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MANUAL UNIVERSITÁRIO

DE ELECTRODINÂMICA
CLÁSSICA

Rogério Uthui
DEPARTAMENTO DE FÍSICA

MANUAL DE
ELETRODINÂMICA CLÁSSICA

Maputo 2012

Manual Universitário de Electrodinâmica Clássica – Rogério Uthui  Página 2 
PREFÁCIO
No desenho deste curso de Electrodinâmica tentou-se adequar o facto de a Electrodinâmica Clássica ser
um dos primeiros cursos de Física Teórica que são dados aos estudantes dos cursos de Física e de Ensino
de Física nas universidades moçambicanas.
Entende-se, pois, que o estudante tenha um domínio em fase de cristalização dos conceitos da Física
Geral (neste caso, das disciplinas de Mecânica e de Electricidade e Magnetismo) e do uso do aparato
matemático superior que normalmente é coberto nas disciplinas universitárias de Análise Matemática,
Álgebra Linear e Geometria Analítica e Física Matemática.
Para alargar o espectro dos potenciais utilizadores deste manual a estudantes dos cursos de Engenharia
Eléctrica, Comunicações e outros, normalmente com um currículo menos preenchido de disciplinas de
matemática superior, adoptou-se uma explanação mais para o lado fenomenológico e com níveis
progressivos de complexidade à medida que se avança nos textos.
Desta maneira, entende-se que o estudante ao terminar este curso de Electrodinâmica Clássica a nível de
graduação terá bases muito sólidas para cursos mais avançados e direccionados a nível de pós-
graduação, sem prejuízo de perceber claramente os fenómenos tratados e bases da teoria que os
descreve.
Para além disso, incluí-se no Manual uma parte prévia que trata principalmente dos aspectos
matemáticos que serão usados com alguma frequência no manual.

A preparação deste manual surgiu da realidade que se vive actualmente de falta de livros, de uma
maneira geral, adequados a todas as vicissitudes do ensino superior moçambicano (a expansão
geográfica, a expansão demográfica e os desafios de desenvolvimento do país) que de alguma maneira
limitam o acesso pleno da miríade de fontes existentes em diferentes meios incluindo a Internet. Não
espanta, pois, que nos tenhamos inspirado na classe real de estudantes universitários moçambicanos,
sem contudo olhar para os principais misconceptions característicos na interpretação de fenómenos nesta
área do saber.

O Autor

Manual Universitário de Electrodinâmica Clássica – Rogério Uthui  Página 3 
Antes da ordem do dia:
APARATO MATEMÁTICO A SER USADO NESTE MANUAL
A disciplina de Electrodinâmica clássica, assim como todas as disciplinas de Física Teórica, utilizam
muito aparato matemático na demonstração de conceitos e derivação de fórmulas. O estudante
universitário está de alguma forma familiarizado com estas operações, uma vez que as pode ter
analisado na disciplina de Álgebra Linear e Geometria Analítica. Nesta secção inicial expomos as
fórmulas fundamentais de modo a sistematizá-las num único espaço. Ao longo do Manual, algumas
delas serão demonstradas. As áreas cobertas são vectores, geometria diferencial, sistemas de
coordenadas, e matrizes.
ÁLGEBRA VECTORIAL
Produto escalar ou produto interno ou produto ponto rr r r
1 a.b = a . b cosθ (0.1)
(dot)
v v v
i j k
r r r r
2 Produto vectorial ou produto externo axb = a . b .senθ = ax ay az (0.2)
bx by bz

3 Propriedades dos produtos escalar e vectorial


rr rr
3,1 Comutativa a.b = b .a (0.3)
r r r rr rr
3,2 Distributiva do produto escalar a.(b + c ) = (a.b ) + (a.c ) (0.4)
rr r r
3,3 Vectores perpendiculares a.b = 0 ⇒ a ⊥ b (0.5)
r
r ar.b
3.4 Componente do vector b na direcção do vector a compav b = r (0.6)
a
r r r r
3.5 Anti-comutativa axb = −b xa (0.7)

3.6 Distributiva do produto vectorial r r r r r r r (0.8)


a x (b + c ) = ( a xb ) + ( a xc )
3.7 Vectores paralelos r r r r (0.9)
a xb = 0 ⇒ a ≡ b
r r r r rr r r r r rr
4 Identidade de Lagrange (axb ).(c xd ) = (a.c )(b .d ) − (a.d )(b .c ) (0.10)

5 Produto triplo de vectores

ax ay az
5.1 Produto escalar triplo de vectores r r r r r r r r r (0.11)
(axb ).c = bx by bz = (b xc ).a = (c xa ).b
cx cy cz

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5.2 Produto escalar triplo Tem o significado de volume do paralelepípedo (0.12)
r r r rr r rr r
5.3 Produto vectorial triplo ax(b xc ) = (a.c ).b − (a.b ).c (0.13)

6 Vectores recíprocos
6,1 ⁄ · (0.14)
6,2 Sejam dados os vectores a’, b’ e c’ tais que: ⁄ ·   (0.15)
6,3 ⁄ · (0.16)
Então, a’, b’ e c’ são vectores recíprocos de a, b e c · · · 1
6.4 (0.17)
respectivamente, de tal maneira que:
7 Decomposição de vectores numa base qualquer
Decomposição de um vector a numa base não –
7.1 r r r · · · (0.18)
ortogonal {e1 , e2 , e3 }

8 SISTEMAS DE COORDENADAS TRIDIMENSIONAIS MAIS COMUNS


cos sin cos (0.19)

sin sin sin (0.20)

cos (0.21)

⁄ (0.22)

⁄ (0.23)

arccos ⁄ (0.24)

tan ⁄ (0.25)

Sistema de coordenadas: Rectangulares Esférico Polares Cilíndrico polares

Coordenadas de P: , , , , , ,

Elemento do volume: sin · · · ·

Elementos métricos: 1, , sin 1, , 1

OPERAÇÕES DE GEOMETRIA DIFERENCIAL


9 Gradiente

Coordenadas rectangulares   (0.26)

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(0.27)
coordenadas cilíndricas

(0.28)
Coordenadas esféricas
(0.29)
coordenadas generalizadas

Aqui, f é uma função escalar, qi – a base do sistema de coordenadas e hi os elementos da métrica

10 Divergência

Coordenadas rectangulares (0.30)

(0.31)
Coordenadas cilíndricas
(0.32)
coordenadas esféricas  

coordenadas generalizadas   (0.33)

Aqui, A é uma função vectorial, qi – a base do sistema de coordenadas e hi os elementos da métrica

11 Rotacional

coordenadas rectangulares ⁄ ⁄ ⁄ (0.34)

⁄ (0.35)
coordenadas cilíndricas ⁄ ⁄ ⁄

coordenadas esféricas (0.36)

⁄ sin sin ⁄
  ⁄ ⁄ ⁄
sin
(0.37)
coordenadas generalizadas ⁄ ⁄ ⁄

Aqui, A é uma função vectorial, qi – a base do sistema de coordenadas e hi os elementos da métrica

12 Laplaciano
(0.38)
coordenadas rectangulares

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(0.39)
coordenadas cilíndricas
(0.40)
coordenadas esféricas sin
(0.41)
coordenadas generalizadas       

Aqui, f é uma função escalar, qi – a base do sistema de coordenadas e hi os elementos da métrica

IDENTIDADES DE OPERADORES DIFERENCIAIS


14

· · (0.42)

· · (0.43)

· (0.44)

· rot   (0.45)

· · (0.46)

(0.47)

∆ (0.48)

0 (0.49)

0 (0.50)

(0.51)

Aqui, f e g são campos escalares e A e B, campos vectoriais

FORMAS RADIAIS
15

(0.52)

3 (0.53)

2 (0.54)

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4 (0.55)

(0.56)
1⁄

1 (0.57)

2 (0.58)
1⁄

  ⁄ 4 … δ é a função Delta de Dirac (0.59)

TRANSFORMAÇÕES DE INTEGRAIS DE VECTORES


15

Teorema de Gauss (divergência) . (0.60)

(0.61)
Teorema de Stokes . .

Primeiro Teorema de Green   (0.62)

·   ·   · · ·   ·   ·

Segundo Teorema de Green (0.63)

·   · · · · ·

Aqui: f e g são campos escalares, A – campo vectorial, V – volume abrangido delimitado


pela superfície fechada S; dl, dS e dV – elementos de comprimento, superfície e de
volume.

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INTRODUÇÃO

O conteúdo moderno da disciplina chamada Electrodinâmica Clássica, que se lecciona a cursos de Física
e de Engenharia, corresponde quase que na totalidade à teoria do campo electromagnético, cujas bases
foram colocadas por James Clerk Maxwell (1831 – 1879) na sua obra fundamental “Tratado sobre
Electricidade e Magnetismo”, que viu a luz em 1873. Gustav Hertz, com as suas experiências (1887 –
1889) conseguiu demonstrar a veracidade da teoria de unificação da electricidade e do magnetismo e da
propagação das ondas electromagnéticas. Ele mesmo desenvolveu e transformou as equações de
Maxwell até o seu aspecto actual.

§ 1. Micro e Macro - electrodinâmica


A teoria clássica do campo de James Clerk Maxwell tanto na forma integral como na diferencial, tem
um carácter macroscópico ou, por outras palavras, ela é uma teoria fenomenológica. Isto significa que
na sua formulação não se tem em conta a estrutura atómico - molecular das substâncias que preenchem o
meio no qual se verifica a acção do campo.
A presença de substâncias na região onde se tem o campo eléctrico é considerada através da introdução,
nas fórmulas, dos coeficientes de susceptibilidade (dieléctrica - ε e magnética - μ), de condutibilidade
- γ, e outros, que são considerados constantes, não dependendo nem da intensidade nem da frequência do
campo.
O facto de a teoria de Maxwell ser fenomenológica encerra em si muitas limitações.
A análise do problema tendo em considerando a existência da substância conduziu ao aparecimento da
teoria electrónica clássica, inventada por Lorentz (1853 – 1928). Outro exemplo de dois approaches
distintos (fenomenológico versus estrutural) pode ser a termodinâmica versus a teoria molecular -
cinética que estuda o mesmo objecto científico mas sem ter em conta a sua estrutura (no primeiro caso) e
considerando a sua estrutura, no segundo caso.
A teoria de Lorentz é clássica porque ela considera que em todas as escalas de organização da matéria
(mega, macro e micro - mundo) as leis são exactamente as mesmas, não têm diferenças qualitativas.
Daqui segue que as equações de Maxwell são válidas também para os electrões e átomos, posição que a
mecânica quântica nega e demonstra com exemplos válidos e fenómenos verificáveis que existe uma
diferença substancial na análise de processos ocorrendo numa ou noutra escala.

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Ao se analisar o micro - mundo, salta logo à vista a não homogeneidade espacial da substância, a
distribuição das suas micro - cargas e seus micro - campos. De facto, a densidade do material nuclear é
1014g/cm3, enquanto que fora do núcleo, mas muito perto deste, a densidade é zero!
A intensidade do campo eléctrico E ≈ 2.107 unidades CGS dentro do núcleo e praticamente zero fora do
átomo.

