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SISTEMÁTICA I
GRADUAÇÃO
Unicesumar
Reitor
Wilson de Matos Silva
Vice-Reitor
Wilson de Matos Silva Filho
Pró-Reitor de Administração
Wilson de Matos Silva Filho
Pró-Reitor de EAD
Willian Victor Kendrick de Matos Silva
Presidente da Mantenedora
Cláudio Ferdinandi
TEOLOGIA SISTEMÁTICA I
SEJA BEM-VINDO(A)!
Caro(a) aluno(a), seja bem-vindo(a)! Preparamos este material com a intenção de apre-
sentar a você uma exposição teórica dos princípios e conceitos introdutórios e básicos
da teologia sistemática. Esse material é apenas um lúmen para quem quer ser iluminado
pelo saber teológico. Fazer teologia é uma arte, portanto, deve-se estudar e assimilar
teoricamente as próprias normas da prática teológica. Em seguida, é preciso imitar o
modo como os artesãos, que são os teólogos, praticam seu ofício. Finalmente, aprende-
-se exercendo, por conta própria, a arte teológica. Por isso, Tomás de Aquino descrevia
que o ato teológico é o fervor da fé da pessoa que ama a verdade que crê e que procura
encontrar razões para seu amor. A estrutura do livro se explica por seu caráter didático
e metodológico, por isso as atividades que propomos em cada unidade vão te direcio-
nar, mas lembre-se: é um investimento que necessita tempo e esforço, porém, antes de
tudo, fé e amor, uma vez que seu conteúdo é desafiador. Você está preparado(a)? Vamos
encarar esse desafio juntos?
Este material está dividido em cinco unidades:
A unidade I, “Introdução à Teologia Sistemática”, abordará a definição do conceito, uma
divisão didática para se estudar a teologia e os pressupostos, o método e a tarefa da te-
ologia sistemática. A unidade II, chamada “O Deus que se revela”, irá fornecer a você co-
nhecimentos dogmáticos sobre a revelação especial de Deus no transcorrer da história,
tanto por meio das Escrituras, quanto da tradição da Igreja cristã e de seus pensadores. A
unidade III, intitulada “A doutrina da Trindade”, fornecerá um panorama histórico da defi-
nição e formulação bíblico-doutrinária da Trindade. A unidade IV, intitulada “A soberania
de Deus”, abordará a importância do poder soberano e gracioso de Deus na salvação e
restauração de seu povo. Por fim, a unidade V tratará das características da pessoa e obra
de Cristo, nessa unidade, será enfatizado o centro da fé cristã, ou seja, a divindade e a
humanidade do Senhor Jesus, o Cristo.
Este livro tem como objetivos fornecer subsídios teóricos sobre alguns dos principais ca-
pítulos da teologia sistemática. Ele foi desenvolvido para responder a razão da fé cristã
e sedimentar, de forma simples e objetiva, a prática da fé na vivência e no labor ministe-
rial. Um grande abraço e um ótimo curso!
Professor Roney de Carvalho Luiz
09
SUMÁRIO
UNIDADE I
15 Introdução
16 Definição
18 Divisão da Teologia
61 Considerações Finais
UNIDADE II
69 Introdução
80 A Fé como Conhecimento
UNIDADE III
A DOUTRINA DA TRINDADE
133 Introdução
UNIDADE IV
A SOBERANIA DE DEUS
173 Introdução
UNIDADE V
249 Introdução
337 CONCLUSÃO
339 REFERÊNCIAS
Professor Dr. Hermisten Maia Pereira Da Costa
Professor Me. Roney De Carvalho Luiz
INTRODUÇÃO A TEOLOGIA
I
UNIDADE
SISTEMÁTICA
Objetivos de Aprendizagem
■■ Compreender o conceito e os tipos de estudos teológicos.
■■ Conceituar os pressupostos e método da Teologia Sistemática.
■■ Estabelecer a importância de conhecer e estudar a Teologia
Sistemática.
Plano de Estudo
A seguir, apresentam-se os tópicos que você estudará nesta unidade:
■■ Definição
■■ Divisão da teologia
■■ Pressupostos e método da teologia
■■ Necessidade e tarefa da teologia sistemática
15
INTRODUÇÃO
Introdução
I
DEFINIÇÃO
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
verdade para o povo para todos os tempos e lugares; a Escritura é isso.
As nossas teologias são meras tentativas de ajudar pessoas, geralmente
e em tempos e lugares específicos, a fazerem melhor uso da Escritura
(FRAME, J. M., 2010, p. 97).
Contudo deve ser observado que conhecer a Deus é o alvo maior. Os demais resul-
tados, ainda que relevantes, são secundários.2 “O tema e o conteúdo da teologia
é a Revelação de Deus”.3 O fundamento é a Palavra, o foco é Jesus Cristo, o Deus
encarnado. Dessa concepção, subentende-se, seguindo a linha de Kuyper,4 que:
a. A Teologia nunca é “arquetípica”, mas sim “éctipica”;5 ela não é gerada
pelo esforço de nossa observação de Deus, mas sim o resultado da reve-
lação soberana e pessoal de Deus. Uma “Teologia Arquetípica” – se é
que podemos falar desse modo –, pertence somente a Deus, porque
somente Ele Se conhece perfeitamente tendo, inclusive, ciência completa
do seu conhecimento perfeito. Por isso, como temos insistido em outros
trabalhos, a Teologia sempre será o efeito da ação reveladora, inspira-
dora e iluminadora de Deus por meio do Espírito; a Teologia nunca é a
causa primeira; sempre é o efeito da ação primeira de Deus em revelar-se.
1 Consultar referência.
2 Consultar referência.
3 Consultar referência.
4 Consultar referência.
5 “Éctipo” é uma palavra de derivação grega, “e)/ktupoj” (cópia de um modelo, ou reflexo de um
arquétipo), passando pelo latim “ectypus” (feito em relevo, saliente). “Éctipo” é o oposto a arquétipo (do
grego, “a)rxe/tupoj” = “original”, “modelo”). Na filosofia, Berkeley (1685-1753) estabeleceu esta distinção
no campo das ideias: “pois acaso não admito eu um duplo estado de coisas, a saber: um etípico, ou
natural, ao passo que o outro é arquetípico e eterno? Aquele primeiro foi criado no tempo; e este segundo
desde todo o sempre existiu no espírito de Deus” (BERKELEY, G. Três Diálogos entre Hilas e Filonous.
São Paulo: Abril Cultural, (Os Pensadores, v. 22), 1973, 3º Diálogo, p. 119).
INTRODUÇÃO A TEOLOGIA
17
“No princípio Deus...”, isso deve ser sempre considerado em todo e qualquer
enfoque que dermos à realidade. Deus se revela e se interpreta por meio do
Espírito; e é somente por intermédio dEle que poderemos ter um genuíno
conhecimento de Deus. A teologia sempre é relativa: “relativa à revelação
de Deus. Deus precede e o homem acompanha. Esse ato seguinte, este ser-
viço, são pensamentos humanos concernentes ao conhecimento de Deus”.6
b. A Teologia não termina em conhecimento teórico e abstrato, antes, se ple-
nifica no conhecimento prático e existencial de Deus por intermédio da
Sua Revelação nas Escrituras Sagradas, mediante a iluminação do Espírito.
Conhecer a Deus é obedecer a Seus mandamentos. “A boa teologia deslo-
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
6 Consultar referência.
7 Consultar referência.
8 Consultar referência.
9 Consultar referência.
10 Consultar referência.
11 Li, posteriormente, a declaração de Kapic: “tal conhecimento (de Deus) não é meramente intelectual: é
também apaixonado, e toca tanto o nosso entendimento quanto os nossos afetos” (KAPIC, Pequeno livro
para novos teólogos, São Paulo: Cultura Cristã, 2014, p. 31).
12 A frase de Kierkegaard é: “o paradoxo é a paixão do pensamento, e o pensador sem um paradoxo é como
o amante sem paixão, um tipo medíocre” (KIERKEGAARD, Migalhas Filosóficas, ou, Um bocadinho de
Filosofia de João Clímacus, Petrópolis, RJ: Vozes, 1995, p. 61).
Definição
I
“A teologia é serva da igreja”.13 Esse serviço será relevante se, antes, a teolo-
gia for serva da Palavra.14 A grande virtude de quem serve é ser encontrado fiel
(1Co 4.2). O teólogo não pode ter outro propósito do que o glorificar a Deus
por meio da compreensão fiel das Escrituras e no seu ensino ao povo de Deus.
“A teologia é a reflexão sobre o Deus que os cristãos cultuam e adoram”.15 Por
isso, o teólogo não é um transeunte em férias com uma agenda flexível e sem
maiores compromissos, antes, podemos compará-lo a um peregrino em busca
do melhor caminho que o conduza de forma mais adequada possível à glorifi-
cação do Nome de Deus por meio de seu conhecimento, ensino e obediência.
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Quando falamos de Teologia Reformada, estamos nos referindo à Teologia
proveniente da Reforma (Calvinista) em distinção à Teologia Luterana. O
designativo Reformada é preferível ao Calvinista16 – ainda que a empreguemos
indistintamente – considerando o fato de que a Teologia Reformada não é estri-
tamente proveniente de João Calvino (1509-1564).17
DIVISÃO DA TEOLOGIA
[...] no círculo das ciências, a teologia tem direito a um lugar de honra, não
por causa das pessoas que pesquisam essa ciência, mas em virtude do objeto
que ela pesquisa; ela é e continuará sendo – desde que esta expressão seja
entendida corretamente – a rainha das ciências (BAVINCK, H., 2012, p. 53).
13 Consultar referência.
14 Consultar referência.
15 Consultar referência.
16 A expressão “Calvinismo” foi introduzida, em 1552, pelo polemista luterano Joacquim Westphal (c. 1510-
1574), pastor em Hamburgo, para referir-se, em especial, aos conceitos teológicos de Calvino (Cf. MCGRATH,
A. E. The Intellectual Origins of The European Reformation, Cambridge, Massachusetts: Blackwell
Publishers, 1993, p. 6; COTTRET, B. Calvin: a Biography, Grand Rapids, Mi.: Eerdmans and Edinburgh: T &
T Clark, 2000, p. 239). Na realidade, Calvino deplorou o uso do termo (1563) que ele considera empregado
cruelmente por esses “zelotes frenéticos” (Cf. John Calvin, Commentaries on the Prophet Jeremiah, Grand
Rapids, Michigan: Baker Book House, (Calvin’s Commentaries, v. 9), 1996 (reprinted), (Carta Dedicatória do
seu comentário do Livro de Jeremias), p. xxii). No entanto usamos o termo no sentido que permanece até os
nossos dias, como designativo da teologia Reformada em contraste com a Luterana. (Veja: WARFIELD, B.B.
Calvin and Calvinism, Grand Rapids, Michigan: Baker Book House - The Work’s of Benjamin B. Warfield,
2000 – Reprinted, v. 5, p. 353; W.S. Reid, Tradição Reformada: In: Walter A. Elwell, ed. Enciclopédia Histórico-
Teológica da Igreja Cristã, São Paulo: Vida Nova, 1988-1990, v. 3, p. 562).
17 Consultar referência.
INTRODUÇÃO A TEOLOGIA
19
A. Teologia Exegética
É o estudo da linguagem bíblica – valendo-se da morfologia (estrutura da lin-
guagem), lexicografia (o significado das palavras) e sintaxe (funções das várias
partes da oração) –, buscando uma compreensão clara e precisa do texto bíblico.
A sua tarefa consiste em determinar de maneira mais precisa possível a mensa-
gem do texto bíblico considerando o seu contexto histórico.
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Esta área envolve disciplinas tais como: Grego, Hebraico, Introdução e Análise
Bíblica, Hermenêutica e Teologia Bíblica. O nome Teologia Bíblica é uma nomencla-
tura técnica que não deve nos conduzir à indução de que haja teologia não-bíblica.
Como bem observou Vos (1862-1949): “toda genuína Teologia Cristã é neces-
sariamente Teologia Bíblica - porque à parte da Revelação Geral, a Escritura
se constitui o único material com o qual a ciência Teológica pode tratar”.18 Por
Teologia Bíblica, estamos indicando o ramo da Teologia que partindo da Revelação
bíblica, organiza o seu material de forma histórica, conforme registrado nos diver-
sos livros da Bíblia considerando a revelação progressiva de Deus. Ela determina
e enuncia os fatos das Escrituras.19 Esta disciplina ocupa um lugar intermediá-
rio entre a Exegese e a Teologia Sistemática,20 podendo ser o diálogo de ambas
altamente producente e esclarecedor. Ainda que seus métodos possam ser distin-
tos, se elas se propuserem a ser coerentes com a plenitude de Revelação Bíblica,
partirão de sua unidade revelacional. Prevalece aqui as ponderações de Carson:
Existe o perigo de sucumbir a um biblicismo descuidado que interpreta
e traduz textos sem de fato buscar uma síntese que realmente preserve a
fidelidade bíblica; por outro lado, há o risco de confiar nas fórmulas con-
fessionais sem que sejamos capazes de explicar com alguma profundida-
de como elas são frutos das reflexões acerca do que a Bíblia de fato diz.21
18 Consultar referência.
19 Consultar referência.
20 Para uma visão sumária dos caminhos e descaminhos desta disciplina, veja: TAYLOR, W. Teologia
Bíblica. In: MERRIL, C. Tenney, org. ger., Enciclopédia da Bíblia, São Paulo: Cultura Cristã, 2008, v. 5, p.
840-847; HASEL, G. F. Teologia do Antigo Testamento, Rio de Janeiro: JUERP. 1987, p. 9-26; HASEL, G.
F. Teologia do Antigo Testamento, Rio de Janeiro: JUERP, 1988, p. 9-57
21 Consultar referência.
Divisão da Teologia
I
B. Teologia Histórica22
É o estudo da história do povo de Deus desde o Novo Testamento até os nos-
sos dias. Ela abrange a História da Igreja, História das Missões etc. “O estudo da
história da igreja permite compreender a história em geral e a teologia em par-
ticular com maior profundidade”.23
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presunção de uma teologia não sistemática e de que haja outras disciplinas teológicas
não metódicas.25 Estou convencido de que toda teologia é de algum modo sistemá-
tica; a forma de organizá-la é que vai determinar o tipo de sistematização. Com isso
estamos admitindo a limitação do nome, não, contudo, ao ponto de pretender bani-
-lo. A nomenclatura “sistemática”, que pode parecer redundante, é proveniente do
verbo grego sunista/w, que significa: organizar, coligar, congregar. Portanto, a desig-
nação de Teologia Sistemática é pertinente visto que ela se propõe a organizar em
um sistema unificado os ensinamentos bíblicos.26 Creio que esta palavra de posicio-
namento seja necessária e suficiente dentro dos objetivos deste texto.
Podemos dizer que a Teologia Sistemática, considerando a unidade de toda a
Escritura, é o estudo sistematizado da Revelação Especial de Deus conforme regis-
trada nas Escrituras Sagradas, buscando uma compreensão real e harmônica de
“todo o desígnio de Deus” por meio de suas relações intrínsecas e extrínsecas, real-
çando a sua relevância para a vida do povo de Deus. Noutras palavras, sua função
é tomar os fatos da Bíblia, “determinar sua relação entre si e com as outras ver-
dades cognatas, bem como vindicá-las e mostrar sua harmonia e consistência”.27
22 Uso essa nomenclatura de forma distinta da que é empregada normalmente para se referir ao estudo
histórico das doutrinas cristãs, como estas foram compreendidas em diferentes períodos da história. (Por
exemplo: MCGRATH, A. E. Teologia Sistemática, histórica e filosófica: Uma introdução à teologia
cristã, São Paulo: Shedd Publicações, 2005, p. 182-184). Entendo que essa abordagem deve fazer parte da
própria Teologia Sistemática.
23 Consultar referência.
24 Nos círculos teológicos Luteranos e Reformados da Europa, prevaleceu o nome Dogmática. (Veja-
se: BAVINCK, H. Reformed Dogmatics. Volume 1: Prolegomena, Grand Rapids, Michigan: Baker
Academic, 2003, p. 26-34).
25 Consultar referência.
26 Consultar referência.
27 Consultar referência.
INTRODUÇÃO A TEOLOGIA
21
D. Teologia Prática
Trata da aplicação prática das doutrinas bíblicas à vida da Igreja, envolvendo a
Homilética, Educação Cristã, Liturgia e a Teologia Pastoral. Podemos dizer que
a Teologia Prática é o grande ponto de contato entre a Academia e a Igreja. Visto
que toda a teologia é comprometida, o alvo de toda reflexão teológica é o culto a
Deus e a edificação do povo de Deus, para que esse amadureça em sua fé e possa
servi-Lo com maior integridade. Nós estudamos a respeito de Deus, por meio
de Sua revelação, a fim de adorá-Lo em nossa obediência.
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Como fica demonstrado, a teologia traz consigo alguns pressupostos dos quais
dependem a sua existência. Retomando a definição de teologia como sendo o
estudo da Revelação Pessoal de Deus conforme registrada nas Escrituras Sagradas,
em forma de esboço, podemos indicar os seguintes pressupostos:
28 Consultar referência.
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real, ainda que não exaustivo.
Não podemos compreender plenamente a Deus em toda a sua gran-
deza, mas que há certos limites dentro dos quais os homens devem
manter-se, embora Deus acomode a nossa tacanha capacidade toda
declaração que faz de Si mesmo. Portanto, somente os estultos é que
buscam conhecer a essência de Deus.30
INTRODUÇÃO A TEOLOGIA
23
O fato que queremos destacar é que todos trabalham com os seus pressupos-
tos, explícitos ou não, plenamente conscientes deles ou apenas parcialmente.
Schaeffer (1912-1984) coloca a questão nestes termos:
Todas as pessoas têm seus pressupostos, e elas vão viver de modo mais
coerente possível com estes pressupostos, mais até do que elas mesmas
possam se dar conta. Por pressupostos entendemos a estrutura básica
de como a pessoa encara a vida, a sua cosmovisão básica, o filtro atra-
vés do qual ela enxerga o mundo. Os pressupostos apoiam-se naquilo
que a pessoa considera verdade acerca do que existe. Os pressupostos
das pessoas funcionam como um filtro, pelo qual passa tudo o que elas
lançam ao mundo exterior. Os seus pressupostos fornecem ainda a base
para seus valores e, em consequência disto, a base para suas decisões.34
33 Consultar referência.
34 SCHAEFFER, F. A. Como Viveremos? São Paulo: Editora Cultura Cristã, 2003, p. 11. McGregor
Wright demonstra isso em sua obra quando parte para analisar os textos bíblicos que acredita serem o
fundamento de sua posição. Escreve então: “...devemos todos orar para que o Espírito Santo sonde os
nossos corações, em busca de indícios de que nossa exegese esteja sendo controlada por suposições e
pressuposições das quais não estejamos plenamente cônscios, porque elas tendenciam nossa leitura da
Palavra de Deus. Contudo a questão não é se podemos ser não-tendenciosos ou não, mas se estamos
conscientes de nossas pressuposições. Realmente percebemos como elas nos afetam, e realmente estamos
desejosos de ver essas pressuposições julgadas pelas Escrituras?” (R.K. McGregor Wright, A Soberania
Banida: redenção para a cultura pós-moderna, São Paulo: Editora Cultura Cristã, 1998, p. 122).
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São esses pressupostos que determinam a nossa maneira de ver e, portanto, agir
no mundo.36 A nossa percepção e ação fundamentam-se em nossos pressupos-
tos os quais sãos reforçados, transformados, lapidados ou abandonados em prol
de outros, conforme a nossa percepção dos “fatos”. A questão epistemológica
antecede à práxis.
Descartes (1596-1650), após dizer que “o bom senso é a coisa do mundo
melhor partilhada”, admite que “não é suficiente ter o espírito bom, o principal
é aplicá-lo bem”.37 De fato, bom senso, a boa maneira de conduzir o pensamento
na avaliação dos fatos, é indispensável, contudo, se ele for provido de um bom
método, a possibilidade de obter êxito é bem maior.38
35 SILVA, M. Em Favor da Hermenêutica de Calvino: In: KAISER JUNIOR, W. C.; SILVA, M. Introdução à
Hermenêutica Bíblica. São Paulo: Editora Cultura Cristã, 2002, p. 255. De forma complementar, devemos
também entender que: “Corretamente empregados, os padrões confessionais devem guiar, formatar
e enriquecer nossa exegese; mal empregados, eles se divorciam dos textos bíblicos que os nutriram e
desenvolveram” (= Carson, D. A. Jesus, o Filho de Deus: O título cristológico muitas vezes negligenciado,
às vezes mal compreendido e atualmente questionad., São Paulo: Vida Nova, 2015, p. 81-82).
36 “Seria atenuar os fatos dizer que a cosmovisão ou visão de mundo é um tópico importante. Diria que
compreender como são formadas as cosmovisões e como guiam os limitam o pensamento é o passo
essencial para entender tudo o mais. Compreender isso é algo como tentar ver o cristalino do próprio
olho. Em geral, não vemos nossa própria cosmovisão, mas vemos tudo olhando por ela. Em outras
palavras, é a janela pela qual percebemos o mundo e determinamos, quase sempre subconscientemente,
o que é real e importante, ou irreal e sem importância” (Johnson, P. E. no Prefácio à obra de Nancy.
Pearcey, A Verdade Absoluta: Libertando o Cristianismo de Seu Cativeiro Cultural. Rio de Janeiro: Casa
Publicadora das Assembleias de Deus, 2006, p. 11).
37 Consultar referência.
38 Lalande define “bom senso”, como a “faculdade de distinguir espontaneamente o verdadeiro do falso e de
apreciar as coisas pelo seu justo valor” (Bom Senso: In: LALANDE, A. Vocabulário Técnico e Crítico da
Filosofia. São Paulo: Martins Fontes, 1993, p. 996a).
INTRODUÇÃO A TEOLOGIA
25
39 Este é o significado original da palavra, variando conforme a conjunção com outras (Veja: entre outras
obras, DANA, H. E.; MANTEY, J. R. Manual de Gramatica del Nuevo Testamento Griego. Buenos Aires:
Casa Bautista de Publicaciones, 1975, p. 104-105). Uma curiosidade bíblica: Paulo exorta aos efésios:
“Revesti-vos de toda a armadura de Deus, para poderdes ficar firmes contra as ciladas (meqode/ia) do
diabo” (Ef 6.11). Esta palavra envolve um “plano ou sistema deliberado”. Meqode/ia é da mesma raiz da
nossa palavra “método”. As ciladas de Satanás visam nos induzir ao erro. Ele, portanto, atua de forma
metódica, seguindo sempre um plano para obter êxito nos seus propósitos.
40 Consultar referência.
41 Consultar referência.
42 Consultar referência.
43 Consultar referência.
44 Consultar referência.
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Teologia, sendo Deus o Seu autor, a causa final. A teologia busca sempre a gló-
ria de Deus, como objetivo máximo e final; e esse objetivo é alcançado sempre
em sua fidelidade à Revelação. Portanto, embora admitindo a infalibilidade da
Revelação Geral, só consideramos a Revelação Especial como fonte da Teologia.
Dessa forma, a tentativa de reconhecer a Revelação Geral como fonte secundá-
ria da Teologia está fora de cogitação, visto que, para que isso aconteça, teríamos
de interpretá-la de acordo com a luz da Escritura, e podemos observar também
que, qualquer tentativa de se criar uma fonte secundária ou terciária de teolo-
gia (os catecismos, por exemplo) implica em admitir que a Bíblia precisa de um
complemento, logo é incompleta ou insuficiente. A Revelação Geral tem o seu
valor ilustrativo, contudo, em nada acrescenta à Revelação Especial e aquela só
pode ser entendida corretamente por aquele que, mediante a iluminação do
Espírito Santo, entende a Revelação Especial. Para esse homem, a Revelação
Geral se constitui em uma “republicação”, ainda que não cronológica, das ver-
dades contidas nas Escrituras, contudo essa “republicação” não é complementar
nem transforma vida. E o que a natureza trata de forma estrita e apenas indica-
tiva, a Escritura fala de forma ampla e demonstrativa.
45 Consultar referência.
46 “A cosmovisão cristã tem coisas importantes a dizer sobre a totalidade da vida humana” (Ronald H.
Nash, Questões Últimas da Vida: uma introdução à Filosofia, p. 19).
INTRODUÇÃO A TEOLOGIA
27
Por outro lado, Abraham Kuyper (1837-1920), em seu livro Principles of Sacred
Theology, nos chama a atenção para o fato de que não devemos considerar a
Revelação Especial ou a Escritura como fonte da Teologia (“fons theologiae”),
tendo em vista que o termo “fonte” no estudo científico tem um significado mui
definido. Em geral, denota uma área de estudo sobre a qual, o homem como
agente ativo faz uma triagem para a sua pesquisa, como na Botânica, Zoologia e
História. Nesse caso, o objeto de estudo é passivo; o homem que é ativo, debruçan-
do-se sobre o fenômeno para extrair do objeto o conhecimento desejado. Assim
sendo, usando o termo nesse sentido, tem-se a impressão de que o homem como
agente ativo pode se colocar sobre as Escrituras para descobrir ou tirar dela o
conhecimento de Deus, que ali está passivamente esperando o seu descobridor.
Sabemos que isso não é verdade! Deus se revela ao homem e mais uma vez, ati-
vamente, fornece os meios para a compreensão desta revelação: o Espírito Santo.
A Teologia, como vimos, é sempre o efeito da ação reveladora, inspiradora e ilu-
minadora de Deus por meio do Espírito. Por isso, falar de Teologia Americana,
Europeia ou da América Latina se constitui, no mínimo, em uma ignorância
bíblica: ou a Teologia é Bíblica ou não é Teologia; surja em que continente for,
em que movimento for, em que regime político for. Brunner (1889-1966) cor-
retamente enfatiza:
A dogmática que está sob uma obrigação apenas para com a Verda-
de deve se proteger contra todo regionalismo nacional ou continental,
pelo qual o ponto de vista Europeu, o Inglês ou o Americano seria mais
importante do que é na verdade.47
47 Consultar referência.
Deus não se deixa invadir pela razão humana ou mesmo pela fé; Ele se dá a conhe-
cer livre, fidedigna e explicitamente; Deus se revela a Si mesmo como Senhor e
“Senhorio significa liberdade”.48 Quanto mais conhecemos Deus, mais compre-
endemos e sentimos que Seu ministério é inescrutável. A “douta ignorância” faz
parte essencial da genuína teologia sistemática.49 O conhecimento de nossa limi-
tação não é inato; antes é precedido pela revelação. Sem a revelação de Deus não
há teísmo, ateísmo nem agnosticismo. É no encontro com Deus que tomamos
conhecimento de nossas limitações.
Sem a revelação, o homem passaria toda a sua vida e estaria na eternidade
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
sem o menor conhecimento de Deus, por mais engenhosos que fossem os seus
métodos, por mais sistemáticas que fossem as suas pesquisas, por mais que evo-
luísse a ciência. O homem nunca conseguiria chegar a Deus ou mesmo a sua
ideia: ignoraria eternamente a própria ignorância! Entretanto Deus continuaria
sendo o que sempre foi: o Senhor! “Ainda que o mundo inteiro fosse incrédulo,
a verdade de Deus permaneceria inabalável e intocável” (João Calvino, Gálatas,
São Paulo: Paracletos, 1998, (Gl 2.2), p. 48-49). Todavia graças a Deus, porque
Ele soberanamente Se Revelou a Si mesmo, para que possamos conhecê-Lo e
render-Lhe toda a glória que somente a Ele é devida. Em Cristo, nós somos con-
frontados com o clímax e plenitude da revelação de Deus (Jo 14.9-11; 10.30; Cl
1.19; 2.9; Hb 1.1-4). “No Filho, temos a revelação última de Deus. Da mesma
forma como é verdade que quem viu o Filho viu o Pai, também é verdade que
quem não viu o Filho, não viu o Pai”. 50 Jesus Cristo é a medida da revelação!
Lembremo-nos mais uma vez das palavras de A. Kuyper, de que o homem
não pode se colocar sobre a Bíblia para fazer uma investigação de Deus; Deus é
Quem se comunica, Quem se dá; Ele é sempre o Sujeito, nunca o objeto na rela-
ção do conhecimento. Na Revelação, ocorre uma mudança de referência. Nós
que nos acostumamos a pensar a partir de nós, precisamos aprender a pensar
a partir de Deus; nós não somos “a medida de todas as coisas” nem o ponto de
partida, somos o fim da Revelação graciosa de Deus.
48 Consultar referência.
49 Ver: CALVINO, J. As Institutas, III.21.2; III.23.8. Na edição de 1541, escrevera: “E que não achemos
ruim submeter neste ponto o nosso entendimento à sabedoria de Deus, aos cuidados da qual Ele deixa
muitos segredos. Porque é douta ignorância ignorar as coisas que não é lícito nem possível saber; o desejo
de sabê-las revela uma espécie de raiva canina” (CALVINO, J. As Institutas da Religião Cristã: edição
especial com notas para estudo e pesquisa, v. 3 (III.8), p. 53-54).
50 Consultar referência.
INTRODUÇÃO A TEOLOGIA
29
ser considerado genuíno o “credo” que se ajuste aos critérios racionais vigentes.54
Para nós, reformados, entretanto, é a Palavra de Deus que deve dirigir toda
a nossa abordagem e interpretação teológica, bem como de toda a realidade: o
Espírito, por intermédio da Palavra, é Quem deve nos guiar à correta interpre-
tação da Revelação. Na Escritura, temos o nosso padrão e apelo final.55
51 Calvino, comentando a respeito desta vida e a futura, diz: “...esta vida, por mais que esteja cheia de infinitas
misérias, com toda razão se conta entre as bênçãos de Deus, que não é lícito menosprezar” (As Institutas,
III.9.3). À frente, acrescenta: “E muito maior é essa razão, se refletirmos que nesta vida nos está Deus de
certo modo a preparar para a glória do Reino Celeste” (As Institutas, III.9.3).
52 PACKER, J. I. O “Antigo” Evangelho. São Paulo: Fiel, 1986, p. 1ss., traça uma boa distinção entre o
“Antigo” e o “Novo” Evangelho, mostrando que o “Antigo”, buscava a Glória de Deus, enquanto que o
“novo” está preocupado em “ajudar” o homem. Em 1768, Abraham Booth (1734-1806) observara que a
pregação dos cristãos primitivos gerava a perseguição “porque a verdade que pregavam ofendia o orgulho
humano (...) não dava lugar ao mérito humano” (BOOTH, A. Somente pela Graça. São Paulo: Publicações
Evangélicas Selecionadas, 1986, p. 9,10).
53 O filósofo alemão Feuerbach (1804-1872), reduziu “a teologia à antropologia” (FEURBACH, L. A. A
Essência do Cristianismo, Campinas, SP: Papirus, 1988, Prefácio da 2ª edição p. 35).
54 Consultar referência.
55 Consultar referência.
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
Dr. Lloyd-Jones (1889-1981), em 1969, nas conferências que realizava no Se-
minário Teológico Westminster, resume:
O pregador deveria ser bem versado em teologia bíblica, a qual, por sua vez con-
duz à teologia sistemática. Para mim, nada é mais importante para um pregador
do que o fato que ele deveria estar de posse da teologia sistemática, conhecen-
do profundamente e estando bem arraigado nela. Essa teologia sistemática, esse
corpo de verdades derivadas das Escrituras, sempre deve fazer-se presente como
pano de fundo e influência controladora da pregação. Cada mensagem, que pro-
vém de algum texto ou declaração específica das Escrituras, sempre deve fazer
parte ou ser um aspecto desse conjunto total da Verdade. Jamais será algo isola-
do, jamais será algo separado ou desvinculado. A doutrina que houver em qual-
quer texto específico, nunca deveríamos olvidar, faz parte desse conjunto maior
– a Verdade ou a Fé. Esse é o significado da frase ‘comparando Escritura com Es-
critura’. Não podemos manipular nenhum texto isolado; toda a nossa preparação
de um sermão deveria ser controlada por esse pano de fundo de teologia siste-
mática (...). O emprego correto da teologia sistemática consiste em que, quando
descobrimos alguma doutrina específica no texto selecionado, nós averiguamos
e controlamos, assegurando-nos de que ela cabe dentro de todo esse corpo de
doutrinas bíblicas que é vital e essencial” (LLOYOD-JONES, 1984, p. 48-49).
56 Consultar referência.
57 Consultar referência.
INTRODUÇÃO A TEOLOGIA
31
Para McGrath (2007, p. 67), “uma teologia que toca a mente, deixando de afetar
o coração, não é a verdadeira teologia cristã”. João Calvino (1509-1564) comen-
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
tando o texto de 1Tm 6.3,58 diz que “[a doutrina] só será consistente com a
piedade se nos estabelecer no temor e no culto divino, se edificar nossa fé, se
nos exercitar na paciência e na humildade e em todos os deveres do amor”.59
Estamos convencidos de que a genuína piedade bíblica (eu)se/beia) – At 3.12;
1Tm 2.2; 3.16; 4.7,8; 6.3,5,6,11; 2Tm 3.5; Tt 1.1; 2Pe 1.3,6,7; 3.11 – começa pela
compreensão correta do mistério de Cristo, conforme nos diz Paulo, “evidente-
mente, grande é o mistério da piedade Aquele que foi manifestado na carne foi
justificado em espírito, contemplado por anjos, pregado entre os gentios, crido
no mundo, recebido na glória” (1Tm 3.16). A piedade era a tônica do ministério
pastoral de Paulo. É desse modo que ele inicia a sua carta a Tito, “Paulo, servo
de Deus e apóstolo de Jesus Cristo, para promover (kata/)60 a fé que é dos elei-
tos (e)klekto/j) – Mt 22.14; 24.22,24,31; Mc 13.20,22,27; Lc 18.7; 23.35; Rm
8.33; 16.13; Cl 3.12; 1Tm 5.21; 2Tm 2.10; Tt 1.1; 1Pe 1.1; 2.4; 1Pe 2.6,9; 2Jo 1,13;
Ap 17.14 – de Deus e o pleno conhecimento da verdade segundo a piedade” (Tt
1.1). Portanto, devemos indagar sempre a respeito de doutrinas consideradas
evangélicas, se elas, de fato, contribuem para a piedade. A genuína ortodoxia
será plena de vida e piedade.
58 “Se alguém ensina outra doutrina e não concorda com as sãs palavras de nosso Senhor Jesus Cristo e com o
ensino segundo a piedade, é enfatuado, nada entende, mas tem mania por questões e contendas de palavras,
de que nascem inveja, provocação, difamações, suspeitas malignas, altercações sem fim, por homens cuja
mente é pervertida e privados da verdade, supondo que a piedade é fonte de lucro” (1Tm 6.3-5).
59 Consultar referência.
60 Kata/ quando estabelece relação, tem o sentido de “de acordo com a”, “com referência a”. No texto,
pode ter o sentido de “segundo a fé que é dos eleitos”, “no interesse de”, “promover”, etc. (Mc 7.5; Lc 1.9,38;
2.22,24,29; Jo 19.7; At 24.14; Cl 1.25,29; 2Tm 1.1,8,9; Hb 7.5).
Paulo diz que é apóstolo da parte de Jesus Cristo comprometido com a fé que é dos
eleitos de Deus. O seu ensino tinha esse propósito – diferentemente dos falsos mes-
tres, que se ocupavam com fábulas e mandamentos procedentes da mentira (Tt 1.14)
– promover a fé dos crentes em Cristo Jesus. A fé que é dos eleitos, portanto, deve ser
desenvolvida no “pleno conhecimento (e)pi/gnwsij) – Rm 1.28; 3.20; 10.2; Ef 1.17;
4.13; Fp 1.9; Cl 1.9,10; 2.2; 3.10; 1Tm 2.4; 2Tm 2.25; 3.7; Tt 1.1; Fm 6; Hb 10.26; 2Pe
1.2,3,8; 2.20 – da verdade (a)lh/qeia)”. Ou seja, a nossa salvação se materializa em
nosso conhecimento intensivo e qualitativamente completo da verdade. Contudo
esse conhecimento da verdade, longe de arrogante e autossuficiente, está relacio-
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nado com a piedade “segundo a piedade (eu)se/beia)” – At 3.12; 1Tm 2.2; 3.16;
4.7,8; 6.3,5,6,11; 2Tm 3.5; Tt 1.1; 2Pe 1.3,6,7; 3.11. O verdadeiro conhecimento de
Deus é cheio de piedade. Piedade caracteriza a atitude correta para com Deus, englo-
bando temor, reverência, adoração e obediência. Ela é a palavra para a verdadeira
religião.61 Paulo diz que a piedade para tudo é proveitosa, não havendo contraindi-
cação “pois o exercício físico para pouco é proveitoso (w)fe/limoj), mas a piedade
para tudo é proveitosa (w)fe/limoj),62 porque tem a promessa da vida que agora é e
da que há de ser” (1Tm 4.8). Por isso, Timóteo, com o propósito de realizar a vontade
de Deus, deveria exercitá-la com a perseverança de um atleta (1Tm 4.7);63 segui-la
como alguém que persegue um alvo, e a convicção e o zelo com os quais o próprio
Paulo perseguira a Igreja de Deus (Fp 3.6) “tu, porém, ó homem de Deus, foge des-
tas coisas; antes, segue (diw/kw)64 a justiça, a piedade (eu)se/beia), a fé, o amor, a
constância, a mansidão” (1Tm 6.11). O tempo presente do verbo indica a progressi-
vidade que deve caracterizar essa busca pela piedade.
61 Consultar referência.
62 Este adjetivo que, no Novo Testamento, só é empregado por Paulo, é aplicado às boas obras (Tt 3.8) e à
Palavra inspirada de Deus em sua aplicação às nossas necessidades (2Tm 3.16).
63 “Mas rejeita as fábulas profanas e de velhas caducas. Exercita-te (gumna/zw), pessoalmente, na piedade”
(1Tm 4.7). Gumna/zw é aplicada ao exercício próprio de atleta. No Novo Testamento a palavra é usada
metaforicamente, indicando o treinamento que pode ser utilizado para o bem ou para o mal (*1Tm 4.7;
Hb 5.14;12.11; 2Pe 2.14).
64 Diw/kw é utilizada sistematicamente para aqueles que perseguiam a Jesus, os discípulos e a Igreja (Mt
5.10-12; Lc 21.12; Jo 5.16; 15.20). Lucas emprega este mesmo verbo para descrever a perseguição que
Paulo efetuou contra a Igreja (At 22.4; 26.11; 1 Co 15.9; Gl 1.13,23; Fp 3.6), sendo também a palavra
utilizada por Jesus Cristo quando pergunta a Saulo do porquê de sua perseguição (At 9.4-5/At 22.7-8/
At 26.14-15). Paulo diz que prosseguia para o alvo (Fp 3.12,14). O escritor de Hebreus diz que devemos
perseguir a paz e a santificação (Hb 12.14).
INTRODUÇÃO A TEOLOGIA
33
65 J. Calvino, As Institutas, I.5.9. “...Importa se nos transfunda ela (a doutrina) ao coração e se nos traduza no
modo de viver, e, a tal ponto a si nos transforme, que nos não seja infrutuosa. Se, com razão, se incendem
os filósofos contra aqueles que, em professando uma arte que lhes deva ser a mestra da vida, a convertem
em sofística loquacidade, e os alijam ignominiosamente de sua grei, de quão melhor razão haveremos de
detestar estes fúteis sofistas que se contentam em revolutear o Evangelho no topo dos lábios, Evangelho cuja
eficácia devera penetrar os mais profundos afetos do coração, arraigar-se na alma e afetar o homem todo,
cem vezes mais do que as frias exortações dos filósofos” (CALVINO, J. As Institutas, III.6.4).
66 Consultar referência.
67 Consultar referência.
68 Consultar referência.
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
beia), pelo conhecimento completo daquele que nos chamou para a sua própria
glória e virtude” (2Pe 1.3).71
A piedade como resultado de nosso relacionamento com Deus deve ter o
seu reflexo concreto dentro de casa, sendo revelada por meio do tratamento que
concedemos aos nossos pais e irmãos “... se alguma viúva tem filhos ou netos,
que estes aprendam primeiro a exercer piedade (eu)sebe/w) para com a própria
casa e a recompensar a seus progenitores, pois isso é aceitável diante de Deus”
(1Tm 5.4).72 Nunca o nosso trabalho, por mais relevante que seja, poderá se tor-
nar em um empecilho para a ajuda aos nossos familiares. A genuína piedade é
caracterizada por atitudes condizentes para com Deus (reverência) e para com o
nosso próximo (fraternidade). Curiosamente, quando o Novo Testamento des-
creve Cornélio, diz que ele era um homem “piedoso (Eu)sebh/j) e temente a
Deus (...) e que fazia muitas esmolas ao povo e de contínuo orava a Deus” (At
10.2). A piedade é, portanto, uma relação teologicamente orientada do homem
para com Deus em sua devoção e reverência e a sua conduta biblicamente ajus-
tada e coerente com o seu próximo. A piedade envolve comunhão com Deus e
o cultivo de relações justas com os nossos irmãos. “A obediência é a mãe da pie-
dade”, resume Calvino.73
INTRODUÇÃO A TEOLOGIA
35
74 Este advérbio só ocorre em dois textos do Novo Testamento: 2Tm 3.12; Tt 2.12.
75 Consultar referência.
76 “Para aquele que é intelectualmente dotado, é muito mais fácil ser um cristão no campo do pensamento
do que naquele comportamento prático; e ainda o bom teólogo sabe muito bem que o que realmente
conta diante de Deus não é simplesmente o que alguém pensa, mas o que alguém pensa com tal fé que se
torna ato. Porque somente essa fé ‘que atua pelo amor’ é considerada” (BRUNNER, E. Dogmática, São
Paulo: Novo Século, 2004, v. 1, p. 119-120).
77 Consultar referência.
78 “A oração é sempre necessária como instrução (...). Transmitir conhecimento não basta. É igualmente
essencial que oremos – que oremos por nós mesmos, para que Deus nos faça receptivos ao conhecimento
e à instrução; que oremos para sermos capacitados a agasalhar o conhecimento recebido e aplicá-lo; que
oremos para que não fique só em nossas mentes, e sim que se apegue aos nossos corações, dobre as nossas
vontades e afete o homem todo. O conhecimento, a instrução e a oração devem andar sempre juntos;
jamais devem estar separados” (LLOYD-JONES, D. M. As Insondáveis Riquezas de Cristo. São Paulo:
Publicações Evangélicas Selecionadas, 1992, p. 98).
79 Consultar referência.
Talvez, aqui, esteja uma das armadilhas mais sutis, pois prezamos a doutrina,
entendemos ser ela fundamental para a vida cristã, no entanto, nesta justíssima
ênfase e compreensão, podemos nos esquecer da importância vital da pieda-
de.80 Notemos que não estou dizendo que isso aconteça conosco com frequência
ou que esse seja o nosso ponto fraco, apenas observo que devemos vigiar nesse
flanco, para que o inimigo não alcance êxito em seu desígnio destruidor. Paulo fala
dos “desígnios” de Satanás (2Co 2.11),81 indicando a ideia de que ele tem metas
definidas, estratégias elaboradas, um programa de ação com variedades de téc-
nicas e opções a serem aplicadas conforme as circunstâncias. Ele emprega toda
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
a sua “energia” (2Ts 2.9).82 Nesse texto, fica claro que Satanás se vale de todos os
recursos a ele disponíveis, contudo, como não poderia ser diferente, amparado
na “mentira” – que lhe é própria (Jo 8.44) –, para realizar os seus propósitos.
D.M. Lloyd-Jones (1899-1981), assim se expressou:
O ministro do Evangelho é um homem que está sempre lutando em
duas frentes. Primeiro ele tem que concitar as pessoas a se interessarem
por doutrina e pela teologia, todavia não demorará muito nisso antes
de perceber que terá que abrir uma segunda frente e dizer às pessoas
que não é suficiente interessar-se somente por doutrinas e teologia, que
você corre o perigo de se tornar um mero intelectualista ortodoxo e
de ir ficando negligente quanto à sua vida espiritual e quanto à vida da
Igreja. Este é o perigo que assedia os que sustentam a posição reforma-
da. Essas são as únicas pessoas realmente interessadas em teologia, pelo
que o diabo vem a eles e os impele para demasiado longe na linha desse
interesse, e eles tendem a tornar-se meros teólogos e só intelectualmen-
te interessados na verdade (LLOYD-JONES, 1993, p. 22).
80 Consultar referência.
81 “Para que Satanás não alcance vantagem sobre nós, pois não lhe ignoramos os desígnios (no/hma)” (2Co
2.11). A palavra traduzida por “desígnio” (no/hma), ocorre cinco vezes no NT., sendo utilizada apenas
por Paulo: 2Co 2.11; 3.14; 4.4; 10.5; 11.3; Fp 4.7, tendo o sentido de “plano” (Platão, Política, 260d),
“intenção maligna”, “intrigas”, “ardis”. Com exceção de Fp 4.7, a palavra sempre é usada negativamente no
NT. No/hma é o resultado da atividade do nou=j (mente); (BEHM, J.; WURTHWEIN, E. nou=j, etc. In:
Gerhard Kittel; G. Friedrich, eds. Theological Dictionary of the New Testament, Grand Rapids, Michigan:
Eerdmans, 1983 (Reprinted), v. 4, p. 960).
82 “Ora, o aparecimento do iníquo é segundo a eficácia (e)ne/rgeia) de Satanás, com todo poder, e sinais, e
prodígios da mentira” (2Ts 2.9). Satanás atua de forma eficaz na consecução dos seus objetivos: e)ne/rgeia
(energeia) – “trabalho efetivo” –, de onde vem a nossa palavra “energia”, passando pelo latim, “energîa”.
Esse substantivo é empregado tanto para Deus (Ef 3.7; 4.16; Fp 3.21; Cl 1.29; 2.12) como para Satanás
(2Ts 2.9). Estando este subordinado à e)ne/rgeia de Deus (2Ts 2.11). E)ne/rgeia e seus derivados, no NT.,
descreve sempre um poder eficaz em atividade sobre-humana, por meio da qual a natureza de quem a
exerce se revela (Veja: BARCLAY, W. Palavras Chaves do Novo Testamento, p. 51-57).
INTRODUÇÃO A TEOLOGIA
37
temos uma incumbência dada por ela um serviço a lhe prestar, devido
a uma compulsão que pode originar-se somente no seu interior. Pensa-
mento dogmático não é somente pensar sobre a fé, é um pensar crendo.
Calvino está convencido de que ninguém pode “provar sequer o mais leve gosto
da reta e sã doutrina, a não ser aquele que se haja feito discípulo da Escritura”.85
E que “só quando Deus irradia em nós a luz de seu Espírito é que a Palavra logra
produzir algum efeito”.86 Portanto, “o conhecimento de todas as ciências não
passa de fumaça quando separada da ciência celestial de Cristo”.87 Desse modo,
“o homem que mais progride na piedade é também o melhor discípulo de Cristo,
e o único homem que deve ser tido na conta de genuíno teólogo é aquele que
pode edificar a consciência humana no temor de Deus”.88
Ao longo da História, diversos teólogos têm insistido nesse ponto. O lute-
rano Davi Chyträus (1530-1600) – aluno de Melanchthon (1497-1560) – resumiu
bem esse espírito, quando escreveu, em 1581, “demonstramos ser cristãos e teó-
logos muito mais através da fé, da vida santa e do amor a Deus e ao próximo, do
que através da astúcia e das sutilezas das polêmicas”.89 Ele também costumava
repetir aos seus alunos durante o ano “o estudo da teologia não deve ser condu-
zido através da rixa e disputa, mas pela prática da piedade”.90
83 Consultar referência.
84 Consultar referência.
85 Consultar referência.
86 Consultar referência.
87 Consultar referência.
88 Consultar referência.
89 Consultar referência.
90 Consultar referência.
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
dade bíblica. A infidelidade, ao contrário do que possa parecer em um primeiro
momento, não consiste apenas em acrescentar ensinamentos estranhos à Palavra,
mas, também, omitir e, talvez de forma mais sutil, nos contentarmos com ame-
nidades, sem expor com clareza, fidelidade e profundidade a Palavra de Deus.
Fidelidade exige o silêncio reverente diante do mistério e a ousadia edificante
diante do estudo do revelado; ambas as atitudes nos previnem da especulação
91 Quanto à estupefação que a palavra “teologia” causa, por exemplo: THIELICKE, H. Recomendações
aos Jovens Teólogos e Pastores. São Paulo: Sepal, 1990, 69p.; HORDERN, W. Teologia Protestante ao
Alcance de Todos. Rio de Janeiro: Casa Publicadora Batista, 1974, p. 11ss.
92 Se a especulação indevida é um mal; devemos observar também, que mal semelhante é negligenciar
o estudo daquilo que Deus nos revelou em Sua Palavra. Calvino (1509-1564) nos advertiu quanto a
isto, dizendo: “As cousas que o Senhor deixou recônditas em secreto não perscrutemos, as que pôs a
descoberto não negligenciemos, para que não sejamos condenados ou de excessiva curiosidade, de uma
parte, ou de ingratidão, de outra” (As Institutas, III.21.4). Alhures, ele observa que a sabedoria consiste
em reconhecer os nossos limites. “Nem nos envergonhemos em até este ponto submeter o entendimento
à sabedoria imensa de Deus, que em Seus muitos arcanos sucumba. Pois, dessas cousas que nem é
dado, nem é lícito saber, douta é a ignorância, a avidez de conhecimento, uma espécie de loucura” (As
Institutas, III.23.8).
Calvino orientou-nos pastoralmente, dizendo: “...Que esta seja a nossa regra sacra: não procurar saber
nada mais senão o que a Escritura nos ensina. Onde o Senhor fecha seus próprios lábios, que nós
igualmente impeçamos nossas mentes de avançar sequer um passo a mais” (CALVINO, J. Exposição de
Romanos. (Rm 9.14), p. 330).
“Aqueles que inquirem curiosamente acerca de tudo, e que jamais ficam satisfeitos, podem com justiça ser
chamados ‘questionadores’. Em suma, as coisas mantidas em elevada estima pelos eruditos da Sorbonne
são aqui condenadas pelo apóstolo. Porquanto toda a teologia dos papistas nada é senão um labirinto de
questões” (CALVINO, J. As Pastorais. (Tt 3.9) p. 355).
Do mesmo modo, diz Agostinho: “Ignoremos de boa mente aquilo que Deus não quis que soubéssemos”
(AGOSTINHO, Comentário aos Salmos. São Paulo: Paulus, (Patrística, 9/1), 1998, v. 1, (Sl 6), p. 60).
93 “O fútil ensino dos sofistas, erguendo-se em airosas especulações e sutilezas, não só obscurecem a
simplicidade da doutrina genuína com suas implicações, mas também a oprimem e a fazem desprezível,
já que o mundo quase sempre se deixa levar pela aparência externa” (CALVINO, J., As Pastorais. (1Tm
6.20), p. 186).
94 Somente aquele que conhece experimentalmente a Deus pode confiar no Seu poder e descansar nas Suas
Promessas. Vejam-se: PACKER, J. I. O Conhecimento de Deus, São Paulo: Mundo Cristão, 1980, p. 9-35.
95 Consultar referência.
INTRODUÇÃO A TEOLOGIA
39
pecaminosa e da ingratidão para com o que Deus nos tem concedido na Escritura.
Calvino nos instrui dizendo que “as cousas que o Senhor deixou recônditas em
secreto não perscrutemos, as que pôs a descoberto não negligenciemos, para
que não sejamos condenados ou de excessiva curiosidade, de uma parte, ou de
ingratidão, de outra”.96
Isso não significa que todos nós conseguimos compreender perfeita e exaus-
tivamente a Palavra, mas aponta para a responsabilidade que temos de, pela
graça, crescer no conhecimento de Jesus Cristo que nos advém pela Escritura
(2Pe 3.18). O ensino da Palavra é um privilégio altamente responsabilizador.
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
Deus, por graça, tem se valido de Seus servos para a transmissão de Sua mensa-
gem. Somos embaixadores cuja responsabilidade é sermos integralmente fiéis à
mensagem do Rei. Não somos autores da mensagem; ela não nos pertence. No
entanto somos arautos e embaixadores comissionados pelo Senhor a quem deve-
mos representar com integridade e responsabilidade (Mt 10.5-7,16,40; 2Co 5.20;
1Ts 2.13).97 Com conhecimento de causa, em 1956, Lloyd-Jones (1899-1981),
lamentava que “muitíssimas vezes os ministros cristãos não têm sido senão uma
espécie de Capelão da Corte, declarando vagas generalidades”.98
Como pregadores e mestres, é necessário que não nos contentemos em guiar
as pessoas apenas pelo sopé da montanha da glória de Deus; “torne-se um alpi-
nista nos rochedos íngremes da majestade de Deus”, aconselha Piper.99
Podemos estar tão preocupados com as nossas teorias que transformamos
a Palavra em apenas um elemento convalidador do que pensamos. Deste modo,
também nos tornamos infiéis ao Senhor da Palavra. É extremamente perigoso
pensarmos autonomamente e fazermos de Deus um ventríloquo que, com voz
estranha, diga o que queremos. Deus e a Sua Palavra não se adéquam a este papel.
A fidelidade doutrinária parte do desejo de conhecer a Palavra e expô-la em sua
profundidade, abrangência e simplicidade; nada mais, nada menos.
O apóstolo Paulo tinha consciência de que a sua mensagem era pura e sim-
plesmente “todo o desígnio de Deus” (At 20.27).
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
“Não devemos cometer o erro de fazer da evangelização uma inimiga
da teologia e do discipulado um inimigo da erudição edificante” ‒ John
Piper.102
100 Acentua MacArthur: “Toda a tarefa do ministro fiel gira em torno da Palavra de Deus – guardá-la,
estudá-la e proclamá-la” (MACARTHUR, J. F. Com Vergonha do Evangelho, São José dos Campos, SP.:
Fiel, 1997, p. 29).
101 Consultar referência.
102 Consultar referência.
103 BUSENITZ, N. A Palavra da Verdade em um mundo de erro: Fundamentos da apologética Cristã: In:
MACARTHUR, J. et al. Evangelismo: compartilhando o Evangelho com fidelidade, São José dos Campos,
SP.: Editora Fiel, 2012, p. 66,67.
104 “A doutrina está sempre subordinada às Escrituras é sempre sua serva, nunca mestra” (MCGRATH, A.
Teologia para Amadores, São Paulo: Mundo Cristão, 2008, p. 32).
105 Consultar referência.
INTRODUÇÃO A TEOLOGIA
41
A Teologia Sistemática funciona como boias (ou se preferirem, faróis) que ser-
vem para guiar, sinalizar e orientar o pregador na elaboração do seu sermão.106 A
Palavra de Deus é um todo orgânico que se harmoniza, todavia essa compreensão
só será possível por intermédio do seu estudo sistemático. O estudo da Teologia
Sistemática – aliado, obviamente, à leitura e meditação das Escrituras –, ajuda-nos
nesse processo de conhecimento global: a harmonia da revelação de Deus está pre-
sente em todas as páginas da Bíblia. Por isso, o pregador terá melhores condições
de entender o texto que servirá de base para o seu sermão, recorrendo à exegese,
à história bíblica e à Teologia Bíblica e Sistemática, tendo uma visão mais clara do
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
que as Escrituras nos ensinam a respeito daquele passo sagrado. Chapell define
exegese como “o processo mediante o qual os pregadores descobrem as definições
e as distinções gramaticais das palavras num texto”.107 MacArthur enfatiza: “nin-
guém tem o direito de ser um teólogo se não for um exegeta”.108
A Confissão de Westminster (1647), conforme vimos, expressa bem esse
conceito ao dizer, no capítulo 1, seção 9:
a regra infalível de interpretação da Escritura é a mesma Escritura; por-
tanto, quando houver questão sobre o verdadeiro e pleno sentido de
qualquer texto da Escritura (sentido que não é múltiplo, mas único),
esse texto pode ser estudado e compreendido por outros textos que
falem mais claramente (Mt 4.5-7; 12.1-7).
No século XX, C.S. Lewis (1898-1963), em mais uma de suas ficções, cria um
personagem demoníaco (1941) que, por meio de cartas infernais (ou seriam
celestiais?) ensinando ao demônio mais jovem como solapar com sutileza a
igreja, termina por nos mostrar algumas estratégias de Satanás. Segue uma delas:
106 Fiquei satisfeito ao ler em Barth, advertência semelhante: “Os dogmas são como bóias, postes
indicadores que assinalam a boa direção. Não é preciso fazer uma exposição dos dogmas nem expor
seu conteúdo teológico, senão deixar-se guiar por eles” (BARTH, K. La Proclamacion del Evangelio,
Salamanca: Ediciones Sigueme, 1969, p. 87).
107 Consultar referência.
108 MACARTHUR JUNIOR, J. F. Princípios para uma Cosmovisão bíblica: uma mensagem exclusivista
para um mundo pluralista, São Paulo: Editora Cultura Cristã, 2003, p. 50. “Se não nos propusermos a ser
estudantes de língua e literatura além de teologia, sempre seremos limitados na capacidade de ‘manejar
bem a palavra da verdade’.” (KÖSTENBERGER, A. J.; PATTERSON, R. D. Convite à interpretação
bíblica: A tríade hermenêutica. São Paulo: Vida Nova, 2015, p. 580). “Não haverá um pregador
verdadeiro, se tudo o que ele disser não estiver fundamentado em exatidão exegética. Pecamos quando
pregamos aquilo que achamos que as Escrituras afirmam, e não pregamos o seu verdadeiro significado.
Também pecamos quando pregamos os pensamentos que a Palavra desperta em nosso intelecto e não
aquilo que a Palavra realmente declara. Um arauto é um traidor, se não transmite exatamente o que o Rei
diz” (OLYOTT, S. Pregação pura e simples, São José dos Campos, SP.: Fiel, © 2010, 2012, p. 29).
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O propósito da pregação cristã não pode ser simplesmente debater por deba-
ter, ou vencer o seu adversário.109 Talvez haja aqui algo de sutilmente ardiloso e
diabólico. Toda pregação visa conduzir o homem a Cristo, o Deus-Encarnado.
Sabemos de nossas limitações aqui. Podemos e devemos pregar a Palavra em
sua inteireza, com fidelidade, sinceridade e real interesse. Contudo a conversão
é obra do Espírito de Deus. Faremos bem em nos ater à nossa esfera confiada
por graça a nós (1Co 9.16; Ef 3.8). Calvino, com a lucidez que lhe é própria, já
nos advertiu em mais de um lugar:
Gostaria que isso fosse levado em conta por aqueles que estão sempre
com a língua bem afiada, procurando polemizar em cada questão e so-
fismar em torno de uma única palavra ou sílaba. Mas eles são impulsio-
nados pela ambição, a qual, como sei de experiência pessoal com alguns
deles, às vezes é uma doença quase fatal. O que o apóstolo diz acerca da
subversão daqueles que ouvem é plenamente comprovado pela observa-
ção diária. É natural que em meio às contendas percamos nossa apreen-
são da verdade, e Satanás faz mal uso das controvérsias como pretexto
para subverter e destruir nossa fé (CALVINO, 1998, p. 233).
Portanto, devemos nos preparar para apresentar, quando necessário, uma defesa de
nossa fé. Devemos saber em quem e porque cremos. A Palavra de Deus é o fundamento
de nossa fé e da apresentação do Evangelho. A instrução de Paulo é fundamental:
“tomai também o capacete da salvação e a espada do Espírito, que é a palavra de Deus”
(Ef 6.17). Não podemos ir para guerra desarmados, ou com armas inadequadas resul-
tantes da ignorância de quem são nossos adversários e qual o propósito dessa luta.
INTRODUÇÃO A TEOLOGIA
43
...a apologética, como eu encaro, não deve ser de forma alguma separa-
da da evangelização. De fato, eu me pergunto se a ‘apologética’ que não
leva as pessoas até Cristo como salvador, e depois para o viver sob o
senhorio de Cristo, na verdade pode ser considerada apologética cristã.
“...porque sei em quem tenho crido e estou certo de que ele é poderoso para guar-
dar o meu depósito até aquele Dia” (2Tm 1.12). Paulo não fala de hipóteses ou
teorias, afirma sim a sua firme certeza na verdade de Deus.
6
Quanto a mim, estou sendo já oferecido por libação, e o tempo da
minha partida é chegado. 7 Combati o bom combate, completei a car-
reira, guardei a fé. 8 Já agora a coroa da justiça me está guardada, a qual
o Senhor, reto juiz, me dará naquele Dia; e não somente a mim, mas
também a todos quantos amam a sua vinda” (2Tm 4.6-8).
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ciona e me proporciona mais conforto e sucesso, já não existe interesse pela
verdade. Ela tornou-se irrelevante.115 No entanto a busca da verdade pela verdade
é uma característica fundamental da Igreja. Já que cabe à Igreja o privilégio de
proclamar a Palavra, ela tem de compreender as Escrituras para anunciá-la com
fidelidade e vivenciá-la para proclamar com autoridade. Por isso, a Igreja é cha-
mada de “coluna e baluarte da verdade”, porque a ela foram confiados os oráculos
de Deus (Rm 3.2/1Tm 3.15). A Igreja como baluarte da verdade está amparada
no fundamento que consiste na obra de Deus realizada por intermédio de Cristo
(Mt 16.18/Ef 2.20).116 “Escrevo-te estas coisas, esperando ir ver-te em breve; para
que, se eu tardar, fiques ciente de como se deve proceder na casa de Deus, que é
a igreja do Deus vivo, coluna (stu=loj)117 e baluarte (* e(drai/wma) da verdade
(a)lh/qeia)” (1Tm 3.14-15).
Deus Se dignou em preservar a verdade por meio da Igreja. Quando a Igreja
falha nesse propósito, ainda que a verdade não seja abalada em sua essência, ela
se torna fragilizada em sua exposição e aceitação.
A igreja enfrenta, aqui, dois perigos evidentes:
a. A “barganha” com o mundo. Na pretensão de ser ouvida de forma impac-
tante, negocia os seus valores por meio da assimilação dos valores seculares.
Na adoção dessa prática, a igreja perde totalmente a sua relevância como
voz profética de Deus para a sua geração.
INTRODUÇÃO A TEOLOGIA
45
A igreja é chamada a atuar do mundo. Essa atuação engloba uma agenda que
envolva uma mudança de perspectiva em nossa relação familiar, profissional,
social, econômica, política e religiosa. A relevância da verdade sustentada pela
igreja deve se manifestar em todas as esferas.
A Igreja tem, portanto, a grande responsabilidade de estudar a Palavra, pro-
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c) Evangelização “plena”
O Evangelho deve ser proclamado em sua inteireza a todos os homens e ao homem
todo; a teologia oferece solidez na transmissão dessa verdade, mostrando Quem
é Deus e a real necessidade do homem.
Tudo o que as Escrituras dizem a respeito do homem, e particularmen-
te tudo o que elas dizem sobre a salvação do homem, é afinal de contas
para glória de Deus. Nossa teologia está centralizada em Deus porque
nossa vida está centrada em Deus.120
A pregação não é dirigida apenas à emoção, mas também à mente; ela pre-
cisa ser entendida, por isso, a mensagem deve ser apresentada de forma clara e
objetiva – sem que, com isso, estejamos esquecendo que a conversão é obra do
Espírito –, visando atingir os nossos ouvintes: “o propagador do evangelho deve,
por conseguinte, ter um alcance inteligente do significado do evangelho e deve
estar em condições de dar uma afirmação inteligente acerca do mesmo”.122 A ope-
ração do Espírito não elimina nem atenua a nossa responsabilidade de proclamar
a Palavra com seriedade, esforçando-nos por fazê-lo da melhor forma possível
conforme os parâmetros bíblicos. Quando pregamos o Evangelho e quando o
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ouvimos, a nossa razão não deve nem pode ser esquecida. “Submissão e uso da
razão, eis em que consiste o cristianismo”.123 “...é só quando compreendemos
as doutrinas com as nossas mentes que podemos viver verdadeiramente a vida
cristã e desfrutá-la, como é o seu propósito para nós”.124
O Evangelho deve ser pregado em sua amplitude; é nossa responsabilidade
anunciar “todo o desígnio de Deus”, nada ocultando, nada omitindo. A Palavra
de Deus nos foi dada para que a conheçamos e a pratiquemos, portanto, ela deve
ser publicada por meio do ensino e da pregação. A Teologia Sistemática auxi-
lia-nos nessa tarefa, fornece-nos uma perspectiva abrangente do ensino bíblico
a respeito de Deus e de Sua Glória, bem como da natureza humana,125 de suas
necessidades e como Deus em Sua misericórdia pode satisfazê-las. O Evangelho
pleno consiste na pregação integral da Palavra.
