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SEGMENTO MESA 177

DOENÇAS DE ORIGEM ALIMENTAR


3
I NTRODUÇÃO
DOENÇAS DE
ORIGEM ALIMENTAR

As Doenças Transmitidas por Alimentos (DTA) são síndromes que afetam o consumidor. Manifes-
tam-se com o desenvolvimento de sintomas clínicos gastrintestinais, relacionados com o perío-
do de incubação, quando causadas por agentes que desencadeiam doenças agudas. As doenças
crônicas também ocorrem, no caso de o agente ser cumulativo (o consumo reiterado se soma no
organismo, pois a excreção do agente é pobre ou não ocorre no consumidor) ou em decorrência
da doença aguda. Em alguns casos, o agente pode disseminar-se para outros órgãos.

Apesar de haver subnotificações de casos e de surtos de DTA no Brasil, a sua notificação está
prevista na legislação brasileira (artigo 2º da Portaria do Ministério da Saúde nº1461 de 22 de
dezembro de 1999, estabelece: “Todo e qualquer surto ou epidemia, assim como a ocorrência de
agravo inusitado, independente de constar na lista de doenças de notificação compulsória, deve
ser notificado, imediatamente, às Secretarias Municipal e Estadual de Saúde e à Fundação Nacio-
nal de Saúde/FUNASA.”)

O diagnóstico das DTA é uma atividade que tem por objetivo o esclarecimento de ocorrência de
natureza epidemiológica relacionada ao consumo de alimentos. É de interesse à saúde do con-
sumidor, para a implementação de medidas de controle dos agentes de agravo à saúde. Permite
identificar perigos de maior incidência e prevalência, fornecendo dados indispensáveis para a
elaboração de um plano de Análise de Perigos, Pontos Críticos de Controle e outras formas de
controle de perigos.

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O diagnóstico das DTA depende da caracterização do agente através dos sintomas e período de
incubação e por análise laboratorial, assim como da associação com o consumo de uma mesma
refeição, o que caracteriza surtos fechados e nos quais os comensais têm relação entre si (locais
como residências, indústrias, escolas, associações, clubes, festas, creches, asilos etc.) ou envol-
ver consumidores que não partilharam da mesma refeição, mas que têm em comum a ingestão de
produto de distribuição ampla, que pode afetar pessoas sem relação entre si, de municípios,
estados e até países diferentes. Assim, para um dimensionamento total das doenças de origem
alimentar, é necessário dispor de sistema de notificação e de associação entre os casos.

Para caracterizar casos e surtos de DTA, é necessário que a população esteja informada sobre os
sintomas desta classe de ocorrência (diarréias brandas, episódios de vômito), pois comumente
são considerados pelo próprio afetado como “mal-estar passageiro” e não necessariamente as-
sociados ao consumo de alimentos. Sintomas graves, como diarréias severas, febre, incapacitações
físicas é que podem, em função da necessidade de atendimento médico e/ou hospitalar, sugerir
ao afetado ou seus contatos, uma “doença significativa” de origem alimentar. Os profissionais de
atendimento primário à saúde também devem estar alertados para estas ocorrências, com vistas
ao dimensionamento do problema e da investigação de suas causas.

Os dados levantados de sintomas prevalentes entre os afetados e período de incubação indicam


o agente veiculado pelo alimento, sendo importantes para orientar sobre o diagnóstico do(s)
agente(s) mais provável(is). Esses dados devem indicar o alimento que veiculou o agente,
correlacionando a taxa de ataque entre os comensais afetados e os não afetados. Toda e qual-
quer informação e observação que permita avaliar falhas/erros no preparo e na conservação do
alimento, que possa ter favorecido o evento, deve ser compartilhada e discutida entre o pessoal
que manipulou/preparou o alimento e os profissionais que estão procedendo ao levantamento
de dados sobre o surto.

Os surtos de DTA podem envolver um número significativo de afetados. A análise de amostras de


alimentos envolvidos, como fonte comum do agente, é importante, principalmente para orientar
as ações de saúde pública e de controle de alimentos em toda a sua cadeia de produção, incluin-
do o seu preparo final. A análise das sobras, além das amostras de rotina, pode ser útil na
confirmação do veículo.

É importante assinalar que a análise de produtos que não foram processados, como por exemplo
carnes cruas, não tem função diagnóstica do surto, mas pode ser indicativa da presença do
patógeno na matéria-prima utilizada, sendo útil para um possível rastreamento de origem de
contaminação do produto efetivamente consumido.

Quando o resultado da análise de alimentos é relacionada com o resultado das amostras biológi-
cas e ambientais, o diagnóstico é completo e os perigos de maior incidência e prevalência podem
ser adequadamente caracterizados.

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Apesar de a ocorrência dessas doenças ser freqüente, nem sempre elas são notificadas ou conhe-
cidas. O trabalho que vem sendo realizado pela Secretaria de Saúde do Estado do Paraná relatou
em 1978 apenas um surto de DTA, porém em 1998 e 1999 conseguiu a notificação, respectiva-
mente, de 200 e 192 surtos.

