
55. Segue-se o pidyrsopontado.
56. AIN/TT, Mosteiro de Santa Maria de Tarouquela, m.16, doc.1.
57. AIN/TT, Mosteiro de Tarouquela, m. 16, doc 3.
58. Sinal contendo um quadrado dividido em 4 triângulos nos quais se pode ler: Ave Maria.
59. IAN/TT- Mosteiro de Santa Maria de Tarouquela, Mç.16, nº 7.
60. Rasgão no pergaminho.
61. Borrão no pergaminho.
62. Mancha no pergaminho.
63. Sinal contendo um quadrado dividido em 4 triângulos nos quais se pode ler: Avé Maria.
64. AIN/TT, Mosteiro de Arouca, gav. 6, m. 9, doc. 24.
65. IAN/TT - OSB, Mosteiro de S. Pedro de Cete, m. 5, n. 38.
66. Braamcamp Freire, «A honra de Resende», pp. 11-14.
67. Em Julho de 1279, um Rodrigo Peres que julgamos pertencer à mesma gens e sua mulher,
a
D. Constança Martins. fazem doação ao mosteiro de S. Cristóvão de Lafões, sendo abade
D. Bernardo, de certa herdade chamada Paredes, junto a Covelas. Estamos em crer que seja
outro parente de D. Sancha, da linhagem dos de Pinho, e aliás co-herdeiro dos bens situa-
dos em Paredes.