O Evangelho não consiste no anúncio de ‘algumas partes’ da Bíblia, mas
sim de todo o ‘Conselho’ de Deus revelado nas Escrituras (Vejam-se:
Gl 1.8,9,11). O conteúdo da mensagem cristã deve ser nada mais, nada
menos do que toda a vontade revelada de Deus (Dt 29.29).126
INTRODUÇÃO A TEOLOGIA
47
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o recte docere só pode ser realizado pelo Espírito Santo”.132
Herman Bavinck (1854-1921 apud ZYLSTRA, p.7), em sua aula inaugural
em Amsterdã, sobre Religião e Teologia, disse:
religião, o temor de Deus, deve ser o elemento que inspira e anima a in-
vestigação teológica. Isso deve marcar a cadência da ciência. O teólogo
é uma pessoa que se esforça para falar sobre Deus porque ele fala fora
de Deus e por meio de Deus. Professar a teologia é fazer um trabalho
santo. É realizar uma ministração sacerdotal na casa do Senhor. Isso
é por si mesmo um serviço de culto, uma consagração da mente e do
coração em honra ao Seu nome.
O apóstolo Paulo diz “toda Escritura é inspirada por Deus e útil para o ensino,
(didaskali/a = “instrução”) para a repreensão, para a correção, para a educa-
ção na justiça” (2Tm 3.16). Entre outras coisas, isso significa que o nosso pensar
teológico deverá estar sempre conectado com a fidelidade à Escritura e com o
ensino da Palavra; esse aspecto realça a nossa responsabilidade como intérpre-
tes e pregadores da Palavra. Por outro lado, há, aqui, um grande conforto, que
nem sempre temos nos dado conta que não precisamos – nem nos foi requerido
–, “desculpar” ou “justificar” Deus e a Sua Palavra.133
INTRODUÇÃO A TEOLOGIA
49
Não há o que selecionar ou cortar “toda Escritura é (...) útil o para ensino”.
Algumas vezes, tenho a impressão de que diante de “questões embaraçosas” tais
como a “condenação de todos os homens inocentes que morrerem sem conhe-
cer a Cristo”, a “eleição de uns para a salvação em detrimento de outros”, “o quase
silêncio dos evangelhos sobre os trinta primeiros anos de Cristo”, e semelhan-
tes, ficamos como que procurando uma justificativa para O Soberano agir desta
ou daquela forma, buscamos uma maneira de tornar Deus apetecível à mente e
aos valores modernos e “pós-modernos”. Como cristãos, devemos aprender, se
ainda não o fizemos, a nos calar diante do silêncio de Deus, sabendo que o som
da nossa voz petulante e “lógica”134 – em tais circunstâncias –, por si só seria uma
“heresia”.135 Diante da vontade de Deus – que é a causa final de todos os Seus
atos –, temos que manter um reverente silêncio, reconhecendo que Ele assim
age, porque foi do Seu agrado; conforme o Seu santo, sábio e bondoso querer
Isto nos basta! (Sl 115.3;135.6; Dn 4.35; Ef 1.11). O que nos compete é procu-
rar entender, por meio do estudo e da oração, o que Deus quer nos ensinar em
“toda a Escritura” e em cada parte da Escritura.136
134 A lógica dirigida pelo espírito de submissão a Deus, sempre será útil; caso contrário, esqueçamo-la.
No entanto, devemos ter em que mente que “não podemos prender Deus na prisão da lógica humana”
(HOEKEMA, A. Salvos pela Graça. São Paulo: Cultura Cristã, 1997, p. 86).
135 Consultar referência.
136 Spurgeon (1834-1892) salientou: “Não se deve reter nenhuma doutrina. A doutrina retida, tão
detestável na boca dos jesuítas, não é nem um pouco menos abjeta quando adotada por protestantes”
(SPURGEON, C. H. Lições aos Meus Alunos. São Paulo: Publicações Evangélicas Selecionadas, 1982, v. 2,
p. 94). “O ensino saudável é a melhor proteção contra as heresias que assolam à direita e à esquerda entre
nós” (SPURGEON, C. H. Lições aos Meus Alunos. v. 2, p. 89).
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A teologia reformada sustenta que Deus pode ser conhecido, mas que
ao homem é impossível ter um exaustivo e perfeito conhecimento de
Deus (...). Ter esse conhecimento de Deus seria equivalente a compre-
endê-lo, e isso está completamente fora de questão “Finitum non possit
capere infinitum”.141
137 “...o Criador é incompreensível para as Suas criaturas. Um Deus que pudesse ser exaustivamente
compreendido por nós, cuja revelação sobre Si mesmo não nos apresentasse qualquer mistério, seria
um Deus segundo a imagem do homem e, portanto, um Deus imaginário, e nunca o Deus da Bíblia”
(PACKER, J. I. Evangelização e Soberania de Deus, p. 20).
138 Farley acentua com propriedade que “Um Deus que não fosse inefável, que fosse inteiramente
conhecido como um objeto, uma coisa ou um dado, não seria o Deus da Escritura” (FARLEY, B. W. A
Providência de Deus na Perspectiva Reformada: In: MCKIM, D. K. ed. Grandes Temas da Tradição
Reformada, São Paulo: Pendão Real, 1999, p. 74).
139 Consultar referência.
140 “Visto que somos seres finitos e não podemos enxergar o todo da realidade de uma vez, nossa
perspectiva da realidade é necessariamente limitada por nossa finitude” (GEISLER, N.; BOCCHINO, P.
Fundamentos Inabaláveis: resposta aos maiores questionamentos contemporâneos sobre a fé cristã, São
Paulo: Vida Nova, 2003, p. 50).
141 Do mesmo modo, enfatiza Schaeffer (1912-1984): “A comunicação entre Deus e o homem é verdadeira,
o que não significa que ela seja exaustiva. Esta é uma importante diferença e precisa sempre ser mantida
em mente. Para conhecer qualquer coisa que seja, de forma exaustiva, teríamos que ser infinitos, como
Deus é. Mesmo no céu não seremos assim” (SCHAEFFER, F. A. O Deus que Intervém, São Paulo: Cultura
Cristã, 2002, p. 151).
142 Consultar referência.
143 Consultar referência.
144 Consultar referência.
INTRODUÇÃO A TEOLOGIA
51
Muitas pessoas querem saber do seu futuro, o que as aguarda, se serão bem
sucedidas em seus projetos etc., buscando, para isso, orientação em cartas de
baralho, jogo de búzios, em mapas astrais, por meio da necromancia, revela-
ções sobrenaturais e “caixinhas de promessa”. Todavia Paulo está dizendo que
a Palavra de Deus é útil para o nosso ensino; não para fazer previsões ou para
ficar entregue aos nossos casuísmos interpretativos ou para satisfazer as nossas
curiosidades pecaminosas. Ela é útil para o ensino. Deus quer nos falar por inter-
médio da Sua Palavra. A questão é: queremos nós ouvi-lo? Estamos preparados
para isso? Temos priorizado em nossa vida o ouvir a voz de Deus? Como teólo-
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145 kubei/a (só ocorre aqui em todo o Novo Testamento), palavra que vem de ku/boj, astúcia, dolo,
que, passando pelo latim, cubus, chegou a nossa língua como cubos, dados. Significa a habilidade para
manipular os dados, usando de truques para iludir e persuadir. Paulo emprega a palavra figuradamente
para se referir ao homem que usa de todos os seus truques para enganar, dar pistas erradas e driblar;
revelando aqui a habilidade de um jogador profissional sem escrúpulos, que obviamente quer levar
vantagem a qualquer preço.
146 Consultar referência.
Pode soar estranho, mas, ao que parece, a gravidade do ensino bíblico juntamente
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com a seriedade de suas reivindicações fazem com que o homem não queira saber
dele, preferindo uma mensagem mais light, que, quando muito, mexa com seus
músculos, mas não com a sua mente e coração. Para muitas pessoas, a religião
ocupa um lugar reservado às crianças, às mulheres, aos pobres, aos velhos ou
quando a medicina confessa a sua impotência. Nessa brecha, a religião pode ter
alguma importância em que peço ou encomendo algumas orações. O homem
longe de Deus e avesso a Sua Palavra, quando possível, fabrica e molda seus mes-
tres e domestica os outros.
Na mesma linha de raciocínio, o escritor de Hebreus pede aos seus leitores
que suportem aquela exortação que fizera; em outras palavras, pede que suportem
a “sã doutrina”, “rogo-vos ainda, irmãos, que suporteis (a)ne/xomai) a presente
palavra de exortação; tanto mais quanto vos escrevi resumidamente” (Hb 13.22).
147 A ideia da palavra é de “oportunidade”, “tempo certo”, “tempo favorável” etc. (Veja: Mt 24.45; Mc 12.2;
Lc 20.10; Jo 7.6,8; At 24.25; Gl 6.10; Cl 4.5; Hb 11.15). Ela enfatiza mais o conteúdo do tempo. Esse termo,
que ocorre 85 vezes no NT, é mais comumente traduzido por “tempo”, surgindo, então, algumas variantes,
indicando a ideia de oportunidade. Assim temos (Almeida Revista e Atualizada): Tempo e tempos: Mt 8.29;
11.25; 12.1; 13.30; 14.1; Lc 21.24; At 3.20; 17.26; “Devidos tempos”: Mt 21.41; “Tempo determinado”: Ap 11.18;
“Momento oportuno”: Lc 4.13; “Tempo oportuno”: Hb 9.10; 1Pe 5.6; Oportunidade: Lc 19.44; Gl 6.10; Cl 4.5;
Hb 11.15; Devido tempo: Lc 20.10; Presente: Mc 10.30; Lc 18.30; “Circunstâncias oportunas”: 1Pe 1.11; Algum
tempo: Lc 8.13; Hora: Lc 8.13; 21.8; Época: Lc 12.56; At 1.7; 1Ts 5.1 (Xro/nwn kai\ tw=n kairw=n); 1Tm 6.15;
Hb 9.9; Ocasião: Lc 13.1; 2Ts 2.6; 1Pe 4.17; Estações: At 14.17; Vagar: At 24.25; Avançado: Hb 11.11.
148 A)ne/xomai aparece 15 vezes no Novo Testamento, sendo traduzida por: “Sofrer” (Mt 17.17 = Mc 9.19;
Lc 9.41); “atender” (At 18.14); “suportar” (1Co 4.12; 2Co 11.1; Ef 4.2; Cl 3.13; 2Ts 1.4; 2Tm 4.3; Hb 13.22);
“tolerar” (2Co 11.4,19,20). Na LXX este verbo não ocorre. No entanto a))ne/xw é empregada umas 11 vezes,
sendo traduzida por: conter (Is 42.14; 64.12); carregar (Is 46.4), deter (Is 63.15) e reter (Am 4.7; Ag 1.10).
Originalmente, a palavra estava associada à ideia de manter-se ereto, erguido; daí o sentido de suportar de
“cabeça erguida”.
149 “Se porventura desejarmos conservar a fé em sua integridade, temos de aprender com toda prudência a
refrear nossos sentidos para não nos entregarmos a invencionices estranhas. Pois assim que a pessoa passa a dar
atenção às fábulas, ela perde também a integridade de sua fé” (CALVINO, J. As Pastorais, (Tt 1.14), p. 320).
INTRODUÇÃO A TEOLOGIA
53
Por sua vez, não devemos “suportar” os falsos mestres com seus ensinos
enganosos. Paulo receia isso pelos coríntios. Logo eles que eram tão críticos em
relação a Paulo e tão tolerantes para com o ensino enganoso, que se constituía
em um “evangelho” estranho e oposto ao ensinado pelo Apóstolo. Notemos que
os falsos mestres não apresentavam uma imagem de Jesus corrompida, porém
tentavam distorcer os seus ensinamentos,
mas receio que, assim como a serpente enganou a Eva com a sua as-
túcia, assim também seja corrompida a vossa mente e se aparte da
simplicidade e pureza devidas a Cristo. Se, na verdade, vindo alguém,
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prega outro (a)/lloj) Jesus que não temos pregado, ou se aceitais espíri-
to diferente (e(/teroj) que não tendes recebido, ou evangelho diferente
(e(/teroj) que não tendes abraçado, a esse, de boa mente (kalw=j), o
tolerais (a)ne/xomai) (2Co 11.3-4).
Toda a Escritura é útil para o ensino. Queremos aprender com Deus? Desejamos
fazer a vontade de Deus? Estamos dispostos, de fato, a ouvir a Sua voz? Observe
bem, estamos dizendo a Sua voz; a voz de Deus, não a nossa. Se a sua resposta for
não, confesso não ter argumentos para convencê-lo da oportunidade que você está
deixando escapar, contudo o que posso reafirmar, é que Deus Se revelou na Sua
Palavra, para que possamos ser conduzidos a Cristo, aprendendo dEle a respeito de
Si mesmo, de nós e do significado de todas as coisas. Portanto, Ele deseja nos ensinar.
150 h)de/wj * Mc 6.20; 12.37; 2Co 11.19. A palavra é proveniente de h(donh/, “deleite”, “prazer” (*Lc 8.14; Tt
3.3; Tg 4.1,3; 2Pe 2.13). h(donh/, de onde vem o termo “hedonista”, é sempre usada negativamente no Novo
Testamento (Ver: BEYREUTHER, E. Desejo: In: BROWN, C. ed. ger. O Novo Dicionário Internacional
de Teologia do Novo Testamento. São Paulo: Vida Nova, 1981-1983, v. 1, p. 606-608; In: STÄHLIN, G.
h)donh/: In: KITTEL, G.; FRIEDRICH, G. eds. Theological Dictionary of the New Testament, Grand
Rapids, Michigan: Eerdmans, 1983, v. 2, p. 909-926).
A teologia deve estar sempre a esse serviço aprender e ensinar. A teologia não é
algo acabado e feito, ela está sempre a caminho, buscando uma compreensão mais
exaustiva e fiel da Revelação. Quanto aos teólogos, enquanto não aprendermos a
aprender, não poderemos ser teólogos! O teólogo tem paixão por ensinar, mas a
sua paixão primeira e prioritária deve ser a de ouvir a voz de Deus nas Escrituras.
Nenhum homem será sempre um bom mestre se não revelar-se pes-
soalmente educável e sempre disposto a aprender; e ninguém satisfará
àquele que se acha por demais imbuído da plenitude e lucidez de seu
conhecimento, que crê que nada lucraria ouvindo a outrem.151
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
Outro ponto que devemos destacar é que, à Igreja, cabe a responsabilidade de
propagar o Evangelho e defendê-lo contra as heresias e a imoralidade. Uma visão
defeituosa da doutrina bíblica levará necessariamente a equívocos na estrutura
e ensino da Igreja bem como no seu aspecto ético. O cristianismo não é ape-
nas um ensino moral,152 todavia tem implicações naquilo que cremos, na forma
como encaramos a realidade e, consequentemente, nos nossos valores morais.
“Uma religião sem doutrina seria uma religião sem significado. E tal religião não
poderia ser propagada nem defendida”.153 Toda doutrina ensinada nas Escrituras
tem relação com outras doutrinas, e essas têm implicações direta com a nossa
ética. Por isso, cada doutrina deve ser vista dentro de uma perspectiva abran-
gente das Escrituras e, ao mesmo tempo, deve vir acompanhada da questão
pessoal e intransferível – e, por isso mesmo, de extrema relevância o que devo
fazer? A genuína teologia conduz à piedade. A Teologia Sistemática, partindo
da Palavra, esforça-se por elaborar um sistema doutrinário que reflita a própria
organicidade das Escrituras, apresentando-o de forma coerente e organizado,
proporcionando elementos para o ensino do Evangelho e a defesa da Fé (Fp
1.7,16; 2.16; 2Tm 2.15/1Pe 3.15).
A Igreja é uma comunidade constituída por todos aqueles que, pelo dom
da fé, atenderam ao convite gracioso de Deus feito por intermédio da Palavra.
INTRODUÇÃO A TEOLOGIA
55
e) Fé salvadora
A revelação é o outro lado da fé. Esta como resultado daquela – por obra do
Espírito –, precisa ser articulada como exercício reflexivo de sua percepção. A
teologia é a articulação sistematizada da fé enquanto conhecimento da Revelação
de Deus. Isto significa que a genuína teologia derivada das Escrituras, só pode ser
formulada por homens crentes, homens falhos e pecadores, contudo, que foram
regenerados por Deus (Tt 3.5/Rm 6.14; 1Jo 1.8). A academia sem a fé não ela-
bora teologia! A teologia brota dentro da intimidade da fé.
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
fessionais,156 as obras de Teologia Sistemática sempre refletirão o pensamento de
uma comunidade confessional. No entanto a nossa atitude deve ser caracterizada
por uma tentativa de compreensão de cada sistema, ainda que não concordemos
com ele. A Teologia Sistemática busca um entendimento mais profundo de todo
o desígnio de Deus revelado, portanto, ela se vale de todos os recursos legítimos
para uma melhor compreensão da Revelação. Desse modo, a Teologia não pode ser
simplesmente uma apologia da fé, mas sim uma compreensão da Palavra de Deus
dentro de um quadro de referência que se julga proveniente da mesma Escritura.
O luterano Gustaf Aulén (1879-1978) observa que, a teologia sistemática só
pode ser confessional na medida em que o elemento também confessional contri-
bui para a compreensão e percepção do que é essencialmente cristão (...). No que
tange ao confessionalismo, portanto, o trabalho da teologia sistemática envolve
contínuo auto-exame, algo muito diverso de toda autossuficiência confessional
ingênua. A teologia não busca expressões denominacionais do cristianismo, mas
sim o próprio cristianismo autêntico; não reconhece expressões denominacio-
nais, a não ser que estas deem provas de serem genuinamente cristãs.157
Nessa observação, deve ser ressaltada que a expressão “denominacional do
cristianismo”, na verdade, nada mais é do que o resultado da convicção de que
aquela proposição tornou-se denominacional, por ser bíblica, não o inverso.
Notemos que não estamos dizendo que toda proposição de um sistema teológico
seja bíblica, mas sim que toda proposição pressupõe ser genuinamente bíblica,
portanto, a sua formulação e ensino.
INTRODUÇÃO A TEOLOGIA
57
Paul Tillich (1886-1965), ainda que não seguindo uma linha teológica evan-
gélica, caracteriza bem a questão da teologia, ao falar da sua tarefa:
A tarefa da teologia é mediação, mediação entre o critério eterno da
verdade manifesto na figura de Jesus, o Cristo, e as experiências mu-
táveis dos indivíduos e dos grupos, suas variadas questões e suas cate-
gorias de percepção da realidade. Quando se rejeita a tarefa mediadora
da teologia, rejeita-se a própria teologia; pois o termo ‘teo-logia’ pres-
supõe, em si, uma mediação, a saber, entre o mistério, que é theos, e a
compreensão, que é logos (TILLICH, 1992, p. 15).158
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
matizada da Palavra de Deus. A sua fidedignidade estará sempre no mesmo
nível da sua fidelidade à Escritura.160 A teologia como ciência não cria fatos.161
A relevância de nossa formulação não dependerá de sua “beleza”, “populari-
dade” ou “significado para o homem moderno”, mas sim na sua conformação às
Escrituras. O mérito de toda teologia está no seu apego incondicional e irrestrito
à Revelação; a melhor interpretação é a que expressa o sentido do texto à luz de
toda a Escritura,162 ou seja, em conexão com toda a verdade revelada. Nada há
mais edificante e prático do que a Verdade de Deus!163
158 Notemos que “as experiências mutáveis dos indivíduos e dos grupos” não se constituem no nosso ponto
de partida teológico, antes, são desafios para os quais o teólogo deve buscar nas Escrituras a resposta.
159 O conceito da “Teologia” como “reflexão” é comum entre teólogos, mesmo de quadro de referência
diferentes. O teólogo católico alemão Heinrich Fries (1911-1998), define a teologia como “scientia fidei”
(“ciência da fé”) e “reflexão sistemática sobre a revelação” (FRIES, H. Teologia: In: FRIES, H. ed. Dicionário
de Teologia, v. 5, p. 300,302). O presbiteriano John H. Leith conceitua: “Teologia cristã é reflexão crítica
sobre Deus, sobre a existência humana, sobre a natureza do universo e sobre a própria fé à luz da revelação
de Deus registradas nas Escrituras e, especialmente, personificada em Jesus Cristo, que é, para a comunidade
cristã, a revelação final, isto é, a revelação definitiva, o critério para todas as outras revelações” (LEITH, J. H.
A Tradição Reformada: uma maneira de ser a comunidade cristã, p. 140).
160 Calvino dedicou o seu Comentário de Romanos (1539) a Simon Grynaeus (1493-1540), com quem
discutira alguns anos antes sobre a melhor maneira de interpretar as Escrituras. Segundo Calvino, ambos
concluíram que “a lúcida brevidade (“perspicua brevitas”) constituía a peculiar virtude de um bom intérprete.
Visto que quase a única tarefa do intérprete é penetrar fundo a mente do escritor a quem deseja interpretar,
o mesmo erra seu alvo, ou, no mínimo, ultrapassa seus limites, se leva seus leitores para além do significado
original do autor” (CALVINO, J. Exposição de Romanos, Dedicatória, p. 19). Anos mais tarde (1546),
escreveria: “... não aprecio as interpretações que são mais engenhosas do que sadias” (CALVINO, J. Exposição
de 1 Coríntios, (1Co 15.29), p. 472. Veja: também: CALVINO, J., Exposição de Romanos, (Rm 10.18), p. 376;
CALVINO, J. Gálatas, São Paulo: Paracletos, 1998, (Gl 4.22-25), p. 138-144).
161 Consultar referência.
162 “Quão importante é dar-nos conta do perigo de começar com uma teoria e impô-la às Escrituras! (...).
Temos que ser cuidadosos quando estudamos as Escrituras para não suceder que elaboremos um sistema
de doutrina baseado num texto ou numa compreensão errônea de um texto” (D. Martyn Lloyd-Jones, As
Insondáveis Riquezas de Cristo, p. 43). Damião Berge, um estudioso de Heráclito, descreveu a função do
intérprete, que, pode nos ser útil aqui. Diz o autor: “Interpretar é apreender o sentido depositado nas palavras
do autor; é retirá-lo de sua reclusão e pô-lo, gradativamente, ao alcance do leitor, processo esse que, em geral,
culmina num ensaio de tradução tão verbal como acessível” (Berge, D. O Logos Heraclítico: Introdução ao
Estudo dos Fragmentos, Rio de Janeiro: Instituto Nacional do Livro, 1969, p. 63).
163 Stott coloca a questão nestes termos: “...nada coloca o coração em fogo como a verdade” (STOTT, J. R. W.
Cristianismo Equilibrado, Rio de Janeiro: CPAD., 1982, p. 62).
INTRODUÇÃO A TEOLOGIA
59
Com isso, ela confessa a sua limitação. A ciência reflete o grau de apreensão de sua
época, envolvendo seus pressupostos e instrumentos disponíveis. A teologia, por-
tanto, permanece sempre aberta às Escrituras para um conhecimento mais completo
da Revelação de Deus. Aliás, uma teologia que se fechasse para as Escrituras dei-
xaria de ser teologia, ficaria necrosada, morreria. Portanto, o que permanece para
nós, constituindo-se no critério último, é “O Espírito Santo falando na Escritura”.168
O teólogo Reformado Geerhardus Vos (1862-1949), assim conceitua: “toda
genuína Teologia Cristã é necessariamente Teologia Bíblica porque aparte da
Revelação Geral, a Escritura constitui o único material com o qual a ciência Teológica
pode tratar”.169
164 Michel, O. escreveu: “toda teologia genuína é a batalha contra o teologismo, a teorização, e contra a
tentativa de substituir o motivo genuinamente bíblico e histórico por uma transformação filosófica (...).
Atualmente desejamos cada vez mais ouvir a nós mesmos, enquanto a Bíblia nos convidaria a ouvir a
palavra pura” (apud BLAUW, J. A Natureza Missionária da Igreja, São Paulo: ASTE., 1966, p. 105).
165 Corretamente declarou Lloyd-Jones (1899-1981): “O Espírito Santo é o poder atuante na Igreja, e o
Espírito Santo jamais honrará coisa alguma senão a Sua Palavra. Foi o Espírito Santo quem nos deu esta
Palavra. Ele é o seu Autor. Não é dos homens! Tampouco a Bíblia é produto da ‘carne’ e do ‘sangue’ (...). O
Espírito não honrará nada, senão Sua Palavra. Portanto, se não crermos e não aceitarmos sua Palavra, ou se
de algum modo nos desviarmos dela, não teremos direito de esperar a bênção do Espírito Santo. O Espírito
Santo honrará a verdade, e não honrará outra coisa. Seja o que for que fizermos, se não honrarmos esta
verdade, Ele não nos honrará” (Lloyd-Jones, D. M. O Combate Cristão, p. 103).
166 Após redigir essas linhas, li o teólogo batista, Erickson, dizendo que a teologia sistemática não é baseada sobre
a teologia bíblica; ela é teologia bíblica. “Nosso objetivo é uma teologia bíblica sistemática”; é ter uma teologia
bíblica “pura” (Erickson, M. J. Christian Theology, 8. ed. Grand Rapids, Michigan: Baker, 1991, p. 25).
167 Harrison acentuou que, “a importância da Reforma para a crítica bíblica, não esteve tanto na preocupação
com os processos históricos ou literários envolvidos na formulação do cânon bíblico, senão em sua insistência
contínua na primazia do singelo sentido gramatical do texto por direito próprio, independente de toda
interpretação feita pela autoridade eclesiástica” (Harrison, R. K. Introduccion al Antiguo Testamento,
Jenison, Michigan: T.E.L.L., 1990, v. 1, p. 7-8).
168 Confissão de Westminster, I.10.
169 VOS, G. Biblical Theology: Old and New Testament, Grand Rapids, Michigan: WM. B. Eerdmans
Publishing Co., 1985 (reprinted), “Preface”, p. v. Lloyd-Jones (1889-1981), nos adverte quanto ao perigo de
transformarmos a teologia em algo etéreo: “O grande perigo é tornar a teologia um tema abstrato, teórico,
acadêmico. Ela jamais poderá ser isso, porque é conhecimento de Deus” (LLOYD-JONES, D. M. Uma
Escola Protestante Evangélica In: Discernindo os Tempos, p. 389).
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
ouvido, senão confirmar as consciências ensinando a verdade e o que é certo e
proveitoso”.170 Por isso, o fim da teologia não pode ser simplesmente o de dizer
coisas agradáveis aos homens, mas sim o de anunciar toda a verdade de Deus
revelada, conforme nos foi dado conhecer, reconhecendo, nessa formulação e
proclamação, o aspecto divino e o humano da teologia.
“Não creias que te baste a leitura sem a unção, a especulação sem a devoção,
a investigação sem a admiração, a atenção sem a alegria, a atividade sem a
piedade, a ciência sem a caridade, a inteligência sem a humildade, estudo
sem a graça divina, a pesquisa sem a sabedoria que vem de Deus.”
Fonte: Boaventura (OT 16, n. 32, p. 139).
INTRODUÇÃO A TEOLOGIA
61
CONSIDERAÇÕES FINAIS
do revelado para a sua reflexão, ensino e prática. Ela não é necessariamente ver-
dadeira, entretanto faz parte da sua essência a busca sistemática da verdade, do
conhecimento tal qual nos foi dado na Escritura.
Finalmente, na ótica da teologia cristã reformada, aprendemos a necessi-
dade e tarefa natural da inteligência humana e a relação sistematizada da verdade
como elemento norteador e desenvolvedor da piedade.
Considerações Finais
1. Retomando a definição de teologia como sendo o estudo da Revelação Pessoal
de Deus, conforme registrada nas Escrituras Sagradas, em forma de esboço, des-
creva, de acordo com a unidade estudada, como podemos indicar os pressupos-
tos da teologia cristã.
63
Dirijo-me a você, caro jovem, você que está começando o estudo da teologia. Para mim,
você representa a teologia do futuro, de modo que, dirigindo-me a você, é como se eu
falasse ao teólogo do III Milénio, que está às portas. Quero dirigir-me também a quem,
mesmo não sendo jovem de idade, se interessa pelas coisas da fé, ainda que de modo
informal.
Permita-me apresentar-lhe aqui uma espécie de decálogo. São dez leis para estudar
bem teologia. “Leis” talvez seja uma palavra forte demais. Falemos então em “conselhos”.
Premissa: “Teologizar é preciso…”
Antes de começar, quero que você esteja bem convencido da importância e mesmo da
necessidade de estudar teologia. Enfatizar que vale a pena gastar os dias a aprofundar
o mistério de Deus, o que não deixa, aliás, de redundar em benefício próprio e de todo
o povo.
É a muitos títulos que a teologia é necessária. Vejo pelo menos cinco instâncias dife-
rentes que solicitam o estudo da teologia: a fé, o mundo, a vida, a época de hoje e a
realidade social.
1. A fé pede teologia. É, em primeiro lugar, a própria fé que, por sua dinâmica interna,
busca compreender o que crê. Todo “crente” verdadeiro é também, e a seu modo,
um “teólogo”. Pois, a teologia é precisamente “a fé que deseja entender”, como a de-
finiu magistralmente Sto. Anselmo. Sem o estudo, a fé facilmente cai na cegueira do
irracionalismo e da superstição, ou na miopia da superficialidade e do sincretismo.
2. O mundo que existe pede teologia. A própria criação é um grito inarticulado por
um Criador. A teologia nada mais faz senão recolher esse grito e articulá-lo racional-
mente. E se você incluir na ideia de mundo o curso histórico, inclusive os eventos
da Revelação, então a razão é interpelada no máximo de sua potência. Ela, que se
interroga sobre tudo, não pode se esquivar de perguntas como: Que querem nos
dizer os “enviados de Deus”, especialmente Jesus de Nazaré?
3. A vida pede teologia. Nós, os viventes, buscamos inelutavelmente o sentido último e
radical das coisas. Por que a existência, a dor, a culpa, a morte? Como responder ade-
quadamente a essas questões fundamentais e perenes sem recorrer a alguma teologia?
4. Nossa época pede teologia. A cultura moderna é essencialmente reflexiva: não
se contenta apenas com o recurso à tradição, mas pergunta sempre pelo porquê
de tudo. Mesmo a chamada razão pós-modema, embora prefira o “discurso fraco”,
ela também precisa ser submetida a discernimento. Mais: as questões atuais com
que a fé se vê confrontada são tão complexas que exigem reflexão elaborara da e
rigorosa. Pense somente nas questões que põe hoje a economia (neoliberalismo,
mercado, globalização, tecnologia, etc.); ou as que colocam as ciências modernas,
como a biologia (clonagem, inseminação e gestação humanas em meios artificiais),
a cosmologia (origem e fim do cosmos, leis constitutivas do universo, a hipótese de
outros mundos habitados, etc.), a ecologia e poderíamos continuar.
5. A realidade social em que vivemos pede teologia. Qual é a missão dos cristãos fren-
te aos grandes desafios sociais de hoje? Para confrontar seriamente a fé com esses
desafios é preciso botar a razão teológica para funcionar. Sobretudo nós, no Sul do
mundo, queremos saber como a fé pode ser fermento de libertação para a massa
de excluídos do sistema social. Agora, se você incluir na realidade social a cultura,
então surgem outras perguntas, tipicamente teológicas, como: Que sinais de Deus
estão presentes nessa ou naquela cultura? Como inculturar aí as linguagens e as
práticas cristãs?
1. Bem, meu caro amigo, parece-me que ficou claro porque é necessário e mesmo
urgente fazer hoje teologia. Escute agora como proceder no estudo dessa ciên-
cia. Passo agora aos dez conselhos de que falei acima.
2. Antes de falar de Deus, ponha-se de joelhos e fale com Deus.
3. Nunca perca de vista o tema central da teologia: o mistério de Deus.
4. Seja a Sagrada Escritura o principal texto de referência de sua teologia.
5. Sua teologia deve permanecer vitalmente ligada à Comunidade de Fé: a Igreja.
6. Mantenha sempre viva a consciência da pobreza da linguagem humana frente
ao Mistério.
7. Tenha paixão pelo conhecimento de Deus e das coisas de Deus.
8. Faça uma teologia que esteja a serviço do Povo de Deus.
9. Que sua teologia leve sempre em conta a realidade do povo.
10. Não esqueça de desdobrar a dimensão sócio-libertadora da fé.
11. Faça teologia com o ouvido aberto a quem sofre.
Fonte: Boff (1999, p. 78s).
MATERIAL COMPLEMENTAR
Antologia Teológica
Ferreira, Julio Andrade (org.)
Editora: Novo Século - Ed. Cristã
Sinopse: O Brasil, por um bom tempo, ficou carente de obras na
área acadêmica da teologia, pois muitos textos de grandes autores
ainda não foram publicados em nossa terra. O renomado professor
Júlio Andrade Ferreira oferece uma coletânea de textos dos maiores
teólogos do século XX, acerca dos principais temas doutrinários. A
longa experiência acadêmica do organizador dessa publicação
garante uma apresentação didática, que conduz, com segurança,
o leitor em meio às discussões mais intrincadas.
Comentário: Esta Antologia é uma grande ajuda para estudantes de teologia de todas as idades. Ela
contém seleções de alguns dos maiores nomes da teologia, tratando de cada assunto doutrinário.
Este material foi selecionado e organizado didaticamente pelo professor de teologia brasileira Júlio
de Andrade Ferreira.
Lutero
Após quase ser atingido por um raio, Martim Lutero (Joseph
Fiennes) acredita ter recebido um chamado. Ele se junta ao
monastério, mas logo fica atormentado com as práticas adotadas
pela Igreja Católica na época. Após pregar em uma igreja suas
95 teses, Lutero passa a ser perseguido. Pressionado para que
se redima publicamente, Lutero se recusa a negar suas teses
e desafia a Igreja Católica a provar que elas estejam erradas e
contradigam o que prega a Bíblia. Excomungado, Lutero foge e
inicia sua batalha para mostrar que seus ideais estão corretos e
que eles permitem o acesso de todas as pessoas a Deus.
Comentário: Esse filme, financiado pela Thrivent Financial for
Lutherans, uma organização sem fins lucrativos que busca apoiar
iniciativas que promovam o Luteranismo, retrata, de maneira
romanceada, a trajetória de Martim Lutero, o grande inspirador da
reforma protestante que ocorreu no século XVI. Lutero sempre alimentou o desejo de ser padre e
se tornou doutor em teologia, mas a sua profunda religiosidade tomou caminhos revolucionários
que confrontaram diretamente a Igreja Romana, então, o poder absoluto daquela época.
Material Complementar
Professor Dr. Hermisten Maia Pereira Da Costa
Professor Me. Roney De Carvalho Luiz
II
UNIDADE
O DEUS QUE SE REVELA
Objetivos de Aprendizagem
■■ Compreender que Deus se revela de maneira especial através de Sua
Palavra.
■■ Entender o conceito de Inspiração e o valor da tradição.
■■ Estabelecer a importância de conhecer os principais catecismos
protestantes.
Plano de Estudo
A seguir, apresentam-se os tópicos que você estudará nesta unidade:
■■ Deus como Autor de todo conhecimento
■■ A criação como Revelação de Deus
■■ A fé como conhecimento
■■ A necessidade das Escrituras
■■ As Escrituras, os Credos e a Reforma Protestante
69
INTRODUÇÃO
o universo, estabelecendo suas leis próprias e avaliando a Sua criação como boa.
Moisés apenas apresenta o Deus Todo-Poderoso exercitando o Seu poder de
forma criadora, segundo o Seu eterno propósito. Deus existe; este é o fato pres-
suposto em toda a narrativa da Criação. Deus cria segundo a Sua Palavra, e isso
nos enche de admiração e reverente temor: a Palavra de Deus é o verbo criador
que manifesta a determinação e o poder de Deus (Gn 1.1,26,27; Sl 33.6,9; Jo 1.1-
3; Hb 11.3), o Qual criou as coisas com sabedoria (Pv 3.19).
Nesta unidade de estudo, propomos o pensar sobre essas características
da revelação, inspiração e iluminação para se conhecer a Deus, perpassando, a
seguir, com os principais catecismos da tradição cristã protestante.
Introdução
II
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
é proveniente de Deus, porque “todas as coisas procedem de Deus”,172 assim, não
pode haver contradição em Deus mesmo; 3) A ciência e a fé não se contradizem,
o mesmo doador da fé (Ef 2.8) é o criador das verdades científicas, logo, quando
ambas parecem contraditórias, é porque ou há uma compreensão errada da fé, ou
a ciência não é ciência, está laborando em erro. Por isso, é preciso que haja humil-
dade de ambas as partes: do teólogo na interpretação da Palavra de Deus, sempre
em submissão ao Espírito de Deus, sem cair em um dogmatismo ingênuo, nem
em um relativismo dogmático, que corre sempre atrás dos modismos científicos e
filosóficos para adaptar a Teologia. É preciso que nós, teólogos, entendamos que
trabalhar com a teologia não significa dizer sempre coisas novas; embora reconhe-
çamos “as situações novas que ameaçam a salvação dos homens”173 para as quais
devemos buscar na Palavra a resposta. Por outro lado, precisamos entender que
a Palavra de Deus é mais rica do que qualquer dogma, portanto, o nosso sistema
doutrinário, por melhor que seja – e eu estou convencido de que é –, não pode ser
mais rico do que a Palavra de Deus, como bem observou Berkouwer (1903-1996):
“porventura a Escritura não é mais rica do que qualquer pronunciamento eclesiás-
tico, por mais excelente e atento ao Verbo divino que este possa ser?”.174 Por isso, o
critério último de análise, será sempre “O Espírito Santo falando na Escritura”.175
O teólogo sabe que a Teologia é uma busca humana por compreender e sistema-
tizar a revelação; e como humanos que somos, podemos nos enganar. A teologia,
portanto, está, de certa forma, sempre a caminho, em busca de uma compreen-
são mais exaustiva das Escrituras. Entretanto, como em todas as demais ciências,
nós Reformados, temos nossos pressupostos; o nosso é que a Bíblia é o regis-
tro inspirado e inerrante da Palavra de Deus. Disso não abrimos mão. Estamos
convencidos que uma visão relapsa da Palavra determina o fracasso teológico e
espiritual da Igreja.
A História, a Natureza e o homem, como parte dessa, refletem algo do Seu Criador;
“o homem, por haver sido criado à imagem de Deus, nos revela muito sobre o ser
do Criador”178 (Sl 139.14). Por isso, os homens são indesculpáveis (Rm 1.19,20).
Deus expressa o Seu pensamento e a Sua vontade no mundo, na Criação,
envolvendo o homem com a manifestação visível da Sua glória, a qual é pro-
clamada, apesar do pecado, de forma facunda nas obras da Criação (Sl 19.1; At
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
14.17; Rm 1.19,20). Calvino (1509-1564) acentua que,
a aparência do céu e da terra compele até mesmo os ímpios a reconhe-
cerem que algum criador existe (...). Certamente que a religião nem
sempre teria florescido entre todos os povos, se porventura as mentes
humanas não se persuadissem de que Deus é o Criador do mundo.179
Deus, o mundo e o homem são as três realidades com as quais toda a ciência
e toda filosofia se ocupam.180 Pois bem, se Deus não tivesse primeiramente, de
forma livre e soberana Se revelado (Sl 115.3; Rm 11.33-36) – concedendo, ao
homem, o universo como meio externo de conhecimento, o qual funciona com
as suas leis próprias e regulares –, toda e qualquer ciência seria impossível. O
mundo, inclusive o homem, é o grande laboratório de todas as ciências. Só que
quem “construiu” esse laboratório foi Deus, deixando, ao homem, a responsa-
bilidade de estudá-lo, descobrindo os “enigmas” que estão por trás das leis que
funcionam de acordo com as prescrições do Seu Criador. Não pensemos, con-
tudo, que Deus criou o mundo apenas para satisfazer a curiosidade humana;
Deus o fez como testemunho da Sua glória: “a grande finalidade da criação foi
a manifestação da glória de Deus”181. Deus, ainda hoje, não deixou de dar tes-
temunho da Sua existência e bondoso cuidado para com o homem (At 14.17).
Deus está ativo, preservando a Sua criação para o fim proposto por Ele mesmo.
“Deus não é mero espectador do universo que Ele criou; Ele está presente e ativo
em todas as partes, como o fundamento que sustenta tudo e o poder que governa
tudo o que existe.”182 A Bíblia atesta esse fato amplamente. (Vd. Ne 9.6; At 17.28;
Ef 4.6; Cl 1.17; Hb 1.3).183 Deus faz todas as coisas “conforme o conselho da Sua
vontade” (Ef 1.11/Sl 115.3).
O homem natural pode não saber disso, pode não aceitar e até combater tal
“absurdo”, entretanto o que o homem pode fazer contra a verdade? (2Co 13.8).
O que são os argumentos que tentam negar a existência de Deus, senão fruto de
uma falsa interpretação da Revelação Geral de Deus? Calvino (1509-1564), dis-
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
Sem a ação primeira de Deus, não haveria ciência. Graças a Deus porque
Ele registrou de forma mui santa e sábia as Suas leis (físicas, químicas, termo-
dinâmicas, etc.) “no grande livro do mundo”.189 É preciso, porém, que não nos
detenhamos apenas aí, para que não fiquemos com a menor parte, pois o que disse
Blaise Pascal (1623-1662), apesar do exagero de ênfase, tem o seu lugar: “o Deus
dos cristãos não consiste num Deus simplesmente autor de verdades geométri-
cas e da ordem dos elementos; essa é a porção dos pagãos e dos epicuristas.”190
Dentro de tudo o que foi colocado, surge, de forma natural, a pergunta: e o
homem pode entender essa revelação? Pode o homem, como intérprete que é,
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
reconhecer a mensagem unívoca do grande “locutor”, que é Deus? Creio que a
Ciência, nos seus avanços e retrocessos – diferentemente da concepção de Comte
a respeito da ciência –, com conexões aqui e ali, tem respondido a essas ques-
tões. Passemos, agora, à resposta formal dessas indagações.
Partindo do princípio de que a Revelação de Deus tem por objetivo mostrar o Seu
Autor: Deus é o substantivo da Sua Revelação. Não teria nenhum valor a Revelação
objetiva de Deus se não houvesse concomitantemente uma potencialidade de
recepção subjetiva para ela, pois, assim, seria uma revelação que não se desco-
briria, não se tornaria acessível. Seria o equivalente a um intérprete verter para o
inglês as palavras de um orador alemão para um auditório que só entende o por-
tuguês. Perguntaríamos: o interprete traduziu o que o orador disse? Responderia
o interlocutor: Sim. Voltaríamos à questão: então, ele revelou o conteúdo da men-
sagem? A resposta seria óbvia: não. Ele traduziu, mas ninguém o entendeu, pois o
seu idioma não é o nosso nem temos condições de aprendê-lo agora.
O conhecimento que Deus deseja que tenhamos Dele está revelado nas Escrituras.
Como já vimos, originalmente, Deus se revelou na Criação, no Éden só havia um
livro: o livro da Natureza (Gn 3.17-19), e, como parte do castigo pelo pecado, o
homem perdeu o discernimento espiritual para poder ver a glória de Deus mani-
festa na criação (Sl 19.1; Rm 1.18-23). A Revelação Geral que fora adequada para
as necessidades do homem no Éden – embora saibamos que ali também se deu a
Revelação Especial (Gn 2.15-17,19,22; 3.8ss) –, tornou-se, agora, incompleta e ine-
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
ficiente para conduzir o homem a um relacionamento pessoal e consciente com
Deus. A observação de Calvino (1509-1564) parece-nos importante aqui: “nossa
ruína se deve imputar à depravação de nossa natureza... em sua condição original,
para que não lancemos a acusação contra o próprio Deus, autor dessa natureza.”191
A Bíblia ou Revelação Especial tornou-se necessária por causa do pecado.
Por meio da História, Deus separou e preparou homens para que registrassem
de forma exata e infalível os Seus desígnios, sendo a Palavra de Deus escrita,
dentre outras coisas, “o corretivo às ideias disformes que pode dar-nos a natu-
reza em seu estado caído.”192 Por isso, só se considera adequada a revelação de
Deus contida na Bíblia, somente por meio das Escrituras o homem pode ter um
conhecimento de Deus livre de superstições.193
A constatação da Revelação de Deus gera em nós dois sentimentos: humil-
dade e alegria. Humildade por sabermos que tudo o que temos e sabemos provém
de Deus (Jo 15.5; 1Co 4.7; 2Co 3.5). Alegria, por ter acesso à Revelação de Deus
que é a verdade. Tais sentimentos, acompanhados do estudo da Palavra, devem
conduzir-nos à adoração (Mt 4.10; Hb 13.15; 1Pe 2.9). A Bíblia foi-nos confiada
a fim de que, mediante a iluminação do Espírito Santo, sejamos conduzidos a
Jesus Cristo (Jo 5.39/Lc 24.27,44), sendo Ele mesmo Quem nos leva ao Pai (Jo
14.6-15; 1Tm 2.5; 1Pe 3.18) e nos dá vida abundante (Jo 10.10; Cl 3.4). A Bíblia
foi registrada para que cumpramos os seus preceitos, dados pelo próprio Deus
(Dt 29.29; Js 1.8; 2Tm 3.15, 16; Tg 1.22); ela foi-nos concedida para que conhe-
çamos o Seu Autor e, conhecendo-O, O adoremos, e, adorando-O, mais O
conheçamos (Os 6.3; 2Pe 3.18).194 A revelação nos foi dada com esse propósito
e devemos usá-la com essa finalidade”.195
A Igreja, como resultado da ação de Deus por meio da Palavra, manifesta tais
comportamentos, tendo ciência de que a meditação que faz na Palavra, guiada
pelo Espírito, é uma tentativa de interpretá-la, a fim de proclamar e ensinar em
uma linguagem humana196 a verdade que ela tem recebido pela graça de Deus.
“A verdade é idêntica à graça” (Jo 1.17).197
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
Por outro lado, Kuyper (1837-1920)198 nos chama a atenção para o fato de
que não devemos considerar a Revelação Especial ou a Escritura como fonte da
Teologia (“fons theologiae”), tendo em vista que o termo “fonte” no estudo cien-
tífico tem um significado mui definido. Em geral, denota uma área de estudo
sobre a qual, o homem, como agente ativo, faz uma triagem para a sua pesquisa,
como na Botânica, Zoologia e História. Nesse caso, o objeto de estudo é pas-
sivo; o homem é quem é ativo, debruçando-se sobre o fenômeno para extrair do
objeto o conhecimento desejado. Assim sendo, usando o termo nesse sentido,
tem-se a impressão, de que o homem, como agente ativo, pode se colocar sobre
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
as Escrituras, para descobrir ou tirar dela o conhecimento de Deus, que ali está
passivamente esperando o seu descobridor. Sabemos que isso não é verdade.
Deus se revela ao homem e, mais uma vez, ativamente fornece os meios para a
compreensão dessa revelação: o Espírito Santo. A Teologia, como vimos, é sem-
pre o efeito da ação reveladora, inspiradora e iluminadora de Deus por meio do
Espírito. Por isso, falar de Teologia Americana, Européia ou da América Latina
se constitui, no mínimo, em uma ignorância bíblica: ou a Teologia é Bíblica ou
não é Teologia; surja em que continente for, em que movimento for, em que
regime político for. Brunner (1889-1966) corretamente enfatiza: “a dogmática
que está sob uma obrigação apenas para com a Verdade deve se proteger contra
todo regionalismo nacional ou continental, pelo qual o ponto de vista Europeu,
o Inglês ou o Americano seria mais importante do que é na verdade.”199 Deus
não se deixa invadir pela razão humana ou mesmo pela fé. Ele se dá a conhe-
cer livre, fidedigna e explicitamente; Deus se revela a Si mesmo como Senhor e
“Senhorio significa liberdade”.200 “Quanto mais conhecemos Deus, mais compre-
endemos e sentimos que Seu ministério é inescrutável”201 A “douta ignorância”
faz parte essencial da genuína teologia bíblica. O conhecimento de nossa limi-
tação não é inato, antes, é precedido pela revelação. Sem a revelação de Deus,
não há teísmo, ateísmo nem agnosticismo. É no encontro com Deus que toma-
mos conhecimento de nossas limitações.
Filho, temos a revelação última de Deus. Da mesma forma como é verdade que
quem viu o Filho viu o Pai, também é verdade que quem não viu o Filho, não
viu o Pai.”202 Jesus Cristo é a medida da revelação.
A Teologia Reformada reconhece a centralidade real de Deus em todas as
coisas, tendo como alvo principal, não o tão decantado bem-estar humano – que
por certo tem a sua relevância –, mas a glória de Deus, sabendo que as demais
coisas serão acrescentadas (Mt 6.33; Ef 1.11-12). Infelizmente, ao longo da his-
tória, as “teologias” que deveriam ser relativas à Revelação, têm sido relativas
ao homem, tornando-se assim, antropologias.203 O Iluminismo, que gerou o
“Liberalismo Teológico”, – e esse pode ser definido como o esforço de interpre-
tar, reformular e explicar a fé cristã dentro de uma perspectiva iluminista –, foi
o grande fomentador desta nova abordagem. Dentro dessa perspectiva, só pode
ser considerado genuíno o “credo” que se ajuste aos critérios racionais vigentes.204
Para os reformados, entretanto, é a Palavra de Deus que deve dirigir toda a
abordagem e interpretação teológica, bem como de toda a realidade: O Espírito
através da Palavra é Quem deve guiar à correta interpretação da Revelação. Na
Escritura tem-se o padrão e apelo final.
A FÉ COMO CONHECIMENTO
A razão, mesmo estigmatizada pelo pecado, que se mostra tão eficaz nas coi-
sas naturais, perde-se diante do mistério de Deus revelado em Cristo e também
diante da Revelação geral na Natureza: “as mentes humanas são cegas a essa luz,
a qual resplandece em todas as coisas criadas, até que sejam iluminadas pelo
Espírito de Deus e comecem a compreender, pela fé, que jamais poderão enten-
dê-lo de outra forma.”205 A graça, portanto, antecede à fé e ao conhecimento.
A graça de Deus é eminentemente socializante, isso porque não há um
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homem sequer que dela não necessite e, mesmo sem saber, dela não participe.
Todos, sem exceção, somos devedores à graça de Deus – aquele favor imere-
cido da parte de Deus para com os pecadores. O nosso Deus é “o Deus de toda
graça” (1Pe 5.10). Bem-aventurados são todos aqueles que vivem como súditos
do Reino da Graça de Deus. A graça de Deus é a tônica da Sua relação com o Seu
povo. Tudo que temos, somos e seremos é pela graça (1Co 15.10). A riqueza da
graça de Deus se manifesta de modo superabundante em nós (2Co 9.14; Ef 1.7;
2.7), todavia ela não foi manifestada em toda a sua plenitude, por isso, aguarda-
mos o regresso triunfante de Jesus Cristo, quando Ele mesmo revelará a graça de
forma mais completa (1Pe 1.13), concluindo a nossa salvação (Fp 1.6/1Pe 1.3-5).
Estou inteiramente de acordo com Packer, quando ele diz que “conhecer a
Deus é uma questão de graça.”206 O conteúdo do conhecimento como a sua pos-
sibilidade estão em Deus, que livre e soberanamente Se revela e oferece a nós
pecadores, de forma graciosa por meio da Sua Palavra. Somente pela graça da
autorrevelação de Deus é que podemos nos relacionar com Deus. O “conhe-
cimento” intelectual e abstrato de um Deus distante, se possível fosse fora da
Revelação Geral, o que não é, não redundaria em relacionamento afetivo e de
confiança. Nós podemos conhecer a Deus subjetivamente porque Ele Se deu a
conhecer objetivamente em Sua Palavra e, plenamente, dentro do Seu propó-
sito, em Cristo Jesus, o Deus encarnado. (Cl 1.19; 2.9).
de Deus. Daí que, por melhores que sejam os argumentos que possamos alinhar
para explicar a nossa fé, não conseguimos o nosso intento. Não que a fé seja irracio-
nal, como sugeriram Kierkegaard (1813-1855) e Miguel de Unamuno (1864-1936),
entre tantos outros; o que ocorre é que a fé não pode ser limitada pelos cânones da
razão; ela é suprarracional, apesar de caminhar durante algum tempo lado a lado
com a razão, ela, agora, acompanhada da esperança, lança-se ao infinito (1Co 15.19;
Hb 1.1). A fé não é irracional, ela respalda-se em Deus e na Sua promessa. Foi isso
que fez Abraão, conforme escreve Paulo: “não duvidou da promessa de Deus, por
incredulidade; mas, pela fé, se fortaleceu, dando glória a Deus, estando plenamente
convicto de que ele era poderoso para cumprir o que prometera” (Rm 4.20,21).
A fé exige conhecimento da Palavra de Deus. A fé é uma relação de confiança,
como acreditar em alguém que não conhecemos? A fé consiste no conhecimento
do Pai e do Filho pelo testemunho do Espírito (Jo 17.3/Jo 15.26; 16.13-14). “A fé
não consiste na ignorância, mas no conhecimento; e este conhecimento há de
ser não somente de Deus, mas também de Sua divina vontade.”207 É impossível
crer e nos relacionar pessoalmente com um Deus desconhecido.
A fé é gerada em nós pelo Espírito por meio da Palavra (Rm 10.17); ela é a
boa obra do Espírito Santo em nós, que age fundamentado em uma realidade
histórica irrefutável: a obra de Cristo no Calvário. “A fé verdadeira é aquela que
ouve a Palavra de Deus e descansa em Sua promessa.”208 A Palavra e a fé só pode-
rão ser entendidas mediante a aceitação da graça de Deus, onde tudo começa.
A Fé como Conhecimento
II
Temos a graça pela obra de Cristo, para que, pela graça, possamos conhecer a
Deus e, assim, possamos saber “qual a esperança do seu chamamento, qual a
riqueza do seu poder para com os que cremos, segundo a eficácia do seu poder;
o qual exerceu ele em Cristo, ressuscitando-o dentre os mortos, e fazendo-o sen-
tar a sua direita nos lugares celestiais” (Ef 1.18-20), vivendo, a partir daí, pela
graça e para a glória de Deus (1Co 10.31).
É somente pela graça, mediante a fé, que podemos nos apropriar da Revelação
com atos e palavras feita por Deus. Somente a fé, como efeito da graça, nos faz
perceber a Revelação, abrindo os nossos olhos para a Palavra de Deus (Sl 119.18;
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Ef 1.15-18). Desse modo, Deus nos ilumina para que possamos entender a Sua
Revelação nas Escrituras.
A Revelação antecede à fé (Rm 10.17; Gl 3.3,5). Pela Revelação, mediante
a iluminação do Espírito, o homem é subjugado por Deus, respondendo posi-
tivamente com fé. A resposta do homem é apenas uma evidência da eleição de
Deus (Jo 15.16; At 3.16; 15.11; 16.14; 18.27; Ef 2.8; Fp 2.12,13). Deus Se revela,
fala por meio da Palavra regenerando o pecador, concedendo-lhe fé para que,
agora salvo pela graça, ande nas boas obras preparadas por Deus de antemão
para nós (Cf. Ef. 2.10).
Entretanto, no nosso relacionamento com Deus, deparamo-nos com um
paradoxo: quanto mais conhecemos a Deus, temos, por um lado, um maior dis-
cernimento de nossa pecaminosidade e, por outro, uma maior consciência da
insondabilidade e infinitude de Deus. Paulo, escrevendo aos romanos, após falar
de um assunto difícil, exulta:
ó profundidade da riqueza, tanto da sabedoria, como do conhecimento
de Deus! Quão insondáveis são os seus juízos e quão inescrutáveis os
seus caminhos! Quem, pois, conheceu a mente do Senhor? ou quem foi
o seu conselheiro? Ou quem primeiro lhe deu a ele para que lhe venha
a ser restituído? Porque dele e por meio dele e para ele são todas as
cousas. A ele pois, a glória eternamente. Amém (Rm 11.33-36).
“Nossa fé não tem que estar fundamentada no que nós tenhamos pensado por
nós mesmos, senão no que foi prometido por Deus.”209 Por isso, devemos estar
atentos à Palavra de Deus, para entendê-la e praticá-la (Js 1.8; Sl 119.97; Fp 3.15;
Tg 1.22-25).
Por outro lado, devemos enfatizar que, pelo fato do nosso conhecimento
a respeito de Deus ser limitado, isso não significa que o que conhecemos aqui
será corrigido pelo que conheceremos na eternidade, como se a revelação de
Deus contida na Palavra fosse imprecisa. Não é. Entendemos que, o pouco que
podemos conhecer do Deus infinito é fidedigno, pois o nosso conhecimento res-
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A Fé como Conhecimento
II
A tentativa humana por encontrar Deus aparte de Jesus Cristo, conforme é nos
dado a conhecer nas Escrituras, termina em naturalismo, ateísmo ou deísmo,
que nada mais são do que formas de paganismo. A religiosidade descompromis-
sada como resultado da carência de Deus, não direcionada pela Palavra, termina
em superstição e idolatria que, entre outros males, pode, em determinadas cir-
cunstâncias, dar a sensação de satisfação para a angustiante carência de Deus,
no entanto esse remendo humano torna a situação do homem ainda pior, por-
que, na realidade, ele consciente ou inconscientemente está se enganando e, desse
modo, enquanto adota um paliativo espiritual, abandona a procura sincera pela
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verdade e torna-se, geralmente, imune à genuína proclamação do Evangelho de
Cristo. Somente o genuíno conhecimento de Cristo nos conduz a Deus e nos
liberta das cadeias do pecado. “Como as trevas são dispersas pelos raios furti-
vos do sol, assim todas as invenções e erros perversivos se desvanecem diante
desse conhecimento de Deus.”211
NECESSIDADE PRIMÁRIA
é que, na eternidade, não haverá mais a Bíblia; apenas teremos a visão ampla e
experimental daquilo para o qual ela apontava: A vitória do Cordeiro!
NECESSIDADE CONSEQUENTE
213 Vd. WARFIELD, B. B. Revelation and Inspiration: In: The Works of Benjamin B. Warfield,
Grand Rapids, Michigan: Baker Book House, 1981, p. 7ss. A revelação Geral é “tênue e obscura para
a humanidade pecadora, e mesmo para a humanidade redimida.” (GRONINGEN, G. V. Revelação
Messiânica no Velho Testamento, p. 64).
214 Consultar referência.
215 Consultar referência.
216 Consultar referência.
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e, O conhecendo O adoremos e, O adorando, mais O conheçamos (Os 6.3; 2
Pe 3.18).218 A Bíblia foi-nos confiada a fim de que, mediante a iluminação do
Espírito Santo,219 sejamos conduzidos a Jesus Cristo (Jo 5.39/Lc 24.27,44), sendo
Ele mesmo Quem nos leva ao Pai (Jo 14.6-15; 1Tm 2.5; 1Pe 3.18) e nos dá vida
abundante (Jo 10.10; Cl 3.4). Por isso, “ao estudarmos Deus, devemos procurar
ser conduzidos a Ele.”.220
217 Calvino combateu as especulações com veemência; em diversos lugares ele escreveu sobre o assunto;
como exemplo, cito: “Porque são mui poucos entre a ingente multidão de homens que existe no mundo
os que pretendem saber qual é o caminho para ir ao céu; porém todos desejam antes do tempo conhecer
o que é que se faz nele.” (As Institutas, III.25.11; Vd. também I.5.9). “’A Escritura é proveitosa.’ Segue-
se daqui que é errôneo usá-la de forma inaproveitável. Ao dar-nos as Escrituras, o Senhor não pretendia
satisfazer nossa curiosidade, nem alimentar nossa ânsia por ostentação, nem tampouco deparar-nos
uma chance para invenções místicas e palavreado tolo; sua intenção, ao contrário, era fazer-nos o bem. E
assim, o uso correto da Escritura deve guiar-nos sempre ao que é proveitoso.” (Calvino, J. As Pastorais,
São Paulo: Paracletos, 1998, (2Tm 3.16), p. 263). “As cousas que o Senhor deixou recônditas em secreto
não perscrutemos, as que pôs a descoberto não negligenciemos, para que não sejamos condenados ou de
excessiva curiosidade, de uma parte, ou de ingratidão, de outra.” (As Institutas, III.21.4).
“Nem nos envergonhemos em até este ponto submeter o entendimento à sabedoria imensa de Deus, que
em Seus muitos arcanos sucumba. Pois, dessas cousas que nem é dado, nem é lícito saber, douta é a
ignorância, a avidez de conhecimento, uma espécie de loucura.” (As Institutas, III.23.8).
218 Consultar referência.
219 Calvino observou que: “Só quando Deus irradia em nós a luz de seu Espírito é que a Palavra logra
produzir algum efeito. Daí a vocação interna, que só é eficaz no eleito e apropriada para ele, distingue-se
da voz externa dos homens.” (Calvino, J., Exposição de Romanos, São Paulo: Paracletos, 1997, (10.16),
p. 374). A vocação eficaz do eleito, “não consiste somente na pregação da Palavra, senão também na
iluminação do Espírito Santo.” (CALVINO, J. As Institutas, III.24.2).
220 Consultar referência.
A. Mecânica ou Ditada
Inspiração não significa que os escritores receberam o conteúdo de seus escritos,
por ditado divino. Se assim fosse, significaria que eles foram apenas os secretá-
rios, amanuenses de Deus, que copiavam pura e simplesmente o que lhes fora
ditado221; logo, não haveria estilos diferentes na Bíblia, o que, como sabemos, há.
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O estilo, nesse caso, seria do Espírito Santo. Um dos textos que indicam o contrá-
rio, é 2Pe 3.15,16, quando Pedro faz alusão à maneira própria de Paulo escrever.
B. Iluminação
A Inspiração não consiste apenas numa intensificação da ação do Espírito Santo
sobre os escritores, de tal forma que eles puderam ter um grau mais elevado de
percepção espiritual. Se a inspiração fosse apenas isto, cairíamos num subjeti-
vismo extremamente perigoso, pois, nesse caso, a veracidade dos textos bíblicos
dependeria da apreensão de cada “iluminado” para que pudesse registrar o que
percebera. Consequentemente, não poderíamos considerar a Bíblia como o regis-
tro inerrante da Palavra de Deus, visto que a Bíblia apenas conteria a Palavra que
foi apreendida, captada... Este conceito contraria o ensino das Escrituras (Vd. Jo
10.35; At 4.25,26; 6.2), que afirma que Deus fala através dos Seus servos, sendo
o seu registro, a Palavra de Deus, a qual não pode ser anulada.
C. Intuição
Inspiração não significa que os escritores foram inspirados da mesma forma
que os grandes autores da literatura, inventores, cientistas, músicos etc.222
221 Notemos que não haveria nenhum problema em copiar o “ditado” divino; o que estamos dizendo é que
a Bíblia não nos ensina isso.
222 Richardson, que sustenta tal posição, diz: “a inspiração dos livros da Bíblia não nos força a aceitar
que foram produzidos ou escritos de qualquer maneira genericamente diferente daquela por que se
escreveram outros grandes livros cristãos, como, por exemplo, A Imitação de Cristo ou O Peregrino. A
inspiração do Espírito Santo, no sentido em que o apóstolo Paulo disse ter a direção do Espírito, não
cessou quando foram escritos todos os livros do Novo Testamento, ou quando se estabeleceu finalmente o
cânon do Novo Testamento. Há uma boa porção da literatura cristã que vai do século segundo ao século
vinte, que pode com muita propriedade ser tida como inspirada pelo Espírito Santo, precisamente no
mesmo sentido formal que julgamos inspirados os livros da Bíblia.” (RICHARDSON, A. Apologética
Cristã, 2ª ed. Rio de Janeiro, JUERP, 1978. p. 167).