C LASSIFICAÇÃO GENÉRICA DAS PRINCIPAIS DOENÇAS DE ORIGEM


ALIMENTAR

As doenças alimentares também podem ser classificadas de acordo com o agente e os sintomas:

Doenças infecciosas
Causadas por agentes bacterianos, virais e parasitários que têm a capacidade de causar infec-
ções. São exemplos a Salmonella Typhi, os demais sorovares, Streptococcus do grupo A, vírus da
hepatite infecciosa, vírus entéricos humanos, Toxoplasma gondii, entre outros. As infecções
bacterianas podem desencadear sintomas que incluem a febre, que pode ser mais ou menos alta.
Alguns agentes, como a Escherichia coli O157:H7, o Vibrio cholerae 01 epidêmico e outros, podem
produzir toxina, durante a infecção.

Doenças toxinogênicas (toxinoses)


São as doenças que têm como agente toxinas microbianas (bacterianas), pré-formadas no pro-
duto. O que diferencia esse grupo de agentes do anterior, é que neste a toxina é o agente inge-
rido e não as células viáveis do microrganismo patogênico. A síndrome (sinais clínicos) dessa
classe de doença está relacionada com a toxina e o respectivo sítio biológico de atuação. São
exemplos a toxina botulínica que se liga nas terminações nervosas em nível muscular, impedindo
a liberação de acetilcolina , a estafilocócica que atua no centro vomitivo cerebral.

Doenças tóxicas
São síndromes que têm como agente uma toxina ou uma substância química. A presença das
substâncias químicas tóxicas, como os pesticidas, pode ser conseqüência de uso indevido na produção
primária de vegetais e animais, conforme já assinalado. Outra classe de produtos tóxicos, igualmente
importante, é a de resíduos de drogas veterinárias, como medicamentos antiparasitários, antibióticos
e determinadas classes de hormônios não tolerados, por falha na aplicação e no cumprimento de
tempo de carência. Os contaminantes inorgânicos (metais pesados, como mercúrio, chumbo,
cádmio) podem estar presentes como conseqüência de seu uso na composição de alguns pesticidas
ou por despejo de dejetos industriais e de mineração no meio ambiente.

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Como conseqüência do uso de compostos nitrogenados na adubação, águas superficiais usadas


para consumo humano podem ser contaminadas por níveis altos de nitratos e nitritos. Algumas
toxinas biológicas, como as micotoxinas produzidas por fungos toxinogênicos, estão classifica-
das como substâncias químicas tóxicas, considerando que a determinação analítica é realizada
principalmente por métodos químicos; as ficotoxinas (toxinas de algas de água doce ou salgada)
também podem ser classificadas como contaminantes químicos, pela mesma razão. As toxinas
naturais são também consideradas perigos de natureza química. Como exemplo, temos a histidina
e a tirosina: a histidina pode estar presente em pescados (em especial da Família Scombridae); e
a tirosina (que se transforma em aminas biogênicas, notadamente a histamina) pode ser encon-
trada em queijos úmidos, maturados. Algumas bactérias psicrotróficas são capazes de produzir e
liberar determinadas enzimas que, em excesso e dependendo da faixa etária e condições nutricionais
e de saúde do consumidor, podem causar diarréias, a exemplo das lipases produzidas por deter-
minadas espécies de Pseudomonas pelo armazenamento prolongado do leite cru sob refrigera-
ção, antes do seu processamento térmico.

É importante assinalar que essas substâncias tóxicas são termoestáveis e o processamento do


produto pelo calor não as inativa. Determinados aditivos, como os compostos relacionados com
o sulfito de sódio, nitrato e nitrito, alguns dos corantes artificiais e outros podem causar doenças
no consumidor quando usados indevidamente ou em excesso. Os aditivos com função de
conservante, se usados em quantidades insuficientes, podem permitir a multiplicação de
contaminantes microbianos no produto, incluindo os patógenos. Alguns nutrientes, como a vi-
tamina A, quando em excesso, também podem causar injúria no consumidor. As síndromes rela-
cionadas dependem da forma de atuação e sítio de eleição do agente no organismo do afetado.

Doenças relacionadas com síndromes alérgicas e metabólicas do


consumidor
Alguns agentes podem estar presentes no alimento, seja por não cumprimento da formulação
do produto, como exemplo a presença de glúten em produtos cuja rotulagem não indica sua
presença ou de proteínas com poder de desencadear sintomas alérgicos em indivíduos sensíveis,
como é o caso de determinadas proteínas, como de soja, amendoim e outros. A intolerância à
lactose é outra síndrome incluída nessa classe.

Doenças nutricionais
Essas síndromes estão relacionadas com a ausência/deficiência de nutrientes no produto ali-
mentício ou com nutrientes não biodisponíveis e com alimentos direcionados a dietas de ema-
grecimento que não forneçam os nutrientes necessários, levando o consumidor a condição de
subnutrição, desnutrição ou síndromes relacionadas com falta de nutrientes, vitaminas, sais
minerais e outros.

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Além desse enfoque, os agentes de doenças alimentares podem ser classificados quanto à gravi-
dade dos sintomas. Os agentes que apresentam probabilidade alta de letalidade são considera-
dos de severidade alta (toxinose botulínica, febre tifóide, disenteria bacilar por Shigella dysenteriae
etc.; os que causam doenças revertidas por atendimento médico, caso das demais salmoneloses
e shigeloses que são consideradas de severidade média, e os que apresentam sintomas e sinais
de curta duração, raramente com complicações, são os denominados de severidade baixa (toxinose
estafilocócica, toxiinfecção por B.cereus etc.).

Essa classificação, entretanto, pode ser questionada, pois pode mudar quando se consideram os
consumidores de maior risco e respectivas complicações de saúde, por ocorrência de doenças
extra-intestinais (meningites, pielonefrites, pneumonias etc.), assim como o desencadeamento
de doenças crônicas (doenças cardíacas, artrites, doenças circulatórias etc.) como decorrência
(complicação) da doença entérica de origem alimentar.

