Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Atividade Motora
Autor: Prof. Bergson de Almeida Peres
Colaboradoras: Profa. Vanessa Santhiago
Profa. Laura Cristina da Cruz Dominciano
Professor conteudista: Bergson de Almeida Peres
Licenciado em Educação Física pela Unimep (1989), possui especialização em Treinamento Esportivo pela EEFEUSP
(1990) e em Fisiologia do Exercício pela Unifesp (1991). Em 1996, concluiu seu mestrado pela EEFEUSP em Biodinâmica
do Movimento Humano. Atuou como preparador físico da Seleção Brasileira de Basquetebol masculina em 1999
e foi convidado pela equipe de futebol Manchester United (Inglaterra) como preparador físico de 2000 a 2003.
É coordenador geral do curso de Educação Física da UNIP.
CDU 612
© Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida ou transmitida por qualquer forma e/ou
quaisquer meios (eletrônico, incluindo fotocópia e gravação) ou arquivada em qualquer sistema ou banco de dados sem
permissão escrita da Universidade Paulista.
Prof. Dr. João Carlos Di Genio
Reitor
Comissão editorial:
Dra. Angélica L. Carlini (UNIP)
Dra. Divane Alves da Silva (UNIP)
Dr. Ivan Dias da Motta (CESUMAR)
Dra. Kátia Mosorov Alonso (UFMT)
Dra. Valéria de Carvalho (UNIP)
Apoio:
Profa. Cláudia Regina Baptista – EaD
Profa. Betisa Malaman – Comissão de Qualificação e Avaliação de Cursos
Projeto gráfico:
Prof. Alexandre Ponzetto
Revisão:
Fernanda Pereira
Rose Castilho
Sumário
Fisiologia Aplicada à Atividade Motora
APRESENTAÇÃO.......................................................................................................................................................9
INTRODUÇÃO............................................................................................................................................................9
Unidade I
1 FONTES ENERGÉTICAS.................................................................................................................................... 11
1.1 Fontes de ATP.......................................................................................................................................... 11
2 FONTES ANAERÓBIAS DE ATP: METABOLISMO ANAERÓBIO.......................................................... 12
2.1 Sistema ATP‑CP (fosfogênio)............................................................................................................ 12
2.2 Glicólise anaeróbia (sistema do ácido lático)............................................................................ 14
3 FONTES AERÓBIAS DE ATP – METABOLISMO AERÓBIO.................................................................... 16
3.1 Glicólise aeróbia..................................................................................................................................... 16
3.2 Ciclo de Krebs.......................................................................................................................................... 17
3.3 Sistema de transporte de elétrons................................................................................................. 17
3.4 Sistema aeróbio e metabolismo das gorduras.......................................................................... 18
3.5 Energia aeróbia total no músculo.................................................................................................. 18
4 SISTEMAS AERÓBIOS E ANAERÓBIOS DURANTE O REPOUSO E O EXERCÍCIO........................ 19
4.1 Repouso..................................................................................................................................................... 20
4.2 Exercício.................................................................................................................................................... 20
4.2.1 Exercícios de curta duração................................................................................................................. 20
4.2.2 Exercícios de longa duração................................................................................................................ 22
4.3 Interação das fontes enérgicas aeróbias e anaeróbias durante o exercício.................. 23
4.4 Atividade física e perda de gordura corporal............................................................................. 24
4.5 Hormônios e exercício físico............................................................................................................. 26
4.5.1 Metabolismo lipídico.............................................................................................................................. 26
4.5.2 Diferenças no metabolismo lipídico entre homens e mulheres........................................... 27
4.5.3 Metabolismo lipídico e VO2.................................................................................................................. 28
4.6 Ordem da utilização dos nutrientes.............................................................................................. 29
4.6.1 Quociente respiratório e medição da perda de gordura.......................................................... 30
Unidade II
5 ESTRUTURA E FUNÇÃO DO SISTEMA NERVOSO.................................................................................. 34
5.1 O sistema nervoso central................................................................................................................. 35
5.1.1 Medula espinhal....................................................................................................................................... 37
5.1.2 Tronco cerebral......................................................................................................................................... 38
5.1.3 O cerebelo................................................................................................................................................... 39
5.1.4 O diencéfalo............................................................................................................................................... 40
5.1.5 Os hemisférios cerebrais....................................................................................................................... 40
5.2 O sistema nervoso periférico............................................................................................................ 41
6 AS CÉLULAS NEURAIS.................................................................................................................................... 43
6.1 As células da glia................................................................................................................................... 43
6.2 O neurônio............................................................................................................................................... 45
6.2.1 Estrutura do neurônio........................................................................................................................... 45
6.2.2 Sinais neurais............................................................................................................................................. 46
6.2.3 Condições celulares necessárias para a geração dos sinais neurais.................................... 50
6.2.4 Força do gradiente de concentração............................................................................................... 54
6.2.5 Força da carga elétrica.......................................................................................................................... 55
6.2.6 Classificação dos neurônios................................................................................................................ 60
6.2.7 As sinapses.................................................................................................................................................. 64
6.3 Junção neuromuscular........................................................................................................................ 69
6.3.1 Substâncias neurotransmissoras....................................................................................................... 71
6.3.2 Alguns neurotransmissores importantes e as funções que desempenham.................... 72
6.4 Somação espacial e somação temporal....................................................................................... 73
6.5 Receptores sensoriais.......................................................................................................................... 74
6.5.1 Classificação em relação à função.................................................................................................... 74
6.5.2 Classificação de acordo com a localização anatômica............................................................ 75
6.6 Sistema nervoso e habilidades motoras...................................................................................... 75