91
d
68. AUC, gav 8-A, Mç 3, n.º 188.
69. AIN/TT, Ord de Santiago, gav. 5, m. 3, Livro de Mestrados 191A.
70. AIN/TT, M C O, Ord de Avis, conv de S. Bento de Avis, m. 4., n.º 436.
71. Informação que nos foi pessoalmente dada pelo Prof. Doutor José Augusto de Sotto Mayor
Pizarro.
72. AIN/TT - S. Dinis de Odivelas, Tomo 3.º, m. ou cod 46 (ca. 37), n.º 49.
73. AIN/TT, chanc. de D. Afonso V, liv. 3, fl, 61v. Carta de perdão de Dinis Martins, escudeiro.
74. AIN/TT, M C O, Ord de Avis, conv de S. Bento de Avis, m. 4., n.º 444.
75. AIN/TT, M C O, Ord de Avis, conv de S. Bento de Avis, m. 4., n-º 443.
76. ADB, cota 6410, liv. 16.
77. AIN/TT, M C O, Ord de Avis, conv de S. Bento de Avia.
78. Documentamos um Vasco Peres Furtado embora, de momento, não seja possível determi-
nar a que ramo pertenceria.1389, 11, 18. ADB, Colecção Cronológica - Cota 9000 - Recibo
que Vasco Peres Furtado deu a Diogo Gonçalves, escrivão de Lisa (?) pelo aluguer de uma
casa que este possuía.
79. AIN/TT - Colegiada de S. Julião de Frielas, m. 1, n.º 6.
80. Versus affricum maré quod est iuxta Fraelas ubi fit sal.Maria Teresa Barbosa Acabado, In-
ventário de Compras do Real Mosteiro de S. Vicente de Fora (Cartulário do séc.XIII), Co-
imbra, 1969, pp. 18-19.
81. Traslado duma carta de 1364, Janeiro, 7, que foi lida no paço do concelho em audiência a
1430, Maio, 4 AIN/TT - Colegiada de S. Julião de Frielas, m. 1, n.º 3.
82. AIN/TT, Celas, maço 12, n.º 7.
83. Este João da Gaia poderá talvez identificar-se com o escudeiro-trovador homónimo men-
cionado por Rodrigues Lapa nas Cantigas de Escarnho, n.º 95, que troça dos vilãos afidal-
gados.
84. IAN/TT - Colegiada de S. Julião de Frielas, m.1, n.º 7.
85. IAN/TT - Colegiada de S. Julião de Frielas, m. 1, n.º 69.
86. IAN/TT - Colegiada de S. Julião de Frielas, m. 2, n.º 5.
87. IAN/TT - Colegiada de S. Julião de Frielas, m.2, n.º 30.
88. IAN/TT - Colegiada de S. Julião de Frielas, m. 2, n.º 29.
89. AIN/TT . Colegiada de S. Pedro de Alfama, Mç 1, n.º 11.
90. 1351, Fevereiro,6, Lisboa (pousada do tabelião) ...no logo a que chamam Ripellas, termho
de Lixboa, a qual parte com herdades de Joham Ffustel e com o o olival de dona Lozia e com
a vinha da egreja de Ssanta Marinha de Lixboa in Morujão, Maria do Rosário Barbosa, Um
Mosteiro Cisterciense Feminino, Santa Maria de Celas ( Século XIII a XV), Coimbra, Univer-
sidade, 2001, p.474, doc. nº 203.
91. AIN/TT, Mosteiro de Lorvão, maço 3, sem número.
92. Mosteiro de S. Vicente de Fora, 1.ª inc, m 11, nº 4.
93. Fernão Lopes, CDF, cap. XXXIX a XLI, pp. 112-135.
94. Ambos haviam sido feitos vassalos de João Afonso Telo, irmão da rainha D. Leonor Teles, co-
mo relata Fernão Lopes no cap. LX, p. 228 da CDF.
95. IAN/TT, S. Dinis de Odivelas, Tomo 3.ª, maço ou Cód 46 (cx 37, n.º 13).
96. Supomos seja o Gil Esteves Fariseu casado com Sancha Eanes da Cunha sepultados em Nos-
sa Senhora de Graça, em Lisboa. Integrou a frota de galés que, em 1383, foi buscar reforços
ao Porto e invadir a Galiza.
97. IAN/TT, convento de Chelas, Mç 33, doc 649.
98. Miguel Gomes Martins, «Estêvão Vasques Filipe. O Percurso de um guerreiro em finais de
Trezentos», in Cadernos do Arquivo Municipal de Lisboa, n.º 5, Lisboa, 2001, p. 39.
99. Fernão Lopes, CDJ I, cap XLI.
100. Anselmo Braamcamp Freire, «Brasões da sala de Sintra», Imprensa Nacional-Casa da Moe-
da, Lisboa, 1996, vol. III, p.164.
101. Fernão Lopes, op. cit, cap CXX.
102. AIN/TT, chanc. de D. João I, liv 1, fl. 53.
103. Fernão Lopes, CDJ (I), cap. CLXXXII
104. Não encontramos na chancelaria qualquer diploma respeitante a esta nomeação.
105. 408, Livro Primeiro, Título sessenta e oito
106. Um documento de 8.6.1436 refere expressamente Afonso Furtado de Mendonça como
cunhado de Afonso Nogueira. IAN/TT, Arquivos particulares. Documentos referentes ao 2.º
barão do Sobral, n.º 3.
107. AIN/TT, chancelaria de D. Duarte, liv 1, p. 17
108. Fernão Lopes, CDJ (I), vol. II, cap. LXXXII.
109. IAN/TT, S. Dinis de Odivelas, liv 9, fl 310
110. Records of the Exchequer, and its related bodies, with those of the Office of First Fruits
and Tenths, and the Court of Augmentations. Exchequer, Treasury of Receipt; Diplomatic
Documents.
111. AIN/TT, chanc. de D. João I, liv.2, fl. 51.
112. H Baquero Moreno, «Subsídios para o estudo da legitimação em Portugal na Idade Média.
D. Afonso III - D. Duarte», p. 228, Lourenço Marques, Minerva Central, s.d.
113. AIN/TT, chanc. de D. Manuel I, liv. 28, fl. 18v.
a
114. AIN/TT, canc. de D. João I, Liv. 2, fl. 60
115. AIN/TT, Colegiada de Santo Estêvão de Alfama, Mç 4, n. 62.
116. AIN/TT, chanc de D. João I, liv. 3, fl. 17