Se assim fosse, a Bíblia poderia até ser um belíssimo livro, todavia apenas um
livro humano, criado pela genialidade humana e, por mais belo e extraordiná-
rio que fosse, seria falível, cheio de erros, preceitos antiquados e o pior de tudo:
não nos conduziria a Deus (Jo 5.39).
D. Parcial ou Fracional
Inspiração não significa que os autores tiveram apenas uma inspiração parcial quanto
a alguns assuntos da Bíblia. Os defensores desta idéia entendem que doutrinaria-
mente a Bíblia contém a Palavra de Deus (embora não haja unanimidade quanto à
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aceitação desta ou daquela doutrina); contudo, ela contém erros de história, crono-
logia, arqueologia, geografia, etc. A idéia mais comum, é a de que a Bíblia só teria
autoridade em matérias morais e espirituais. Este conceito traz em seu bojo a pres-
suposição consciente ou inconsciente de que a Bíblia tem uma “inerrância limitada”,
restrita aos assuntos morais e espirituais.223 Todavia, Paulo diz que “Toda Escritura
é inspirada por Deus...” (2Tm 3.16). O labor humano em tentar separar – como se
existisse o que separar –, o que é “inspirado” do que “não é inspirado”, se constitui
em algo nocivo e temerário, visto que o homem arroga a si a condição de superior à
Palavra, colocando-se sobre a Bíblia para julgá-la, com critérios subjetivos, estabele-
cendo um “Cânon dentro do Cânon”, rejeitando o próprio testemunho das Escrituras.
E. Mental
Inspiração não significa que os autores secundários tiveram apenas os seus pen-
samentos inspirados, mas não as palavras de seus registros. Se isso fosse assim, os
pensamentos seriam verdadeiros, contudo o registro desses pensamentos pode-
ria e, de fato, conteria erros. Ora, essa concepção é extravagante, uma vez que
admite a possibilidade de Deus inspirar o pensamento humano sem palavras.
Não é justamente em palavras que nós pensamos, ainda que a sua expressão possa
ser pictórica? Além do mais, a Bíblia nos ensina que Deus dá as palavras para
serem registradas (Cf. Ex 24.4; 34.27; Is 30.8; Jr 1.9; 36.2; Hc 2.2; Ap 21.5). A ins-
piração termina não nas ideias, mas no registro final das Escrituras (2Tm 3.16).
223 Sproul apresenta, de forma clara e objetiva, alguns desvios decorrentes da aceitação da “inerrância
limitada”. (SPROUL, R. C. Sola Scriptura: Crucial ao Evangelicalismo: In: BOICE, J. M. ed. O Alicerce da
Autoridade Bíblica, p. 134-138. A interpretação católica romana, a partir do Concílio Vaticano II (1962-
1965), corresponde a este conceito. Conforme já vimos, o Concílio declarou: “Deve-se professar que os
livros da Escritura ensinam com certeza, fielmente e sem erro a verdade que Deus em vista da nossa salvação
quis fosse consignada nas Sagradas Escrituras.” (Compêndio do Vaticano II, II.3.11. § 179, p. 129).
A. Considerações Gramaticais
A palavra “inspiração” não ocorre no Novo Testamento. Ela só aparece uma
única vez no Antigo Testamento: “mas ninguém diz: onde está Deus que me fez,
que inspira canções de louvor durante a noite” (Jó 35.10) (ARA).224 No Novo
Testamento, a palavra é decorrente de uma tradução interpretativa do Texto de
2Tm 3.16, que diz: “toda Escritura é inspirada por Deus...”. A expressão “ins-
pirada por Deus” provém de um único termo grego, Qeo/pneustoj, que só
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ocorre aqui. (Não aparece na LXX). Todavia a tradução que temos (Almeida,
Revista e Atualizada) segue aqui a Vulgata que traduz “Divinitus Inspirata”.225
A palavra Qeo/pneustoj não significa “ins-pirado”, mas sim “ex-pirado”,
ou seja, ao invés de soprado para dentro, soprado para fora. Esse adjetivo, comenta
Colin Brown,
não significa qualquer modo específico de inspiração, tal qual alguma for-
ma de ditado divino. Nem sequer dá a entender a suspensão das faculda-
des cognitivas normais dos autores humanos. Do outro lado, realmente
quer dizer algo bem diferente da inspiração poética. É um erro omitir o
elemento divino no termo, transmitido por theo (The New English Bible
faz assim, ao traduzir a frase; ‘toda escritura inspirada’).226 É claro que a ex-
pressão não dá a entender que algumas escrituras são inspiradas, enquanto
outras não são. Todas as Sagradas Escrituras expressam a mente de Deus;
fazem assim, no entanto, com o alvo da sua operação prática na vida.227
O que Paulo quer dizer é que toda a Escritura Sagrada é soprada, exalada por
Deus. Se tomarmos a palavra apenas no sentido passivo, diremos que “Deus, em
sua revelação, é soprado pelas páginas das Escrituras”. Desse modo, podemos
dizer que Deus é o Autor e o Conteúdo das Escrituras.
224 O verbo é traduzido da mesma forma em BJ. ARC e ACR traduzem mais literalmente, por “dá”
225 A expressão completa é: “Omnis Scriptura Divinitus Inspirata”.
226 De fato, assim lemos em The New English Bible: New Testament, Great Britain, Oxford University
Press, 1961: “Every inspired scripture”. Mesmo equívoco comete ARC. Vd. uma boa discussão sobre
este ponto In: BLUM, E. A. The Apostles’ of Scripture: In: GEISLER, N. L. ed. Inerrancy, Grand Rapids,
Michigan: Zondervan Publishing House, 1980, p. 45ss.
227 BROWN, C. Escritura: In: BROWN, C. ed. ger. O Novo Dicionário Internacional de Teologia
do Novo Testamento, São Paulo: Vida Nova, 1981-1983, Vol. II, p. 103-104. Vd. A análise da questão
In: Hoeksema, H. C. The Doctrine of Scripture, Grand Rapids, Michigan: Reformed Free Publishing
Association, 1990, p. 40ss.
Com isso, estamos dizendo que o Deus que Se revelou, esteve “expirando” os
homens que Ele mesmo separou para registrarem essa revelação. A inspira-
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
ção bíblica garante que seja registrado de forma veraz aquilo que a inspiração
profética fazia com respeito à palavra do profeta, para que ela correspondesse
literalmente à mente de Deus. Em outras palavras: a Palavra escrita é tão fide-
digna quanto a Palavra falada pelos profetas; ambas foram inspiradas por Deus.
A Bíblia é o registro infalível da Palavra de Deus. Deus fez com que os Seus ser-
vos registrassem a Sua vontade mediante a Revelação, Inspiração e Iluminação do
Espírito; desta forma, o Deus Triúno é o Autor das Escrituras, sendo a Inspiração
mais propriamente atribuída ao Espírito. (Cf. 2Sm 23.2; Mt 22.43; At 1.16; 4.24-
26; 28.25; Hb 3.7-11; 9.6-8; 10.15-17; 1Pe 1.10-12/2Tm 3.16; 2Pe 1.20-21).
B. Definição de Inspiração
Podemos definir a Inspiração como sendo a influência sobrenatural do Espírito
de Deus sobre os homens separados por Ele mesmo, a fim de registrarem de
forma inerrante e suficiente toda a vontade de Deus, constituindo este registro
na única fonte e norma de todo o conhecimento cristão.
Van Groningen (1995, p. 64-65) coloca a questão nestes termos:
O Espírito Santo habitou em certos homens, inspirou-os, e assim diri-
giu-os que eles, em plena consciência, expressaram-se na sua singular
maneira pessoal. O Espírito capacitou homens a conhecer e expressar
a verdade de Deus. Ele impediu-os de incluir qualquer coisa que fosse
contrária a essa verdade de Deus. Ele também impediu-os de escrever
coisas que não eram necessárias. Assim, homens escreveram como ho-
mens, mas, ao mesmo tempo, comunicaram a mensagem de Deus, não
a do homem (Gerard Van Groningen. Revelação Messiânica no Velho
Testamento, Campinas: Luz para o Caminho, 1995, p. 63).
vras dos autógrafos originais são Palavra de Deus (2Sm 23.2; Jr 1.9; Mt
5.18; 1Co 2.13). Em Gl 3.16, é interessante observar que Paulo baseia
o seu argumento em uma só palavra usada no original hebraico.230
A inspiração se estende aos pensamentos bem como às palavras.231
228 A inspiração é também chamada de “orgânica”, porque a Escritura pode ser comparada em certo sentido a
um organismo, onde há uma interação harmoniosa de forças. Deus preparou os Seus servos desde à eternidade,
tornando-os “órgãos da inspiração”. (Vd. HOEKSEMA, H. C. The Doctrine of Scripture, p. 78ss).
229 Consultar referência.
230 Consultar referência.
231 TIl, C. V. An Introduction To Systematic Theology, Phillipsburg, New Jersey, Presbyterian and Reformed
Publishing Co., 1974, p. 152. Seguindo essa linha de interpretação, a Formula Consensus Helvetica (1675) –
também conhecida como “Símbolo Secundino”, “Formula Anti-Saumuriensis”, ou “Anti-Amyraldensis” devido
ao combate à teologia de Moisés Amyraut (1596-1664) da escola de Saumur –, foi mais longe, declarando a
infalibilidade das vogais hebraicas(*), que, diga-se, ainda não existiam nos tempos bíblicos (Sobre as “massoretas”
que vocalizaram o Antigo Testamento Hebraico, Vd. ARCHER JUNIOR, G. L. Merece Confiança o Antigo
Testamento, São Paulo: Vida Nova, 1974, p. 65ss; R.N. Champlin, Manuscritos do Antigo Testamento e Massora:
In: EBTF., IV, p. 64-65; 153). Diz a Formula no cânon II: “O Original Hebreu do Antigo Testamento que temos
recebido da tradição da Igreja Judaica, a qual antigamente ‘foram confiados os oráculos de Deus’ (Rm 3.2), e
retido até o presente dia, tanto em suas consoantes como em suas vogais – os pontos mesmos, ou pelo menos, a
força dos pontos –, e tanto em sua substância como em suas palavras é inspirado divinamente, de modo que, junto
com o Original do Novo Testamento, é a única e completa regra da nossa fé e vida, mediante cujo critério, como
uma pedra de toque, devem ser postas à prova todas as versões que existem, tanto orientais como ocidentais, e
se em algum ponto variam, devem ser colocadas em conformidade com a mesma”. (In: LEITH, J. H. ed. Creeds
of the Churches, New York, Anchor Books, 1963, p. 310). Esta declaração teológica, que Hodge denomina de
“a mais científica e completa de todas as Confissões Reformadas” (Hodge, A. A. Esboços de Theologia, Lisboa,
Barata & Sanches, 1895, p. 113), foi elaborada em Zurique, pelo professor John Henry Heidegger, de Zurique
(1633-1698); Rev. Lucas Gernler, de Basiléia (1625-1675) e pelo professor François Turretini, de Genebra (1623-
1687), o grande teólogo reformado, para quem a Bíblia é a única fonte da Teologia. Ela foi a última Confissão
da Igreja Reformada Suíça, encerrando, assim, o período de “Credos Calvinistas”. Mesmo não estendendo
sua autoridade além da Suíça, esta Fórmula é de grande valor para a história da teologia Protestante e para o
fortalecimento da união entre os Reformados nos cantões suíços. ”Este Consensus foi significativo não somente
para condenar a teologia Salmuriana, porém também pra unir os cantões evangélicos da Suiça na comum
definição da fé reformada. Semelhante unidade foi necessária para o fortalecimento reformado da Suíça contra
a Igreja Católica Romana.” (KLAUBER, M. I. The Helvetic Formula Consensus (1675): An Introduction and
Translation: In: Trinity Journal, 11NS (1990), p. 107). (Vd. SCHAFF, P. The Creeds of Christendom, 6ª ed.
Grand Rapids, Michigan: Baker Book House, (Revised and Enlarged), (1931), Vol. I, p. 478-479; Hodge, A.
A., Esboços de Theologia, p. 113; ROGERS, J. The Church Doctrine of Biblical Authority: In: ROGERS, J, ed.
Biblical Authority, Waco, Texas, Word Books, 1977, p. 30-31).
(*) Esta tese era sustentada por Johannes Buxtorf, pai (1564-1629) e filho (1599-1664), tendo esse exercido
influência na Fórmula. (Vd. BERTHEAU, E. Buxtorf: In: SCHAFF, P. ed. Religious Encyclopaedia: or
Dictionary of Biblical, Historical, Doctrinal, and Practical Theology, Chicago, Funk Wagnalls, Publishers,
1887 (Revised Edition), Vol. I, p. 351; Schaff, P. The Creeds of Christendom, Vol. I, p. 479-480; Tillich, P.
História do Pensamento Cristão, São Paulo: ASTE, 1988, p. 256).
A Inspiração das Escrituras
II
1. Papel Passivo
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de Deus em se revelar e, também, no fato de que não expressaram a sua natu-
reza pecaminosa. Os escritores foram apenas instrumentos humanos por meio
dos quais Deus decretou registrar a Sua mensagem (2 Pe 1.21; 2 Tm 3.16).
Eles falaram, todavia somente à medida que foram conduzidos pelo Espírito
Santo. A Escritura não é maniqueísta: tendo de um lado a Palavra de Deus e,
de outro, a palavra dos homens; nem é ela o produto de uma decisão humana
e falível; é, antes, “exalada por Deus” em toda a sua extensão.233
2. Papel Ativo
Por isso, dentro da inspiração, há lugar para assuntos pessoais como, por
exemplo, a Epístola de Paulo a Filemon e, também, há espaço para reco-
mendações e preocupações específicas (Cf. 1Tm 5.23; 2Tm 4.13).
A. Os Profetas
1. Os profetas são descritos como aqueles por meio dos quais Deus fala (Ex 7.1;
Dt 18.15,18; Jr 1.9; 7.1). O Profeta não criava nem adaptava a mensagem;
a ele competia transmiti-la como havia recebido (Ex 4.30; Dt 4.2,5). O que
se exige do Profeta é fidelidade. Martin-Achard, resume bem isso, dizendo:
Na realidade, o profeta não tem por missão pregar uma ideologia nova,
qualquer que seja ela, ele coloca novamente os seus contemporâneos
diante da pessoa de Deus, ele situa Israel diante de Alguém e não diante
de um ensinamento ou um ideal, ele deixa Javé e o seu povo face a face
(Martin-Achard, 1970, p. 71. Vd. ARCHER JUNIOR, 1974, P. 333-337).
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14.14; 23.16; 29.9; Ez 13.2,3,6).
B. Os Apóstolos
Os escritores do Novo Testamento reconheciam ser o Antigo Testamento a Palavra
de Deus (Hb 1.1; 3.7), sendo a “Escritura” um registro fiel da história e da von-
tade de Deus (Rm 4.3; 9.17; Gl 3.8; 4.30).
Os Apóstolos falavam com a convicção de que estavam pregando e ensinando
a Palavra inspirada de Deus, dirigidos pelo Espírito Santo (Vd. 1Co 2.4-13; 7.10;
14.37; 2Co 13.2-3; Gl 1.6-9; Cl 4.16; 1Ts 2.13; 2Ts 3.14). Paulo e Pedro coloca-
vam os Escritos do Novo Testamento no mesmo nível do Antigo Testamento (Cf.
1Tm 5.18/Dt 25.4; Lc 10.7; 2Pe 3.16). Paulo reconheceu os apóstolos e os pro-
fetas, no mesmo nível, como os fundamentos da Igreja, edificados sobre Jesus
Cristo, a pedra angular (Ef. 2.20).
C. Jesus Cristo
Jesus apelava para o Antigo Testamento, considerando-o como a expressão fiel
do Conselho de Deus, sendo a verdade final e decisória. Deus é o Autor das
Escrituras (Mt 4.4,7,10; 11.10; 15.4; 19.4; 21.16,42; 22.29; Mc 10.5-9; 12.10; 12.24;
Lc 19.46; 24.25-27, 44-47; Jo 10.34).
At 1.16; 4.24-26; 28.25; Rm 15.4; 2Tm 3.16; Hb 1.1-2; 3.7-11; 10.15-17; 2Pe 1.20).
A Bíblia fornece argumentos racionais que demonstram a sua inspiração
e inerrância, todavia os homens só poderão ter essa convicção mediante o tes-
temunho interno do Espírito Santo (Sl 119.18).236 Os discípulos de Cristo só
entenderam as Escrituras, quando o próprio Jesus lhes abriu o entendimento (Lc
24.45). A Escritura autentica-se a si mesma, e nós a recebemos pelo Espírito.237
A posição que sustentamos nesse ensaio consiste apenas em uma rendição
incondicional às reivindicações Proféticas, Apostólicas e do próprio Cristo. Diante
de um testemunho tão evidente, como poderia eu descartá-lo e seguir as opi-
niões fantasiosas de homens? O cristão sincero deve aprender, pelo Espírito de
Deus, a subordinar a sua inteligência à sabedoria de Deus revelada nas Escrituras
e guarda-la no coração a Palavra de Deus (Sl 119.11).238
Durante toda a história, a Palavra de Deus foi alvo dos mais diversos ataques,
entre eles, o mais comum é a suposição de sua falibilidade. No entanto um ataque
mais sutil que também permeou boa parte da história da Igreja é a concepção,
ainda que muitas vezes velada, de que as Escrituras não são suficientes para nos
dirigir e orientar.
Melanchthon (1497-1560) e Lutero (1483-1546) depararam-se explicita-
mente com esse problema bem no início da Reforma Protestante. Por volta de
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1520, na pequena, porém, próspera e culta cidade alemã de Zwickau, quando sur-
giu um grupo de homens “iluminados” – chamados por Lutero de “profetas de
Zwickau”239 –, que alegava ter revelações especiais vindas diretamente de Deus,
entendendo ter sido chamado por Deus para “completar a Reforma”. A sua reli-
gião partia sempre de uma suposta revelação interior do Espírito. Acreditavam
que o fim dos tempos estava próximo – os ímpios seriam exterminados – e que,
por isso, não era necessário estudar teologia visto que o Espírito estaria inspi-
rando os pobres e ignorantes. Combatiam também o batismo infantil. Assim
pensando, esses homens diziam:
de que vale aderir assim tão estritamente à Bíblia? A Bíblia! Sempre a
Bíblia! Poderá a Bíblia nos fazer sermão? Será suficiente para a nossa
instrução? Se Deus tivesse tencionado ensinar-nos, por meio de um
livro, não nos teria mandado do céu uma Bíblia? Somente pelo Espírito
é que poderemos ser iluminados. O próprio Deus fala dentro de nós.
Deus em pessoa nos revela aquilo que devemos fazer e aquilo que de-
vemos pregar.240
Um certo alfaiate, Nícolas Storck, escolheu doze apóstolos e setenta e dois discípulos,
declarando que, finalmente, tinham sido devolvidos à Igreja os profetas e apóstolos.241
239 Os principais líderes eram: Nícolas Storck, Marcos Tomás e Marcos Stübner. Tomás Münzer (c. 1490-
1525) tornar-se-ia o mais famoso dos que foram influenciados por esse círculo, tendo mais tarde as suas
idéias próprias, ainda que fiel aos mesmos princípios. (Vd. WILLIAMS, G. H. La Reforma Radical,
México: Fondo de Cultura Económica, 1983, p. 66ss; DELUMEAU, J. O Nascimento e Afirmação da
Reforma, São Paulo: Pioneira, 1989, p. 101).
240 Consultar referência.
241 Consultar referência.
242 Como resultado das supostas revelações diretas de Deus, Storck e seus companheiros sustentavam
que “dentro de cinco a sete anos os turcos invadiriam a Alemanha e destruiriam os sacerdotes e todos os
ímpios. Storck via-se como cabeça de uma nova igreja, designada por Deus para completar a Reforma
que Martinho Lutero deixara inacabada.” [WEAVER, J. D. Profetas de Zwickau: In: ELWELL, W. A. ed.
Enciclopédia Histórico-Teológica da Igreja Cristã, São Paulo: Vida Nova, 1988-1990, Vol. III, p. 657].
243 Consultar referência.
244 Consultar referência.
245 Justificando com o príncipe o motivo da sua volta, escreveu-lhe no dia de sua chegada a Wittenberg, 7
de março de 1522: “Não são acaso os Wittemberguenses as minhas ovelhas? Não mas teria confiado Deus?
E não deveria eu, se necessário, expor-me à morte por causa delas?” (apud D’AUBIGNÉ, J. H. M. História
da Reforma do Décimo-Sexto Século, Vol. III, p. 83).
246 Lutero, iniciando no dia 09/3/1522, pregou oito dias consecutivos em Wittenberg. Vd. o seu primeiro
sermão In: Lutero, M. Pelo Evangelho de Cristo: Obras selecionadas de momentos decisivos da Reforma,
Porto Alegre/São Leopoldo, RS.: Concórdia Editora/Editora Sinodal, 1984, p. 153-161. Quanto aos
detalhes da sua volta, Vd: D’AUBIGNÉ, J. H. M., História da Reforma do Décimo-Sexto Século, III, p.
72ss.; ATKINSON, J. Lutero e o Nacimiento del Protestantismo, p. 254ss.
247 Consultar referência.
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em outros aspectos, não fossem expressamente chamados ao conheci-
mento da aliança de deus.248
Nós somos herdeiros dos princípios bíblicos da Reforma; para nós, como para
os reformadores, a Palavra de Deus é a fonte autoritativa de Deus para o nosso
pensar, crer, sentir e agir: a Palavra de Deus nos é suficiente.
250 A tradição oral (para/dosij) [“transmissão”, “entrega”, “tradição”. A palavra é formada de “Para/”
(“junto a”, “ao lado de”) & “Di/dwmi” (Conforme o contexto: “dar”, “trazer”, “conceder”, “causar”, “colocar”,
etc.] consistia basicamente no que Jesus Cristo, os apóstolos e outros servos de Deus ensinavam por
meio de seus sermões, orientações e comportamento.(1Co 11.2, 23-25; Gl 1.14; 2Ts 2.15; 3.6/Rm 6.17;
16.17; 1Co 15.1-11; Fp 4.9; 1Ts 2.9, 13; 4.11,12). Nesses textos, evidenciam-se que a “tradição” recebida
e ensinada amparava-se numa certeza quanto à sua origem divina. Portanto, as “tradições” mencionadas
por Paulo distinguem-se daquelas inventadas e transmitidas pelos homens, as quais são recriminadas
por Cristo, visto que estes ensinamentos anulavam a Palavra de Deus (Cf. Mt 15.2,3,6; Mc 7.3,5,8,9,13). A
para/dosij é rejeitada todas as vezes que entra em choque com a Palavra de Deus.
251 Consultar referência.
252 Consultar referência.
Os Credos baseiam-se na Palavra, porém não são a Palavra – nem jamais foi
isso cogitado pelos seus formuladores; eles não podem substituir a Palavra de
Deus; somente Ela gera vida pelo poder de Deus (1Pe 1.23; Tg 1.18).
Para nós, reformados, os Credos têm a sua autoridade decorrente da Palavra
de Deus; em outras palavras, o seu valor não é intrínseco, mas sim, extrínseco:
Eles são recebidos e cridos enquanto permanecem fiéis à Escritura; assim, a sua
autoridade é relativa.
Os Credos são somente uma aproximação e relativa exposição correta da
verdade revelada. Dessa forma, podem ser modificados pelo progressivo conhe-
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cimento da Bíblia a qual é infalível e inesgotável. Por isso, não devemos tomar
os Credos como autoridade final para definir um ponto doutrinário: os limites
de nossa reflexão teológica estão na Palavra, não nos Credos. Os Credos não
estabelecem o limite de nossa fé, antes a norteia. A Palavra de Deus sempre será
mais rica do que qualquer pronunciamento eclesiástico por melhor que seja ela-
borado e por mais fiel que seja às Escrituras. No entanto, como ressalta Packer,
“na verdade a abordagem impiedosa seria tentar aprender de Deus como cava-
leiro solitário que orgulhosamente ou impacientemente virasse as costas para
a igreja e sua herança: isso seria receita certeira para esquisitices sem fim!”.253
A Confissão de Westminster estabelece o paradigma que deve nos orientar:
O Juiz Supremo, pelo qual todas as controvérsias religiosas têm de ser
determinadas, e por quem serão examinados todos os decretos de con-
cílios, todas as opiniões dos antigos escritores, todas as doutrinas de
homens e opiniões particulares, o Juiz Supremo, em cuja sentença nos
devemos firmar, não pode ser outro senão o Espírito Santo falando na
Escritura. (Confissão de Westminster, capítulo I, seção 10).
como Palavra autoritativa de Deus, e é Ele mesmo Quem nos ilumina para que
possamos interpretá-la corretamente (Sl 119.18). Por isso, o Espírito não pode
ser separado da Palavra. Somente pela operação divina poderemos reconhe-
cer a Sua origem divina bem como compreendê-la salvadoramente. “A suprema
prova da Escritura se estabelece reiteradamente da pessoa de Deus nela a falar.”266
Portanto, a Igreja tentar subordinar a autoridade da Bíblia ao seu arbítrio consiste
em uma “blasfêmia”: “É chocante blasfêmia afirmar que a Palavra de Deus é falí-
vel até que obtenha da parte dos homens uma certeza emprestada.”267 Em outro
lugar: “...a Palavra do Senhor é semente frutífera por sua própria natureza.”268
Na Confissão Gaulesa (1559), redigida primariamente por Calvino (1509-1564),
no Capítulo IV, diz: “nós sabemos que esses livros [das Escrituras] são canônicos, e
a regra segura de nossa fé (Sl 19.9; 12.7), não tanto pelo comum acordo e consen-
timento da Igreja quanto pelo testemunho e persuasão interior do Espírito Santo”
(CONFISSÃO de Westminster, I.6; CONFISSÃO Belga,1561, Art 5).
A INSPIRAÇÃO E A EVANGELIZAÇÃO
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No ato evangelizador da Igreja, ela prega a Palavra de Deus, conforme a ordem
divina expressa nas Escrituras, fala da salvação eterna oferecida por Cristo, con-
forme as Escrituras, proclama as perfeições de Deus, conforme as Escrituras...
Ora, se a Igreja não tem certeza da fidedignidade do que ensina, como, então,
poderá testemunhar de forma honesta?
Uma Igreja que não aceite a inspiração e a inerrância bíblica, não poderá
ser uma igreja missionária.271 Como poderemos pregar a Palavra se não estiver-
mos confiantes do sentido exato do que está sendo dito? Como evangelizar se
nós mesmos não temos certeza se o que falamos procede da Palavra de Deus ou
está embasado em uma falácia?
Billy Graham (1974, p. 20), no Congresso de Lausanne, na Suíça, afirmou
corretamente: “se há uma coisa que a história da Igreja nos deveria ensinar, é a
importância de um evangelismo teológico derivado das Escrituras.”
Nesse sentido, encontramos a convicção de Paulo, o grande missionário, de
que a Palavra de Deus é fiel, por isso, ele a ensinava com autoridade (1Tm 1.15;
4.9/2Tm 4.6-8).
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3) A eleição divina daqueles que serão salvos alicerçar-se sobre o fato da
provisão divina de que eles haverão de crer, por sua própria deliberação.
4) A morte de Cristo não garantiu a salvação para ninguém, pois não garan-
tiu o dom da fé para ninguém (e nem mesmo existe tal dom); o que ela fez
foi criar a possibilidade de salvação para todo aquele que crê.
5) Depende inteiramente dos crentes manterem-se em um estado de gra-
ça, conservando a sua fé; aqueles que falham nesse ponto, desviam-se e se
perdem.
275 Que chama de “espectro papista”, que “separa a fé da Palavra de Deus”. (CALVINO, J. Exposição de
Romanos, São Paulo: Paracletos, 1997, [Rm 10.17], p. 375).
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Pelas palavras de Calvino, podemos observar a necessidade latente do ensino e
estudo constante da Palavra de Deus, a fim de que cada homem, sendo como é,
responsável diante de Deus, tenha condições de se posicionar diante de Deus de
forma consciente; a fé explícita é patenteada pela Igreja por meio do ensino da
Palavra. Tillich (1986, p. 41), interpretando esse fato, diz:
Cada indivíduo deve ser capaz de confessar os próprios pecados, ex-
perimentar o significado do arrependimento, e se tornar certo de sua
salvação em Cristo. Essa exigência gerava um problema no protestan-
tismo. Significava que todas as pessoas precisavam ter o mesmo co-
nhecimento básico das doutrinas fundamentais da fé cristã. No ensino
dessas doutrinas não se emprega o mesmo método para o povo comum
e para os candidatos às ordens, ou para os futuros professores de teolo-
gia, com a prática do latim e grego, da história da exegese e do pensa-
mento cristão. Como se pode ensinar a todos? Naturalmente, apenas se
tornarmos o ensino extremamente simples.
Essa necessidade determina o uso cada vez mais evidente da razão, a fim de
apresentar, da forma mais razoável possível, a doutrina e, ao mesmo tempo, de
forma simples. Eis dois marcos do ensino ortodoxo: amplitude e simplicidade.
O ser humano é responsável diante de Deus; ele dará contas de si mesmo ao
seu Criador, portanto, tendo oportunidade, ele precisa conhecer devidamente a
Palavra de Deus em toda a sua plenitude revelada.
276 Foi com esse espírito que Calvino nos advertiu diversas vezes: “As cousas que o Senhor deixou recônditas
em secreto não perscrutemos, as que pôs a descoberto não negligenciemos, para que não sejamos
condenados ou de excessiva curiosidade, de uma parte, ou de ingratidão, de outra” (CALVINO, J. As
Institutas. Campinas, SP; Luz para o Caminho/Casa Editora Presbiteriana, 1985-1989, III.21.4). “Nem nos
envergonhemos em até este ponto submeter o entendimento à sabedoria imensa de Deus, que em Seus
muitos arcanos sucumba. Pois, dessas cousas que nem é dado, nem é lícito saber, douta é a ignorância, a
avidez de conhecimento, uma espécie de loucura.” (CALVINO, J. As Institutas. III.23.8). ”Que esta seja a
nossa regra sacra: não procurar saber nada mais senão o que a Escritura nos ensina. Onde o Senhor fecha
seus próprios lábios, que nós igualmente impeçamos nossas mentes de avançar sequer um passo a mais.”
[CALVINO, J. Exposição de Romanos. São Paulo: Edições Paracletos, 1997, (Rm 9.14), p. 330].
Catecismos visavam servir para instruir as crianças e os adultos; esse é o motivo que
contribuiu decisivamente para a sua proliferação, sendo que a maioria deles jamais
passou da forma manuscrita, visto que muitos pastores os elaboravam apenas para
a sua congregação local, visando atender as suas necessidades doutrinárias.278
O primeiro trabalho a receber o título de “Catecismo”, foi o de Andreas
Althamer (c. 1500), em 1528.279 Porém os mais influentes no século XVI foram
os de Lutero (1483-1546): O Catecismo Maior (1529) e O Catecismo Menor
(1529). No prefácio do Catecismo Menor, Lutero declara os motivos que o leva-
ram a redigir esse Catecismo e apresenta também sugestões de como ensiná-lo
à Congregação. No decorrer dos sete capítulos, ele quase sempre inicia dizendo:
“como o chefe de família deve ensiná-lo à sua casa”, “como o chefe de família deve
ensiná-lo com toda a simplicidade à sua casa” e expressões similares.
Transcreverei, apenas, o que Lutero disse a respeito das suas motivações:
A lamentável e mísera necessidade experimentada recentemente,
quando também eu fui visitador,280 é que me obrigou e impulsionou a
preparar este catecismo ou doutrina cristã nesta forma breve, simples
e singela. Meu Deus, quanta miséria não vi! O homem comum sim-
plesmente não sabe nada da doutrina cristã, especialmente nas aldeias.
E, infelizmente, muitos pastores são de todo incompetentes e incapazes
para a obra do ensino. (...) Não sabem nem o Pai-Nosso, nem o Credo,
nem os Dez Mandamentos. (LUTERO, 1983, p. 363).
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o início de 1542, tornando-se juntamente com a Instituição um sucesso edito-
rial. Em 1545,284 Calvino traduziu para o latim visando dar um alcance maior
aos seus ensinamentos, contribuindo, desse modo, para a maior unidade entre
as Igrejas Reformadas. A partir de 1561, esse Catecismo ganhou maior impor-
tância, visto que, desde então, todo ministro da Igreja deveria jurar fidelidade
aos ensinamentos nele expressos e comprometer-se a ensiná-los.285
281 Esse Catecismo (Em português: Instrução na Fé, Goiânia: Logos Editora, 2003) consistiu num resumo
da primeira edição das Institutas (1536). (Cf. LEITH, J. H. em prefácio à tradução da obra de Calvino e
Paul T. Fuhrmann em “prefácio histórico” à mesma obra, Instruction in Faith (1537), Louisville, Kentucky:
Westminster/John Knox Press, [1992], p. 10 e 16; Cf. LINDSAY, T. M. La Reforma y su Desarrollo Social,
Barcelona: CLIE., (s.d.), p. 101; MCNEILL, J. T. The History and Character of Calvinism, New York:
Oxford University Press, 1954, p. 140. Vd. também, p. 204). Esta foi a primeira “exposição sistemática do
pensamento calvinista na língua francesa.” (FREUNDT JUNIOR, A. H. Catecismo de Genebra: In: ELWELL,
W. A. ed. Enciclopédia Histórico-Teológica da Igreja Cristã, I, p. 246).
Consultar referência.
282 Consultar referência.
283 Este Catecismo pode ser assim esboçado:
I - Fé (1-130).
Introdução (1-18).
Segue a exposição do Credo Apostólico, da seguinte forma:
a) Deus Pai (19-29).
b) Deus Filho (30-87).
c) Deus Espírito Santo (88-91).
d) A Igreja (92-130).
II - Os Dez Mandamentos (131-232).
III - A Oração (233-295) .
IV - A Palavra e os Sacramentos (296-373).
a) A Palavra e o Ministro (296-308).
b) Os Sacramentos (309-373).
- Definição e Significado (309-323).
- Batismo (324-339).
- Ceia do Senhor (340-373).
284 Consultar referência.
285 Consultar referência.
Quanto às Confissões, elas basicamente não foram feitas como um texto para
a instrução na fé Cristã, já que essa era a função dos Catecismos.286 Elas poderiam
ser produzidas por homens individualmente para o seu uso privado (A Segunda
Confissão Helvética), por um Concílio de uma Igreja em particular (Cânones de
Dort), por um indivíduo que age como representante de sua Igreja (Confissão
de Augsburgo), por um grupo de teólogos convocados pelo Estado (Confissão
de Westminster) ou escrita como uma defesa de sua fé em meio a uma terrível
perseguição (A Confissão dos Valdenses) etc. Com isso, estamos dizendo, que
não havia uma regra fixa para a elaboração de uma Confissão, os contextos eram
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“Não vejo, porém, nenhuma razão por que uma igreja, por mais universal-
mente corrompida, desde que contenha uns poucos membros santos, não
deva ser denominada, em honra desse remanescente, de santo povo de Deus.”
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“Todavia, ainda quando a Igreja seja remissa em seu dever, não por isso será
direito de cada um em particular a si pessoalmente assumir a decisão de se-
parar-se.”
287 CALVINO, J. As Institutas, IV.2.5. Calvino entendia que “onde os homens amam a disputa, estejamos
plenamente certos de que Deus não está reinando ali.” [CALVINO, J. Exposição de 1 Coríntios, São
Paulo: Edições Paracletos, 1996, (1Co 14.33), p. 436]. George comenta com acerto, que “Calvino não
estava disposto a comprometer pontos essenciais em favor de uma paz falsa, mas ele tentou chamar a
igreja de volta à verdadeira base de sua unidade em Jesus Cristo.” (George, T. Teologia dos Reformadores,
São Paulo: Vida Nova, 1994, p. 182-183).
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apaixonado e exclusivista, ainda que surgissem novos debates teológicos nos
séculos XVII e XVIII durante o período denominado de “Ortodoxia Protestante”.
Mesmo assim, as diferenças permaneceram sem, contudo, ferir pontos cru-
ciais da Reforma, tais como: a Bíblia como autoridade final; a Justificação pela
graça mediante a fé; o Sacerdócio universal dos Santos; a Suficiência do sacri-
fício de Cristo para nos salvar etc. Assim, os Credos da Reforma tinham três
objetivos específicos:
a. Evidenciar os fundamentos bíblicos de seus ensinos.
b. Demonstrar que as suas doutrinas estavam em acordo com os principais
credos da Igreja (Apostólico, Niceno, Constantinopolitano).
c. Demarcar a sua posição teológica em relação à teologia romana e às demais
correntes provenientes da Reforma.
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C. Confissão Belga (1561)
A Confissão Belga que se inspirou na Confissão Gaulesa (1559) foi escrita em
francês, em 1561, por Guido (ou Guy, Wido) de Brès (1523-1567), com a ajuda
de M. Modetus, Adrien de Saravia (1513-1613) – um dos primeiros protestan-
tes a advogar a ideia de missões estrangeiras e G. Wingen, sendo revisada por
Francis Junius (1545-1602) e publicada a sua tradução em holandês em 1562.
O pastor Guy de Brès escreveu uma carta de defesa aos magistrados.
Lançou-a juntamente com um exemplar de sua recente “Confession de
Foy” por sobre o muro do castelo de Doornick, para assim ser levado
ao governador e ao rei. Se este jamais leu a confissão de fé, não se sabe,
mas ela chegou a ocupar um lugar de suma importância na Igreja Re-
formada holandesa.296
296 SCHALKWIJK, F. L. Igreja e Estado no Brasil Holandês, (1630-1654), Recife, Pe.: FUNDARTE,
(Coleção Pernambucana, 2ª Fase, Vol. 25), 1986, p. 27. Quanto à parte do teor da carta, Vd. FISHER, J. P.
Historia de la Reforma. Barcelona: CLIE., (1984), p. 291.
297 SCHAFF, P. The Creeds of Christendom, 6ª ed. revised and enlarged, Grand Rapids, Michigan: Baker
Book House, 1977, Vol. I, p. 534. McNeill diz a mesma coisa com outras palavras, Vd. MCNEILL, J. T.
The History and Character of Calvinism, p. 270: “Ele (Olevianus) era dois anos mais jovem que Ursinus,
mais eloqüente e menos erudito.”.
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às necessidades cotidianas do povo de Deus.
Ele foi traduzido para todas as línguas da Europa e muitas Asiáticas, sendo
amplamente usado. Devido a essa amplitude de traduções, Schaff (1819-1893)
diz que Heidelberg “tem o dom pentecostal de línguas em um raro grau.”298
298 SCHAFF, P. The Creeds of Christendom, Vol. I, p. 536. Há aqui um dado importante; como sabemos,
os Holandeses estiveram no Brasil no período de 1630 a 1654; ainda que não fosse o âmbito religioso o seu
principal trabalho, não deixaram de atuar também nessa área. Em 1656, Antônio Paraupaba pede socorro
aos Estados Gerais em favor da nação indígena do Brasil que havia abraçado a religião Reformada; a
certa altura diz: “Ajudem agora! A luz da Palavra de Deus será apagada por falta de pastores”. [apud
SCHALKWIJK, F. L. Igreja e Estado no Brasil Holandês: 1630-1654, p. 312]. O trabalho dos holandeses
na publicação de um Catecismo trilingue (holandês, português e tupi), intitulado: “Uma instrução simples
e breve da Palavra de Deus nas línguas brasiliana, holandesa e portuguesa, confeccionada e editada por
ordem e em nome da Convenção Elcesial Presbiterial no Brasil, com formulários para batismo e santa
ceia acrescentados” –, não deixa de ser extremamente interessante, considerando as suas vicissitudes, já
que o Presbitério de Amesterdã não o aprovara, não pelo que dissera, mas pelo que omitira, além de uma
possível suspeita, certamente infundada, de algum viés arminiano. Na realidade, o seu autor, o Rev. David
à Doreslaer com a ajuda do Rev. Vincentius J. Soler confessou ter problemas em expressar determinados
conceitos teológicos em línguas bárbaras. O que ele desejava era fazer um resumo do Catecismo de
Heidelberg (1563) adotado pela Igreja Reformada Holandesa. Assim, o Catecismo que tinha como alvo
principal os índios evangelizados, foi impresso na Holanda, em 1641, chegando em Recife em 1642. Ao
que parece, ele não teve grande utilidade devido aos debates provocados entre o Sínodo da Holanda
e a Companhia das Índias Ocidentais. Schalkwijk, conclui: “Provavelmente, os catecismos ficaram
empilhados em algum lugar, falados demais para serem usados, santos demais para serem queimados.”
(SCHALKWIJK, F. L. Igreja e Estado no Brasil Holandês: 1630-1654, p.324).
Ela foi traduzida para vários idiomas (inclusive o Árabe), tendo ampla aceitação
em diversos países nos anos seguintes, sendo também adotada na Escócia (1566),
na Hungria (1567), na França (1571), na Polônia (1578). Essa Confissão “veio
a ser o elo de união para as igrejas calvinistas espalhadas por toda a Europa.”299
O objetivo primário dessa Assembleia era a revisão dos Trinta e Nove Artigos da
Igreja da Inglaterra. Trabalharam na elaboração da Confissão 121 teólogos e 30 leigos
nomeados pelo Parlamento, a saber: 20 da Casa dos Comuns e 10 da Casa dos Lordes
(nomeação feita em 12/06/1643) e também 8 representantes escoceses, 4 pastores e 4
presbíteros, “os melhores e mais preclaros homens que possuía”302 – sendo que dois deles
nunca tomaram assento –, que, mesmo sem direito a voto, exerceram grande influência.
Os principais debates dessa Assembleia não foram de ordem teológica, já que
praticamente todos eram Calvinistas, mas sim no que se refere ao governo da
Igreja. “Embora houvesse diversidade quanto à Eclesiologia, havia unidade
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quanto à Soteriologia”.303
Nesse particular, havia quatro partidos representados. Os Episcopais: James
Ussher (1581-1656), Brownrigg, Westfield, Prideaux; Presbiterianos: T. Cartwright
(1535-1603), Walter Travers (c. 1548-1635) etc.; Independentes: (Congregacionais),
“Os cinco Irmãos Dissidentes”, conforme eram chamados, eram: Thomas Goodwin
(1594-1665), Philip Nye (1596-1672), Jeremiah Burroughs (1599-1646), William
Bridge (1600-1670), Sidrach Simpson; Erastianos: assim chamados por segui-
rem o pensamento do médico de Heidelberg, Thomas Erasto (1524-1583) – que
defendia a supremacia do Estado sobre a Igreja –, Thomas Coleman, John Selden
(1584-1654), Whitelocke, J. Lightfoot (1602-1675). Esses entendiam que o tra-
balho do pastor era basicamente o de ensino; o pastor é o mestre. Prevaleceu,
no entanto, o sistema Presbiteriano de Governo.
O Breve Catecismo foi elaborado para instruir as crianças; O Catecismo Maior,
especialmente para a exposição no púlpito, ainda que não exclusivamente. Eles
substituíram, em grande parte, os Catecismos e Confissões mais antigos adota-
dos pelas igrejas reformadas de fala inglesa. Apesar da teologia dos Catecismos
e da Confissão de Westminster ser a mesma, sendo, por isso, sempre adotados
os três, parece que os mais usados são o Catecismo Menor e a Confissão.
Esses Credos foram logo aprovados pela Assembleia Geral da Igreja da
Escócia (Confissão - 27/08/1647-, Catecismos Maior e Menor - 28/07/1648),
sendo esse ato homologado pelo Parlamento Escocês em 7 de fevereiro de 1749.
Eles tiveram e têm uma grande influência no mundo de fala inglesa, máxime
entre os Presbiterianos – embora também tenham sido adotados por diversas
igrejas batistas e congregacionais. No Brasil, esses Credos são adotados pela Igreja
Presbiteriana do Brasil, Presbiteriana Independente e Presbiteriana Conservadora.
A. Limites
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Creio ter ficado evidente a relevância dos Credos Evangélicos no que se refere
a sua formulação doutrinária. O ato de depreciar os Credos significa deixar de
usufruir as contribuições dos servos de Deus no passado referentes à compre-
ensão bíblica; “é uma negação prática da direção que no passado deu o Espírito
Santo à Igreja.”304
Por outro lado, os Credos têm o seu limite. O Credo é uma resposta do
homem à Palavra de Deus, sumariando os artigos essenciais da fé cristã. Dessa
forma, eles pressupõem fé,mas não a geram; essa é obra do Espírito Santo atra-
vés da Palavra (Rm 10.17).
Os Credos baseiam-se na Palavra, porém não são a Palavra – nem jamais foi
isso cogitado pelos seus formuladores; eles não podem substituir a Palavra de
Deus; somente ela gera vida pelo poder de Deus (1Pe 1.23; Tg 1.18).
Para os reformados, os Credos têm a sua autoridade decorrente da Palavra
de Deus; em outras palavras, o seu valor não é intrínseco, mas sim extrínseco:
eles são recebidos e cridos enquanto permanecem fiéis à Escritura, assim, a sua
autoridade é relativa. Se isso é assim, alguém poderia insistir: “para que, então,
os Credos se nós temos a Bíblia?”. O Dr. A. A. Hodge (1823-1886), apresenta
uma observação relevante:
304 Berkhof, L. Introduccion a la Teologia Sistematica, p. 22. Stott coloca bem esta questão: “Desrespeitar
a tradição e a teologia histórica é desrespeitar o Espírito Santo que tem ativamente iluminado a Igreja em
todos os séculos.” (STOTT, J. R. W. A Cruz de Cristo. Miami: Editora Vida, 1991, p. 8).
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do povo de Deus e o juízo privado e a sabedoria não auxiliada do objetor
individual. (Hodge, A.A. Esboços de Theologia, 1895, p. 99).
B. Valor e importância
A ideia de Credos desagrada a muitas pessoas, porque os Credos pressupõem
caminhos a serem seguidos; imaginam os Credos como um empobrecimento
espiritual, um amordaçamento do Espírito. Dentro dessa perspectiva, a doutrina
tem pouco valor, o que importa, de fato, é a “vida cristã”, por isso, as ênfases de
tais pessoas ou grupos nas “experiências” – que, via de regra, pretendem convali-
dar a Palavra – ou em um “evangelho” puramente ético-social. Todavia ambos os
comportamentos, que revelam o mesmo equívoco, pecam por não compreende-
rem que a base de uma vida cristã autêntica é uma sólida doutrina vivenciada (Vd.
1Tm 4.16). D. M. Lloyd-Jones (1899-1981), acentuou bem esse ponto, dizendo:
Toda a doutrina cristã visa levar, e foi destinada a levar a um bom resul-
tado prático. (...) A doutrina visa levar-nos a Deus, e a isso foi destinada.
Seu propósito é ser prática (...) a nossa vida cristã nunca será rica, se
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Alinhemos, agora, alguns elementos que atestam a importância e o valor dos Credos:
1. Facilita a confissão pública de nossa fé.
2. Oferece-nos, de forma abreviada, o resultado de um processo cumula-
tivo da história, reunindo as melhores contribuições de diversos servos de
Deus na compreensão da verdade. Em outro lugar, referindo-nos à ciência,
enfatizamos que ela não tem pátria nem idade; não sendo privilégio de um
povo, menos ainda de um indivíduo; todo cientista – usando a figura de
João de Salisbury (c. 1110-1180)305 – equivale a um anão sobre os ombros
de gigantes, valendo-se das contribuições de seus predecessores, a fim de
poder enxergar um pouco além deles. Podemos aplicar essa figura à teo-
logia. Aliás, Packer já o fez, mais especificamente aplicando à tradição:
A tradição nos permite ficar sobre os ombros de muitos gigantes que
pensaram sobre a Bíblia antes de nós. Podemos concluir pelo consenso
do maior e mais amplo corpo de pensadores cristãos, desde os primeiros
Pais até o presente, como recurso valioso para compreender a Bíblia com
responsabilidade. Contudo, tais interpretações (tradições) jamais serão
finais; precisam sempre ser submetidas às Escrituras para mais revisão.306
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5. Preserva a doutrina bíblica das heresias surgidas no decorrer da história,
revelando-se de grande utilidade, especialmente, nas questões controvertidas,
dando-nos uma exposição sistemática e norteadora a respeito do assunto.
6. No que se refere à compreensão bíblica, permite distinguir as nossas
Igrejas das demais.
7. Serve como elemento regulador do ensino ministrado na Igreja bem como
de seu governo, disciplina e liturgia.
“A comunicação que Deus tem com o homem é verdadeira, mas isto não
significa que seja exaustiva. Esta é uma distinção importante que precisa-
mos sempre ter em mente. Para conhecer qualquer coisa exaustivamente,
precisaríamos ser infinitos, como Deus. Mesmo na vida eterna não seremos
assim.”
Fonte: Schaeffer (1981, p. 143).
309 “A tradição é o sangue da teologia. Separada da tradição a teologia é como uma flor cortada sem suas
raízes e sem o solo, logo murcha na mão. Uma sã teologia nunca nasce de novo. Ao honrar a sã tradição,
se assegura a continuidade teológica com o passado. Ao mesmo tempo a tradição cria a possibilidade
de abrir novas portas para o futuro. Como diz o provérbio: ‘A tradição é o prólogo do futuro.’ Por isso,
toda dogmática que se preze como tal, deve definir sua posição em uma ou outra tradição confessional.”
(SPYKMAN, G. J. Teologia Reformacional: Um Nuevo Paradigma para Hacer la Dogmática, Jenison,
MI.: The Evangelical Leitarature League, 1994, p. 5).
310 Consultar referência.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
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De forma abreviada, analisamos a tradição como o resultado de um pro-
cesso cumulativo da história, que reuniu as melhores contribuições de diversos
servos de Deus na compreensão da verdade e compreender pelo consenso do
maior e mais amplo corpo de pensadores cristãos, desde os primeiros pais até o
presente, como recurso valioso para compreender a Bíblia com responsabilidade.
Nesta unidade de estudo ainda, pensamos sobre essas características da reve-
lação, inspiração e iluminação para se conhecer a Deus, perpassando os principais
catecismos da tradição cristã protestante. Visto que o cristianismo é um modo
de vida fundamentado na doutrina, os Credos oferecem uma base sintetizada
para o ensino das doutrinas bíblicas, facilitando a sua compreensão, a fim de que
todos os crentes sejam habilitados para a obra de Deus.
III
UNIDADE
A DOUTRINA DA TRINDADE
Objetivos de Aprendizagem
■■ Compreender a definição da doutrina trinitária.
■■ Conhecer o panorama histórico sobre a teologia da Trindade.
■■ Estabelecer a importância de conhecer os fundamentos bíblicos da
teologia da Trindade.
Plano de Estudo
A seguir, apresentam-se os tópicos que você estudará nesta unidade:
■■ Definição da doutrina
■■ A formulação doutrinária: os credos da igreja a busca de uma
compreensão bíblica
■■ Fundamentos bíblicos da doutrina
■■ A Trindade e a nossa Salvação
■■ A Trindade e as nossas orações
133
INTRODUÇÃO
Nesta terceira unidade de seu livro, trataremos sobre a doutrina cristã da Trindade.
Tal doutrina é peculiar ao cristianismo. E enquanto doutrina bíblica está inti-
mamente ligada com a nossa humanidade, pois são as doutrinas bíblicas que
determinam e pressupõem as experiências religiosas do povo de Deus.
Desde o início do cristianismo, encontramos fórmulas e frases que indicam
o caráter Trino de Deus. Essa ideia clássica da doutrina trinitária explica que
Deus tem “uma substância e três pessoas”. Ainda que essa fórmula não se encon-
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tre explícita nas Escrituras, seu propósito é afirmar o que as Escrituras parecem
dizer a respeito: que o Pai, o Filho e o Espírito Santo são três – não é o mesmo
– mas um só Deus.
Nessa unidade de estudo, propomos um aprofundamento nesse conceito da
triunidade divina, observando de forma progressiva a construção dessa formu-
lação teológica e doutrinária no decorrer da história da igreja cristã.
Introdução
III
DEFINIÇÃO DA DOUTRINA
Para expressar a verdade bíblica de que o Ser de Deus subsiste em três pessoas, a
teologia cristã usa o termo Trindade, palavra essa que não se encontra na Bíblia,
mas, sim, o seu ensinamento. A palavra Trindade é proveniente do latim trinitas,
derivando-se do termo trinus (= triplo), ao que veio corresponder outro sinô-
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nimo tríade, do grego tri/aj que significa um conjunto de três.
Até onde sabemos Teófilo de Antioquia (c. 115-181) – em uma apologia a
respeito do Cristianismo – foi possivelmente o primeiro a usar a palavra Trindade
(tri/aj).312 Tertuliano (c. 155-220) foi o primeiro a usar o termo latino Trinitas313
e, também, o primeiro a tentar sistematizar essa doutrina, ainda que o tenha feito
de forma deficiente, subordinando o Filho e o Espírito ao Pai.314
Em nosso estudo preferimos empregar a palavra Triunidade por acreditar
que ela expressa melhor o ensinamento bíblico de que há um só Deus que sub-
siste em três pessoas.
É necessário enfatizar que quando nos aproximamos desse tema para estu-
dá-lo, temos de fazê-lo com reverente temor e humildade, reconhecendo a
grandiosidade do assunto e a nossa limitação para entendê-lo de forma ade-
quada e explicá-lo de modo correto.
A palavra Triunidade traz em seu bojo quatro ideias fundamentais embasa-
das nas Escrituras, a saber:
1. O Pai é Deus;
2. O Filho é Deus;
3. O Espírito é Deus;
4. Esses três são um só Deus.315
A DOUTRINA DA TRINDADE
135
Definição da Doutrina
III
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Deus. É claro, então, que o Pai não é o Filho e que o Filho não é o Pai; que, tam-
bém, o Espírito Santo não é o Pai ou o Filho.
Para Berkhof (1990, p.88-91),
Entretanto, essas Pessoas, assim distintas, não são divididas nem con-
fundidas entre si. Porque somente o Filho se tornou homem, não o
Pai ou o Espírito Santo. O Pai jamais existiu sem seu Filho e sem seu
Espírito Santo, pois todos os três têm igual eternidade, no mesmo ser.
Não há primeiro nem último, pois todos os três são um só em verdade,
em poder, em bondade e em misericórdia. 320
No “Shemá” 322 (“ouve”), o “credo judeu”, 323 que consistia na leitura de Dt 6.4-9;
11.13-21; Nm 15.37-41 e, possivelmente, Dt 26.5-9.324 O “Shemá” era repetido
três vezes ao dia,325 sendo usado liturgicamente em Sinagoga.326 A instrução ini-
ciava com a afirmação de que há somente um Deus “Ouve, Israel, o SENHOR,
nosso Deus, é o único SENHOR.” (Dt 6.4).
A DOUTRINA DA TRINDADE
137
327 “Pai, Filho e Espírito Santo, cada um possui toda a substância e todos os atributos da divindade. A
pluralidade de Deus não é, portanto, pluralidade de essência, mas de distinções hipostáticas ou pessoais”.
Consultar referência da nota.
328 Consultar referência da nota.
329 Consultar referência da nota.
330 “Tendo criado o homem para ser uma criatura sociável, Deus não só lhe inspirou o desejo e o colocou
na necessidade de viver com os de sua espécie, mas lhe outorgou igualmente a faculdade de falar,
faculdade que deveria constituir o grande instrumento e o laço comum desta sociedade. É daí que provêm
as palavras, as quais servem para representar, e até para explicar as ideias”. Consultar referência da nota.
331 Consultar referência da nota.
332 Consultar referência da nota.
333 Consultar referência da nota.
Definição da Doutrina
III
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
B. A ESSÊNCIA DE DEUS PERTENCE TOTALMENTE POR IGUAL A CADA
UMA DAS TRÊS PESSOAS
A essência divina não está dividida entre as três pessoas como se fossem modulares
e independentes. Deus é plenamente as três pessoas com todas as suas perfeições,
isso equivale, dizer que as Três Pessoas da Trindade têm a mesma essência - O
Deus Pai é tanto Deus Filho como Deus Espírito Santo. Portanto, não há subordi-
nação de essência (ontológica), não há nenhuma diferença em dignidade pessoal.
A única subordinação que podemos falar é da que se refere à ordem e à relação. 334
A DOUTRINA DA TRINDADE
139
pode estatuir ao certo de que natureza seja a massa do sol, que, entre-
tanto, diariamente com os olhos se vê, de à sua parca medida reduzir a
imensurável essência de Deus? (...) Pelo infelicíssimo resultado de qual
temeridade importa-nos ser advertidos, para que tenhamos o cuidado
de aplicar-nos a esta questão com docilidade mais do que com sutileza,
nem incutamos no espírito ou investigar a Deus em qualquer outra parte
que em Sua Sagrada Palavra, ou a Seu respeito pensar qualquer cousa, a
não ser que lhe vá à frente a Sua Palavra, ou falar que não o tomado dessa
mesma Palavra. Ora, se a distinção que em uma só é única divindade
subsiste de Pai, Filho e Espírito, posto que é difícil de apreender-se, causa
a certos espíritos mais dificuldade e problema do que é justo, lembrar-se
devem de que as mentes humanas penetram em um labirinto337 quando
cedem à sua curiosidade e, destarte, por mais que não alcancem a altura
do mistério, deixem-se reger dos oráculos celestes.338
337 Figura semelhante a Calvino empregou para falar a respeito da doutrina da Eleição. “[...] quando
os homens quiserem fazer pesquisa sobre a predestinação, é preciso que se lembrem de entrar no
santuário da sabedoria divina. Nesta questão, se a pessoa estiver cheia de si e se intrometer com excessiva
autoconfiança e ousadia, jamais irá satisfazer a sua curiosidade. Entrará em um labirinto do qual nunca
achará saída. Porque não é certo que as coisas que Deus quis manter ocultas e das quais Ele não concede
pleno conhecimento sejam esquadrinhadas dessa forma pelos homens. Também não é certo sujeitar a
sabedoria de Deus ao critério humano e pretender que este penetre a Sua infinidade eterna. Pois Ele quer
que a Sua altíssima sabedoria seja mais adorada que compreendida (a fim de que seja admirada pelo que
é). Os mistérios da vontade de Deus que Ele achou bom comunicar-nos, Ele nos testificou em Sua Palavra.
Ora, Ele achou bom comunicar-nos tudo o que viu que era do nosso interesse e que nos seria proveitoso”.
(As Institutas da Religião Cristã) “Aprendamos, pois, a evitar as inquirições concernentes a nosso Senhor,
exceto até onde Ele nos revelou através da Escritura. Do contrário, entraremos em um labirinto do qual o
escape não nos será fácil.” (Romanos). Consultar referência da nota.
338 Calvino combateu as especulações com veemência; em diversos lugares ele escreveu sobre o assunto.
Como exemplo: “Porque são mui poucos entre a ingente multidão de homens que existe no mundo os
que pretendem saber qual é o caminho para ir ao céu; porém todos desejam antes do tempo conhecer o
que é que se faz nele.” (As Institutas, III.25.11; Veja-se. também I.5.9). “As cousas que o Senhor deixou
recônditas em secreto não perscrutemos as que puseram a descoberto não negligenciemos, para que não
sejamos condenados ou de excessiva curiosidade, de uma parte, ou de ingratidão, de outra.” (As Institutas,
III.21.4). “Nem nos envergonhemos em até este ponto submeter o entendimento à sabedoria imensa de
Deus, que em Seus muitos arcanos sucumba. Pois, dessas cousas que nem é dado, nem é lícito saber, douta
é a ignorância, a avidez de conhecimento, uma espécie de loucura.” (As Institutas, III.23.8). Consultar
referência da nota.
Definição da Doutrina
III
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
A FORMULAÇÃO DOUTRINÁRIA: OS CREDOS DA
IGREJA A BUSCA DE UMA COMPREENSÃO BÍBLICA
Kuyper (2010, p. 57) diz que: “Deus permitiu aos heréticos fustigarem sua Igreja
exatamente para despertar a mente pelo conflito e para levá-la a buscar a Palavra
de Deus.”. Já Santo Agostinho (1991, p. 143) diz que: “A ciência da definição, da
divisão e da classificação, ainda que seja empregada muitas vezes para coisas fal-
sas, não é por si só falsa; nem foi instituída pelos homens, mas descoberta pela
própria razão das coisas.”.
Definir, segundo o sentido etimológico339 é delimitar. A definição procura deter-
minar a compreensão da ideia,340 circunscrevendo a sua abrangência, indicando
todos os seus elementos constitutivos. Como todo conceito possui um conteúdo,
a definição nada mais é do que a determinação da natureza desse conteúdo.
Aristóteles (384-322 a.C.), compreendia a definição como consistindo “no
gênero e nas diferenças; e se, por outro lado, não é um desses termos, evidente-
mente, será um acidente.” (1973, p. 17).
Do ponto de vista lógico, a ideia é igual a sua definição. A definição lógica
consiste de fato em delimitar exatamente a compreensão de um objeto, ou, em
outros termos, em dizer o que uma coisa é. Daí o princípio “A definição é a noção
(ideia) desenvolvida e [...] a noção é a definição condensada”. 341
339 As palavras gregas correspondentes são: o(/roj = “termo”, “limite” e o(rismo/j = “delimitação”, “acordo”,
“tratado”. Consultar referência da nota.
340 É a “expansão do conceito essencial das coisas”. “Definição é uma oração que manifesta a natureza de
uma coisa ou de um termo”. Consultar referência da nota.
341 Consultar referência da nota.
A DOUTRINA DA TRINDADE
141
A definição se propõe a nos fazer ver com maior clareza o assunto do qual
tratamos. A “indefinição” acarreta uma série de omissões e equívocos, justa-
mente, por não termos claro diante de nós o objeto do qual estamos tratando
ou, em que sentido nos aproximou de cada ideia.
Condillac (1715-1780) assim expressou essa questão: “A necessidade de defi-
nir é apenas a necessidade de ver as coisas sobre as quais se quer raciocinar e, se
fosse possível ver sem definir, as definições se tornariam inúteis”. (1973, p. 121). 342
Como toda a Lógica, a definição respalda-se no Princípio de Contradição
– “Nada pode simultaneamente ser e não ser”343 –, portanto, uma definição não
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
pode ser contraditória com a própria essência do definido; antes, ela deve convir
a todo o definido e somente a ele. Assim sendo, será possível substituir a defi-
nição pelo definido sem possibilidade de equívoco, caso contrário não haveria
interesse na definição, tantas as confusões que ela provocaria.
A observação de Espinosa (1632-1677) nos orienta que “A verdadeira defini-
ção de cada coisa não envolve nem exprime senão a natureza da coisa definida.”344
O princípio que deve nos nortear é que a definição deve primar pela essência,
não pelos “acidentes” que normalmente são efêmeros e não indicam as qualida-
des intrínsecas do ser.345
Aristóteles (384-322 a.C.) está correto ao dizer “Uma definição é uma frase
que significa a essência de uma coisa.”346
O historiador Huizinga (1872-1945) apresenta-nos um bom princípio:
Uma boa definição deve ser concisa, ou seja, expor o conceito que se trata
de definir com toda precisão e de um modo completo, no menor núme-
ro de palavras. A definição descreve o significado de uma determinada
palavra, usada para designar um determinado fenômeno. Na definição
deve ficar inscrito, incluído o fenômeno em sua totalidade. Permanecem-
-se fora dela partes essenciais do fenômeno, a definição não é boa. Por
outro lado, uma definição não precisa entrar em detalhes. (1994, p. 87).