6.6.1 Unidades motoras.................................................................................................................................... 76
6.7 Mecanismos de graduação da força muscular......................................................................... 77
6.7.1 Modificação da quantidade de unidades motoras ativadas.................................................. 78
6.7.2 Modificação da frequência de ativação das unidades motoras........................................... 79
6.8 Tipos de movimentos........................................................................................................................... 80
6.8.1 Movimentos reflexos.............................................................................................................................. 80
6.8.2 Tipos de reflexos....................................................................................................................................... 80
6.8.3 Movimentos voluntários....................................................................................................................... 86
6.8.4 Movimentos rítmicos............................................................................................................................. 87
Unidade III
7 CONTROLE TÉRMICO DURANTE O EXERCÍCIO...................................................................................... 94
7.1 Mecanismos de regulação da temperatura................................................................................ 94
7.1.1 Radiação...................................................................................................................................................... 95
7.1.2 Condução.................................................................................................................................................... 95
7.1.3 Convecção................................................................................................................................................... 96
7.1.4 Evaporação................................................................................................................................................. 96
7.2 Hipotálamo: nosso termostato corporal...................................................................................... 98
7.2.1 Glândulas sudoríparas........................................................................................................................... 99
7.2.2 Musculatura lisa das arteríolas.......................................................................................................... 99
7.2.3 Músculo esquelético............................................................................................................................... 99
7.2.4 Glândulas endócrinas...........................................................................................................................100
8 EXERCÍCIOS SOB ALTAS TEMPERATURAS E DISTÚRBIOS INDUZIDOS PELO CALOR............101
8.1 Riscos à saúde durante exercício realizado no calor............................................................102
8.2 Distúrbios relacionados ao calor...................................................................................................104
8.2.1 Cãibras........................................................................................................................................................104
8.2.2 Exaustão....................................................................................................................................................104
8.2.3 Intermação...............................................................................................................................................105
8.3 Prevenção dos distúrbios térmicos..............................................................................................106
8.3.1 Hidratação................................................................................................................................................106
8.3.2 Vestimenta................................................................................................................................................107
8.3.3 Aclimatação.............................................................................................................................................108
APRESENTAÇÃO
Esta disciplina tem como objetivo geral fornecer conhecimentos sobre as respostas fisiológicas no
ser humano em virtude de um estresse, considerando este último a atividade física ou o exercício físico
efetuado. Por conseguinte, os futuros profissionais de Educação Física e do esporte em geral receberão
subsídios e ampliarão suas habilidades para a elaboração e prescrição da atividade física mais adequada
ao praticante.
Ao término desta matéria, o aluno terá uma ampla visão dos sistemas energéticos responsáveis pelo
movimento durante a prática de uma atividade física.
Todos esses assuntos são de extrema importância para a vida profissional do educador físico, não
apenas por auxiliar no desenvolvimento de melhores equipes e programas de atividades, mas também
por permitir a prevenção e promoção da saúde da população e dos atletas.
INTRODUÇÃO
Se fosse proposto ao profissional de Educação Física escolher um termo que pudesse ser considerado
um denominador comum em todas as fases desta ciência e do esporte, qual seria ele? Energia certamente
é o termo mais apropriado. É por essa razão que a bioenergética é considerada um dos conceitos mais
importantes a ser compreendido tanto por profissionais quanto por estudantes desta área. Vejamos por
que essa afirmação pode ser verdadeira.
É por meio da liberação de energia que um músculo é capaz de se contrair e gerar movimento.
A maneira pela qual os depósitos de energia são consumidos depende essencialmente da aptidão física
da pessoa e do tipo de atividade física que está sendo realizado. Um indivíduo pode aprimorar muito
seu desempenho através de programas de treinamento, modificando ou aumentando os depósitos de
energia. O tipo de programa elaborado exigirá conhecimento acerca da depleção e reposição desses
depósitos de energia a depender da especificidade da atividade a ser realizada.
O alimento constitui nossa fonte indireta de energia. Dentro do corpo ele sofre uma série de reações
químicas, denominadas, coletivamente, de vias metabólicas.
Essas são apenas algumas das importantes razões que tornam necessário compreender com exatidão
os conteúdos relacionados à energia, os quais serão abordados no presente livro‑texto.
9
FISIOLOGIA APLICADA À ATIVIDADE MOTORA
Unidade I
1 FONTES ENERGÉTICAS
O fato de a desintegração do ATP liberar a fonte imediata de energia para a contração muscular,
leva‑nos a formular a seguinte questão: de que maneira esse importante composto é fornecido a cada
célula muscular? Ao respondê‑la, convém enfatizar que a energia é necessária para a ressíntese de ATP.
Isso não é nenhuma surpresa, uma vez que ocorre liberação de energia quando o ATP é desintegrado.
Em outras palavras, o fornecimento desse composto às células musculares depende da ressíntese de ATP,
a qual, por sua vez, também requer energia.
Existem três sistemas através dos quais as células musculares passam a dispor dessa energia.
Do ponto de vista químico, o menos complexo é denominado sistema ATP‑CP ou sistema fosfogênio.
Nele, a energia necessária para a ressíntese de ATP provém da desintegração de apenas um composto:
a fosfocreatina (CP). Nos outros dois sistemas – glicólise anaeróbia ou ácido lático; e sistema aeróbio –, uma
série de reações químicas complexas envolvendo a desintegração das substâncias alimentares constitui
a principal fonte de energia para a formação da mesma molécula.
Lembrete
Todos os três fornecedores de energia para a ressíntese do ATP operam da mesma maneira.
A energia liberada a partir da desintegração das substâncias alimentares e aquela liberada quando o
CP é desfeito são usadas para refazer a molécula de ATP; isto é, a energia é utilizada para conduzir
a reação demonstrada na figura a seguir – da direita (B) para a esquerda (A). Em outras palavras, a
energia liberada pela desintegração dos alimentos e do CP está ligada funcionalmente ou acoplada às
necessidades energéticas da ressíntese de ATP a partir de ADP e Pi. A acoplagem funcional de energia
de uma série de reações denominadas (pela bioquímica) de acopladas constitui, ainda, o princípio
fundamental implicado na produção metabólica de ATP.
11
Unidade I
Adenosina P P P Adenosina P P P
ATP ADP + PI
A B
Dois dos três sistemas metabólicos implicados na ressíntese de ATP e previamente mencionados,
o sistema ATP‑CP (fosfogênio) e a glicólise anaeróbia (sistema do ácido lático), são anaeróbios.
