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BALHO
FERNANDO HERNANDEZ
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Este livro é um convite à transgressão (além, atravessar, mas também, desobedecer e infringir regras) das
barreiras que impedem o indivíduo de pensar por si mesmo, de construir uma nova relação educativa baseada na
colaboração em sala de aula, na escola e com a comunidade.
O educador é, portanto, um transgressor do que existe pronto, acabado, constituído e passado. Por a-
companhar a dinâmica da sociedade, inova em termos de atitudes e comportamentos, tendo à mudança de men-
talidades, a par do questionamento sempre presente e base para a construção do conhecimento.
Apresenta, primeiramente, seis situações de transgressão, ou intenção de mudança, com as quais lança
as bases da linha de raciocínio que desenvolve no texto:
Primeira: quanto ao domínio da psicologia instrucional que esteve, em sua história, vinculada a setores
educacionais militares norte-americanos, cuja prática reduz a complexidade da instituição escolar a pacotes de
conceitos, procedimentos, atitudes e valores.
Segunda: quanto à visão da aprendizagem vinculada ao desenvolvimento e conhecida como construtivis-
mo. Essa transgressão não é contra o construtivismo, mas sim contra a interpretação que reduz e simplifica al-
guns aspectos da aprendizagem.
Terceira: em relação à visão do currículo escolar centrado nas disciplinas, entendidas como fragmentos
empacotados em compartimentos fechados, oferecidos aos alunos sob formas de conhecimento que muito pou-
co ou nada tem a ver com suas vidas, necessidades e interesses.
Quarta: em relação à Escola que transfere para o futuro a sua responsabilidade em formar os educandos,
encarando ser a finalidade da infância chegar à idade adulta e desconsiderando-a como um período particular,
específico e rico em experiência e descobertas fundamentais. Transgressão contra as Escolas que impedem que
os alunos se construam como sujeitos em cada época de sua vida.
Quinta: quanto à perda da autonomia no discurso dos docentes, à desvalorização de seus conhecimentos
e à sua substituição por discursos psicológicos, antropológicos ou sociológicos que pouco responde ao que acon-
tece no cotidiano da Escola.
Sexta: em relação à incapacidade da Escola para repensar-se de maneira permanente, dialogar com as
transformações que acontecem na sociedade, nos alunos e na própria educação.
Convite à transgressão
Hernandez descreve a importância e necessidade de transgredir a visão de educação escolar baseada nos
conteúdos apresentados como objetos estáveis e universais, de modo que se atue com realidades socialmente
construídas que são revividas no desenvolvimento dos projetos. Também, transgredir a visão de aprendizagem
vinculada ao desenvolvimento conhecida como construtivismo, não por sua inadequação, mas pela simplificação
e redução dos processos que se realizam na relação ensino-aprendizagem a uma sequência de habilidades cere-
brais que possibilitam a aprendizagem e que até certo ponto, independem da ação da escola. Para Hernández, as
noções conhecidas no âmbito do construtivismo não dão conta dos valores promovidos ou excluídos pela Escola e
pelo professor, não tratam da relação de poder que a Escola veicula, nem do papel da afetividade na aprendiza-
gem, e menos ainda do processo de formação da identidade do educando, do qual a realidade escolar participa.
E ainda transgredir a divisão dos conteúdos do currículo escolar em disciplinas. Seu trabalho pretende
superar as intenções didáticas das experiências multidisciplinares onde um mesmo tema é tratado por diferentes
professores, para a defesa de uma filosofia transdisciplinar, que implicará numa mudança da organização da ges-
tão do tempo e do espaço na Escola.
A transdiciplinaridade vinculada à proposta de currículo por projetos de trabalho implica numa mudan-
ça nos limites de tempo, na gestão dos espaços e na disponibilidade de continuar aprendendo por parte dos
docentes.