D OENÇAS DE MAIOR INCIDÊNCIA E PREVALÊNCIA E SUA IMPORTÂNCIA


ECONÔMICA E SOCIAL

As doenças de maior incidência e prevalência diagnosticadas no nosso meio são as de origem


bacteriana. Dentre essas, as mais freqüentes são: toxinose estafilocócica, as toxiinfecções por
Clostridium perfringens tipo A e por Bacillus cereus e a infecção por Salmonella sp. Outros agentes,
como infecções por Aeromonas sp e toxinose botulínica também estão registradas. Dentre as
toxinas marinhas, é digna de nota a ocorrência de surto de toxina diarréica de moluscos, ocorrido
no início dos anos 90 em Florianópolis, Santa Catarina, com relato de mais de 500 afetados
(dados não publicados). Também por algas tóxicas, porém de água doce, existe forte suspeita de
ocorrência de surto, na cidade de São Paulo, relacionada com o consumo de água potável, também
no início dos anos 90: ocorreu a floração das algas no reservatório de água que abastece mais de
50% da população, que conferiu cheiro e gosto da mesma.

Apesar de não ter sido evidenciada a presença de toxina por bioensaio em camundongos, o
extrato das algas, enviado ao “Departament of Biological Sciences, Wright State University”, Dayton,
Ohio, Estados Unidos, aos cuidados do Prof. Wayne W. Carmichael, foi positivo para hepatotoxina
(dados não publicados).

As infecções virais são relativamente freqüentes, em especial nos meses quentes do ano. Apesar
de as parasitoses serem agentes de doenças freqüentes da população brasileira, o relato e a
associação com alimento não é comum; a exceção está relacionada com surto de Anisakis, pelo
consumo de tainha capturada na costa marítima do litoral sul do Estado de São Paulo.

Quanto aos agentes químicos, a escassez de informações em nosso meio não permite dimensionar
sua ocorrência; entretanto acidentes pelo consumo de metanol em bebidas alcoólicas já foram

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relatados em vários estados, como São Paulo, Mato Grosso e Bahia. Relatos de reações adversas
pelo consumo de produtos com aditivos, em especial o sulfito em sucos de fruta concentrados,
ingeridos sem diluição, também já foram relatados em nosso meio. Acidentes com pesticidas
também ocorrem, principalmente relacionados com consumo de grãos e tubérculos destinados
ao plantio e em casos de acidentes domésticos.

A caracterização dos agentes, em nível internacional e, em menor proporção no nacional, tem


permitido verificar que as doenças bacterianas intestinais não estão relacionadas só com qua-
dros diarréicos, mas também com síndromes de maior gravidade, envolvendo doenças crônicas
de longa duração, como é o caso de artrite desencadeada por infecções intestinais por Salmonella
Enteritidis ou os casos de comprometimento renal decorrente da infecção intestinal por Escherichia
coli O157:H7, além de infecções em outros órgãos que não o trato digestivo, como as meningi-
tes, pielonefrites, infecções urinárias e pneumonias.

Os agentes de doenças transmitidas por alimentos são numerosos e de natureza bastante


diversificada. Em um número considerável de surtos, não é possível caracterizar o agente, porém,
a literatura internacional considera que, para 1.000.000 de casos de doenças transmitidas por
alimentos relacionada com bactérias e desnutrição, ocorrem 100 casos por agentes químicos. O
importante é observar que essas naturezas de agentes também se manifestam em nosso meio,
porém esses dados nem sempre estão relacionados com os alimentos, sendo necessário buscar
informações epidemiológicas. Por exemplo, caso se trate de meningite bacteriana por outro
agente que não a Neisseria meningitidis, é possível obter essa informação nos serviços de
epidemiologia.

Outro fator importante é a avaliação do custo econômico de saúde pública, para o atendimento
dos casos e do ônus individual e coletivo quando da ocorrência de DTA. O impacto não é restrito
ao número de afetados, mas também às complicações posteriores de saúde dos afetados e às
conseqüências econômicas.

Embora os dados das implicações econômicas não estejam disponíveis em nosso meio, existem
estimativas internacionais: nos Estados Unidos, segundo Todd, 1989, as bactérias são responsá-
veis por gastos de quase 7 bilhões de dólares, os vírus por cerca de 350 milhões, os parasitos por
625 milhões, as toxinas marinhas por 125 milhões e os agentes químicos por 33 milhões de
dólares. No que se refere a casos de diarréia infantil, Todd estimou, em 1978, o custo de 50
dólares por caso de doença nos países em desenvolvimento, com total de 50 milhões de dólares/
ano, incluindo os casos fatais. Já para a toxoplasmose congênita, decorrente da contaminação
da mulher grávida, o custo da manutenção da vida da criança afetada é estimado em 430 milhões
de dólares, nos Estados Unidos. Além destes gastos diretos com os afetados, subestimados ainda
em nível internacional, há que se considerar:

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1) a perda da produtividade tanto no serviço como na aprendizagem por impossibilidade física
dos afetados;

2) a exportação de produtos prejudicada (no caso do Peru, com a introdução da cólera, a


exportação de pescado foi praticamente paralisada, incluindo a de produtos de pescados
comercialmente estéreis);

3) os custos governamentais relacionados com o diagnóstico do surto;

4) a perda com a destruição de produtos associados à DTA;

5) o custo social em caso de doenças crônicas que impossibilitam a produtividade familiar e dos
casos fatais, com as conseqüências óbvias de ônus familiar e social e a revisão/reformulação
tecnológica das indústrias envolvidas;

6) a imagem prejudicada de um setor (exemplo, a indústria de palmito em conserva nos anos de


1999-2000) ou de uma determinada indústria que pode levar anos para ser recuperada.

