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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE LONDRINA

LICENCIATURA EM FILOSOFIA

VINICIUS DE SOUZA NACAMURA

A VISÃO DA EDUCAÇÃO EM ARISTÓTELES

O pensamento ético e político aristotélico na educação e o conceito de amizade

SÃO SEBASTIÃO DA AMOREIRA-PR

2020
VINICIUS DE SOUZA NACAMURA

A VISÃO DA EDUCAÇÃO EM ARISTÓTELES

O pensamento ético e político aristotélico na educação e o conceito de amizade

Trabalho sobre a relação entre Aristóteles e a educação


na disciplina de Filosofia e Educação na Universidade
Estadual de Londrina.

Professor: Américo Grissoto

SÃO SEBASTIÃO DA AMOREIRA-PR

2020
A VISÃO DA EDUCAÇÃO EM ARISTÓTELES E A IMPORTÂNCIA DA AMIZADE
NA FORMAÇÃO DO HOMEM

O intuito que proponho no presente trabalho consiste em elucidar algumas


características do pensamento aristotélico referente à educação, utilizando-se tanto de sua
visão ética, quanto da visão política. Ao fazer essa importante relação entre ética e política
aristotélica, introduzirei o conceito de amizade presente nos capítulos VIII e IX da Ética a
Nicômaco, a fim de que possamos pensar esse termo relacionando-o com a educação
contemporânea e os processos de socialização do indivíduo dentro do ambiente plural da
instituição escolar.

A visão de uma cidade-estado unida e próspera era algo presente nas concepções
filosóficas dos denominados “filósofos da pólis”, onde grande parte da investigação sobre
qual seria o Estado ideal, foram feitas pelos clássicos atenienses: Sócrates, Platão e seu
sucessor respectivamente, Aristóteles. Neste momento trabalharei primeiramente o
pensamento político de Aristóteles, tentando delimitar seus aspectos fundamentais e
constituintes da base sobre a qual se possa construir o pensamento educacional.

No livro V da obra “Política”, Aristóteles começa ressaltando a importância da


educação da juventude, e que essa deveria ser substancialmente a preocupação do legislador, e
ainda afirma que todos deveriam ter um educação igual e pública visto que tanto o indivíduo,
quanto a cidade-estado possuem o mesmo fim. Essa relação do indivíduo em prol do coletivo,
e que ambos possuem o mesmo bem último, é fundamental para entender a função de cada
cidadão na pólis ideal, aquela compreendida num contexto onde o exercício da política, e da
livre conversação em questões coletivas, promoviam um bem aos seus cidadãos,
caracterizados como “animais políticos”, ou seja, que naturalmente o homem é um animal
social, voltado para a coletividade como perspectiva da própria existência.

Aristóteles nesse livro desenvolve seu pensamento educacional e procura elucidar os


diferentes aspectos da educação a serem considerados, em detalhes o filósofo aborda questões
como o que constituirá o ensino, qual o melhor dentre eles, quais deveriam ser as matérias da
educação, qual é a finalidade desse processo, para justamente tentar alcançar o objetivo
político em sua mente. O ensino aristotélico possui quatro matérias a serem ensinadas, a
saber: leitura e escrita, ginástica, desenho, e por fim, a música. Ao defini-las reconhece o
caráter de utilidade prática às três primeiras matérias, e investiga se a música também deveria
ser ensinada aos jovens, se ela é útil, ou se ela serve aos fins propostos tanto ao Estado,
quanto para o indivíduo. Chegando à conclusão que a música deveria ser ensinada aos jovens
como formação de caráter, reconhece nas melodias e nos ritmos diferentes padrões que
produzem variados sentimentos nas pessoas, que a melodia que deveria ser ensinada era
aquela que seguia seu pensamento de virtude ética, o “justo meio”, a “mediania”, que era
representada pelo estilo dórico. Sendo assim a música teria três principais objetivos, a
educação, a catarse, e o deleite intelectual.