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CAPÍTULO I
CAMPO ELÉCTRICO CONSTANTE NUM MEIO HOMOGÉNEO

§ 2. Lei de Coulomb, intensidade do campo eléctrico


Os fenómenos eléctricos e magnéticos são as duas faces de uma mesma moeda; dois lados de um único
processo indivisível electromagnético.
Na electrostática nós analisamos os fenómenos claramente de origem eléctrica. Nós sabemos, porém,
que na realidade, eles são acompanhados por campos magnéticos cujo aparecimento nos foge ao
analisarmos pelo método macroscópico.
Todas as micro-cargas do corpo, independentemente da existência ou não de qualquer interacção
externa, encontram-se em movimento constante de modo que não existem cargas estacionárias nos
corpos. O conceito de “carga imóvel” não é mais senão o valor médio das micro - cargas a nível
macroscópico.
O movimento das micro - cargas está relacionado com o aparecimento de campos magnéticos que não
podemos detectar por instrumentos de medida uma vez que estes apenas registam a média macroscópica
do movimento das micro - cargas.
A lei empírica mais fundamental, na qual se apoia a electrostática é a lei de Coulomb, de interacção
entre duas cargas pontuais. Um corpo considera-se pontual quando as suas dimensões são desprezáveis
em relação às distâncias até aos outros corpos, nas condições de um problema dado.
r r
q1 q 2 r
F12 = K 2 (2.1)
r r
K – é uma constante de proporcionalidade e depende da escolha do sistema de unidades, tal que nos
sistema CGS e SI tem valores diferentes:
CGS: K = 1;

1 Nm 2
SI: K= = 8.99 ⋅ 10 9
4πεε0 C2

Aqui, ε - é a constante dieléctrica do meio ; ε0 =8.85.1012F/m é a constante dieléctrica do vácuo.


r 1 q1q2 r
F12 = r (2.2)
4πεε0 r 312
r r r r r
O vector r12 = r2 − r1 ; o seu módulo é dado por: r = |r2 − r1 |.

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Assim, a fórmula (2.2) pode-se reescrever da seguinte maneira:
r 1 q1q 2 r r
F12 = r r 3 (r2 − r1 ) (2.3)
4πεε0 (r2 − r1 )
r
O campo eléctrico é caracterizado pelo vector intensidade do campo E , para a investigação do qual
usa-se uma carga de prova, pontual e positiva.
r
r F
E = (2.4)
q
r
Pode-se imaginar a intensidade do campo E como sendo a força com que o campo age sobre uma carga
positiva e unitária, colocada no ponto de observação.

[E ]= V ; 1
V
=
1
unidades de campo eléctrico CGS
m m 3 ⋅10 4

§ 3. Campo de cargas pontuais, volumétricas, superficiais e lineares num meio homogéneo.


Em muitos casos práticos, temos que determinar a intensidade do campo eléctrico para uma dada
distribuição de cargas. Existem muitas formas de solução deste tipo de problemas, conhecido como o
“problema directo da electrostática”.
Neste tipo de problemas pede-se, normalmente, para “investigar o campo da carga pontual Q, colocada
no ponto M com coordenadas xo,yo,zo num meio homogéneo (ε=const)”. Procuremos o campo no ponto
de observação A com coordenadas x, y e z, conforme mostrado na figura 1.1.

Figura 1.1. Explicação do processo de cálculo do campo eléctrico.


Sobre a carga de prova q colocada no ponto A irá agir uma força F definida pela lei de Coulomb a partir
da qual se pode determinar a expressão para o campo eléctrico de acordo com a fórmula (2.4):
r 1 Qq r
F= r (3.1)
4πε0 r 3

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r 1 Qr (3.2)
E= r
4πε0 r 3
r
A determinação do vector intensidade do campo eléctrico E , normalmente faz-se através do cálculo das
suas componentes (projecções) num dado sistema de referência. Assim, teremos:

⎧ r 1 Q ⋅ rx Q(x − x 0 ) ⎫
⎪ E x = 4 πε r 3
=
4 πε 0 r 3 ⎪
⎪ 0

⎪ r 1 Q ⋅ rx Q(y − y 0 ) ⎪
⎪E y = = ⎪ (3.3)
⎨ 4 πε 0 r3 4 πε 0 r 3 ⎬
⎪ r 1 Q ⋅ rx Q(z − z 0 ) ⎪
⎪ Ez = 3
= ⎪
⎪ 4 πε 0 r 4 πε 0 r 3 ⎪
⎪ ⎪
⎩ ⎭

r
A partir destas expressões obtém-se, finalmente, o módulo do vector E :

⎧ r r Ex
⎪ cos( E , x ) =
E (3.4)

⎪ r r Ey
E = E 2
x + E 2
y + E 2
z ; ⎨ cos( E , y ) =
⎪ E
⎪ r r Ez
⎪ cos( E , z ) = E

Se o campo for criado por algumas cargas, q1, q2, q3,….,qN, então será válido o princípio de
sobreposição, segundo o qual o campo total é igual à soma dos campos criados por cada uma das
cargas individualmente, isto é:
r n r
E = ∑ Ei (3.5)
i =1

Em muitos casos a carga está distribuída por um corpo de dimensões finitas. Nesses casos especiais
importa analisar o caso em que se tenha uma distribuição homogénea de carga por uma linha, uma
superfície ou pelo volume de um corpo maciço.
A resolução do problema directo da electrostática nesses casos deverá passar pelos seguintes passos:
a) Dividir o corpo no qual a carga está distribuída, por comprimentos, superfícies ou volumes
elementares, conforme o caso;

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b) Introduzir o conceito de distribuição linear (λ), superficial (σ) ou volumétrica (ρ) de carga. Ter
em conta que no elemento de comprimento (dl), superfície (dS) ou volume (dV), está contida
uma carga elementar dQ que se pode considerar pontual e para a qual se pode aplicar a lei de
Coulomb:
dQ = λdl; dQ = σdS; dQ = ρdV (3.6).
c) Usando a definição de campo eléctrico (fórmula 3.2) e as expressões (3.6), escrever a expressão
r
da intensidade elementar do campo eléctrico dE criado pela carga elementar dQ;
d) Por fim, usando o princípio de sobreposição, somar ou integrar os campos elementares conforme
se trate de uma distribuição discreta ou contínua de cargas.

Exemplo 1: campo eléctrico de um segmento de recta carregado uniformemente.


Uma barra fina, de comprimento L é carregada uniformemente com densidade linear λ. Calcular o campo eléctrico num
ponto situado a uma distância x de uma das extremidades.
Resolução: A lei de Coulomb é aplicável, somente, para cargas pontuais. Pode-se dividir a barra em pequenos elementos
(infinitesimais) de comprimento dl, cuja carga é dq = λdl. Esses elementos são cargas pontuais para as quais se pode
aplicar a lei de Coulomb e, seguidamente, achar-se o campo total pelo princípio de sobreposição, integrando ao longo do
comprimento da barra.

1dq 1 λdl
dE = =
4πε 0 ( x + l )2
4πε 0 (x + l )2
Figura 1.2. Ilustração das condições do problema.

L
λ L
dl λ ⎛ 1 ⎞ λ ⎛ 1 1⎞ λL
E=
4πε o ∫0 (x + l )2 = 4πε o ⎜⎝ − x + l ⎟⎠ = 4πε o ⎜⎝ − x + L + x ⎟⎠ = 4πε o x(x + L )
0

Exemplo 2: campo eléctrico de um anel carregado uniformemente.


Tem-se um anel de raio R, carregado com carga Q distribuída uniformemente com densidade λ. Achar a distribuição da
intensidade do campo eléctrico ao longo do eixo horizontal que passa pelo centro do anel a uma distância x do seu
centro. Por razões de simetria as componentes verticais de dE se anulam e restam só as componentes horizontais dEx . A
densidade linear de distribuição da carga λ=Q/2πR. Como no caso anterior, divide-se
o anel em elementos de carga de comprimento dl e carga dq=λ.dl. Calcula-se,
seguidamente, o campo criado por cada elemento de comprimento no ponto desejado
e integra-se pelo perímetro de todo o anel.

1 λdl λdl x λdl.x


dE x = ⋅ cos α = ⋅ =
Figura 1.3. Cálculo do campo 4πε 0 R + x
2 2
4πε 0 R 2 + x 2 (
R +x22
)
4πε 0 R 2 + x 2 ( )
3
2
eléctrico de um anel
2πR
carregado x Q.x
E = ∫ dE x = ∫ λdl ⇒ E =
(
4πε 0 R 2 + x 2 ) 3
2
0 (
4πε 0 R 2 + x 2 )
3
2

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§ 4. Linhas de força do campo eléctrico. Fluxo do vector intensidade do campo eléctrico
Um campo vectorial pode ser representado graficamente com a ajuda de linhas de força do vector dado.
Para o campo eléctrico, as linhas de força são aquelas para as quais o vector intensidade do campo
r
eléctrico E é tangente em cada ponto. As linhas de força do campo eléctrico começam nas cargas
positivas e terminam nas cargas negativas e podem vir do infinito ou sair para o infinito. Para o caso do
r
campo eléctrico E , as linhas de força nunca estão fechadas. Por outro lado, as linhas de força do
mesmo campo eléctrico nunca se intersectam, uma vez que isso implicaria a existência de alguns valores
para o campo eléctrico nos tais pontos de intersecção, facto sem nenhum sentido físico.
Na representação gráfica das linhas de força do campo eléctrico, una maior densidade das mesmas
indica um maior valor de campo, enquanto que para o campo constante, as linhas de força são rectas
paralelas.
Lembremo-nos do conceito simples de fluxo de um vector através de uma superfície. Num campo
r
homogéneo ( E = const.), o fluxo φ que passa pela superfície perpendicular So (veja a figura 1.2) é dado
pela fórmula:
φ = E ⋅ S0 (4.1)
Para uma outra área S, inclinada num ângulo α em relação a S0 , teremos:
φ = E ⋅ S 0 = E n ⋅ S cos α (4.2).
r r
O ângulo α, é o ângulo entre o vector campo eléctrico E e o vector n , normal externa à superfície S.

Figura 1.4. Desenho explicativo do conceito de fluxo do vector campo eléctrico através de uma superfície.
r
A expressão E.cosα é a projecção En do vector campo eléctrico E na normal à superfície. Deste modo,

φ = En.S (4.3)

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Para o caso em que temos uma superfície de formato qualquer, escolhe-se nela uma superfície
elementar dS muito pequena, que pode ser considerada plana (veja fig. 1.3) e escreve-se a expressão do
r
fluxo elementar do vector E através dela:

d φ = E ⋅ dS cos α (4.4).
O fluxo total através de toda a superfície será dado através da integração da expressão (4.4) por toda a
superfície atravessada pelas linhas de força do campo,

r r
φ= ∫E
s
n ⋅ dS = ∫ E ⋅ dS
s
(4.5)

Figura 1.5. Fluxo através de uma superfície S, de formato qualquer.

§ 5. Teorema de Gauss na forma diferencial e integral.