Esse termo significa “sem oxigênio”, enquanto que metabolismo se refere às várias séries de reações
químicas que ocorrem dentro do corpo (por exemplo, dentro das células musculares). Assim sendo,
metabolismo anaeróbio, ou fontes anaeróbias de ATP, refere‑se à ressíntese de ATP através de reações
químicas que não exigem a presença do oxigênio que respiramos, ainda que este seja utilizado pela
musculatura esquelética durante a prática de atividade física.
Já que esse sistema é menos complexo (mas não menos importante), será abordado primeiro.
A fosfocreatina (CP), à semelhança do ATP, é armazenada nas células musculares. Levando‑se em conta
que tanto o ATP quanto a CP contêm grupamentos fosfatos, estes são denominados coletivamente
como fosfogênios – daí o nome sistema fosfogênio. A CP se assemelha ao ATP também pelo fato
de que quando seu grupamento fosfato é removido, ocorre liberação de grande quantidade de
energia intramuscular. Os produtos finais dessa quebra são a creatina (C) e o fosfato inorgânico (Pi).
Como assinalamos previamente, a energia é imediatamente disponibilizada e está bioquimicamente
acoplada à ressíntese de ATP. Por exemplo, com a mesma rapidez com que o ATP é desintegrado
durante a contração muscular (movimento), ele é reproduzido de modo contínuo a partir de ADP e Pi,
graças à energia liberada durante a decomposição de CP armazenada. Essas reações acopladas podem
ser assim resumidas:
CP Pi + C + ENERGIA
ENERGIA + ADP + Pi ATP
Figura 2
Neste momento cabe mencionar que as equações precedentes foram bastante simplificadas. Dentro
do nosso corpo elas são mais complexas e exigem a presença de enzimas, que são compostos proteicos
capazes de acelerar a velocidade de cada reação. Em verdade, todas as reações metabólicas que ocorrem
no corpo exigem a presença de enzimas, incluindo a desintegração de ATP pela enzima ATPase.
12
FISIOLOGIA APLICADA À ATIVIDADE MOTORA
Observação
Por ironia, o único meio pelo qual a CP pode ser formada novamente a partir de Pi e C é através da
energia liberada pela desintegração de ATP. Isso ocorre durante a recuperação após o exercício físico, a
fonte primária de ATP origina‑se daquela obtida por meio da desintegração das substâncias alimentares.
Qual é a quantidade de ATP disponível a partir do sistema fosfogênio? Em primeiro lugar, deve‑se
observar que o armazenamento de CP no músculo ultrapassa o do ATP, pois a função daquela consiste
em fornecer energia à ressíntese deste último.
Em segundo lugar, a abreviatura mM se refere a milimol, que é uma unidade de mensuração utilizada
para quantificar as porções dos compostos químicos. Um mol é uma determinada quantidade de um
composto químico medida por peso, este depende do número e dos tipos de átomos que formam o
composto para ser mensurado. Para nossos propósitos, convém lembrar que 1.000 mM equivalem a 1
mol, e que quando 1 mol de ATP é desintegrado são liberadas de 7 a 12 Kcal de energia utilizável.
Em terceiro lugar, deve‑se observar que apenas 570 a 690 mM de fosfogênio são estocados na
massa muscular total do corpo. Isso equivale a uma quantidade de energia ATP de 5,7 a 6,9 Kcal, o que
não representa muita energia para ser usada durante um exercício físico. Por exemplo, os depósitos de
fosfogênio dentro dos músculos que estão realizando um movimento provavelmente se esgotarão após
cerca de 10 segundos de atividade apenas! O que significa que em um exercício de intensidade máxima,
como uma breve corrida (um pique) de 100 metros, a quantidade total de energia ATP disponível a partir
do sistema fosfogênio é muito limitada.
A importância desse sistema para os preparadores físicos e atletas é exemplificada pelas poderosas
e rápidas largadas dos velocistas, acelerações realizadas pelos jogadores de futebol, saltadores em
altura e distância, e arremessadores, bem como por outras atividades semelhantes que são concluídas
em poucos segundos. Sem o fosfogênio, os movimentos rápidos não poderiam ser executados, pois
essas atividades exigem um fornecimento rápido e não uma grande quantidade de ATP. O sistema
do fosfogênio representa a fonte de ATP disponibilizada mais rapidamente para ser utilizada pela
musculatura esquelética. Eis algumas das razões para isso: não depende de uma longa série de reações
químicas; não depende do transporte de oxigênio que respiramos durante a execução do movimento
intenso para os músculos ativos; e tanto ATP quanto CP estão armazenados diretamente dentro dos
mecanismos contráteis dos músculos.
13
Unidade I
A glicólise anaeróbia é o outro sistema anaeróbio no qual o ATP é ressintetizado dentro da musculatura
esquelética, consiste numa desintegração incompleta de um dos nutrientes, o carboidrato (açúcar), em
ácido lático (daí o nome “sistema do ácido lático”). No corpo, todos os carboidratos são transformados
no açúcar simples glicose, que tanto pode ser utilizado imediatamente nessa forma ou armazenado no
fígado e nos músculos como glicogênio, para uso subsequente. Para nossas finalidades, carboidrato,
açúcar, glicose e glicogênio têm significados equivalentes com relação ao metabolismo. O ácido lático
é um coproduto da glicólise anaeróbia e quando se acumula em altos níveis nos músculos e no sangue
produz fadiga muscular. Esse último ponto é fundamental para a compreensão da fadiga muscular.
Do ponto de vista químico, a glicólise anaeróbia é mais complexa que o sistema fosfogênio, pois
requer 12 reações químicas separadas, porém sequenciais, para sua concretização. Essa série de reações
foi descoberta na década de 1930 por dois cientistas alemães: Gustav Embden e Otto Meyerhof. Por essa
razão, às vezes a glicólise anaeróbia é denominada ciclo de Embden‑Meyerhof, no entanto, a designação
mais comum é simplesmente glicólise, que significa dissolução ou desintegração do açúcar (glicogênio).
Assim sendo, a glicólise anaeróbia se refere à desintegração do glicogênio sem a utilização do oxigênio
que respiramos durante o exercício físico.