ORIGEM E USO
A palavra “Credo” é derivada do latim “credo”, que denota uma postura ativa
de “eu creio”, uma confiança perene em Deus. Portanto, há na declaração cre-
dal um ato de adoração a Deus a quem damos crédito. Assim, os credos são
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
antes de tudo uma confissão de gratidão à glória de Deus.347 No credo a Igreja
declara a sua fé em Deus visto que somente Ele é absolutamente digno de crédi-
to.348 Curiosamente, em hebraico, confessar tem o sentido também de publicar,
anunciar os feitos de Deus: Davi, por exemplo, usa a palavra em dois dos sal-
mos penitenciais:349 “Confesso (dg;n")(nagad) 350 a minha iniquidade; suporto
tristeza por causa do meu pecado” (Sl 38.18). “Abre, Senhor, os meus lábios, e a
minha boca manifestará (dg;n")(nagad) os teus louvores” (Sl 51.15). A confissão
sincera é um ato de benevolência de Deus que inclina o nosso coração ao arre-
pendimento e à confissão. Quando, por graça, assim fazemos, rendemos graças
a Deus pela sua justiça e por sua graça. “A ideia de ‘confissão’ era ambivalente,
pois, ao reconhecer-se justo o julgamento, confessava-se o extravio e era dado a
esta declaração um tom de louvor a Deus”.351
Ainda mais ilustrativas são duas outras palavras hebraicas tam-
bém traduzidas por confissão; ([dy) (yada`)352, “conhecer”, “pensar”,
“reconhecer”, “discernir” e ([dy) (yadah)353, “confessar”, “dar graças”, “agradecer”.
347 Sugestivas observações de Thomas H. McDill no prefácio à obra: Paul T. Fuhrmann. Consultar
referência da nota.
348 Consultar referência da nota.
349 Os Salmos classificados como Penitenciais são: 6, 32, 38, 51, 102, 130 e 143. Neles encontramos forte
alento para o pecador perdoado. Consultar referência da nota.
350 O sentido básico é de “declarar”, “publicar”, “tornar conhecido”, “anunciar”, “manifestar” e “expor”.
351 Consultar referência da nota.
352 Consultar referência da nota.
353 Consultar referência da nota.
A DOUTRINA DA TRINDADE
143
Ambas comportam vários significados literais e figurados. ([dy) (yadah) tem tam-
bém o sentido de “declarar”, “confirmar”, “homologar”. Isso independe do teor da
declaração; podendo, portanto, ser uma confissão de fé ou de pecado354, envolvendo
a ideia de reconhecimento, especialmente de louvor.355 Uma das ideias prepon-
derantes, é o de “confessar ou declarar a glória de Deus”356. É por isso que ([dy)
(yadah) é traduzida muitas vezes por: a) Render graças: (Sl 7.17; 57.9; 107.1,8, 15,
21,31; 118.19,21, 28, 29; 119.7); b) Dar graças (Sl 30.4,12; 35.18; 52.9; 106.47; Is
12.1,4); c) Louvar (Sl 6.5; 9.1; 28.7; 30.9; 42.5,11; 43.4-5; 44.8; 45.17; 49.18; 54.6;
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67.3 (2 vezes); Is 25.1); d) Glorificar (Sl 18.49); e) Celebrar (Sl 33.2); f) Confessar
(os pecados) (Lv 16.21; 1Rs 8.33,35; Ed 10.1; Ne 1.6; 9.2-3; Sl 32.5; Dn 9.4,20);
g) Confessar (o nome de Deus) (2Cr 6.24,26).
A Bíblia apresenta diversas confissões que consistem em expressões de
fé, as quais eram ensinadas. Parece haver acordo entre os estudiosos no que
diz respeito às evidências neotestamentárias referentes a um corpo doutriná-
rio específico, considerado como “depósito sagrado da parte de Deus”357. No
Antigo Testamento, encontramos o “Shemá” 358 (“ouve”), o “credo judeu” 359,
que consistia na leitura de Dt 6.4-9; 11.13-21; Nm 15.37-41 e, possivelmente,
Dt 26.5-9.360 O “Shemá” era repetido três vezes ao dia361, sendo usado liturgi-
camente em Sinagoga362. No Novo Testamento deparamo-nos com abundante
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gue aos santos” (Jd 3/1Tm 1.19; Tt 1.13) e à “fé santíssima” (Jd 20).364
Outros textos parecem indicar as primeiras confissões da Igreja, tais como:
“Jesus, o Cristo” (At 5.42); “Jesus Cristo é Senhor” (Fp 2.11/1 Co 12.3); “Senhor é
Deus” (Jo 20.28); “Deus e Salvador Jesus Cristo” (At 2.13); “Senhor e Cristo” (At
2.36); “Jesus Cristo Filho de Deus” (At 8.37; Mt 16.16; 1Jo 4.15), etc.365 Vejam-se
também: Mt 28.19; 1Co 15.3-7; Fp 2.6-11; 1Co 11.23-27.
Os Credos em princípio não pretendem ser uma exposição exaustiva da fé,
antes consistem em uma declaração de fé dos pontos considerados essenciais à
existência da Igreja Cristã. Primitivamente, os Credos e Confissões eram empre-
gados principalmente da seguinte forma:
Doutrinariamente:
Serviam como ensino proposicional a respeito da fé cristã, ao mesmo tempo em
que combatiam ênfases ou ensinamentos essencialmente errados366, resguardando,
assim, a Igreja, de ensinamentos heréticos367 concedendo certa uniformidade de
fé nos convertidos368. No segundo século, eles eram conhecidos como “regra de
A DOUTRINA DA TRINDADE
145
369 Os “Pais da Igreja” e alguns Concílios usaram com certa frequência a expressão “cânon” que, via de
regra visava distinguir os ensinamentos da Igreja cristã das heresias que surgiam. Abaixo, poderemos
constatar, dentro da documentação disponível, alguns dos diversos e valiosos testemunhos dos Pais e
Concílios da Igreja. Clemente (c. 30-100), bispo de Roma (91-100), por volta do ano 95 AD., deparou-se
com uma grave dissensão na Igreja de Corinto, causada por alguns jovens que não estavam obedecendo
aos presbíteros da Igreja. Clemente então, no mesmo ano, escreveu uma carta à Igreja, na qual ele os
exorta à humildade e obediência, segundo o exemplo de Cristo, para que possam assim, chegar à unidade
e paz. Estimulando a Igreja arrependida a uma caminhada segura em Cristo, diz: “Prossigamos para
a gloriosa e venerável regra (kanw/n) de nossa tradição” (Clemente de Roma, Epístola aos Coríntios,
I.7.2). Clemente de Alexandria (c. 150-c. 215), chamou a harmonia entre o Antigo e o Novo Testamento
de “um cânon para a Igreja” (Clemente de Alexandria, The Stromata, VI.15. In: ANF., II, p. 506-511.
(Veja-se também, VI.11; VII.16)). Ele também escreveu um livro contra os judaizantes, intitulado,
“Cânon eclesiástico ou contra os judaizantes” (Eusebio de Cesarea, Historia Eclesiástica, VI.13.3. Irineu
(c.120-202), chama o “credo batismal” – que deveria ser guardado sem nenhuma modificação no
coração –, de “O cânon da verdade” (Irineu, Against Heresies, I.9.4. In: ANF., I, p. 330. Veja-se também,
Against Heresies, I.10.1; III.4.1). Policarpo (c. 70-155), refere-se ao “Evangelho” como “cânon da fé”
(Eusebio de Cesarea, Historia Eclesiástica, V.24.6). Entre os anos de 264 e 268, três Sínodos reuniram-
se sucessivamente em Antioquia, tendo como objetivo julgar a conduta e os ensinamentos de Paulo de
Samosata, bispo de Antioquia desde 260. O último dos três sínodos (268) o condenou e o excomungou
por “heterodoxia” (e(terodoci/an). A sua doutrina e conduta foram classificadas como sendo uma
“apostasia do cânon” (“a)posta\j tou= kano/noj”) (Eusebio de Cesarea, Historia Eclesiástica, VII.30.6); ou
seja, o abandono da fé ortodoxa. Como pudemos observar, o emprego da expressão “cânon” pelos Pais
e Concílios da Igreja, tinha o sentido de um padrão aprendido e recebido como verdadeiro. Uma outra
expressão usada e, pelo que deduzimos, tinha o mesmo significado, era: “regra de fé” (Cf. o uso feito por
Tertuliano, Da Prescrição dos Hereges, 13. In: Cirilo Folch Gomes, (compilador). Antologia dos Santos
Padres, 2. ed. (revista e ampliada), São Paulo: Paulinas, 1980. § 254, p. 162 e ANF., III, p. 249; Novaciano,
Sobre a Trindade: In: Cirilo Folch Gomes, (compilador). Antologia dos Santos Padres, § 309, p. 201) e,
“regra dos antigos” (Conforme uso de Basílio, Profissão de Fé: In: Cirilo Folch Gomes, (compilador).
Antologia dos Santos Padres, § 365, p. 239). Em outras palavras, o “cânon eclesiástico” (kanw\n th=j e)
kklhsi/aj), quando não se referia aos Livros da Bíblia, significava a doutrina ortodoxa da Igreja, aquilo que
a Igreja sustentava como verdade. (Para mais detalhes sobre este assunto, Veja-se: Hermisten M.P. Costa,
A Inspiração e Inerência das Escrituras: Uma Perspectiva Reformada, São Paulo: Editora Cultura Cristã,
1998). Consultar referência da nota.
370 Ambrósio de Milão (c. 334-397) escreveu: “Os santos apóstolos juntos fizeram um resumo da fé, a fim
de que pudéssemos compreender brevemente o elenco de toda a nossa fé. A brevidade é necessária, para
que ela seja sempre mantida na memória e na lembrança”. Consultar referência da nota.
Liturgicamente:
a. Batismo: Os fiéis declaravam (no caso de serem adultos)371 responsiva-
mente a sua fé na ocasião do batismo372 (Veja em: At 8.37; Rm 10.9)373 e
declaratoriamente374.
b. Santa Ceia: Na Eucaristia a Igreja declarava a sua fé por meio de hinos,
orações e exclamações devocionais. (Veja em: 1Co 12.3; 16.22; Fp 2.5-11).
c. Culto: Ao que parece, a partir do quarto século, os credos passaram a ser
usados nos cultos regulares, sendo recitados após a leitura das Escrituras.
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Com o passar do tempo, os credos foram se tornando mais detalhados, isto por
três motivos: 1) Devido à compreensão mais aprimorada das doutrinas bíblicas;
2) Considerando o intenso crescimento da igreja (séc. III), instruir os neófitos
para que esses não fossem facilmente conduzidos pelas heresias; 3) Devido à
necessidade de, mediante o ensino cristão, combater as heresias375 que surgiam,
marcadamente, relacionadas com a Pessoa de Cristo.376 Nesse contexto, são ela-
borados quatro Credos que são considerados os mais importantes dos cinco
primeiros séculos que veremos no momento oportuno.
A DOUTRINA DA TRINDADE
147
diante o qual todas as coisas foram feitas, tanto as que estão no céu como
as que estão na terra; o qual, por nós homens e por nossa salvação, desceu,
encarnou-se e se fez homem e sofreu e ressuscitou ao terceiro dia, subiu ao
céu, e novamente virá para julgar os vivos e os mortos;
E no ESPÍRITO SANTO. E quantos dizem “Houve tempo em que não era”; e
“Antes de nascer, Ele não era”, ou que “Foi feito do que não existe”, bem como
quantos alegam ser o Filho de Deus “de outra substância ou essência”, ou
“feito”, ou “mutável”, ou “alternável”, a todos esses a Igreja católica e apostó-
lica anatematiza.
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encontradas dessa verdade que, especialmente, olhadas à luz do Novo Testamento,
adquirem maior eloquência e firmeza. Dentro da revelação progressiva de Deus,
encontramos gradativamente o desvelar da ação trinitária de Deus. Os compo-
nentes revelados dentro do organismo da revelação conferem forte evidência da
doutriana da Trindade. 377
A DOUTRINA DA TRINDADE
149
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o Espírito de Deus pairava por sobre as águas”.
■■ Salmo 33.6 - “Os céus por sua (yehôvâh) palavra se fizeram, e, pelo sopro
(ruah) de sua boca, o exército deles”.
■■ Isaías 48.16 - “Chegai-vos a mim e ouvi isto: não falei em segredo desde
o princípio; desde o tempo em que isso vem acontecendo, tenho estado
lá. Agora, o SENHOR Deus me enviou a mim e o seu Espírito”.
■■ Isaías 63.7-10 - “7Celebrarei as benignidades do SENHOR e os seus atos
gloriosos, segundo tudo o que o SENHOR nos concedeu e segundo a
grande bondade para com a casa de Israel, bondade que usou para com
eles, segundo as suas misericórdias e segundo a multidão das suas benig-
nidades. 8 Porque ele dizia: Certamente, eles são meu povo, filhos que não
mentirão; e assim ele se tornou o seu Salvador. 9 Em toda a angústia deles,
ele foi angustiado, e o Anjo da sua presença os salvou; pelo seu amor e
pela sua compaixão, ele os remiu; e os tomou e os conduziu todos os dias
da antiguidade. 10 Mas eles foram rebeldes e contristaram o seu Espírito
Santo, pelo que se lhes tornou em inimigo e ele mesmo pelejou contra eles”.
■■ Ageu 2.4-5 - “4Ora, pois, esforça-te, Zorobabel, diz o SENHOR, e esforça-
-te, Josué, filho de Jozadaque, sumo sacerdote, e esforça-te, todo o povo da
terra, diz o SENHOR, e trabalhai; porque eu sou convosco, diz o SENHOR
dos Exércitos. 5 Segundo a palavra da aliança que fiz convosco, quando
saístes do Egito, o meu Espírito permanece no meio de vós; não temais.”
A DOUTRINA DA TRINDADE
151
do Anjo do Senhor como Deus “Vendo o SENHOR (yehovah) que ele se voltava
para ver, Deus (‘elohiym), do meio da sarça, o chamou e disse: Moisés! Moisés!
Ele respondeu: Eis-me aqui!” (Êx 3.4). Na sequência, o Anjo se identifica como
o Deus de Abraão, Isaque e Jacó “Disse mais Eu sou o Deus (‘elohiym) de teu pai,
o Deus (‘elohiym) de Abraão, o Deus (‘elohiym) de Isaque e o Deus (‘elohiym) de
Jacó. Moisés escondeu o rosto, porque temeu olhar para Deus (‘elohiym)” (Êx 3.6).
Nesses e outros textos, podemos observar que o Anjo é identificado como
Deus (Gn 22.11,16; 31.11,13); o Anjo é distinguido de Deus (Gn 16.9,13; 48.15,16)
e, o Anjo aceita adoração devida somente a Deus (Êx 3.2; 4.5; Jz 13.20-22/Ap
22.8-9). 381
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isso, Deus, o teu Deus, te ungiu com o óleo de alegria, como a nenhum
dos teus companheiros”.
■■ Malaquias 3.1 - “Eis que eu envio o meu mensageiro, que preparará o
caminho diante de mim; de repente, virá ao seu templo o Senhor, a quem
vós buscais, o Anjo da Aliança, a quem vós desejais; eis que ele vem, diz
o SENHOR dos Exércitos”.
c. Ele é Filho de Jeová
■■ Salmo 2.7 - “Proclamarei o decreto do SENHOR Ele me disse Tu és meu
Filho, eu, hoje, te gerei”.
■■ Provérbios 30.4 - “Quem subiu ao céu e desceu? Quem encerrou os ventos
nos seus punhos? Quem amarrou as águas na sua roupa? Quem estabele-
ceu todas as extremidades da terra? Qual é o seu nome, e qual é o nome
de seu filho, se é que o sabes?”.
NO NOVO TESTAMENTO
A DOUTRINA DA TRINDADE
153
De forma mais específica, podemos dizer que a salvação que era atribuída a Jeová
no Antigo Testamento (Jó 19.25. Sl 9.14; 78.35; 106.21; Is 41.14; 43.3,11,14; 47.4),
no Novo Testamento é atribuída ao Filho de Deus (Mt 1.21; Lc 1.76-79; 2.17; Jo
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simplesmente especulando, antes, mostrando como esta doutrina (Trindade)
está amparada nas Escrituras e como ela tem uma relação direta com a experi-
ência do cristão resultante da sua salvação em Cristo385.
Sem as obras da Trindade, jamais seríamos salvos pela graça. A graça de
Deus, que é personificada em Cristo, é apenas um lado das obras redentoras
do Deus Triúno. Toda a Trindade está comprometida na salvação do Seu povo,
tendo cada uma das Pessoas da Santíssima Trindade, conforme o Conselho tri-
nitário, um papel fundamental.
A obra do Espírito é distinta da obra do Pai e do Filho, porém, não é inde-
pendente. A Trindade opera conjuntamente, tendo o mesmo propósito eterno
a glória do próprio Deus por intermédio da salvação do Seu povo (Is 43.7/Ef
1.6; 1Pe 2.9,10) 386. A Teologia Reformada, fiel aos ensinamentos das Escrituras,
ensina esta verdade. Packer comentando esse ponto, disse:
Deus – O Jeová Triúno, Pai, Filho e Espírito Santo; três pessoas traba-
lhando em conjunto, em sabedoria, poder e amor soberanos, a fim de
realizar a salvação de um povo escolhido. O Pai escolhendo, o Filho
cumprindo a vontade do Pai de remir, o Espírito executando o propó-
sito do Pai e do Filho mediante a renovação do homem. (1986, p. 9) 387.
A DOUTRINA DA TRINDADE
155
É precisamente isso que estamos dizendo, quando declaramos que a nossa sal-
vação é por Deus - O Deus Triúno - autor e o executor da nossa salvação; do
princípio ao fim, a salvação é obra do Deus da graça. Paulo estimulando os fili-
penses, inspirado por Deus, fala de sua convicção inabalável “Estou plenamente
certo de que aquele que começou boa obra em vós há de completá-la até ao Dia
de Cristo Jesus” (Fp 1.6) 388.
A Obra do Espírito torna efetivo em nós aquilo que Cristo realizou definitiva-
mente por nós. Podemos afirmar que sem as operações do Espírito, o Ministério
Sacrificial de Cristo não teria valor objetivo para os homens, visto que os méri-
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388 “A graça começa, continua e termina a obra da salvação no coração de uma pessoa.” (SPURGEON,
1992, p. 45). “[...] Em sua inteireza a nossa salvação procede do Senhor. É sua realização. Ele mesmo
apresenta Sua noiva a Si mesmo por que ninguém mais pode fazê-lo, ninguém mais é competente
para fazê-lo. Somente Ele pode fazê-lo. Ele fez tudo por nós, do princípio ao fim, e concluirá a obra
apresentando-nos a Si mesmo com toda esta glória aqui descrita.” (LLOYD-JONES, 1991, p. 137). Do
mesmo modo acentua Murray (1993, p. 98): “A salvação é do Senhor, tanto em sua aplicação como em sua
concepção e realização”. Consultar referência da nota.
389 A aplicação da redenção pelo Espírito Santo não pode, em nenhum sentido, ser transformada na
aquisição da redenção, pois, embora o Espírito Santo receb a todas as coisas de Cristo, a aplicação nesse
campo de operação é tão necessária e tão importante quanto à aquisição. (...) E, a esse respeito, a aquisição
e a aplicação estão tão fortemente ligadas que a primeira não pode ser concebida nem existir sem a
segunda e vice-versa”. (BAVINCK, 2012, p. 221). Consultar referência da nota.
390 Consultar referência da nota.
391 Consultar referência da nota.
392 “De fato a graça reina, mas uma graça reinante à parte da justiça não é apenas inverossímil, mas
também inconcebível”. (MURRAY, ANO, p. 19). Consultar referência da nota.
393 Consultar referência da nota.
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que Deus, pelo Espírito, aplicará os méritos de Cristo no coração do Seu povo.
Portanto, aqui, está a nossa responsabilidade e o nosso conforto, conforme bem
observou Graham (1982, p. 30):
O Espírito Santo é o grande comunicador do Evangelho, usando como
instrumento pessoas comuns como nós. Mas é dele a obra. Assim,
quando o Evangelho é fielmente proclamado, o Espírito Santo é quem
o envia como dardo flamejante aos corações dos que foram prepara-
dos. 394
394 A consciência de que os “resultados” da Evangelização dependem do Deus soberano, traz como
implicação a nossa ousada confiança em Deus, não em nossos métodos. (GRAHAM, 1982). Packer
analisou bem este ponto, fazendo aplicações complementares: “Se esquecermos que a prerrogativa
de Deus é produzir resultados quando o evangelho é pregado, acabaremos pensando que é nossa
responsabilidade assegurá-los. E, se nos esquecermos de que somente Deus pode infundir fé, acabaremos
pensando que a conversão, em última análise, depende não de Deus, mas de nós, e que o fator decisivo é
a maneira como evangelizamos. E essa linha de pensamento, coerentemente seguida, nos fará desviar em
muito.” (PACKER, 1990, p. 22). Consultar referência da nota.
A DOUTRINA DA TRINDADE
157
Segundo Calvino (2001, p.288), “Quando o Espírito nos testifica que somos filhos
de Deus, ele, ao mesmo tempo, imprime esta confiança em nossos corações, para
que ousemos invocar a Deus como nosso Pai”. O Espírito é quem nos ensina a
orar como convém, ou seja, orar segundo a vontade de Deus. A oração é educa-
tiva, pois nos desafia a confiar nas promessas de Deus registradas na Sua Palavra
e, assim, na medida em que confiamos, podemos amadurecer a nossa fé através
do aprendizado experiencial, de que Deus cumpre fielmente as Suas promessas.
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O Espírito nos dirige para que não usemos o nome do Filho em vão porque
somente Ele pode nos mostrar qual é a vontade de Deus e nos capacitar a acei-
tá-la com fé. Quando oramos no Espírito estamos confessando a nossa pequenez
e, ao mesmo tempo, testemunhando a nossa fé na soberania de Deus.
“O Espírito constrói uma determinada atmosfera em torno de toda a oração
autêntica, e dentro desse círculo próprio é que a oração vive e triunfa; fora dele,
a oração é apenas uma formalidade morta”, comentou Spurgeon. (1987, p. 85).
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ção eficaz é aquela que tem o Espírito como seu autor. Sem o auxílio do Espírito,
jamais oraremos com discernimento.
Calvino (1509-1564), analisando o fato de que pedimos tantas coisas erradas
a Deus e que, se Ele nos concedesse o que solicitamos, traria muitos males sobre
nós395, enfatiza “Não podemos nem sequer abrir a boca diante de Deus sem grande
perigo para nós, a não ser que o Espírito Santo nos guie à forma devida de orar” 396.
A oração genuína é sempre precedida do senso de necessidade e de uma fé
autêntica nas promessas de Deus. Graças a Deus porque todos nós, em Cristo,
temos o Espírito de oração (Zc 12.10), porque sem Ele jamais poderíamos orar
de modo aceitável ao Pai. “A própria oração é uma forma de adoração”, segundo
Sproul (1997, p. 187).
Por outro lado, o auxílio do Espírito não deve servir de pretexto para a nossa
indolência e irresponsabilidade espiritual. Interpreta Calvino (As Institutas, III.1.1),
Aqui não se diz que, lançando o ofício da oração sobre o Espírito de
Deus, podemos adormecer negligentes ou displicentes, como alguns se
acostumaram a blasfemar, dizendo Devemos ficar à espera, sem nenhu-
ma preocupação, até que o Espírito chame a atenção da nossa mente,
até então ocupada e distraída com outras coisas. Muito ao contrário,
aqui somos induzidos a desejar e a implorar tal auxílio, com aversão e
desgosto por nossa preguiça e displicência.397
395 Claraval (1090-1153), disse: “Não permitam que eu tenha tamanha miséria, pois dar a mim o que
desejo, dar a mim o que meu coração almeja, é um dos mais terríveis julgamentos do mundo.” Consultar
referência da nota.
396 Comentando o texto de Romanos 8.26, Calvino diz: “O Espírito, portanto, é Quem deve prescrever a
forma de nossas orações”. (Calvino, 1997, p. 291). Consultar referência da nota.
397 Consultar referência da nota.
A DOUTRINA DA TRINDADE
159
E ainda nos exorta dizendo: “Quando nos sentirmos frios, e indispostos para
orar, supliquemos logo ao Senhor que nos inflame com o fogo de seu Espírito,
pelo qual sejamos dispostos e suficientes para orar como convém”398. Muitas
vezes, estamos tão confusos diante das opções que temos, que não sabemos nem
mesmo como apresentar os nossos desejos e as nossas dúvidas diante de Deus.
Todavia o Espírito nos socorre. Ele “ora a nosso favor quando nós mesmos deve-
ríamos ter orado, porém não sabíamos para que orar”399.
Comentando o Salmo 91.12, diz que: “Nunca podemos aquilatar os sérios
obstáculos que Satanás poria contra nossas orações não nos sustentasse Deus
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Precisamos, portanto, “Que o mesmo Deus nos ensine, conforme ao que Ele
sabe que convém, e que Ele nos leve guiando como que pela mão, e que nós
o sigamos. 402” (CALVINO, J. As Institutas, III.1.1). Orar como convém é orar
segundo a vontade de Deus, colocando os nossos desejos em harmonia com o
santo propósito de Deus403; isto só é possível pelo Espírito de Deus que se conhece
perfeitamente (1Co 2.10-12)404. Assim, toda oração genuína é sob a orientação
e direção do Espírito (Ef 6.18; Jd 20).
O Espírito ora conosco e por nós. Ele, juntamente com Cristo, em esferas dife-
rentes, intercede por nós, como contrasta Kuyper (1837-1920)406:
Cristo intercede por nós no céu, e o Espírito Santo na terra. Cristo
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nosso Santo Cabeça, estando ausente de nós, intercede fora de nós; o
Espírito Santo nosso Consolador intercede em nosso próprio coração
quando Ele o santifica como Seu templo. (1995, p. 670)
Spener (1996, p.119), falando sobre a oração, segue uma linha semelhante “Não é
suficiente que se ore exteriormente, com a boca, pois a oração verdadeira e mais
necessária acontece no nosso ser interior, podendo expressar-se em palavras ou
permanecer na alma, mas, de qualquer maneira, lá acha e encontra Deus.” 409
A DOUTRINA DA TRINDADE
161
O Espírito, que procede do Pai e do Filho, é quem nos guia em nossas ora-
ções, fazendo-nos orar corretamente ao Pai. De fato, Deus propiciou para nós
todos os elementos fundamentais para a nossa santificação (2Pe 1.3); a ação do
Espírito aponta nesta direção, indicando também, que as nossas orações são
“imperfeitas, imaturas e insuficientes”, por isso Ele nos auxilia, ensinando-nos
a orar como convém.
Paulo fala que nós, os crentes em Cristo, recebemos o Espírito de ousada
confiança em Deus, que nos leva, na certeza de nossa filiação divina, a clamar
”Aba, Pai”. ”Porque não recebestes o espírito de escravidão para viverdes outra
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410 Conforme expressão de Lloyd-Jones (1984, p. 358). A relação feita por Calvino entre a oração e a
convicção de nossa filiação divina. (CALVINO, s/d, p. 279-280)
Orar ao Pai não significa simplesmente usar o seu nome, mas, sim, diri-
gir-nos de fato a Ele conforme os seus preceitos, em submissão à sua vontade.
Uma oração francamente oposta aos ensinamentos de Jesus não pode ser con-
siderada de fato uma oração dirigida ao Pai, por mais que usemos e repitamos
o nome de Jesus.
O problema, dentro do contexto vivido por Jesus, é que muitos dos judeus,
na realidade, ofereciam as suas orações aos homens, mesmo usando o nome de
Deus. Usar o nome de Deus não é garantia de estarmos nos dirigindo a Ele. Do
mesmo modo, podemos estar tão preocupados com a forma de nossas orações
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que nos esquecemos do Pai. É a Ele que a nossa oração é destinada, portanto,
cabe a Ele, que vê em secreto, julgá-la. A nossa oração não necessita ter publi-
cidade para que Deus a ouça. Ele vê em secreto e nos recompensa conforme o
que vê. (Mt 6.6).
No Antigo Testamento, por intermédio de Isaías, Deus recrimina os judeus
dizendo que eles sacrificavam simplesmente porque gostavam de fazê-lo, não por-
que quisessem agradá-lo. O ritual é que era prazeroso, não a satisfação de Deus:
Como estes escolheram os seus próprios caminhos, e a sua alma se de-
leita nas suas abominações, assim eu lhes escolherei o infortúnio e farei
vir sobre eles o que eles temem; porque clamei e ninguém respondeu,
falei, e não escutaram; mas fizeram o que era mau perante mim, e esco-
lheram aquilo em que eu não tinha prazer. (Is 66.3-4).
A DOUTRINA DA TRINDADE
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
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do Evangelho, sustentando uma fé indefinida e, por isso, mesmo superficial, não
condizente com a plenitude da revelação bíblica. Compreendemos que nas pági-
nas do Novo Testamento a doutrina da Triunidade é apresentada de forma mais
clara e completa, ampliando aquilo ao que o Antigo Testamento apenas alude.
Nessa unidade de estudo, propusemos um aprofundamento nesse conceito
da triunidade divina, observando que o Espírito de Deus é distinto de Deus de
forma progressiva a construção dessa formulação teológica e doutrinária no
decorrer da história da igreja cristã.
A DOUTRINA DA TRINDADE
165
A. Credo Apostólico
O credo dos apóstolos tem a sua origem no credo Romano Antigo, elaborando no se-
gundo século, tendo algumas declarações doutrinárias acrescentadas no decorrer dos
primeiros séculos, chegando à sua forma como temos hoje, por volta do sétimo. Paul
Tillich (1886-1965), comentando a primeira declaração de fé deste credo – “Creio em
Deus pai todo-poderoso criador do céu e da terra” -, diz que “deveríamos pronunciar es-
sas palavras com grande reverência porque por meio dessa confissão, o cristianismo se
separou da interpretação dualista da realidade presente no paganismo [...]. O primeiro
artigo do credo é a grande muralha que o cristianismo ergueu contra o paganismo. Sem
essa separação, a cristologia teria inevitavelmente se deteriorado em um tipo de gnos-
ticismo no qual o Cristo não seria mais do que um dos poderes cósmicos entre outros,
embora, talvez, o maior deles”.
O Credo Apostólico era usado na preparação dos catecúmenos, professado durante o ba-
tismo, servindo também para a devoção privada dos cristãos. Posteriormente, passou a ser
recitado com a Oração do Senhor no culto público. No nono século, ele foi sancionado pelo
Imperador Carlos Magno para uso na Igreja e, o papa o incorporou à liturgia Romana.
A Reforma valorizou esse Credo, sendo ele usado liturgicamente em muitas de nossas
igrejas ainda na atualidade. A analogia feita por P. Schaff (1819-1893) parece resumir
bem o significado desse Credo “Como a Oração do Senhor é a Oração das orações, o
Decálogo a Lei das leis, também o Credo dos Apóstolos é o Credo dos credos”.
B. Credo Niceno-Constantinopolitano
O Credo Niceno primitivo foi elaborado no Primeiro Concílio Ecumênico de Nicéia
(20/05/325), na Bitínia, no ano 325. Esse Concílio teve uma representação significativa
(especialmente das igrejas do Oriente) 300 ou 318 bispos; cerca de 1/6 de todos os bis-
pos (estima-se a existência de 1800 bispos em toda a Igreja). O Concílio foi convocado
e subvencionado pelo Imperador Constantino – quem presidiu a sessão inaugural, fa-
zendo um discurso sobre o perigo da dissensão dentro da Igreja, tendo também, ampla
participação no decorrer do Concílio – visando tratar da questão Ariana que prejudicava
a união da Igreja e, consequentemente, do Império.
O Concílio, depois de amplo debate, declarou a igualdade essencial entre o Pai e o Filho.
Os ensinamentos de Ário foram condenados e ele, foi deportado para o Ilírico. Posterior-
mente, o Concílio de Constantinopla (381), convocado pelo Imperador Teodósio I, – sendo
presidido, inicialmente, por Melécio de Antioquia (310-381) –, constituído tradicionalmen-
te por 150 bispos, ampliou o Credo Niceno, daí o nome de Credo Niceno-Constantinopoli-
tano. Esse Credo “ampliado” foi lido e aprovado no Concílio de Calcedônia (451).
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C. O Credo de Calcedônia
O Quarto Concílio Ecumênico foi realizado em Calcedônia, perto de Constantinopla
(atual Istambul). Reunido de 8 a 31 de outubro de 451, contou com a presença de mais
de 500 bispos e vários delegados papais, que como de costume o representavam. Nessa
reunião, a já aludida “Carta Dogmática” ou “Tomo” redigida pelo bispo Leão I, o “Grande”
de Roma (13/06/449), foi decisiva na elaboração de seu Credo.
Como vimos, Calcedônia ratificou o Credo de Nicéia (325) e o de Constantinopla (381).
O seu objetivo era estabelecer uma unidade teológica na Igreja. A sua declaração teo-
lógica foi rascunhada em 22 de outubro, por uma comissão presidida por Anatólio de
Constantinopla († 458), encontrando a sua redação final, possivelmente na 5ª Sessão,
na quinta-feira, de 25 de outubro. Calcedônia rejeitou o Nestorianismo (duas pessoas e
duas naturezas) e o Eutiquianismo (uma pessoa e uma natureza), afirmando que Jesus
Cristo é uma Pessoa, sendo verdadeiro Deus e verdadeiro homem (uma pessoa e duas
naturezas). “[...] Calcedônia pronunciou-se não só contra a separação como contra a fu-
são” das duas naturezas de Cristo. Todavia, a noção de mistério esteve presente nessa
confissão, por isso, ela não tentou explicar o que as Escrituras não esclareciam.
Como já escrevemos em outro lugar, “Um decreto ou uma declaração teológica, por
mais relevantes que sejam, não põe fim, imediatamente, a um sistema; a ortodoxia, por
sua vez, não é criada através de pronunciamentos oficiais, embora saibamos que todos
eles sejam necessários e relevantes para nortear a Igreja. Com isso, estamos apenas que-
rendo indicar que, do mesmo modo que Nicéia não colocou um ponto final na questão
Trinitária, Calcedônia, não determinou o fim dos problemas Cristológicos.
Como já indicamos, as heresias permaneceram em diversas regiões, especialmente na Igreja
Oriental. Contudo, Calcedônia se constitui em um marco decisório na vida da Igreja, esta-
belecendo uma compreensão Cristológica que, se não é a final, é a que pôde ser alcançada,
pelo Espírito, dentro da revelação. No entanto, a Palavra é a fonte de toda a genuína teologia,
portanto, Calcedônia estabeleceu balizas, e graças a Deus por isso, devemos permanecer
sempre atentos à Palavra de Deus, à luz da qual nós e a nossa teologia seremos julgados.
Hendriksen está essencialmente correto ao declarar “A relação entre as duas naturezas
sempre permanecerá sendo um mistério muito além de nossa compreensão, mas, pro-
vavelmente nunca seja encontrada uma formulação melhor do que a que é encontrada
no Símbolo de Calcedônia”.
D. Credo Atanasiano
Também conhecido como “Symbolum Quicunque”, porque esta é a sua primeira palavra
em latim “Quicunque vult salvus esse” (“Todo aquele que quiser ser salvo...”). Esse Credo
que reflete a teologia dos quatro primeiros sínodos ecumênicos tem sentenças breves
que são “artisticamente arranjadas e ritmicamente expressadas. Ele é um credo musical
ou salmo dogmático.”
Segundo a tradição, ele teria sido escrito por Atanásio (295-373), Bispo de Alexandria
(328-373), conhecido como “Pai da Ortodoxia”. Segundo a mesma tradição, Atanásio o
elaborara durante o seu exílio em Roma, tendo-o oferecido ao papa Julius como sua
confissão de fé. Todavia, essa tradição tem sido rejeitada por muitos estudiosos desde o
século XVII, quando o holandês Gerhard Jan Vossius (1577-1649), apresentou em 1642,
as suas conclusões que contrariavam a referida crença, o mesmo fazendo James Usher
(1581-1656), em 1647.
A teoria mais aceita hoje é a de que esse Credo foi escrito por volta do ano 500, no
sul da Gália ou África do Norte ou, até mesmo em dois lugares e momentos diferentes.
Apesar de várias hipóteses quanto à sua autoria (Ambrósio, Hilário de Arles, Virgílio de
Tapsus, Vicente de Lérins, Paulinus de Aquileja, entre outros), ninguém conseguiu provar
de modo incontestável a identidade do seu autor. A ênfase desse Credo é a defesa da
Cristologia e da doutrina da Trindade conforme foram definidas nos Concílios de Ni-
céia (325), Constantinopla (381) e Calcedônia (451), refletindo visivelmente a teologia
de Agostinho (354-430).
Fonte: o autor.
MATERIAL COMPLEMENTAR
A Trindade e A Sociedade
Leonardo Boff
Editora: Vozes
Sinopse: O mistério da Santíssima Trindade sempre
ficou distante da piedade dos fiéis, pois se acentuava
tanto seu caráter de mistério que a grande maioria
preferia ficar apenas com o conceito de um só Deus,
onipotente, criador do céu e da Terra. Assim se
perdia a singularidade da fé cristã em um Deus que
é Trindade de Pessoas que se unem pela comunhão
e pelo amor. O presente livro mostra como a
comunhão e as relações eternas de inclusão entre o
Pai, o Filho e o Espírito Santo podem inspirar relações
sociais mais participativas, igualitárias e includentes. Cada pessoa na medida em que vive em
comunhão com os outros participa da comunhão trinitária.
Comentário: Para Boff, o Deus cristão, o Deus da vida, sempre é a Trindade de Pessoas: a
comunhão do Pai, do Filho e do Espírito Santo. O conceito pericórese é colocado em intrínseca
significação com os conceitos bíblicos de comunhão, amor e vida, pois a interpenetração
dinâmica entre as Pessoas da Trindade é o resultado do amor e da vida que constituem a essência
da Trindade. A Trindade seria modelo e inspiração para a organização da sociedade e para as lutas
por justiça e pela vida humana.
As Institutas
João Calvino
Editora: Cultura Cristã
Sinopse: Um dos tratados teológicos mais
influentes da história do Cristianismo, Instituição
da religião cristã é a obra máxima de Calvino, autor
universalmente reconhecido e estudado - inclusive
por Weber e Marx - como um dos pilares da Reforma
Protestante.
Comentário: O nome Institutas é uma tradução do
título original em latim da obra, Institutio christianae
religionis. Institutas quer dizer instrução, ensino. Um
nome mais simples para a obra poderia ser Ensino Sobre o Cristianismo, aliás, título utilizado
em um resumo da obra feito pelo teólogo J. P. Wiles. O nome Institutas, portanto, não é de
forma alguma ligado a instituições de qualquer tipo, como o nome por vezes é erroneamente
compreendido e divulgado.
Material Complementar
MATERIAL COMPLEMENTAR
Apresentação:
O artigo publicado com o título: LEONARDO BOFF E JOÃO CALVINO: DIFERENTES PERSPECTIVAS
CONCERNENTES À SANTÍSSIMA TRINDADE tem como objetivo comparar o pensamento de dois
teólogos, João Calvino e Leonardo Boff, acerca da doutrina da Trindade. Tendo sido formados por
escolas diferentes e havendo um abismo de quase cinco séculos entre os dois, é considerável que
tais pensadores apresentem concepções distintas acerca desse assunto.
LINK: Disponível em: http://www.monergismo.com/textos/jcalvino/Boff-Calvino-Trindade_Daniel-
Leite.pdf
Professor Dr. Hermisten Maia Pereira Da Costa
IV
UNIDADE
A SOBERANIA DE DEUS
Objetivos de Aprendizagem
■■ Compreender o conceito teológico de soberania de Deus.
■■ Conceituar os pressupostos a respeito da liberdade de Deus
manifestada em Sua graça.
■■ Estabelecer o entendimento sobre Imagem e Semelhança, Pecado e
Depravação total.
Plano de Estudo
A seguir, apresentam-se os tópicos que você estudará nesta unidade:
■■ A liberdade soberana de Deus
■■ O poder soberano de Deus na Criação
■■ O poder soberano e gracioso de Deus na Salvação e Restauração de
seu povo
173
INTRODUÇÃO
é fundamental à ideia bíblica de graça, pois, se a graça não fosse livre, não seria
graça; graça que é obrigatória não é graça, é obrigação.
Veremos ainda que, apesar dessa Graça, o homem pecou. O pecado com-
prometeu de forma gravíssima todas as faculdades originais do ser humano, o
homem não deixou de ser a imagem e semelhança de Deus – visto que isso impli-
caria em deixar de ser homem.
Terminaremos a unidade descrevendo que a nossa salvação é decorrente do
Pacto da Graça, por meio do qual Deus confiou o Seu povo ao Seu Filho para
que Este viesse entregar a Sua vida por ele. Cristo deu a Sua vida em favor de
todos aqueles que o Pai Lhe confiara na eternidade.
Portanto o nosso assunto nesta unidade é a soberania de Deus e a sua rela-
ção com a liberdade humana. Creio que todos nós cremos nessa verdade bíblica,
mas quanto experimentamos isso em nossa vida? Vamos ao estudo.
Introdução
IV
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às provações, porque temos a paz de Deus atuando para proteger nos-
sos corações (MACARTHUR, 2001, p. 30).
O homem, como ser paradoxal414 que é, tende a nutrir posições diferentes sobre
o mesmo assunto, dependendo das circunstâncias que, amiúde, são de caráter
passional. Posso, por exemplo, defender a supremacia da lei, até que eu mesmo
a tenha quebrado. Do mesmo modo, posso sustentar determinados princípios
liberais ou conservadores, desde que a minha família não esteja em jogo ou que
outros interesses políticos não sejam afetados. Ou seja: tendemos a ser mais sub-
jetivos do que imaginamos ou estaríamos dispostos a admitir. Lamentavelmente,
temos de admitir que somos mais dados a interesses do que a princípios. E o
pior: o princípio é o meu interesse. Daí, o meu interesse ser o meu princípio de
pensamento e ação.
Uma doutrina que facilmente é objeto de posicionamentos contraditórios
é a soberania de Deus415. Gostamos de alardear a nossa liberdade, a nossa capa-
cidade de escolha e persuasão. Quando assim fazemos, falar em soberania de
Deus parece diminuir um pouco nossa autoconfiança e suposta autonomia; desse
modo, consideramos ser melhor deixá-la guardada em alguma gaveta para onde
empurramos os papéis que não estão sendo utilizados e não sabemos bem o
que fazer com eles. No entanto, quando percebemos que estamos sem recursos,
sem perspectivas favoráveis, sem saber o que fazer, podemos, sem talvez nos dar
conta, nos contentar com uma fé singela no cuidado de Deus e podemos, então,
A SOBERANIA DE DEUS
175
dizer para nós mesmos: “Deus é soberano, Ele sabe o que faz”; “nada acontece
por acaso...”. Na verdade, nós mesmos, crentes em Cristo, com certa frequên-
cia, tendemos a adotar atitude semelhante. Calvino (1509-1564) capta bem isso
ao dizer: “Mesmo os santos precisam sentir-se ameaçados por um total colapso
das forças humanas, a fim de aprenderem, de suas próprias fraquezas, a depen-
der inteira e unicamente de Deus”416.
Mas, afinal, Deus é ou não soberano? Parece que esta é uma das doutrinas
mais repudiadas pelo homem natural e, ao mesmo tempo, é a doutrina mais
consoladora para todos nós que cremos em Cristo Jesus, especialmente nos
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procediam desse modo, pensavam que Deus fosse igual a eles. No entanto Deus,
no momento próprio, exporia diante deles os seus delitos: “Tens feito estas coisas,
e eu me calei; pensavas que eu era teu igual; mas eu te arguirei e porei tudo à tua
vista” (Sl 50.21). Calvino (2002, p. 549) diz que o homem pretende usurpar o lugar
de Deus: “Cada um faz de si mesmo um deus e virtualmente se adora, quando
atribui a seu próprio poder o que Deus declara pertencer-lhe exclusivamente”.
De fato, os homens estão dispostos a reconhecer espontaneamente diversas
virtudes em Deus: o seu amor, sua graça, bondade, perdão, tolerância, provisão
etc. Agora, a sua soberania, jamais421. Pink (1886-1952) entende que “negar a
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soberania de Deus é entrar em um caminho que, seguindo até à sua conclusão
lógica, leva a manifesto ateísmo”422. A nossa dificuldade está em reconhecer a
Deus como o Senhor que reina423. A Palavra, por sua vez, nos desafia a aprender
com Ela a respeito de Deus e de Seu Reino. O nosso Deus, entre tantas perfeições,
é o Deus soberano, sem esse atributo, Deus não seria Deus: “Verdadeiramente
reconhecer a soberania de Deus é, portanto, contemplar o próprio Deus sobe-
rano” (PINK, 1977, p. 138).
No entanto Jó demonstra a dificuldade de nossa compreensão, ao indagar:
“Eis que isto são apenas as orlas dos seus caminhos! Que leve sussurro temos
ouvido dele! Mas o trovão do seu poder, quem o entenderá?” (Jó 26.14). Mas o
fato que faz parte amplamente da experiência cristã é que somente aquele que
confia intensamente na soberania de Deus poderá encontrar a paz em meio às
vicissitudes da vida424.
Como mais um ingrediente de cautela, devemos entender que o nosso conhe-
cimento a respeito de Deus é um “conhecimento-de-servo” delimitado pelo
próprio Senhor, considerando, inclusive, o pecado humano. Em outras palavras:
421 Kennedy diz precisamente isso: “O motivo por que tantas pessoas se opõem a essa doutrina
(predestinação) é que elas querem um Deus que seja qualquer coisa, menos Deus. Talvez permitam-lhe
ser algum psiquiatra cósmico, um pastor prestativo, um líder, um mestre, qualquer coisa, talvez... contanto
que Ele não seja Deus. E isso por uma razão muito simples... elas mesmas querem ser Deus. Essa sempre
foi a essência do pecado – o fato que o homem pretende ser Deus” (KENNEDY, 1981, p. 31).
422 Em outro lugar: “Os idólatras do lado de fora da cristandade fazem ‘deuses’ de madeira e de pedra,
enquanto que os milhões de idólatras que existem dentro da cristandade fabricam um Deus extraído de
suas mentes carnais. Na realidade, não passam de ateus, pois não existe alternativa possível senão a de um
Deus absolutamente supremo, ou nenhum deus” (PINK, 1985, p. 28). “Defender a crença num ‘poder do
alto’ nebuloso é balançar entre o ateísmo e um cristianismo total com suas exigências pessoais” (SPROUL,
1986, p. 48).
423 Ver o sermão de Spurgeon sobre Mt 28.15, citado por Pink. Consultar referência da nota.
424 Consultar referência.
A SOBERANIA DE DEUS
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promissos com terceiros. Em outras palavras: Deus é soberano em Si mesmo, a
onipotência faz parte da sua essência. Por isso mesmo, para Ele não há impos-
síveis. Apesar de qualquer oposição, Ele executa o Seu plano430. Tudo o que Ele
deseja, pode realizar (Mt 19.26; Jó 23.13)431. No entanto Deus não precisa exer-
citar o Seu poder para ser o que é.
Deus Se apresenta nas Escrituras como de fato é, o Deus Todo-Poderoso
(Onipotente), com capacidade para fazer todas as coisas conforme a Sua von-
tade (Sl 115.3; 135.6; Is 46.10; Dn 4.35; Ef 1.11)432. Ele pode fazer tudo o que
quer ou venha a querer, na forma e no tempo que determinar433. Deus também
Se mostra coerente com as demais de Suas perfeições, ou seja, Deus exercita o
Seu Poder em harmonia com todas as perfeições de Sua natureza (2Tm 2.13), a
Sua vontade é eticamente determinada. O poder de Deus se harmoniza perfei-
tamente com a Sua vontade434.
A SOBERANIA DE DEUS
179
Em outras palavras: “A vontade de Deus é uma com seu ser, sua sabedoria,
bondade e todas as suas outras perfeições”435.
A soberania de Deus se manifesta no fato de Ele poder fazer tudo o que
faz (poder ordenado) e mesmo aquilo que não realiza, visto que não determi-
nou fazê-lo (poder absoluto). O poder absoluto de Deus envolve o seu poder
ordenado436 e o poder ordenado delimita o poder absoluto pela própria decisão
restritiva de Deus: quando Deus decide fazer o que faz, delimitou a sua ação de
forma que não mais pode fazer o que não determinou fazer. O poder de Deus é
sempre condizente com a totalidade de Seus atributos.
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fama, prestígio etc., mas, sim, à Sua própria natureza. Deus não deriva o Seu
poder de nada além de Si mesmo. Deus não simplesmente está poderoso: Ele é
o próprio Poder. Por isso, se manifesta poderosamente: “Uma vez falou Deus,
duas vezes ouvi isto: Que o poder pertence a Deus” (Sl 62.11).
A “Confissão de Fé de Westminster” (1647) resume:
Deus tem em si mesmo, e de si mesmo, toda a vida, glória, bondade e
bem-aventurança. Ele é todo suficiente em si e para si, pois não precisa
das criaturas que trouxe à existência, não deriva delas glória alguma,
mas somente manifesta a sua glória nelas, por elas, para elas e sobre
elas. Ele é a única origem de todo o ser; dele, por ele e para ele são todas
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as coisas e sobre elas tem ele soberano domínio para fazer com elas,
para elas e sobre elas tudo quanto quiser (II.2).
Deus é tão eterno quanto o Seu poder. Ele sempre foi e será o que é, indepen-
dentemente de qualquer elemento externo a Ele. Deus existe eternamente por
Si próprio440. “Somente em Deus a existência e a essência são uma coisa só”441.
A existência de Deus é autoexistente por sua própria determinação. A vontade
de Deus é o fundamento último de todas as coisas. Isso nos basta. Somente Ele
é absoluto e, de fato, é o fim de todas as coisas.
Por isso que a Bíblia não tenta explicar a existência de Deus, ela parte ape-
nas do fato consumado de que Deus existe, manifestando o Seu poder em Seus
atos criativos (Gn 1.1).
Portanto, as coisas são o que são porque Deus assim as criou. A realidade,
como tudo, encontra sentido em Deus e nos Seus propósitos, visto que todas as
coisas foram feitas por Ele e para Ele (Pv 16.4; Rm 11.36).
De acordo com Spurgeon (Veja: Ex 3.14; At 17.25; 1Tm 6.15,16):
O poder de Deus é como Ele mesmo, auto-existente, autossustentado. O
mais poderoso dos homens não pode acrescentar sequer uma sombra de
poder ao Onipotente. Ele não se firma sobre nenhum trono reforçado;
nem se apoia em nenhum braço ajudador. Sua corte não é mantida por
Seus cortesãos, nem toma Ele emprestado das Suas criaturas o Seu esplen-
dor. Ele próprio é a grande fonte central e o originador de toda energia442.
440 Veja uma boa discussão sobre isso em: SPROUL, R. C. Razão para Crer. São Paulo: Mundo Cristão,
1986, p. 80-83.
441 Consultar referência.
442 Consultar referência.
A SOBERANIA DE DEUS
181
Desse modo, podemos dizer que as coisas que existem, existem por deci-
são de Deus, pois somente Ele, como Criador que é, pode também preservar
todas as coisas. Bavinck (1854-1921), de forma sumária, afirma: “Sem Ele, não
há existência nem propriedade. Somente Ele tem autoridade absoluta. Sempre
e em toda parte Ele decide”444.
443 Reconheço que a palavra decisão não é a melhor, pois pressupõe a ideia de algo anterior à decisão;
no entanto não disponho de outra melhor. A ideia é que eternamente Deus sempre teve, diante de Si, as
escolhas e eternamente as fez livre e soberanamente.
444 Consultar referência.
445 Consultar referência.
quer, dentro de Suas próprias deliberações. Deus age sempre conforme o Seu
Decreto, não dependendo de nenhum meio externo para realizá-lo, a menos que
Ele assim O determine. Ele é o incansável Todo-Poderoso. Escreve Isaías: “Não
sabes, não ouviste que o eterno Deus, o SENHOR, o Criador dos fins da terra,
nem se cansa, nem se fatiga?....” (Is 40.28).
Ontologicamente, Deus não precisa de nada fora de Si mesmo, Ele se basta
a Si. Ele é “independente e verdadeiramente autopoderoso”446. A criação nada
lhe acrescenta ou diminui. Nenhuma alteração ocorre no Seu ser. O prazer e a
suficiência de Deus estão nEle mesmo. Deus não precisa de meios para execu-
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tar o que quer. “Esta simples ideia da onipotência de Deus, de que Ele pode fazer
sem esforço, mediante volição, tudo o que quer, é a ideia de poder mais elevada e
mais claramente apresentada nas Escrituras”447. Contudo, por graça, Ele se agen-
cia também por intermédio das causas externas para concretizar o Seu propósito.
Por exemplo: Deus poderia, se quisesse, salvar a todos os homens, indepen-
dentemente da Palavra (Bíblia) e da fé em Cristo, entretanto Ele assim não faz;
esta não é a Sua forma ordinária de agir porque sábia e livremente estabeleceu
o critério de salvação, que é pela graça, sempre pela graça, que opera mediante
a fé, por meio da Palavra (Rm 10.17; Ef 2.8). Deus sempre age de forma compa-
tível com a sua perfeita justiça. Bavinck (1854-1921), mais uma vez, é-nos útil
aqui ao escrever: “Sua vontade é idêntica ao seu ser, e a teoria do poder absoluto,
que separa o poder de Deus de suas outras perfeições, é somente uma abstração
vazia e impermissível”448.
Jesus Cristo se encarnou a fim de que Deus pudesse ser justo e, ao mesmo tempo,
o justificador daqueles que confiam em Jesus para a salvação (Rm 3.26); portanto,
para nós que cremos, Ele se tornou justiça, santificação e redenção (1Co 1.30). Desse
modo, sem a graça de Deus, amparada no sacrifício de Cristo449, ninguém será salvo!
446 Consultar referência. Veja também o instrutivo e edificante capítulo de MacArthur em: MACARTHUR
JR., J. F. Deus: face a face com Sua Majestade. São José dos Campos/SP: Editora Fiel, 2013, p. 91-107.
447 Consultar referência.
448 Consultar referência.
449 “Devemos buscar refúgio na graciosa promessa da misericórdia que nos é oferecida em Cristo, para
que saibamos com certeza que somos considerados justos aos olhos de Deus” (CALVINO, 1996, p. 131).
“A maior desonra que alguém poderia lançar sobre Seu nome é a de contestar Sua justiça” (CALVINO, p.
417). “Deus, que é justo, pode perdoar pecado porque Ele já puniu o pecado na Pessoa de Seu unigênito
Filho. (...) Deus proclama Sua eterna justiça e ainda pode perdoar os pecados daqueles que crêem em
Jesus – eis uma terribilíssima, uma profundíssima declaração” (LLOYD-JONES, 1997, p. 420).
A SOBERANIA DE DEUS
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Deus tem poder para executar toda a Sua deliberação450. Ele é o Todo-
Poderoso (Gn 17.1) e nenhum dos Seus planos pode ser frustrado (Jó 42.2). Ele
determinando, quem o impedirá? A Palavra de Deus é poderosa no cumpri-
mento do que Deus Se propôs (Is 55.11), porque provém do Deus onipotente.
Jurou o SENHOR dos Exércitos, dizendo: Como pensei, assim suce-
derá, e, como determinei, assim se efetuará. Quebrantarei a Assíria na
minha terra e nas minhas montanhas a pisarei, para que o seu jugo se
aparte de Israel, e a sua carga se desvie dos ombros dele. Este é o desíg-
nio que se formou concernente a toda a terra; e esta é a mão que está
estendida sobre todas as nações. Porque o SENHOR dos Exércitos o
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450 “O poder de Deus é a sua capacidade de fazer aquilo que deseja e determina que aconteça, seja na área
física, moral ou espiritual. É a capacidade de ação onipotente que esteja de acordo com a Sua vontade”
(CAMPOS, 1999, p. 384).
451 Veja também: SANTO AGOSTINHO. A Trindade. São Paulo: Paulus, 1994, III. 6-9.
452 Consultar referência.
453 Atitude muito comum nas crianças, que, quando estão perdendo o jogo, formam uma nova regra para
se beneficiar, dizendo que o que antes não podia, “agora pode”. Diga-se de passagem, que essa atitude
infelizmente não caracteriza somente as crianças; muitas vezes, nós, adultos, quando estamos investidos
de alguma autoridade, somos com frequência – com uma imaturidade maldosa – “levados” a mudar as
normas e as leis, obedecendo a casuísmos que, “coincidentemente”, nos beneficiam.
454 A frase completa é a seguinte: “O poder tende a corromper, e o poder absoluto corrompe de modo
absoluto. Os grandes homens são quase sempre homens maus” (ACTON).
Afinal, Deus poderia fazer tudo isso ou não?! Deus estaria sujeito à corrup-
ção resultante do mau uso do poder? Retardemos um pouco mais a resposta.
Geralmente, quem raciocina da forma apresentada anteriormente tem em
mente a ação do homem como modelo – cometendo o mesmo equívoco de mui-
tos gregos na Antiguidade –, tomando o homem como parâmetro para uma
comparação, como se o “homem fosse a medida de todas as coisas”455. Esse tipo
de raciocínio encontra alento em Thomas Hobbes (1588-1679), que entendia
que “o soberano de uma República, seja ele uma assembleia ou um homem, não
está absolutamente sujeito às leis civis. Pois tendo o poder de fazer ou desfazer
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as leis, pode, quando lhe apraz, livrar-se desta sujeição revogando as leis que o
incomodam e fazendo novas”456. De fato, apesar de essa atitude não ser apreciá-
vel em si, ela ocorre com frequência na esfera humana.
Respondemos agora: de fato, os homens são tão fracos em suas condições
de poderosos que não conseguem controlar os seus ímpetos, por isso, agem por
paixões das mais variadas, tais como: preconceito, vaidade, ódio, interesses etc.
Deus, no entanto, é tão perfeito em Seu poder que as suas eternas perfeições se
constituem em “limites” para Si mesmo! Por isso, quando afirmamos que Deus
não mente, não se contradiz, não muda, não peca e não pode salvar fora de
Jesus Cristo, não pretendemos estabelecer limites para Deus, mas, sim, reconhe-
cer os próprios limites ou critérios que Ele declarou a respeito de Si mesmo em
Sua relação consigo e com o universo. Esses critérios são decorrentes das Suas
perfeições, pois, se Deus é perfeitamente poderoso, é também perfeitamente ver-
dadeiro, justo, fiel, sábio, amoroso, bondoso e santo.
Deus é tão poderoso que nos trata conforme as perfeições do Seu ser e nos deu
a conhecer tais perfeições a fim de que pudéssemos nEle confiar e as Suas virtudes
proclamar (Ml 3.6; 1Pe 2.9,10). O poder de Deus está sob o controle de Sua sábia e
santa vontade. “Deus pode fazer tudo o que Ele deseja, porém Ele não deseja fazer
tudo o que pode”457 (Ex 3.14; Nm 23.19; 1Sm 15.29; At 4.12; 2Tm 2.13; Hb 6.18;
455 O sofista grego Protágoras (c. 480-410 a.C.) afirmara: “O homem é a medida de todas as coisas, da
existência das que existem e da não existência das que não existem” (PROTÁGORAS apud PLATÃO). O
Humanismo Renascentista tomou este dito como lema na sua “virada antropológica” (Veja: HERMISTEN,
M. P.).
456 Consultar referência.
457 Consultar referência.
A SOBERANIA DE DEUS
185
Tg 1.13,17)458. “Deus é lei para Si próprio, de modo que tudo quanto Ele faz é jus-
to”459. O poder absoluto de Deus não é incoerente com a Sua essência. A vontade
de Deus é santa. Não há propósitos e atitudes contraditórios em Deus. O sobe-
rano poder de Deus somente é limitado pelo absurdo ou pelo autocontraditório e
por ações imorais460. “Deus é o padrão para a moralidade humana, assim Ele não
pode ser menos que perfeito em Sua santidade, bondade, e retidão”461. Portanto,
Ele não pode realizar coisas autoexcludentes em si mesmas: não pode deixar de
ser Deus, não pode ser diferente de Si mesmo, fazer um círculo quadrado. Lewis
(1898-1963) argumenta de forma ácida, porém correta: “Não é possível nem a
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Deus nem à mais fraca de suas criaturas executar duas alternativas que se excluem
mutuamente; não porque o seu poder encontre um obstáculo, mas porque a tolice
continua sendo tolice mesmo quando é falada sobre Deus”462.
O poder de Deus é executado em completa harmonia com a Sua perfeita e
gloriosa dignidade, enfim, com o seu caráter sábio e santo. A perfeição da natu-
reza de Deus permeia todas as Suas obras. “Deus age consistentemente consigo
mesmo, e jamais poderá desviar-se do que Ele disser”463. Desse modo, as Suas pro-
messas sempre serão cumpridas, visto que Ele é poderoso para cumprir tudo o
que promete. Por Deus ser fiel, justo e poderoso, o que Ele promete, cumprirá464.
“Seja o que for que Deus tenha que fazer, inquestionavelmente o fará, se Ele o
tiver prometido”465. Esse fato nos enche de alegre confiança em Deus.
458 “Disse Deus a Moisés: EU SOU O QUE SOU. Disse mais: Assim dirás aos filhos de Israel: EU SOU
me enviou a vós outros” (Êx 3.14). “Deus não é homem, para que minta; nem filho de homem, para que
se arrependa. Porventura, tendo ele prometido, não o fará? Ou, tendo falado, não o cumprirá?” (Nm
23.19). “Também a Glória de Israel não mente, nem se arrepende, porquanto não é homem, para que se
arrependa” (1Sm 15.29). “E não há salvação em nenhum outro; porque abaixo do céu não existe nenhum
outro nome, dado entre os homens, pelo qual importa que sejamos salvos” (At 4.12). “Se somos infiéis,
ele permanece fiel, pois de maneira nenhuma pode negar-se a si mesmo” (2Tm 2.13). “Para que, mediante
duas coisas imutáveis, nas quais é impossível que Deus minta, forte alento tenhamos nós que já corremos
para o refúgio, a fim de lançar mão da esperança proposta” (Hb 6.18). “Ninguém, ao ser tentado, diga: Sou
tentado por Deus; porque Deus não pode ser tentado pelo mal e ele mesmo a ninguém tenta” (Tg 1.13).
“Toda boa dádiva e todo dom perfeito são lá do alto, descendo do Pai das luzes, em quem não pode existir
variação ou sombra de mudança” (Tg 1.17).
459 Em outro livro, o mesmo autor escreve: “Afirmamos que Deus não está sujeito a nenhuma regra ou lei
fora da sua própria vontade e natureza e que Deus é a sua própria lei, não tendo qualquer obrigação de
prestar contas dos seus propósitos a quem quer que seja” (PINK, 1977, p. 21).
460 Consultar referência.
461 Consultar referência.
462 Consultar referência.
463 Consultar referência.
464 Consultar referência.
465 Consultar referência.
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O PODER SOBERANO DE DEUS NA CRIAÇÃO
Portanto, por mais que ao homem, com sério propósito, convenha vol-
ver os olhos a considerar as obras de Deus, uma vez que foi colocado
neste esplendíssimo teatro para que fosse seu espectador, todavia, para
que fruísse maior proveito, convém-lhe, sobretudo, inclinar os ouvidos
à Palavra (CALVINO, J. As Institutas. I.6.2).
A SOBERANIA DE DEUS
187
da Criação. Deus cria segundo a Sua Palavra e isso nos enche de admiração e
reverente temor: a Palavra de Deus é o verbo criador que manifesta a determi-
nação e o poder de Deus (Gn 1.1,26, 27; Sl 33.6,9; Jo 1.1-3; Hb 11.3)466, o Qual
criou as coisas com sabedoria (Pv 3.19).
O “Catecismo Maior de Westminster”, respondendo à pergunta, “Qual é a
obra da criação?”, resume: “A obra da criação é aquela pela qual, no princípio
e pela palavra do seu poder, Deus fez do nada o mundo e tudo quanto nele há,
para si, no espaço de seis dias, e tudo muito bom”467 (Gn 1; Rm 11.36; Ap 4.11).