A contaminação dos alimentos é um problema que acompanha a sociedade humana desde os


primórdios de sua história. A necessidade de se alimentar, associada a épocas do ano e regiões
geográficas mais ou menos ricas em produtos naturais, induziu o homem a selecionar alimentos
e a desenvolver métodos para a sua preservação. Os acertos na forma de preservação permitiram
que a sociedade humana, ao longo de sua história e da organização da sociedade, definisse áreas
geográficas correspondentes aos centros produtores/transformadores de matérias-primas, em
conseqüência de centros consumidores. Permitiram, também, que o homem avançasse em territó-
rios desconhecidos (viagens por períodos longos de tempo) e empreendesse campanhas bélicas,
de conquista de novos territórios. Apesar dos avanços alcançados, o problema da contaminação
dos alimentos acompanha a sociedade humana até os dias de hoje, marcadamente no que se refere
à saúde coletiva e seus riscos e às perdas econômicas por alteração/deterioração de alimentos.

No passado, as formas de prevenção e controle eram exercidas sobretudo por restrições sociais e
religiosas, com regras para o consumo de alimentos, que incluía proibições de alguns alimentos
(carne de porco, ovos de pata, água não tratada, morango, determinados pescados como da
família Tetrodontidae (baiacu) e do tipo arabaiana (litoral norte do Brasil), em determinadas
épocas do ano etc.

O risco relativo de cada natureza de agentes de DTA, segundo dados internacionais, encontra-se
na Tabela 29.

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Tabela 29: Risco relativo de cada natureza de agentes de DTA

Perigo Risco Relativo


Desnutrição 1.000 000
Contaminação microbiana 1.000 000
Poluição ambiental 100
Pesticidas 1
Aditivos alimentares 1

Fonte: Trunswel et al., 1978, apud Varnam & Evans, 1991 (modificado).

Considerando recursos e disponibilidade de pessoal, entende-se como prioridade a segurança


do consumidor, como forma de modificação do estado de morbidade das DTA e suas conseqüên-
cias - casos fatais e seqüelas graves. As seqüelas estão sendo revistas, inclusive dentro do con-
texto de perda de força de trabalho e de gastos com tratamento médico.

Além da gravidade, durante a ocorrência de surtos de DTA deve-se considerar os aspectos de


perda econômica. Como exemplo, um surto causado por S. Napoli, envolvendo a Inglaterra e
outros países, teve um custo estimado de mais de 4.000.000 de libras esterlinas. A aplicação de
medidas de prevenção (controle) teria economizado deste total cerca de 2.136.780 de libras
esterlinas. A introdução da pasteurização do leite na Escócia “economizou” os gastos em tratamento
médico de uma média de 257 afetados por ano. Essa economia é suficiente para a compra de
pasteurizadores de leite. A cloração da água da rede de distribuição permite “economizar” muito
mais. Em nosso meio, em um único surto de salmonelose ocorrido em uma escola de S. José do
Rio Preto, 211 pessoas foram afetadas; e destas 82 foram hospitalizadas e as demais receberam
tratamento médico ambulatorial. Os gastos não foram computados, mas com certeza são mais
elevados do que se gastaria com a prevenção.

O esforço organizado da sociedade tem demonstrado que os gastos para a prevenção das Doen-
ças são menores que os relacionados com a recuperação ou cura. A avaliação do custo/benefício
dos programas de prevenção devem considerar a economia nacional. No que se refere a agravos
da saúde, deve-se levar em conta uma série de gastos (Tabela 30)

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Tabela 30: Tipos de gastos para avaliação de custos nos casos de agravos de saúde

Geral Específicos
Morte Não calculável
Tratamento médico Medicamentos
Hospitalização
Tratamento de seqüelas
Pagamentos Suplemento necessário
Manutenção de dependentes
Produtividade Perda
Exportação Perda de mercados
Perda de força turística
Imagem prejudicada
Prevenção Custo da infraestrutura
Custo do controle de produção
Custo da pesquisa
Surtos e epidemias Valor da perda de alimentos
Custo da investigação
Custo da recuperação da imagem
Treinamento/retreinamento

C ATEGORIAS DE DTA EM FUNÇÃO DOS AGENTES

Levando-se em consideração os aspectos de distribuição, freqüência de ocorrência e gravidade


de sintomas, as DTA foram agrupadas nas seguintes categorias:

Enfermidades graves e agudas - intoxicação botulínica, intoxicação por PSP (toxina paralisante
dos moluscos), infecção por V. vulnificus, infecção por E. coli O157:H7, infecção por V. cholerae
O139, infecção por S. Typhi (febre tifóide), infecção por L. monocytogenes em imunossuprimidos
ou imunocomprometidos, infecção por C. perfringens, produtor de toxina necrosante dos intesti-
nos, enterovírus, enteroparasitos etc.

Enfermidades moderadamente graves - infecção por Salmonella sp, toxinfecção por V. cholerae
01, infecção por V. parahaemolyticus, infecção por Aeromonas hydrophila etc.