Lembrete
Várias das etapas observadas no processo glicolítico são mostradas esquematicamente na figura
seguinte. Convém enfatizar novamente que a série de reações mostrada é extremamente simplificada e
inclui apenas algumas das 12 reações específicas que estão sabidamente implicadas na glicólise. Além
disso, cada uma das reações requer a presença de uma enzima específica para poder ocorrer numa
velocidade suficiente.
GLICOGÊNIO
GLICOSE
ÁCIDO PIRÚVICO
ÁCIDO LÁTICO
14
FISIOLOGIA APLICADA À ATIVIDADE MOTORA
Apenas alguns poucos moles de ATP podem ser ressintetizados a partir do glicogênio durante a
glicólise anaeróbia, em comparação com a produção possível na presença de oxigênio. Por exemplo,
durante a glicólise anaeróbia apenas 3 moles de ATP podem ser ressintetizados a partir da desintegração
de 1 mol, ou 180 gramas, de glicogênio. Como veremos a seguir, na presença de oxigênio suficiente, a
desintegração completa da mesma quantidade de glicogênio produz 39 moles de ATP.
As equações resumidas das reações acopladas para a ressíntese de ATP pela glicólise anaeróbia são
as seguintes:
3 ATP/MOL DE GLICOGÊNIO CONTRAÇÃO MUSCULAR
Figura 4
Durante o exercício, na realidade, a produção de ATP útil por glicólise anaeróbia é inferior aos 3
moles de ATP mostrados na equação precedente. A razão para isso é que, durante o exercício exaustivo,
os músculos e o sangue só conseguem tolerar o acúmulo de aproximadamente 60 a 70 gramas de ácido
lático antes de chegar à fadiga. Se todos os 180 gramas de glicogênio fossem desintegrados de modo
anaeróbico durante o exercício, seriam formados 180 gramas de ácido lático. Portanto, na prática, só
conseguimos ressintetizar totalmente entre 1,0 e 1,2 mol de ATP por glicólise anaeróbia durante o
exercício intenso, antes de o ácido lático no sangue e nos músculos alcançar níveis exaustivos.
Se os músculos podem tolerar de 2,0 a 2,3 gramas de ácido lático por quilograma de músculo, ou 60
a 70 gramas para a massa muscular total, então a quantidade máxima de ATP produzida pela glicólise
ficaria entre 1,0 e 1,2 mol. Nessas condições, cabe observar que isso corresponde a aproximadamente o
dobro de ATP que se pode obter a partir do sistema ATP‑CP.
15
Unidade I
Observação
Admite‑se que essas cristas contenham alguns – ou mesmo todos – dos sistemas enzimáticos
necessários para o metabolismo aeróbio. O músculo esquelético contém muitas mitocôndrias.
As muitas reações do sistema aeróbio podem ser divididas em três séries principais: glicólise aeróbia;
ciclo de Krebs; e sistema de transporte de elétrons.
16
FISIOLOGIA APLICADA À ATIVIDADE MOTORA
Em seguida, o ácido pirúvico formado durante a glicólise aeróbia continua sendo desintegrado
através de uma série de reações denominadas ciclo de Krebs, em homenagem ao seu descobridor,
Sir Hans Krebs – Prêmio Nobel de Fisiologia em 1953. Esse ciclo também é conhecido como ciclo do
ácido tricarboxílico (TCA) e como ciclo do ácido cítrico, fazendo alusão a alguns compostos químicos
encontrados neste ciclo. Durante o ciclo de Krebs ocorrem duas grandes alterações químicas: produção
de CO2 e oxidação; isto é, remoção de elétrons.
Dessa maneira, quando são removidos átomos de hidrogênio de um composto, diz‑se que este foi
oxidado. A produção de CO2 e a remoção de elétrons no ciclo de Krebs estão assim relacionadas: ácido
pirúvico (em sua forma modificada) contém carbono (C), hidrogênio (H) e oxigênio (O); quando H é
removido, somente permanecem C e O, ou seja, os componentes químicos do dióxido de carbono. Dessa
forma, no ciclo de Krebs, o ácido pirúvico é oxidado, resultando na produção de CO2. O ciclo de Krebs é
mostrado esquematicamente mais adiante.
Seguimos com a análise da desintegração do glicogênio. O produto final – H2O – é formado a partir
dos íons hidrogênio e dos elétrons que são removidos no ciclo de Krebs e do oxigênio que respiramos.
A série específica de reações nas quais é formado H2O é denominada sistema de transporte de
elétrons (STE) ou cadeia respiratória. O que ocorre no STE é que os íons hidrogênio e os elétrons são
“transportados” até o oxigênio por carreadores eletrônicos numa cadeia de reações enzimáticas cujo
produto final é a água.
Portanto, durante o metabolismo aeróbio, a maior parte do total de 39 moles de ATP é ressintetizada no
sistema de transporte de elétrons, ao mesmo tempo em que ocorre formação de água, como pudemos observar.
Compete‑nos observar que num total de 39 moles de ATP são ressintetizados três por glicólise
aeróbia e 36 através do sistema de transporte de elétrons.
Fazendo‑se a relação em litros de oxigênio para a desintegração de 180 gramas de glicogênio, serão
necessários 134,4 litros de O2 para ressintetizar 39 moles de ATP, ou 3,45 litros de O2 necessários por
mol de ATP ressintetizado. Em outras palavras, sempre que o corpo (músculo) consome (absorve) 3,45
litros de O2, ocorre a síntese aeróbia de 1,0 mol de ATP. Em repouso, isso levaria entre 10 a 15 minutos.
Entretanto, durante um exercício máximo, levaria cerca de 1 minuto, apenas!
17
Unidade I
A gordura é desintegrada inicialmente através de uma série de reações químicas denominadas de beta
oxidação. Essas reações preparam a gordura (denominada ácido graxo) para penetrar no ciclo de Krebs
e no sistema de transporte de elétrons. Todos os três nutrientes, quando utilizados como combustíveis
metabólicos aeróbios, sofrem essas duas últimas séries de reações. Por essa razão, o ciclo de Krebs e o
sistema de transporte de elétrons são denominados de via comum final para o metabolismo aeróbio.