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A Narrativa Bíblica
Kuyper (1837-1920) nos chama a atenção para um ponto que costumeiramente
é esquecido.
Quando Deus criou a Adão, Ele nos criou também. Na natureza de
Adão Ele produziu a natureza que agora vivemos. Gênesis 1 e 2 não é
história de estranhos mas de nós mesmos – com respeito à carne e ao
sangue que levamos conosco, à natureza humana em que nos sentamos
para ler a Palavra de Deus468.
466 “No princípio, criou Deus os céus e a terra. (...) 26 Também disse Deus: Façamos o homem à nossa
imagem, conforme a nossa semelhança; tenha ele domínio sobre os peixes do mar, sobre as aves dos céus,
sobre os animais domésticos, sobre toda a terra e sobre todos os répteis que rastejam pela terra. 27 Criou
Deus, pois, o homem à sua imagem, à imagem de Deus o criou; homem e mulher os criou” (Gn 1.1,26-
27). “6 Os céus por sua palavra se fizeram, e, pelo sopro de sua boca, o exército deles. (...) 9 Pois ele falou, e
tudo se fez; ele ordenou, e tudo passou a existir” (Sl 36,6,9).
467 Consultar referência.
468 Consultar referência.
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A concepção cristã da criação do homem encontra a sua base e fundamento
na Palavra de Deus, por isso, é essencial à nossa consideração o que o Espírito
Santo fez registrar no Livro de Hebreus: “Pela fé entendemos que o universo foi
formado pela palavra de Deus, de maneira que o visível veio a existir das cousas
que não aparecem” (Hb 11.3).
Nessa passagem bíblica, subjazem algumas verdades que devem ser destacadas:
4. Deus é o Ser eterno que antecede a toda criação.
5. A fé é que deve dirigir a nossa compreensão a respeito da criação. Calvino
(1509-1564), conclui: “É tão somente pela fé que chegamos a entender
que o mundo foi criado por Deus”470.
6. A criação é um ato livre da vontade soberana de Deus. Não há pressões
externas ou necessidades internas que O impulsionem a criar471. Deus fez
o que fez, quando fez, e como fez, por Sua livre determinação. “A criação
do mundo não foi um ato arbitrário, senão que serviu para fins elevados
e dignos, e esses fins estiveram de acordo com a bondade e sabedoria infi-
nitas do Criador472.
7. Nada pode existir sem que tenha sido criado por Deus (Jo 1.3). Os Céus
e a Terra são obras de Deus, não há independência fora de Deus.
469 “A doutrina da criação a partir do nada ensina a absoluta soberania de Deus e a absoluta dependência
humana. Se uma partícula não tivesse sido criada do nada, Deus não seria Deus” (BAVINCK, 2012, p.
427).
470 “As mentes humanas são cegas a essa luz da natureza, a qual resplandece em todas as coisas criadas,
até que sejam iluminados pelo Espírito de Deus e comecem a compreender pela fé, que jamais poderão
entendê-lo de outra forma” (CALVINO, p. 299).
471 Consultar referência.
472 Consultar referência.
A SOBERANIA DE DEUS
189
473 Quanto à distinção dos nomes empregados para Deus nas primeiras narrativas de Gênesis.
Para um estudo mais detalhado a respeito dos nomes bíblicos usados para Deus, entre uma ampla
bibliografia disponível, veja: BAVINCK, H. Dogmática Reformada: Deus e a Criação. São Paulo: Cultura
Cristã, 2012, 2 v. p. 97-150. Consulte também: BRUNNER, E. Dogmática. São Paulo: Novo Século, 2004,
1 v. p. 155ss.; 159ss. Consulte também: H. BIETENHARD. In: KITTEL, G.; G. Friedrich, eds. Theological
Dictionary of the New Testament. Grand Rapids, Michigan: Eerdmans, 1981 (Reprinted), 5 v. p. 242-283.
Lucas 3.38: Cainã, filho de Enos, Enos, filho de Sete, e este, filho de Adão,
filho de Deus.
João 1.1-5: No princípio era o Verbo, e o Verbo estava com Deus, e o Verbo era
Deus. 2 Ele estava no princípio com Deus. 3 Todas as coisas foram feitas por intermé-
dio dele, e, sem ele, nada do que foi feito se fez. 4 A vida estava nele e a vida era a luz
dos homens. 5 A luz resplandece nas trevas, e as trevas não prevaleceram contra ela.
Romanos 1.20,25: 20 Porque os atributos invisíveis de Deus, assim o seu
eterno poder, como também a sua própria divindade, claramente se reconhe-
cem, desde o princípio do mundo, sendo percebidos por meio das coisas que
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foram criadas. Tais homens são, por isso, indesculpáveis (...). 25 pois eles muda-
ram a verdade de Deus em mentira, adorando e servindo a criatura em lugar do
Criador, o qual é bendito eternamente. Amém!
Colossenses 1.16-17: 16 pois, nele, foram criadas todas as coisas, nos céus
e sobre a terra, as visíveis e as invisíveis, sejam tronos, sejam soberanias, quer
principados, quer potestades. Tudo foi criado por meio dele e para ele. 17 Ele é
antes de todas as coisas. Nele, tudo subsiste.
Hebreus 1.1-2: Havendo Deus, outrora, falado, muitas vezes e de muitas
maneiras, aos pais, pelos profetas,2 nestes últimos dias, nos falou pelo Filho, a
quem constituiu herdeiro de todas as coisas, pelo qual também fez o universo.
Apocalipse 4.11: 11Tu és digno, Senhor e Deus nosso, de receber a glória, a
honra e o poder, porque todas as coisas tu criaste, sim, por causa da tua vontade
vieram a existir e foram criadas.
As Confissões e Catecismos Reformados, sensíveis aos ensinamentos bíbli-
cos, pelo Espírito, confessam tal verdade:
O “Catecismo de Heidelberg” (1563), à pergunta 26, “Que é que crês, quando
dizes: ‘Creio em Deus Pai, Todo-Poderoso, Criador do Céu e da Terra’?”, responde:
Que o eterno Pai de nosso Senhor Jesus Cristo, que do nada criou o
céu e a terra com tudo que neles há, que também os sustenta e governa
pelo seu Filho – meu Deus e meu Pai. Confio nele tão completamente
que não tenho nenhuma dúvida de que Ele proverá de todas as coisas
necessárias ao corpo e à alma...
A SOBERANIA DE DEUS
191
A Escritura Sagrada foi-nos dada com propósitos específicos. Dentro desses pro-
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pósitos, ela é suficiente e eficaz. Sabemos, por exemplo, que a Bíblia não tem a
pretensão de fazer ciência; ela não é um manual científico que pretende ensinar-
-nos a respeito de Química, Física, Biologia, Botânica, Astronomia etc. Entretanto
cremos que o que ela diz no campo científico, como em qualquer outro, é a ver-
dade do ponto de vista fenomenológico475, não havendo divergência real entre
a genuína ciência e a correta interpretação da Bíblia476, já que Deus é o Senhor
de toda a verdade.
O próprio Calvino (1509-1564) destacou isso quando, comentando Gênesis
1.14, disse: “É necessário relembrar, que Moisés não fala com agudez filosófica
sobre os mistérios ocultos, porém relata aquelas coisas que em toda parte obser-
vou, e que igualmente são comuns aos homens simples”477. Ou seja, Moisés,
inspirado por Deus, escreveu do ponto de vista de como os fenômenos são per-
cebidos, sem a preocupação – já que este não era o seu objetivo –, de registrar
com terminologia científica os fatos. Acrescentaríamos: na hipótese de Moisés
ter escrito conforme os padrões científicos de sua época – o que de fato não fez,
sendo isso extremamente impressionante se considerarmos que ele teve uma
formação primorosa dentro dos moldes egípcios e conseguiu romper com ela –,
certamente o que dissesse seria ridicularizado hoje por ser considerado fruto de
uma concepção pré-científica. Por outro lado, se redigisse o relato da Criação de
forma científica absoluta, que certamente não era a dos egípcios e, também, não
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é a nossa, perguntamos: entenderíamos hoje o que ele teria dito? A resposta é:
não! As Escrituras continuariam sendo ridicularizadas, nesse caso, simplesmente
pela nossa ignorância científica. A linguagem descritiva dos fatos, conforme se
apresentam à nossa percepção, é o melhor modo de tornar algo compreensível
a todas as épocas, assim, Deus Se designou fazer e O fez.
Acreditamos na coerência de toda a realidade, considerando inclusive o
pecado humano conforme registrado nas Escrituras; por isso, a ciência genuína
nunca nos afastará de Deus, antes ela só encontrará o seu sentido pleno nAquele
que é o Seu Senhor e para onde todo o real converge e encontra o seu verdadeiro
significado. Aliás, como bem acentuou Bavinck (1854-1921):
Qualquer ciência, filosofia ou conhecimento que suponha poder fir-
mar-se em suas próprias pressuposições, deixando Deus de fora de suas
considerações, transforma-se em seu próprio opositor e desilude a to-
dos que constroem suas expectativas nisto478.
Portanto, nós não temos medo dos fatos, porque sabemos que os fatos são de
Deus, nem temos medo de pensar, porque sabemos que toda verdade é verdade
de Deus. A razão corretamente conduzida e o exercício da genuína ciência não
oferecem perigo à fé, antes, são suas aliadas.
Charles Hodge (1797-1878), um dos grandes teólogos norte-americanos do
século XIX, escreveu:
A SOBERANIA DE DEUS
193
Ele [Deus] não ensinou astronomia ou química aos homens, porém Ele
deu-lhes os fatos externos sobre os quais aquelas ciências são constru-
ídas. Tampouco ensinou-nos teologia sistemática, porém Ele deu-nos
na Bíblia as verdades que, propriamente compreendidas e organizadas,
constituem a ciência da Teologia (HODGE, 1986, p. 3).
479 Consultar referência da nota. Veja: BOICE, J. M. Psalms: an expositional commentary. Grand Rapids,
MI.: Baker Book House, 1994, 1 v. (Sl 8), p. 67. Consulte também: HOEKEMA, A. Criados à Imagem de
Deus. São Paulo: Editora Cultura Cristã, 1999, p. 30-32.
Para uma visão panorâmica das interpretações desse Salmo ao longo da história, veja: WALTKE, B. K.;
HOUSTON, J. M.; MOORE, E. The Psalms as Christian Worship: A Historical Commentary. Grand
Rapids, MI.: Eerdmans, 2010, p. 234-254.
480 “32 Davi disse a Saul: Não desfaleça o coração de ninguém por causa dele; teu servo irá e pelejará contra
o filisteu. 33 Porém Saul disse a Davi: Contra o filisteu não poderás ir para pelejar com ele; pois tu és ainda
moço, e ele, guerreiro desde a sua mocidade. 34 Respondeu Davi a Saul: Teu servo apascentava as ovelhas
de seu pai; quando veio um leão ou um urso e tomou um cordeiro do rebanho, 35 eu saí após ele, e o feri,
e livrei o cordeiro da sua boca; levantando-se ele contra mim, agarrei-o pela barba, e o feri, e o matei. 36
O teu servo matou tanto o leão como o urso; este incircunciso filisteu será como um deles, porquanto
afrontou os exércitos do Deus vivo. 37 Disse mais Davi: O SENHOR me livrou das garras do leão e das do
urso; ele me livrará das mãos deste filisteu. Então, disse Saul a Davi: Vai-te, e o SENHOR seja contigo”
(1Sm 16.32-37).
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Ele ultrapassa a visão apenas local de Israel, para reconhecer que o testemunho
de Deus na Criação se estende a toda a terra (Sl 8.1). “O mundo foi originalmente
criado para este propósito, que todas as partes dele se destinem à felicidade do
homem como seu grande objeto”482.
O salmista percebe que este reconhecimento da majestade de Deus só se tor-
nou possível pela revelação de Deus na Criação: “Pois expuseste nos céus a tua
majestade” (Sl 8.1). É Deus mesmo Quem sempre inicia o processo e os meios
de comunicação entre Ele e nós. A Sua comunicação é sempre um ato de graça.
Após a queda, envolve também a Sua misericórdia, visto que esta é uma mani-
festação da bondade de Deus para com aqueles que estão em miséria483.
Davi, ciente de que a Criação não é uma mera extensão da essência de Deus484,
não se detém na Criação, antes, vai além, reconhecendo a glória de Deus nEla.
Argumentando de forma espacialmente dedutiva485, faz uma pergunta retó-
rica: “Que é o homem, que dele te lembres? E o filho do homem, que o visites?”
(Sl 8.4).
A sensação é de pequenez diante do vasto universo, do qual podemos con-
templar, ainda hoje, uma minúscula parte. O sistema solar é apenas um pequeno
ponto no universo do qual apenas conhecemos limitadamente. No entanto, até
481 Veja a argumentação de Keil e Delitzsch, em favor da redação do Salmo após a unção de Davi.
Consultar referência.
482 Consultar referência da nota.
483 Consultar referência da nota. “Misericórdia é o princípio eterno da natureza de Deus que o leva a
buscar o bem temporal e a salvação eterna dos que se opuseram à vontade dele, mesmo a custo do
sacrifício próprio” (STRONG, 2003, p. 431).
484 Consultar referência da nota.
485 “Nem mesmo o mundo todo pode ter o mesmo valor de um homem” (BAVINCK, 2012, p. 19).
A SOBERANIA DE DEUS
195
onde a ciência pôde ir, não há nada mais complexo do que o cérebro humano486,
ainda que este não seja o aspecto mais amplo e completo do ser humano criado
à imagem de Deus.
Aqui vemos de forma refletida o paradoxo da existência humana: grandeza
e limitação; finitude e transcendência; prodigialidade e animalidade. A ciência
esbarra sempre na questão enfatizada por Blaise Pascal487, detectada por Bavinck:
“A ciência não pode explicar essa contradição no homem. Ela reconhece apenas
sua grandeza e não sua miséria, ou apenas sua miséria e não sua grandeza”488.
Sem a Palavra de Deus, nenhuma ciência ou mesmo a arte, nem mesmo a jun-
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
486 “Não há outra estrela ou planeta no universo cuja importância para Deus se compare à da Terra. O
próprio homem, no sentido biológico, é infinitamente mais complexo do que as estrelas. É absurdo
apequenar o homem só por causa de seu tamanho. Embora grande, uma estrela é muito simples,
composta em sua maior parte de hidrogênio e hélio. A medida do significado no universo não é o
tamanho, mas a ordem e a complexidade, e o cérebro humano, até onde a ciência pode determinar, é,
de longe, o mais complexo agregado de matéria do universo. Em sentido estritamente físico, a Terra é o
mais complexo agregado de matéria inanimada que conhecemos no universo, e se destina exclusivamente
a servir de lar para o homem” (MORRIS, 1986, p. 21-22). “Os seres humanos são infinitamente mais
complexos do que processos físicos, químicos e biológicos. A partir de uma perspectiva teísta cristã, pode-
se afirmar também essa complexidade em virtude do fato de que as pessoas são criadas à própria imagem
de Deus. Cada pessoa é única, e as exceções podem ser citadas para qualquer paradigma ou modelo”
(PAZMIÑO, 2008, p. 13).
487 “É perigoso fazer ver demais ao homem quanto ele é igual aos animais, sem lhe mostrar a sua grandeza.
É ainda perigoso fazer-lhe ver demais a sua grandeza sem a sua baixeza. É ainda mais perigoso deixá-lo
ignorar uma e outra. Mas é muito vantajoso representar-lhe ambas” (PASCAL, 1973, p. 139).
488 Consultar referência.
489 Consultar referência da nota.
490 Consultar referência da nota.
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
pondida apenas a partir de um referencial material. “O homem é um enigma
cuja solução só pode ser encontrada em Deus”493. Deus revelou de forma mag-
nífica o homem ao homem494.
O salmista reverentemente se admira do fato de Deus se lembrar de nós (Sl
8.4) , tendo o sentido de “prestar atenção”, sustentar, cuidar, manifestar a sua
495
graça ou juízo496. Admira-se também de Deus nos visitar. A palavra pode ter o
sentido de passar em revista, observar (Êx 3.16)497, supervisionar, vir ao encon-
tro498. O significado no texto é de uma visita providente, abençoadora e salvadora
(Gn 21.1; 50.24-25/Êx 13.19; Êx 4.31; Sl 17.3; 65.9; 80.15; 106.4)499. Jó, também,
A SOBERANIA DE DEUS
197
de forma poética, mas com sentimentos confusos, indaga: “17 Que é o homem,
para que tanto o estimes, e ponhas nele o teu cuidado, 18 e cada manhã o visites, e
cada momento o ponhas à prova?” (Jó 7.17-18). Deus considera tanto o homem
que tem o seu coração nele, cuidando, protegendo e guardando. Ainda que na
intensidade da angústia de Jó isso o incomode circunstancialmente − visto que
o cuidado, dentro dessa perspectiva, soa como uma “inspeção” −, o fato é que
Deus cuida atentamente de Seu povo (Sl 144.3,4,15).
A Bíblia atesta que Deus faz todas as coisas conforme o conselho da Sua von-
tade (Ef 1.11): conforme o Seu santo prazer e deliberação (Sl 115.3;135.6). Todos
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(dq;P’) (paqad) a terra e a regas; tu a enriqueces copiosamente; os ribeiros de Deus são abundantes de
água; preparas o cereal, porque para isso a dispões” (Sl 65.9). “Lembra-te de mim, SENHOR, segundo a
tua bondade para com o teu povo; visita-me (dq;P’) (paqad) com a tua salvação” (Sl 106.4).
500 Consultar referência da nota.
501 Consultar referência da nota.
Aqui temos o decreto Trinitário que antecede o tempo e que, agora, se executa
historicamente conforme o eternamente planejado.
O “Façamos” de Deus, conforme usado em Gênesis 1.26, (he&A(an) (na’aseh), o
qual, imperfeito, indica que o homem foi criado ou será criado502 após deliberação
ou consulta, como explica Calvino: “Até aqui Deus foi introduzido simplesmente
a ordenar; agora, quando se aproxima da mais excelente de suas obras, ele passa
à consulta”503.
Calvino diz que Deus poderia ter criado o homem ordenando, pela sua simples
palavra, o que desejasse que fosse feito, “porém prefere comunicar este atributo à
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
excelência do homem: que ele, de certa maneira, faz uma consulta concernente
à criação”504. A que Deus consulta? Perguntaríamos. Deus consulta a Si mesmo:
Mas desde que o Senhor não necessita de conselheiro, não há dúvida
de que ele consultou a si mesmo. (...) Deus não convoca conselheiro
alheio; daí nós inferimos que ele acha em si mesmo alguma coisa dis-
tinta; como, na verdade, sua eterna sabedoria e poder residem nele505.
O fato de Deus ter criado o homem após deliberação tem dois objetivos na con-
cepção de Calvino: 1) nos ensinar que o próprio Deus se encarregou de fazer
algo grande e maravilhoso; 2) dirigir a nossa atenção para a dignidade de nossa
natureza. Assim, ele conclui:
Na verdade, há muitas coisas nesta natureza corrompida que pode-
riam induzir ao desdém; mas, se o leitor pesar corretamente todas as
circunstâncias, o homem é, entre outras criaturas, um certo espécime
preeminente da sabedoria, justiça e bondade divinas, de modo que ele é
merecidamente chamado pelos antigos mikri/kosmoj, ‘um mundo em
miniatura’506.
Comentando Gênesis 5.1, Calvino diz que Moisés repetiu o que ele havia dito
antes, porque
502 “Esta forma pode ser traduzida como um futuro simples (nós faremos). Se entendido assim, o texto
está registrando um anúncio de Deus” (GRONINGEN, 2002, p. 75). “Embora o tempo aqui usado seja o
futuro, todos devem reconhecer que esta é a linguagem de alguém que aparentemente delibera” (CALVIN,
1996, p. 91).
503 Consultar referência da nota.
504 Consultar referência da nota.
505 Consultar referência da nota.
506 Consultar referência da nota.
A SOBERANIA DE DEUS
199
Em Adão, temos uma demonstração eloquente da justiça divina: Adão foi ini-
cialmente criado à imagem de Deus, para que pudesse refletir, como por um
espelho, a justiça divina.
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
teológico, apresentando Deus como o sujeito da ação, que do nada, pelo Seu
poder, faz vir à existência algo novo, que antes não existia (Cf. Gn 1.1; 2.4; Sl
51.10;102.18; 148.5; Is 41.20; 48.6-7; 65.17, Am 4.13 etc.)511, contrapondo-se,
também, aos deuses pagãos (Ez 28.13, 15)512.
O homem como criação secundária (em termos de ordem, não de impor-
tância) foi formado com maestria e habilidade de matéria previamente criada
por Deus (Gn 3.19); entretanto ele recebeu diretamente de Deus o fôlego da
vida (Gn 2.7), passando, ao mesmo tempo, a ter uma origem terrena e celestial.
Isto nos persuade que, criação direta (imediata), o homem recebeu a im-
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pressão da imagem divina; que na criação as Pessoas divinas, cada uma
efetuou uma obra distinta; e finalmente, que a criação do homem com
referência ao seu destino se realizou pelo sopro do fôlego de Deus513.
511 Consultar referência da nota. Outras características do verbo e seu emprego no AT. podem ser
encontradas em: W. H. SCHMIDT. )frfB: In: JENNI, E.; WESTERMANN, C. Diccionario Teologico
Manual del Antiguo Testamento. Madrid: Ediciones Cristiandad, 1978, 1 v. p. 489-490. BAVINCK, H.
Dogmática Reformada. São Paulo: Cultura Cristã, 2012, 2 v. p. 425.
TURRETINI, F. Compêndio de Teologia Apologética. São Paulo: Cultura Cristã, 2011, 1 v. p. 548.
WALTKE, B. K.; FREDERICKS, C. J. Gênesis. São Paulo: Cultura Cristã, 2010, (Gn 1.1), p. 67-68. Quanto
ao costumeiro exagerado peso dado ao verbo, consultar referência.
512 Consultar referência da nota. Veja também: FOERSTER, W. kti/zw. In: KITTEL, G.; FRIEDRICH, G.
Theological Dictionary of the New Testament. 3 v. p. 1005-1028.
513 Consultar referência da nota.
A SOBERANIA DE DEUS
201
Mas como é que falastes? (...). Efetivamente, qualquer que seja a subs-
tância com que produzistes essa voz, de modo algum poderia existir,
se a não tivésseis criado. Mas que palavra pronunciastes para dar ser à
matéria com que havíeis de formar aquelas palavras?
e enchei as águas dos mares; e, na terra, se multipliquem as aves” (Gn 1.22), revela
o Poder do Criador. Deus, por Sua Palavra, cria o mundo e, segundo o exercí-
cio desse mesmo poder, capacita as suas criaturas a se propagarem, tornando “o
ser humano como co-criador criado”515.
Como indicativo da posição elevada em que o homem foi colocado, o Criador
compartilha com ele – abençoando e capacitando-o516 – do poder de nomear os
animais, envolvendo, nesse processo, inteligência e não arbitrariedade517, e tam-
bém de dar nome à sua mulher (Gn 2.19,20,23; 3.20).
E mais: Deus delega-lhes poderes para cultivar (db;[‘) (‘abad) (lavrar, servir,
trabalhar o solo) e guardar (rm;v’) (shãmar) (proteger, vigiar, manter as coisas)518
o jardim do Éden (Gn 2.15/Gn 2.5; 3.23), demonstrando a sua relação de domínio,
não de exploração e destruição, antes, um cuidado consciente, responsável e preser-
vador da natureza:519 “6 Deste-lhe domínio sobre as obras da tua mão e sob seus pés
tudo lhe puseste: 7 ovelhas e bois, todos, e também os animais do campo; 8 as aves
do céu, e os peixes do mar, e tudo o que percorre as sendas dos mares” (Sl 8.6-8).
Aqui o primeiro casal, atendendo ao mandato cultural, em uma atividade
familiar exclusivamente humana, pode desenvolver e aprimorar a sua capacidade
e potencialidades, refletindo a sua condição de imagem e semelhança de Deus.
514 CHARNOCK, S. Discourses Upon The Existence and Attributes of God. 2 v. p. 47ss.
515 Devo esta expressão ao teólogo luterano Philip J. Hefner. No entanto deve ser observado que o autor
emprega a expressão em uma acepção distinta da minha. Consultar referência da nota.
516 Consultar referência da nota.
517 É muito interessante a abordagem deste exercício de Adão analisado pelo campo da semiótica. Veja:
ECO, U. A Busca da Língua Perfeita na Cultura Européia. 2. ed. Bauru/SP: EDUSC, 2002, p. 25ss.
518 Consultar referência da nota.
519 Consultar referência da nota.
Todavia todas essas atividades envolvem o trabalho compartilhado por Deus com
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o ser humano. O nomear, procriar, dominar, guardar e cultivar refletem a graça
providente e capacitante de Deus. É nesse particular – domínio – que o homem
foi bastante aproximado de Deus pelo poder que lhe foi outorgado.
Ao homem foi conferido o poder de ir além da matéria, podendo raciocinar,
estabelecer conexão e visualizar o invisível. “O pensamento e o conhecimento do
homem, apesar de serem extraídos de seu cérebro, são, todavia, em sua essên-
cia uma atividade inteiramente espiritual, pois transcendem aquilo que ele pode
ver e tocar”522.
Ao homem, portanto, foi concedido o privilégio responsabilizador de pen-
sar, analisar, escolher livremente o seu caminho de vida523, verbalizar os seus
pensamentos e emoções, podendo, assim, dialogar com o seu próximo (Gn 3.6)
e com Deus (Gn 3.9-13), sendo entendido por Ele e entendendo a Sua vontade.
Portanto, desde o início estava constituída uma comunidade, já que: “Comunicar
é uma maneira de compreensão mútua”524.
Quando usamos adequadamente dos recursos que Deus nos confiou para
dominar a terra, estamos cumprindo o propósito da criação, glorificando a Deus.
É necessário, portanto, que glorifiquemos a Deus em nosso trabalho pela forma
legítima como o executamos. Devemos estar atentos ao fato de que o nosso domí-
nio está sob o domínio de Deus. A Criação pertence a Deus por direito; a nós
A SOBERANIA DE DEUS
203
por delegação de Deus (Sl 24.1; 50.10-11; 115.16)525. Ele mesmo compartilhou
conosco esse poder, contudo não abriu mão dele526. Teremos de Lhe prestar contas.
Por isso, ainda que o nosso domínio seja demonstrado, especialmente pelo
avanço da ciência, novos desafios surgem. Encontramos a plenitude desse domí-
nio em Cristo Jesus, verdadeiro Deus e verdadeiro homem.
Algo admirável no Salmo 8 é que o salmista em seu hino começa com Deus,
glorificando o nome de Jeová (hwhy), e conclui tornando a Ele, testemunhando
com júbilo a magnificência de Seu nome em toda a terra: “Ó SENHOR, Senhor
nosso, quão magnífico em toda a terra é o teu nome! Pois expuseste nos céus a tua
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No homem, como reflexo de Seu Criador, Deus deve ser visto, quer em Sua natu-
reza que expressa Deus, quer em seus atos, visto que ele está comprometido com
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na criação era bom, exceto a solidão do homem. “Deus pôs o dedo na única defi-
ciência existente no Paraíso”530.
Waltke “acentua que a declaração é altamente enfática. Essencialmente, é
ruim para Adão viver sozinho”531. Com essa constatação, inicia-se uma belís-
sima descrição do cuidado de Deus para sua criatura:
As cenas da criação são pintadas como se um artista as visualizasse:
Deus, como o oleiro, formando o homem; como jardineiro, designando
um jardim de beleza e abundância; e como um edificador de templo,
tomando a mulher da costela do homem532.
O paraíso não era o céu533. O homem ainda não havia percebido isso, no entanto
Deus sabe que a solidão lhe fará mal. A carência vai se tornar evidente: Deus
passou diante de Adão todos os animais, para que este pudesse nominá-los, dis-
tinguindo cada espécie. Aqui vemos, de passagem, a inteligência de Adão, tendo
condições de discernir as espécies, exercitando a sua capacidade de julgar, atri-
buindo nomes que, certamente, estavam relacionados a características essenciais
dos animais534. Entre toda a Criação, não há uma companheira a altura do homem.
A SOBERANIA DE DEUS
205
535 Consultar referência da nota. Calvino (1509-1564) escreveu: “O homem é um animal social de
natureza, consequentemente, propende por instinto natural a promover e conservar esta sociedade e,
por isso, observamos que existem na mente de todos os homens impressões universais não só de uma
certa probidade, como também de uma ordem civil” (CALVINO). Em outro lugar, entendendo que o
princípio de que não seja bom que o homem viva sozinho não se restringe a Adão, diz que “o homem foi
formado para ser um animal social”, acrescenta: “Mas ainda que Deus declarasse, no que respeita a Adão,
que não lhe seria proveitoso viver sozinho, contudo não restrinjo a declaração unicamente à sua pessoa,
mas, antes, a considero como sendo uma lei comum da vocação do homem, de modo que cada um deve
recebê-la como dita a si próprio: que a solidão não é boa, excetuando somente aquele a quem isenta como
que por um privilégio especial” (CALVIN, p. 128).
536 Consultar referência da nota.
537 Consultar referência da nota.
538 Diz a Confissão de Westminster: “O matrimônio foi ordenado para o auxílio mútuo de marido e
mulher, para a propagação da raça humana por uma sucessão legítima, e da Igreja por uma semente santa,
e para evitar-se a impureza” Gn 2.18 e 9.1; Ml 2.15; 1Co 7.2,9. Consultar referência.
539 Consultar referência da nota. “A relação em ‘uma só carne’ envolve mais do que sexo; é a fusão de duas
vidas em uma; é consentir em compartilhar a vida juntos, através do pacto do casamento; é a completa
entrega de si mesmo a um novo círculo de existência, ao lado de um companheiro” (ORTLUND JR apud
PIPER; GRUDEM, p. 39).
A mulher foi criada para ser companheira do homem. Desse modo, percebe-se
a ideia de complemento. O homem sozinho estaria no paraíso, contudo perma-
neceria só, sem uma companheira. O paraíso sem a mulher seria um paraíso
incompleto, insatisfatório. No céu, seremos como os anjos, não nos casaremos
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(Mt 22.30). Adão, no seu estado terreno, ainda precisa do auxílio de uma esposa.
Visto que a mulher completaria o homem, esta tornar-se-ia da mesma forma
incompleta se não cumprisse a sua missão. Vemos então aqui que somente os
dois juntos, tornando-se uma só carne, se encaminham para a plenificação como
imagem e semelhança de Deus por meio da geração de filhos, a proliferação da
raça humana e o uso de seus talentos de forma criativa e construtiva.
O rabino Cassuto (2010, p. 105) colocou isso de forma poética: “Assim como
a costela se encontra no lado do homem e lhe é anexa, da mesma forma a boa
esposa, a costela de seu esposo, fica a seu lado para ser sua auxiliar-sósia, e sua
alma faz fronteira com a dele”540.
Auxiliadora idônea
“Far-lhe-ei uma auxiliadora (rz<[e) (‘ezer)541 que lhe seja idônea (dg<n<)
(neged)” (Gn 2.18), é a solução encaminhada por Deus.
Auxiliadora
(rz<[e) (‘ezer): “Auxiliadora”, “ajudadora”. Esta palavra que, nos tempos moder-
nos, é com frequência olhada como se fosse uma diminuição da mulher, tem, na
realidade, um tom extremamente significativo. Ela é empregada especialmente
para descrever a ação de Deus que vem em socorro do homem. Deus mesmo é o
ajudador dos pobres (Sl 72.12), dos órfãos (Sl 10.14/Jó 29.12); daqueles que não
podem contar com mais ninguém (Sl 22.11). Por isso, podemos contar com Deus
A SOBERANIA DE DEUS
207
nos momentos de enfermidade (Sl 28.7), nas opressões de inimigos (Sl 54.4) e em
períodos de grande aflição (Sl 86.17). Aqueles que vivem fielmente, buscando
seu amparo em Deus, podem ter a certeza do Seu cuidado (Sl 37.40/Sl 89.21),
sendo a Sua lei e as Suas mãos os seus auxílios (Sl 119.173,175)542. Por isso, os
servos de Deus suplicam a Sua ajuda na batalha e nas aflições (Dt 33.7/Sl 20.2;
30.10; 79.9; 109.26; 119.86). O rei Uzias tornou-se famoso internacionalmente
porque por trás de todos os seus empreendimentos estava a maravilhosa ajuda
de Deus (2Cr 26.15). Por outro lado, quando Israel deixou de confiar no sustento
de Deus e buscou aliança com os egípcios para a sua proteção, Deus diz que isso
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de nada adiantaria contra a Babilônia (Is 30.5,7; 31.3/Os 13.9). Somos desafiados,
então, a confiar em Deus, porque Ele cuida de nós, é o nosso amparo (Sl 33.20;
70.5; 72.12; 115.9-11; 124.8; Is 44.2): de Deus vem o nosso socorro (Sl 121.1-2).
Israel é feliz porque tem a Deus como aquele que o socorre (Dt 33.26,29). Felizes
são todos aqueles que têm a Deus por auxílio (Sl 146.5). Devido ao Seu socorro,
devemos entoar louvores ao Seu nome (Sl 28.7).
Dentro das profecias messiânicas de Isaías, vemos a confiança do Ungido do
Senhor. Certo do socorro do Senhor, sabe que não será envergonhado (Is 50.7,9).
Harriet e Gerard fazem uma bela e real aplicação: “Que papel importante
Deus dá a mulher. Ela se coloca ao lado do seu marido como auxiliadora, assim
como Deus se coloca ao lado de seu povo”543.
Idônea
(dg<n<) (neged): “Idônea” tem o sentido de “correspondente a ele”, “con-
forme”, “aquilo que corresponde“,“sua contrária”. Significa também “estar em
frente”, “defronte” (Êx 19.2; Js 3.16; 6.5,20; Dn 6.11).
A mulher foi formada como uma “contraparte” do homem, é uma seme-
lhança perfeita dele, ainda que lhe seja oposta, no sentido de complemento. O
homem aprovou a criação de Deus, porque pôde perceber a mulher “não como
sua rival mas como sua companheira, não como uma ameaça mas como a única
capaz de realizar seus desejos íntimos”544.
542 “173Venha a tua mão socorrer-me, (rz:[‘)(‘azar) pois escolhi os teus preceitos. (…) 175 Viva a minha alma
para louvar-te; ajudem-me (rz:[‘)(‘azar) os teus juízos” (Sl 119.173, 175).
543 Consultar referência da nota.
544 Consultar referência da nota.
Robertson analisa:
O propósito da existência do homem como ser criado não é ser um
auxílio para a mulher no casamento. Mas o propósito da existência da
mulher como ser criado é glorificar a Deus sendo um auxílio para o
homem.
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
respondeu a ele de tal maneira que fez dela o auxílio adequado de que
ele necessitava.
Este traço distintivo da mulher indica que ela não é menos significativa
do que o homem com respeito à pessoa dela. De maneira igual ao ho-
mem, ela traz em si mesma a imagem e semelhança de Deus (Gn 1.27).
Somente como igual em pessoalidade podia a mulher ‘corresponder’ ao
homem (ROBERTSON, O. P. Cristo dos Pactos. 1997, p. 69).
Deus, ao criar a mulher, não a fez inferior; ela também foi feita conforme a ima-
gem e semelhança de Deus (Gn 1.27). A ordem divina quanto ao povoar a terra,
dominar, guardar e cultivar é responsabilidade de ambos. Os dois partilham dos
deveres e responsabilidades conferidos por Deus. Sozinhos, ambos são insufi-
cientes para cumprirem o propósito de Deus em sua vida.
A SOBERANIA DE DEUS
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de essencial indica.
549 Consultar referência. Veja também: RAD, G. V. El Libro del Genesis. Salamanca: Sigueme, 1977, p. 69.
550 Consultar referência da nota.
551 “1Este é o livro da genealogia de Adão. No dia em que Deus criou o homem, à semelhança (tUm:D)
(Demüth) de Deus o fez; (…) 3 Viveu Adão cento e trinta anos, e gerou um filho à sua semelhança (tUm:D)
(Demüth), conforme a sua imagem (meelec) (Tsëlëm), e lhe chamou Sete” (Gn 5.1,3). “Se alguém derramar
o sangue do homem, pelo homem se derramará o seu; porque Deus fez o homem segundo a sua imagem
(meelec) (Tsëlëm)” (Gn 9.6). “Porque, na verdade, o homem não deve cobrir a cabeça, por ser ele imagem
e glória de Deus, mas a mulher é glória do homem” (1Co 11.7). “E vos revestistes do novo homem
que se refaz para o pleno conhecimento, segundo a imagem daquele que o criou” (Cl 3.10). “Com ela,
bendizemos ao Senhor e Pai; também, com ela, amaldiçoamos os homens, feitos à semelhança de Deus”
(Tg 3.9/Pv 14.31).
552 Consultar referência da nota.
553 Consultar referência da nota.
554 Consultar referência da nota.
A SOBERANIA DE DEUS
211
Assim sendo, o homem não foi feito da mesma substância de Deus, apenas
foi-lhe concedido alguns de Seus atributos. Continuando essa linha de raciocí-
nio, diz: “Contemplando a glória de Cristo, estamos sendo transformados, como
pelo Espírito do Senhor, Que, certamente, opera em nós, na mesma imagem Sua,
contudo, não assim que nos renda consubstanciais a Deus”555.
O homem foi criado por Deus segundo o próprio modelo divino (Ef 4.24)556,
isso não significa que o homem seja fisicamente igual a Deus. Deus não tem
forma, é espírito (Jo 4.24)557, nem significa que seja da mesma essência, visto que
esta é incomunicável558. A imagem e semelhança refletem, em Adão, característi-
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cas próprias por intermédio das quais ele poderia relacionar-se consigo mesmo,
com o mundo e com Deus. A imagem de Deus é uma precondição essencial para
o seu relacionamento com Deus e expressa, também, a sua natureza essencial: o
homem é o que é por ser a imagem de Deus. Não existiria humanidade senão pelo
fato de ser a imagem de Deus, esta é a nossa existência autêntica e toda inclusiva.
Barth (2010, p. 184), com propriedade, escreveu: “Ele não seria homem
se não fosse a imagem de Deus. Ele é a imagem de Deus pelo fato de que ele é
homem”559. Desse modo, “ser humano é ser a imagem de Deus. Portanto, imago
Dei descreve nosso estado normal. Não assinala algo que está dentro de nós, ou
a algo acerca de nós, senão a nossa humanidade”560. A imagem de Deus não é
algo colado ou anexado a nós, podendo ser tirado ou recolocado. Antes, é algo
essencial ao nosso ser. “A imagem de Deus é intrínseca à humanidade. Não sería-
mos humanos sem ela. De toda a criação, somente nós somos capazes de ter um
relacionamento pessoal consciente com o Criador e de reagir a Ele”561. Portanto,
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do mal; enquanto obedeceram este preceito, foram felizes em sua co-
munhão com Deus e tiveram domínio sobre as criaturas.
A SOBERANIA DE DEUS
213
mesmo tempo em que não era impossível ao homem pecar, também não havia
nele nada que o constrangesse a fazê-lo564. O homem é a “expressão mais nobre e
sumamente admirável de Sua justiça, e sabedoria e bondade”565. Calvino explica
o que significa “retidão” e “verdadeira santidade”: “Portanto, por esta palavra
se designa a perfeição de toda nossa natureza, como apareceu quando Adão
foi dotado com um reto juízo, tinha os afetos em harmonia com a razão, tinha
todos os seus sentidos íntegros e bem regulados e realmente excedia em tudo o
que é bom”566. Em outro lugar: “Do quê concluímos que, de início, a imagem
de Deus foi conspícua na luz da mente, na retidão do coração e na saúde de
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Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
etc. A queda trouxe sérias consequências: a morte e a escravidão. “Como a morte
espiritual não é outra coisa senão o estado de alienação em que a alma subsiste
em relação a Deus, já nascemos todos mortos, bem como vivemos mortos até que
nos tornamos participantes da vida de Cristo”575. O homem perdeu totalmente
seu discernimento espiritual: ele está morto! O pecado traz, em outro estágio, a
idolatria, visto que o homem sozinho não consegue se relacionar com Deus e até
mesmo ignora o Deus verdadeiro (At 17.22-29). João Amós Comênio comenta:
É evidente que todo o homem nasce apto para adquirir conhecimento
das coisas: Primeiro, porque é imagem de Deus. Com efeito, a imagem,
se é perfeita, apresenta necessariamente os traços do seu arquetípico,
fiou então não será uma imagem. Ora, uma vez que, entre os atribu-
tos de Deus, se destaca a onisciência, necessariamente brilhará no ho-
mem algo de semelhante a ela. (...) A tal ponto a mente do homem é de
capacidade inesgotável que, no conhecimento, se apresenta como um
abismo....
A SOBERANIA DE DEUS
215
576 Pensam de igual modo, entre outros: SANTO AGOSTINHO. A Cidade de Deus. Petrópolis, RJ/São
Paulo: Vozes/Federação Agostiniana Brasileira, 1990, 2 v. Livro XIV.1. p. 131.
Consultar os outros na referência desta nota.
577 Consultar referência da nota.
578 Consultar referência da nota.
579 Ainda que a compreensão de Brunner (1889-1966) seja limitante, visto que interpretou a Criação
em termos simplesmente existencialistas, portanto, não crendo na historicidade da Criação e Queda,
identificando o conceito de imagem e semelhança como a capacidade de relacionar-se com Deus em amor,
o que diz aqui é relevante (BRUNNER, 2006, p. 107-115; 364-367). Compare com outros, encontrados na
referência desta nota. “O homem que através de sua mente pode pensar o universo, descobrir suas leis, e
estimar sua extensão, é maior do que o universo. (...) A verdadeira grandeza do homem não é sua razão,
pela qual aprende a conhecer, mas consiste no fato de que foi feito para a comunhão com Deus e com
os demais indivíduos” (BRUNNER, 2006, p. 100). Para uma resenha crítica da posição de Brunner, veja:
HOEKEMA, A. A. Criados à Imagem de Deus. São Paulo: Editora Cultura Cristã, 1999, p. 66-72.
580 Consultar referência da nota.
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refletir o governo de Deus mediante um governo real exercido sobre a terra”586.
Portanto, o domínio sobre a Criação não significa destruição e matança, antes o
conhecimento e o interesse587 próprio pelo que nos fora confiado e o desejo de
preservá-lo para poder apresentar a Deus o resultado de nosso trabalho, feito
em obediência à Sua vontade e, portanto, realizado para a Sua glória. O homem
glorifica a Deus cumprindo o propósito de Deus para a Sua Criação.
Renunciar a esse governo ou transformá-lo em destruição significa rejeitar
algo de característico na sua natureza essencial de imagem de Deus588.
8) Corporeidade: Deus não tem corpo, nem por isso o corpo humano é
menos importante do que a sua alma. Deus é Quem cria o espírito e a matéria.
É por meio de seu corpo que o homem reflete as maravilhas de ter sido criado
à imagem de Deus. Não há no homem uma espiritualização em detrimento do
corpo. O homem é um ser integral. A salvação é integral, assim como será a nossa
morada eterna após a nossa ressurreição final. Portanto, cremos que a imagem de
Deus abrange o seu corpo. Jesus Cristo se encarnou para salvar o homem todo.
A SOBERANIA DE DEUS
217
589 “Apesar de ter sido colocado num Paraíso, cercado de abundantes bênçãos de Deus, o homem escolheu
resistir ao direito de Deus de governar sobre ele” (LAWSON, 2012, p. 76).
590 Consultar referência da nota.
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
que certamente de alguma forma cultivavam, de serem iguais a Deus. Eles se
esqueceram de todo o histórico de sua relação com o Deus fiel, amoroso, justo e
sábio592; o seu desejo falou mais alto aos seus corações. O desejo, ainda que por
vezes momentâneo, tende a eternizar-se na brevidade de seu ardor. Aqui eles
conceberam o que pode ser chamado de mal moral593.
Paulo, interpretando o acontecimento histórico registrado em Gênesis, diz:
“Mas receio que, assim como a serpente enganou (e)capata/w = desviou, sedu-
ziu, desencaminhou) a Eva com a sua astúcia (panourgi/a594 = “ardil”, “truque”,
“maquinação”, “trapaça”), assim também sejam corrompidas as vossas mentes, e
se apartem da simplicidade e pureza devidas a Cristo” (2Co 11.3). Novamente:
“A mulher, sendo enganada, (e)capata/w) caiu em transgressão” (1Tm 2.14).
O verbo grego595 tem o sentido de enganar completamente, conseguindo
totalmente o seu objetivo; desse modo, Eva, conforme o texto nos diz, foi comple-
tamente enganada por Satanás. Assim, quando ela cede à tentação, está plenamente
convencida de que o que faz é certo dentro de seus objetivos duvidosos. Daqui
podemos concluir que a certeza subjetiva não significa necessariamente a cor-
reta interpretação dos fatos. Satanás enganou Eva e Adão. Após isso, os fez crer
591 Devo pontuar que entendo a teologia como uma sistematização do revelado na Palavra, a fim de tornar
mais compreensível a plenitude da revelação. A teologia, portanto, nada tem a dizer além das Escrituras.
Ela não a substitui, nem a completa, antes, deve ser a sua serva. A teologia brota dentro da intimidade da
fé daqueles que cultuam a Deus e comprometem-se com a edificação da igreja.
592 “O pecado original foi o pecado de esquecer Deus. Adão e Eva deram as costas a Ele – daí os
problemas” (LLOYD-JONES, 2004, p. 47).
593 “Mal moral é o mal resultante das escolhas e das ações dos seres humanos” (NASH apud BECKWITH
et al., 2006, p. 247).
594 Ocorre 5 vezes no NT.: Lc 20.23; 1Co 3.19; 2Co 4.2; 11.3; Ef 4.14.
595 e)capata/w (exapatáõ)* Rm 7.11; 16.18; 1Co 3.18; 2Co 11.3; 2Ts 2.3; 1Tm 2.14.
A SOBERANIA DE DEUS
219
que a mentira em que creram era a verdade. Satanás, que tem pretensões divi-
nas, fez com que Eva o seguisse. Adão a seguiu. Ninguém seguiu Deus. O caos
se instalara. Nossos primeiros pais demonstraram que seguiriam a um novo
senhor. As consequências viriam de forma intensamente perceptível. A proximi-
dade de Satanás os afastara cada vez mais de Deus. No tempo próprio, que não
demoraria, eles se esconderiam da presença de Deus (Gn 3.8-10). A presença
abençoadora e alegre de Deus, no cair da tarde, tornou-se uma presença terri-
ficante e assombrosa. Deus continuava a ser o mesmo. O homem, todavia, não.
O pecado nos afasta de Deus, rejeitando a Sua presença que, por si só, revela o
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596 “Os homens pecaminosos nunca se dispõem a andar dentro das fronteiras que Deus impõe às suas
criaturas. Em sua arrogância, declaram sua suposta liberdade e reivindicam ser senhores de seus próprios
destinos” (HARMAN, 2011, p. 79).
597 Bonhoeffer, com argúcia, disse que: “Também Satanás sabe empregar a Palavra de Deus como arma na
luta” (BONHOEFFER, 1968, p. 52).
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tem um referencial totalmente excludente, o qual ele dilui muito bem a fim de
dar-nos a impressão de que a sua conclusão é coerente com a Palavra600. Como
bem disse Bonhoeffer (1906-1945): “A fraude, a mentira do diabo consiste na sua
tentativa de fazer o homem acreditar que poderia viver sem a Palavra de Deus”
(BONHOEFFER, 1968, p. 60).
Com esse propósito, ele também age por intermédio de falsos mestres, dizen-
do-nos que pode nos levar à verdade plena muito superior a que nos é proposta
pela Escritura. Foi isso que ocorreu na Igreja de Corinto: os falsos mestres usa-
dos por Satanás fizeram muitos crentes acreditarem que o apóstolo Paulo era
desprezível, portanto não poderia dar-lhes ensinamento profundo. Nós sabemos
quanto sofrimento isso trouxe à Igreja e a Paulo, quanta dor e desvios doutriná-
rios e, consequentemente, um distanciamento de Deus. Satanás sempre objetiva
nos afastar de Deus e, quando damos crédito às suas insinuações, ele alcança o
seu objetivo.
O pecado é enganoso, dando-nos a impressão, em um primeiro momento, de
plena e completa satisfação. Ele tende a satisfazer os nossos desejos mais imedia-
tos, muitos dos quais até legítimos em determinadas circunstâncias – ainda que
nem sempre –; no entanto fornece-nos caminhos que conflitam com a Palavra
598 Outro mal contemporâneo é aquilo que MacArthur chama de “teologia da autoestima” e “psicologia da
autoestima”. Consulte: MACARTHUR JR., J. Sociedade sem Pecado. São Paulo: Editora Cultura Cristã,
2002, p. 74ss.
599 Consultar referência da nota.
600 “O credo alternativo do diabo contém, frequentemente, alguns elementos da verdade, escolhidos com
cuidado – mas sempre diluídos e totalmente misturados com falsidades, contradições, deturpações,
distorções e qualquer outra perversão imaginável da realidade. E, somando tudo isso, o resultado final é
uma grande mentira” (MACARTHUR JR., 2008, p. 71).
A SOBERANIA DE DEUS
221
([r;)(ra`) não comerás; porque, no dia em que dela comeres, certamente mor-
rerás” (Gn 2.16-17).
Eles desobedeceram. A chave da questão não está na árvore, antes, na deso-
bediência à ordem de Deus: “Perguntou-lhe Deus: Quem te fez saber que estavas
nu? Comeste da árvore de que te ordenei (hw"c') (tsavah) que não comesses?”
(Gn 3.11)601.
Observe a ênfase dada à ordem divina. Somente Deus tem autoridade para
estabelecer leis e critérios para a Sua criação. Na realidade, pouco importaria para
Deus o que o homem comeria no Jardim do Éden, exceto pelo fato de Ele estabe-
lecer a Sua proibição como sinal de Sua autoridade absoluta, demarcando o limite
que caracterizaria a obediência ou não do homem e da mulher, Suas criaturas602.
Apesar de o pecado ter comprometido de forma gravíssima todas as faculda-
des originais do ser humano, o homem não deixou de ser a imagem e semelhança
de Deus – visto que isso implicaria em deixar de ser homem. Nele “esses atributos
ainda estão presentes em ‘pequenas reservas’ remanescentes da sua criação”603.
Contudo ele se tornou uma imagem desfigurada, pervertida, desfocalizada, mais
propriamente uma “caricatura” do Seu Criador604. Em outras palavras: conti-
nuamos sendo homens, ainda que em franca rebelião contra Deus. Perdemos,
601 “E a Adão disse: Visto que atendeste a voz de tua mulher e comeste da árvore que eu te ordenara (hw"c')
(tsavah) não comesses, maldita é a terra por tua causa; em fadigas obterás dela o sustento durante os dias de
tua vida” (Gn 3.17). O contraste posterior com Noé é evidente. Este, fez tudo quando o Senhor ordenara
(hw"c') (tsavah) (Gn 6.22, 7.5,9,16). Os mandamentos de Deus são para serem literalmente cumpridos: “Tu
ordenaste (hw"c') (tsavah) os teus mandamentos, para que os cumpramos à risca” (Sl 119.4).
602 Consultar referência da nota.
603 Consultar referência da nota.
604 Consultar referência da nota.
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Calvino (1509-1564), comentando esse assunto, disse que:
Quando de seu estado [original] decaiu Adão, não há mínima dúvida
de que por esta defecção se haja alienado de Deus. Pelo que, embora
concedamos não haja sido nele aniquilada e apagada de todo a imagem
de Deus, foi ela, todavia, corrompida a tal ponto que, o que quer que
resta é horrenda deformidade605.
O Significado do Pecado
O “Catecismo Menor de Westminster” define bem a questão: “Pecado é qual-
quer falta de conformidade com a lei de Deus, ou qualquer transgressão desta
lei”606 (Veja: Tg 2.10; 4.17; 1Jo 3.4).
605 Consultar referência da nota. Em outro lugar, escreve Calvino: “O primeiro homem foi criado por Deus
em retidão; em sua queda, porém, arrastou-nos a uma corrupção tão profunda, que toda e qualquer luz
que lhe foi originalmente concedida ficou totalmente obscurecida. (...) Só quando aliado ao conhecimento
de Deus é que alguns dos dotes a nós conferido do alto se pode dizer que possui alguma excelência real.
À parte disso, eles se acham viciados por aquele contágio do pecado que não deixou sequer um vestígio
no homem de sua integridade original” (CALVINO, 1999, p. 579). “Tão logo Adão alienou-se de Deus
em consequência de seu pecado, foi ele imediatamente despojado de todas as coisas boas que recebera”
(CALVINO, 1997, p. 57). “É verdade que ela (a imagem de Deus no homem) não foi totalmente extinta;
mas, infelizmente, quão ínfima é a porção dela que ainda permanece em meio à miserável subversão e
ruínas da queda” (CALVINO, 1999, p. 169).
606 Consultar referência da nota.
A SOBERANIA DE DEUS
223
Pecar significa agir de maneira contrária aos princípios expressos por Deus
em Sua Palavra607. No pecado de nossos primeiros Pais, encontramos a expres-
são da falta de amor por Deus que eles já cultivavam em seus corações608.
O Pecado é universal
Todos pecaram. O homem, além de não querer, nada pôde fazer para deixar
de pecar. Após a queda, a natureza humana se corrompeu total e intensamente,
estendendo essa contaminação a todas as áreas da sua vida. O pecado trouxe
um quadro de irreversibilidade pecaminosa que se perpetuou em todos os seres
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humanos devido o seu pecado. Ou seja: o homem continuou nessa prática (Gn
6.5; 8.21; Is 64.6; Rm 3.9-12). A Escritura nos fala que o pecado, comum a todos
nós (Rm 3.23), nos fez cativos (Jo 8.34; Rm 6.20; 7.23), habitando em nós (Rm
7.17,20), mantendo-nos sob o seu domínio. Portanto, negar a nossa condição
de pecadores é negar a própria Palavra de Deus, que diz: “Se dissermos que não
temos cometido pecado, fazemo-lo mentiroso e a sua palavra não está em nós”
(1Jo 1.10). “Não ser consciente de pecado algum é o pior pecado de todos”609.
O pecado é o grande nivelador de toda a humanidade: todos pecaram, todos
estão no mesmo nível610, não há lugar para arrogância ou supostas boas obras
justificadoras (Rm 3.19-20)611. Se todos pecaram, isso significa que nós também
pecamos; se todos precisam de salvação, significa que nós também precisamos.
“Pecado não é algo peculiar a uns poucos, senão que permeia o mundo intei-
ro”612. O pecado nos impossibilita totalmente de nos salvar a nós mesmos.
Na “Oração do Senhor”, temos um indicativo da universalidade do pecado. “O
fato de Jesus ensinar a todas as pessoas a fazerem esta oração demonstra a univer-
salidade do pecado; e para repetir esta oração se requer um sentido de pecado”613.
607 “O pecado não é um lapso lamentável de padrões convencionais; a sua essência é a hostilidade para com
Deus (Romanos 8.7), manifesta em rebeldia ativa contra Ele” (STOTT, 1991, p. 80).
608 “O pecado de Adão consistiu no fato de que ele baniu todo o amor por Deus do seu coração. (...)
Quando Adão deixou de amar a Deus, ele começou a odiá-lo” (KUYPER, 2010, p. 361).
609 Consultar referência da nota.
610 Consultar referência da nota.
611 “Ora, sabemos que tudo o que a lei diz, aos que vivem na lei o diz para que se cale toda boca, e todo
o mundo seja culpável perante Deus, visto que ninguém será justificado diante dele por obras da lei, em
razão de que pela lei vem o pleno conhecimento do pecado” (Rm 3.19-20).
612 Consultar referência da nota.
613 Consultar referência da nota.
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como é usada nas Escrituras com referência às consequências do peca-
do, inclui todas as formas de mal que são infligidas como castigo desse
pecado. (...) Significa, pois, a miséria eterna do inferno (...) juntamente
com o antegozo dessas misérias que são os males e penalidades que
passamos neste mundo614.
A SOBERANIA DE DEUS
225
parte desse juízo já é manifesto nessa vida (Jo 3.16-18), mas não totalmente; daí a
perplexidade de alguns servos de Deus em determinados momentos da história,
quando o mal parece oprimir e esmagar o bem (Sl 73.1-14; Hc 1.1-17; Ml 3.14-15)620.
As consequências, portanto, não foram simplesmente visivelmente imedia-
tas. Elas ainda iriam aparecer. A natureza humana foi corrompida. O juízo de
Deus entrou em processo de concretização, tornando a vida uma caminhada
para a morte 621. O processo de morte entrou em cena na vida humana. A morte,
portanto, soa como algo anormal622, contrária ao nosso desejo de viver. O nosso
desejo vislumbra a perpetuidade da vida; os nossos esforços se concentram nesse
ideal, enquanto que o nosso organismo caminha de forma cada vez mais célere
para a morte. Essa é a terrível geografia da humanidade. “O que distingue os
humanos de todas as outras criaturas é a autoconsciência. Sabemos que esta-
mos vivos e que morreremos, e não conseguimos deixar de questionar por que
a vida é assim e qual é o seu significado”623.
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eternamente para Deus, não tendo mais oportunidade de arrependimento (Hb 9.27).
Em síntese, o pecado lançou o homem em um estado de miséria espiritual contra
o qual ele nada pode fazer (Mt 19.25,26; Gl 2.16; Ef 2.9). Isso torna todos os homens
dependentes única e exclusivamente da salvação de Deus manifestada em Cristo.
Depravação total
O homem após a Queda prolifera o pecado, gerando filhos à sua imagem caída:
“Viveu Adão cento e trinta anos, e gerou um filho à sua semelhança, conforme
a sua imagem, e lhe chamou Sete” (Gn 5.3). E assim se sucedeu com os filhos de
seus filhos, até à nossa geração (Gn 8.21; Sl 50.5; 58.3).
Calvino comenta com maestria:
Ao dizer que Sete gerou um filho conforme sua própria imagem, em
parte a referência é à primeira origem de nossa natureza; ao mesmo
tempo deve-se notar sua corrupção e poluição, as quais, sendo con-
traídas por Adão, por sua queda, inundou toda sua posteridade. Se
permanecesse íntegro, teria transmitido a todos os seus filhos o que
havia recebido; agora, porém, lemos que Sete, bem como os demais, foi
maculado, porque Adão, que decaíra de seu estado original, a ninguém
podia gerar senão seres semelhantes a ele próprio (CALVIN, 1981, p.
228-229).
624 “.... as vossas iniquidades fazem separação entre vós e o vosso Deus; e os vossos pecados encobrem o
seu rosto de vós, para que vos não ouça” (Is 59.2). “Ele vos deu vida, estando vós mortos nos vossos delitos
e pecados (...) E estando nós mortos em nossos delitos, nos deu vida juntamente com Cristo, - pela graça
sois salvos” (Ef 2.1,5). “E a vós outros, que estáveis mortos pelas vossas transgressões e pela incircuncisão
da vossa carne, vos deu vida juntamente com ele, perdoando todos os nossos delitos” (Cl 2.13). “Porque
pela graça sois salvos, mediante a fé; e isto não vem de vós; é dom de Deus; não de obras, para que
ninguém se glorie” (Ef 2.8-9).
625 Consultar referência da nota.
626 Consultar referência da nota.
A SOBERANIA DE DEUS
227
uma ideia adequada do domínio do pecado, a menos que nos convençamos dele
como algo que se estende a cada parte da alma, e reconheçamos que tanto a
mente quanto o coração humano se têm tornado completamente corrompidos”
(CALVINO, 1981, p. 431). Calvino, interpretando Rm 8.7, diz:
...nada, senão a morte, procede dos labores de nossa carne, visto que os
mesmos são hostis à vontade de Deus. Ora, a vontade de Deus é a nor-
ma da justiça. Segue-se que tudo quanto seja contrário a ela é injusto; e
se é injusto, também traz, ao mesmo tempo, a morte. Contemplamos a
vida em vão, caso Deus nos seja contrário e hostil, pois a morte, que é
a vingança da ira divina, deve necessariamente seguir de imediato a ira
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divina (CALVINO, 1981, p. 266-267).
630 “O homem foi formado para ser um animal social” (CALVIN, 1981, p. 128). Em outro lugar: “O
homem é um animal social de natureza, consequentemente, propende por instinto natural a promover e
conservar esta sociedade e, por isso, observamos que existem na mente de todos os homens, impressões
universais não só de uma certa probidade, como também de uma ordem civil” (CALVINO).
631 “Pelo pecado estamos alienados de Deus” (CALVINO, p. 32). “Tão logo Adão alienou-se de Deus
em consequência de seu pecado, foi ele imediatamente despojado de todas as coisas boas que recebera”
(CALVINO, 1997, p. 57). “Como a vida espiritual de Adão era o permanecer unido e ligado a seu Criador,
assim também o dEle alienar-se foi-lhe a morte da alma” (CALVINO).
632 Podemos também chamar de aspecto “lato”, “estrutural” ou “formal”. Para uma visão panorâmica do uso
desses termos, consultar referência da nota.
633 Consultar referência da nota.
634 Podemos também chamar de aspecto “estrito”, “funcional” ou “material”. Para uma visão panorâmica do
uso desses termos, consultar: HOEKEMA, A. A. Criados à Imagem de Deus. São Paulo: Editora Cultura
Cristã, 1999, p. 84-88,101. “Ele é a criatura que, inicialmente, foi criada à imagem e semelhança de Deus,
e essa origem divina e essa marca divina nenhum erro pode destruir. Contudo, ele perdeu, por causa do
pecado, os gloriosos atributos de conhecimento, justiça e santidade que estavam contidos na imagem de
Deus. Todavia, esses atributos ainda estão presentes em ‘pequenas reservas’ remanescentes da sua criação;
essas reservas são suficientes não somente para torná-lo culpado, mas também para dar testemunho
de sua primeira grandeza e lembrá-lo continuamente de seu chamado divino e de seu destino celestial”
(BAVINCK, 2001, p. 17-18).
A SOBERANIA DE DEUS
229
635 Consultar referência da nota. Agostinho (354-430), comentando o Salmo 148, faz uma analogia
muito interessante: “Como nossos ouvidos captam nossas palavras, os ouvidos de Deus captam nossos
pensamentos. Não é possível agir mal quem tem bons pensamentos. Pois as ações procedem do
pensamento. Ninguém pode fazer alguma coisa, ou mover os membros para fazer algo, se primeiro não
preceder uma ordem de seu pensamento, como do interior do palácio, qualquer coisa que o imperador
ordenar, emana para todo o império romano; tudo o que se realiza através das províncias. Quanto
movimento se faz somente a uma ordem do imperador, sentado lá dentro? Ao falar, ele move somente
os lábios; mas move-se toda a província, ao se executar o que ele fala. Assim também em cada homem, o
imperador acha-se no seu íntimo, senta-se em seu coração; se é bem e ordena coisas boas, elas se fazem; se
é mau, e ordena o mal, o mal se faz” (SANTO AGOSTINHO, 1998, p. 1126-1127).
636 Consultar referência.
637 “Moral e espiritualmente, o caráter do homem estampa a imagem de Satanás, e não a de Deus. Ora, é
precisamente isso o que a Bíblia quer dizer quando fala sobre o homem caído no pecado como ‘filho do
diabo’ (Jo 8.44; Mt 13.38; At 13.10 e 1Jo 3.8)” (PACKER, 1994, p. 67).
638 Consultar referência.
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
do mais, deve-se notar que os homens não são isentados de culpa e
condenação mediante o pretexto desta servidão; porque, embora todos
se apressem para o mal, contudo não são impelidos por qualquer força
extrínseca, e sim pela inclinação direta de seus próprios corações; e,
por fim, pecam não de outro modo, senão voluntariamente (CALVIN,
1981, p. 284-286).