Enfermidades autolimitantes, de menor gravidade - intoxicação estafilocócica, toxiinfecção


por B. cereus, toxiinfecção por C. perfringens, intoxicação por TDM (toxina diarréica de moluscos)
etc.

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O CORRÊNCIA DA DOENÇA NOS CONSUMIDORES

A análise das enfermidades que afetam uma comunidade/população é ferramenta indispensável


para caracterizar as que podem ser transmitidas por alimentos, assim como para caracterizar a
gravidade de complicações relacionada com as mesmas.

O CORRÊNCIA DO AGENTE NOS ALIMENTOS

Os agentes de DTA de maior prevalência, em nível nacional e internacional, são: Salmonella sp,
enterotoxina estafilocócica, B. cereus, C. perfringens. Na situação epidêmica de cólera a ocorrên-
cia de V. cholerae O1 e provavelmente O139 fica aumentada. A ocorrência das parasitoses intestinais
é relativamente alta, porém o estudo epidemiológico não é sistemático, apesar de que a grande
maioria dos mesmos tem veiculação alimentar. O mesmo ocorre com as infecções por vírus
entéricos.

C ONCENTRAÇÃO
Além da ocorrência, é um dado muito importante o número de células viáveis de patógenos ou a
quantidade de toxina presente, pois os agentes de DTA têm uma concentração mínima, que é
capaz de ultrapassar as barreiras de proteção natural de cada classe de consumidor.

P OTENCIAL DE DISTRIBUIÇÃO E DISSEMINAÇÃO DO AGENTE

Ampla - Salmonella sp; V. cholerae O1 etc.(pandemias).

Limitada - V. vulnificus, V. parahaemolyticus, A. hydrophila, L. monocytogenes, Shigella sp, E. coli


enteropatogênica, enterovírus, parasitos, etc. (epidemias).

Restrita (ou confinada)- enterotoxinas estafilocócicas e toxina botulínica, B. cereus e C.


perfringens (surtos).

Além dessas características importantes para os perigos mais significativos, outros dados são de
interesse, como os fatores que interferem com a multiplicação, morte e sobrevivência dos agen-
tes de DTA; habitat natural ou distribuição do agente; condições de multiplicação e produção de
toxinas; formas de controle; aplicação do Sistema de Análise de Perigos e Pontos Críticos de
Controle (APPCC), ou avaliação por check list usados na inspeção e fiscalização da aplicação das
Práticas de Higiene; certificação laboratorial das medidas preventivas adotadas; previsão do
comportamento do agente no meio ambiente e nos produtos alimentícios, para fins de decisão
de destino de produtos etc.

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GUIA PARA DIAGNÓSTICO LABORATORIAL DAS DTA
Baseada no Compendium of Methods for the Microbiologica Examination of Foods - APHA (capítulo
40 na 3a. edição) temos a seguinte classificação geral, especificada de acordo com o período de
incubação, sintomas predominantes e indicação do(s) agente(s):

• Sintomas predominantes ou de ocorrência primária no trato intestinal alto, ou superior


(náusea, vômito) - Exemplos: para período de incubação menos de 1 hora, com sintomas
como náusea, vômito, gosto alterado e queimação na boca, os agentes podem ser
contaminantes metálicos como zinco, cobre, cádmio, arsênico, antimônio; entre 1 e 2 horas,
com sintomas como náusea, vômito, cianose, dor de cabeça, tontura, dispnéia e tremores, os
agentes podem ser os sais de nitrito; entre 1 e 6 horas, mediana entre 2 e 4 horas, com
sintomas como náusea, vômito, diarréia, cólicas e prostração, o agente pode ser enterotoxina
estafilocócica ou toxina diarrêica de Bacillus cereus.

• Sintomas respiratórios e dor de garganta - Exemplo: para período de incubação de 12 a 72h,


com os sintomas: dor de garganta, febre, náusea, vômito, rinorréia e, mais raramente, exantema,
o agente pode ser Streptococcus pyogenes.

• Sintomas predominantes ou de ocorrência primária no trato intestinal baixo, ou inferior


(cólicas abdominais, diarréia)- Exemplos: para período de incubação entre 8 a 22 horas,
mediana de 10 a 12h, com os sintomas:cólicas abdominais e diarréia os- agentes podem ser
C. perfringens (diarréia putrefativa) , B. cereus, Streptococcus faecalis ou S. faecium; entre 12
a 74h, mediana de 10 a 12h, com os sintomas: cólicas abdominais, diarréia, vômito, febre e
calafrio, os agentes podem ser Salmonella sp; E.coli enteropatogênica, Yersinia enterocolitica,
Aeromonas hydrophila, Campylobacter jejuni, V.cholerae, entre outros agentes possíveis.

• Sintomas neurológicos (distúrbios visuais, vertigem, comichão, paralisia) Exemplos: para


período de incubação menos de 1 hora, com sintomas: comichões, dormência, atordoamento,
cambaleio, entorpecimento, rigidez de garganta (dificuldade de deglutição), fala incoerente
e parada respiratória, os agentes podem ser toxinas de moluscos; menos de 1 hora, com os
sintomas: gastrinterite, irritabilidade, visão borrada, dores no peito, cianose, contorção e
convulsão, os agentes podem ser inseticidas organofosforados; entre 12 a 72h, com os
sintomas: vertigens, visão borrada ou dupla, perda de reflexo à luz, dificuldade de deglutição,
de fala e de respiração, boca seca, fraqueza e parada respiratória, o agente pode ser uma
neurotoxina botulínica.

