A Ciência segundo Thomas Kuhn; O processo de evolução científica segundo Popper e Kuhn; Objetividade e
Verdade segundo Popper e Kuhn
Disciplina: Filosofia
Conteúdos de 11.º
Kuhn começa por descrever a fase que antecede a ascensão de um determinado campo
de investigação ao estatuto de ciência propriamente dita:
Importa referir, em primeiro lugar, que Kuhn considera que aquilo que distingue a
ciência da não-ciência é o aparecimento de um paradigma.
Digamos que o Paradigma impõe aos cientistas “o que ver”, “como ver” e “quando ver”,
não deixando aos cientistas grande margem de liberdade. Ao definir o que o cientista pode, ou
não pode fazer, o Paradigma funciona como um “grande ditador”, sendo os cientistas meros
obreiros, executores, das suas linhas de comando.
No entanto, acontece por vezes depararmo-nos com enigmas que parece não poderem
ser resolvidos à luz dos normativos do Paradigma. À medida que o número de enigmas sem
solução aumenta (acréscimo de anomalias), a comunidade científica começa a interrogar-se
sobre a validade do Paradigma, o qual parece ser insuficiente para explicar as anomalias ou os
factos da realidade. Por tal razão, cresce no interior da comunidade científica um sentimento de
insatisfação e insegurança, o qual empurra a comunidade para um período de Crise.
No decorrer desta Crise, a Ciência Normal fica como que em suspense e dá lugar a um
período de Ciência Extraordinária. Durante este período, mais do que se fazerem novas
investigações, a comunidade científica centra as suas atenções no debate sobre a manutenção
do atual Paradigma ou a escolha de um novo.
O debate que ocorre durante o período de Ciência Extraordinária não é um debate fácil,
pois, apesar de todas as contrariedades, a comunidade científica é bastante reticente quanto à
questão de alterar o Paradigma vigente. É que o Paradigma representa um modo de fazer
ciência, de perceber, abordar e resolver problemas; enfim, o Paradigma é uma forma de “ver o
mundo”. De tal modo que optar pela mudança de Paradigma representa uma mudança na forma
como vemos e compreendemos o mundo e o real. Veja-se, por exemplo, a revolução na
mundivisão que a ciência (e através dela todas as outras áreas de conhecimento) sofreu quando
o Paradigma Geocêntrico deu lugar a um Paradigma Heliocêntrico. Durante este período, a
comunidade científica divide-se em duas fações: os conservadores, que se recusam a abrir mão
do velho paradigma, mesmo perante o seu sistemático fracasso; e os revolucionários, que
procuram uma revisão completa dos fundamentos do seu campo de estudo, de modo a traçar
um novo paradigma capaz de solucionar, pelo menos em parte, as anomalias anteriormente
detetadas.
NOTA: Estes processos revolucionários não representam uma evolução, num sentido
cumulativo, em direção a uma compreensão mais profunda da realidade tal como ela
objetivamente é. Esta mudança implica uma alteração substancial da forma como entendemos
o o que é fazer ciência numa determinada área, bem como o tipo de fenómenos e entidades
objeto dessa investigação. Assim, os cientistas orientados por paradigmas diferentes têm
mundos diferentes e incompatíveis diante dos seus olhos e não existe um padrão neutro que
permita julgar qual desses mundos está mais próximo da realidade.
Bem como se pode notar um crescente sucesso e prestígio da ciência, que parece
evidenciar que as teorias atuais estão mais próximas da verdade do que as anteriores.
Uma outra objeção que podemos considerar baseia-se no facto de os novos paradigmas
resolverem, frequentemente, as anomalias dos seus antecessores, para concluir que os
paradigmas não são incomensuráveis.
Repare-se que embora a verdade seja considerada objetiva, ela funciona apenas como
uma meta para a qual a ciência deve tender, sem que jamais possa estar segura de a ter atingido.
Daí que nenhuma teoria seja verdadeira, mas somente corroborada. E o progresso ocorre
através da resistência que as teorias apresentam face aos testes de falsificação. É como se a
ciência evoluísse através da procura do erro, pois no fundo o trabalho do cientista é elaborar
testes que coloquem a claro os erros das teorias. Se, no entanto, as teorias passam em todos os
testes, podemos dizer que progredimos, dado que essas teorias se tornam cada vez mais
verosímeis.
Mas sendo assim, será que para Kuhn não existe qualquer progresso científico? A
resposta é: sim, existe progresso científico. Porém, este progresso ocorre no interior de cada
Paradigma, e não na transição de um Paradigma para outro. É ao nível do período de Ciência
Normal, quando o cientista se encontra a resolver enigmas à luz das diretivas estabelecidas pelo
Paradigma vigente, que o progresso ocorre: cada enigma resolvido traduz-se num progresso
efetivo. Quantos mais soluções são descobertas, mais se pode dizer que a ciência evoluiu.
E como é feita a escolha dos Paradigmas? Será ao menos isso alguma coisa que obedece
a critérios meramente objetivos, ou até nesse ponto a objetividade estará colocada em causa?
Ora bem, efetivamente, segundo Kuhn, a escolha de um Paradigma é marcada por fatores de
ordem histórica, sociológica e psicológica. O mesmo é dizer que a par dos critérios objetivos que
certamente existem no momento da escolha do Paradigma, essa escolha necessariamente será
também marcada por critérios subjetivos.
Vejamos: segundo Kuhn, ao nível dos critérios objetivos que são contabilizados para o
efeito da escolha contam-se os seguintes:
- Alcance: maior ou menor abrangência das áreas que podem ser “tocadas” pelo
Paradigma;
Dados estes critérios, objetivos, imagine que dois Paradigmas rivais apresentam o mesmo grau
de rigor objetivo ao nível da Exatidão, da Consistência e do Alcance. No entanto, um deles é
excelente ao nível da Simplicidade e o outro ao nível da Fecundidade. Perante este cenário,
perguntamos: que Paradigma escolher? Responde Kuhn: é precisamente neste momento que
entram em jogo os critérios subjetivos, isto é, as preferências individuais daqueles que executam
a escolha. Certamente as preferências pessoais de alguns investigadores irão inclinar a escolha
para o Paradigma que apresenta maior simplicidade, enquanto outros escolherão o que
apresenta maior Fecundidade. No fundo, tudo dependerá daquilo que cada um privilegia.