Trabalho de Epidemiologia
História natural das doenças e níveis de prevenção
Ao relacionar doenças passíveis de transmissão por agentes infecciosos com enfermidades que
acometem a população sem que haja a veiculação das mesmas, podemos observar a mudança no perfil
epidemiológico de morte causada por elas no decorrer das décadas. Tem-se, então, com base no gráfico abaixo,
retirado de um documento “Epidemiologia das causas externas no Brasil: mortalidade por acidentes e violência
no período de 2000 a 2009” da Secretaria de Vigilância em Saúde do Ministério da Saúde, que as Doenças
Infecciosas e Parasitárias (DIP), principais causas de morte nas décadas de 1930 até meados de 1960, reduziram
seus índices, ao passo que as Doenças Crônicas Não Transmissíveis (exemplificadas pela Hipertensão Arterial e
pelas Diabetes Mellitus), representadas no gráfico pelas Doenças Cardiovasculares (DCV), emergiram como as
principais causas de morte na atualidade. Essa transição deve-se ao fato da evolução na área de tecnologia em
saúde para tratar e previnir as patologias causadas pelas DIP, além do desenvolvimento de políticas públicas para
promover a saúde e o conhecimento sobre essas doenças, e também à mudança no estilo de vida do brasileiro,
cujos costumes tendem ao sedentarismo associado ao consumo desregrado de alimentos, principalmente os de
baixo valor nutricional.
Uma doença não infecciosa, portanto, é aquela que, no estado atual do conhecimento clínico e
fisiopatológico, não se relaciona com uma invasão do organismo por outros seres vivos parasitários. Um
exemplo de doença não infecciosa crônica, e que se encontra classificada com uma DCV, é a Hipertensão
Arterial Sistêmica (HAS). De acordo com as VI Diretrizes Brasileiras de Hipertensão Arterial (2010), trata-se de
uma condição clínica multifatorial caracterizada por níveis elevados e sustentados de pressão arterial (PA).
Associa-se frequentemente a alterações funcionais e/ou estruturais dos órgãos-alvo (coração, encéfalo, rins e
vasos sanguíneos) e a alterações metabólicas, com consequente aumento do risco de eventos cardiovasculares
fatais e não fatais. É considerada um dos principais fatores de risco modificáveis e um dos mais importantes
problemas de saúde pública. Considerando-se valores de PA ≥ 140/90 mmHg, 22 estudos encontraram
prevalências entre 22,3% e 43,9% (média de 32,5%), com mais de 50% entre 60 e 69 anos e 75% acima de 70
anos.
Para o entendimento do processo global e do desenvolvimento da HAS, faz-se necessário detalhar e
interrelacionar os agentes causadores dessa doença, a população que está suscetível a ela e os fatores que
influenciam a existência dos agentes, sua susceptibilidade e seu contato com o hospedeiro (ambiente).
Mais de 90% dos casos de HAS são de origem desconhecida e tendem a se agrupar em famílias,
podendo representar um grupo de doenças ou síndromes de base genética resultantes da herança da diferentes
anormalidades bioquímicas. Os fenótipos resultantes podem ser modulados por fatores ambientais, com
conseqüente variação na intensidade e gravidade da elevação da pressão arterial, no tempo para seu
aparecimento e nas lesões dos órgãos-alvo. Quanto a etiologia da doença, diversos fatores fisiopatológicos foram
identificados na gênese da HAS de causa primária: aumento da atividade do sistema nervoso simpático; aumento
da produção de hormônios retentores de sódio e de vasoconstrictores; aumento prolongado da ingestão de sódio
durante a vida; ingestão inadequada de potássio e cálcio; aumento da secreção ou secreção inapropriada de
renina, com conseqüente aumento na produção de angiotensina II e aldosterona; deficiência na produção de
vasodilatadores, como prostaciclinas, óxido nítrico (NO) e peptídeos natriuréticos; alterações na expressão do
sistema calicreína-cinina; anormalidades nos vasos de resistência; diabetes mellitus e resistência à insulina;
alterações dos receptores adrenérgicos, influenciando a frequência cardíaca, a resposta inotrópica do coração e o
tônus vascular; e alterações no transporte iônico. Recentemente, há evidências que anormalidades vasculares
estruturais e funcionais, como disfunção endotelial, aumento do estresse oxidativo e remodelamento vascular,
podem contribuir para a patogenia da HAS.