A compreensão da finalidade desse ensino proposto por Aristóteles, e os objetivos que


ele propõe é uma característica fundamental de seu pensamento. Para o filósofo, a pólis grega
era a mais alta forma de organização política, a mais perfeita união política entre os homens,
sendo assim, o fim ao qual o cidadão deseja chegar é aquele de fazer parte dos destinos de sua
cidade (algo que Sócrates seguiu até o fim), de se fazer constituinte do exercício político, de
por meio do diálogo e do livre viver, permitir um fim, um bem político para si e para a cidade.

Nessa imbricação existente entre o pensamento ético e o político, é quase impossível


falar de um sem citar o outro, ou fazer de somente um aspecto, a exposição fundamental da
filosofia aristotélica. Tendo dito a respeito de seus variados conceitos políticos, algo que
elucidará mais o conteúdo que pretendo discorrer é a visão ética do filósofo, que também não
pode ser dissociado do pensamento da educação.

Em sua obra “Ética a Nicômaco”, Aristóteles concebe sua própria visão acerca das
virtudes, ela é representada por um lado pela virtude ética, que se caracteriza pela “justa
medida”, ou “justo meio”, onde a visão ética é aquela que tende sempre ao meio termo, onde
a razão domina os vícios que sempre tendem ao excesso ou à falta. O filósofo compreendia
que a formação ética de seus cidadãos era um dos elementos basilares de uma sociedade
política próspera, que visando o bem dos indivíduos e do bem comum, acaba garantindo o
bem viver de todos em última instância. Existe ainda outro tipo de virtude, a chamada virtude
dianética, ela se divide em duas características: a sabedoria (phrónesis) que é a responsável
pelos atos morais a serem seguidos eticamente, voltado à realidade concreta dos homens; e a
sapiência (sophía) que é o bem último e maximização da felicidade dos homens,
correspondendo à contemplação das realidades metafísicas, que nos aproximaria do divino e
por isso elevaria nossa alma à perfeição.

Por conseguinte, o pensamento ético das virtudes feita por Aristóteles é essencial para
a concepção de cidade ideal que faz o filósofo, a educação que ele elabora tem em vista a
formação para o agir político do cidadão, ao modo que ele possa da melhor forma servir a
comunidade, todas as etapas que Aristóteles coloca na formação dos indivíduos, a boa
alimentação e movimentos leves no início da vida a fim de obter saúde, o ensino da leitura e
da escrita, a ginástica como criadora da coragem, a música como formação do caráter e deleite
intelectual, o desenho, os serviços militares quando atinge a maioridade, e esse quando acaba,
a participação política na pólis, tem como fim o bem da cidade e da coletividade, que por
meio de cidadãos éticos, constroem essa base sobre a qual a sociedade possa prosperar.

Tendo dito a respeito das duas ciências práticas no pensamento aristotélico, irei
considerar agora a respeito do conceito de amizade, presente nos livros VIII e IX da “Ética a
Nicômaco”, e relacioná-la com a educação contemporânea no modo como os indivíduos se
relacionam, a integração social do mesmo dentro da instituição escolar, e a formação como
algo além do mero conteúdo a ser ensinado, algo que constitui uma experiência fundamental
para a vida bem vivida.

Ao começo do livro VIII, é exposto que a amizade seria uma das virtudes mais
necessárias à vida, que ninguém escolheria viver sem amigos, mesmo tendo em suas mãos
todos os bens. Mostrando a importância do conceito, o filósofo faz diversas definições e
diferenciações quanto aos tipos de amizade, que para ele se divide em três tipos: a amizade
que visa ao útil, ou seja, numa relação entre duas pessoas o fator fundamental que garante a
conexão é algo de útil que a outra pessoa me concede; a amizade que visa ao agradável,
aquela em que a amizade se sustenta pelo prazer recíproco que uma pessoa oferece à outra; e a
amizade pelo bem em si, aquela em que a única motivação pela relação é em vista do bem do
outro, pela pessoa que é em si, em que se deseja o conviver com o outro.