Por intermédio de Isaías, Deus faz uma analogia extremamente forte para ilus-
trar a nossa situação. Ele toma dois animais difíceis de trato: o boi e o jumento.
Mostra que a obtusidade, a teimosia e a dificuldade de condução desses animais
dão-se pela sua própria natureza; no entanto assim mesmo eles sabem reconhe-
cer os seus donos, aqueles que lhes alimentam. O homem, por sua vez, como
coroa da criação639, cedendo ao pecado, perdeu totalmente o seu discernimento
espiritual. Já não reconhecemos nem mesmo o nosso Criador, antes lhe volta-
mos as costas e prosseguimos em outra direção:640
O boi conhece o seu possuidor, e o jumento, o dono da sua manjedou-
ra; mas Israel não tem conhecimento, o meu povo não entende. Ai des-
ta nação pecaminosa, povo carregado de iniquidade, raça de malignos,
filhos corruptores; abandonaram o SENHOR, blasfemaram do Santo
de Israel, voltaram para trás (Is 1.3-4).
Com o pecado, o homem tornou-se positivamente mau (Gn 6.5; 8.21; Mt 7.11)
e incapaz de:
639 “Não é arrogância humana acreditar que seja a coroa, o alvo da criação. Ela o é, não apenas porque seja
a última numa série ascendente, mas porque, pela sua natureza, foi estabelecida para isso” (BRUNNER,
2006, p. 99).
640 Lloyd-Jones explora com vivacidade a analogia do texto. Veja: LLOYD-JONES, D. M. O Caminho de
Deus, não o nosso. p. 43-46.
A SOBERANIA DE DEUS
231
a) Fazer o Bem: O homem é mau, por isso não pode produzir bons frutos
(Jó 14.4; Jr 13.23; Mt 7.17-18; Jo 15.4-5; Rm 3.9-18). Diante do escrutínio
perfeito de Deus, os atos de “bondade” praticados pelo homem natural são
frutos da Graça Comum de Deus, a qual atua sobre todos indistintamente.
b) Entender o Bem: Se Deus não iluminar o homem natural, ele jamais com-
preenderá a mensagem salvadora do Evangelho: nós um dia fomos salvos,
porque Deus abriu os nossos olhos para a Sua Palavra (Jo 1.11; 8.43-44; At
16.14; 1Co 2.14; Sl 119.18; 1Jo 4.5-6). O conhecimento que Adão e Eva pas-
saram a ter após o pecado foi virtualmente diferente (Gn 2.25; 3.7), nada
havia ali de um “conhecimento salvador”.
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c) Desejar o Bem: O homem natural, além de não fazer e não entender o bem,
nem sequer o deseja. A sua vontade está sob o domínio tirânico do pecado e, por
isso, quando o homem deseja a Cristo sinceramente, já indica a ação primeira
de Deus: a iniciativa é sempre de Deus (Mt 7.18; Jo 3.3; 5.40; Jo 6.44,65; 8.43;
15.4-5). A. A. Hodge (1823-1886) diz: “Sua essência está na inabilidade da alma
de conhecer, escolher e amar o que é bom espiritualmente, e seu fundamento
está nessa corrupção moral da alma que a torna cega, insensível e totalmente
adversa para tudo quanto é bom espiritualmente”. (HODGE, 1895, p. 315)
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
O PODER SOBERANO E GRACIOSO DE DEUS NA
SALVAÇÃO E RESTAURAÇÃO DE SEU POVO
A razão porque a graça é tão pouco apreciada nos nossos dias é porque
a majestade transcendente e a soberania e a santidade de Deus são tão
pouco estimadas. Nós enxergamos pouco mais do que meio palmo en-
tre Deus e o nosso ego pecaminoso (MARTIN, 2001, p. 17).
A SOBERANIA DE DEUS
233
é graça de modo algum”644. Deus nos olha com graça porque assim O decidiu; o
homem não pode exercer nenhuma influência sobre isso, todavia Deus é gracioso
para com o homem porque determinou em Si mesmo considerar a necessidade
do Seu povo, manifestando essa Sua santa perfeição. Aqui, o homem é totalmente
passivo. Como morto, está inerte, inerme e em estado de putrefação espiritual645.
Packer corretamente declarou:
A graça é livre, no sentido de ser auto-originada e de proceder de Al-
guém que podia ou não conceder graça. Somente quando se percebe
que o que decide o destino do homem é o fato de Deus resolver ou não
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
salvá-lo de seus pecados – sendo esta uma decisão que Ele não é obri-
gado a tomar em nenhum caso – é que se começa a apreender a ideia
bíblica da graça (PACKER, 1980, p. 119).
644 Consultar referência da nota. Do mesmo modo, Parker: “Se a graça fosse uma obrigação da parte de
Deus, já não seria graça. Porém é em Sua divina liberdade que Deus nos mostra sua graça” (PARKER,
1985, p. 254b).
645 Consultar referência da nota.
graça (Jo 1.17; 14.6). Ele é a causa, o conteúdo e a manifestação da graça de Deus;
falar de Cristo é falar da graça646.
Os profetas do Antigo Testamento falavam de uma salvação futura que ocorre-
ria pela graça (1Pe 1.10). Jesus Cristo, a graça de Deus encarnada, veio na plenitude
do tempo (Gl 4.4), na plenitude da graça (2Tm 1.9/Jo 1.16; 1Co 1.4; Ef 1.6,7; 2Tm
2.1). A autoentrega de Jesus pelos pecados dos pecadores eleitos foi um dom da
graça que fora profetizada (1Pe 1.10-11/Rm 5.15; Hb 2.9). A pobreza assumida
por Cristo revela a riqueza da Sua graça (2Co 8.9). Desse modo, Ele, somente Ele
nos dá acesso à graça (Hb 4.14-16), convidando-nos: “Vinde a mim” (Mt 11.28).
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
Por isso, como vimos, Jesus Cristo se encarnou a fim de que Deus pudesse ser
justo e, ao mesmo tempo, o justificador daqueles que confiam em Jesus para salvação
(Rm 3.26). Ele assim se tornou para os que creem em justiça, santificação e reden-
ção (1Co 1.30). “O Cristianismo se distinguiu unindo justiça e amor na cruz”647.
Calvino resume bem a relação entre o Deus soberano e gracioso, revelado
de forma plena em Seu Filho, Jesus Cristo:
Visto que todo homem é indigno de se dirigir a Deus e de se apresentar
diante de Sua face, a fim de nos livrar da vergonha que sentimos ou que
deveríamos sentir, o Pai celeste nos deu Seu Filho, o nosso Senhor Jesus
Cristo, para ser o nosso Mediador e Advogado para com Ele, para que, por
meio dele, pudéssemos aproximar-nos livremente dele (1Tm 2.5; 1Jo 2.1;
Hb 8.6 e 9.15). Com isso nos certificamos de que, tendo tal Intercessor, o
qual não pode ser recusado pelo Pai, também nada nos será negado de tudo
o que pedirmos em Seu nome (Hb 4.14-16). Seguros também de que o tro-
no de Deus não é somente trono de majestade, mas também de Sua graça,
podendo nós comparecer perante ele com toda a confiança e ousadia, em
nome do Mediador e Intercessor, para rogar misericórdia e encontrar graça
e ajuda, em toda necessidade que tivermos (CALVINO, 2006, p. 101-102).
646 “A plenitude do ser de Deus é revelada nEle. Ele não apenas nos apresenta o Pai e nos revela Seu nome,
mas Ele nos mostra o Pai em Si mesmo e nos dá o Pai. Cristo é a expressão de Deus e a dádiva de Deus.
Ele é Deus revelado a Si mesmo e Deus compartilhado a Si mesmo, e portanto Ele é cheio de verdade e
também cheio de Graça” (BAVINCK, 2001, p. 25-26).
647 Consultar referência da nota.
A SOBERANIA DE DEUS
235
A graça de Deus não é barata648. Nós, muitas vezes, nos comportamos como
filhos que, amados e agraciados com presentes de seus pais, se esquecem de que
se aquilo que ganhamos foi “fácil”, “generoso”, sem mérito algum de nossa parte,
custou muitas vezes um alto preço para os pais: privação de adquirir outro bem
para si, filas, crediários, juros, economias etc. A graça de Deus tem um outro
lado que, com frequência, nos esquecemos: a obra sacrificial de Cristo.
É um erro lamentável julgar toda a verdade considerando apenas a parte que
nos compete do todo. A graça de Deus se evidencia nas obras da Trindade. O
Pacto da Graça, por meio do qual somos salvos, foi Pacto de Obras para Cristo649.
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
A nossa salvação é muito cara, custou o precioso sangue de Cristo (1Pe 1.18-
20/At 20.28; 1Co 6.20). Como bem expressou Calvino: “... Nós dizemos que [a
Redenção] é gratuita para nós, mas não para Cristo, a quem custou altíssimo
preço, uma vez que Ele pagou o resgate com o seu santo e precioso sangue, por-
que não existe nenhum outro preço que possa satisfazer à justiça de Deus”650.
Isso, longe de apontar para o suposto valor inerente de nossas almas, revela
o amor gracioso de Deus que confere valor a nós.
Deus não quebra a Sua justiça por amor; antes, cumpre a justiça em amor, a
graça reina pela justiça (Rm 5.21). O amor de Deus não desconsidera o pecado,
antes o penaliza em Cristo, o Amado (Ef 1.6-7), em Quem temos a plenitude da
graça do Deus Triúno. “De fato a graça reina, mas uma graça reinante à parte
da justiça não é apenas inverossímil, mas também inconcebível”651.
Abraham Booth (1734-1806), escrevendo sobre esse assunto, assim se
expressou:
“A graça de Deus vem a nós não porque Deus revela o fato da Sua lei ser quebrada
por nós, mas porque a Sua lei foi plenamente satisfeita pelos atos de justiça que
Cristo fez a nosso favor (...) “Ele cumpriu perfeitamente a lei de Deus” (BOOTH,
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
A. Somente pela Graça. 1986, p. 56-57).
652 Lutero, comentando Gl 1.3, escreveu: “Esses dois vocábulos, graça e paz, abraçam o cristianismo
universal. A graça perdoa o pecado, a paz tranquiliza a consciência” (LUTERO, p. 48).
653 Consultar referência da nota.
654 Consultar referência da nota.
655 Consultar outras definições na referência da nota.
A SOBERANIA DE DEUS
237
temos, somos e seremos é pela graça (1Co 15.10). A riqueza da graça de Deus
se manifesta de modo superabundante em nós (2Co 9.14; Ef 1.7; 2.7); todavia
ela não foi revelada em toda a sua plenitude; por isso, aguardamos o regresso
triunfante de Jesus Cristo, quando Ele mesmo revelará a graça de forma mais
completa (1Pe 1.13), concluindo a nossa salvação (Fp 1.6/1Pe 1.3-5).
Tornando ao texto de Efésios, podemos observar que Paulo toma essas duas
palavras – Graça (= saúde), que era a saudação dos gregos, e Paz, saudação dos
judeus –, conferindo um sentido teológico: a paz é resultado da graça de Deus.
Notemos que nas saudações de Paulo, ele nunca inverte esta ordem: a paz com
Deus é resultado de Sua própria graça. Devemos observar, contudo que a paz
aqui, deve ser entendida como o equivalente hebraico, {Olf$ (shãlôm), “prosperi-
dade espiritual”660. A paz como resultado da graça pressupõe um estado anterior
de inimizade. Conforme vimos, o pecado nos colocou num estado de inimi-
zade, hostilidade e ódio para com Deus: estávamos separados de Deus (Is 59.2).
O homem encontrava-se em um estado de rebelião contra Deus (Is 65.2).
A graça de Deus concretiza-se em Cristo, por meio de Seu sacrifício vicário.
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
Veja também: Cl 1.20-22.
Paulo nos ensina que, em Cristo, passamos a ter paz com Deus e também
com o nosso próximo. Dentro do propósito imediato de Paulo, ele demonstra
que os gentios, distantes das promessas de Israel, e os judeus agora têm acesso
livre a Deus em Cristo, pelo mesmo e único Espírito.
Notemos que em tudo isso a iniciativa é de Deus. O Deus Triúno deseja a
paz e providencia os meios para isso. “Tudo provém de Deus, que nos reconci-
liou consigo mesmo por meio de Cristo (...). Deus estava em Cristo reconciliando
consigo o mundo...” (2Co 5.18,19). “A cruz trouxe a paz, embora não houvesse
paz na cruz. Foi uma cena caótica, mas a cruz proporcionou a justiça que, por
si só, traz a paz verdadeira”661.
Portanto, a graça que nos vem por Cristo Jesus propiciou de forma eficaz
a nossa reconciliação com Deus, conduzindo-nos à paz. Agora, reconciliados
com Deus, vivemos em paz, confiando inteiramente em Sua promessa. A paz da
reconciliação conduz-nos à paz interior e, em todas as nossas relações:662
Não há nenhuma paz genuína que seja desfrutada neste mundo senão
na atitude repousante nas promessas de Deus. Os que não lançam mão
delas podem ser bem-sucedidos por algum tempo em abafar ou expul-
sar os terrores da consciência, mas sempre deixarão de desfrutar do
genuíno conforto íntimo663.
A graça de Deus sempre antecede a paz. Fomos reconciliados com Deus por Sua
graça. Somos, portanto, agraciados com a paz. “O primeiro e mais importante
A SOBERANIA DE DEUS
239
aspecto desta paz com Deus não é a paz do nosso coração, mas o fato de que
Deus está em paz conosco”664.
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
humana é feita desse vai-e-vem entre o orgulho e o desespero, que ape-
nas a fé pode eliminar. Se contar consigo mesmo, o homem não pode
chegar a ela, uma vez que não podemos, nós mesmos, nos libertar do
orgulho e da angústia. Se formos libertos é graças a uma ação que não
depende de nós (BARTH, 2006, p. 23).
A Palavra de Deus nos ensina que a nossa salvação é por Deus porque é Ele Quem
faz tudo672, por isso, o homem não pode criar a graça, antes, ela lhe é outorgada,
devendo ser recebida sem torná-la vã em sua vida (2Co 6.1; 8.1-3/1Co 15.10).
Uma manifestação mais intensa da graça de Deus para conosco equivale um
maior peso de culpa sobre nós, se porventura viermos a desprezá-la.
A graça de Deus abre o nosso coração, fazendo-nos ver a necessidade da sal-
vação, passando a desejá-la ardentemente desde então673, a graça de Deus promove
a paz em nosso coração por intermédio da nossa reconciliação com Deus (Rm
5.1; 2 Co 5.18-21/Rm 1.7; 1Co 1.3; 2Co 1.2). Em paz com Deus, somos agencia-
dores dessa paz por meio da proclamação do Evangelho (Sl 34.14; Mt 5.9; Rm
12.18; 2Co 13.11; Hb 12.14/2Co 5.20) e, também, por meio de nossa conduta.
Agora vivemos na esfera do Reino da graça, estando sob a graça, em um estado
de graça, em uma nova posição em Cristo (Rm 5.2; 6.14; Ef 1.20; 2.6; Cl 1.13).
O Novo Testamento ensina claramente que a nossa salvação é resultado da graça
de Deus. Além dessa declaração abrangente, podemos encontrar ainda nas pági-
nas do Novo Testamento a relação de vários elementos da “ordem da salvação”.
A SOBERANIA DE DEUS
241
Considerações Finais
IV
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
Determinadas doutrinas bíblicas tornam-se bastante conhecidas em nosso meio.
Elas passam a identificar determinado grupo ou denominação. Tornam-se emble-
máticas. O ideal é que essa doutrina distintiva passe a ser crida não simplesmente
como uma premissa teológica, mas como uma realidade extraída das Escrituras,
crida e vivenciada pelo povo de Deus.
Como vimos, o conceito teológico da soberania de Deus é livre na manifesta-
ção da Sua graça. Aliás, esse conceito é fundamental à ideia bíblica de graça, pois
se a graça não fosse livre, não seria graça; graça que é obrigatória não é graça, é
obrigação. Aprofundamos o conhecimento a respeito da Graça e da depravação
total do homem como consequência do pecado, o qual comprometeu de forma
gravíssima todas as faculdades originais do ser humano, estabelecendo um enten-
dimento sobre Imagem e Semelhança, Pecado e Depravação total.
Finalizamos esta unidade resumindo a ideia sobre a soberania de Deus e a
sua relação com a liberdade humana. Ainda descrevemos que a nossa salvação
é decorrente do Pacto da Graça, por meio do qual Deus confiou o Seu povo ao
Seu Filho para que Este viesse entregar a Sua vida por Ele. Cristo deu a Sua vida
em favor de todos aqueles que o Pai Lhe confiara na eternidade.
A SOBERANIA DE DEUS
243
1. Sabemos que o poder de Deus é soberanamente livre e que Ele não tem prima-
riamente compromissos com terceiros. Em outras palavras: Deus é soberano em
Si mesmo, a onipotência faz parte da sua essência. Por isso mesmo, para Ele não
há impossíveis. Apesar de qualquer oposição, Ele executa o Seu plano. Reflita e
explique qual a finalidade da oração de súplica.
Liberdade e graça no pensamento de Agostinho
Agostinho sempre insistiu na ideia de que de um mal pode surgir um bem. Parece que seu
debate com Pelágio acerca do poder do livre arbítrio foi um desses males, que lhe garantiu
projeção, que se iniciou em sua pequena Tagaste e se espalhou pelo mundo inteiro até os
dias de hoje. A polêmica iniciou-se quando, após ler algumas obras de Pelágio, Agostinho
aproveitou a festa de São João Batista, realizada em Cartago, em junho de 413, para iniciar
suas críticas ao pensamento pelagiano. Os estudos de Agostinho enfatizando o livre-arbí-
trio humano, a boa e a má vontades, o desenvolvimento das virtudes foram aproveitados
por Pelágio e seu discípulo Celestio. De fato, em uma passagem da obra “O livre-arbítrio”,
Agostinho volta a dizer: “Porque os pecados, como já expusemos longamente, não devem
ser atribuídos senão à própria vontade. E não é para se buscar outra causa além dessa.”
Afirmações como essa foram utilizadas por Pelágio, que asseverava que todo ser humano
nasce livre do pecado original; o pecado de Adão e Eva era de responsabilidade exclusiva
deles; cada um responde por seus atos, sem herança pecaminosa. De acordo com seu pro-
ceder, cada um receberá recompensa ou castigo. Recompensa pela manifestação da boa
vontade; castigo, pelo exercício da má vontade. E a escolha da manifestação de vontade,
se boa ou má, reside no livre-arbítrio humano, o que torna cada pessoa responsável por
suas escolhas, de modo que cada um pode alcançar a salvação ou se entregar a perdição,
conforme lhe apraz. Como se nota, o ponto de contato entre o ensino de Agostinho e o de
Pelágio é o livre-arbítrio. Para Agostinho, entretanto, esta vontade já não se encontra tão
livre depois da queda, impossibilitando o ser humano de alcançar a justiça e a salvação por
si só. Assim, impossibilitado de agradar a Deus, o ser humano carece de uma força vinda
de Deus, que promova essa aproximação, de modo que, em que pese nossa vontade ser
sempre livre, somente será boa quando auxiliada pela graça de Deus, que transforma uma
vontade má em boa. Há, por assim dizer, uma crescente aproximação de Deus, que se
inicia no momento em que se deseja segui-lo. Então por que muitos querem guardar os
mandamentos divinos e não conseguem? Responde Agostinho que é porque ainda não
querem retamente. E é preciso reconhecer essa deficiência do querer, confessá-la a Deus
e rogar para que Ele conceda uma vontade boa. Quando essa vontade se manifesta, ainda
fraca e incapaz de nos levar a cumprir os mandamentos, é necessário que lhe peçamos
mais graça, porque somente com sua cooperação essa vontade se torna forte e decidi-
da a ponto de nos possibilitar uma vida. Discorda Pelágio, para quem o ser humano é o
único responsável pelo seu destino. Para isso Deus lhe deu o livre-arbítrio e o dotou de
inteligência racional, de modo que tenha condições de ponderar acerca do bem e do mal
e optar por qual caminho seguirá. A pessoa deve labutar todos os dias, esmerando-se por
negar o mal e praticar o bem, ou seja, Pelágio entende que por seu esforço pessoal, qual-
quer um pode sim viver isento de pecado, tanto que o Antigo Testamento silencia acerca
dos pecados de algumas pessoas, dando a entender que não pecaram. Agostinho não
descarta a possibilidade de alguém viver sem pecar, apenas entende que isso somente
seria factível depois que essa pessoa fosse justificada mediante a graça de Deus, acres-
centando que, exceto Jesus Cristo, nunca houve, não há e provavelmente nunca haverá
quem viva neste mundo sem pecar. Pelágio insiste que não nega a graça de Deus, mas
que a compreende de um outro modo. Para ele, a graça é reconhecida em nosso livre-ar-
245
bítrio, na lei e na doutrina, e nos é acrescentada na medida em que nos esforçamos para
agradar a Deus. Mas essa concepção, segundo Agostinho, tira da graça o seu mérito, por
transformá-la em retribuição feita por Deus ao esforço humano e, desse modo, já não seria
graça, porquanto já não seria gratuita, mas pagamento. A argumentação de Agostinho em
relação à impossibilidade de o ser humano, por si só, conseguir praticar os mandamentos
reside em sua tese acerca da hereditariedade do pecado original. Por causa desse pecado,
a natureza humana ficou pervertida e sua vontade tendenciosamente má, de modo que,
sem o auxílio divino, por meio da graça, ninguém alcança a salvação. Sequer terá vonta-
de de não pecar, porque essa vontade eficaz, que o capacita a ser um cristão, é dada por
Deus, também mediante a graça. Portanto, sem a graça, a pessoa nem ao menos consegue
querer ser cristão, quanto mais conseguirá ser de fato cristão. Somente o batismo é capaz
de redimir a pessoa desse pecado. Por isso, todos os que morrem sem recebê-lo, morrem
sem salvação, incluso as crianças. Essa graça, uma vez concedida, capacita a pessoa a se
achegar a Deus. Pode-se afirmar então que ela está salva? Diz Agostinho que algumas sim,
outras, apenas aparentam estar salvas, porquanto não receberam de Deus o dom da per-
severança. Logo, a vontade de servir a Deus e o cumprimento dessa vontade, mediante a
prática do bem, a guarda dos mandamentos, provêm da graça de Deus, que a concede aos
batizados. Mas para que prossigam na graça até a morte, dependem de terem recebido o
dom da perseverança, que não é dado a todos, mas somente aos predestinados à salva-
ção, o que implicará na doutrina dos excluídos. Com isso, afirma Agostinho que também
a fé é um dom de Deus. Mas não é por que concedeu um dom que tem de conceder os
demais. O conhecimento da Lei não garante o recebimento do dom da fé, pois não basta
conhecer a vontade de Deus para ser justificado; é necessário querer amar essa vontade
e isso implica fé. Por isso nem todos os “cristãos” são salvos, porque nem todos receberam
essa fé salvífica, fé para amar os mandamentos de Deus e amar o próprio Deus. Por sua
presciência divina, Deus já sabia na eternidade os que o amariam e concedeu-lhes por
graça a fé. Essa fé é, portanto, obra da graça de Deus, que a concede aos que previu que
a abraçariam e os predestinou para a Sua salvação. Em síntese, ensina Agostinho que, em
sua presciência, predestinou Deus aqueles aos quais haveria de conceder sua graça afim
de que fossem salvos. Os demais estão eternamente condenados e, ainda que queiram
crer e, por algum tempo, trilhem os caminhos da Verdade, não permanecerão, ante a falta
do dom da perseverança, que não lhes foi concedido porquanto não estão predestinados
à salvação. Pelágio, por seu turno, ao negar o pecado original e insistir na responsabilida-
de individual pela escolha do bem ou do mal, mediante o uso racional do livre-arbítrio,
apregoava uma natureza humana apta a servir ao criador e de praticar o bem, ainda que
passível de pecar. Mas uma vez perdoado seu pecado, voltava a desfrutar daquela nature-
za provida de vontade eficaz para guiá-lo pelo caminho do bem ao encontro do Criador,
de modo que o batismo tem uma outra conotação e sua falta não priva ninguém, muito
menos os infantes, da glória de Deus. Quanto à perseverança, também é responsabilidade
de cada um, pois, se ao ser perdoado o ser humano volta a desfrutar da paz com Deus,
basta que se esforce até o fim de seus dias para manter uma vida de santidade.
Fonte: OLIVEIRA, M. Liberdade e graça no pensamento de Agostinho DISCERNINDO - Re-
vista Teológica Discente da Metodista 47, v. 2, n. 2, p. 35-52, jan./dez. 2014.
MATERIAL COMPLEMENTAR
Comentário: O filme “Jornada pela Liberdade”, o qual tem por título original
“Amazing Grace”, é um grande clássico do cinema cristão mundial. O longa-
metragem conta a história do parlamentar britânico William Wilberforce, um
cristão piedoso que lutava internamente entre a sua vida pública e o ministério
eclesiástico, até que, em uma visita ao ex-capitão de um navio negreiro Inglês −
autor da música Amazing Grace − o ajudou a decidir pela vida pública.
A PESSOA E A OBRA DE
V
UNIDADE
CRISTO
Objetivos de Aprendizagem
■■ Compreender a Cristologia como tema central do cristianismo.
■■ Conceituar Jesus como personagem histórica e divina.
■■ Entender o senhorio de Jesus Cristo.
Plano de Estudo
A seguir, apresentam-se os tópicos que você estudará nesta unidade:
■■ Fé no Senhor Jesus: Verdadeiro Deus
■■ Fé no Senhor Jesus: Verdadeiro homem
■■ Fé no Senhor Jesus: Uma única Pessoa
■■ Fé no Senhor Jesus: O Único Senhor
■■ Jesus e a Ressurreição
■■ O sacerdócio de Cristo
■■ A ascensão de Jesus Cristo
249
INTRODUÇÃO
são dupla que professa e proclama fé: Jesus de Nazaré é compreendido e aceito
como o Cristo, o Messias prometido, o Ungido de Deus. Isso faz com que a
conhecida relação entre o “Jesus histórico” e o “Cristo da fé” seja complexa e
teologicamente desafiadora. Resumidamente, compreende-se que o “Jesus his-
tórico” é o Jesus que pode ser reconstituído pela investigação histórica, aquele
homem que viveu e morreu na Palestina do século I, ocupada pelos romanos.
O “Cristo da fé” é aquele anunciado pela Igreja depois da Páscoa, o Cristo dos
símbolos de fé e das declarações dogmáticas.
Nesta unidade trataremos a compreensão da Cristologia como tema central
do cristianismo. Analisaremos a pessoa de Jesus como personagem histórica e
divina, sendo criado pelos cristãos como único e verdadeiro Senhor. Concluiremos
a unidade estudando, ainda, Sua ressurreição, sacerdócio e ascensão.
Introdução
V
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
A fé em Jesus Cristo como Senhor envolve a compreensão de que Ele é senhor
de todas as coisas. Portanto, o é também de minha vida. Falar do senhorio de
Cristo significa, portanto, não apenas tratar um tanto vagamente sobre o mundo
ou sobre a igreja, mas, também, que Ele é o meu Senhor. E mais: a Pessoa de Cristo
está associada determinantemente à Sua obra. Jesus Cristo só pode, de fato, nos
salvar, com todas as implicações dessa palavra, se verdadeiramente Ele for Deus
e Deus encarnado. Em outras palavras, não podemos separar arbitrariamente a
Cristologia da Soteriologia675. Todas as Suas reivindicações só podem ser con-
sistentes se Ele, de fato, for o que disse ser. Analisemos aspectos da Sua pessoa.
Vamos nos deter um pouco a “divindade” do Senhor Jesus, o Deus encarnado.
674 Para uma abordagem exaustiva desse assunto, recomendo: HARRIS, M. J. Jesus as God: The New
Testament use of Theos in Reference to Jesus. Eugene, Oregon: Wipf & Stock, 2008.
675 PANNENBERG, W. Fundamentos de Cristologia. Salamanca: Ediciones Sígueme, 1973, p. 49-50. Para
uma visão abrangente das questões cristológicas levantadas ao longo da história, tratando da identidade
de Cristo e da salvação, veja-se: MCGRATH, A. E. Teologia sistemática, histórica e filosófica: Uma
introdução à teologia cristã. São Paulo: Shedd Publicações, 2005, p. 401-501.
Na sequência, Jesus é levado pelo Espírito ao deserto para ser tentado pelo
diabo (Mt, 4.1). As duas primeiras tentações descritas tem início com a argu-
mentação provocativa de satanás: “Se és Filho de Deus” (Mt, 4.3,6).
ses e heróis nascidos de “casamentos” dos deuses com os mortais. Tais homens
se diziam filhos de deus e, por isso, eram, em alguns casos, até mesmo adorados,
como manifestações da divindade. Mesmo o Novo Testamento apresenta alguns
indícios desse costume entre os pagãos (At, 8.9-11; 12.21,22; 14.11,12; 28.6)676.
No entanto Ele declara a sua divindade no contexto judeu fortemente mono-
teísta e que, ao longo da história, foi ridicularizado e perseguido por causa de sua
fé tão exclusivista. O curioso é que Ele conseguiu que pessoas de níveis sociais
dos mais diversificados, homens, mulheres, jovens, anciãos, sacerdotes e pesca-
dores, consentissem em segui-lo, convencidos da realidade de seu testemunho.
Jesus declara: “Tudo me foi entregue por meu Pai. Ninguém conhece o Filho,
senão o Pai; e ninguém conhece o Pai, senão o Filho e aquele a quem o Filho o
quiser revelar” (Mt, 11.27).
676 COSTA, H. M. P. Eu Creio: no Pai, no Filho e no Espírito Santo. São José dos Campos, SP: Fiel, 2014, p.
285ss. As palavras de Herman Bavinck (1854-1921) são contundentes e biblicamente esclarecedoras: “O
nome Filho de Deus, quando é atribuído a Cristo, tem um significado mais profundo que o teocrático: Ele
não foi um simples rei de Israel que no curso do tempo foi adotado como Filho de Deus; nem tampouco
foi Ele chamado Filho de Deus por causa do Seu nascimento sobrenatural, como os socinianos e Hofman
afirmavam; nem é Ele Filho de Deus no sentido meramente ético, como outros supõem; nem recebeu o
título de Filho de Deus por causa da sua obra expiatória e ressurreição, interpretação que amparam em
Jo 10.34-36; At 13.32-33 e Rm 1.4; porém Ele é o Filho de Deus no sentido metafísico: por natureza e
desde a eternidade. Ele é exaltado muito acima dos anjos e profetas (Mt 13.32; Mt 21.27; 22.2) e mantém
uma verdadeira relação especial com Deus (Mt 11.27). Ele é o Filho amado no qual o Pai tem prazer (Mt
3.17; 17.5; Mc 1.11; 9.7; Lc 3.22; 9.35); é o Filho unigênito (Jo 1.18; 3.16, 1Jo 4.9ss); é o próprio Filho de
Deus (Rm 8.32); o Filho eterno (Jo 17.5, 24); Hb 1.5; 5.5; ao qual o Pai concedeu o ter vida em si mesmo
(Jo 5.26); igual ao Pai em conhecimento (Mt 11.27), em honra (Jo 5.23), em poder criador e redentor (Jo
1.3, 5.21, 27), em coração (Jo 10.30) e em domínio (Mt 11.27; Lc 10.22; 22.29; Jo 16.15; 17.10); por causa
dessa Filiação, Ele foi condenado a morte (Jo 10.33; Mt 26.63ss) (BAVINCK, H., The Doctrine of God.
Translated, edited and outlined by William Hendriksen. Carlisle, Pennsylvania: The Banner of Truth
Trust, © 1951, 2003 (Reprinted), p. 270.
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
Após o Senhor Jesus acalmar o vento forte que ameaçava fazer com que Pedro se
afogasse no mar, tendo também caminhado por sobre as águas, lemos: “E os que esta-
vam no barco o adoraram, dizendo: Verdadeiramente és Filho de Deus!” (Mt, 14.33).
No prólogo do Evangelho de João temos a descrição de profundo signifi-
cado teológico:
1
No princípio era o Verbo, e o Verbo estava com Deus, e o Verbo era
Deus. 2 Ele estava no princípio com Deus. 3 Todas as coisas foram feitas
por intermédio dele, e, sem ele, nada do que foi feito se fez. (...) 14 E o
Verbo se fez carne e habitou entre nós, cheio de graça e de verdade, e
vimos a sua glória, glória como do unigênito do Pai. (...) 18 Ninguém
jamais viu a Deus; o Deus unigênito, que está no seio do Pai, é quem o
revelou (Jo, 1.1-3,14,18).
Quando João diz que “No princípio era o Verbo”, indica uma existência eterna,
não uma transformação ou aprimoramento. O Verbo sempre foi o que é. No
verso 14, aí sim, encontramos o Verbo se tornando algo que não era: “E o Verbo
se fez carne e habitou entre nós (...)” (Jo 1.14). Desse modo, antes da Criação,
“no princípio” (Gn 1.1), o Verbo já existia.
Owen (1616-1683) escreveu:
Quando Ele tomou sobre Si a forma de um servo em nossa natureza,
Ele se tornou aquilo que nunca havia sido antes, mas não deixou de ser
aquilo que sempre tinha sido em Sua natureza divina. Ele, que é Deus,
não pode deixar de ser Deus. A glória da Sua natureza divina estava
velada, de forma que aqueles que O viram não acreditaram que Ele era
Deus (OWEN, 1989, p. 30).
Deus não pode deixar de ser o Deus glorioso. Na encarnação, Ele ocultou exter-
namente a sua glória aos olhos dos homens.
A. Títulos Divinos
Jesus Cristo recebeu designações aplicáveis somente a Deus, sendo identificado
como Deus. “1No princípio era o Verbo, e o Verbo estava com Deus, e o Verbo era
Deus. (...) 18 Ninguém jamais viu a Deus; o Deus unigênito, que está no seio do
Pai, é quem o revelou” (Jo, 1.1,18).
Após a ressurreição, Tomé que ainda não vira o Senhor, duvidou do teste-
munho dos demais discípulos (Jo, 20.24-25). A narrativa prossegue:
26
Passados oito dias, estavam outra vez ali reunidos os seus discípulos,
e Tomé, com eles. Estando as portas trancadas, veio Jesus, pôs-se no
meio e disse-lhes: Paz seja convosco! 27E logo disse a Tomé: Põe aqui o
dedo e vê as minhas mãos; chega também a mão e põe-na no meu lado;
não sejas incrédulo, mas crente. 28Respondeu-lhe Tomé: Senhor meu e
Deus meu! (Jo, 20.26-28).
B. Perfeições Divinas
A Palavra atribui a Cristo diversas perfeições que são próprias do Ser de Deus,
as quais veremos a seguir.
1) Onisciência
2
E eis que lhe trouxeram um paralítico deitado num leito. Vendo-lhes
a fé, Jesus disse ao paralítico: Tem bom ânimo, filho; estão perdoados
os teus pecados. 3Mas alguns escribas diziam consigo: Este blasfema.
4
Jesus, porém, conhecendo-lhes os pensamentos, disse: Por que cogitais
o mal no vosso coração? (Mt, 9.2-4).
Devemos observar que, à frente, quando Jesus diz que não sabia o dia da Sua
volta (Mc 13.32), não anula o que afirmamos anteriormente. Entendemos que o
Verbo encarnado, durante o Seu estado de humilhação, não tinha conhecimento
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
disso, porque não era da vontade de Seu Pai, e Jesus Cristo limitava-se a fazer
e a conhecer aquilo que era do agrado do Pai; todavia, no Seu estado de exalta-
ção, a partir da Sua ressurreição, isso já era conhecido, mas Ele não quis revelar
(At 1.6,7). No Seu estado de humilhação, ainda que não saibamos compreender
adequadamente isso, a Sua onisciência foi usada de forma restrita (confira: Mc
2.8; 5.32; 9.21, 33-34; 10.33-34; 11.12-13).
2) Onipresença
“Porque, onde estiverem dois ou três reunidos em meu nome, ali estou no meio
deles” (Mt 18.20). “(...) E eis que estou convosco todos os dias até à consuma-
ção do século” (Mt 28.20).
A encarnação do Verbo não significa o encarceramento do Logos ao corpo
de Jesus; a Segunda Pessoa da Trindade está de fato encarnada, mas, também,
continua presente em todos os lugares, sustentando todas as coisas com o Seu
poder677. Aqui, vemos um dos atributos de Deus revelado: a imensidão. “Ora,
ninguém pode estar no céu e na terra ao mesmo tempo, senão aquele que enche
céu e terra. (...) Portanto, lemos que Ele desceu do céu por meio da encarnação,
Ele que esteve sempre no céu por sua imensidão”678.
677 CATECISMO de Heidelberg, p. 47-48; GRUDEM, W. A. Teologia Sistemática. São Paulo: Vida Nova,
1999, p. 462.
678 TURRETINI, F. Compêndio de Teologia Apologética. São Paulo: Cultura Cristã, 2011, v. 1, p. 375-376.
3) Onipotência
Após a ressurreição, antes de enviar seus discípulos a todo o mundo, o Senhor
lhes disse: “(...)Toda a autoridade me foi dada no céu e na terra” (Mt 28.18).
26
Porque assim como o Pai tem vida em si mesmo, também concedeu
ao Filho ter vida em si mesmo. 27E lhe deu autoridade para julgar, por-
que é o Filho do Homem. 28 Não vos maravilheis disto, porque vem a
hora em que todos os que se acham nos túmulos ouvirão a sua voz e
sairão: 29os que tiverem feito o bem, para a ressurreição da vida; e os
que tiverem praticado o mal, para a ressurreição do juízo” (Jo, 5.26-29).
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
4) Eternidade
“João testemunha a respeito dele e exclama: Este é o de quem eu disse: o que vem
depois de mim tem, contudo, a primazia, porquanto já existia antes de mim” (Jo,
1.15). “Respondeu-lhes Jesus: Em verdade, em verdade eu vos digo: antes que
Abraão existisse, EU SOU” (Jo, 8.58).
O tempo presente dessa declaração assinala a continuidade de Sua existência
eterna679. E, também, “Jesus usou o Nome divino pelo qual Deus se havia reve-
lado a Moisés na sarça ardente”680.
Jesus Cristo reivindica a mesma eternidade divina do Deus Pai. Portanto, ou
Ele é de fato Deus ou um louco. As Escrituras demonstram que Ele não usurpou
ou pretendeu usurpar o lugar de Deus ou ser igual a Deus, antes, Ele é o pró-
prio Deus (Fp 2.5-11)681.
“Vim do Pai e entrei no mundo; todavia, deixo o mundo e vou para o Pai”
(Jo, 16.28). “Ele é antes de todas as coisas. Nele, tudo subsiste” (Cl, 1.17).
5) Imutabilidade
“Jesus Cristo, ontem e hoje, é o mesmo e o será para sempre” (Hb, 13.8).
C. Obras Divinas
A Palavra atribui a Jesus Cristo a realização de obras que são prerrogativas divinas:
679 MACLEOD, D. A Pessoa de Cristo. São Paulo: Cultura Cristã, 2007, p. 49.
680 BOICE, J. M. Fundamentos da Fé Cristã. Rio de Janeiro: Editora Central Gospel, 2011, p. 237.
681 PIPER, J. Um homem chamado Jesus Cristo. São Paulo: Vida, 2005, p. 25-29.
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“31Então, os demônios lhe rogavam: Se nos expeles, manda-nos para a
manada de porcos. 32Pois ide, ordenou-lhes Jesus. E eles, saindo, passa-
ram para os porcos; e eis que toda a manada se precipitou, despenha-
deiro abaixo, para dentro do mar, e nas águas pereceram” (Mt, 8.31-32).
5) Juízo Final
“21Nem todo o que me diz: Senhor, Senhor! entrará no reino dos céus,
mas aquele que faz a vontade de meu Pai, que está nos céus. 22Muitos,
naquele dia, hão de dizer-me: Senhor, Senhor! Porventura, não temos
nós profetizado em teu nome, e em teu nome não expelimos demônios,
e em teu nome não fizemos muitos milagres? 23Então, lhes direi expli-
citamente: nunca vos conheci. Apartai-vos de mim, os que praticais a
iniquidade” (Mt, 7.21-23).
37
Vós conheceis a palavra que se divulgou por toda a Judéia, tendo co-
meçado desde a Galiléia, depois do batismo que João pregou, 38como
Deus ungiu a Jesus de Nazaré com o Espírito Santo e com poder, o qual
andou por toda parte, fazendo o bem e curando a todos os oprimidos
do diabo, porque Deus era com ele; 39e nós somos testemunhas de tudo
o que ele fez na terra dos judeus e em Jerusalém; ao qual também ti-
raram a vida, pendurando-o no madeiro. 40A este ressuscitou Deus no
terceiro dia e concedeu que fosse manifesto, 41não a todo o povo, mas
às testemunhas que foram anteriormente escolhidas por Deus, isto é, a
nós que comemos e bebemos com ele, depois que ressurgiu dentre os
mortos; 42e nos mandou pregar ao povo e testificar que ele é quem foi
constituído por Deus Juiz de vivos e de mortos (At, 10.37-42).
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Outro fato que atesta a divindade de Cristo é a adoração tributada a Ele, bem
como as orações. Biblicamente, somente Deus deve ser adorado e o próprio Jesus,
no Seu confronto com satanás, cita o texto de Dt 6.13, dizendo: “Ao Senhor teu
Deus adorarás, e só a ele darás culto” (Mt 4.10). Entretanto, Ele aceita ser ado-
rado e o Novo Testamento ensina esta prática explicitamente (Mt 14.33; 15.25;
28.9,17; 1Co 1.2; Fp 2.9-11).
Se formos sinceros em nossa investigação bíblica, não restam muitas alternati-
vas para nós. Ou Jesus Cristo é, de fato, Deus, conforme o seu próprio testemunho
e, assim, podemos então considerá-lo de forma decorrente como um grande mes-
tre, um bom homem, justo e misericordioso ou, senão, Ele é um farsante ,não
merecendo a nossa fé, nem mesmo o nosso respeito. Barth (1886-1968) coe-
rentemente afirma que a Escritura não nos deixa vagueando em nossa fé, antes,
quando nos fala de Deus, aponta para Jesus Cristo, em Quem nossa atenção e
pensamentos devem se concentrar682. Stott (apud DUDLEY, 2006, p. 44) coloca
a questão nestes termos: “Jesus deve ser adorado ou apenas admirado? Se Ele é
Deus, é digno de nossa adoração, fé e obediência; se não é Deus, dedicar a ele
essa devoção é idolatria”683.
682 BARTH, K., Church Dogmatics. Peabody, Massachusetts: Hendrickson Publishers, 2010, II/2, p. 52.
683 DUDLEY, T. Cristianismo autêntico: 968 textos selecionados das obras de John Stott. São Paulo:
Editora Vida, 2006, p. 44. C.S. Lewis escreveu de forma contundente: “Um homem que fosse só homem,
e dissesse as coisas que Jesus disse, não seria um grande mestre de moral: seria ou um lunático, em pé de
igualdade com quem diz ser um ovo cozido, ou então seria o Demônio. Cada um de nós tem que optar
por uma das alternativas possíveis. Ou este homem era, e é, Filho de Deus, ou então foi um louco, ou
cuspir nele e matá-lo como um demônio; ou podemos cair a seus pés e chamá-lo de Senhor e Deus. Mas
não venhamos com nenhuma bobagem paternalista sobre ser Ele um grande mestre humano. Ele não
nos deu esta escolha. Nem nunca pretendeu” (LEWIS, C. S. A essência do Cristianismo. São Paulo: ABU
Editora, 1979, p. 29).
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da Trindade, sendo verdadeiramente divina, possui duas naturezas: a
divina e a humana. A natureza divina não necessita de fortalecimento,
porém a natureza humana, sim. Portanto, todas as qualificações neces-
sárias foram conferidas ao Mediador quando, em seu batismo, o Es-
pírito Santo, simbolizado por uma pomba, desceu sobre ele em plena
medida (HENDRIKSEN, 2001, p. 307).
O episódio narrado por Lucas em Atos 14.8-18 ilustra bem a crença do povo.
E, nesse caso, há algo curioso: Júpiter e Mercúrio, os quais foram identificados
pelo povo como sendo Barnabé e Paulo, respectivamente (At 14.12), eram asso-
ciados à região pela literatura latina.
Ovídio (42 a.C.-18 d.C.), em sua obra principal, Metamorfoses, narra que o
pobre casal, Filemon e Báucis, hospedou em sua humilde casa Júpiter e Hermes
(= Mercúrio), que vieram à sua cidade disfarçados de mortais à procura de uma
hospedagem, e que não conseguiram pousada em nenhuma das mil casas da
região, exceto na do casal. Filemon e Báucis, por esse ato de hospitalidade, con-
ta-nos Ovídio, foram recompensados, sendo poupados do dilúvio que destruiu
as casas de seus vizinhos não hospitaleiros, tendo, inclusive, num ato simultâ-
neo, a sua pequena casa transformada num templo e, a pedido, receberam a
incumbência de serem sacerdotes e guardiães do santuário de Júpiter e, con-
forme solicitaram, Filemon e Báucis morreram juntos684.
Essa lenda que já era bem conhecida nos tempos de Paulo e Barnabé, escla-
rece porque tão prontamente o povo os identificou com tais divindades após o
684 OVÍDIO. As Metamorfoses. Rio de Janeiro: Editora Tecnoprint, 1983, Livro VIII, p. 214-216.
milagre realizado por Deus por intermédio deles685. Além disso, a ideia de que
as divindades assumissem temporariamente uma forma humana já fazia parte
da religiosidade do povo. Homero, o grande poeta grego, em sua Odisséia,
escrita por volta no séc. IX a.C., disse: “Os deuses tomam às vezes a figura de
estrangeiros, vindos de longes terras e, sob aspectos diversos, vão de cidade em
cidade, a fim de ficarem conhecendo quais os homens soberbos e quais os jus-
tos” (HOMERO, 1979, p. 162).
Em outra passagem, na mesma obra, Homero narra como a deusa Palas
Atena, filha de Zeus (= Júpiter) se aproximou em determinado momento do seu
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685 Stott (1994, p. 258) informa-nos que: “Duas inscrições e um altar de pedra foram encontrados perto
de Listra, e eles indicam que Zeus e Hermes eram adorados juntos, como divindades padroeiras locais”
(STOTT, J. R. W. A Mensagem de Atos: até os confins da terra, São Paulo: ABU, 1994, (At 14.11-15a)).
686 Como sabemos, esse nome é derivado do verbo grego doke/w = “parecer”. Esse ensinamento foi
primariamente difundido, por volta do ano 85, por Cerinto, natural de Alexandria, discípulo de Fílon.
687 TENNEY, M.C. Docetismo: In: HARRISON, E. F. ed. Diccionario de Teologia. Michigan: T.E.L.L.,
1985, p. 175.
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Curiosamente, Jesus Cristo era tão humano aos olhos dos que o viam e con-
viviam com Ele que a afirmação e a demonstração de sua divindade geravam
reações contrastantes: ódio, incredulidade, ressentimento, admiração e adoração.
A perplexidade de grupos e pessoas diante da figura de Jesus Cristo se revela
por meio de indagações variadas que faziam a respeito de sua identidade. Algumas
delas são descritas nas páginas do Novo Testamento.
Assim, encontramos: Os escribas e fariseus, após presenciarem seus atos
miraculosos e declarar perdoado o paralítico que fora curado, indagam: “Quem
é este que diz blasfêmias (Blasfhmi/a)?691 Quem pode perdoar pecados, senão
688 Veja suas Cartas: Aos Efésios, 7,18,19,20; Aos Magnésios, 11; Aos Tralianos, 9; Aos Esmirnenses, 1-3,
7. (Veja-se a coleção de Cartas em: Cartas de Santo Inácio de Antioquia. 3. ed. Petrópolis, RJ: Vozes,
1984). Devemos mencionar que, apesar de Inácio combater os “docetas”, esse nome só iria aparecer como
designação desse tipo de pensamento por volta do ano 200, em Serapião, que denomina esse grupo de
Dokhta\j (Cf. CESAREA, E. de. Historia Eclesiastica. Madrid: La Editorial Catolica, Biblioteca de Autores
Cristianos, v. 349-350, 1973, VI.12.6).
689 POLYCARP. The Epistle of Polycarp to the Philippians, VII. In: ROBERTS, A.; DONALDSON, J. eds.
The Ante-Nicene Fathers. 2. ed. Peabody, Massachusetts: Hendrickson Publishers, 1995, v. 1, p. 34.
(Quanto a um testemunho antigo sobre o procedimento de Policarpo, consulte IRINEU. Irineu de Lião.
São Paulo: Paulus, 1985, III.1.3. p. 251-252).
690 Notemos que nem todo “docetismo” era gnóstico, no entanto, como essa era uma das características do
gnosticismo, os termos foram identificados.
691 Esse substantivo ocorre também em: Mt 15.19; 12.31-32; 26.65; Mc 2.7; 3.28; 7.22; 14.64; Jo 10.33; Ef
4.31; Cl 3.8; 1Tm 6.4; Jd 9; Ap 2.9; 13.1,5,6; 17.3. O verbo, Blasfhme/w é empregado mais vezes no
Novo Testamento (35 vezes) e aquele que blasfema, Bla/sfhmoj, é utilizado 5 vezes (At 6.11,13; 1Tm
1.13 (aqui de forma substantivada); 2Tm 3.2; 2Pe 2.11). O verbo Blasfhme/w, que tem o sentido de
“injuriar”, “difamar”, ”insultar”, “caluniar”, “maldizer”, “falar mal”, “falar para danificar”, etc., é formado
de duas palavras, Bla/yij derivada de Bla/ptw = “injuriar”, “prejudicar” (* Mc 16.18; Lc 4.35) e Fhmi/
= “falar”, “afirmar”, “anunciar”, “contar”, “dar a entender”. A Blasfêmia tem sempre uma conotação
negativa, de “maldizer”, “caluniar”, “causar má reputação” etc., contrastando com Eu)fhmi/a (“boa fama”
* 2Co 6.8) e Eu)/fhmoj (“boa fama” * Fp 4.8) (Eu)/ & fh/mh). No Fragmento 177 de Demócrito, lemos:
“Nem a nobre palavra encobre a má ação, nem é a boa ação prejudicada pela má palavra (Blasfhmi/a)”.
Em Platão (427-347 a.C.), é considerada blasfêmia atribuir aos deuses determinadas formas humanas,
conforme fizeram primariamente os poetas e as mães, que assim aprendiam e transmitiam aos seus
filhos essas estórias (A República. 7. ed. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1993, II, 381e). No
Novo Testamento, esse grupo de palavras é usado predominantemente no sentido religioso: “caluniar”,
“difamar”. O verbo Blasfhme/w, empregado de forma absoluta, indica uma blasfêmia contra Deus (Cf.
Mt 26.65a; Mc 2.7; Jo 10.36); do mesmo modo ocorre com o substantivo Blasfhmi/a (Cf. Mt 26.65b;
Mc 14.64; Lc 5.21; Jo 10.33, etc.). “No NT o conceito de blasfêmia é controlado completamente pelo
pensamento de violação do poder e majestade de Deus. Blasfêmia pode ser dirigida imediatamente contra
Deus (Ap 13.6; 16.11,21; At 6.11), contra o nome de Deus (Rm 2.24; 1Tm 6.1; Ap 16.9), contra a Palavra
de Deus (Tt 2.5), contra Moisés e Deus e consequentemente contra o fundamento da revelação na Lei (At
6.11)” (BEYER, H. W. Blasfhmi/a. In: KITTEL, G.; FRIEDRICH, G. eds. Theological Dictionary of
the New Testament. Grand Rapids, Michigan: Eerdmans, 1983 (Reprinted), v. 1, p. 622-623). Na LXX,
esse pensamento é predominante: a blasfêmia é contra a majestade e glória de Deus. Para o judeu, falar
de forma ímpia contra Moisés ou a Lei significa blasfemar (veja: At 6.11). Para o judaísmo do período
anterior ao Cristianismo — conforme interpretação que faziam de Dt 21.22-23 —, morrer numa cruz
significava uma blasfêmia, sendo esse tipo de morte uma maldição divina (ver: Gl 3.13) (Cf. HOFIUS, O.
Blasfhmi/a: In: BALZ, H.; SCHNEIDER, G. eds. Exegetical Dictionary of New Testament. Grand Rapids,
Michigan: Eerdmans, 1978-1980, v. 1, p. 221).
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Quem revelou aos profetas o nascimento e obra do Messias (Is, 53.1-12/1Pe
1.10-12/2Pe 1.21) e pregou a mensagem de arrependimento por meio de Noé
(1Pe 3.18-19/2Pe 2.5). O Espírito, como dizia Basílio (330-379), era o compa-
nheiro inseparável do Filho em todos os seus atos; vida e morte692. Na vida de
Cristo, não há alusão nem evidência de um crescimento da presença e direção do
Espírito693. Em Cristo, vemos a plenitude do Espírito (Is, 11.1ss; 42.1ss; 61.1ss).
Nele, temos, pela primeira vez, a manifestação do poder do Espírito da “nova
aliança”694 de forma completa e perfeita. John Owen (1616-1683) diz que “para
capacitar Cristo a cumprir perfeitamente os deveres que tinha a realizar sobre
a terra, o Espírito Santo o ungiu de modo especial com dons e poderes extraor-
dinários”695. Da mesma forma, Kuyper (1837-1920) afirma: “Evidentemente as
Escrituras têm o propósito de enfatizar a realidade da inabilidade da natureza
humana com a qual Cristo foi dotado para realizar a obra do Messias sem a ope-
ração constante e condução poderosa do Espírito Santo, pelo qual ela foi de tal
modo fortalecida que se tornou o instrumento do Filho de Deus para a realiza-
ção de sua maravilhosa obra”696.
surreição dos mortos, a saber, Jesus Cristo, nosso Senhor” (Rm, 1.3-4).
Kuyper (2010, p. 133-134) escreveu com sensibilidade bíblica:
Como o ouvido não pode ouvir sem som e o olho não pode ver sem luz,
também a nossa natureza humana é incompleta sem a luz e a habilita-
ção do Espírito Santo. Portanto, quando o Filho assumiu sua natureza
humana, ele a tomou exatamente como ela é, isto é, incapaz de qual-
quer ato santo sem o poder do Espírito Santo. Então ele foi gerado pelo
Espírito Santo para que, desde o começo, sua natureza humana fosse
ricamente dotada com poderes. O Espírito Santo desenvolveu esses
poderes e ele foi consagrado ao seu ofício pela comunicação à sua na-
tureza humana, dos dons messiânicos, pelos quais ele ainda intercede
por nós como o nosso Sumo Sacerdote e governa sobre nós como nosso
Rei. Por essa razão ele foi guiado, impelido, inspirado e apoiado pelo
Espírito Santo em cada passo de seu ministério messiânico699.
697 “Não examinamos o Antigo Testamento apenas para encontrar os antecedentes históricos de Cristo e de
seu ministério, nem mesmo para buscar referências que façam previsões sobre ele. Temos de encontrar
Cristo no Antigo Testamento – não aqui e ali, mas em toda parte” (MOHLER Jr., R. A. Estudando as
Escrituras para encontrar Jesus. In: CARSON, D. A. (Org.). As Escrituras dão testemunho de mim. São
Paulo: Vida Nova, 2015, p. 18).
698 “A pregação cristocêntrica não é simplesmente evangelística, nem confinada a uns poucos relatos
do evangelho. Abrange o todo da Escritura como revelação do plano redentor de Deus, e anuncia cada
passagem dentro do seu contexto” (CHAPELL, B. Pregação Cristocêntrica. São Paulo: Editora Cultura
Cristã, 2002, p. 32). “Se tem de acontecer uma nova Reforma neste tempo, tem de haver uma reforma do
púlpito. Essa restauração envolverá restaurar Cristo como o principal foco no púlpito. Tem de haver um
retorno decisivo a fazer de Cristo o ponto focal de toda pregação” (LAWSON, S. J. O tipo de pregação
que Deus abençoa. São José dos Campos, SP: Editora Fiel, 2013, p. 65). “Jesus Cristo crucificado é o tema
que unifica toda a Escritura” (Ibidem, p. 28). “Se o sermão falha em exaltar Cristo, não atinge o alvo”
(Ibidem, p. 25). Para uma abordagem crítica da igreja contemporânea, incluindo, obviamente, o abandono
da pregação bíblica, veja-se: HORTON, M. Cristianismo sem Cristo: O Evangelho Alternativo da Igreja
Atual. São Paulo: Cultura Cristã, 2010. Do mesmo modo, enfocando mais especificamente a adoração:
HORTON, M. Um Caminho Melhor. São Paulo: Cultura Cristã, 2007.
699 Ver também: HENDRIKSEN, W. Comentário do Novo Testamento: Mateus 1. São Paulo: Cultura
Cristã, 2001, (Mt 3.16), p. 303
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A SUA HUMANIDADE FOI RECONHECIDA
Ele teve uma vida normal revelada em todas as ocasiões, não apenas
circunstancialmente.
sorte que todas as gerações, desde Abraão até Davi, são catorze; desde Davi até
ao exílio na Babilônia, catorze; e desde o exílio na Babilônia até Cristo, catorze”
(Mt, 1.1,16,17).
B. Nascido de mulher
“Ora, o nascimento de Jesus Cristo foi assim: estando Maria, sua mãe, despo-
sada com José, sem que tivessem antes coabitado, achou-se grávida pelo Espírito
Santo” (Mt, 1.18). “Vindo, porém, a plenitude do tempo, Deus enviou seu Filho,
nascido de mulher, nascido sob a lei” (Gl, 4.4).
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1) Nascimento e crescimento
“Tendo Jesus nascido em Belém da Judéia, em dias do rei Herodes, eis que vie-
ram uns magos do Oriente a Jerusalém” (Mt, 2.1).
4
José também subiu da Galiléia, da cidade de Nazaré, para a Judéia, à
cidade de Davi, chamada Belém, por ser ele da casa e família de Davi,
5
a fim de alistar-se com Maria, sua esposa, que estava grávida. 6Estando
eles ali, aconteceu completarem-se-lhe os dias, 7e ela deu à luz o seu
filho primogênito, enfaixou-o e o deitou numa manjedoura, porque
não havia lugar para eles na hospedaria. 8Havia, naquela mesma região,
pastores que viviam nos campos e guardavam o seu rebanho durante as
vigílias da noite. 9E um anjo do Senhor desceu aonde eles estavam, e a
glória do Senhor brilhou ao redor deles; e ficaram tomados de grande
temor. 10O anjo, porém, lhes disse: Não temais; eis aqui vos trago boa-
-nova de grande alegria, que o será para todo o povo: 11é que hoje vos
nasceu, na cidade de Davi, o Salvador, que é Cristo, o Senhor. 12E isto vos
servirá de sinal: encontrareis uma criança envolta em faixas e deitada
em manjedoura (...) 40Crescia o menino e se fortalecia, enchendo-se de
sabedoria; e a graça de Deus estava sobre ele. 41Ora, anualmente iam
seus pais a Jerusalém, para a Festa da Páscoa. 42Quando ele atingiu os
doze anos, subiram a Jerusalém, segundo o costume da festa. (...) 52E
crescia Jesus em sabedoria, estatura e graça, diante de Deus e dos ho-
mens (Lc, 2.4-12; 40,41; 52).
Jesus nasceu como uma criança normal – após cumprirem-se os dias –, não
sabendo falar, nem andar. Desenvolveu-se como uma criança comum, tendo que
ser trocado, dado banho, amamentado, cuidado, conduzido, tomado nos braços,
enfim, passou por todas as experiências possíveis a uma criança normal (veja:
Lc, 2.5-7,22,27,28). Tendo, também, que ser educado pelos pais.
2) Obediência700
“E desceu com eles para Nazaré; e era-lhes submisso. Sua mãe, porém, guar-
dava todas estas coisas no coração” (Lc, 2.51). Considerando essa passagem,
Ware (2013) comenta:
É realmente admirável que este Jesus, que entendia claramente sua
identidade como o Filho do Pai celestial, escolheu colocar-se sob
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a autoridade de seus pais humanos. Sua submissão a eles indica seu
compromisso de seguir a lei do Senhor, que ordenava aos filhos serem
obedientes a seus pais, honrar pai e mãe. Embora ele fosse Deus em
carne humana, e embora o Espírito de Deus nele o capacitara a en-
tender sua identidade como o tão esperado Messias de Israel, Jesus se
manteve em submissão a seus pais humanos701.
A obediência de Cristo foi em favor do Seu povo; Ele viveu em constante har-
monia com a vontade do Pai. O preço da obediência era o sofrimento. Assim,
Ele foi batizado, submeteu-se às leis do povo, foi ultrajado, torturado, contado
entre os transgressores, morto e sepultado704.
O próprio Jesus diz: “A minha comida consiste em fazer a vontade daquele
que me enviou, e realizar a sua obra” (Jo 4.34). O Seu alimento e alegria consis-
tiram em realizar a obra do Pai (Is 50.4-7; 53.4-7).
3) Morte
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“E Jesus, clamando outra vez com grande voz, entregou o espírito” (Mt, 27.50).
“3Antes de tudo, vos entreguei o que também recebi: que Cristo morreu pelos
nossos pecados, segundo as Escrituras, 4e que foi sepultado e ressuscitou ao ter-
ceiro dia, segundo as Escrituras” (1Co, 15.3-4).
1) Teve fome
“E, depois de jejuar quarenta dias e quarenta noites, teve fome” (Mt, 4.2).
2) Teve sede
“Depois, vendo Jesus que tudo já estava consumado, para se cumprir a Escritura,
disse: Tenho sede!” (Jo 19.28).
3) Sentiu cansaço
“Estava ali a fonte de Jacó. Cansado da viagem, assentara-se Jesus junto à fonte,
por volta da hora sexta” (Jo 4.6).
4) Sentiu sono
“E eis que sobreveio no mar uma grande tempestade, de sorte que o barco era
varrido pelas ondas. Entretanto, Jesus dormia” (Mt, 8.24).
5) Chorou
“41Quando ia chegando, vendo a cidade, chorou 42e dizia: Ah! Se conheceras por
ti mesma, ainda hoje, o que é devido à paz! Mas isto está agora oculto aos teus
olhos” (Lc, 19.41-42).
32
Quando Maria chegou ao lugar onde estava Jesus, ao vê-lo, lançou-
-se-lhe aos pés, dizendo: Senhor, se estiveras aqui, meu irmão não teria
morrido. 33Jesus, vendo-a chorar, e bem assim os judeus que a acom-
panhavam, agitou-se no espírito e comoveu-se. 34E perguntou: Onde
o sepultastes? Eles lhe responderam: Senhor, vem e vê! 35Jesus chorou.
36
Então, disseram os judeus: Vede quanto o amava” (Lc, 11.32-36).
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6) Foi tentado
“A seguir, foi Jesus levado pelo Espírito ao deserto, para ser tentado pelo diabo”
(Mt 4.1).
17
Por isso mesmo, convinha que, em todas as coisas, se tornasse seme-
lhante aos irmãos, para ser misericordioso e fiel sumo sacerdote nas
coisas referentes a Deus e para fazer propiciação pelos pecados do
povo. 18Pois, naquilo que ele mesmo sofreu, tendo sido tentado, é pode-
roso para socorrer os que são tentados (Hb 2.17-18).
“Porque não temos sumo sacerdote que não possa compadecer-se das nossas fra-
quezas; antes, foi ele tentado em todas as coisas, à nossa semelhança, mas sem
pecado” (Hb 4.15).
O Espírito guiou [“impeliu”705 (Mc, 1.12)] Jesus ao deserto para ser tentado,
permanecendo com Ele durante todos os quarenta dias (Lc, 4.1,2). O relato de
Lucas nos dá a entender que Jesus foi tentado desde a Sua chegada. A tenta-
ção faz parte do Seu amadurecimento para o Ministério que o Pai Lhe confiara.