A população suscetível à HAS está diretamente relacionada com o os fatores de risco de desenvolver a
doença e estes, por outro lado, são, de fato, os parâmetros promovem o intermédio entre a patogenia e o
hospedeiro da mesma, isto é, o meio ambiente propício para que um indivíduo entre em contato com os
respectivos agentes etiológicos. Os fatores de risco para a HAS são: a (1) idade, sendo a prevalência de HAS
superior a 60% acima do 65 anos; (2) o gênero, já que a prevalência de HAS é mais elevada nos homens até os
50 anos invertendo-se a partir da quinta década; (3) a etnia, considerando que a HAS é duas vezes mais
prevalente em indivíduos da cor não branca, apesar de não se conhecer com exatidão o impacto da miscigenação
sobre a HAS no Brasil; (4) o excesso de peso e obesidade, com maior risco de desenvolver a doença ao se
aumentar 2,4 kg/m² no índice de massa corporal (IMC); (5) a ingestão de sal, pois a ingestão excessiva de sódio
tem grande correlação com a elevação da PA; (6) a ingestão de álcool; (7) o sedentarismo, ao passo que a
atividade física reduz a incidência de HAS; (7) fatores genéticos; e outros fatores ambientais que tendem a
contribuir passa o aparecimento da doença.
A prevenção dessa doença é muito importante, principalmente a realizada antes da ocorrência da fase
patológica, pois a HAS é, na maioria das vezes, um distúrbio silencioso, cujas conseqüências e
comprometimento de diferentes órgãos aparecem de maneira tardia. Dessa forma, medidas não medicamentosas,
como mudanças no estilo de vida, são entusiasticamente recomendadas na prevenção primária da HAS,
notadamente nos indivíduos com PA limítrofe, isto é, 140/90 mmHg. As principais recomendações não
medicamentosas para prevenção primária da HAS são: alimentação saudável, consumo controlado de sódio e de
álcool, ingestão adequada de potássio e combate ao sedentarismo e ao tabagismo. Além de ações pré-HAS,
existem medidas eficientes de prevenção da evolução do processo patológico no organismo, enquanto a doença
ainda esta progredindo, na tentativa de regredi-la (prevenção secundária); e atitudes que se dirigem a fase final
do processo e visam desenvolver a capacidade residual do indivíduo (prevenção terciária). Inclui-se na prática da
forma secundária de prevenção o tratamento medicamentoso, por meio de diuréticos, inibidores adrenérgicos,
bloqueadores dos canais de cálcio, vasodilatadores diretos, inibidores da enzima conversora de angiotensina
(IECA), bloqueadores do receptor AT1 da angiotensina II e o inibidor direto da renina (Alisquireno), e o
tratamento não medicamentoso da prevenção primária, que deve ser mantido durante das três fases de prevenção.
Por fim, reverter as conseqüências secundárias à HAS é um meio de atenuar ou evitar a invalidez e promover o
ajustamento do paciente a condições irremediáveis (prevenção terciária), que se dá pelo tratamento das lesões
dos órgãos-alvo acometidos, como coração, rins, sistema nervoso e olhos.
Referências bibliográficas:
REVISTA BRASILEIRA DE HIPERTENSÃO. Diretrizes de Hipertensão Arterial.6. Ed. São Paulo, SP, 2010.
SECRETARIA DE VIGILÂNCIA EM SAÚDE. Epidemiologia das causas externas no Brasil: mortalidade por
acidentes e violência no período de 2000 a 2009. Disponível em:
<http://portal.saude.gov.br/portal/arquivos/pdf/cap_11_saude_brasil_2010.pdf>. Acesso em: 27 jan. 2013.