Os exemplos mostrados no §3, embora simples e propositadamente escolhidos, dão uma indicação de
que a determinação do campo eléctrico utilizando a lei de Coulomb e o princípio de sobreposição pode
conduzir a cálculos volumosos e pesados e que nem sempre são possíveis sem recurso a técnicas muito
avançadas de integração com uso de métodos numéricos.
Nos casos em que se tem uma distribuição espacial simétrica de carga, a determinação do campo
eléctrico pode se simplificar bastante com o uso do teorema de Gauss para a electrostática.

Figura 1.4. Dedução do teorema de Gauss para a electrostática.

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Seja dω um elemento de ângulo sólido, a partir do vértice do qual se podem ver as superfícies
elementares dS0 – esférica e dS - não esférica (no caso, plana). Devido ao facto de serem infinitamente
pequenas, as superfícies elementares dS0 e dS podem-se considerar planas e o ângulo entre elas pode-se
r
indicar pela letra α. Desenhemos um raio vector r que sai do ponto de origem e passa pelo centro da
superfície elementar dS. No ponto de intersecção do raio vector com a superfície, desenhemos uma
r
normal externa n . É claro que o ângulo
v^ r
α = (r , n )
Uma vez que a área elementar,
v^r (5.1)
dS 0 = dS cos α = dS cos ( r , n )
Podemos escrever a expressão para o ângulo sólido elementar:
dS0 dS .cosα
dω = = (5.2)
r2 r2
Se colocarmos uma carga pontual Q no vértice, então poderemos calcular o fluxo elementar do vector
campo eléctrico através de uma superfície qualquer aberta S, visível a partir do ponto onde se encontra a
fonte, sob o ângulo sólido ω:
r r
Q ⋅ dScos(E, n ) Qdω
dφ = = (5.3)
4πεε0 r 2 4πεε0
Integrando por toda a superfície
Q ⋅ dω Qω
φ= ∫ = (5.4).
4πεε0 4πεε0
Onde ω é o ângulo sólido total, sob o qual se vê a superfície S a partir do ponto onde se localiza a fonte.
Se a superfície S envolver completamente a carga Q, então o ângulo sólido total do qual se vê esta
superfície fechada é 4π. Assim, o fluxo do campo eléctrico criado pela carga Q através de uma superfície
fechada que a envolve é dado por:
Q 4π Q Q
φ = ∫ 4πεε
S 0
dω = =
4πεε 0 εε 0 (5.5)

Se a superfície fechada contiver algumas cargas então o fluxo através dela será:
1
φ=
εε0
∑Q (5.6)

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Exprimamos o teorema de Gauss na forma diferencial. Seja ΔV um volume elementar delimitado pela
superfície fechada ΔS e que contém a carga ΔQ = ρ.dV. Para este elemento de volume, o fluxo
elementar será:
1
Δφ = ∫ En ⋅ dS = ρΔV (5.7)
ΔS
εε0

Dividindo termo a termo por ΔV, obteremos:

Δϕ ∫ E dSn
1
= ΔS
= ρ (5.8)
ΔV ΔV εε0
Passando para o caso limite, em que se comprime o volume ΔV até ser infinitamente pequeno, passando
para um ponto:

dϕ ∫ EndS 1
lim = lim ΔS
= ρ (5.9)
ΔV → 0 dV ΔV → 0 ΔV εε0
A expressão no meio é conhecida por divergência, uma operação diferencial e que exprime a potência
de uma fonte de campo.
r 1
divE = ρ (5.10)
εε0
Esta é a expressão do teorema de Gauss na sua forma diferencial e tem o significado físico de que o
campo eléctrico tem origem nas cargas eléctricas. Para casos em que não temos nenhuma carga eléctrica
dentro do volume escolhido,
r
div E = 0 (5.11)
A partir da fórmula (5.9) podemos obter a expressão que também é conhecida por 2º teorema de Gauss:

r r r
V
∫ div E ⋅ dV = ∫E
S
n dS
(5.12)

Esta fórmula permite transformar um integral pelo volume num integral pela superfície e vice e
versa. Assim, o fluxo do campo eléctrico pode ser calculado através da integral pelo volume ou pela
superfície que delimita esse mesmo volume.

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Exemplo 3: Aplicação do teorema de Gauss no cálculo de campo eléctrico

Usando a teorema de Gauss determine o campo eléctrico E a ema distância x de um fio infinito, carregado com uma
densidade linear constante λ.

Resolução:
:
A solução dos problemas aplicando o teorema de Gauss obedece aos seguintes passos:
1. Identificar o tipo de simetria que se tem no problema (cilíndrica, esférica, etc…);
2. Escolher uma superfície gaussiana com a mesma simetria que a do problema e que
passe pelo ponto no qual se pretende calcular o campo eléctrico;
3. Escrever o teorema de Gauss e obter a expressão do campo eléctrico.
Eis, pois, a solução do problema: por questões de simetria, a superfície gaussiana analisada é
um cilindro de raio x, cujo eixo de simetria coincide com o fio. O fluxo só passa pela superfície
dos lados do cilindro. Aplicando o teorema de Gauss:

λh λ
Figura 1.5 E ⋅ 2πxh = ⇒ E=
εε o 2πεε o x

Para comparação, vejamos como se resolve o mesmo problema usando a lei de Coulomb e o princípio de sobreposição. Para
isso escolhamos elementos de comprimento dl , com carga dq e calculamos o campo que cada um deles cria num ponto a uma
distância y. O resto é um problema de geometria e reduzem-se as variáveis de integração a partir da semelhança de triângulos:
1 λdl
dE y = dE cos α = ⋅ ⋅ cos α
4πε 0 r2
Esta equação é difícil de integrar pois tem duas variáveis α
e l.
Usemos algumas semelhanças geométricas no problema para
eliminar uma das variáveis. Devido à semelhança dos
triângulos, podemos escrever:
⎧dl ⋅ cos α = rdα

⎨ x
Figura 1.6. Fio infinito com carga.
⎪⎩r = cos α
1 λ 1 λdα . cos α
dE y = ⋅ rdα =
4πε 0 r 2
4πε 0 x

Integra-se para α variando de 0 até π/2 (infinito), multiplicando por 2 por causa da simetria do problema.
π
λ 2
2λ λ
E= ⋅ 2 ∫ cos α .dα = ⋅ sen π ⇒ E =
4πε 0 x 0 4πε 0 x 2 2πε 0 x

§ 6. Dieléctricos num campo electrostático. Vector indução eléctrica.


Até agora temos estado a analisar o campo eléctrico num meio dieléctrico homogéneo e não limitado.
Como exemplo particular de tal dieléctrico podemos considerar o vácuo, que é caracterizado pela
permeabilidade dieléctrica ε = 1.

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Quando a região onde se encontra um campo eléctrico estiver preenchida por um dieléctrico homogéneo
( ε = const), então no denominador da fórmula para o cálculo do campo aparece a constante ε > 1 , isto
é, o campo e as linhas de força enfraquecem em ε vezes em relação aos respectivos valores no vácuo.
Nos casos reais, temos vários dieléctricos com limites e fronteiras e as anomalias que isso traz ao campo
são muito difíceis de analisar.
Na teoria analisam-se dieléctricos ideais, cujas cargas estão ligadas às moléculas (cargas ligadas). Por
outras palavras, não se analisam os campos cujas intensidades são tão fortes que podem retirar electrões
das moléculas. Assume-se que as cargas ligadas, nas moléculas, podem se deslocar apenas um pouco da
sua posição normal. A condutibilidade eléctrica dos dieléctricos ideais é igual a zero.
Ao se electrizar um dieléctrico, (por exemplo através da fricção) pode-se transmitir uma quantidade
limitada de cargas livres superficiais. Contrariamente ao caso dos metais, em que a carga superficial
pode ser retirada através da ligação de um ponto qualquer à terra, para se conseguir o mesmo efeito nos
dieléctricos, teriam que se ligar todos os pontos da superfície que recebe carga à terra. Não existe, neste
caso, o conceito de cargas livres distribuídas pelo volume.
Sob a acção do campo eléctrico ocorre a polarização do dieléctrico. No caso da Física geral
consideram-se dois mecanismos de polarização (electrónica e por orientação).
Na polarização electrónica pressupõe-se a existência de moléculas não - polares, nas quais as cargas
negativas ou positivas estão dispostas simetricamente em relação ao centro de cargas. Sob acção do
campo ocorre uma reorganização das cargas dentro das moléculas (i.e., polarizam-se) e podem ser vistas
como dipolos. O momento dos dipolos moleculares

r r
p = ql (6.1),
r
onde l é o vector que sai do centro da carga negativa ao centro da carga positiva.
O momento do dipolo induzido é proporcional ao campo:

r r
p = ε0 βE (6.2).
onde β é a polarizabilidade da molécula, que caracteriza o grau da molécula se reorientar sob acção de
um campo externo. A polarização de um dieléctrico caracteriza-se pelo vector polarização que é a
soma algébrica dos momentos dipolares moleculares por unidade de volume.
r r r r r N
r
P = p1 + p2 + p3 + ... + p N = ∑ pi (6.3)
i =1

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aqui, N é número de dipolos moleculares por unidade de volume. Num campo homogéneo, pode-se
considerar que todas as moléculas de uma substância homogénea estão polarizadas da mesma forma.
r r r r
P = N p = N ε 0 β E = αε 0 E (6.4)
O coeficiente
α = Nβ (6.9),
chama-se susceptibilidade dieléctrica. Exemplos de dieléctricos com moléculas não polares são os
gases: H2, N2, CO2, CH4, os líquidos toluol, exano, benzeno e alguns cristais sólidos: naftalina, enxofre,
etc.
O segundo mecanismo de polarização por orientação, acontece nos dieléctricos cujas moléculas na
ausência do campo têm as cargas de sinais diferentes dispostas sob forma de um dipolo. Quando o
campo externo for nulo, E = 0, os momentos dipolares estão orientados çãoticamente e o vector
polarização
r
P = 0 (6.10)
r
Quando há um campo externo, P é diferente de zero e pode-se descrever pela fórmula:
r r
P = αε 0 E (6.11)
São exemplos de substâncias com moléculas polares os seguintes: gases: H2S, SO2, NH3; líquidos: água,
nitrobenzol, éter; cristais dipolares: HCl, HBr, etc.
A polarização do dieléctrico ocorre sob acção de um campo inicial, e é devida à redistribuição das
cargas ligadas contidas nele. O campo resultante é a soma do campo externo e do campo do dieléctrico
polarizado.
Macroscopicamente, as cargas ligadas têm uma densidade volumétrica ρlig. Para além disso, na
superfície do dieléctrico surgem cargas ligadas superficiais com densidade σlig. O campo das cargas
ligadas obedece à lei de Gauss.
r ρ
div Elig = lig (6.12)
εε0
Para o campo total:
r
div E =
1
(ρ + ρ lig ) (6.13),
εε 0

Ou, na forma integral:


r 1 ρ + ρ lig
E =
εε 0
∫ 4πεε 0 r3
dV (6.14)

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A resolução de problemas em electrostática simplifica-se muito quando se introduz uma grandeza
r
auxiliar chamada vector indução eléctrica D que se distingue pelo facto de na sua origem se
r
considerarem apenas as cargas eléctrica livres. Para o vector D é valido o teorema de Gauss.

r
div D = ρ (6.15)
que faz parte do sistema de equações de Maxwell. Existe também o conceito de fluxo de indução
φD = ∫D
S
n dS
e o teorema de Gauss na forma integral para o vector indução escreve-se assim:

φD = ∫D n dS = ∫ ρ dV = ∑Q (6.16),
S V

onde ∑ Q é a soma algébrica das cargas livres no volume V delimitado pela superfície S. Para um
dieléctrico homogéneo, (ε = const. ) pode-se escrever:
r r r
div εε 0 E = ρ ⇒ D = εε 0 E (6.17),
F Volt C
no sistema SI as unidades do vector indução [D ] = ⋅ = 2 , coincidem com as unidades da
m m m
densidade superficial da carga. Um exemplo seria o cálculo do campo num condensador com diferentes
camadas de dieléctricos com constantes ε1 = 2, ε2 = 4 e ε3 = 1, como mostrado na figura 1.7 abaixo. O
vector indução do campo num condensador plano D = σ é valido para todas as camadas. Assim,
D D D
E = ; E = ; e E =
2ε 4ε ε
1 2 3
0 0 0

Figura 1.7. Exemplo que mostra a relação entre E e D.