O primeiro Adão sucumbiu à tentação, desobedecendo a Deus; Jesus Cristo,
o último Adão, deve ser tentado para poder levar sobre Si o pecado dos eleitos. A
tentação foi crucial para o Seu Ministério. Se Cristo não vencesse o presunçoso
tentador706, jamais poderia ser o Salvador daqueles que estavam sob o “domínio”
705 E)kba/llw. A palavra tem o sentido de “tirar”, “expelir”. (Mt 7.22; 8.16,31; Mc 1.34,39; 3.15, etc.). “Jesus,
sendo cheio do Espírito, sentia a sua força no íntimo da Sua alma” (KUYPER, A. The Work of the Holy
Spirit. Chaattanooga: AMG. Publishers, 1995, p. 108).
706 “...Talvez a prova cabal do poder, da autoconfiança e da habilidade do diabo se ache no fato de que
ele não hesitou em tentar e atacar até mesmo o Filho de Deus. Ele O abordou confiantemente, seguro
de si, pois havia derrotado todos os outros” (LLOYD-JONES, D. M. O Combate Cristão. São Paulo:
Publicações Evangélicas Selecionadas, 1991, p. 73).
de Satanás. É relevante observar que o Seu ministério público teve início após
esse episódio, começando com um sermão (Lc 4.16-21/Is 61.1-2).
A tentação promovida por satanás contra Jesus Cristo indica a sua convic-
ção de que Ele era realmente homem. Jamais encontramos nas Escrituras satanás
desafiando diretamente a Deus. Ele age ordinariamente tentando os servos de
Deus a desobedecerem a Deus e, consequentemente, a se afastarem do Senhor.
Porém não o vemos provocando um confronto direto.
Aqui, temos Satanás descrente da divindade de Cristo e, ao mesmo tempo,
convicto de sua humanidade, tentando-o, como fizera com Adão e continua
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fazendo com os homens durante todo o tempo que Deus lhe tem permitido agir
dentro de uma esfera restrita. Na realidade, Satanás podia, como de fato fez, ten-
tar a Jesus de forma externa, contudo, não podia fazê-lo internalizar a tentação.
Ele foi tentado, mas nunca se sentiu tentado.
7) Orou
“E, despedidas as multidões, subiu ao monte, a fim de orar sozinho. Em caindo a
tarde, lá estava ele, só” (Mt, 14.23). “Tendo Jesus falado estas coisas, levantou os
olhos ao céu e disse: Pai, é chegada a hora; glorifica a teu Filho, para que o Filho
te glorifique a ti” (Jo 17.1)707. “Ele, Jesus, nos dias da sua carne, tendo oferecido,
com forte clamor e lágrimas, orações e súplicas a quem o podia livrar da morte
e tendo sido ouvido por causa da sua piedade” (Hb 5.7).
Grudem (1990, p. 440) comenta que: “Ele era tão plenamente humano que
mesmo os que viveram e trabalharam com ele por trinta anos, mesmo os irmãos
que cresceram na casa dele, não percebiam que era um tanto superior a outros
seres humanos muito bons. Ao que parece, não tinham ideia de que fosse Deus
vindo em carne”.
707 “Se alguma vez você tiver dificuldade sobre a encarnação, só esta oração, a oração da vida do nosso
Senhor em geral deveria colocá-lo imediatamente em paz, e mantê-lo em paz. Ele é verdadeiramente
homem. Não é o caso de Deus numa espécie de corpo de fantasma, não é uma teofania, é a encarnação,
a Palavra feita carne e habitando entre nós. Ele é verdadeiramente Deus, sim, mas é verdadeiramente
homem. (...) Portanto, observar o nosso Senhor enquanto ora é talvez uma das portas mais maravilhosas
de entrada ao grande mistério da Sua bendita Pessoa” (LLOYD-JONES, D. M. Salvos desde a Eternidade.
São Paulo: Publicações Evangélicas Selecionadas, 2005 (Certeza Espiritual: v. 1), p. 31-32).
Nos tópicos anteriores, estudamos a realidade das duas naturezas de Cristo, afir-
mando o que podemos aprender das Escrituras, que Jesus Cristo é plenamente
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homem e plenamente Deus. Agora, trataremos biblicamente a compreensão de
que o Senhor Jesus, tendo duas naturezas, se constitui em uma só pessoa.
Por natureza, entendemos os elementos essenciais para que uma coisa seja o que
é (a concreta substância de uma espécie); dessa forma, quando falamos em natu-
reza humana, nos referimos a um corpo mortal e uma alma (= espírito) imortal,
os quais a constituem.
ALGUNS EQUÍVOCOS
Observem que, dentro dessa perspectiva, Jesus não salvaria ninguém, já que Ele
não seria verdadeiro homem nem verdadeiro Deus.
ensina a respeito.
710 Nome proveniente de Nestório (380-451), Bispo de Constantinopla (428-431). Tentando refutar o
Eutiquianismo, Nestório ensinava que Jesus Cristo era constituído de duas pessoas e duas naturezas.
Entendia que cada uma das duas naturezas de Jesus tinha a sua própria subsistência e personalidade; a
união entre elas não era ontológica, mas apenas moral, simpática e afetiva. Os seus ensinamentos foram
rejeitados no Concílio de Éfeso (431) e de Calcedônia (451).
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Aqui, não há nenhum docetismo. Jesus Cristo não é apenas um ser celestial com
aparência exterior humana, antes, é verdadeira e plenamente humano, porém
sem pecado717 (veja, também: Jo 1.18; Cl 1.13-22; Hb 1 e 2; 4.4-5.10; 7.1-10.18;
1Jo 1.1-2.2).
711 A palavra grega morfh/ (Mc 16.12; Fp 2,6,7) não indica algo externo (forma) em contraste com a
essência interna. A aparência externa é a expressão visível, sensível, da sua natureza interna. Não há
antítese. Portanto, a natureza essencial de Cristo era divina. A sua forma externa corresponde àquilo que
Ele é em sua essência. (Confira: BRAUMANN, G. Forma. In: BROWN, C. ed. ger. O Novo Dicionário
Internacional de Teologia do Novo Testamento. São Paulo: Vida Nova, 1981-1983, v. 2, p. 378-281);
Hendriksen, preciso, como sempre, conclui: “O que Paulo está dizendo [...] é que Cristo Jesus sempre foi
(e continuará sempre sendo) Deus por natureza, a expressa imagem da Deidade. O caráter específico da
Divindade, segundo se manifesta em todos os atributos divinos, foi e é a sua eternidade – Cf. Cl 1.15,17
(também, Jo 1.1; 8.58; 17.24)” (HENDRIKSEN, W. Exposição de Filipenses. São Paulo: Casa Editora
Presbiteriana, 1992, p. 139).
712 A palavra denota uma igualdade qualitativa e quantitativa de tamanho, numérica, de valor ou força,
sendo aplicada a quantias iguais, extensões de tempo, partes, pedaços, etc. (Veja: STÄHLIN, G. i)/soj:
In: KITTEL, G.; FRIEDRICH, G. eds. Theological Dictionary of the New Testament. Grand Rapids,
Michigan: Eerdmans, 1982 (Reprinted), v. 3, p. 343-355). No NT. apresenta a ideia de consistência/
coerência (Mc 14.56,59); igual/igualar (Mt 20.12; Jo 5.18; Ap 21.16); outro tanto (Lc 6.34); mesmo (At
11.17). O texto de Filipenses aponta para a preexistência do verbo e a sua igualdade com o Pai. Ou seja:
Ele é eternamente Deus.
713 BROWN, C. et. al. Vazio: In: BROWN, C. ed. ger. O Novo Dicionário Internacional de Teologia do
Novo Testamento. São Paulo: Vida Nova, 1981-1983, v. 4, p. 690-692; OEPKE, A. keno/j: In: KITTEL,
G.; FRIEDRICH, G. eds. Theological Dictionary of the New Testament. Grand Rapids, Michigan:
Eerdmans, 1982 (Reprinted), v. 3, p. 661-662 (especialmente); TURRETINI, F. Compêndio de Teologia
Apologética. São Paulo: Cultura Cristã, 2011, v. 1, p. 381-382.
714 Da mesma forma, a natureza essencial de Cristo tornou-se humana, na forma de servo.
715 *Rm 1.23; 5.14; 6.5; 8.3; Fp 2.7; Ap 9.7. Uma palavra rara que significa “aquilo que é semelhante”,
“cópia”. Para uma visão paralela desses textos, veja: BEYREUTHER, E. et. al. Semelhante: In: BROWN,
C. ed. ger. O Novo Dicionário Internacional de Teologia do Novo Testamento, v. 4, p. 410-411 (em
especial); SCHNEIDER, J. o(/moioj: In: KITTEL, G.; FRIEDRICH, G. eds. Theological Dictionary of the
New Testament. Grand Rapids, Michigan: Eerdmans, 1982 (Reprinted), v. 5, p. 192-198; HOLTZ, T. o(moi/
wsij: In: BALZ, H.; SCHNEIDER, G. eds. Exegetical Dictionary of the New Testament. Grand Rapids,
MI.: Eerdmans, 1999 (Reprinted), v. 2, p. 512-513.
716 WARFIELD, B. B. The Person fo Christ. In: WARFIELD, B. B. The Works of Benjamin B. Warfield.
Grand Rapids, MI.: Baker Book House, 2000 (Reprinted), v. 9. p. 176ss.
717 SCHNEIDER, J. o(/moioj: In: KITTEL, G.; FRIEDRICH, G. eds. Theological Dictionary of the New
Testament. Grand Rapids, Michigan: Eerdmans, 1982 (Reprinted), v. 5, p. 196.
A POSIÇÃO BÍBLICO-REFORMADA
Na história da Igreja, houve dois Concílios que foram fundamentais para definir
a questão das duas naturezas de Cristo. O primeiro deles foi o de Nicéia, reunido
em 325, e o segundo – o mais importante – foi o de Calcedônia, reunido de 8 a
31 de outubro de 451, com a presença de mais de 500 bispos e vários delegados
papais, que, como de costume, o representavam. Calcedônia ratificou o Credo
de Nicéia (325) e o de Constantinopla (381). O seu objetivo era estabelecer uma
unidade teológica na Igreja.
O seu Credo foi rascunhado em 22 de outubro por uma comissão presi-
dida por Anatólio de Constantinopla († 458), encontrando a sua redação final,
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1) As propriedades de ambas as naturezas podem ser atribuídas a uma só
Pessoa, por exemplo, onisciência e conhecimento limitado.
2) Os sofrimentos do Deus-Homem podem ser reputados como real e verda-
deiramente infinitos, ao mesmo tempo em que a natureza divina não é passível
de sofrimento.
3) É a divindade, e não a humanidade, que constitui a raiz e a base da per-
sonalidade de Cristo.
4) O Logos não se uniu a um indivíduo distinto, e sim à natureza humana.
Não houve primeiro um homem já existente com quem a segunda Pessoa da
Deidade teria se associado. A união foi efetuada com a substância da humani-
dade no ventre da virgem.
Como sabemos, os documentos confessionais da Igreja, elaborados e/ou
sancionados, por vezes, em Concílios, não são Palavra de Deus, contudo, ao
longo da história, Deus tem propiciado e capacitado a Igreja a se pronunciar
Um decreto ou uma declaração teológica, por mais relevante que seja, não põe
fim imediatamente a um sistema. A ortodoxia, por sua vez, não é criada por
intermédio de pronunciamentos oficiais, embora saibamos que todos eles sejam
necessários e relevantes para nortear a Igreja e enriquecer a sua fé723. Com isso,
estamos apenas querendo indicar que, do mesmo modo que Nicéia não colo-
cou um ponto final na questão Trinitária, Calcedônia não determinou o fim dos
problemas Cristológicos. As heresias permaneceram em diversas regiões, espe-
cialmente na Igreja Oriental724. Contudo Calcedônia se constitui num marco
722 Como nos diz Bavinck a respeito de Calcedônia, como princípio, pode ser dito a respeito de todos os
Concílios e pronunciamentos eclesiásticos: “A linguagem de Calcedônia não é sacrossanta e está aberta
a reformulação. Porém, até agora, todos os esforços para melhorá-la falharam, e a igreja não pode fazer
nada melhor hoje em dia do que manter a doutrina das duas naturezas” (BAVINCK, H. Dogmática
Reformada. São Paulo: Cultura Cristã, 2012, v. 3, p. 243).
723 “Uma confissão teológica pobre pode, em última análise, conduzir apenas à vida cristã empobrecida”
(TRUEMAN, C. R. O imperativo confessional. Brasília, DF: Editora Monergismo, 2012, p. 254).
724 Além das indicações já feitas, veja: BERKHOF, L. História das Doutrinas Cristãs. p. 99-102; KELLY,
J. N. D. Doutrinas Centrais da Fé Cristã: Origem e Desenvolvimento, p. 258; LOHSE, B. A Fé Cristã
Através dos Séculos. 2. ed. São Leopoldo, RS: Sinodal, 1981, p. 101-106; TILLICH, P. História do
Pensamento Cristão. São Paulo: ASTE., 1988, p. 91ss.; GONZALEZ, J. L. A Era das Trevas. São Paulo:
Vida Nova, (Uma História Ilustrada do Cristianismo), 1980-1988, p. 102ss.; BRAATEN, C. E. A Pessoa de
Jesus Cristo: In: BRAATEN, C. E.; JENSON, R. W. eds. Dogmática Cristã, v. 1, p. 492ss.
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mento de Calcedônia. Escreveu:
Com efeito, que se diz o Verbo haver-Se feito carne (Jo 1.14), não se deve
assim entender que se haja sido Ele ou convertido em carne, ou confu-
samente misturado à carne; ao contrário, porque no ventre da Virgem
para Si escolheu um templo em que habitasse, e Aquele Que era o Filho
de Deus Se fez o Filho do Homem, não mediante confusão de substân-
cia, mas mercê de unidade de pessoa. Pois, na verdade, afirmamos ser a
Divindade assim associada e unida à humanidade que a cada natureza
permaneça integral sua propriedade e, todavia, dessas duas constitua um
Cristo único (CALVINO, 2006, II.14.1)
O único Redentor dos eleitos de Deus é o Senhor Jesus Cristo, que, sendo
o eterno Filho de Deus, se fez homem, e assim foi e continua a ser Deus e
homem em duas naturezas distintas, e uma só pessoa, para sempre.
Com esse nome, queremos dizer que Jesus Cristo, mesmo tendo duas nature-
zas, possuía apenas uma personalidade, a qual reunia perfeitamente as Suas duas
naturezas, sem haver fragmentação no Seu comportamento. Jesus Cristo sempre
agiu como Deus-Homem. “O que importa é sustentar que todos e quaisquer atos
de Cristo são atos da única Pessoa do Verbo encarnado: mesmo na sangrenta
paixão e na morte é ilícito separar a natureza humana da Divina”725.
1) Jesus Cristo fala de Si mesmo como uma única pessoa; não havendo o inter-
câmbio entre um “Eu” e um “Tu” entre as duas naturezas:
Tendo Jesus falado estas coisas, levantou os olhos ao céu e disse: Pai,
é chegada a hora; glorifica a teu Filho, para que o Filho te glorifique a
ti. (...) 4Eu te glorifiquei na terra, consumando a obra que me confiaste
para fazer; 5e, agora, glorifica-me, ó Pai, contigo mesmo, com a glória
que eu tive junto de ti, antes que houvesse mundo. (...) 22Eu lhes tenho
transmitido a glória que me tens dado, para que sejam um, como nós
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o somos; 23eu neles, e tu em mim, a fim de que sejam aperfeiçoados na
unidade, para que o mundo conheça que tu me enviaste e os amaste,
como também amaste a mim (Jo, 17.1,4,5,22,23).
e) Jesus Cristo falando aos seus discípulos: “Que será, pois, se virdes o Filho do
Homem subir para o lugar onde primeiro estava?” (Jo 6.62).
f) Pedro, discursando no templo, diz que os judeus mataram o Autor da vida:
“Dessarte, matastes o Autor da vida, a quem Deus ressuscitou dentre os mor-
tos, do que nós somos testemunhas” (At 3.15).
g) Paulo, instruindo os presbíteros de Éfeso em Mileto, fala do sangue de Deus:
“Atendei por vós e por todo o rebanho sobre o qual o Espírito Santo vos cons-
tituiu bispos, para pastoreardes a igreja de Deus, a qual ele comprou com o
seu próprio sangue” (At 20.28).
h) Paulo refere-se a Cristo como Deus bendito: “Deles são os patriarcas, e
também deles descende o Cristo, segundo a carne, o qual é sobre todos, Deus
bendito para todo o sempre. Amém!” (Rm 9.5).
i) Paulo diz que os homens em sua ignorância crucificaram o Senhor da glória:
“Sabedoria essa que nenhum dos poderosos deste século conheceu; porque, se
a tivessem conhecido, jamais teriam crucificado o Senhor da glória” (1Co 2.8).
j) Paulo afirma que em Cristo habita corporalmente toda a plenitude da
divindade: “8Cuidado que ninguém vos venha a enredar com sua filosofia e
vãs sutilezas, conforme a tradição dos homens, conforme os rudimentos do
mundo e não segundo Cristo; 9porquanto, nele, habita, corporalmente, toda
a plenitude da Divindade” (Cl 2.8-9)726.
726 “A plenitude do ser de Deus é revelada nEle. Ele não apenas nos apresenta o Pai e nos revela Seu nome,
mas Ele nos mostra o Pai em Si mesmo e nos dá o Pai. Cristo é a expressão de Deus e a dádiva de Deus.
Ele é Deus revelado a Si mesmo e Deus compartilhado a Si mesmo, e portanto Ele é cheio de verdade e
também cheio de Graça” (BAVINCK, H. Teologia Sistemática. Santa Bárbara d’Oeste, SP.: SOCEP, 2001,
p. 25-26).
Além dos textos citados, leiam também: Mt 1.21; Lc 1.31-33; Gl. 4.4; Fp 2.6-11,
Cl 1.13-20; Hb 1.1-2.
4) Todos os que se referiam a Jesus Cristo faziam menção de apenas uma
só pessoa:
À pergunta de Jesus Cristo a respeito de sua identidade, Pedro responde de
forma confiante e incisiva: “(...)Tu és o Cristo, o Filho do Deus vivo” (Mt 16.16).
No final do primeiro século, como vimos, João, combatendo ensinamentos
de falsos mestres que penetravam a igreja, instrui:
“Amados, não deis crédito a qualquer espírito; antes, provai os espíritos
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se procedem de Deus, porque muitos falsos profetas têm saído pelo
mundo fora. 2Nisto reconheceis o Espírito de Deus: todo espírito que
confessa que Jesus Cristo veio em carne é de Deus” (1Jo 4.1-2).
727 PIPER, J. Um homem chamado Jesus Cristo. São Paulo: Vida, 2005, p. 45-46.
o sentido de propriedade.
A Bíblia, por outro lado, não ignora a forma de tratamento empregada para
“senhor” – além de reconhecer outras –, todavia, quando os profetas, discípulos
e os autores sagrados a utilizam para Deus, ela significa posse absoluta. Como
veremos, o mesmo acontece na confissão e proclamação do Senhorio de Cristo.
728 PAPE, D. Cristo é o Senhor. 3. ed. São Paulo: ABU Editora, 1983, p. 26-27.
729 Consultar referência.
730 ANGLADA, P. Soli Deo Gloria: O Ser e as obras de Deus. Ananindeua, PA.: Knox Publicações, 2007,
p. 35. Veja: QUELL, G. ku/rioj: In: KITTEL, G.; FRIEDRICH, G. eds. Theological Dictionary of the
New Testament, v. 3, p. 1065-1066; PAYNE, J. B. Hawa. In.: HARRIS, R. L. et. al. eds. Dicionário
Internacional de Teologia do Antigo Testamento. São Paulo: Vida Nova, 1998, p. 348.
Como bem sabemos, o texto hebraico original não constava de vogais, entre-
tanto, com o decréscimo do conhecimento da língua hebraica, tornou-se ainda
mais difícil a compreensão dos textos, visto que a introdução mental de uma
vogal errada, conduziria o leitor a uma interpretação equivocada. Por isso, desde
a Antiguidade várias tentativas foram feitas para se introduzir as vogais, o que
finalmente ocorreu de forma satisfatória pelos judeus da escola massorética de
Tiberías, por volta do ano 950 da Era Cristã.
No caso do nome hwhy (YHWH), que ocorre cerca de 7000 vezes no AT.731,
há algumas particularidades curiosas: Por volta do ano 300 a.C. ou um pouco
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antes, os judeus, devido a: (1) sua reverência para com Deus; (2) sua interpretação
de Lv 24.16 e Ex 3.15 e (3) o temor de serem culpados do pecado de profana-
ção, deixaram de pronunciar o nome YHWH. O que eles passaram a fazer foi
o seguinte: Todas as vezes que liam o nome YHWH em voz alta, esse nome era
substituído por yfnOdf) (‘âdônây)(“Senhor”)732. “Para indicar que esta substi-
tuição se devia fazer, os Massoretas733 intercalavam as vogais de ‘aDõNãY734 sob
as consoantes de JaHWeH, daí surgiu a palavra JeHowah ou ‘Jeová’”. (ARCHER
JR. 1974, p. 66). O certo é que hoje nós não temos condições de saber qual era a
pronúncia correta do tetragrammaton735 divino, daí, pronunciar-se de diversas
formas: Yavé, Javé, Jeová, dentre outras.
“É especialmente no nome Yhwh que o Senhor se revela como o Deus de
Graça” (BAVINCK, 1955, p. 103)736. Aqui, de modo especial, encontramos a afir-
731 A estatística não é precisa e os critérios variam: QUELL, G. ku/rioj: In: KITTEL, G.; FRIEDRICH,
G. eds. Theological Dictionary of the New Testament, v. 3, p. 1067; BROWN, F.; DRIVER, S. R.;
BRIGGS, C. A. A Hebrew and English Lexicon of the Old Testament. Oxford: Clarendon, 1953, p. 217b;
FRETHEIM, T. Javé: In: VANGEMEREN, W. A. (Org.). Novo Dicionário Internacional de Teologia e
Exegese do Antigo Testamento. São Paulo: Cultura Cristã, 2011, v. 4, p. 736.
732 Palavra usada exclusivamente para Deus. Cf. Gesenius’ Hebrew-Chaldee Lexicon to the Old
Testament. 13. ed. Grand Rapids, Michigan: Eerdmans, 1978, p. 12b. Sobre o porquê do uso específico
dessa palavra: CULLMAN, O. Cristologia do Novo Testamento. São Paulo: Editora Liber, 2001, p. 263ss.
733 Consultar referência.
734 Ainda que em menor escala, os Massoretas também intercalavam com o tetragrammaton, as vogais
de ‘Elohim. BERKHOF, L. Teologia Sistemática. Campinas, SP.: Luz para o Caminho, 1990, p. 51;
HENDRIKSEN, W. Comentário do Novo Testamento: Mateus. São Paulo: Cultura Cristã, 2001, v. 1, (Mt
6.9), p. 460-461.
735 BERKHOF, L. Teologia Sistemática. Campinas, SP.: Luz para o Caminho, 1990, p. 51; BAVINCK, H.
The Doctrine of God. 2. ed. Grand Rapids, Michigan: W. M. Eerdmans Publishing Co., 1955, p. 102ss.;
CRABTREE, A. R. Teologia do Velho Testamento, 2. ed. Rio de Janeiro: JUERP, 1977, p. 64.
736 BAVINCK, H. The Doctrine of God. 2. ed. Grand Rapids, Michigan: W. M. Eerdmans Publishing Co.,
1955, p. 103.
737 KAISER JR., W. C. Teologia do Antigo Testamento. São Paulo: Vida Nova, 1980, p. 111-112. “A fé
entende a imutabilidade como expressão da direção inalterável da vontade de Deus e como a afirmação
de que essa vontade, sob todas as circunstâncias e em toda a sua atividade, caracteriza-se pelo amor”
(AULÉN, G. A Fé Cristã. São Paulo: ASTE, 1965, p. 131).
738 Para um estudo mais exaustivo desse emprego, confira: BIETENHARD, H. Senhor. In: BROWN, C.
ed. ger. O Novo Dicionário Internacional de Teologia do Novo Testamento. São Paulo: Vida Nova,
1981-1983, v. 4, p. 423-432; FOERSTER, W.; QUELL, G. Ku/rioj: In: KITTEL, G.; FRIEDRICH, G. eds.
Theological Dictionary of the New Testament. Grand Rapids, Michigan: Eerdmans, 1982 (Reprinted), v.
3, 1039-1098.
739 Consultar referência.
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
o nascimento de Jesus:
8
Havia, naquela mesma região, pastores que viviam nos campos e guar-
davam o seu rebanho durante as vigílias da noite. 9E um anjo do Senhor
desceu aonde eles estavam, e a glória do Senhor brilhou ao redor deles;
e ficaram tomados de grande temor. 10O anjo, porém, lhes disse: Não
temais; eis aqui vos trago boa-nova de grande alegria, que o será para
todo o povo: 11é que hoje vos nasceu, na cidade de Davi, o Salvador, que
é Cristo, o Senhor (ku/rioj) (Lc 2.8-11)741.
740 Palavra que só aparece no Evangelho de Lucas. *Lc 5.5; 8.24.45; 9.33,49; 17.13. O uso secular dessa
palavra para designar o mestre é amplo. A expressão pode indicar alguém que conduz um elefante,
supervisor de obras públicas (Ex 1.11; 5.14;1Rs 5.16; 2Cr 2.2), o líder de uma associação atlética ou de
um templo, um magistrado ou governador de uma cidade, líder de uma escola filosófica e, até mesmo,
uma deidade guardiã (veja: OEPKE, A. E)pista/thj: In: KITTEL, G.; FRIEDRICH, G. eds. Theological
Dictionary of the New Testament. Grand Rapids, Michigan: Eerdmans, 1982 (Reprinted), v. 2, p. 622-
623).
741 Veja, também, Mc 12.36,37; Lc 1.43; 3.4; Jo 20.28; At 2.36; 10.36; Rm 10.9; 1Co 2.8; 8.6; 12.3; Fp 2.11, Tg
2.1; Ap 19.16, etc.
742 Consultar referência.
Atos 2.20-21: 20O sol se converterá em trevas, e a lua, em sangue, antes que
venha o grande e glorioso Dia do Senhor. 21E acontecerá que todo aquele que
invocar o nome do Senhor será salvo.
Romanos 10.13: Porque: Todo aquele que invocar o nome do Senhor será salvo.
Joel 2.31-32: 31O sol se converterá em trevas, e a lua, em sangue, antes que
venha o grande e terrível Dia do SENHOR. 32 E acontecerá que todo aquele
que invocar o nome do SENHOR será salvo; porque, no monte Sião e em
Jerusalém, estarão os que forem salvos, como o SENHOR prometeu; e, entre
os sobreviventes, aqueles que o SENHOR chamar.
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
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surreição e ascensão, quando, então, não houve mais dúvida quanto a ser Jesus,
o Senhor e Cristo746. Por isso, Pedro pôde falar ousadamente diante do povo e
das autoridades judaicas:
29
Irmãos, seja-me permitido dizer-vos claramente a respeito do patriar-
ca Davi que ele morreu e foi sepultado, e o seu túmulo permanece entre
nós até hoje. 30Sendo, pois, profeta e sabendo que Deus lhe havia ju-
rado que um dos seus descendentes se assentaria no seu trono, 31pre-
vendo isto, referiu-se à ressurreição de Cristo, que nem foi deixado na
morte, nem o seu corpo experimentou corrupção. 32A este Jesus Deus
ressuscitou, do que todos nós somos testemunhas. 33Exaltado, pois, à
destra de Deus, tendo recebido do Pai a promessa do Espírito Santo,
derramou isto que vedes e ouvis. 34Porque Davi não subiu aos céus,
mas ele mesmo declara: Disse o Senhor ao meu Senhor: Assenta-te à
minha direita, 35até que eu ponha os teus inimigos por estrado dos teus
pés. 36Esteja absolutamente certa, pois, toda a casa de Israel de que a
este Jesus, que vós crucificastes, Deus o fez Senhor (ku/rioj) e Cristo
(Veja: At 2.29-36. Veja, também: 1Co 15.25; Hb 1.3,10,13).
743 ERICKSON, M. J. Introdução à Teologia Sistemática. São Paulo: Vida Nova, 1997, p. 280.
744 DODD, C. H. Segundo as Escrituras. São Paulo: Paulinas, 1979, p. 31-32.
745 Consultar referência.
746 Consultar referência.
1) É o único Senhor
Em última instância, todos temos apenas um único Senhor. Jesus Cristo é o
Senhor dos senhores. Os senhores humanos, por mais poderosos que sejam em
relação a seus bens e subordinados, na sua relação com Deus são apenas servos.
Paulo escreve aos coríntios:
4
No tocante à comida sacrificada a ídolos, sabemos que o ídolo, de si
mesmo, nada é no mundo e que não há senão um só Deus. 5Porque,
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
747 * Lc 2.29; At 4.24; 1Tm 6.1,2; 2Tm 2.21; Tt 2.9; 1Pe 2.18; 2Pe 2.1; Jd 4; Ap 6.10. A palavra “denota o
senhor como dono e amo nas esferas da vida pública e familiar” (BIETENHARD, H. Senhor. In: BROWN,
C. ed. ger. O Novo Dicionário Internacional de Teologia do Novo Testamento. São Paulo: Vida Nova,
1981-1983, v. 4, p. 421).
2) É o Senhor Todo-Poderoso
O Senhorio de Cristo não é apenas de honra, ou, quem sabe, simbólico, alu-
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dindo a uma tradição que nos tornaria diferentes de outros povos. Jesus Cristo é
o Senhor Todo-Poderoso. O seu poder provém Dele mesmo, não estando ampa-
rado e dependente de nada fora de Si mesmo.
O apóstolo João, quando escreve às sete igrejas da Ásia, se apresenta como
tendo sido enviado pelo Senhor, Aquele que é Onipotente, cujo majestoso poder
se estende sobre todas as coisas e pessoas:
5
E da parte de Jesus Cristo, a Fiel Testemunha, o Primogênito dos mor-
tos e o Soberano (a)/rxwn) dos reis da terra. Àquele que nos ama, e,
pelo seu sangue, nos libertou dos nossos pecados, (...) 8Eu sou o Alfa e
Ômega, diz o Senhor (ku/rioj) Deus, aquele que é, que era e que há
de vir, o Todo-Poderoso (pantokra/twr) (= Onipotente)750 (Ap 1.5,8).
3) É o Senhor Eterno
O Deus Todo-Poderoso não tem mandato em Seu governo. Ele é o Senhor Criador
e preservador de todas as coisas. Na época de eleições, os governantes correm
para realizarem obras que lhes rendam votos e contratos negociáveis em causa
748 “A Igreja nasceu numa sociedade em que a escravidão humana era uma instituição aceita, sancionada
pela lei e parte do arcabouço da civilização greco-romana” (MARTIN, R. P. Colossenses e Filemon:
introdução e comentário. São Paulo: Mundo Cristão/Vida Nova, 1984, p. 132).
749 “Ante os olhos da lei o escravo era uma coisa. Não existia algo assim como um código de condições
de trabalho. Quando um escravo não era apto para o trabalho podia ser despedido, ainda que viesse a
morrer. O escravo não tinha o direito de casar-se e se chegava a ter um filho este pertencia ao amo, como
os cabritos de um rebanho ao pastor. O amo podia açoitá-lo, marcá-lo a fogo e matá-lo sem que ninguém
o impedisse. Novamente todos os direitos pertenciam ao amor e os deveres ao escravo” (BARCLAY,
W. Filipenses, Colosenses, I y II Tesalonicenses. Buenos Aires: La Aurora (El Nuevo Testamento
Comentado, v. 11), 1973, (Cl 3.18-4.1), p. 172).
750 *2Co 6.18; Ap 1.8; 4.8; 11.17; 15.3; 16.7,14; 19.6,15; 21.22.
está no SENHOR, seu Deus, 6que fez os céus e a terra, o mar e tudo o que
neles há e mantém para sempre a sua fidelidade (Sl, 146.2-6).
Pedro, escrevendo a irmãos que estavam sendo assolados por heresias que visa-
vam, em última instância, negar o senhorio de Cristo (2Pe, 2.1), os estimula a
amadurecer em sua fé, valendo-se dos recursos que Deus tem proporcionado à
igreja para a sua plena maturidade. Conclui, então: “Pois desta maneira é que vos
será amplamente suprida a entrada no reino eterno de nosso Senhor (ku/rioj) e
Salvador Jesus Cristo” (2Pe, 1.11).
É justamente por isso que a Palavra do Senhor permanece eternamente. Pedro
encoraja as igrejas perseguidas. Prosseguindo em seu argumento, demonstra que
essa Palavra é que lhes fora anunciada. Não há outra palavra: “24Pois toda carne
é como a erva, e toda a sua glória, como a flor da erva; seca-se a erva, e cai a sua
flor; 25a palavra do Senhor (ku/rioj), porém, permanece eternamente. Ora, esta
é a palavra que vos foi evangelizada” (1Pe, 1.24,25).
A Lei do Senhor não tem prazo de validade. O que Pedro anunciou com
fidelidade é a Palavra do Senhor, a mesma que ele repete agora. Essa palavra per-
manece para sempre. Ela é a “palavra do Senhor”, o Senhor eterno.
Jesus Cristo é o Senhor. Senhor do tempo e da eternidade, quer aqui, quer
no céu; quer na vida, quer na morte. O seu reinado permanece. Não há esfera
ou dimensão da existência que lhe seja estranha:
8
Porque, se vivemos, para o Senhor (ku/rioj) vivemos; se morremos,
para o Senhor (ku/rioj) morremos. Quer, pois, vivamos ou morramos,
somos do Senhor (ku/rioj). 9Foi precisamente para esse fim que Cristo
morreu e ressurgiu: para ser Senhor (kurieu/w) tanto de mortos como
de vivos (Rm, 14.8-9).
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paz, por meio de Jesus Cristo. Este é o Senhor (ku/rioj) de todos” (At, 10.36).
Paulo, quando prega no areópago ateniense, proclama o senhorio e auto-
nomia de Deus: “O Deus que fez o mundo e tudo o que nele existe, sendo ele
Senhor (ku/rioj) do céu e da terra, não habita em santuários feitos por mãos
humanas” (At, 17.24).
Posteriormente, escrevendo aos Romanos, os instrui: “Pois não há distin-
ção entre judeu e grego, uma vez que o mesmo é o Senhor (ku/rioj) de todos,
rico para com todos os que o invocam” (Rm, 10.12).
5) É o Senhor misericordioso
A situação do homem sem Deus é deplorável, totalmente dominado pelo pecado.
Deus, no entanto, nos trata com misericórdia, não debitando em nossa conta
a nossa dívida, a qual jamais poderíamos pagar, antes, a aumentaríamos sem-
pre751. O nosso único recurso, portanto, é recorrer à misericórdia gratuita de
Deus752. Somos carentes da Sua misericórdia, daí a necessidade de buscarmos a
Deus diante do trono da sua misericórdia, para que possamos ter a bênção da
bem-aventurança que começa por nossa reconciliação com Ele. Somente assim
encontraremos o antídoto para as nossas misérias espirituais.
Misericórdia merecida, portanto, é uma contradição de termos753. Misericórdia
sempre pressupõe a indignidade daquele que a recebe. Enquanto a graça ressalta
751 CALVINO, J. O Livro dos Salmos. São Paulo: Paracletos, 1999, v. 1, (Sl 32.1), p. 39.
752 CALVINO, J. O Livro dos Salmos. São Paulo: Paracletos, 1999, v. 1, (Sl 6.4), p. 128-129.
753 PINK, A. W. Deus é Soberano. Atibaia, SP.: FIEL, 1977, p. 23.
6) É o Senhor Bondoso
O Senhorio de Cristo se manifesta, também, em atos de bondade para conosco
(Rm, 10.12) ainda que nem sempre percebamos isso por nos acostumarmos com a
Sua bondade em nossa rotina cotidiana. Contrariamente, por vezes, costumamos
pensar que o mundo, a vida e todas as demais coisas funcionam naturalmente,
não como uma manifestação da bondade do Senhor para com todos. Deus nos
governa paternalmente com espírito de mansidão e benignidade754.
Pedro estimula a igreja a ter maior comunhão com Deus, desenvolvendo a
sua salvação em santificação. Fazendo eco ao Salmo 34.8, testa, então, a sua expe-
riência com Deus: “Se é que já tendes a experiência de que o Senhor (ku/rioj) é
bondoso” (1Pe, 2.3).
754 CALVINO, J. O Livro dos Salmos. São Paulo: Paracletos, 1999, v. 1, (Sl 8.2), p. 163.
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capacidade, suplica ao seu senhor pedindo-lhe “paciência”: “26Então, o servo,
prostrando-se reverente, rogou: Sê paciente (makroqume/w) comigo, e tudo te
pagarei. 27E o senhor (ku/rioj) daquele servo, compadecendo-se, mandou-o
embora e perdoou-lhe a dívida” (Mt 18.26-27).
Em nossa salvação, vemos a longanimidade de Jesus Cristo. Paulo, antigo
Saulo, experimentou de modo intenso a paciência de Deus para com Ele. Dá o
seu testemunho: “Mas, por esta mesma razão, me foi concedida misericórdia,
para que, em mim, o principal, evidenciasse Jesus Cristo a sua completa longa-
nimidade (makroqumi/a), e servisse eu de modelo a quantos hão de crer nele
para a vida eterna” (1Tm, 1.16)755.
Do mesmo modo, Pedro escreve: “(...) Tende por salvação a longanimidade
(makroqumi/a) de nosso Senhor (ku/rioj), como igualmente o nosso amado
irmão Paulo vos escreveu, segundo a sabedoria que lhe foi dada” (2Pe, 3.15).
Notemos que a longanimidade de Deus não significa indecisão, antes, dentro
do Seu propósito, ela é exercitada a fim de que todos aqueles que constituem o
Seu povo escolhido se arrependam de seus pecados e sejam salvos (2Pe, 3.9,15).
755 “Paulo é um exemplo vivo da paciência divina, uma prova da misericórdia de Deus para com os
pecadores” (FALKENROTH, U.; BROWN, C. Paciência: In: BROWN, C. ed. ger. O Novo Dicionário
Internacional de Teologia do Novo Testamento. São Paulo: Vida Nova, 1981-1983, v. 3, p. 376).
8
Já agora a coroa da justiça me está guardada, a qual o Senhor (ku/rioj),
reto (di/kaioj) juiz, me dará naquele Dia; e não somente a mim, mas
também a todos quantos amam a sua vinda. (....) 14Alexandre, o latoeiro,
causou-me muitos males; o Senhor (ku/rioj) lhe dará a paga segundo
as suas obras” (2Tm, 4.8,14/Jo, 5.26-27).
As nossas causas não são indiferentes a Deus. Os nossos juízos e os juízos dos
outros a nosso respeito não são coisas de somenos importância aos olhos do
Senhor que percebe as coisas como de fato são, visto que tudo Ele tem diante de
si, já que tudo que existe, existe por sua preservação.
Comentado o Salmo 62, Calvino (1509-1564) escreve:
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O Deus que governa o mundo por sua providência o julgará com justi-
ça. A expectativa disso, devidamente apreciada, terá um feliz efeito na
disposição de nossa mente, acalmando a impaciência e restringindo
qualquer disposição ao ressentimento e retaliação em face de nossas
injúrias756.
O juízo de Cristo será íntegro devido à Sua própria natureza e, também, devido à
sua onisciência: nada ficará oculto diante do Seu escrutínio (Mt, 10.26; Lc, 8.17;
Rm, 2.16; 1Co 4.5). Todavia, como acentua Bavinck (1965, p. 86 ).
(...) quando Cristo começar a julgar, nós sabemos que tipo de julga-
mento será esse: misericórdia e Graça e ao mesmo tempo perfeita justi-
ça. Ele conhece a natureza do homem e tudo o que há nela; Ele conhece
os lugares secretos do coração e pode detectar nele todo mal e corrup-
ção, mas Ele vê também o menor começo de fé e de amor que estiver
presente ali. Ele não julga de acordo com a aparência, nem de acordo
com pessoas, mas de acordo com a verdade e com a justiça757.
756 CALVINO, J. O Livro dos Salmos. São Paulo: Paracletos, 1999, v. 2, (Sl 62.12), p. 584.
757 Consultar referência.
9) É o Senhor da Glória
A maioria das pessoas que conviveu com Jesus Cristo durante o Seu ministério
terreno não conseguia perceber que aquele homem tão doce e acessível, amado e
odiado, reverenciado e temido era o próprio Deus encarnado. O Deus, o Senhor
da glória758. Paulo escreve aos coríntios mostrando a nulidade do conhecimento
humano diante da sublimidade de Cristo, o Senhor: “Sabedoria essa que nenhum
dos poderosos deste século conheceu; porque, se a tivessem conhecido, jamais
teriam crucificado o Senhor (ku/rioj) da glória” (1Co, 2.8/Tg, 2.1/Jo, 17.1-5)
Ele fez-se pobre por amor do Seu povo: “Pois conheceis a graça de nosso
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Senhor (ku/rioj) Jesus Cristo, que, sendo rico (plou/sioj), se fez pobre por amor
de vós, para que, pela sua pobreza, vos tornásseis ricos (ploute\w)” (2Co, 8.9).
O Senhorio de Cristo sobre o Seu povo é um Senhorio Pastoral. Ele não ape-
nas nos governa, mas também nos protege, ensina, disciplina, sustenta etc. Por
isso, o escritor da Carta aos Hebreus orou em favor dos crentes aos quais se des-
tinava: “Ora, o Deus da paz, que tornou a trazer dentre os mortos a Jesus nosso
Senhor (ku/rioj), o grande Pastor das ovelhas (...)” (Hb, 13.20. Veja, também,
Jo 10.11; 1Pe 5.4).
JESUS E A RESSURREIÇÃO
a quem escolhera (At 15.40). O seu primeiro propósito era confirmar a fé dos
irmãos das regiões por onde passara com Barnabé (At 15.36). Após percorrer
toda a região, Paulo desejava ir para a Bitínia, porém, o Espírito de Deus não o
permitiu (At 16.7). Depois, ele teve a visão “na qual um varão macedônio estava
em pé e lhe rogava, dizendo: Passa a Macedônia, e ajuda-nos” (At, 16.9). Ele
concluiu corretamente que Deus o havia chamado (proskale/omai)760 para
aquela região (At 16.10): assim o Evangelho chegou à Europa, sendo o portão
de entrada a cidade de Filipos.
Paulo chegou a Filipos, por volta do ano 49, em companhia de Silas, Timóteo e
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Lucas (At, 16.1-3,10-12; 1Ts, 1.1/2.2). Assim, pôde pregar naquela colônia romana,
evangelizando a Lídia, a vendedora de púrpura e a todos os seus familiares (At,
16.14,15). Poucos judeus residiam na cidade. O “lugar de oração” (At, 16.13)
indica a presença de alguns judeus, porém, em número inferior a dez homens,
quantidade mínima considerada para se formar uma sinagoga. De acordo com
a lei da Mishná, era permitido que dez homens judeus formassem, em qualquer
lugar, uma sinagoga761. Havia cidades, inclusive, que possuíam várias. Estima-se
que em Jerusalém houvesse cerca de 500 delas762.
Paulo expulsou o demônio de uma jovem adivinhadora, dando prejuízo aos
seus senhores; ele foi acusado, açoitado e preso (At, 16.16-24). Na prisão, teste-
munhou sua fé aos outros companheiros de cela; teve também a oportunidade
de pregar ao carcereiro que foi convertido juntamente com os seus familiares
(At, 16.25-34).
Quando as autoridades descobriram que Paulo era cidadão romano, reco-
nheceram que transgrediram a lei, visto que o haviam prendido e açoitado sem
que houvesse um processo formal contra ele (At, 16.35-38).
Libertos, Paulo e Silas vão embora; Lucas deve ter permanecido em Filipos
(Compare: At, 16.10,12,13/At, 16.40; 17.1). Quando Paulo e Silas partem, ao
que parece, a Igreja ficou se reunindo na casa de Lídia (At, 16.40). Vemos que,
760 A palavra tem o sentido de “convocar”. Dentre outros textos, ela ocorre, também, em At 13.2,7.
761 Consultar referência.
762 HALE, B. B. Introdução ao Estudo do Novo Testamento. Rio de Janeiro: JUERP, 1983, p. 17. Variando
as estimativas entre 394 e 480 (Cf. SCHAFF, P. History of the Christian Church. Peabody, Massachusetts:
Hendrickson Publishers, 1996, v. I, p. 457).
Jesus e a Ressurreição
V
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Outros judeus, no entanto, movidos de inveja, subornaram homens da malan-
dragem (a)gorai=oj = “vagabundo”, “desordeiro”, “homens de mercado”) (At,
17.5) e juntos alvoroçaram a cidade, movendo uma perseguição contra Paulo e
Silas, invadindo, inclusive, a casa de um certo Jasom que os havia hospedado.
A palavra ou, mais propriamente, o grito desses homens que conclamava o
povo à perseguição era: “Estes que têm transtornado o mundo chegaram também
aqui” (At, 17.6). A acusação que causou um reboliço no povo e nas autorida-
des era: “Todos estes procedem contra o decreto de César, afirmando ser Jesus
outro rei” (At, 17.7).
Jasom e outros irmãos foram presos e, posteriormente, libertos após pagarem
a fiança estipulada (At, 17.9); fiança que pode ter sido apenas um compromisso
de não mais hospedar tais homens e promover a sua partida da cidade.
À noite, irmãos cuidadosos promoveram a saída de Paulo e Silas de Tessalônica,
indo então para Beréia (80 km), onde continuaram o seu trabalho (At, 17.10).
Notemos que a afirmação de que “Estes que têm transtornado (a)nastato/w
= “sublevar”, “incitar”, “revolucionar”)763 o mundo chegaram também aqui” (At
17.6), ou, mais literalmente: “estes que têm causado problemas em todo lugar”
indica, por um lado, que a fama de seu trabalho era evidente, causando grande
transformação; por outro lado, revela, também, que a sua mensagem era olhada
com desconfiança, especialmente por parte dos judeus.
Aqui, aprendemos, de passagem, quão revolucionário é o Evangelho; ele afeta
a nossa mente e coração, transformando a nossa maneira de ver, sentir e agir no
não detalhe, é provável que Silas e Timóteo vieram a Atenas e, em seguida, Paulo
os enviou a Tessalônica para exortar, consolar e fortalecer os crentes tessaloni-
censes. Posteriormente, eles se encontraram em Corinto. O relatório apresentado
trouxe grande conforto a Paulo. A igreja, apesar de jovem e perseguida, perma-
necia firme no Senhor (At, 18.1-5/1Ts, 3.1-10).
Votemos a Atenas. Ali, Paulo, enquanto aguardava seus companheiros, ao
invés de simplesmente descansar ou procurar conhecer aquela cidade magní-
fica de que tanto ouvira falar desde a sua infância, ficou indignado, irritado com
a intensa idolatria praticada766; a cidade estava sufocada, totalmente dominada
por sua fé ingênua e politicamente correta em diversos deuses (At 17.16)767. No
entanto, a sua fé não tira férias nem se amedronta, antes, se revela em atos con-
cretos: começou, então, a pregar o Evangelho; primeiramente, entre os judeus;
em seguida, a todos na praça e, também, debatia com os filósofos epicureus e
estoicos (At 17.17-18). Aqui, chegamos a nosso ponto: a mensagem de Paulo.
Lucas relata que ele “Pregava (eu)aggeli/zomai) a Jesus e a ressurreição” (At,
17.18). Analisemos, agora, alguns aspectos da Ressurreição de Cristo como con-
teúdo da pregação da igreja cristã.
764 “A experiência cristã que acontece apenas no coração, e que não renovou nossa mente, é inadequada
e, de acordo com Jesus, profundamente falha. Falta-lhe o arrependimento e seu amor é incompleto”
(BARCLAY, O. Mente Cristã. São Paulo: Cultura Cristã, 2010, p. 16).
765 Consultar referência.
766 “Não é preciso supor que Paulo fosse cego à beleza deles (estátuas pagãs primorosamente
confeccionadas). Mas ele não se impressionava com uma beleza que não honrasse Deus o Pai e o Senhor
Jesus Cristo. Pelo contrário, ele ficou oprimido pelo emprego idólatra da criatividade artística dada por
Deus aos atenienses. Foi isso que Paulo viu: uma cidade submersa nos seus ídolos” (STOTT, J. R. W. A
Mensagem de Atos: até os confins da Terra. São Paulo: ABU Editora, 1994, (At 17.16-34), p. 313).
767 A palavra traduzida por “revoltava” (parocu/nw) tem o sentido também de ira, irritação (*At 17.16; 1Co
13.5).
Jesus e a Ressurreição
V
A morte de Cristo, que parecia uma vitória de satanás sobre o Reinado do Senhor,
não o foi, antes, foi a realização do propósito de Deus. A ressurreição de Cristo
é o coroamento do Seu Ministério terreno, assinalando a sua vitória definitiva.
Ela, portanto, é repleta de significado para o Ministério de Cristo e, consequen-
temente, para a vida da Igreja, que é o Seu Corpo. Sem a ressurreição, a obra de
Cristo seria nula, a Igreja não existiria, não haveria salvação, estaríamos todos
perdidos para sempre! “Mas de fato Cristo ressuscitou dentre os mortos(...)”
(1Co, 15.20); esta é a fé da Igreja; é nossa certeza. Estudemos, agora, esse tema
de tão grande importância.
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
Paulo, pregando em Antioquia, demonstra essa realidade citando o Salmo 2:
32
Nós vos anunciamos o evangelho da promessa feita a nossos pais,
33
como Deus a cumpriu plenamente a nós, seus filhos, ressuscitando a
Jesus, como também está escrito no Salmo segundo: Tu és meu Filho,
eu, hoje, te gerei. 34E, que Deus o ressuscitou dentre os mortos para
que jamais voltasse à corrupção, desta maneira o disse: E cumprirei a
vosso favor as santas e fiéis promessas feitas a Davi. 35Por isso, também
diz em outro Salmo: Não permitirás que o teu Santo veja corrupção.
36
Porque, na verdade, tendo Davi servido à sua própria geração, con-
forme o desígnio de Deus, adormeceu, foi para junto de seus pais e viu
corrupção. 37Porém aquele a quem Deus ressuscitou não viu corrupção
(At, 13.32-37).
772 NYGREN, A. Commentary on Romans. 5. ed. Philadelphia: Fortress Press, 1980, p. 51. “Por meio
de sua gloriosa ressurreição, sua investidura com poder não só foi realçada, mas também começou a
resplandecer em toda sua glória” (HENDRIKSEN, W. Romanos. São Paulo: Cultura Cristã, 2001, (Rm
1.4), p. 58-59).
773 Consultar referência.
774 “A fé cristã primitiva reinterpretou o Antigo Testamento à luz dos novos eventos revelatórios de Cristo.
Isto não equivale, necessariamente, a que haja uma relação matemática – uma por uma – entre a profecia
e seu cumprimento. Significa que a corrente inteira da história e a profecia do Antigo Testamento se
cumprem em Cristo” (LADD, G. E. Creo en la Resurreccion de Jesus. Miami, Florida: Editorial Caribe,
1977, p. 142).
Jesus e a Ressurreição
V
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
• Oséias 6.2: “Depois de dois dias, nos revigorará; ao terceiro dia, nos levan-
tará, e viveremos diante dele”.
• Lucas 24.27; 44-46: “27E, começando por Moisés, discorrendo por todos
os Profetas, expunha-lhes o que a seu respeito constava em todas as
Escrituras. 44A seguir, Jesus lhes disse: São estas as palavras que eu vos
falei, estando ainda convosco: importava se cumprisse tudo o que de mim
está escrito na Lei de Moisés, nos Profetas e nos Salmos. 45Então, lhes
abriu o entendimento para compreenderem as Escrituras; 46e lhes disse:
Assim está escrito que o Cristo havia de padecer e ressuscitar dentre os
mortos no terceiro dia”.
• Atos 2.29-31: “29Irmãos, seja-me permitido dizer-vos claramente a res-
peito do patriarca Davi que ele morreu e foi sepultado, e o seu túmulo
permanece entre nós até hoje. 30Sendo, pois, profeta e sabendo que Deus
lhe havia jurado que um dos seus descendentes se assentaria no seu trono,
31
prevendo isto, referiu-se à ressurreição de Cristo, que nem foi deixado
na morte, nem o seu corpo experimentou corrupção”.
• Atos 13.32-37: “32Nós vos anunciamos o evangelho da promessa feita a
nossos pais, 33como Deus a cumpriu plenamente a nós, seus filhos, ressus-
citando a Jesus, como também está escrito no Salmo segundo: Tu és meu
Filho, eu, hoje, te gerei. 34E, que Deus o ressuscitou dentre os mortos para
que jamais voltasse à corrupção, desta maneira o disse: E cumprirei a vosso
favor as santas e fiéis promessas feitas a Davi. 35Por isso, também diz em
outro Salmo: Não permitirás que o teu Santo veja corrupção. 36Porque, na
verdade, tendo Davi servido à sua própria geração, conforme o desígnio
de Deus, adormeceu, foi para junto de seus pais e viu corrupção. 37Porém
aquele a quem Deus ressuscitou não viu corrupção”.
Jesus e a Ressurreição
V
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
mentos bíblicos que manifestam com clareza a realidade da ressurreição de Cristo.
O Túmulo Vazio
Mateus registra que um anjo do Senhor removeu a pedra (de cerca de duas tone-
ladas)775 que fechara o sepulcro de Jesus (Mt, 28.2-4); certamente, isso não foi
feito para que Jesus pudesse sair, visto que a matéria não servia de empecilho
para o corpo glorificado do Senhor ressurreto (Cf. Jo, 20.19,26); todavia isso foi
feito, segundo me parece, a fim de que, primeiramente, Maria Madalena e Maria,
mãe de Tiago e de José (Mt, 27.56,61; 28.1), pudessem constatar com os seus pró-
prios olhos o túmulo vazio (Lc, 24.1-3) e, posteriormente, também o fizessem
João e Pedro (Jo, 20.1-10). O túmulo continuou vazio como evidência concreta
da ausência do corpo de Jesus. Contudo o túmulo vazio pode ser explicado de
três formas: 1) Os discípulos de Jesus levaram o corpo; 2) Os inimigos de Jesus
levaram o corpo; ou 3) Ele realmente ressuscitou.
Analisemos rapidamente as possibilidades. Quanto à primeira, podemos
observar que não aconteceu, pois eles ficaram desanimados e desesperados com
a morte de Jesus, não esperando ressurreição alguma (Cf. Lc, 24.17-21;36,37);
mesmo que eles tentassem raptar o corpo de Jesus, isto seria impossível, visto
que havia uma escolta de sobreaviso guardando o túmulo (Cf. Mt, 27.62-66).
O mesmo é válido para a possibilidade dos inimigos de Jesus tentarem roubar
o seu corpo, também, por que eles fariam isso? Para dar uma pista errada aos
crédulos? Ora, se fosse assim, e o rapto tivesse ocorrido, quando os discípulos
775 MCDOWELL, J. As Evidências da Ressurreição de Cristo. São Paulo: Candeia, 1985, p. 77-78.
As Aparições de Jesus
O Senhor ressurreto apareceu durante quarenta dias (At, 1.3) a várias pessoas em
cerca de 13 ocasiões diferentes, dando prova evidente da Sua ressurreição. Paulo
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A Pregação Apostólica
A certeza e o significado da ressurreição de Cristo estavam tão nítidos na mente
e nos corações dos discípulos que todos os seus sermões tinham como clímax
histórico a ressurreição. A mensagem apostólica apontava para a vitória de
Deus sobre o pecado e a morte, por meio da ressurreição de Cristo. A pregação
apostólica se baseava nas Palavras e nos atos salvadores de Deus na História e a
ressurreição foi um fato histórico (ver: At, 1.22; 2.24; 3.15; 4.10,33. 5.30; 10.39-
41; 17.2,3,17,18; 26.23; 1Co, 15.12).
776 Ver também: Mt 28.9,16,17; Mc 16.9; Lc 24.13-15; 36-50; Jo 20.24-29; 21.1,14; At 2.32; 3.15.
Jesus e a Ressurreição
V
Outras Evidências
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a) A Existência da Igreja: a Igreja Cristã só pode ser explicada e compreendida
à luz da ressurreição de Cristo, porque, se Cristo não ressuscitou, é vã a nossa fé
(1Co, 15.14,17). Ladd (1985, p. 303), de modo enfático, afirma:
Não foi a esperança da continuidade da vida no além-túmulo, uma
confiança na supremacia de Deus sobre a morte ou a convicção da
imortalidade do espírito humano que deu origem à igreja e à mensa-
gem a ser proclamada. Foi a crença em um evento acontecido no tempo
e no espaço: Jesus de Nazaré ressuscitou dentre os mortos. Fé na ressur-
reição de Jesus é um fato histórico inevitável. Sem essa evidência não
haveria igreja777.
777 LADD, G. E. Teologia do Novo Testamento. Rio de Janeiro: JUERP, 1985, p. 303.
O Novo Testamento declara que a ressurreição de Cristo foi pelo poder do Trino
Deus; essas afirmações ora se referem simplesmente a Deus – denotando, assim,
o trabalho da Trindade –, ora se referem às pessoas distintamente. A ênfase, sem
dúvida, é para evidenciar a unidade da Trindade no mesmo propósito glorioso
e salvador.
Em alguns textos das Escrituras, encontramos essa obra de modo discriminado:
1. Poder do Pai (Rm, 6.4; Gl, 1.1; Ef, 1.17-20).
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Jesus e a Ressurreição
V
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nossa futura ressurreição. Cristo não voltou a morrer, nem voltaremos após a
ressurreição (Rm, 6.9).
Na ressurreição de Cristo, observamos alguns aspectos que tomados em con-
junto tornam-se misteriosos para nós.
779 Veja-se boa discussão sobre esse ponto em: GRUDEM, W. A. Teologia Sistemática. p. 510-513.
Significado Teológico
A ressurreição de Cristo revela alguns aspectos do caráter do Trino Deus:
1) O Poder de Deus: a ressurreição de Cristo se constitui no clímax da mani-
festação do Poder de Deus nessa Era (2Co, 13.4; Ef, 1.19,20; Cl 2.12; Fp, 3.10/At
2.24; 3.15; 4.10; 5.30; Rm, 10.9).
2) O Cumprimento das Escrituras: Deus é o Autor das Escrituras. Como
já vimos acima, a ressurreição de Cristo foi anunciada pelo Espírito por inter-
médio dos profetas. Caso Cristo não ressuscitasse, a Escritura teria falhado em
seu testemunho a respeito do Filho, o que é impossível (Jo, 5.39; 10.35). A res-
surreição manifesta-se como uma demonstração palpável de que Deus sempre
cumpre eficaz e completamente as Suas promessas (veja: Sl, 16.10; Is, 26.19; Os,
6.2/Lc, 24.44-46/At, 13.32-37).
3) O Cumprimento das Palavras de Cristo: Conforme já estudamos, Jesus
Cristo anunciou a Sua morte e ressurreição como fatos que se sucederiam. O
acontecimento da ressurreição vem confirmar a veracidade de Suas palavras (Cf.
Mt, 28.6-7; Mc, 14.27-28; 16.6,7,14; Lc, 24.6-8).
4) A Afirmação de Sua Filiação Divina: Jesus, em Seu ministério, reivindi-
cava para Si uma filiação única e especial de Deus, demonstrando isso de forma
distintiva no Seu relacionamento afetivo com o Pai (Cf. Mt, 11.27; Mc, 14.36; Jo,
20.17). Aquele que foi morto como maldito e odiado de Deus era, na realidade,
780 HODGE, C. Teologia Sistemática. p. 953. Veja: BAVINCK, H. Teologia Sistemática. p. 402-403.
Berkhof (p. 347) comenta: “Sua ressurreição (...) consistiu em que nele a natureza humana, o corpo e a
alma, foi restaurada à sua prístina força e perfeição e até mesmo elevada a um nível superior, enquanto
que o corpo e a alma foram reunidos num organismo vivo” (BERKHOF, L. Teologia Sistemática.).
Jesus e a Ressurreição
V
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ção consiste na declaração por parte do Pai – como representante da Trindade
– de que as demandas do Pacto foram cumpridas no seu aspecto sacrificial pelo
Filho, como representante do Seu povo Eleito; portanto, o Filho não deveria
permanecer morto. A ressurreição é o “amém” do Pai à obra expiatória do Filho
(2Co, 1.20). “Se, afinal, a obra expiatória de Cristo devia ser eficaz, tinha que
terminar, não na morte, mas na vida. Ademais, foi o selo do Pai aplicado à obra
consumada de Cristo, foi a declaração de que Ele a aceitou”781 (At, 2.22-24). Na
ressurreição, Jesus Cristo é publicamente coroado como Senhor! (BAVINCK,
2012, p. 404-405). “No Novo Testamento, a autoridade máxima legitimadora
para Jesus Cristo é o próprio Deus, vindicando e exaltando Jesus pela ressurrei-
ção e, com isso, retrospectivamente validando seu ministério”782.
7) O Triunfo de Deus: A ressurreição de Cristo assinala a vitória de Deus
sobre o pecado, a morte e Satanás. Pelo pecado, entrou a morte no mundo; a vitó-
ria sobre a morte deveria ser concretizada por meio de um homem que morresse
e ressuscitasse (Rm, 5.12; 1 Co, 15.21). Cristo venceu a todos por nós, a fim de
nos dar a vida eterna, a começar aqui, em liberdade (Jo, 10.10). Por isso, o pecado
já não mais nos domina (Rm, 6.14/Jo, 8.32-34); Satanás e seus demônios estão
sob o domínio de Cristo (Ef, 1.20-22/Hb, 2.14); a morte foi transformada, sig-
nificando, agora, não mais o fim, mas sim, o ingresso na eternidade (2Tm, 1.10).
781 BERKHOF, L. Teologia Sistemática. Campinas, SP.: Luz para o Caminho, 1990, p. 350.
782 Consultar referência.
Significado Soteriológico
A ressurreição de Cristo tem – como já se depreende – rico significado reden-
tor. Isso é o que veremos agora.
1) A Nossa Regeneração: pela regeneração, Deus infunde em nós uma nova
disposição que nos conduz, sob a influência do Espírito, em direção à vontade
de Deus, em uma santa e prazerosa obediência783. A ressurreição de Cristo é o
fundamento de nossa regeneração (1Pe, 1.3).
Quando Jesus ressurgiu dos mortos tinha uma nova qualidade de vida,
uma ‘vida ressurreta’ em um corpo e em um espírito humanos perfei-
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783 “A regeneração consiste na implantação do princípio da nova vida espiritual no homem, numa radical
mudança da disposição dominante da alma, que, sob a influência do Espírito Santo, dá nascimento a uma
vida que se move em direção a Deus” (BERKHOF, 1990, p. 470).
784 HENDRIKSEN, W. Romanos. São Paulo: Cultura Cristã, 2001, (Rm 4.23-25), p. 214.
Jesus e a Ressurreição
V
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para todos os que pela graça creem em Cristo.
4) O Sentido da nossa fé: a ressurreição de Cristo dá sentido a nossa fé. Se
Cristo não tivesse ressuscitado, a nossa fé, por mais intensa que fosse, estaria fun-
damentada numa mentira; por isso, tudo o que temos estudado seria nulo. Nesse
caso, a fé teria apenas valor como fé; seria fé na fé, não no fato histórico da res-
surreição. Todavia, conforme nos ensinam as Escrituras, o Senhor ressuscitou,
sendo esse fato o cerne da nossa fé (1Co, 15.14,17,20/Rm, 10.9,10). A fé bíblica
adquire significado a partir de seu alvo. A fé por si só não se autorreferenda.