Para Aristóteles, a amizade mais perfeita em suas definições, é a amizade do homem


bom, do homem virtuoso, onde a relação entre eles seriam a mais perfeita pois visam o bem,
veem a relação com outro como um fim em si mesmo, por meio da convivência garantem a
prática das virtudes dentre esses homens por meio de uma relação recíproca, igual, e
prazerosa no convívio. Ao tratar dos outros tipos de amizade, pela utilidade e pelo prazer, diz
que essas são frágeis e acidentais que, visando apenas a algo que é útil ou prazeroso
reciprocamente, ao acabar esses dois estados de coisas numa relação, ela acaba se
deteriorando, visto que a motivação pela qual os indivíduos estabeleceram essa amizade foi
unicamente essas.
O desenvolvimento da amizade feita ainda abrange uma grande variedade de questões
ao qual ela pode se relacionar, ela não se limita ao primeiro plano, parecendo superficial
apenas constatar que a amizade é boa, mas não é isso que acontece em sua argumentação. O
filósofo ainda trata de algumas características da amizade, a reciprocidade em relação ao que
se recebe, a igualdade entre as duas parte e o prazer no convívio, a amizade que envolve
superioridade de uma das partes ele irá dizer que nesses casos o amor deve ser proporcional à
“quantidade” de virtude existente a mais no outro , a fim de que se estabeleça uma igualdade
entre eles, de exemplo usa algumas relações do contexto de sua época, a amizade entre o pai e
o filho, o marido e a mulher, o senhor e o escravo. Aristóteles ainda trata da extensão da
comunidade sendo resultante da extensão da amizade presente nela, e por conseguinte, a
extensão da justiça que corresponde à extensão da última, aí se tem uma ideia da importância
amizade na formação da comunidade, algo tão inerente na compreensão do homem e da
política em sua filosofia.

Mas qual a importância desses conceitos para a educação contemporânea? Por que
esses conceitos serviriam pra pensar a educação atual? Qual o sentido de buscar essas ideias
tendo em vista a distância cronológica e o contexto diferente das épocas? É fundamental. O
reavivamento dessas ideias tão elaboradas em tempos passados servem de perspectiva e são
sujeitas a mudanças a todo momento para melhor entender a contemporaneidade, é uma
compreensão de como as mesmas questões são colocadas através do tempo, e como
poderemos respondê-las através de problemas presentes em nosso contexto. Em suma, a
pergunta que eu pretendi a responder é: De que serve o pensamento aristotélico à educação
contemporânea?

Em uma sociedade cada vez mais atomizada, onde as relações entre a comunidade são
frágeis, ocorre uma decadência do espírito comunitário em vistas do bem comum enxergado
por Aristóteles como uma característica fundamental daquilo que ele via como uma sociedade
que visasse o bem, o prazer, o bem viver de todos os cidadãos constituintes da pólis. O termo
cidadão não pode ser entendido como na Antiguidade, onde apenas uma pequena parcela dos
homens eram considerados como tal, o trabalho filosófico consiste na eterna mutação daquilo
é estabelecido, no repensar as estruturas que condicionam essas desigualdades da época, que
hoje em dia, não podem ser mais aceitas. O estudo da filosofia aristotélica consegue
apresentar fatores essenciais para pensar o contemporâneo, a sua visão da política relacionada
a algo comum a todos, que visam todos ao mesmo fim, a sua visão da educação formativa do
caráter moral, intelectual, corporal, político do cidadão, como forma de perpetuar o bem
coletivo e individual. As virtudes éticas e dianéticas que permitem aos cidadãos por meio
hábito garantirem uma vida plena e virtuosa, e alcançarem a felicidade (eudaimonia) como
uma atividade e fim último.

Considerando a amizade como uma forma de integração maior por parte dos
indivíduos dentro da instituição escolar, que por meio da convivência mútua num espaço onde
se encontra uma pluralidade de pessoas, cada uma com sua própria visão de mundo e
realidade, seja possível construir uma comunidade que vise o bem de todos, e isso só será
possível via uma formação em que se estimule os cidadãos para tal. A amizade, uma das
virtudes mais necessárias quanto ao ambiente escolar, da convivência com outros, é fator
fundamental desse processo de ensino, tanto como elevação humana da amizade boa em si
mesma, como uma maior união por parte das individualidades com capacidade para formar
um corpo político que atinja os fins propostos, a felicidade e o bem geral. Talvez possamos
pensar o objetivo da educação por meio daquilo que Aristóteles diz ser seus três princípios, o
caminho do meio, o possível, e o ideal.

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