§ 7. Carácter potencial do campo electrostático


O campo electrostático tem energia, com a qual pode realizar trabalho por exemplo ao transportar cargas
e corpos com carga. Calculemos o trabalho realizado pelo campo de uma carga pontual Q ao transportar
r
uma carga q, ao longo de um deslocamento elementar d l .
r r r r
dA = f ⋅ d l = q E d l (7.1).

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r r r
Aqui f = qE é a força que actua sobre a carga q e E é a intensidade do campo no ponto com raio
r
vector r
r r Qq r
dA = f ⋅ dl = dr (7.2).
4πεε 0 r 2

Aqui utilizamos a igualdade


(r
)
rdl cos r ^ dl = rdr
onde dr é um elemento de linha de força. O trabalho total:
r2
r2 r r
qQ
r2
dr qQ ⎛ 1 ⎞ qQ ⎛1 1⎞
A = q ∫ Edl = ∫ 2
= ⎜ − ⎟ = ⎜⎜ − ⎟⎟(7.3).
r1
4 πεε 0 r1 r 4 πεε 0 ⎝ r ⎠ r1 4 πεε 0 ⎝ r1 r2 ⎠
Daqui vê-se que o trabalho para deslocar uma carga num campo
Figura 1.8. Trabalho realizado pelo
campo eléctrico. eléctrico não depende da forma da trajectória mas sim das posições
inicial e final. Os campos com esta característica chamam-se campos potenciais. É claro que o integral
linear
2 r r 2 r r

1
Edl = ∫ E ldl
1
(7.4)

é o trabalho para movimentar uma carga unitária q = 1 do ponto 1 para o ponto 2 e o integral de linha
2 r r

1
E d l não depende da forma da trajectória de integração, ou seja, na electrostática verifica-se a

igualdade
2 r r 2 r r

132
Edl = ∫ Edl
142
(7.5).

Figura 1.9. Ilustração do sentido de contorno para o integral de linha.


Analisemos o integral numa linha fechada 13241, mudando de sentido 142, como mostrado na figura,

2 r r 2 r r 2 r r

132
Edl = − ∫
142
Edl =
241
∫ Edl (7.6).

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Donde segue que
2 r r 2 r r 2 r r r r

132
Edl + ∫
241
Edl = ∫
13241
Edl = ∫
L
Edl = 0 (7.7)

O integral por uma linha curva fechada chama-se circulação e tem o sentido físico de trabalho do
deslocamento de uma carga unitária por um circuito fechado. Campos cuja circulação é igual a zero
chamam-se potenciais.
Usando o teorema de Stokes, conhecido da análise vectorial, segundo o qual “a circulação de um
vector por uma linha fechada qualquer L, é igual ao fluxo do rotacionário deste vector através de uma
superfície S delimitada pela linha fechada L”, podemos escrever:
r r r r

L
Ed l = ∫ n dS
rot E
S
(7.8)

r
Para que o campo E seja potencial, então
r
rot E = 0 (7.9)

§ 8. Potencial do campo electrostático num meio homogéneo


O trabalho do campo electrostático pode, também, ser determinado pela variação de uma grandeza
energética que caracteriza o campo em cada ponto – o potencial eléctrico.
Se colocarmos uma carga de prova q num campo de uma carga positiva Q, então aquela irá se afastar no
sentido de diminuição do campo eléctrico, isto é, para o infinito. Neste caso o campo realiza trabalho
A ∞ que conduz ao aumento da energia cinética da carga de prova. O potencial do campo no ponto onde

começou o movimento
A∞
ϕ = (8.1).
q

Assim o potencial do campo num ponto dado é numericamente igual ao trabalho realizado pelo campo
para empurrar uma carga unitária positiva desde esse ponto até o infinito. Também se pode dizer que

W
ϕ = (8.2)
q
O potencial do campo num ponto é numericamente igual ao trabalho das forças externas contra o campo,
para deslocar uma carga unitária positiva do infinito ao ponto dado. O potencial do campo num ponto é
igual à energia potencial de uma carga unitária positiva colocada nesse ponto. Uma carga q num ponto

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com potencial φ, tem energia potencial W = q.φ. Assim, o trabalho para deslocar uma carga q de um
sítio com potencial φ1 para outro com potencial φ2 é dado por:
A = W1 − W2 = q (W1 − W2 ) = −q(W2 − W1 ) (8.3).
A unidade do potencial é o volt.

§9. Potencial de um campo de cargas pontuais, lineares, superficiais e volumétricas num meio
homogéneo.
A fórmula para a determinação do potencial do campo de uma carga pontual a uma distância r da carga
obtém-se da fórmula do trabalho do campo para deslocar uma carga q do ponto r1 ao ponto r2.
Colocando r1 = r e r2 = ∞ podemos calcular o trabalho:

Qq
A∞ = ∫ fdr = 4πεε
r 0 r
(9.1)

Donde se pode obter o potencial


A∞ Q
ϕ= = (9.2)
q 4πεε 0 r

O princípio de sobreposição dos campos é válido também para o potencial, isto é, o potencial de um
sistema de cargas pontuais é igual à soma algébrica dos potenciais das diferentes cargas:
ϕ = ϕ 1 + ϕ 2 + ϕ 3 + ... + ϕ N (9.3)
Este princípio é valido para outras distribuições de carga (volumétrica, superficial, ou linear). Para cada
caso, teremos:
⎧ dQ ρdV
⎪dϕ = =
⎪ 4 πεε 0 r 4 πεε 0 r
⎪ dQ δdS
⎨dϕ = = (9.4)
⎪ 4 πεε 0 r 4 πεε 0 r
⎪ dQ λdl
⎪dϕ = =
⎩ 4 πεε 0 r 4 πεε 0 r

§ 10. Gradiente do potencial e sua ligação com a intensidade do campo


O gradiente do potencial é o vector virado no sentido do maior aumento do potencial e é numericamente
igual à variação do potencial por unidade de comprimento. Lembremos que o trabalho para deslocar
uma carga do ponto A1 (x,y,z) ao ponto infinitamente perto A2(x+dx, y+dx, z+dz) será igual à diferença
r r
de potencial destes pontos: ϕ ( A1 ) − ϕ ( A2 ) = −[ϕ ( A2 ) − ϕ ( A1 )] = Edl . Assim,
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r r
Edl = − dϕ (10.1),
onde dφ é o diferencial completo da função φ(x,y,z). O sinal negativo significa que o campo desloca a
carga positiva no sentido da diminuição do potencial. Reescrevamos a equação anterior da seguinte
maneira.
r r ⎛ ∂ϕ ∂ϕ ∂ϕ ⎞ v
E d l = − ⎜⎜ dx + dy + dz ⎟⎟ = − grad ϕ ⋅ d l (10.2),
⎝ ∂x ∂y ∂z ⎠
Onde a expressão para o gradiente é:
r ∂ϕ r ∂ϕ r ∂ϕ
grad ϕ = i + j + k (10.3)
∂x ∂y ∂z

daqui, segue que


r
E = − grad ϕ (10.4).
Ou seja, desdobrando para cada componente do vector E:
⎧ ∂ϕ
⎪Ex = − ∂x (10.5)
⎪ 2 2 2
⎪ ∂ϕ r ⎛ ∂ϕ ⎞ ⎛ ∂ϕ ⎞ ⎛ ∂ϕ ⎞
⎨Ey = − E = ⎜ ⎟ + ⎜⎜ ⎟⎟ + ⎜ ⎟
⎪ ∂y ⎝ ∂x ⎠ ⎝ ∂y ⎠ ⎝ ∂z ⎠
⎪ ∂ϕ
⎪Ez = −
⎩ ∂z

§ 11. Campo eléctrico de um dipolo


Conhecemos já o cenceito de dipolo eléctrico - um sistema constituído por duas cargas pontuais de
sinais diferentes e igual valor, colocados a uma distância curta uma da outra. Este modelo é útil porque,
em muitos casos, as moléculas podem ser analisadas como dipolos eléctricos. A característica
→ → →
fundamental do dipolo é o momento dipolar p = q . l onde o vector l está dirigido da carga negativa
à negativa. O momento dipolar eléctrico determina tanto o campo eléctrico próprio do dipolo como a
magnitude das forças externas que actuam sobre o dipolo. Sobre a cargas +q e -q num campo
r r r
homogéneo, actuam as forças f1 = f 2 = qE que formam um par de forças. O momento de rotação do

par de forças será:


r r
K = f .l.senθ = q.E.l.senθ = p.E.sen( p ^ E ) (11.1)
na forma vectorial escreve-se
r r r
K = pxE (11.2)

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a) b)
Figura 1.10. Forças que agem sobre um dipolo num campo homogéneo (a) e não homogéneo (b).
.
Quando o dipolo está num campo não homogénio (figura 1.10 b) para além do momento rotacional actua
ainda a resultante das duas forças, diferentes aplicadas nas extremidades (pólos) do dipolo. A não-
homogeneidade do campo caracteriza-se pela derivada do campo em relação às coordenadas, e o campo
∂E
aumenta rapadimente ao longo do eixo z, então será o seu gradiente. A partir da figura, e
∂z
introduzindo os ponto z, (z + Δz ) e (z - Δz ), podemos escrever que:
⎧ ∂E
⎪⎪ E ( z + Δz ) = E ( z ) + ∂z Δz
⎨ (11.3)
⎪ E ( z − Δz ) = E ( z ) − ∂E Δz
⎪⎩ ∂z
e a força procurada:
r r r r r ∂E
f = f1 − f 2 = qE ( z + Δz ) − qE ( z − Δz ) = q 2Δz (11.4)
∂z
Tendo em conta a igualidade 2Δz = l. cos θ , a força de equilíbrio pode ser reescrita como:
r r ∂E r ∂E
f = ql cos θ = p. cos θ
∂z ∂z (11.5)

O sentido desta força depende do sinal de cosθ e, portanto, do ângulo θ: Parav θ < π a força é colinear
2

ao campo e o dipolo de certa maneira “ estica-se” no sentido do aumento do campo. Para θ > π o
2

dipolo é empurado para as zonas com menor E . Este último fenómeno não se observa normalmente,
uma vez que, devido à acção simultânea do momento de rotação, o dipolo orienta-se ao longo de vector
intensidade de campo (já que quando θ = 0 ⇒ cosθ = 1 ).