Significado Vivencial
A ressurreição de Cristo é associada por Paulo a nossa responsabilidade de
viver diariamente na presença do Cristo vivo, frutificando para Deus. O nosso
785 STOTT, J. Ouça o Espírito, Ouça o Mundo. São Paulo: ABU Editora, 1997, p. 408-409.
velho homem morreu com Cristo e, por meio da Sua ressurreição, surgiu um
novo homem que se consagra inteiramente ao Seu Senhor. Assim, a santifica-
ção encontra a sua real possibilidade na ressurreição de Cristo, sendo esse fato
um estímulo constante a vivermos dignamente para Deus (ver: Rm, 6.4-14; 7.4).
O fato de morrermos e ressuscitarmos com Cristo traz, portanto, como
implicação fundamental a responsabilidade de viver a ética do reino nesta vida.
A nossa ressurreição com Cristo implica valores novos, celestiais, os quais devem
ser sempre considerados em nossos pensamentos, decisões e atitudes (Cl, 3.1-4/
Rm, 6.11-14). Após argumentar acerca da veracidade da morte e ressurreição de
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Cristo, Paulo exorta: “Portanto, meus amados irmãos, sede firmes, inabaláveis,
e sempre abundantes na obra do Senhor, sabendo que, no Senhor, o vosso tra-
balho não é vão” (1Co 15.58).
Significado Escatológico
A ressurreição de Cristo é o fundamento da esperança futura da nossa ressur-
reição (1Co, 15.19). Biblicamente, nós não podemos separar a ressurreição de
Cristo da nossa; ou aceitamos as duas ou as negamos; não podemos dissociá-
-las. Parece que era esse o problema de alguns membros da Igreja de Corinto.
Pelo que Paulo escreve, deixa entender que alguns irmãos aceitavam a ressur-
reição de Cristo, porém negavam a ressurreição dos crentes. Paulo argumenta
que negar a ressurreição futura dos crentes equivale a negar a historicidade da
ressurreição de Cristo (1Co, 15.12-19). O fato é que a ressurreição de Cristo dá
sentido a nossa esperança; a história da ressurreição de Cristo é o fundamento
e o prenúncio da nossa ressurreição futura (veja: Rm, 6.5; 8.11; 1Co, 6.14; 15.20;
2Co, 4.14). Cristo é as primícias daqueles que virão posteriormente por meio
dEle; em Cristo, temos o penhor do Espírito, a garantia da nossa ressurreição.
Essa é a nossa esperança e, para ela, fomos regenerados pela ressurreição de Jesus
Cristo (Cf. 1Pe, 1.3). “Crer na Ressurreição do Senhor de entre os mortos e em
sua Ascensão ao céu fortalece nossa fé com uma grande esperança”786.
O corpo de Cristo ressurreto é o modelo do corpo glorioso que teremos
na eternidade (Cf. Fp, 3.21; 1Jo, 3.2/1Co, 15.42-44, 50-56). “Assim como Ele
786 AGOSTINHO. A Doutrina Cristã. São Paulo: Paulinas, 1991, I.15.14, p. 63.
Jesus e a Ressurreição
V
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para a vida eterna (At, 26.23; 1Co, 15.20,23).
O Cristianismo é uma religião de ressurreição; a ressurreição é o ponto de
convergência da nossa fé; negar a veracidade histórica da ressurreição de Cristo
significa tirar toda a razão de ser, histórica e transcendente, do Cristianismo. Sem
a ressurreição de Cristo, é vã a nossa fé, vã a nossa pregação, vã a nossa espe-
rança, vã a nossa vida. A ressurreição de Cristo dá sentido a nossa vida e morte,
fé e esperança (1Co, 15.12-16,32). A conclusão da argumentação de Paulo é: “Se
Jesus não foi ressuscitado, os crentes não têm esperança da ressurreição e podem
apelar às filosofias hedonistas da vida”789.
A ressurreição de Cristo indica de forma definitiva a Sua filiação divina
(Rm, 1.4).
“A fé dos cristãos não é louvável porque eles creem no Cristo que morreu,
mas no Cristo que ressuscitou, pois também o pagão acredita que ele morreu e
te acusa, como de um crime, por ter acreditado em um morto. Que tens, por-
tanto, de louvável? Teres acreditado que Cristo ressuscitou e esperar que hás de
ressuscitar por Cristo. Nisso consiste uma fé louvável. ‘Se confessares com tua
boca que Jesus é Senhor e creres em teu coração que Deus o ressuscitou dentre
os mortos, serás salvo’ (Rm, 10.9). (...) Essa é a fé dos cristãos”790.
A certeza da presença do Cristo vivo em nosso meio deve ser um estímulo
a uma vida consagrada a Deus (Rm, 6.8-7.6).
O SACERDÓCIO DE CRISTO
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791 CALVINO, J. Se Deus fuera nuestro Adversario: In: Sermones Sobre Job, Jenison, Michigan: T.E.L.L.,
1988, Sermon nº 6, p. 79.
792 BERKHOF, L. Teologia Sistemática. Campinas, SP.: Luz para o Caminho, 1990, p. 358.
793 GESENIUS. Hebrew-Chaldee Lexicon to the Old Testament. 13. ed. Grand Rapids, Michigan:
Eerdmans, 1978, p. 385; BAEHR, J. Sacerdote. In: BROWN, C. ed. ger. O Novo Dicionário Internacional
de Teologia do Novo Testamento, Vol. IV, p. 287.
O Sacerdócio de Cristo
V
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DISTINÇÃO ENTRE O MINISTÉRIO PROFÉTICO E O MINISTÉRIO
SACERDOTAL
O profeta era um homem escolhido por Deus para ser o Seu porta-voz aos
homens; a sua fidelidade consistia em declarar aos homens a Palavra autêntica
de Deus. O Profeta não criava nem adaptava a mensagem; a ele competia trans-
miti-la como havia recebido (Ex, 4.30; Dt, 4.2,5). Portanto, o que se exige do
profeta é fidelidade796. Essa declaração dos desígnios de Deus envolvia a admo-
estação, a exortação, a repreensão e a apresentação das gloriosas promessas do
Senhor (Ex, 7.1; Nm, 12.6-8; Dt, 18.18; Jr, 1.4-10). O profeta é, de certo modo,
filho de seu tempo – sem dúvida, chamado e capacitado por Deus –, mas que
fala ao seu povo, estimulando, exortando e repreendendo, dentro de um locus
temporal e histórico, no qual o povo vive e atua797.
O Sacerdote era também escolhido por Deus para representar-se a si mesmo
(como parte integrante do povo) e aos homens diante de Deus, oferecendo sacri-
fícios, fazendo intercessão e abençoando o povo (Lv, 9.22; Hb, 5.1-4; 7.1,25,27/
Lv, 9.7). A sua função era mediadora entre Deus e os homens. Resumindo: “O
794 PAYNE, J. B. kãhan: In: R. HARRIS, L. ed. Theological Wordbook of the Old Testament. Chicago:
Moody Press, 1980, Vol. I, p. 431a.
795 PAYNE, J. B. The Theology of the Older Testament. Grand Rapids, Michigan: Zondervan Publishing
House, (c) 1961, p. 372.
796 Stott resume bem a tarefa do profeta: “A característica essencial do profeta não era prever o futuro nem
interpretar a atividade presente de Deus, mas falar as palavras de Deus” (STOTT, J. R. W. O Perfil do
Pregador. São Paulo: SEPAL, 1989, p. 12).
797 “O profeta é sempre produto do seu tempo, mesmo criticando-o e especialmente por isso, porque,
seja como for, é em relação ao seu tempo que ele se situa” (MAILLOT, A.; LELIÈVRE, A. Atualidade de
Miquéias: Um Grande “Profeta Menor”. São Paulo: Paulinas, 1980, p. 23).
profeta fala da parte de Deus ao povo; mas é o sacerdote que fala da parte do
povo a Deus”798.
A NECESSIDADE DO SACERDÓCIO
O Sacerdócio foi criado por Deus devido ao Seu beneplácito; à Sua bondade e amor
atuantes, que se manifestam como um ato voluntário e doador (Is, 53.10; Jo, 3.16;
Rm, 5.8; Gl ,1.4; Cl 1.19,20), considerando o pecado do homem que o distanciou de
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798 PAYNE, J. B. The Theology of the Older Testament. Chicago, Moody Press, 1980, p. 372.
O Sacerdócio de Cristo
V
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sacrifício perfeito que seria oferecido definitivamente (Hb, 5.9-10; 8.2,6,13;
9.11,23,24,28; 10.1; 13.11,12/Cl 2.16,17). Cristo, de fato, representou uma aliança
superior (Hb, 8.6; 9.11), cumprindo de forma muitíssimo mais elevada o que os
sacrifícios do AT se propunham a fazer. As ofertas feitas sob a Lei foram acei-
táveis ao Senhor, porque – conforme Ele mesmo as instituiu – prefiguravam a
oferta perfeita de Cristo799. Também, os sacrifícios eram auxílios que visavam
conduzir os homens à obediência e à piedade800.
No capítulo 8 de Hebreus, o escritor sagrado faz um resumo do Sacerdócio
de Cristo, dizendo:
Ora, o essencial (kefa/laion = “principal”) das cousas que temos dito
é que possuímos tal sumo sacerdote, que se assentou à destra do trono
na Majestade nos céus, como ministro do santuário do verdadeiro ta-
bernáculo que o Senhor erigiu, não o homem (Hb, 8.1-2).
Cristo ministra no verdadeiro tabernáculo (Hb, 8.2/9.24), aquele que não é cópia
de um modelo melhor; antes, é o eterno, estabelecido por Deus, é o tabernáculo
real (Hb, 8.2) (a)lhqino/j). O sacerdócio anterior, obviamente não era falso; ele
era apenas um sinal do verdadeiro representado por Jesus Cristo.
Resumindo, podemos dizer que Cristo como Sacerdote:
799 “Ele [escritor de Hebreus] novamente nos lembra que o juramento foi posterior à lei, para demonstrar
que Deus não se satisfez com o sacerdócio sob a lei, senão que sua vontade era que algo superior fosse
constituído. Nas instituições divinas, o que vem depois é sempre melhor do que o que vem antes, visando
a um estado superior, ou anula o que foi feito para ter validade por um período limitado” (CALVINO, J.
Exposição de Hebreus. São Paulo: Paracletos, 1997, (Hb 7.28), p.201).
800 CALVINO, J. O Livro dos Salmos. São Paulo: Paracletos, 1999, Vol. 2, (Sl 40.6), p. 226.
O Sacerdócio de Cristo
V
Jesus Cristo, em Seu Ministério terreno, cuidou de cada detalhe do Seu Ministério
com o sentimento adequado, correspondente à Sua grande responsabilidade.
Jesus tinha perfeita consciência das implicações da Sua Obra e, também, de que
a cruz era a sua rota obrigatória.
4. Obediente: (Hb, 5.8)
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perfeitamente Deus –, conforme crescia, amadurecia, tomando sobre si maio-
res responsabilidades, desenvolvendo a sua natureza humana.
Quanto mais velho ficava, tanto mais seus pais podiam exigir dele
obediência, e tanto mais seu Pai celestial podia-lhe atribuir tarefas na
força de sua natureza humana. Com cada tarefa cada vez mais difícil,
mesmo quando implicava algum sofrimento (como especifica Hb, 5.8),
aumentava a habilidade moral de Jesus, sua capacidade de obedecer
sob circunstâncias cada vez mais difíceis. Podemos dizer que essa ‘espi-
nha moral’ foi fortalecida por exercícios cada vez mais difíceis. Mas em
tudo isso ele jamais pecou. (GRUDEM, 1990, p. 439).
Como já vimos, a obediência de Cristo foi em favor do Seu povo; Ele viveu em cons-
tante harmonia com a vontade do Pai; o preço da obediência era o sofrimento; assim,
Ele foi batizado, submeteu-se às leis do povo, foi ultrajado, torturado, contado entre
os transgressores, morto e sepultado. O próprio Jesus diz: “A minha comida con-
siste em fazer a vontade daquele que me enviou, e realizar a sua obra” (Jo, 4.34). O
Seu alimento e alegria consistiram em realizar a obra do Pai (Vd. Is, 50.4-7; 53.4-7).
5. Sem Pecado: (Hb, 4.15/Hb, 5.1-3/Hb, 9.28; Lv, 9.7)
Se Cristo tivesse pecado, poderia ser sacerdote (Hb, 5.2); não poderia, contudo,
ser a oferta imaculada (1Pe, 1.18,19), nem o Seu sacrifício teria um valor eterno.
“Ele não carece de qualquer sacrifício, visto que Ele não foi maculado por qual-
quer nódoa do pecado. Seu sacrifício foi tal que, por si só, foi suficiente até ao
fim do mundo, visto que Ele ofereceu-se a Si mesmo”803.
porém, não pode modificar os seus termos. O desex Hesedh é a causa e o efeito
do Pacto; Deus fez o Pacto por misericórdia; Ele revela a Sua misericórdia de
acordo com o Pacto (1Rs, 8.23; Is, 55.3).
Devido ao Seu desex Hesedh, Deus voluntariamente elege o Seu povo, man-
tendo-Se fiel nessa relação independentemente da fidelidade circunstancial dos
Seus eleitos (Dt, 7.6-11; 2Sm, 2.6; Sl, 36.5; 57.3; 89.49; Is, 54.10; 55.3).
O desex Hesedh de Deus não é barato; Deus não age movido por um senti-
mento incontrolável e incoerente; antes, Deus encontra um justo caminho para
estabelecer uma relação sólida com o homem pecador. O fundamento dessa nova
relação é o próprio Cristo. Assim sendo, a santidade de Jesus Cristo se revela na
Sua determinação fiel ao cumprimento do Pacto da Graça (Jo, 17.4). No Antigo
Testamento, o hãsîd (fiel, piedoso) é aquele que pratica o desex hesedh806. (Vd.
Hb, 2.17; 4.15).
7. Inculpável: (Hb 7.26)807
Essa palavra foi usada na Septuaginta para descrever o caráter de Jó (Jó, 2.3; 8.20.
Vd., também: Sl, 25.21; Pv, 2.21; 8.5). Ela é aplicada ao homem que não foi pos-
suído pela maldade; em seus pensamentos e atos não há malícia.
O Sacerdócio de Cristo
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da nossa eleição eterna (Ef, 1.4)810.
9. Perfeito: (Hb, 7.28)811
Cristo, como sacerdote, cumpre perfeitamente o Seu objetivo; a Sua obra é sufi-
ciente para satisfazer as necessidades do Seu povo, dentro de um critério de
avaliação divino (Hb, 2.10; 5.9/7.19; 10.14). Por isso é que a Igreja no céu é descrita
como sendo a dos “espíritos dos justos aperfeiçoados” (teleio/w) (Hb, 12.23).
Jesus, o Sacerdote perfeito cumpre o Seu propósito aperfeiçoando o Seu povo.
A intercessão de Cristo não é feita por meio de evasivas, que procurasse olhar
a nossa “boa intenção” ou a nossa “inocência”, não, ela é objetivamente respal-
dada nos merecimentos de Cristo. Como bem expressou Calvino: “A intercessão
de Cristo é uma contínua aplicação de sua morte para nossa salvação”812. A
Jesus tem poder e, de fato salva a todos os que creem nEle como o único meio
de salvação. Como somente os eleitos creem, a salvação propiciada por Cristo é
suficiente e eficiente apenas para o Seu povo (Jo, 6.37,38,44,65; 8.43-47; 10.16,25-
29; 17.2,9,24; At, 13.48; Tt 1.1).
3. Caminho para o Pai: (Hb, 7.25/Jo, 14.6; 1Tm, 2.5)
813 “Não temos como medir esta intercessão pelo nosso critério carnal, pois não podemos pensar do
Intercessor como humilde suplicante diante do Pai, com os joelhos genuflexos e com as mãos estendidas.
Cristo contudo, com razão intercede por nós, visto que comparece continuamente diante do Pai, como
morto e ressurreto, que assume a posição de eterno intercessor, defendendo-nos com eficácia e vívida
oração para reconciliar-nos com o Pai e levá-lo a ouvir-nos com prontidão” (CALVINO, J. Exposição de
Romanos. São Paulo: Paracletos, 1997, (Rm 8.34), p. 304).
814 CALVINO, J. Exposição de Hebreus. São Paulo: Paracletos, 1997, (Hb 7.25), p. 198.
815 CALVINO, J. Exposição de Hebreus. São Paulo: Paracletos, 1997, (Hb 7.25), p. 197.
816 E)leh/mwn = “misericordioso”, “compassivo”.
817 Sumpaqe/w = “simpatizar com”, “compartilhar da experiência de alguém”.
O Sacerdócio de Cristo
V
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
A palavra era usada para se referir às tropas ou aos homens que iam adiante para
descrever o avanço do inimigo. Uma palavra que tem o mesmo sentido figurado
em nossa língua é “batedor”.
Jesus foi adiante de nós abrindo-nos definitivamente o caminho para o céu
– em comunhão com Deus –, preparando-nos lugar, sendo a Sua vitória a mani-
festação concreta de uma abundante colheita, resultante do Seu trabalho (Is,
53.11; Jo, 14.1-3; 17.24).
8. Representante: (Hb, 9.24)
Cristo comparece diante de Deus, face a face, como representante do Seu povo.
Ele é o nosso único Mediador (1Tm, 2.5).
9. Santificador: (Hb, 10.10,14; 13.11,12)
que Se ofereceu a Si mesmo por nós. “Os antigos sacerdotes eram em maior
número em razão de a morte interromper seu sacerdócio. Quanto a Cristo, não
há morte que o impeça de cumprir seu ofício. Por isso, Ele é o único e eterno
Sacerdote. Propósito distinto produz resultados distintos”822.
822 CALVINO, J. Exposição de Hebreus. São Paulo: Paracletos, 1997, (Hb 7.23), p. 197.
823 CALVINO, J. Exposição de Romanos. São Paulo: Paracletos, 1997, (Rm 12.1), p. 424.
O Sacerdócio de Cristo
V
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Fomos reconciliados definitivamente com Deus (Rm, 5.10,11; 2Co, 5.18-21).
Nossa salvação é o fruto do sacerdócio eterno, se porventura colher-
mos tal fruto pela fé, como devemos fazê-lo. Pois onde a morte ou mu-
dança se faz presente, aí buscaremos a salvação sem qualquer resultado.
Por isso, aqueles que aderem ao antigo sacerdócio jamais alcançarão a
salvação824.
824 CALVINO, J. Exposição de Hebreus. São Paulo: Paracletos, 1997, (Hb 7.25), p. 197.
Nós, como povo redimido por Cristo, considerando a Sua obra sacerdotal, deve-
mos estar atentos ao que a Bíblia requer de nós, como fruto do penoso trabalho
do nosso Salvador.
825 MOULE, C. F. D. As Origens do Novo Testamento. São Paulo: Paulinas, 1979, p. 45.
826 COSTA, H. M.P. O Culto Cristão. São Paulo, 1998.
O Sacerdócio de Cristo
V
A ascensão de Cristo é um fato que tem alta relevância para a fé cristã; a ascen-
são é uma decorrência natural da Sua ressurreição, se constituindo no selo do
cumprimento da Sua obra expiatória.
O Catecismo Maior de Westminster, respondendo à pergunta de n° 53,
“Como Cristo foi exaltado em sua ascensão?”, diz:
Cristo foi exaltado em sua ascensão em ter, depois de sua ressurreição,
aparecido algumas vezes aos apóstolos e conversado com eles, falando-
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-lhes das coisas pertencentes ao reino de Deus, impondo-lhes o dever
de pregar o Evangelho a todos os povos, e em subir aos mais altos céus,
no fim de quarenta dias, levando a nossa natureza, e, como nosso Ca-
beça, triunfando sobre os inimigos, para ali, à destra de Deus, receber
dons para os homens, elevar nossos afetos para lá e preparar-nos um
lugar, onde ele está e estará até à sua segunda vinda, no fim do mundo.
A NARRATIVA BÍBLICA
Após a ressurreição, Jesus Cristo apareceu aos Seus discípulos em ocasiões dife-
rentes, no período de quarenta dias (At, 1.3/1Co, 15.3-7). A ascensão deu-se
justamente após esses quarenta dias.
O episódio da ascensão é descrito por Marcos (Mc, 16.19-20) e Lucas (Lc,
24.50-53; At 1.9-12). Paulo e o escritor de Hebreus também mencionam o fato
(Ef, 1.20; 4.8-10; 1Tm, 3.16; Hb, 1.3; 4.14; 9.24). Os detalhes diferem, mas não
há contradições nas narrativas.
A essência das descrições feitas por Marcos e Lucas é que Jesus foi elevado
às alturas na presença dos Seus discípulos. Creio ser inútil e leviano discutirmos
a “velocidade” em que Jesus foi assunto aos céus ou o tempo gasto por Ele para
chegar ao Seu destino. Charles Erdman afirmou corretamente:
Não devemos, porém, pensar que Ele transitou por espaços infinitos e
agora está numa distância enorme, em alguma região remota. É que no
universo não existem ‘alturas’ nem ‘baixuras’. Só por simples conven-
ção de linguagem, aliás correta, é que dizemos ter Ele ‘ascendido’. É o
modo próprio de dizer que desapareceu das vistas humanas, afastou-se
de condições materiais, para penetrar nas celestiais e espirituais827.
Devemos ressaltar que de fato, Jesus partiu de um lugar para o outro828: Ele
veio da parte de Deus e retornou para Deus (Jo, 6.62) e, na ascensão, a natureza
humana de Cristo passou para “a plenitude da glória celeste e foi perfeitamente
adaptada à vida do céu”829.
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
Responsabilidade da Igreja
A ascensão denota a nossa grande responsabilidade de vivermos como o Corpo
de Cristo no mundo. A Igreja é o sinal da presença de Cristo no mundo, por
meio do Seu Espírito que em nós habita (1Co, 6.19; Gl, 4.6; Fp, 1.19). Por isso,
a Igreja, no calor do Espírito, proclama o Evangelho, tendo a responsabilidade
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de transmiti-lo a outros, como fiel despenseira da verdade (Mc, 16.19,20/1Co,
4.1,2). Uma parte fundamental da proclamação da Igreja consiste em viver dia-
riamente como Corpo de Cristo, guiado e alimentado pela cabeça que é Cristo
(Ef, 1.22,23; 5.23).
A Igreja é o testemunho da presença e da atuação de Deus entre os homens.
A Igreja é o reflexo da presença de Deus. Ela diz ao mundo, por meio de sua
realidade histórica e testemunho, que ainda há esperança de salvação. A Igreja,
como luz do mundo e sal da terra, constitui-se numa bênção inestimável para
toda a humanidade.
A Igreja, portanto, é a presença de Jesus Cristo por meio de seu povo,
em prol do mundo. Embora provisória, essa presença é real, humana e
histórica. Cristo age por meio da Igreja realizando sua obra e confir-
mando sua vitória. Nesse sentido, não há salvação fora da Igreja, desde
que esta se disponha a servir e glorificar Jesus Cristo (SENARCLENS,
1970, p. 357).
A Igreja como Corpo de Cristo vive para a Glória de Deus – que é o maior de
todos os privilégios que teremos, quer aqui, quer no céu (Jo, 17.24) – e como
meio para que os homens glorifiquem a Deus (Mt, 5.14-16; Fp, 2.15).
A Vitória do Filho
Os textos bíblicos referentes a Jesus Cristo como estando à direita de Deus, indi-
cam a Sua vitória, honra, poder e glória; por isso, Ele mesmo disse: “Ao vencedor,
dar-lhe-ei sentar-se comigo no meu trono, assim como também eu venci, e me sen-
tei com meu Pai no seu trono” (Ap, 3.21). O regresso de Jesus ao Pai evidencia a
realização completa de toda a obra a qual viera realizar831.
A ascensão do Filho ressalta o cumprimento de Sua missão, revelando o Seu
estado de Glória (Mc, 16.19; At, 2.32-36; 7.55; Cl, 3.1; 1 Tm, 3.16; Hb, 1.1-4) e
Poder (Ef, 1.20,21; 1Pe, 3.22).
Na realidade, Jesus Cristo retornou ao Seu estado anterior à encarnação,
quando Ele, espontaneamente renunciara à Glória e à dignidade divinas que
faziam parte do Seu Ser (2Co, 8.9; Fp, 2.5-11/Jo, 1.1-3; 17.1-5/Jo, 3.13; 6.62; 7.33;
16.5/Ef, 4.10). A Sua humilhação e a Sua exaltação não afetaram a essência da
Sua natureza Divina.
830 LLOYD-JONES, D. M. Estudos no Sermão do Monte. São Paulo: Fiel, 1984, p. 167-168.
831 Consultar referência.
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determinado momento histórico, no “estado de humilhação”, fazendo-se pobre
(2Co, 8.9), agora, após cumprir cabalmente a Sua obra sacrificial, volta, no
momento preciso, publicamente, no “estado de exaltação”, para Deus. A ascen-
são é uma das maiores evidências históricas da volta de Cristo ao Seu estado de
Glória (Jo, 17.5,24).
832 HENDRIKSEN, W. O Evangelho de João. São Paulo: Cultura Cristã, 2004, (Jo 1.14), p. 118.
833 Consultar referência.
recebidos (Jo, 14.2,3). A Sua ascensão indica que Ele garante para o Seu povo o
lugar eterno no céu, onde pessoalmente nos receberá (Jo, 14.3/1Ts, 4.17). Ele foi
o nosso precursor (Hb, 6.20). Jesus adentrou ao céu não apenas para Si mesmo,
mas para o Seu povo, proclamando o cumprimento de Sua obra redentora, tendo
como colheita todos os eleitos834. “O fato de que Jesus já ascendeu ao céu e atin-
giu o alvo que lhe havia sido estabelecido nos dá a grande segurança de que um
dia também iremos para lá” (GRUDEM, 1990, p. 519).
envio do Espírito era essencial, pois, enquanto Jesus só podia atuar nos discípu-
los por meio de ensinos externos e exemplos, o Espírito Santo poderia trabalhar
dentro deles (Jo 14.17)”837.
Como vimos, Cristo cumpriu perfeitamente as demandas da Lei e adqui-
riu todas as bênçãos que envolvem a salvação. A Obra do Espírito consiste em
aplicar os merecimentos de Cristo aos pecadores, capacitando-os a receberem a
Graça da salvação. Dessa forma, podemos dizer que o Ministério soteriológico
do Espírito se baseia nos feitos de Cristo e que o Ministério Sacrificial de Cristo
reclama a ação do Espírito (Jo, 7.39/Jo, 14.26; 16.13-14). A ascensão é que pro-
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picia essa transição.
O Regresso de Cristo
A ascensão ratificou o que Cristo dissera a respeito de ir para o Pai; Ele também
falou do Seu retorno glorioso para junto dos Seus. Ele foi assunto ao céu entre
nuvens e, da mesma forma, voltará sobre as nuvens com poder e glória (Mt,
24.30; Mc, 14.62; Lc, 21.27,28/Ap, 1.7).
Desde a ascensão de Cristo, a Igreja aguarda e apressa a Sua vinda (2Pe, 3.12)
e, em momento algum, deve-se esquecer da Sua presença real e confortadora
por meio do Seu Espírito que nos deu (Rm, 8.9; Gl, 4.6; Fp, 1.19). O Espírito em
nós revela as venturas futuras que, agora, apenas vislumbramos pela fé e que já
desfrutamos apenas embrionariamente. Quando Cristo regressar, teremos a ple-
nitude, inclusive, a plenitude do Espírito (Rm, 8.23/1Co, 15.44).
837 ERICKSON, M. J. Introdução à Teologia Sistemática. São Paulo: Vida Nova, 2015p. 315.
4. Já nesta vida, somos mais do que vencedores por meio de Cristo (Rm, 8.34-
37).
5. A intercessão de Cristo em nosso favor é eterna e eficaz; todavia os que são
de Cristo não se servem desse fato para dar ocasião ao pecado (1Jo, 2.1).
6. A Igreja deve estar preparada para se encontrar com o Seu Senhor.
Fonte: o autor.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Considerações Finais
1. Apoiado no texto da unidade V, podemos pensar que o debate acerca da dico-
tomia entre o Jesus histórico e o Cristo da fé nasce ao se comparar aquilo que a
Igreja falava a respeito do Cristo e aquilo que os evangelhos mostravam acerca
da pessoa de Jesus. Aos olhos de alguns teólogos, os dois discursos faziam com
que o Jesus histórico e o Cristo da fé da Igreja se mostrassem como personagens
diferentes. No intuito de encontrar quem era realmente o Jesus dos evangelhos
é que se desenvolvem, a partir do século XVIII, as buscas pelo Jesus histórico.
Pesquise a respeito da relação entre o Jesus histórico e o Cristo da Fé.
MATERIAL COMPLEMENTAR
Material Complementar
337
CONCLUSÃO
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
UNIDADE I
46. NASH, R.H. Questões Últimas da Vida: uma introdução à Filosofia, São Paulo:
Cultura Cristã, 2008, p. 14.
47. FERREIRA, F.; MYATT, A. Teologia Sistemática. São Paulo: Vida Nova, 2007, p.
3-30.
52. BRUNNER, E. Dogmática. São Paulo: Novo Século, 2004, v. 1, p. 117.
54. BARTH, K. Church Dogmatics. Edinburgh: T. & T. Clark, 1960, I/1, p. 306.
59. HENDRIKSEN, W. O Evangelho de João. São Paulo: Editora Cultura Cristã, 2004,
(Jo 14.9) p. 657.
66. COSTA, H. M. P. Raízes da Teologia Contemporânea. São Paulo: Editora Cultura
Cristã, 2004.
68. STRONG, A. H. Systematic Theology. p. 27; SPYKMAN, G. J. Teologia Reforma-
cional: Um Nuevo Paradigma para Hacer la Dogmática. Jenison, MI.: The Evangelical
Literature League, 1994, p. 5.
69. BERKHOF, L. Introduccion a la Teologia Sistematica, p. 53; BAVINCK, H. Dogmáti-
ca Reformada. São Paulo: Cultura Cristã, 2012, v. 1, p. 45-46.
70. FRAME, J. M. A doutrina do conhecimento de Deus. São Paulo: Cultura Cristã,
2010, p. 93-101.
71. COSTA, H. M. P. A Palavra e a Oração como Meios de Graça. In: Fides Reformata.
São Paulo: Centro Presbiteriano de Pós-Graduação Andrew Jumper, 5/2 (2000), 15-
48.
72. “Seria uma boa preparação treinar-se para o culto divino, pondo em prática de-
veres domésticos piedosos em relação a seus próprios familiares” (CALVINO, J. As
Pastorais. [1Tm 5.4], p. 131).
73. CALVIN, J. Commentaries of the Four Last Books of Moses. Grand Rapids,
Michigan: Baker Book House, (Calvin’s Commentaries, v. 2), 1996 (Reprinted), v. 1,
(Dt 12.32), p. 453.
75. Cf. CALVIN, J. Calvin’s Commentaries. Grand Rapids, Michigan: Baker Book
House Company, 1996 (Reprinted), v. II/1, (Dt 6.16), p. 422.
77. - COSTA, O. E. ¿Qué Significa Evangelizar Hoy? San José, Costa Rica: Publicacio-
nes INDEF., 1973, 3.442. p. 45.
79. GODFREY, W. R. A Reforma do Culto. In: BOICE, J. M. et al. eds. Reforma Hoje. São
Paulo: Editora Cultura Cristã, 1999, p. 155.
80. Veja, entre outros: LLOYD-JONES, D. M. As Insondáveis Riquezas de Cristo. p.
8, 85-86, 165, 254; LLOYD-JONES, D. M. O Combate Cristão. São Paulo: Publica-
ções Evangélicas Selecionadas, 1991, p. 101-103,127; LLOYD-JONES, D. M. Deus o
Pai, Deus o Filho. São Paulo: Publicações Evangélicas Selecionadas, 1997 (Grandes
Doutrinas Bíblicas, v. 1), p. 393.
ANEXOS
UNIDADE II
UNIDADE III
330. CAMPOS, H. C. de. O Ser de Deus e os seus Atributos. 1º ed. São Paulo: Editora
Cultura Cristã, 1999. p. 123-125.
331. MCGRATH, E. A. Teologia Sistemática, histórica e filosófica: uma introdução
à teologia cristã. 1º Ed. São Paulo: Shedd Publicações, 2005. p. 376.
332. LEIBNIZ, G. W.. Novos Ensaios. São Paulo: Abril Cultural, (Os Pensadores, Vol.
XIX), 1974, III.1. § 1, p. 167).
333. CALVINO, J. As Institutas. I.13.3. Consulte também: STRONG, A. H. Teologia
Sistemática. Campinas: Editora Hagnos, 2003, Vol. 1, p. 491. Consulte também: PIE-
TERS, A. Fundamentos da Doutrina Cristã. São Paulo: Vida Nova, 1979, p. 179.
334. CALVINO, J. As Institutas, I.13.6.
335. CALVINO, J. As Institutas, I.13.19.
336. BERKHOF, L. Teologia Sistemática. 1º Ed. Campinas: Editora Cultura Cristã. Luz
para o Caminho (autorização), 1990, p. 89. Consulte também: LANGSTON, A. B. Es-
boços de Teologia Sistemática. 7º Ed. Rio de Janeiro: JUERP, 1983, p. 119ss.
337. MCGRATH, E. A. Teologia Sistemática, histórica e filosófica: uma introdução
à teologia cristã. 1º Ed. São Paulo: Shedd Publicações, 2005.
338. BERKHOF, L. Teologia Sistemática. 1º Ed. Campinas: Editora Cultura Cristã. Luz
para o Caminho (autorização), 1990, p. 91.
339. CALVINO, JOÃO. As Institutas da Religião Cristã: edição especial com notas
para estudo e pesquisa, São Paulo: Cultura Cristã, 2006, Vol. 3, (III.8.1), p. 38). Consulte
também: CALVINO, JOÃO. Romano. 2º Ed. São Paulo: Parakletos, 2001, (Rm 11.33),
p. 426-427.
340. CALVINO, JOÃO. As Institutas – Edição Clássica. São Paulo: Editora Cultura Cristã,
vol.1, 2, 3 e 4, 1985.
341. As palavras gregas correspondentes são: o(/roj = “termo”, “limite” e o(rismo/j =
“delimitação”, “acordo”, “tratado”.
342. OBREGÓN, E. D. Lógica. 4º Ed. Santa Fé/Argentina: Libreria y Editorial Castellví,
(1951), p. 89 e 90.
343. LIARD, L. Lógica. 9º Ed. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1979, p. 25.
344. CONDILLAC, É. B. de. Lógica ou Os Primeiros Desenvolvimentos da Arte de
Pensar. São Paulo: Abril Cultural, (Os Pensadores, Vol. 27), 1973, p. 121.
345. ARISTÓTELES. Metafísica. III, 2, 996 b 30; IV,2,1005 b 24. Cf. Princípio de Contra-
dição: In: N. Abbagnano, Dicionário de Filosofia, 2º Ed. São Paulo: Mestre Jou, 1982,
p. 188b.
346. ESPINOSA, B. Ética. São Paulo: Abril Cultural, (Os Pensadores, Vol. XVII), 1973,
I.8. Escólio 2, p. 91.
ANEXOS
379. MILÃO, A. de. Explicação do Símbolo. São Paulo: Paulus, 1996, 2. p. 23.
380. ROMA, H. de. Tradição Apostólica. Petrópolis, RJ.: Vozes, 1981, § 44. p. 51.
381. ROMA, H. de. Tradição Apostólica. § 46, p. 51-52; Didaquê. São Paulo: Impren-
sa Metodista, 1957, VII.1. p. 70.
382. MCGRATH, E. A. Teologia Sistemática, histórica e filosófica: uma introdução
à teologia cristã, São Paulo: Shedd Publicações, 2005, p. 54.
383. R.P.C. Hanson, Confissões e Símbolos de Fé: In: Ângelo Di Berardino,
org. Dicionário Patrístico e de Antiguidades Cristãs, Petrópolis, RJ./São Paulo:
Vozes/Paulinas, 2002, p. 322b.
384. HANSON, R.P.C. Confissões e Símbolos de Fé: In: Ângelo Di Berardino, org.
Dicionário Patrístico e de Antiguidades Cristãs, Petrópolis, RJ./São Paulo: Vozes/Pau-
linas, 2002, p. 322b.
385. KELLY, J.N.D. Primitivos Credos Cristianos. Salamanca: Secretariado Trinitario,
1980, p. 125. Consulte também: HALE, B. D. Introdução ao Estudo do Novo Testa-
mento. Rio de Janeiro: JUERP, 1983, p. 299.
386. BAVINCK, H. Dogmática Reformada. São Paulo: Cultura Cristã, 2012, Vol. 2, p.
268.
387. STRONG, A. H. Teologia Sistemática. São Paulo: Editora Hagnos, 2003, Vol. 1,
p. 472-479.
388. HOEKEMA, A. A. Criados à Imagem de Deus. São Paulo, Cultura Cristã, 1999,
p. 24.
390. BAVINCK, H. Dogmática Reformada. São Paulo: Cultura Cristã, 2012, Vol. 1, p.
329; Vol. 2, p. 269-271. Consulte também: CALVINO, J. Exposição de 2 Corín-
tios. São Paulo: Paracletos, 1995, (2Co 13.13), p. 271.
391. CALVINO, J. Exposição de 2 Coríntios. São Paulo: Paracletos, 1995,
(2Co 13.13), p. 271.
392. COSTA, H. M. P. A Pessoa e Obra do Espírito Santo. São Paulo: 2006, p. 65ss.
Consulte também: PINK, A.W. Os Atributos de Deus. São Paulo: Publicações Evan-
gélicas Selecionadas, 1985, p. 74.
393. PINK, A.W. Os Atributos de Deus. São Paulo: Publicações Evangélicas Selecio-
nadas, 1985, p. 74.
394. MCGRATH, E. A. Teologia Sistemática, histórica e filosófica: uma introdução
à teologia cristã, São Paulo: Shedd Publicações, 2005, p. 54.
395. FERGUSON, S. B. O Espírito Santo. 2000. p. 54.
359
ANEXOS
396. KUYPER, A. The Work of the Holy Spirit. Chattanooga: AMG Publishers, 1995,
p. 18-22. Consulte também: KUIPER, R. B. Evangelização Teocêntrica. São Paulo:
Publicações Evangélicas Selecionadas, 1976, p. 7-14. Consulte também: KUIPER, R.
B. El Cuerpo Glorioso de Cristo: Grand Rapids, Michigan: SLC., 1985, p. 169-175.
Consulte também: PINK, A.W. Deus é Soberano. São Paulo: Fiel, 1977, p. 49ss., espe-
cialmente, p. 75-76.
397. SPURGEON, C.H. Sermões Sobre a Salvação. São Paulo: Publicações Evan-
gélicas Selecionadas, 1992, p. 45. Consulte também: LLOYD-JONES, D. M. Vida No
Espírito: No Casamento, no Lar e no Trabalho. São Paulo: Publicações Evangélicas
Selecionadas, 1991, (Ef 5.27), p. 137). Consulte também: MURRAY, J. Redenção: Con-
sumada e Aplicada. São Paulo: Editora Cultura Cristã, 1993, p. 98. Consulte também:
Kuiper, R. B. El Cuerpo Glorioso de Cristo. Michigan: Subcomision Literatura Cris-
tiana de la Iglesia Cristiana Reformada, 1985, p. 169ss; 177ss. Consulte também:
SPURGEON, C.H. Sermões Sobre a Salvação. São Paulo: Publicações Evangélicas
Selecionadas, 1992, p. 12ss.
398. BAVINCK, H. Dogmática Reformada. São Paulo: Cultura Cristã, 2012, Vol. 4, p.
221.
399. CALVINO, J. As Institutas, III.1.1.
400. CALVINO, J. Sermones sobre la obra salvadora de Cristo. T. E. L. L. Jenison, Mi.
EUA, 1988,“Sermon nº 2”, p. 23.
401. MURRAY, J. Redenção: Consumada e Aplicada. São Paulo: Cultura Cristã,
2010, p. 19.
402. Catecismo de Genebra, (1541/2), Perg. 91. Consulte também: COSTA, H. M. P. A
Graça de Deus: Comum ou Exclusiva? São Paulo: 2000.
403. GRAHAM, B. Por que Lausanne?: In: A Missão da Igreja no Mundo de Hoje, São
Paulo/Belo Horizonte, MG.: ABU/Visão Mundial, 1982, p. 30. Consulte também: PA-
CKER, J. I. Evangelização e Soberania de Deus. 2º Ed. São Paulo: Vida Nova, 1990,
p. 22.
404. BURROUGHS, J. Aprendendo a estar contente. São Paulo: Publicações Evan-
gélicas Selecionadas, 1990, p. 28.
405. CALVINO, J. Institución, III. 20.34. Consulte também: CALVINO, J. Exposição de
Romanos. São Paulo: Paracletos, 1997, (Rm 8.26), p. 291). Consulte também: CALVI-
NO, J. O Catecismo de Genebra. Perg. 254.
406. CALVINO, J. As Institutas da Religião Cristã: edição especial com notas para
estudo e pesquisa. Vol. 3, (III.9), 1985, p. 95.
407. CALVINO, J. Catecismo de Genebra. Perg. 245.
ANEXOS
UNIDADE IV
416. VEITH JR., G. E. De Todo o teu entendimento. São Paulo: Cultura Cristã,
2006, p. 123.
418. CALVINO, J. Exposição de 2 Coríntios. São Paulo: Paracletos, 1995, (2Co 1.8),
p. 22.
419. PINK, A. W. Deus é Soberano. Atibaia/SP: Editora Fiel, 1977, p. 19.
420. MCGRATH, A. E. Paixão pela Verdade: a coerência intelectual do Evangelicalis-
mo, São Paulo: Shedd Publicações, 2007, p. 32-35.
425. Ver o sermão de Spurgeon sobre Mt 28.15 citado por PINK, A. W. Os Atributos
de Deus. São Paulo: Publicações Evangélicas Selecionadas, 1985, p. 32-33.
426. MACARTHUR JR., J. Abaixo a Ansiedade. São Paulo: Cultura Cristã, 2001, p. 30.
427. FRAME, J. M. A Doutrina do conhecimento de Deus. São Paulo: Cultura Cristã,
2010, p. 56.
429. GEISLER, N.; BOCCHINO, P. Fundamentos Inabaláveis: resposta aos maiores
questionamentos contemporâneos sobre a fé cristã. São Paulo: Vida Nova, 2003, p.
50.
430. HERMISTEN, M. P. C. Eu Creio. São Paulo: Paracletos, 2002, p. 104.
431. SPURGEON, C. H. Sermões Sobre a Salvação. São Paulo: Publicações Evangéli-
cas Selecionadas, 1992, p. 42-43.
432. BAVINCK, H. Teologia Sistemática. Santa Bárbara d’Oeste/SP: SOCEP, 2001, p.
479-512.
361
ANEXOS
466. HOBBES, T. In: LEBRUN, G. O Que é Poder? 3. ed. São Paulo: Brasiliense, 1981,
p. 28. HOBBES, T. O Leviatã. II.xviii. São Paulo: Abril Cultural, (Os Pensadores), 14 v.
1974, p. 111ss.
467. STRONG, A. H. Systematic Theology. 35. ed. Valley Forge/Pa: Judson Press,
1993, p. 287. Do mesmo modo: SPROUL, R. C. O que é teologia reformada. São
Paulo: Cultura Cristã, 2009, p. 21.
468. PINK, A. Os Atributos de Deus. São Paulo: Publicações Evangélicas Seleciona-
das, 1985, p. 34.
PINK, A. W. Deus é Soberano. São Paulo: Fiel, 1977, p. 21.
469. Catecismo Maior de Westminster. Perg. 15.
471. FRAME, J. M. The Doctrine of God. Phillipsburg/NJ: P & R Publishing, 2002, p.
519.
472. LEWIS, C. S. O Problema do Sofrimento. 2. ed. São Paulo: Mundo Cristão, 1986,
p. 21.
473. CALVINO, J. O Livro dos Salmos. 2 v. (Sl 62.11) p. 581.
474. MACHEN, J. G. El Hombre: La Enseñanza Bíblica sobre el hombre. Lima: El
Estandarte de la Verdad, 1969, p. 82.
483. KEIL, C. F.; DELITZSCH, F. Commentary on the Old Testament. Grand Rapids/
MI: Eerdmans, 1871, 5 v. (I/III), (Sl 8), p. 148.
484. CALVINO, J. O Livro dos Salmos. São Paulo: Paracletos, 1999, 1 v. (Sl 8.6), p. 172.
486. SCHAEFFER, F. A. Poluição e Morte do Homem. São Paulo: Cultura Cristã, 2003,
p. 35.
490. BAVINCK, H. Teologia Sistemática. Santa Bárbara d’Oeste/SP: SOCEP, 2001, p.
24.
491. NASH, R. H. Questões Últimas da Vida: uma introdução à Filosofia. São Paulo:
Cultura Cristã, 2008, p. 19. TIL, C. V. Apologética Cristã. São Paulo: Cultura Cristã,
2010, p. 21.
492. PLATÃO. 155d. Teeteto-Crátilo. 2. ed. Belém: Universidade Federal do Pará,
1988, p. 20.
493. ARISTÓTELES. Metafísica. São Paulo: Abril Cultural, (Os Pensadores), 4 v. 1973,
I.2. p. 214.
495. BAVINCK, H, Teologia Sistemática, Santa Bárbara d’Oeste: SOCEP, 2001,
p. 24.
496. DOOYEWEERD, H. No Crepúsculo do Pensamento. São Paulo: Hagnos, 2010,
p. 259.
363
ANEXOS
498. BOWLING, A.; MCCMISKEY, T. E. Zakar. In: HARRIS, R. L. et al. Dicionário Interna-
cional de Teologia do Antigo Testamento. São Paulo: Vida Nova, 1998, p. 389-393.
ALLEN, L. C. Zkr: In: VANGEMEREN, W. A. (Org.). Novo Dicionário Internacional de
Teologia e Exegese do Antigo Testamento. São Paulo: Cultura Cristã, 2011, 1 v.
p. 1073-1079. EISING, H. Zakhar. Helmer Ringgren, Elohim. In: BOTTERWECK, G. J.;
RINGGREN, H. Theological Dictionary of the Old Testament. Grand Rapids, MI.:
Eerdmans, 1980 (Revised edition), 4 v. p. 64-82. HEBERT, A. G. Memory. In: RICHARD-
SON, A. A Theological Word Book of the Bible. 13. ed. London: SCM Press LTD.,
1975, p. 142-143. BROWN, C.; BARTELS, K. H. In: BROWN, C. O Novo Dicionário In-
ternacional de Teologia do Novo Testamento. São Paulo: Vida Nova, 1981-1983,
3 v. p. 54-62.
500. HAMILTON, V. P. Paqad. In: HARRIS, R. L. et al. Dicionário Internacional de Teo-
logia do Antigo Testamento. São Paulo: Vida Nova, 1998, p. 1228-1230. SCHOTTRO-
FF, W. Pqd. In: JENNI, E.; WESTERMANN, C. Diccionario Teologico Critico Manual
del Antiguo Testamento. Madrid: Ediciones Cristiandad, 1978, Tomo II, p. 589-613.
WILLIAMS, T. F. Pqd. In: VANGEMEREN, W. A. (Org.). Novo Dicionário Internacional
de Teologia e Exegese do Antigo Testamento. São Paulo: Cultura Cristã, 2011, 3
v. p. 655-661. ANDRÉ, G. Paqad. In: BOTTERWECK, G. J.; RINGGREN, H.; FABRY, HJ.
Theological Dictionary of the Old Testament. Grand Rapids, MI.: Eerdmans, 2003,
12 v. p. 50-63.
502. HOEKEMA, A. A. Criados à Imagem de Deus. São Paulo: Editora Cultura Cristã,
1999, p. 24.
503. BAVINCK, H. Our Reasonable Faith. 4. ed. Grand Rapids, Michigan: Baker Book
House, 1984, p. 184.
505. CALVIN, J. Commentaries on The First Book of Moses Called Genesis. Grand
Rapids, Michigan: Baker, 1996 (Reprinted), 1 v. (Gn 1.26) p. 91.
506. CALVIN, J. Commentaries on The First Book of Moses Called Genesis. 1 v. (Gn
1.26) p. 91.
507. CALVIN, J. Commentaries on The First Book of Moses Called Genesis. 1 v. (Gn
1.26) p. 92.
508. CALVIN, J. Commentaries on The First Book of Moses Called Genesis1 v. (Gn
1.26) p. 92.
509. CALVIN, J. Commentaries on The First Book of Moses Called Genesis. 1 v. (Gn
5.1), p. 227-228. CALVINO, J. As Institutas. II.1.1.
512. CHARNOCK, S. Discourses Upon The Existence and Attributes of God. 9. ed.
Michigan: Baker Book House, 1989, 2 v. p. 36.
ANEXOS
538. MEETER, H. H. La Iglesia y Estado. 3. ed. Grand Rapids, Michigan: TELL. (s.d.),
p. 26.
540. ROBERTSON, O. P. Cristo dos Pactos. Campinas/SP: Luz para o Caminho, 1997,
p. 69. BAVINCK, H. Dogmática Reformada: Deus e a Criação. São Paulo: Cultura Cris-
tã, 2012, 2 v. p. 564.
541. ORTLUND JR., R. C. Igualdade Masculino-Feminina e Liderança Masculina. In:
PIPER, J.; GRUDEM, W. (Comps.). Homem e Mulher: seu papel bíblico no lar, na igreja
e na sociedade. São José dos Campos/SP: Editora Fiel, 1996, p. 38.
543. WALTKE, B. K. Gênesis. Tradução Valter Graciano Martins. São Paulo: Editora Cul-
tura Cristã, 2009, p. 94.
544. BAVINCK, H. Dogmática Reformada: Deus e a Criação. São Paulo: Cultura Cris-
tã, 2012, 2 v. p. 584.
545. TURRETINI, F. Compêndio de Teologia Apologética. São Paulo: Cultura Cristã,
2011, 1 v. p. 591.
546. ARISTÓTELES. A Ética, I.7.6. e A Política, I.1.9
LEIBNIZ, G. W. Novos Ensaios. São Paulo: Abril Cultural, (Os Pensadores), 19 v. III.1.1.
p. 167. CALVINO, J. As Institutas. II.2.13. CALVIN, J. Commentaries on The First
Book of Moses Called Genesis. 1 v. (Gn 2.18) p. 128.
547. RAD, G. V. Genesis: A Commentary. 3. ed. (Revised Edition). Bllombsbury Street
London: SCM Press Ltd., 1972, (Gn 2.21-23), p. 84.
548. RAD, G. V. El Libro del Genesis. Salamanca: Sigueme, 1977, (Gn 2.22), p. 101.
549. Confissão de Westminster. XXIV.2.
550. ROBERTSON, O. P. Cristo dos Pactos. Campinas/SP: Luz para o Caminho, 1997,
p. 68. ORTLUND JR., R. C. Igualdade Masculino-Feminina e Liderança Masculina. In:
PIPER, J.; GRUDEM, W. (Comps.). Homem e Mulher: seu papel bíblico no lar, na igreja
e na sociedade. São José dos Campos, SP.: Editora Fiel, 1996, p. 39.
551. WALTKE, B. K.; FREDERICKS, C. J. Gênesis. São Paulo: Cultura Cristã, 2010, (Gn
2.21), p. 105.
554. HARRIET; GRONINGEN, G. V. A Família da Aliança. São Paulo: Editora Cultura
Cristã, 1997, p. 99.
555. ORTLUND JR., R. C. Igualdade Masculino-Feminina e Liderança Masculina. In:
PIPER, J.; GRUDEM, W. (Comps.). Homem e Mulher: seu papel bíblico no lar, na igreja
e na sociedade. São José dos Campos, SP.: Editora Fiel, 1996, p. 39.
556. WALTKE, B. K.; FREDERICKS, C. J. Gênesis. São Paulo: Cultura Cristã, 2010, (Gn
2.18), p. 104.
ANEXOS
CALVINO, J. O Livro dos Salmos. São Paulo: Paracletos, 1999, 2 v. (Sl 62.9) p. 579.
CALVINO, J. Exposição de Hebreus. São Paulo: Paracletos, 1997, (Hb 2.5), p. 57.
CALVINO, J. O Livro dos Salmos. São Paulo: Paracletos, 1999, 1 v. (Sl 8.5), p. 169.
617. Catecismo Menor. Perg. 14.
618. STOTT, J. R. W. A Cruz de Cristo. Florida: Editora Vida, 1991, p. 80.
619. KUYPER, A. A Obra do Espírito Santo. São Paulo: Cultura Cristã, 2010, p. 361.
620. BARCLAY, W. El Padrenuestro. Buenos Aires: La Aurora/ABAP, 1985, p. 118.
621. SCHAEFFER, F. A Obra Consumada de Cristo. São Paulo: Editora Cultura Cristã,
2003, p. 70.
623. CALVINO, J. Efésios. São Paulo: Paracletos, 1998, (Ef 2.2) p. 52.
624. BARCLAY, W. El Padrenuestro. Buenos Aires: La Aurora/ABAP, 1985, p. 118.
616. BOETTNER, L. La Imortalidad. Grand Rapids, Michigan: TELL. (s.d.), p. 20-21.
626. BERKHOF, L. Teologia Sistemática. 1º Ed. Campinas: Editora Cultura Cristã. Luz
para o Caminho (autorização), 1990, p. 262, 675-676.
BOETTNER, L. La Inmortalidad. Grand Rapids, Michigan: TELL. (s.d.), p. 15ss.
MACHEN, J. G. El Hombre. Lima: El Estandarte de la Verdad, 1969, p. 158.
HOEKEMA, A. A. A Bíblia e o Futuro. São Paulo: Editora Cultura Cristã, 1989, p. 105-
114.
BAVINCK, H. Dogmática Reformada. São Paulo: Cultura Cristã, 2012, 2 v. p. 573ss.;
3 v. p. 187-190.
BARTH, K. Church Dogmatics. Edinburgh: T & T. Clark, 1960, III/2. p. 596ss.
NIEBUHR, R. The Nature and Destiny of Man. New York: Scribner, 1941, 1 v. p. 175-
177.
627. BAVINCK, H. Dogmática Reformada. São Paulo: Cultura Cristã, 2012, 3 v. p. 187-
190.
628. BERKHOF, L. Teologia Sistemática. 1º Ed. Campinas: Editora Cultura Cristã.
Luz para o Caminho (autorização), 1990, p. 443.
629. VOS, G. Biblical Theology: Old and New Testaments. Grand Rapids, Michigan:
Eerdmans, 1985 (Reprinted), p. 38-40.
632. VOS, G. Biblical Theology: Old and New Testaments. Grand Rapids, Michigan:
Eerdmans, 1985 (Reprinted), p. 38-40.
LAWSON, S. J. Fundamentos da Graça. São José dos Campos/SP: Editora Fiel, 2012,
1 v. p. 81-82.
ANEXOS
633. PACKER, J. I. Vocábulos de Deus. São José dos Campos/SP: Fiel, 1994, p. 185.
634. COLSON, C.; FICKETT, H. Uma boa vida. São Paulo: Cultura Cristã, 2008, p. 20.
636. KUYPER, A. A Obra do Espírito Santo. São Paulo: Cultura Cristã, 2010, p. 354.
637. HOEKEMA, A. A Bíblia e o Futuro. São Paulo: Casa Editora Presbiteriana,
1989, p. 108.
638. CALVINO, J. Instrução na Fé. Goiânia/GO: Logos Editora, 2003, cap. V, p. 16.
639. CALVINO, J. Instrução na Fé. cap. IV, p. 15.
RYLE, J. C. Santidade. São José dos Campos/SP: Editora Fiel, 1987, p. 24.
640. CALVINO, J. As Institutas. II.1.10.
Confissão de Westminster. VI.2; IX.3.
Catecismo Menor de Westminster Questão 18.
Catecismo de Heidelberg. Questões 5 e 7.
Cânones de Dort. III e IV.
BERKHOF, L. Teologia Sistemática. Campinas/SP: Luz para o Caminho, 1990, p. 248.
641. CALVIN, J. Commentaries on The First Book of Moses Called Genesis. Grand
Rapids, Michigan: Baker Book House, 1981 (Reprinted), 1 v. (Gn 2.18) p. 128.
CALVINO, J. As Institutas. II.2.13.
642. CALVINO, J. Efésios. (Ef 1.9), p. 32.
CALVINO, J. Exposição de Hebreus. São Paulo: Paracletos, 1997, (Hb 2.5) p. 57.
CALVINO, J. As Institutas. II.1.5.
643. HOEKEMA, A. A. Criados à Imagem de Deus. São Paulo: Editora Cultura Cristã,
1999, p. 84-88, 101.
644. CALVINO, J. As Institutas. I.15.4; II.1.5.
CALVINO, J. Breve Instruccion Cristiana. Barcelona: Fundación Editorial de Litera-
tura Reformada, 1966, p. 13.
CALVINO, J. Efésios. (Ef 4.24), p. 142.
CALVINO, J. O Livro dos Salmos. 1 v. (Sl 8.5), p. 169. 2 v. (Sl 62.9), p. 579.
645. BAVINCK, H. Teologia Sistemática. Santa Bárbara d’Oeste/SP: SOCEP,
2001, p. 17-18.
646. BOICE, J. M. O Evangelho da Graça. São Paulo: Cultura Cristã, 2003,
p. 111.
371
ANEXOS
UNIDADE V
694. BASIL. On The Spirit, XVI.39. In: SCHAFF, P.; WACE, H. eds. Nicene and Post-Nice-
ne Fathers of the Christian Church (Second Series). Grand Rapids, Michigan: Eerd-
mans, 1978, v. 8, p. 25.
695. ERICKSON, M. J. Christian Theology. 13. ed. Grand Rapids, Michigan: Baker
Book House, 1996, p. 872.
696. GRUDEM, W. A. Teologia Sistemática. São Paulo: Vida Nova, 1999, p. 640.
697. OWEN, J. O Espírito Santo. Recife: Os Puritanos; Clire, 2012, p. 32.
702. Sobre esse assunto em particular, confira: WARE, B. Cristo Jesus homem: Re-
flexões teológicas sobre a humanidade de Jesus Cristo. São José dos Campos, SP.:
Editora Fiel, 2013, p. 91-112.
703. WARE, B. Cristo Jesus homem: Reflexões teológicas sobre a humanidade de
Jesus Cristo. São José dos Campos, SP.: Editora Fiel, 2013, p. 86.
704. KUYPER, A. A Obra do Espírito Santo. São Paulo: Cultura Cristã, 2010, p. 126-
129; FERGUSON, S. B. O Espírito Santo. São Paulo: Os Puritanos, 2000, p. 54-55.
706. KUYPER, A. A Obra do Espírito Santo. São Paulo: Cultura Cristã, 2010, p. 135-
139.
710. COSTA, H. M. P. Eu Creio: no Pai, no Filho e no Espírito Santo. São José dos Cam-
pos, SP.: Editora Fiel, 2014.
731. Quanto à inadequação dessa ênfase, veja: FRETHEIM, T. Javé. In: VANGEMEREN,
W. A. (Org.). Novo Dicionário Internacional de Teologia e Exegese do Antigo Tes-
tamento. São Paulo: Cultura Cristã, 2011, v. 4, p. 737.
735. Sobre os Massoretas, veja: ARCHER JR., G. L. Merece Confiança o Antigo Testa-
mento. São Paulo: Vida Nova, 1974, p. 65ss.
741. Uso também comum entre os pagãos. Veja: CULLMAN, O. Cristologia do Novo
Testamento. São Paulo: Editora Liber, 2001, p. 257-263.
ANEXOS
744. BIETENHARD, H. Senhor: In: BROWN, C. ed. ger. O Novo Dicionário Internacio-
nal de Teologia do Novo Testamento. São Paulo: Vida Nova, 1981-1983, v. 4, p. 421.
748. CULLMAN, O. Cristologia do Novo Testamento. São Paulo: Editora Liber, 2001,
p. 268; WALLACE, R. S. Cristologia. In: HARRISON, E. F. ed. Diccionario de Teologia.
Michigan: T.E.L.L., 1985, p.133.
759. BAVINCK, H. Our Reasonable Faith. 4. ed. Grand Rapids, Michigan: Baker Book
House, 1984, p. 564.
763. SCHAFF, P. History of the Christian Church. Peabody, Massachusetts: Hen-
drickson Publishers, 1996, Vol. I, p. 456.
767. BARCLAY, W. El Nuevo Testamento Comentado, (Hechos de los Apostoles),
Buenos Aires: La Aurora, 1974, Vol. 7, p. 138.
772. BAVINCK, H. Teologia Sistemática. Santa Bárbara d’Oeste, SP: SOCEP, 2001, p.
405.
771. MCGRATH, A. E. Paixão pela Verdade: a coerência intelectual do Evangelicalis-
mo. São Paulo: Shedd Publicações, 2007, p. 25.
775. COSTA, H. M. P. A Literatura Apocalíptica Judaica. São Paulo: Casa Editora
Presbiteriana, 1985, passim.
780. TURRETIN, F. Institutes of Elenctic Theology. Phillipsburg, New Jersey: P & R
Publishing, 1994, Vol. III, VI.xvii, p. 316.
789. CALVINO, J. As Institutas da Religião Cristã: edição especial com notas para
estudo e pesquisa. São Paulo: Cultura Cristã, 2006, Vol. 2, (II.4), p. 122. Ver: HODGE, C.
Teologia Sistemática, p. 952-953.
791. HABERMAS, G. R. Ressurreição de Cristo: In: ELWELL, W. A. ed. Enciclopédia His-
tórico-Teológica da Igreja Cristã. São Paulo: Vida Nova, 1990, Vol. III, p. 290.
792. SANTO AGOSTINHO. Comentário aos Salmos. São Paulo: Paulus, (Patrística,
9/3), 1998, (Sl 101), Vol. III, p. 32-33.
793. CALVINO, J. Se Deus fuera nuestro Adversario: In: SERMONES Sobre Job. Jeni-
son, Michigan: T.E.L.L., 1988, Sermon nº 6, p. 79.
794. BERKHOF, L. Teologia Sistemática. Campinas, SP.: Luz para o Caminho, 1990,
p. 358.
795. GESENIUS. Hebrew-Chaldee Lexicon to the Old Testament. 13. ed. Grand Rap-
ids, Michigan: Eerdmans, 1978, p. 385; J. Baehr, Sacerdote. In: BROWN, C. ed. ger. O
Novo Dicionário Internacional de Teologia do Novo Testamento. Vol. IV, p. 287.
796. PAYNE, J. B. kãhan: In: HARRIS, R. L. ed. Theological Wordbook of the Old Tes-
tament. Chicago, Moody Press, 1980, Vol. I, p. 431a.
375
ANEXOS
797. PAYNE, J. B. The Theology of the Older Testament. Grand Rapids, Michigan:
Zondervan Publishing House, (c) 1961, p. 372.
808. JENNI, E.; WESTERMANN, C. Diccionario Teologico Manual del Antiguo Testa-
mento. Madrid, Ediciones Cristiandad, 1978, Vol. I, p. 857; COSTA, H. M. P. A Graça de
Deus: Comum ou Exclusiva? São Paulo: 2000, passim.
814. CALVIN, J. The First Epistle of John. Grand Rapids, Michigan: Baker Book
House, (Calvin’s Commentaries), 1981, Vol. 22, (1Jo 2.1), p. 171.
829. ERDMAN, C. E. Atos dos Apóstolos. São Paulo: Casa Editora Presbiteriana, 1960,
p. 19. Do mesmo modo, ver: ERICKSON, M. J. Introdução à Teologia Sistemática. São
Paulo: Vida Nova, 1997, p. 315.
833. BAVINCK, H. Our Reasonable Faith. 4. ed. Grand Rapids, Michigan: Baker Book
House, 1984, p. 396.
835. OWEN, J. A Glória de Cristo. São Paulo: PES, 1989, p. 30. Vd. GRUDEM, W. A.
Teologia Sistemática, p. 465.
837. CALVINO, J. Exposição de Hebreus. São Paulo: Paracletos, 1997, (Hb 6.20), p.
173-174; F.F. Bruce, La Epistola a los Hebreos, Grand Rapids, Michigan: Nueva Crea-
cion, 1987, p. 133-134.