Para que 1 mol de ácido palmítico (cerca de meio quilograma) libere energia suficiente para
ressintetizar 130 moles de ATP, quantidade substancialmente maior que aquela conseguida com 1 mol
de glicogênio, são necessários 515,2 litros de oxigênio!
Portanto, são necessários 3,96 litros de O2 por mol de ATP ressintetizado. Dito de outro modo, é
necessário mais oxigênio para gerar 1 mol de ATP a partir da desintegração aeróbia da gordura que a
partir do glicogênio. Durante o repouso e o exercício, tanto o glicogênio quanto a gordura, mas não a
proteína, constituem fontes importantes de energia geradora de ATP.
É difícil calcular a energia muscular total que pode ser produzida através do sistema com oxigênio,
pois são utilizados todos os três nutrientes que mencionamos. No entanto, como base para comparação
com os sistemas anaeróbios, a energia aeróbia total disponibilizada nos músculos apenas a partir do
glicogênio é destacada na tabela a seguir:
GLICOGÊNIO M. MUSCULAR
Por kg de músculo Massa muscular total
Concentração muscular (grama) 13 – 15 400 – 450
Formação de ATP (moles) 2,8 – 3,2 87 – 98
Energia útil (Kcal) 28 – 32 870 – 980
Vimos que o sistema aeróbio é capaz de utilizar tanto as gorduras quanto o glicogênio para a
ressíntese de grandes quantidades de ATP, sem produção simultânea de fadiga induzida por coprodutos.
Por essa razão, ele é o sistema preferido em condições de repouso. Com relação à prática da atividade
física e do esporte, é igualmente fácil constatar que o sistema aeróbio é particularmente adequado à
produção de ATP durante um movimento prolongado tipo resistência. Por exemplo, durante uma corrida
de maratona (aprox. 42 km), pode‑se calcular que será necessário um total (aproximado) de 150 moles
de ATP (cerca de 1 mol de ATP por minuto). Essa grande e contínua produção de energia ATP somente é
possível pelo fato de a fadiga precoce, devido ao acúmulo de ácido lático, poder ser evitada; e graças à
disponibilidade imediata de grandes quantidades de glicogênio, gorduras e oxigênio para os músculos
esqueléticos que estão realizando o movimento.
(36/MOL
GLICOGÊNIO)
Sistema de transporte de oxigênio
O2
Ciclo de Krebs
Cadeia respiratória
H2O CO2
Existem pelo menos três características importantes dos sistemas aeróbios e anaeróbios, em
condições de repouso e exercício, as quais merecem uma análise adicional: os tipos de nutrientes a
serem metabolizados; os papéis relativos desempenhados por cada sistema; e a presença e o acúmulo
de ácido lático no sangue.
19
Unidade I
4.1 Repouso
Em condições de repouso, cerca de dois terços do combustível alimentar são fornecidos pelas
gorduras e o terço restante pelos carboidratos (glicogênio e glicose). A contribuição das proteínas como
combustível metabólico, como dito anteriormente, é desconsiderada no presente caso. O funcionamento
do sistema aeróbio na condição de repouso é predominante. Isso é verdadeiro porque nosso sistema de
transporte de oxigênio (coração e pulmões) é capaz de fornecer a cada célula oxigênio suficiente e,
portanto, ATP bastante para satisfazer todas as necessidades energéticas do estado de repouso.
Embora o sistema aeróbio seja o predominante em operação, provavelmente observamos que existe
uma quantidade pequena, porém constante, de ácido lático presente no sangue (cerca de 10 mg para
cada 100 ml de sangue). A razão disso é bastante complexa, porém, a compreensão desta formação
de ácido lático de forma constante e o não acúmulo deste nos indica que o sistema anaeróbio está
em funcionamento na musculatura esquelética, mas de forma não predominante. Assim sendo, vemos
que, em repouso, os nutrientes utilizados são gorduras e carboidratos, e o ATP necessário é fornecido
predominantemente pelo sistema aeróbio.
4.2 Exercício
Tanto o sistema anaeróbio quanto o aeróbio contribuem com o fornecimento de ATP durante o
exercício, entretanto, seus papéis relativos dependem dos tipos de exercícios realizados. Para começar
a nossa discussão, podemos dividir os muitos tipos de exercícios em duas categorias: 1) exercícios que
só podem ser realizados por curtos períodos de tempo, mas que exigem esforço máximo; e 2) exercícios
que podem ser realizados por períodos relativamente longos, mas que exigem esforço submáximo
(moderado). A compreensão desse conceito é de extrema importância para os educadores físicos, em
especial, no planejamento dos programas de treinamento.
Os exercícios desta categoria incluem eventos de velocidade, força, potência, resistência de velocidade,
resistência anaeróbia, por exemplo, corridas rápidas (piques) de 100, 200 e 400 metros; a corrida de 800
metros e outros eventos nos quais o ritmo de trabalho exigido pode ser mantido somente por dois ou,
possivelmente, três minutos!
Assim, vemos que o principal combustível alimentar é representado pelos carboidratos, com as
gorduras como participantes secundários e as proteínas como contribuintes dispensáveis. Observamos
ainda que o sistema predominante é anaeróbio. No entanto, isso não significa que seja o único sistema
operante. Isso indica, simplesmente, que a energia ou o ATP necessário para esses tipos de exercícios não
pode ser fornecido unicamente por meio do sistema aeróbio. Consequentemente, a maior parte do ATP
terá que ser fornecida de modo anaeróbico pelo sistema fosfogênio e pela glicólise anaeróbia.