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Encontremos, então, o campo do dipolo usando o método sugerido no §10, isto é, calculando primeiro
o potencial e a partir dele, a intensidade do campo. A partir da fig.
1.11, podemos entender o significado dos símbolos usados.
O potencial o campo resultante em A pode ser visto como a soma
algébrica dos potenciais criadas pelas cargas +q e –q separadamente:
q q q ⎛1 1⎞ q ⎛ r− − r− ⎞
ϕ= − = ⎜⎜ − ⎟⎟ = ⎜ ⎟ (11.6).
4πεε °r+ 4πεε ° r− 4πεε ° ⎝ r+ r− ⎠ 4πεε ° ⎜⎝ r− r+ ⎟⎠

Figura 1.11.
Limitemo-nos a analisar apenas o caso para o qual r >> l (este caso é muito comum na análise do campo
de dipolos moleculares) assim, r+ ° r− ≈ r 2 ; r− − r+ = l cosθ e pode-se considerar que θ1 ≈ θ 2 ≈ θ .

q l cos θ p cos θ
ϕ = = (11.7)
4 πεε 0 r 2
4 πεε 0 r 2

r
Na forma vectorial, pode-se obter esta fórmula multiplicando o numerador e denominado por r :

→ →
p.r cosθ p. r (11.8)
ϕ= =
4πεε 0 r 3
4πεε 0 r 3

por fim, tendo em conta que grad q ⎛⎜ ⎞⎟ = − grad a ⎛⎜ ⎞⎟ = →


1 1 r
podemos reescrever a expressão (11.8).
⎝r⎠ ⎝ r ⎠ r3

→ → → →
p. r p ⎛1⎞ p 1
ϕ= = grad ⎜ ⎟ = − grad (11.9)
4πεε 0 r 3 4πεε 0 4πεε 0
q a
⎝r⎠ r

Demonstremos esta igualdade vectorial: diferenciando, podemos verificar que o gradiente no ponto
onde está a carga é:
2 2 2
⎛1⎞ 1 ⎛1⎞ 1 ⎡ ∂ ⎛ 1 ⎞⎤ ⎡ ∂ ⎛ 1 ⎞⎤ ⎡ ∂ ⎛ 1 ⎞⎤
grad q ⎜ ⎟ = 2 ; i.e grad q ⎜ ⎟ = 2 = ⎢ ⎜ ⎟⎥ + ⎢ ⎜ ⎟⎥ + ⎢ ⎜ ⎟⎥ (11.10)
⎝r⎠ r ⎝r⎠ r ∂
⎣ ox ⎝ r ⎠ ∂
⎦ ⎣ o ⎝ r ⎠⎦ ⎣ ∂zo ⎝ r ⎠⎦
y

De seguida, diferenciemos;

∂ ⎛ 1 ⎞ ∂ ⎜⎛ 1 ⎞
⎟ = x − xo
⎜ ⎟= (11.11)
∂xo ⎝ r ⎠ ∂xo ⎜ (x − xo )2 + ( y − yo )2 + (z + zo )2 ⎟⎠ r
3

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2 2
⎛x−x ⎞ ⎛ y− y ⎞ ⎛z−z ⎞
Tomando os quadrados das derivadas parciais ⎜ 3 o ⎟ , ⎜ 3 o ⎟ e ⎜ 3 o ⎟ , encontramos a expressão
⎝ r ⎠ ⎝ r ⎠ ⎝ r ⎠

procurada. O vector gradq tem o mesmo sentido que o vector r ; calcular a derivada pelas coordenadas
1
do ponto onde se encontra a fonte, significa que o mesmo se desloca. Daí fica claro que a grandeza
r

cresce mais rápido quando r decresce mais rápido. Isso ocorre quando nos deslocamos ao longo e r .
Por isso:
→ → →
⎛1⎞ ⎛1⎞ r 1 r r (11.12)
grad q ⎜ ⎟ = grad q⎜ ⎟ = 2 = 3
⎝r ⎠ ⎝r ⎠ r r r r

A fórmula (11.7) encontrada para a expressão do potencial como função das coordenadas polares r e θ
, significa que, de facto, nós introduzimos, implicitamente, um sistema de coordenadas esféricas,

colocando o início das coordenadas no centro do dipolo e o eixo polar dirigido ao longo de p (fig.
1.11). O potencial do campo, φ, não depende de ângulo azimutal uma vez que o campo do dipolo tem
simetria axial. O eixo de simetria é o eixo do dipolo. Definamos os componentes da intensidade:

1 ∂ϕ ∂ϕ ∂ ⎛ p. cos θ ⎞ p. cos θ
Er = − =− = ⎜ ⎟=
h1 ∂r ∂r ∂r ⎜⎝ 4πεε 0 r 2 ⎟⎠ 2πεε 0 r 3
1 ∂ϕ 1 ∂ϕ 1 ∂ ⎛ p cos θ ⎞ psenθ
Eθ = − =− =− ⎜⎜ ⎟=
2 ⎟
(11.13)
h2 ∂θ r ∂θ r ∂θ ⎝ 4πεε 0 r ⎠ 4πεε 0 r
3

1 ∂ϕ 1 ∂ϕ 1 ∂ ⎛ p cos θ ⎞
Eψ = − =− = = ⎜⎜ ⎟=0
2 ⎟
h3 ∂ψ rsenθ ∂ψ rsenθ ∂ψ ⎝ 4πεε 0 r ⎠
Aqui, ψ é a coordenada azimutal e h1, h2, h3, os coeficientes de Lamé no sistema de coordenadas
esféricas. Daqui pode-se obter o módulo do campo:
4 p 2 cos2 θ + p 2 sen2θ p p (11.14)
E = Er2 + Eθ2 + Eψ2 = = 4 cos2 θ + sen2θ = 1 + 3 cos2 θ
(4πεε r )
0
3 2 4πεε 0r 3 4πεε 0r 3

→ →
O ângulo β entre E e r , define-se a partir das fórmulas (11.13):
EO 1
tg β = = tgθ
Er 2

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Às vezes, em casos notáveis, analisam –se as posições gaussianas (pontos situados ao longo do eixo
do dipolo e pontos ao longo da sua perpendicular, saindo do centro do dipolo, também chamado de
π p
plano equatorial) θ = 0 ou θ = π. Nesse caso E1 =
p
. No segundo caso, θ = ⇒ E =
4πεε 0 r 3
2
2
2πεε 0r 3
§ 12. Campo eléctrico de um corpo polarizado
Usemos os resultados obtidos anteriormente para analisar o fenómeno de polarização dos diélectricos,
tendo em conta os processos atómico-moleculares na base da polarização. Como já foi dito, a
polarização dos dieléctricos acontece sob a acção de um campo primário cujo potencial podemos
escrever como sendo:
ϕ = ϕ o + ϕ´ (12.1)
E, correspondentemente,

→ → →
E = E O + E´ (12.2)
O potencial do campo no dieléctrico, pode ser visto como a soma dos potenciais dos dipolos atómicos
moleculares ∑ ϕ dip . Sabemos que o potencial do dipodo molecular

→ → →
p cos θ p. r p ⎛1⎞
ϕdip = = = grad q ⎜ ⎟ .
4πeo r 2
4πeo r 3
4πeo ⎝r⎠

Nestas fórmulas retirou-se o permeabilidade dieléctica ε uma vez que ela só aparece como resultado da
análise fenomenológica da polarização. Neste caso ela será tida em conta através da introdução do
potencial ϕ´= ∑ ϕ dip

ϕ = ϕo + ∑ ϕdip (12.3)

Calculemos a expressão geral para o potencial do campo de um corpo polarizado, com volume V, no
ponto de observação A (fig 1.12).

Figura 1.12. Cálculo do potencial de um corpo polarizado.

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O volume elementar escolhido dV pode ser visto como um dipolo com momento dipolar P dV que cria,
no ponto de observação, um campo com potencial dφ´ que se pode determinar como:


P dV ⎛ 1 ⎞ PdV cos θ (12.4)
dϕ´= grad q ⎜ ⎟ =
4πε 0 ⎝r⎠ 4πε o r 2

O potencial do campo de todo o corpo obtém –se através da integração por todo o volume:
v
P ⎛1⎞
ϕ´= ∫ grad q ⎜ ⎟dV
V
4πε 0 ⎝r⎠ (12.5)
e o potencial total:….
v
⎛1⎞P
ϕ = ϕ0 + ∫
gradq ⎜ ⎟dV (12.6)
V
4πε 0 ⎝r⎠
Agora transformemos a expressão sob o sinal de integral de acordo com as fórmulas da análise
vectorial:
⎛ →⎞ → →
div⎜ψ . a ⎟ = ψdiv a + a gradψ
⎝ ⎠

⎛ →⎞ →
donde segue que a gradψ = div⎜ψ . a ⎟ −ψdiv a (12.7).
⎝ ⎠
Logo:

⎛1⎞ ⎛1 →⎞ 1 →
P .grad q ⎜ ⎟ = div⎜ P ⎟ − div P
⎝r⎠ ⎝r ⎠ r
Assim, a expressão (12.6) terá a seguinte forma:

⎛ → ⎞ →
P ⎛1⎞ ⎜ P ⎟ div P
ϕ´= ∫ grad q ⎜ ⎟dV = ∫ div⎜ dV − ∫ dV
ν 4πε ⎝r⎠ ν ⎜ 4πε o r ⎟⎟ ν 4πε r (12.8)
o
⎝ ⎠ o

Usando o teorema de Gauss podemos transformar o primeiro integral da direita:

⎛ → ⎞
⎜ P ⎟ Pn
∫ div⎜ ⎟ dV = ∫ dS (12.9)
ν ⎜ 4πε o r ⎟ 4πε r
⎝ ⎠ S o

Assim: v
Pn divP
ϕ´= ∫ dS − ∫ dV
S
4πε o r V 4πε 0 r (12.10)

Onde Pn é a projecção do vector polarização na normal à superficie do corpo dieléctico e S, a sua


superficie. Revisitando as fórmulas (9.4) que expressam o princípio de sobreposição para o potencial

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eléctrico, vemos que a componente normal do vector polarização Pn tem o sentido físico de densidade

superficial das cargas ligadas σlig e div P tem o sentido de densidade volumétrica ρlig destas mesmas
cargas .
⎧Pn = σ lig
⎪ (12.11)
⎨ →
⎪⎩div P = − ρlig
Ficou demonstrado um dos teoremas fundamentais da eletrostática: o campo de um dieléctrico
polarizado define-se pela distribuição das suas cargas ligadas superficiais e volumétricas (12.12).

