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UFF | PPGAU | 02-2018

Disciplina: ​Seminários de dissertação​ | Docente:​​Vinícius M. Netto


Discente: ​Fernanda Pacheco Dias ​Tema:​​ Caminhar e afetos urbanos
Resenha Artigo 3

Artigo: What we talk about when we talk about ‘walking in the city’ ​por Brian
Morris. 2004.

O autor deste artigo é professor de antropologia da Goldsmiths College da


Universidade de Londres, seu texto foi publicado na revista Cultural Studies em
setembro de 2004. O propósito deste artigo é complementar alguns entendimentos
desdobrados a partir do capítulo “Walking in the City” presente no livro “Practice of
Everyday Life” do francês Michel de Certeau. O livro citado foi publicado
originalmente em 1980 e logo assumiu uma posição de relevância para o
acadêmicos e estudantes de estudos culturais. Para Morris o capítulo abordado é
frequentemente citado como modelo para se compreender conceitos culturais como
“poder” e “resistência” e seu artigo intenta contribuir estendendo e repensando
saberes, incluindo uma maior consideração dos agenciamentos e afetos na
compreensão das práticas cotidianas do caminhar urbano.
Partindo do pressuposto de que apesar de ser um capítulo que já foi
amplamente estudado e criticado, o autor afirma que revisitá-lo se faz necessário a
medida que uma perspectiva de estudos urbanos pode oferecer novos tipos de
engajamento teóricos sobre como corpos, sujeitos e ambientes urbanos se
conectam. Brian Morris coloca a seguinte questão para ser explorada: como o
‘cotidiano extraordinário’ passou de prática artística e crítica que contesta a cultura
do consumo/espetáculo para um organizador do banal usado para descrever e dar
sentido à culturas e experiências urbanas atuais?
O autor utiliza-se do apoio de outros dois autores, Tony Bennet e Meaghan
Morris, para fundamentar o argumento de que haja uma aceitação cega ao conceito
de resistência, derivado de Certeau, e que isto fez com que a disciplina de estudos
culturais tenha focado em “rastrear resistências e tomar o seu lado”. Ele pondera
afirmando que existe um limite nessa noção de resistência e está relacionado com a
rigidez do modelo de Certeau, pautado entre estratégias e táticas. Enquanto Certeau
identifica que há um espaço urbano politicamente organizado por programas e o que
as pessoas “fazem” com esse programa constitui uma relação de poder que
estrutura o espaço; Brian Morris acredita na tese de que essa relação (corpus,
poder, mobilidade e forma urbana) é muito mais complexa e multidimensional do que
a binaridade entre estruturas disciplinares e liberdades cotidianas proposta por
Certeau.
Neste ponto, o autor se vale da “teoria da articulação”, explicada por
Lawrence Grossberg, para reformular as características da caminhada “resistente”
de Certeau. Segundo Morris, o fato de Certeau afirmar que a caminhada diária,
como prática cotidiana, pode ser “resistente” não significa dizer que
automaticamente todas as caminhadas são resistentes. É então que ele pondera
que precisamos considerar várias mediações que permitem à caminhada articular
complexos e até mesmo contraditórios efeitos.
Nos parágrafos seguintes, Brian Morris desloca-se para o tema da
psicanálise no discurso de Certeau, propondo uma crítica ao entendimento da
relação universal entre corpo e a subjetividade e corpo e sociedade. O autor recorre
ao trabalho de Marcel Mauss “Técnicas do Corpo” para sugerir que os atributos
corporais habituais, como o caminhar, não são necessariamente performances
corporais “inconscientes”. A seguir teoriza que uma certa “intensidade” descreve
uma consciência cotidiana ou um sentimento de conexão entre corpo e mundo que
poderá ser discutida através da noção teórica de afeto. Ao introduzir o conceito de
afeto, o autor reforça seus argumentos através da crítica a Certeau e Roland Barthes
que versam sobre uma semiologia das práticas urbanas; e se utiliza mais uma vez
do trabalho de Grossberg e Brian Massumi para defender afeto como força ou
intensidade capaz de receber imagens e associá-las a significados. Segundo Morris,
o corpo torna-se barômetro para avaliar a multidimensionalidade dos eventos numa
prática de caminhada.
O artigo foi construído tendo como foco a discussão dos conceitos de
Certeau e sua aplicabilidade nas práticas urbanas contemporâneas e tomou como
repertório teórico trabalhos de outros autores sobre o mesmo tema, e sobre temas
correlatos que puderam acrescentar ao debate. Foram percorridos os conceitos de
resistência, inconsciente, semiótica, corpo e afeto. Estes subtemas citados
relacionados com a prática do caminhar, estão no cerne da minha pesquisa de
dissertação, portanto, fica assim reconhecida a relevância deste artigo para a
fundamentação teórica do meu trabalho.

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