• Sintomas alérgicos (ardência facial, petéquias) - Exemplos: para período de incubação menos
de 1h, com os sintomas: dor de cabeça, tontura, náusea, vômito, gosto picante, queimação na
garganta, inchaço e manchas vermelhas (petéquias) no rosto, dores no estômago e ardência
na pele, o agente pode ser a histamina; menos de 1h, com os sintomas: dormência ao redor
da boca, comichão, dor de cabeça, tontura e náusea, o agente pode ser o glutamato monosódico.
Para essa categoria não consta nenhum agente microbiano.

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• Sintomas de infeção generalizada (febre, calafrio, prostração, dores, nódulos linfáticos


inchados) - Exemplos: para período de incubação entre 7 a 28 dias, mediana de 14 dias, com
os sintomas: dor de cabeça, febre, tosse, náusea, vômito, constipação, dores abdominais,
calafrios, manchas róseas e fezes sanguinolentas, o agente é S. Typhi; entre 10 a 50 dias,
mediana de 25 a 30 dias, com os sintomas febre, prostração, cansaço, anorexia, náusea, dor
abdominal e icterícia, provocado por agente ainda não isolado (provavelmente viral).

TABELA 31 - Exemplos de doenças agudas extra-intestinais causadas por agentes de DTA

Órgão afetado Microrganismo

Pulmões e trato respiratório C. jejuni, Salmonella sp


Cryptosporidium sp
Vírus entéricos

Rins E. coli O157:H7


Salmonella sp,
Shigella sp

Coração Campylobacter sp, Yersinia enterocolitica,


Salmonella sp

Sistema nervoso central Salmonella sp


L. monocytogenes
Enterovírus

Feto L. monocytogenes

Pele e tecidos moles Campylobacter sp


Salmonella sp
Y. enterocolitica

Esses exemplos (Tabela 31 ) não incluem o vírus da hepatite infecciosa e a toxina de determinadas
algas de água doce (que podem afetar o fígado), cisticerco (cérebro), toxina botulínica (termi-
nação nervosa no músculo), toxina paralisante dos moluscos (PSP) em nível muscular e outros.
O envolvimento gastrintestinal não está especificado, por já ter sido descrito. Cabe citar o
Helicobacter pylori como agente de úlcera estomacal.

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TABELA 32 - Exemplos de doenças crônicas causadas por agentes de DTA

Tipos de doenças microrganismos

Artrites Y. enterocolitica
Campylobacter sp
Salmonella sp
Shigella sp
E. coli patogênica
S. aureus

Autoimune/tireóide Y. enterocolitica

Desordens neurais e Neuromusculares C. jejuni


Y. enterocolitica
E. coli patogênica

Vasculares e cardíacas Salmonella sp


Vírus entéricos

Essas tabelas permitem avaliar os agentes de DTA e suas complicações, e a repercussão das mes-
mas na saúde coletiva. Não só pelas DTA, mas pelo geral das doenças relacionadas com o consu-
mo de alimentos, justifica-se a priorização dos recursos da saúde na sua investigação e controle.

D EFINIÇÕES E EXEMPLO DE INVESTIGAÇÃO DE SURTO

• Alimento - Toda substância processada, semiprocessada ou natural que se destina ao consumo


humano, incluindo-se outras substâncias utilizadas na fabricação, preparação ou tratamento
dos produtos alimentícios e excluindo-se os cosméticos, medicamentos e tabaco. Nessa
definição inclui-se a água potável como alimento.

• DTA - Síndrome originada pela ingestão de alimento (incluída água) que contenha agentes
etiológicos em quantidade suficiente para desencadear os sintomas nos afetados. Pode ser
considerada como uma infecção quando o agente específico infeccioso é uma toxina; toxi-
infecção quando o agente específico é ao mesmo tempo infeccioso e toxinogênico e intoxicação
quando o agente é uma substância química.

• Surto de DTA - Episódio no qual uma ou mais pessoas apresentam sintomas clínicos semelhantes
depois de ingerirem alimentos de mesma origem e procedência.

• Caso de DTA - Uma pessoa afetada depois do consumo de alimentos. Um surto de DTA pode
envolver um número variável de casos.

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• Sintomas clínicos - Sintomas (alterações) que o(s) afetado(s) apresenta(m) e que são
considerados anormais. O quadro clínico do surto é dado de grande importância para
caracterizar o agente. Cada tipo de agente apresenta sintomas específicos, como conseqüência
da sua forma de ação sobre o(s) órgão(s) afetado(s) do comensal. Em investigação de surto,
devem ser considerados todos os sintomas apresentados. A freqüência, em porcentagem, é
calculada e os sintomas que aparecem em maior porcentagem são considerados como
característicos do surto em questão.

• Período de incubação - Mediana do tempo entre o consumo do alimento veiculador do agente


e o aparecimento dos primeiros sintomas de cada caso do surto. A mediana do período de
incubação do surto é calculada considerando-se o intervalo de tempo de todos os casos
sintomáticos.

• Comensal - É um indivíduo que utiliza o mesmo restaurante. Sinônimo de consumidor.

• Afetado - É o comensal que apresenta sintomas.

• Exposto - É o comensal que ingeriu os alimentos servidos ou suspeitos.