σ lig ρ (12.12)
ϕ´= ∫ ds + ∫ lig dV
S
4πε o r V
4πε o r

Todas as outras cargas anteriormente analisadas, são cargas livres. Se o campo primário φ0 for devido a
estas cargas livres, então:
σ ρ
ϕ0 = ∫ ds + ∫ dV (12.13)
S
4πε o r V
4πε o r

E o potencial do campo resultante será obtido da seguinte maneira:

ρ + ρ lig σ + σ lig
ϕ = ϕ o + ϕ´= ∫ dV + ∫ dS
ν 4πε o r S
4πε o r (12.14)
As cargas ligadas são sempre tratadas por cargas reais, uma vez que a sua presença não muda a carga
total do corpo polarizado.

§ 13. Cargas ligadas volumétricas e superficiais: relação entre os vectores E, D e P.


Para explicar melhor a fórmula (12.11) do parágrafo anterior, analisemos o campo homogéneo entre as
placas de um condesador plano. Nas suas placas há cargas
livres cujas densidades superficiais são +σ e -σ
respectivamente. Sob a acção do campo destas cargas o
dieléctrico entre as placas do condesador polariza-se.
Consideremos o dielétrico homogéneo com volume V,
espessura L e os seus lados paralelos às placas e com a mesma
Figura 1.13. Visualização do conceito de →

cargas ligadas. superfície S. Sejam ϕo e E o potencial e o campo primário

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em qualquer ponto, i.e.,o campo que existe no vácuo.
Quando o dieléctrico se polariza, irão surgir cargas ligadas nos seus lados: cargas ligadas negativas do
lado de placa positiva e cargas ligadas positivas do lado da placa negativa. Assim, nos dieléctricos

surgem cargas ligadas com densidades + σ lig e − σ lig , que criam um campo adicional E´,ϕ´ no

dieléctrico, contrário ao campo primário.


r r r v v v
ϕ = ϕ o + ϕ´, E = E0 + E ´ no nosso caso E = Eo − E´ .
→ →
O produto P V é o momento dipolar eléctrico do dieléctrico, uma vez que P (polarização ) é a soma dos
momentos dipolares por unidade de volume.

P V = σ eig .S .l (13.1)
como V = s.l , então
P = σ eig (13.2)

Neste caso P = Pn e assim Pn = σ eig .

− σ eig + σ eig Olhando para um caso mais geral, imaginemos que num

campo homogéneo se colocou um corpo do mesmo


dieléctrico que no caso anterior, com área dos lados S e S´,
E tal que
r r
S = S´cos(P, n )
Figura 1.14. Visualização do conceito de
cargas ligadas. As cargas ligadas em ambas as faces são numericamente
iguais:
σ ´eig S r r
σ eig .S = σ ´eig .S´ e = = cos( P, n )
σ eig S´
r r
σ ´eig = σ eig . cos( P, n ) . Uma vez que, σ eig = P, de acordo com (13.2) então, para o caso mais geral,


→ →
σ ´eig = P cos ( P, n ) = Pn (13.3)

A outra equação nas fórmulas (12.11) é div P = − ρ eig . . Ela pode ser reescrita como:

→ → → r
div P = divα .ε o E = αε o div E + ε o E.gradα

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o que significa que a div div P e ρeig podem ser diferentes de zero se o dieléctrico não fôr

homogéneo (isto é, gradα ≠ 0) ou quando divE≠0. Este facto significa que existem cargas livres (que
não estão sendo analisadas). Assim, as cargas ligadas volumétricas só aparecem em dieléctricos não
homogéneos. Como falamos antes, o fenómeno da polarização pode ser visto de duas maneiras, na

equação diferencial de E .
Primeira: através da introdução formal, na fórmula de divergência da permeabilidade relativa ε e
considerando apenas as cargas livres:
→ ρ
div E = .
εε o
Segunda: através da introdução da densidade volumétrica das cargas ligadas na expressão:
→ ρ + ρ eig
div E =
εo
→ →
Colocando nesta última expressão as fórmulas para D e P chegamos à equação principal que liga os
→ → →
vectores E (campo eléctrico), D (indução eléctrica) e P (polarização).

→ → →
divε o E = div D − div P (13.4)
Ou seja:
→ → →
ε o E = D − P , o que implica que
→ → →
D = εo E+ P (13.5)
→ →
Tendo em conta que P = αeo E , podemos recrescer a fórmula:
→ → → →
D = ε o E + αε o E = ε o (1 + α ) E

→ →
Comparando a fórmula (13.5) com a fórmula D = εε o E podemos encontrar a ligação entre a

permeabilidade dielétrica ε e a sua suscaptibilidade:


ε =1+α (13.6)

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§ 14. Condutores num campo eletrostático
Na electrodinâmica macroscópica, analisam-se modelos idealizados: condutores e dieléctricos. Os
condutores caracterizam-se pela existência, neles, de cargas livres que, sob a acção do campo,
movem-se dentro desses corpos sem limites. Nos metais sólidos e líquidos as cargas livres são os
electrões de condução ou de valência.
Na teoria fenomenológica os processos que se verificam nos condutores sob a acção do campo podem
ser explicados com sucesso admitindo a mobilidade das cagas tanto do mesmo sinal como de sinais
diferentes.
Sob a acção do campo, as cargas redistribuem -se (indução
eléctrica) de acordo com o esquema mostrado na fig. 1.15.
O campo das cargas móveis está representado a tracejado
no desenho. Dentro do condutor o campo primário é
compensado até zero uma vez que o movimento das cargas
continua que o campo resultante se anule. Daqui segue que
dentro do condutor não pode existir campo electrostático
(macroscópico).
Figura 1.15.
No caso da indução eléctrica, devido à distribuição das cargas
existentes ocorre uma deformação do campo mesmo fora do condutor. As linhas de força do cmpo
resultante estão dispostas ao longo da normal à superficié do condutor. Se o vector intensidade fosse
orientado sob uma certa inclinação, então a sua componente tangencial levaria ao movimento de cargas
na superficie.
O estado de equilibrio na superficie só será possível quando E = En , i.e, o campo eléctrico é igual à
sua componente normal.
Sabe-se que (de exercícios da electrostática).
σ
E = En =
εε o
O equilibrio das cargas na superficie só é possível quando o campo resultante, em todos os pontos desta
superfície, tiver o mesmo potencial, ou por outras palavras, a superfície de um condutor num campo

electrostático é uma superfície equipotencial ϕ = const. . Uma vez que dentro do campo E = 0 , então

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2
v v
para quaisquer dois pontos seus, ϕ1 − ϕ2 = ∫ E.dl = 0 i.e, todos os pontos no condutor têm o mesmo
1

potencial (dentro do condutor ou na sua superfície) que é o potencial do condutor.

§ 15. Energia de interacção de cargas eléctricas


A introdução do conceito de potencial facilita a análise do lado energético da interacção das cargas
entre si e com o campo. Sejam q1 , e q2 duas cargas pontuais de mesmo sinal situados a uma distância
r uma da outra num meio dieléctrico homogéneo (veja a fig.1.16). Representamos por ϕ12 e ϕ 21 os
potenciais nos pontos M1 e M2 respectivamente, nos quais estão localizadas as cargas. Aqui tenhamos
em conta que ϕ12 é o potencial do campo criado pela carga q2 num ponto M, onde está localizada a
carga q1 , e vice-versa .

Figura 1.16. Energia de interacção de duas cargas eléctricas.


Movendo a carga q2 do inifinito para o ponto M2, as forças externas realizam o trabalho:
q2 q1
− A∞ = q 2ϕ 21 = =W
4πεε o r
(Neste caso a carga q, considera-se fixa). Este trabalho determina a energia potencial da carga q2 no
ponto M2 . a grandeza +A∞ pode ser vista como o trabalho do campo de carga q1 para empurar a carga
q2 para o infinito. Da mesma maneira podemos encontrar a energia potencial de carga q1 no ponto M1:
q1q 2
− A∞ = q1ϕ 2 = =W
4πεε o r
Convém falar, logicamente, da energia de interacção das duas cargas e, por isso a expressão para W
escreve-se de forma simétrica:
1
W= (q1ϕ 2 + q2ϕ 21 ) (15.1).
2
Para um sistema de três cargas pontuais q1, q2 e q3 a energia pode ser determinada escrevendo a
energia de interacção para cada par de cargas:

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1
W1 = (q1ϕ12 + q2ϕ21 )
2
1
W2 = (q1ϕ13 + q3ϕ31 ) (15.2)
2
1
W3 = (q2ϕ23q3ϕ32 )
2
Somando estas equações, obteremos:
1
W= [q1 (ϕ12 + ϕ13 ) + q2 (ϕ 21 + ϕ 23 )q3 (ϕ 31 + ϕ 32 )] (15.3)
2
Introduzindo a notação ϕ1 = ϕ12 + ϕ13 e etc, teremos para três cargas:

1 3
W= ∑ qkϕk e para n cargas,
2 K =1
1 n
W= ∑ qkϕk
2 K =1
(15.4)

De uma maneira geral, para uma distribuição qualquer de carga, divide-se toda a carga numa soma de
cargas volumétricas elementares ρdV e cargas elementares superficiais σdS e passa-se da soma à
integração:
1 1
W= ∫ ρϕdV + ∫ σϕdS (15.5)
2V 2S
Onde ϕ é o potencial de todas as cargas volumétricas e superficiais no elemento de volume dV ou no
elemento de superfície dS.

§ 16. Energia potencial da carga um campo eléctrico externo. Energia do campo eletrostático
A expressão (15.4) permite determinar a energia de um sistema de cargas pontuais num campo eléctrico
externo. Se considerarmos que o nosso zero de pontencial é o potencial no inifinito, podemos exprimir
esta energia potencial através do trabalho do campo para a movimentação das cargas dos respectivos
pontos de localização até ao infinito. Assim a energia das cargas q1, q2, ...qn no campo externo com
potencial ϕ ( x, y, z ) será:
n
W = ∑ ϕ ( xi , yi , zi ).qi (16.1)
i =1

Onde xi, yi, zi são coordenadas do ponto, no qual se localiza a carga qi . É possível expressar a energia
doutra maneira, na qual entre de forma explícita o volume do espaço ocupado pelo campo. Para isso,

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resolvemos um problema auxiliar: encontremos a energia de um condutor fino e isolado, com carga, com
um potencial φ0, num campo homogéneo.
A energia eléctrica do condutor será igual ao trabalho, contra as forças eléctricas de repulsão, realizado
quando se acrescentam sucessivamente cargas elementares dq ao condutor. O transporte de cada carga
dq a partir do infinito (onde ϕ = 0 ) até ao condutor, está relacionada com o trabalho pela expressão:

− A = ∫ ϕdq
Reescrevamos esta expressão tendo em conta a ligação entre o potencial ϕ1 , a carga q e a capacidade
C do condutor: q= C.ϕ ; dq = Cd ϕ :
ϕo
Cϕ o2 qϕ o q 2
− A = ∫ Cϕdϕ = = = =W (16.2)
o 2 2 2C
Analisando o processo análogo de carga de um condesador plano, como um processo de transporte de
cargas elementares de uma placa para outra, podemos obter a energia de um condesador carregado:

W=
1
(Qϕ1 − Qϕ 2 ) = Q (ϕ1 − ϕ 2 ) (16.3)
2 2
Se tivermos em conta a expressão para a capacidade de um condesador plano:
εε o S Q
C= e C=
l ϕ1 − ϕ 2
bem como a ligação entre a diferença do potencial e a intensidade do campo eléctrico ϕ1 − ϕ 2 = E.l ,
teremos
C (ϕ1 − ϕ 2 ) εε o SE 2 l 2 εε o E 2
2
W= = = Sl
2 2l 2
Lembramos que S .l = V volume do espaço onde temos campo:
εε o E 2
W= V (16.4)
2
O aparecimento do volume na fórmula para a energia de interação das cargas eléctricas tem um grande
significado físico: a energia eléctrica está localizada no espaço ocupado pelo campo. Isto demonstra-se
experimentalmente usando campos variáveis. Por causa disso, podemos introduzir o conceito de
densidade volumétrica da energia w:
dW
w= (16.5)
dV

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No caso do condesador plano, o campo é homogéneo e, por isso, W = const o que significa que
W
w= assim
V
→ →
dW εε o E 2 E D
w= = = (16.6)
dV 2 2
Esta fórmula é válida mesmo para campos não homogéneos. Para a energia do campo num dado
volume V, encontramos:
→ →
εε o E 2 ED
W = ∫ wdV = ∫ dV = ∫ dV (16.7)
V V 2 V 2

No caso mais geral, considerando o primeiro integral na expressão (15.5) e a expressão ρ = div D
teremos 1 1 → 1 ⎛ →⎞ 1 → 1 1 →→
W= ∫ ρϕdV = ∫ ϕdiv D dV = ∫ div⎜ ϕ D ⎟dV − ∫ D gradϕdV = ∫ ϕ Dn dS + ∫ D E dV
2V 2V 2V ⎝ ⎠ 2V 2s 2V

§ 17. Sistema completo de equações de Maxwell e condições de fronteira para o campo


electrostático

Resumamos os principais aspectos já analisados, do campo electrostático:



1. O campo electrostático (campo do vector E) é criado por fontes, que são cargas eléctricas ( ligadas
ou livres);

2. As fontes do vector Dsão apenas cargas ligadas;

3. O campo electrostático é potencial, isto é, a circulação do vector E através de uma linha curva
fechada qualquer é igual a zero.
Estes aspectos expressam-se matematicamente através do sistema de equações de Maxwell que na sua
forma diferencial escrevem-se da seguinte maneira:
v
⎧rotE = 0
⎨ v (17.1)
⎩divD = ρ
Onde ρ é a densidade volumétrica das cargas. Na sua forma integral, estas fórmulas têm o seguinte
aspecto:
v v
⎧ E.dl = 0
⎪⎪∫L
⎨ v v v (17.2)
⎪∫ divD.dV = ∫ D.dS = Q
⎪⎩V S

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Quando se transcrevem estas equações no sistema CGS, as equações contendo D , ε e ε0 têm um aspecto
diferente:

⎧divD = 4πρ
⎪ v v v
⎨ divD.dV = D.dS = 4πQ (17.3)
⎪⎩V∫ ∫S
Neste sistema das equações principais do campo electrostático, inclui-se a equação que estabelece a
→ →
ligação entre E e D (chamada equação material), que tem conta as propriedades do meio em que se
encontra o campo:
v v v v
D = εε 0 E ou D = εE (17.4)
Conforme se trate do sistema SI (no primeiro caso) ou SGS (no segundo).
Usemos o sistema das principais equações do campo electrostático para a obtenção das condições de
→ →
fronteira para os vectores E e D.
Como já foi dito antes, o potencial φ do campo electrostático,
para uma distribuição superficial ou volumétrica de cargas, é
uma função continua.
→ →
Na resolução de equações diferenciais para Ee D irão aparecer
constantes de integração e, por isso, para uma determinação
unívoca dos vectores do campo devem ser conhecidas as suas
propriedades na fronteira entre os diferentes meios, i.e., as
condições de fronteira a partir das quais pode-se determinar o
valor das constantes.
Analisemos pois o que ocorre com os dois vectores ao passarem
pela fronteira entre dois meios.
Figura 1.17. Ilustração para a dedução
das condições de fronteira de E e D.
a) Comportamento do vector indução ao passar por uma superfície com carga.
Analisemos o campo electrostático duma superfície carregada S, que divide dois dieléctricos isotópicos

com permeabilidade ε1 e ε2 como mostrado na fig. 1.17. Seja n a normal à superficie, virada para o 20
meio e fixemos, na superficie, uma superficie elementar ΔS, com carga superficial livre бΔS e
construamos sobre ela um prisma rectângular.

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→ →
Sejam n1 e n 2 as normais às bases inferior e superior do prisma respectivamente, cada uma virada para

o lado de fora do prisma. De acordo com a equação de Maxwell para a divergência de D (17.1 e 17.2), o
fluxo do vector indução através deste prisma será:
v v v v
∫ n = Δ + 1 , n 1 ) Δ S + N D = σΔS
/
D ds D 2 cos( D 2 , n 2 ) S D1 cos( D (17.5)
s

Aqui, N´D é o fluxo da indução através dos lados do prisma. Lembremos que:
v v v v →
D2 cos( D2 , n2 ) = D2 n ; D1 cos( D1 , n1 ) = − D1n são as projecções do vector Dnas normais.
Se aproximarmos as bases do prisma à superficie carregada até uma distância infinitamente pequena,
então o fluxo N´D através dos lados do prisma será infinitamente pequeno também e poderá se desprezar.
Neste caso,
(D2n – D1n).ΔS = σΔS
De onde segue a condição de fronteira para o vector indução:
D2n – D1n = σ (17.6)


Ao passar através de uma superfície carregada, a componente normal do vector D experimenta um salto
no valor de σ.


b) Comportamento do vector indução D ao passar por uma superficie não carregada.
Analisemos a superfície que separa dois dieléctricos, na qual não haja cargas livres superficiais (σ = 0).
Da equação (17.6), surge uma outra condição de fronteira:

D2n – D1n = 0 → D2n = D1n (17.7)


Isto é: “na fronteira entre dois dieléctricos (e para σ = 0), a componente normal do vector D é continua,
isto é, não sofre nenhum salto.

c) Comportamento do vector intensidade do campo eléctrico na fronteira entre dois meios.



A componente normal do vector intensidade E experimenta um salto tanto ao passar por uma
superficie com cargas ligadas como por uma superfície com cargas livres isto é, na fronteira entre 2
dieléctricos com permeablidade ε1 e ε2 . A existencia de cargas ligadas na superfície é demonstrada pela

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→ →
diferenca entre ε1 e ε2 destes meios. Em meios isotrópicos, a ligação entre os vectores E e D e entre os
respectivos componentes, tem o mesmo aspecto.
→ →
D = εε 0 E; Dn = εε 0 E n ; Dτ = εε 0 Eτ ;

Aqui, Dτ e Eτ são as componentes tangenciais dos vectores. Da condição (17.7) segue que, na fronteira
entre dois dieléctricos, ε1 ε 0 E1n = ε 2ε 0 E2 n, donde se obtém a relação pretendida:

E1n ε 2
=
E2n ε 1 (17.8)

Vejamos o comportamento da componente tangencial do vector E na fronteira entre dois dieléctricos.
Imaginemos dois dieléctricos com permeabilidade ε1 e ε2, separados por uma superfície S (fig. 1.18).
Tracemos uma recta tangente no ponto onde queremos determinar as condições de fronteira e

decomponhamos o vector E nas suas componentes normal e tangencal En e Eτ.

Figura 1.18. Ilustração para a dedução das condições de fronteira da componente tangencial do vector E.

Usando a equação de Maxwell para a circulação do vector intensidade pelo pequeno circuito fechado

ABCD (L). Seja τ o vector unitario paralelo a Eτ no segundo meio:

∫ E dl = E τ .a − E τ .a + A =0
/
2 1
L

Onde A/ é o trabalho para a deslocação de uma carga unitária nos dois segmentos h. Comprimindo o
circuito infinitamente, diminuem-se os lados h de tal maneira que A/ ≈ 0. Nesse caso,

E2τ – E1τ = 0 → E2τ = E1τ (17.9)


Esta conclusão é válida para a fronteira entre dois meios quaisquer (dieléctrico – condutor, dieléctrico –
dieléctrico ou condutor – condutor). Desta maneira, na fronteira entre dois meios, a componente

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→ →
tangencial E τ é continua, de onde segue que o vector E esta orientado normalmente a superfície do
condutor.

e) Refracção das linhas de forca na fronteira entre dois dieléctricos.


Analisemos o comportamento das linhas de força do campo eléctrico na superfície entre dois
dieléctricos 1 e 2 com uma superfície de separação S (fig. 1.19). No caso geral, ε1≠ε2. Por uma questão

de garantir maior certeza, coloquemos ε1 › ε2 (por exemplo ε1 = 2.ε2). Decomponhamos E 1 no primeiro
meio, nas suas componentes normal e tangencial.

A componente tangencial do vector E 1 na fronteira é continua E1τ = E2τ e a componente normal
experimenta um salto (E2n = 2E1n , de acordo com (17.7)

Figura 1.19. Refracção das linhas de força do vector E na fronteira entre dois dieléctricos.

Da figura 1.19, podemos obter a razão trigonométrica.

E1τ
tgβ1 E1n ε1
= =
tgβ 2 E2τ ε 2
E2 n

Esta relação é conhecida por lei da refracção das linhas de forca. As equações de Maxwell:
e campo na v
⎧rotE = 0
⎨ v (17.10),
⎩ divD = ρ
mais as condições de fronteira na superfície que separa dois dieléctricos:

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⎧ D2 n − D1n = σ
⎨ (17.11)
⎩ E2τ = E1τ

complementadas pelas condições de fronteira na superfície que separa um condutor e um dieléctrico:


⎧ Dn = σ
⎨ (17.12)
⎩ Eτ = 0
E, por fim, as fórmulas de ligação:
v v v (17.13),
D = εε 0 E e E = − gradϕ
compõem o sistema completo das equações de Maxwell para a electrostática no caso de dieléctricos
isotrópicos e condutores homogéneos.

§ 18. Equação diferencial para o potencial (Equação de Poisson – Laplace)


Muitas vezes é fácil resolver os exercícios em eletrostática se se começar a partir da equação diferencial
para o potencial. Das equações fundamentais,

E considerando a condição de homogeneidade do dieléctrico (ε = const.), teremos:

div(εε0 gradφ) = εε0 div gradφ = - ρ (18.1)


O operador div.grad = Δ chama-se Laplaciano. Assim podemos reescrever a expressão (18.1) como:

ρ
Δϕ = −
εε 0 (18.2)
Esta fórmula é a equação de Poisson para o potencial eléctrico. Ela é válida para os pontos onde haja
cargas livres. Para os casos em que não temos cargas livres, ela tem uma formulação mais simples, com
o segundo termo igual a zero e passa a chamar-se equação de Laplace:
Δφ = 0 (18.3)
Esta equação tem um significado muito importante na resolução da questão principal da electrostática,
isto é, no cálculo de grandezas que caracterizam o campo de um sistema dado de cargas nos
condutores. São possíveis duas variantes desta questão:
1. São dados os valores dos potenciais dos condutores e pede-se a determinação do campo no
espaço entre os condutores, bem como a distribuição das cargas;

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2. São dados valores das cargas nos condutores e pede-se o cálculo do potencial nos mesmos,
densidade das cargas nas superfícies e o campo no meio homogéneo entre os condutores.
A questão resume-se ao cálculo da função φ que satisfaz a equação de Laplace nos pontos do meio entre
os condutores, que é igual a zero no infinito e que na superfície do condutor tem os valores φi ,
satisfazendo a relação integral.