O autor não defende que os projetos de trabalho solucionem todas as tensões apontadas no sistema de
ensino, mas Hernández registra que os “projetos” podem desenvolver capacitações que respondem às necessida-
des do mundo do trabalho e da vida nas sociedades modernas. Assim constata que “os projetos” podem:
a) favorecer a construção da subjetividade negando assim que a função da escola seja apenas ensinar
conteúdos;
b) aproximar os conteúdos à vida prática dos alunos;
c) aprender a dialogar com vários fatores de um fenômeno.
Estas condições de aprendizado desenvolvem capacidades que são demandas atuais das relações na soci-
edade e no trabalho, tais como:
1) autonomia: iniciativa de pesquisa;
2) criatividade: utilização original de recursos para a compreensão e construção;
3) capacidade analítica: diagnóstico de situações;
4) capacidade de síntese: experiência em lidar com a integração de diferentes disciplinas;
5) poder de decisão: pela possibilidade de exercício de escolhas.
Organização de Projetos
O que é um Projeto de trabalho?
Hernández inicia o mapeamento desta resposta apontando o que “os projetos” têm em comum com ou-
tras estratégias de ensino, como o trabalho com os centros de interesse ou os estudos de meio, seriam os seguin-
tes pontos:
vão além dos limites escolares;
implicam a realização de atividades práticas;
os temas selecionados são apropriados aos interesses e ao estado de desenvolvimento dos alunos;
são realizadas experiências de primeira mão como visitas, presença de convidados na sala de aula;
deve ser feito algum tipo de pesquisa;
1
Mais informações em:
http://www.pead.faced.ufrgs.br/sites/publico/eixo7/didatica/unidade2/propostas_de_trabalho_integrado/centros_de_inter
esse.pdf
necessita-se trabalhar com estratégias de busca, ordenação e estudo de diferentes fontes de informa-
ção;
implicam atividades individuais, grupais e de classe em relação às diferentes habilidades e conceitos
que são aprendidos.
Diante destas identidades, muitos educadores pensam estar trabalhando com “projetos”, ou que este se-
ria um outro nome para o que estejam aplicando em suas aulas, no entanto há um diferencial que corresponde
exatamente a uma determinada sequência de passos que conferem a qualidade de um trabalho por projetos.
Isto é, em primeiro lugar, é necessário que se tenha um problema para iniciar uma pesquisa. Pode ser so-
bre uma inquietação ou sobre uma posição a respeito do mundo. A partir daí, é importante trabalhar as maneiras
de olhar o mundo que são diversas. Mas não interessa só localizá-las e sim entender o significado delas. O resul-
tado é que se constrói uma situação de aprendizagem em que os próprios estudantes começam a participar do
processo de criação, pois buscam resposta às suas dúvidas. Isso é o projeto de trabalho.
1) parte-se de um tema ou de um problema negociado com a turma;
2) inicia-se um processo de pesquisa;
3) buscam-se e selecionam-se fontes de informação;
4) estabelecem-se critérios de ordenação e de interpretação das fontes;
5) recolhem-se novas dúvidas e perguntas;
6) estabelecem-se relações com outros problemas;
7) representa-se o processo de elaboração do conhecimento que foi conseguido;
8) recapitula-se (avalia-se) o que aprendeu;
9) conecta-se com um novo tema ou problema.
Hernández acredita que participando de um projeto de trabalho, os estudantes vivenciam um processo de
pesquisa que tem sentido para eles, porque podem participar ativamente do processo de produção do conheci-
mento que vai além do currículo básico e que nunca a reduz.
Outro ponto significativo apontado é a mudança no papel do professor que se desvencilha da função de
centralizador do conhecimento e das diretrizes do aprendizado para a função de facilitador, que responde pela
problematização do conhecimento, indicando pistas de pesquisa e não respostas sistemáticas.
Ao final do livro o autor apresenta o relato de diferentes projetos de trabalho, aplicados às primeiras tur-
mas da educação infantil até as séries finais do ensino médio, que esclarecem ainda mais a prática desta proposta
pedagógica tão singular e atraente, mas ainda assustadora para muitos educadores.
Referências:
HERNANDEZ, F. Transgressão e mudança na educação: os projetos de trabalho. Porto Alegre: Artmed, 1998.