• Refeição veiculadora - É a refeição na qual o(s) alimento(s) veiculador(es) foi(ram) servido(s)


para consumo. Para determinar a refeição suspeita, deve-se proceder à análise da taxa de
ataque por refeição para considerar a veiculação do surto.

• Alimento veiculador - É o alimento veiculador do agente. Quando da ocorrência de surto, e


após definição da refeição suspeita, deve-se proceder ao cálculo da taxa de ataque por alimento
ingerido para caracterizar epidemiologicamente o alimento veiculador. É o alimento mais
consumido entre os comensais (expostos) afetados.

• Taxa de ataque - É o cálculo através de comensais afetados e não afetados, que consumiram/
não consumiram o(s) alimento(s), para avaliar a taxa de ataque por alimento/refeição
incriminada.

• Entrevista com os comensais - Quando da ocorrência e confirmação do surto, é a atividade


de busca de informações entre os comensais e não comensais, afetados e não afetados, para
determinar sintomas prevalentes, mediana de período de incubação, determinação de refeição
e alimento veiculador pela análise de taxa de ataque.

• Agente provável - Considerando os dados obtidos pela entrevista dos comensais, é o agente
que mais se adapta ao período de incubação, sintomas clínicos e alimento veiculador.

• Agente confirmado - É o agente que é isolado ou caracterizado laboratorialmente a partir de


material biológico dos afetados e/ou a partir da análise das amostras ou das sobras de alimentos
efetivamente consumidos, para os agentes ativos no alimento ou de produtos; pode incluir
matérias-primas usadas na preparação do alimento, quando se trata de agente passivo.

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• Histórico do produto/alimento - É o histórico que permite avaliar as possíveis falhas de
origem, procedência e manipulação. É obtido pela entrevista dos manipuladores/preparadores
do produto, em função da natureza do agente (ativo ou passivo). O histórico não tem por
finalidade a identificação das falhas, mas de correção/prevenção das mesmas.

• Fatores que contribuem com os surtos - São as falhas detectadas quando do estabelecimento
do histórico do produto. Esses fatores quase nunca são únicos, mas sempre ocorrem em cadeia,
como por exemplo, preparo com muita antecedência e manutenção em condições de temperatura
inadequada.

Essas definições permitem estabelecer formas de elucidação de DTA: notificação de surtos, con-
firmação de surtos, entrevista dos comensais para obter dados sobre a doença, o provável agen-
te e o alimento veiculador e o histórico do alimento, para correção/prevenção de surtos.

Como exemplo, descreveremos um surto e as etapas de estudo. Hipoteticamente, o surto ocorreu


em um restaurante industrial, onde é servido café da manhã, almoço e jantar para 2 turmas
distintas de funcionários.

Tabela 33 - Determinação da refeição veiculadora

Número de comensais que Número de comensais que


participaram das refeições não participaram das refeições

Dia Refeição Total D.1 N.D.2 % Total D.1 N.D.2 %

10 Café 152 52 100 34,2 145 51 94 35,2


Almoço 239 89 150 37,2 64 20 44 31,3
Jantar 237 87 150 36,7 67 23 44 34,3

11 Café 161 56 105 34,8 131 42 89 32,1


Almoço 251 106 145 42,2 52 3 49 5,8
Jantar 208 78 130 37,5 95 31 64 32,6

1
Doentes
2
Não doentes

A refeição suspeita é o almoço do dia 11, uma vez que a diferença de percentual de doentes (taxa
de ataque) entre os que consumiram e não consumiram uma mesma refeição é a maior dentre as
refeições consideradas (42,2 - 5,8 = 36,4).

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Tabela 34 - Determinação do alimento veiculador

Número de comensais que Número de comensais que


participaram das refeições não participaram das refeições
1 2 1 2
Alimento Total D. N.D. % Total D. N.D. %
Feijão 40 2 38 5,0 100 5 95 5,0
Arroz 64 6 58 9,4 76 5 71 6,6
Salada 90 10 80 11,1 50 7 43 14,0
Carne 72 62 10 86,1 68 3 65 4,4
Torta 72 8 64 11,1 68 8 60 11,8

O alimento veiculador é a carne (86,1% de doentes dentre os que comeram e 4,4% de doentes
entre os que não comeram, sendo esta a maior diferença de taxa de ataque, ou seja, 81,7 %).

Na Tabela 39 encontram-se descritos os principais grupos de alimentos incriminados em surtos de DTA.

Tabela 35 - Sintomas prevalentes

Sintoma Número de Casos Percentual


Diarréia 104 81
Dores Abdominais 92 71
Náusea 80 62
Vômito 25 20
Febre 13 10
TOTAL 129 100

Conforme descrito na Tabela 35 os sintomas prevalentes são diarréia, dores abdominais e náusea.

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TABELA 36- Mediana do período de incubação

Intervalo Casos Acumulado

0-1 hora 1 -
1-3 horas 2 3
3-5 horas 8 11
5-7 horas 11 22
7-9 horas 15 37
9-11 horas 3 40

M = n/2, onde, m = mediana e n = total acumulado

40/2 = 20. O valor mais próximo de 20 está no intervalo de 7 a 9.