Existem duas razões para a limitação do sistema aeróbio no fornecimento de ATP suficiente durante
a realização de qualquer exercício. A primeira é que cada um de nós possui um teto para potência
aeróbia ou para o ritmo máximo no qual consegue consumir oxigênio. A segunda razão é que são
20
FISIOLOGIA APLICADA À ATIVIDADE MOTORA
necessários pelo menos 2 ou 3 minutos para o consumo de oxigênio alcançar um nível novo (estado
de equilíbrio no consumo de O2) e mais alto. Por exemplo, atletas possuem potências aeróbias máximas
entre 3,0 a 5,0 litros de O2 por minuto, para mulheres e homens, respectivamente, enquanto que o
máximo para a mulher destreinada oscila ao redor de 2,2 litros por minuto e, para o homem destreinado,
3,2 litros por minuto. Esses níveis de consumo de O2 não são suficientes, em ambos os casos, para suprir
todo o ATP necessário para um esforço como um pique de 100 metros, que pode exigir mais de 45 litros
por minuto (cerca de 8 litros de O2 por 100 metros ou por 10 segundos).
Mesmo que fosse possível consumir oxigênio num ritmo que atendesse, sozinho, à demanda
energética ou de ATP, o praticante teria que transcorrer os dois ou três primeiros minutos de
exercício para acelerar o consumo de oxigênio até o nível exigido. A razão para esse aumento
retardado no consumo de oxigênio corresponde ao tempo que terá de transcorrer para se
manifestarem adaptações bioquímicas e fisiológicas apropriadas. Isso é verdadeiro durante a
transição do repouso para um exercício de qualquer intensidade e de um exercício de menor
intensidade para outro de intensidade mais alta. O período durante o qual o nível de consumo de
oxigênio está abaixo daquele necessário para suprir todo o ATP exigido por qualquer exercício é
denominado déficit de oxigênio.
É durante esse período com déficit de oxigênio que o sistema fosfogênio e a glicólise anaeróbia são
requisitados para fornecerem a maior parte do ATP necessário ao exercício. Isso significa que durante
exercícios de curta duração, porém de alta intensidade, como aqueles mencionados antes, haverá sempre
um déficit de oxigênio durante toda a duração do exercício, e a principal fonte de ATP é representada
pelos dois sistemas anaeróbios.
Nos exercícios de curta duração e alta intensidade vemos que a aceleração rápida na glicólise
anaeróbia é acompanhada por um acúmulo de ácido lático igualmente rápido. À medida que os depósitos
de glicogênio muscular, que representam o único combustível para a glicólise anaeróbia, esgotam‑se, o
acúmulo de ácido lático alcança níveis máximos nos músculos e no sangue. Com altos níveis de ácido
lático, a contração muscular é inibida, pois o acúmulo deste ácido na musculatura esquelética impede
o funcionamento da enzima (fosfofrutoquinase – PFK) que quebra o glicogênio para gerar energia, ou
seja, prejudica a ressíntese do ATP.
Sem a possibilidade de ressintetizar o ATP muscular, não haverá a continuidade de contração muscular
e, consequentemente, surgirá a fadiga muscular. Com essas alterações que geram a fadiga muscular,
o exercício deve ser interrompido ou sua intensidade terá que ser reduzida de modo significativo. Essa
é a razão pela qual a capacidade de tolerar altos níveis de ácido lático e de suportar os desconfortos
da fadiga em geral constitui pré‑requisito para o sucesso na maioria dos esportes. Foram registrados
níveis sanguíneos de ácido lático de até 200 mg/% durante provas competitivas de velocidade tanto em
pista quanto em piscina. Esses altos níveis são cerca de vinte vezes maiores que aqueles encontrados
normalmente em condições de repouso (10 mg/%).
Desse modo, o nível de ácido lático no sangue é um excelente indicador do sistema energético
que está sendo utilizado predominantemente durante o exercício. Se o nível é alto, o sistema primário
utilizado certamente foi a glicólise anaeróbia; já se o nível é baixo, o sistema aeróbio foi o predominante.
21
Unidade I
Qualquer exercício que pode ser mantido por períodos de tempo relativamente longos deve ser incluído
nesta categoria. Por períodos de tempo relativamente longos entendemos 5 minutos ou mais. Nesses
casos, os principais nutrientes são novamente os carboidratos e as gorduras. Entretanto, no início de um
exercício, o principal nutriente utilizado é o glicogênio. A mudança no combustível durante o exercício
ocorre gradualmente, à medida que o transporte de oxigênio até a musculatura esquelética ativa aumente
significativamente, ou seja, por volta de 60% a 70% do volume máximo de oxigênio (VO2 máx.).
Nesses tipos de exercícios a principal fonte de ATP é representada pelo sistema aeróbio. Os sistemas
do ácido lático e do ATP‑CP também contribuem, porém apenas no início do exercício, antes do consumo
de oxigênio alcançar um novo nível de estado estável (steady state); durante esse período incorre‑se
num déficit de oxigênio. Depois que o consumo de oxigênio alcança um novo nível de estado estável
(cerca de 2 ou 3 minutos), torna‑se suficiente para suprir toda a energia ATP exigida pelo exercício.
Por essa razão, o ácido lático sanguíneo não se acumula em níveis muito altos. A glicólise anaeróbia
diminui o seu ritmo uma vez alcançado um consumo de oxigênio de estado estável, e a pequena
quantidade de ácido lático acumulada previamente se mantém relativamente constante até o término do
exercício. Um bom exemplo disso é observado durante uma prova de maratona. Esses atletas percorrem
42,2 km em cerca de 2h05min., entretanto, ao final da prova, seus níveis sanguíneos de ácido lático são
aproximadamente duas a três vezes maiores que aqueles encontrados durante o repouso.
A fadiga experimentada por esses competidores ao término de uma prova é, portanto, geralmente
devido a fatores diferentes dos altos níveis sanguíneos de ácido lático, a depender, é claro, do ritmo de
prova nos períodos finais até a chegada.
Alguns dos fatores mais importantes que podem conduzir a esse tipo de fadiga são: baixos níveis
sanguíneos de glicose, em virtude da depleção dos depósitos hepáticos de glicogênio; fadiga muscular
local devido à depleção dos depósitos musculares de glicogênio; perda de água (desidratação) e
eletrólitos, que resulta em alta temperatura corporal; e abatimento físico e psicológico em geral sofrido
pelo atleta.