93
d
117. IAN/TT, S. Dinis de Odivelas, liv. 26, fl. 323.
118. IAN/TT, S. Dinis de Odivelas, liv. 22, fl. 391
119. AIN/TT, gav 21, Mç 5, n.º 21.
120. AIN/TT, chanc de D. João I, li. 3, fl. 169.
121. Escrita em Silves, em Março de 1450, foi publicada pela primeira vez em 1664 com o titu-
lo de Crónica del Rey D. Joam I…terceira parte em que se contém a tomada de Ceita,
Lisboa, à custa de António Álvares.
122. Saraiva, António José, O Crepúsculo da Idade Média em Portugal, Lisboa, Gradiva, 1988,
p.82
123. AIN/TT, chanc. de D. João I, liv. 4, fl. 34.
124. AIN/TT, chanc de D. Afonso V, liv. 13, p. 71.
125. IAN/TT - S. Dinis de Odivelas, liv. 12, fl 236
126. IAN/TT - chanc de D. Afonso V, liv. 11, fl. 127.
127. AIN/TT - chanc de D. Afonso V, liv. 1, fl. 23v
128. AIN/TT - chanc de D. Afonso V, liv. 22, fl. 48.
129. Também aparece Mendoça e Mendõça, Meendomça, etc, mas a maior parte das vezes
Mendonça
130. IAN/TT, chanc. de D. AfonsoV , liv. 22, fl. 14v,
131. Manuel Abranches de Soveral, «Ascendências Visienses. Ensaio sobre a nobreza de Viseu.
Séculos XIV a XVII», Porto 2004, 2 volumes.
132. Este alvará não se encontra, contudo, na Chancelaria de Dom Afonso V. Convém no
entanto dizer que infelizmente nem todas as nomeações e mercês aparecem na respectiva
chancelaria, como se comprova no facto de vermos certos documento das chancelarias que
anexam outros, anteriores, que depois não aparecem no correspondente reinado.
133. Deste Bernardim devem descender uns Mendonça do Porto
134. Manuel Abranches de Soveral, op. cit..
135. Manuel Abranches de Soveral, op. cit..
137. Deve ser uma cetra de armas, ou seja, um escudo de couro onde se expunham as armas;
o que hoje se chama um panóplia.
137. AIN/TT, M C O, Ordem de Cristo, n.º 15, fl. 8.
Índice
Nota prévia - 4

1. O estado da questão
1.1 Os Furtado portugueses -6
1.2 Fernão Furtado não era de Alava - 10
1.3 A secundarização do fundador - 11
1.4 Furtado também é patronímico - 12

2. Os palimpsestos genealógicos
2.1 O Sísifo das representações simbólicas - 14
2.2 Provas negativas - 18
2.3 A falsa ascendência castelhana - 20

3. O que dizem as fontes


3.1 Furtado que não é Mendonça é furtado? - 22
3.2 Os documentos - 26
3.3 O que se deduz dos documentos - 36
Os Furtado co-herdeiros de Resende e Pinho - 39

4. A origem de Afonso Furtado


4.1 Os esquecidos Furtado de Loures, Frielas e Azóia - 42
4.2 O capitão-mor não era dos de Pedrosêlo - 44
4.3 Os Furtado da Estremadura portuguesa - 45
44. Uma grande figura esquecida - 49
Furtado de Loures. Hipótese de reconstituição genealógica - 62

5. D. Maria de Mendonça
5.1 Convenientemente «furtada»? - 64
5.2 A questão cronológica - 68
Uma tangente ao marquês de Santillana? - 69

6. A questão Heráldica
6.1 Os Furtado de Mendonça das ilhas - 72
a
6.2 A asa e o misterioso escudo de prata - 75

7. Esquema genealógico - 78

Notas - 89

95

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