∂ϕ
− εε 0 ∫ ds = qi
Si ∂n (18.4)
Onde qi é a carga do condutor i e n é a normal à superfície. A igualdade (18.4), é uma forma modificada
do Teorema de Gauss na forma integral, tendo em conta a igualdade:
∂ϕ
En = −
∂n

§ 19. Potencial do campo de um sistema de cargas a grandes distâncias. Decomposição multipolar


Encontremos o campo de um sistema qualquer de cargas volumétricas em pontos situados a grandes
distâncias das cargas, a partir da fórmula para o potencial.

1 ρdv
ϕ=
4πεε 0 V r ∫ (19.1)
Onde V, é região do espaço onde se situa o sistema de cargas. Seja d a maior dimensão linear desta
região.
O centro O é escolhido algures dentro do volume V. O raio

vector virado para o ponto de observação é: R 0 ( X 1; X 2 ; X 3 )
e o raio vector do ponto M, com coordenadas (ξ1, ξ2, ξ3)
onde se situa o volume elementar selecionado dV, com
carga elementar ρdV, será r´(ξ1, ξ2, ξ3). Interessa-nos o
caso em que,isto é o ponto de observação está a uma
distância muito maior do que as dimensões lineares do
sistema de cargas
Figura 1.20. Ilustração para a dedução da R0>>d (19.2)
decomposição multipolar do potencial de um
sistema de cargas eléctricas a grande distância.

Decompondo a função 1/r que entra na formula (19.1) numa série de Taylor por potências de ξi perto
do ponto 0: 1 1 3
⎡ ∂ ⎛ 1 ⎞⎤ 1 3 3
⎡ ∂ 2 ⎛ 1 ⎞⎤
= + ∑ ξi ⎢ ⎜ ⎟⎥ + ∑ ∑ ξiξk ⎢ ⎜ ⎟⎥ +....
r R0 i =1 ⎣ ∂ξi ⎝ r ⎠⎦ r = R 2! i =1 k =1 ⎣ ∂ξi ∂ξ k ⎝ r ⎠⎦ r = R0 (19.3)
0

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Colocando esta decomposição na formula (19.1) obtemos:

⎧⎪ ρdV ⎫⎪
1 ∫ ⎡ ∂ ⎛ 1 ⎞⎤
∑ ⎢ ∂ξ ⎝ r ⎠⎥ ∫ i
1 3 3 ⎡ ∂ 2 ⎛ 1 ⎞⎤
∑∑ ⎢
2! k =1 i =1 ⎣ ∂ξi ∂ξ k ⎝ r ⎠⎦ ∫
ϕ ( X 1; X 2 ; X 3 ) = ⎨ + ⎜ ⎟ * ξ ρdV + ⎜ ⎟ ⎥ * ξ ξ ρdV +... ⎬
(19.4)
4πεε 0 ⎪ R0
i k
⎩ ⎣ i ⎦ r = R0 ⎪⎭

Que podemos reescrever como:


φ = φ1 + φ2 + φ 3 +……………+ φn (19.5)
onde o ultimo termo é inversamente proporcional à potência N do raio R0 :
1
ϕn ≅
R 0n
O primeiro termo de soma, φ1 é o potencial da carga pontual, situada no início das coordenadas e com
valor igual à soma algébrica de todas as cargas do sistema.
O segundo termo:

⎡ ∂ ⎛ 1 ⎞⎤
1 3
⎜ ⎟⎥ ∑ ⎢ ∂ξ
4πεε 0 i =1 ⎣ i ⎝ r ⎠⎦ r = R ∫
ϕ2 = ξi ρdV .
(19.6),
0

pode ser calculado facilmente. Determinemos, para isso, a expressão dentro dos parênteses rectos:

⎡ ∂ ⎛ 1 ⎞⎤ 1 ∂r xi
⎢ ⎜ ⎟⎥ =− r = Ro = (19.7).
⎣ ∂ξi ⎝ r ⎠⎦ r = R0 r ∂ξi R03

∂r
onde o termo: encontra-se diferenciando por ξi o raio vector
∂ξi

r 2 = (ξ1 − x1 ) + (ξ2 − x2 ) + (ξ3 − x3 )


2 2 2

Por outro lado, o integral ∫ ξ ρdV


i pode ser analisado como sendo a componente Pi do vector.


v
P = ∫ r ′ ρdV (19.8)
Das equações (19.7) e (19.8) obtemos:
→ →
1 3
xi 1 P R0 (19.9),
ϕ2 = ∑
4πεε 0 i =1 R0
P=
3 i
4πεε 0 R03

que é o potencial do dipolo eléctrico com momento dipolar P situado no inicio das coordenadas O.

Correspondentemente, φ2 é o potencial dipolar do sistema e P - o momento dipolar do sistema.
O terceiro membro da soma, tem o aspecto:
1 ⎧⎪ 3 3 ⎡ ∂ 2 ⎛ 1 ⎞ ⎤ ⎫⎪
⎨∑ ∑ ⎢
4πεε 0 ⎪ i =1 k =1 ⎣ ∂ ξ i ∂ ξ k ⎝ r ⎠ ⎦ r = R ∫
ϕ3 = ⎜ ⎟⎥ ξ i ξ k ρ dV ⎬
⎩ 0
⎪⎭ (19.10)

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e chama-se momento quadrupolar do sistema. Um quadrupolo é um sistema de quatro cargas (+q), -q,
+q, -q), situadas nos vértices de um paralelogramo (fig. 1.21).
Desta maneira, o potencial de um sistema qualquer de cargas, a uma
distância grande pode ser visto como a soma de potenciais de uma
carga potencial, de um dipolo, de um quadrado, etc. Este método

Figura 1.21. Quadrupolo eléctrico. chama-se decomposição por multipolos.

§ 20. Forcas que agem sobre as cargas por parte do campo eléctrico.
Já sabemos que sobre cargas eléctricas elementares, tanto livres como ligadas, actuam forças por parte
do campo eléctrico, responsáveis pelo movimento das mesmas cargas. No caso de equilíbrio
electrostático das cargas, estas forças agem sobre corpos carregados ou polarizados.
Uma vez que cargas elementares, que se repelem
mutuamente, não podem abandonar a superfície de um
condutor isolado, sobre a superfície do condutor agem forcas
que tendem a esticá-lo. Analisemos a figura 1.21.
Sobre um elemento de superfície dS age a forca:

df = σ(E-E/) dS (20.1)
Onde σ – é a densidade superficial das cargas do elemento de
superfície dS, E – o campo resultante do lado externo do
Figura 1.21. Forças que actuam sobre cargas condutor perto do elemento dS e E’ é o campo devido à carga
eléctricas num corpo, por parte de campos
eléctricos. do elemento dS nos pontos perto dele.
Na fórmula (20.1) consta a diferença dos campos E - E’ uma vez que a carga σ.dS não age sobre si
própria. Seja E’’ o campo nos pontos da superfície elementar dS, devido a todas as cargas, excepto a
carga σdS.
Em dois pontos vizinhos situados um de cada lado de dS os campos E’’ destes pontos são iguais.
Escrevamos as igualdades.
⎧ E′ + E′′ = E
⎨ (20.2)
⎩ E′ − E′′ = 0
O significado físico destas igualdades é simples de interpretar: O campo resultante perto de dS é a soma
de 2 campos: do campo criado pela própria carga σ.dS e do campo criado por todas as cargas resultantes.

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A segunda igualdade significa que não existe campo dentre do condutor. Assim, fica que:
1
E ' = E '' = E
2
donde a forca elementar
σE
df = dS
2

Uma vez que σ = εε0 En e En=E


E2 (20.3)
df = εε 0 dS
2

Tendo em conta a homogeneidade do campo, a força que age por unidade de superfície do condutor é
igual a:
df εε 0 E 2
p== (20.4)
dS 2
Esta grandeza chama-se densidade superficial da forca. A forca geral que age sobre o condutor por toda
a superfície:
→ → E2
F = εε 0 ∫ n dS (20.5)
s
2
→ v
n - é um vector unitario normal. No caso de um condutor isolado carregado, F = 0 .
Às vezes, o problema de cálculo das forças de campo resolve-se facilmente através da expressão para a
energia W do sistema de condutores como função das coordenadas. Suponhamos que numa deslocação
infinitamente pequena de um dos condutores, só muda uma das coordenadas, que iremos indicar por q, e
as cargas de todos os condutores não mudam.
O trabalho δA das forças do campo para realizar uma deslocação elementar dq realiza-se por conta da
diminuição da energia do campo δW, ou seja
δA = - δWe (20.6).
O ídice e significa que a carga não muda, com a variação da energia. Uma vez que
∂W e
δW e = dq ,
∂q
∂W e
então δA = − dq
∂q (20.7)
Usamos a fórmula conhecida de mecânica:
δ A = Q q dq (20.8)

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Não confundir grandeza Q com a carga. De facto, Qq é a forca generalizada, correspondente à
coordenada generalizada q, ou seja:
∂W e (20.9)
Qq = −
∂q
Se q for uma coordenada no sistema cartesiano, então a fórmula (20.9) expressa a projecção da força na
direcção q, se dq for o ângulo elelentar de rotação do condutor à volta de um eixo qualquer, então (20.9)
expressa o momento das forças do campo em relação a este eixo.
Para um dieléctrico no campo eléctrico, podemos analisar as forcas que agem sobre ele de forma mais

simplificada: seja f dV a forca que age sobre uma unidade de volume de um dieléctrico. Nesse caso, e

igualmente ao caso anterior, f é a densidade volumétrica dessa forca. A força total, será (sem
demonstração):
→ v ε ε ⎛ ∂ε ⎞
f = ρ E − 0 E 2 grad ε + 0 grad ⎜ E 2 τ⎟ (20.10)
2 2 ⎝ ∂τ ⎠

→ →
Nesta fórmula, τ é a densidade do dieléctrico. O primeiro termo f 1 = ρ E é a densidade da forca que
age sobre uma carga electrica livre. A segunda parte:
→ ε0 ε0 ⎛ ∂ε ⎞
f2 = − E 2 grad ε + grad ⎜ E 2 τ⎟
2 2 ⎝ ∂τ ⎠
ε0
é diferente de zero apenas nos dieléctricos. O termo − E 2 grad ε aparece apenas nos
2
dieléctricos não homogeneos. A experiência que todos realizaram na escola de atracção de pedaços de
papel por esferográfica electrizada no cabelo, explica-se exactamente pela presenca desta forca.
ε0 ∂ε
O termo grad ( E 2 τ ) caracteriza a distribuição de forças eléctricas no volme do dieléctrico.
2 ∂τ
Ele é responsavel pelo fenómeno conhecido por electrostrícia.

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