Nas atividades prolongadas de intensidade muito baixas, como caminhar, jogar golfe e certas tarefas
do trabalho cotidiano, o ácido lático não se acumula acima do nível normal de repouso. Isso ocorre
porque o sistema fosfogênio isoladamente é suficiente para suprir a energia ATP adicional necessária
antes de se alcançar um consumo de oxigênio de estado estável. Nesses casos, a fadiga pode ser retardada
por até 6 horas ou mais.
A informação precedente pode ser especialmente útil para muitos preparadores físicos. Por exemplo,
um dos aspectos mais importantes das corridas competitivas de média e longa distância é o ritmo das
passadas. Se um atleta começa uma prova de resistência com rapidez excessiva ou se inicia seu pique
final cedo demais, o ácido lático se acumulará em níveis muito altos e os depósitos musculares de
glicogênio se esgotarão precocemente no transcorrer da competição.
22
FISIOLOGIA APLICADA À ATIVIDADE MOTORA
Nesse sentido, cabe relembrar que isso é verdadeiro porque, à medida que aumenta a intensidade
do exercício, aumenta também a quantidade de energia a ser fornecida pelos sistemas anaeróbios.
Consequentemente, a competição pode ser perdida por causa desse início precoce da fadiga. Preparadores
físicos bem informados, ou atletas dessas provas, nunca devem permitir que isso aconteça. Pelo contrário,
do ponto de vista fisiológico, eles devem ser aconselhados a manter um ritmo relativamente constante,
porém suficiente durante o desenrolar da maior parte da prova, e então encerrá‑la com um esforço
máximo. Em outras palavras, o início da fadiga em razão do acúmulo de ácido lático e do esgotamento
do glicogênio muscular dever ser evitado até o final da competição.
Assim como uma capacidade anaeróbia é importante para a realização de exercícios de curta
duração, a potência aeróbia máxima é um fator significativo no desempenho das atividades
prolongadas. Isso se baseia no fato de o sistema aeróbio fornecer a maior parte de energia exigida
por esses tipos de exercícios. Potência aeróbia máxima (VO2 máx.) é definida como a velocidade
máxima com que o oxigênio pode ser consumido e absorvido pela musculatura esquelética ativa.
Quanto maior a potência aeróbia máxima de um atleta, maior será seu sucesso na realização
de eventos de resistência, desde que todos os outros fatores que contribuem para um bom
desempenho esportivo estejam presentes.
Até aqui discutimos os sistemas energéticos durante exercícios constituídos por esforços de curta
duração e alta intensidade (anaeróbios), ou por esforços de longa duração e intensidade moderada
(aeróbios). O que dizer das atividades físicas que se enquadram entre essas categorias? São elas atividades
anaeróbias ou aeróbias? Não é possível classificar essas atividades como estritamente anaeróbias ou
aeróbias, pelo contrário, elas exigem uma combinação (mistura) de metabolismos tanto anaeróbio
quanto aeróbio. Tomemos como exemplo as corridas de 1.500 metros e de uma milha (1.600 metros).
Nessas atividades os sistemas anaeróbios fornecem a maior parte do ATP durante a aceleração, tanto no
início quanto no final da prova; o sistema aeróbio é predominante durante o meio de prova, ou o estado
estável ao longo da corrida. Em síntese, esses corredores retiram cerca da metade do ATP necessário de
fontes anaeróbias e a outra metade de fontes aeróbias.
O conceito de contínuo energético, evidentemente, aplica‑se a todas as atividades e não apenas aos
eventos de pista. Ele será útil para os preparadores físicos nas discussões e planejamentos de programas
de treinamento.
23
Unidade I
% Aeróbio 0 10 20 30 40 50 60 70 80 90 100
% Anaeróbio 100 90 80 70 60 50 40 30 20 10 0
Eventos (Metros) 100 200 400 800 1.500 3.200 5.000 10.000 42.195
Tempo (Min.: Seg.) 0:10 0:20 0:45 1:45 3:45 9:00 14:00 29:00 130:00
Figura 6
24
FISIOLOGIA APLICADA À ATIVIDADE MOTORA
Observação
Assim, medir a frequência cardíaca poderia ser um método mais barato para controlar a execução de
exercícios em intensidades que otimizem a queima de gordura, apesar de que ainda há dúvidas sobre qual
seria a frequência cardíaca que estaria relacionada com uma maior perda de gordura subcutânea como
fonte de energia. Ainda que exista essa possibilidade, “há um número significativo de indivíduos que
realizam atividade física com objetivo de redução ponderal sem o controle de sua respectiva frequência
cardíaca” (MARANGON; WELKER, 2008, p. 365).
Quando o principal intuito do praticante de atividade física é estético, geralmente este objetivo está
atrelado à redução do percentual de gordura, ou seja, à redução da quantidade de gordura corporal.
Para isso, várias modalidades podem ser indicadas pelo preparador físico (professor ou personal trainer),
entre elas podemos indicar:
• ciclismo;
• natação;
• marcha/caminhada;
• corridas.
A musculação igualmente poder ser uma opção para a redução do percentual de gordura, além de
melhorar o condicionamento físico, promovendo saúde e bem‑estar ao praticante.
Desse modo, a literatura científica – e seus diferentes autores – indicam diferentes modalidades
e intensidades, bem como durações para o treinamento visando à maior queima de gordura. Ao não
existir um consenso quanto à frequência cardíaca (FC) ideal para a oxidação de gordura durante o
exercício físico, “a maioria dos autores sugere uma faixa de treinamento baseada no consumo máximo
de oxigênio (VO2max)” (MARANGON; WELKER, 2008, p. 365).
25
Unidade I
Saiba mais
Conforme nossos estudos, podemos admitir que “assim que o exercício físico é iniciado, sinais são
enviados através das vias eferentes pelo sistema nervoso até os músculos em movimento, provocando
adaptação metabólica ao exercício” (MARANGON; WELKER, 2008, p. 366). Como pudemos analisar,
para a obtenção de energia, através da quebra de ATP, ocorre a degradação de carboidratos, lipídios e
proteínas, sobretudo dos dois primeiros.