O histórico de preparo do alimento é igualmente importante para avaliar a falha possível. Nesse
caso hipotético, o histórico do preparo da carne revelou: cocção de carne no dia 10, em panela
de pressão. Após cocção, a carne foi mantida na panela tampada até o dia 11, pela manhã,
quando então foi retirada e fatiada sobre superfície previamente higienizada. Após fatiamento,
foi colocada em bandejas e coberta com molho de tomate preparado imediatamente antes. Não
sofreu reaquecimento após adição do molho. Foi mantida a mais ou menos 450 C até consumo,
por cerca de duas horas e meia. As falhas que se identificam são: preparo com antecedência,
manutenção à temperatura ambiente, reaquecimento insuficiente e manutenção à temperatura
insuficiente do alimento pronto para o consumo até o momento de servir.

O exemplo citado, que mostra as formas de investigação epidemiológica e os dados de campo


necessários para caracterizar o surto, se refere a surto circunscrito, relacionado com refeição
comunitária. Os surtos de larga distribuição, que envolvem produtos também de larga distribui-
ção, como os comerciais e restaurantes públicos, são investigados de forma semelhante, porém
considerando-se sobretudo os sintomas e não uma refeição comum. A caracterização do produto
(alimento) veiculador é feita através de inquérito individual, agrupado pelos investigadores
epidemiológicos. Para tal situação, entretanto, é necessário que se estabeleça a notificação
compulsória de casos compatíveis com os de DTA. Assim, os dados de surtos atualmente são
parciais, uma vez que a notificação não é obrigatória, mesmo quando da ocorrência em comuni-
dade circunscrita.

• Os fatores que contribuem com os surtos de DTA são variáveis. Na Tabela 37 encontram-se
descritos os principais fatores contribuintes associados a surtos de DTA (dados do Paraná de
1978 a 1999).

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Tabela 37- Fatores contribuintes para os surtos de DTA no Paraná, de 1978 a 1999

FATORES CONTRIBUINTES %

RELATIVOS À CONTAMINAÇÃO (bacteriana/química):


Matéria-prima contaminada antes do preparo (bacteriana) 81,7

Contaminação durante o preparo:


Manipuladores contaminados ou infectados (bacteriana) 55,0
Equipamentos contaminados (bacteriana) 34,6
Contaminação cruzada (bacteriana) 34,6
Alimento venenoso (química) 22,4
Contaminação (química) 1,4

RELATIVOS À SOBREVIVÊNCIA (bacteriana)


Processamento inadequado pelo calor(tempo/temperatura < 60º C) 41,2
Reaquecimento inadequado (tempo/temperatura < 70º C) 11,3

RELATIVOS À MULTIPLICAÇÃO (bacteriana)


Conservação inadequada pelo frio (tempo/temperatura > 10º C) 79,2
Tempo muito longo entre preparo e consumo(acima de 2h entre 10º C e 60º C) 83,5

Fonte:Price,1997

Tabela 38 - Associação entre tipos de alimentos e agentes etiológicos de DTA

Tipos de alimentos Agentes etiológicos (microrganismos/


toxinas)

Carne e leite crus ou subprocessados térmicamente Agentes de zoonoses bacterianas


(Salmonellas )
Parasitos animais

Pescados crus ou subprocessados termicamente Patógenos marinhos, como os vibrios, vírus,


parasitos de pescados e toxinas de moluscos

Alimento cozido contaminado por manipulador Enterotoxina estafilocócica, mais raramente,


salmonelose e outros

Alimento cozido contaminado por produto cru Agentes de zoonoses

Alimento cozido mantido por longos períodos em Listeria monocytogenes


temperaturas baixas Yersinia enterocolitica

Alimento cozido mantido por longos períodos em anaerobiose Toxina botulínica, Clostridium perfringens

Produtos nos quais a fermentação foi incompleta Staphylococcus aureus

Alimentos ricos em compostos não tóxicos, Morganella morganii e outras ( transforma


biotransformados em tóxicos histidina e tirosina em aminas tóxicas)

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Tabela 39- Grupos de alimentos incriminados em surtos de doenças transmitidas por alimentos
no Paraná. 1978 –1999.

AGENTES TOTAL

Salomonella sp.

Toxina vegetal
C. perfringens

Shigella spp.

V. cholerae

Químicos
S. aureus

B. cereus

Outros
E. coli
ALIMENTOS Nº %

PREPARAÇÕES MISTAS 183 273 12 10 16 1 - 1 .. 1 497 44,1


CARNE/DERIVADOS 108 47 89 5 20 7 - 2 .. - 278 24,7
LEITE/DERIVADOS 116 7 - - 11 - - 1 .. - 135 12,0
CEREAIS 6 2 1 36 - - - - .. 1 46 4,1
FRUTOS DO MAR - - - - - - 3 - .. - 3 0,3
DIVERSOS 37 21 12 16 11 1 - 9 .. 17 124 11,0
PLANTAS TÓXICAS .. .. .. .. .. .. .. .. 43 .. 43 3,8

TOTAL 450 350 114 67 58 9 3 13 43 19 1126 100,0


(%) 40,0 31,1 10,1 6,0 5,2 0,8 0,3 1,2 3,8 1,7 100,0 ..

FONTE: ISEP/SESA/CSA

NOTAS: “Preparações mistas” incluem matérias-primas de origem animal e vegetal (ex: maionese, panqueca, bolo, farofa).

“Diversos” incluem alimentos pertencentes a outros grupos (ex: tubérculos, refrescos, outros).

O total de cada coluna representa 100% isoladamente.

Sinal convencional utilizado: .. (não se aplica dado numérico).

a) Confirmados – laboratorialmente.

b) Suspeitos – epidemiologicamente.

c) Indeterminados – não foi possível estabelecer o alimento nem laboratorialmente e nem epidemiologicamente.

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