26
FISIOLOGIA APLICADA À ATIVIDADE MOTORA
enzima glicerol quinase. O fígado apresenta tal enzima, onde o glicerol pode
ser oxidado para a obtenção de energia ou ser convertido em glicose. Os
ácidos graxos são captados por diversos tecidos, especialmente os músculos
durante o exercício, onde ele é convertido em acetil‑CoA graxo (MARANGON;
WELKER, 2008, p. 367).
A hidrólise do triglicerídeo irá fornecer moléculas de ácidos graxos, que serão convertidos em energia,
e glicerol, que por sua vez poderá ser captado pelo fígado e servir como precursor de glicose através da
gliconeogênese. Porém, a velocidade com que o fígado capta glicerol para a gliconeogênese é reduzida,
fazendo com que sua concentração sérica esteja aumentada durante o processo de lipólise. Portanto,
a concentração plasmática de glicerol torna‑se uma forma viável de avaliar a intensidade da lipólise
durante o exercício físico, pois sua presença está diretamente relacionada com a quebra da gordura.
Porém, é sabido que isso não é válido em todas as situações ou práticas, dado que atletas com bom nível
de treinamento possuem elevada metabolização de ácidos graxos durante o exercício físico. “Além disso, a
utilização de lipídios como substratos energéticos aumenta à medida que se tem mais tempo de treinamento,
atuando também como fonte energética durante a recuperação” (MARANGON; WELKER, 2008, p. 369).
Vários fatores irão interagir para produzir o substrato energético que será utilizado durante
a prática de uma atividade física. Alguns deles são: a intensidade do exercício, sexo, nível de
treinamento, concentração de ácidos graxos livres plasmáticos, quantidade de carboidrato
disponível e fatores hormonais.
O lipídio nem sempre será a principal fonte energética. Evidentemente ao se tratar a respeito
de atividade física, a dieta exerce função essencial, pois grande parte da energia que necessitamos
e utilizamos provém dos alimentos. Nesse sentido, dependendo do tipo de atividade escolhida pelo
praticante, bem como sua intensidade, o suprimento se dará pelo carboidrato ou pelo lipídio. Atividades
ou exercícios com intensidade moderadas requerem este último, enquanto as práticas de alta intensidade,
que necessitam de suprimento rápido de energia, requerem o consumo do primeiro.
À medida que a intensidade da atividade aumenta, o metabolismo lipídico deixa de ser a principal
fonte de energia, ao passo que os carboidratos passam a representar maior contribuição. Isso ocorre
devido ao fato de a glicose ser mais rapidamente degradada que os ácidos graxos e sua degradação ser
independente da presença do oxigênio, isto é, quando o músculo está em hipóxia.
28
FISIOLOGIA APLICADA À ATIVIDADE MOTORA
É possível observar que pessoas mais condicionadas (treinadas) conservam mais enzimas
lipolíticas ativas nas células musculares quando comparadas com pessoas sedentárias. Com isso
podemos concluir que a atividade física (sobretudo a aeróbia) “induz o aumento da densidade
de capilares no tecido adiposo, assim como sua capacidade de oxidação dos ácidos graxos”
(MARANGON; WELKER, 2008, p. 371). Dessa forma, aqueles que têm o hábito de praticar
uma atividade física “iniciam o processo de oxidação lipídica previamente do que indivíduos
sedentários, que devem permanecer mais tempo em atividade para metabolizar os lipídios”
(MARANGON; WELKER, 2008, p. 371).
Por último, quanto maior for o condicionamento físico do praticante, o uso dos lipídios como
principal fonte de energia também será superior.
Durante a atividade física todos os nutrientes são metabolizados, embora em proporções distintas,
de acordo com a intensidade do exercício físico.
Dessa forma, não é possível afirmar que carboidratos são metabolizados antes das gorduras
e proteínas. Estes elementos são utilizados como fonte de energia de maneira simultânea, o
que irá variar é a sua respectiva contribuição individual. “Em geral, parece que a utilização de
combustível durante o exercício segue uma sequência, na qual a oxidação acontece na seguinte
ordem: glicogênio muscular, glicose sanguínea e ácidos graxos” (MARANGON; WELKER, 2008, p.
371). Quando os estoques de carboidratos reduzem, a glicemia tende a reduzir também, “pois os
diferentes tecidos utilizam glicose constantemente para a geração de energia, sendo que alguns
tecidos, como o cérebro, utilizam somente a glicose em situações normais” (MARANGON; WELKER,
2008, p. 371). Para manter a glicemia relativamente estável, o organismo utiliza os aminoácidos
29
Unidade I
A intensidade do exercício promoverá a oxidação de carboidratos, a qual será elevada nessa situação.
Igualmente é possível deduzir que devido ao fato de os carboidratos fornecerem energia em curto
espaço de tempo, a produção de CO2, em situação de prática intensa, será maior.
30
FISIOLOGIA APLICADA À ATIVIDADE MOTORA
Saiba mais
Resumo
31
Unidade I
Exercícios
Questão 1. (UEL 2003) No gráfico a seguir observa‑se a produção de CO2 e ácido lático no músculo
de um atleta que está realizando atividade física.
Produção
CO2
Ácido lático
A B
T0 T1 Tempo
Figura 7
A) Apenas I e II.
C) Apenas I, II e III.
D) Apenas I, II e IV.
32
FISIOLOGIA APLICADA À ATIVIDADE MOTORA
I – Afirmativa correta.
II – Afirmativa correta.
Justificativa: a respiração aeróbica precisa de O2 para produzir energia em forma de ATP e calor e
elimina o CO2.
Justificativa: em A temos como resultado o CO2, portanto, representa uma respiração aeróbica, e
em B temos a produção de ácido lático, que ocorre no processo anaeróbico, de fermentação.
IV – Afirmativa incorreta.
Questão 2. (Fatec 2007) Se as células musculares podem obter energia por meio da respiração
aeróbica ou da fermentação, quando um atleta desmaia após uma corrida de 1.000 m por falta de
oxigenação adequada de seu cérebro, o gás oxigênio que chega aos músculos também não é suficiente
para suprir as necessidades respiratórias das fibras musculares, que passam a acumular:
A) Glicose.
B) Ácido acético.
C) Ácido lático.
D) Gás carbônico.
E) Álcool etílico.
33