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5915756 – Introdução à Neurociência Computacional – Antonio Roque – Aula 15

Modelagem de Sinapses

Há dois tipos de sinapses, químicas e elétricas. Vamos começar considerando apenas a


sinapse química, que é tida como a mais importante segundo a maioria dos neurocientistas.

Uma sinapse química padrão conecta o axônio do neurônio que envia o estímulo, chamado
de neurônio pré-sináptico, a um dendrito do neurônio que recebe o estímulo, chamado de
neurônio pós-sináptico (veja a figura abaixo).

Quando um potencial de ação chega ao terminal do axônio do neurônio pré-sináptico, uma


série de eventos acontece:
1. Canais de cálcio na membrana do terminal pré-sináptico se abrem e íons de Ca2+
entram na célula pré-sináptica.
2. Os íons de Ca2+ provocam a fusão de vesículas que contêm neurotransmissores com
a membrana pré-sináptica, liberando esses neurotransmissores na fenda sináptica.
3. Depois que as vesículas liberam seu conteúdo, elas retornam ao meio intracelular do
neurônio pré-sináptico e são “recarregadas” com neurotransmissores para ser usadas
novamente no futuro.

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4. Os neurotransmissores liberados na região do meio extracelular entre os dois


terminais sinápticos – chamada de fenda sináptica – se difundem pela fenda
sináptica e se ligam temporariamente a receptores na membrana do dendrito do
neurônio pós-sináptico.
5. As ligações entre os neurotransmissores e os receptores provocam aberturas de
canais na membrana pós-sináptica por onde íons podem passar provocando
alterações no potencial de membrana do neurônio pós-sináptico.
6. A ligação dos neurotransmissores com os receptores de membrana é um processo
muito rápido (de menos de 1 ms) após o qual os neurotransmissores são liberados. A
liberação é feita por células gliais especializadas, denominadas “transportadoras”.
As transportadoras removem os neurotransmissores da membrana pós-sináptica e os
transportam ao neurônio pré-sináptico para que eles sejam re-armazenados nas suas
vesículas.

Há dois tipos básicos de receptores na membrana do neurônios pós-sináptico: receptores


ionotrópicos e receptores metabotrópicos.

Os receptores ionotrópicos são canais iônicos que se abrem quando se ligam a um


neurotransmissor e deixam passar íons para dentro ou para fora do neurônio pós-sináptico.
Os receptores metabotrópicos serão descritos mais adiante.

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Dependendo do tipo de neurotransmissor, quando ele se liga a um receptor ionotrópico


isso pode provocar uma pequena despolarização local na membrana (pela entrada de carga
positiva) ou uma pequena hiperpolarização local na membrana (pela entrada de carga
negativa).

Uma despolarização local na membrana é chamada de potencial pós-sináptico excitatório e


uma hiperpolarização local é chamada de potencial pós-sináptico inibitório. Eles
costumam ser indicados por suas siglas em inglês: EPSP (excitatory post-synaptic
potential) e IPSP (inhibitory post-synaptic potential).

Um neurônio pré-sináptico sempre libera o mesmo tipo de neurotransmissor: quando ele


provoca uma despolarização local, o neurônio pré-sináptico é chamado de excitatório e a
sinapse é dita excitatória; quando ele provoca uma hiperpolarização local, o neurônio pré-
sináptico é chamado de inibitório e a sinapse é dita inibitória.

A Figura abaixo ilustra um potencial pós-sináptico excitatório e um potencial pós-


sináptico inibitório.

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No caso dos receptores metabotrópicos, sua ligação com neurotransmissores não provoca a
abertura de canais iônicos de forma direta, mas de forma indireta porque os receptores
metabotrópicos não formam canais iônicos.

Quando um neurotransmissor se liga a um receptor metabotrópico, este libera proteínas


chamadas de “proteínas G” no meio intracelular. As proteínas G se ligam a moléculas
sinalizadoras – chamadas de segundos mensageiros – que desencadeiam uma sequência de
eventos bioquímicos no interior do neurônio pós-sináptico.

Essa sequência pode causar diversos fenômenos, como a abertura de canais iônicos, a
alteração conformacional (sem a abertura de canais) de proteínas de membrana e de
moléculas transportadoras e até alterações na expressão gênica.

As modificações causadas pela ligação de um neurotransmissor com um receptor


metabotrópico ocorrem mais lentamente e são mais duradouras do que as modificações
causadas pela ligação de um neurotransmissor com um receptor ionotrópico. Além disso,
elas podem ocorrer em locais mais distantes da região da sinapse.

A figura abaixo ilustra esquematicamente o funcionamento dos receptores ionotrópicos e


metabotrópicos.

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Combinações de potenciais pós-sinápticos excitatórios e inibitórios no tempo e no espaço


em um mesmo neurônio podem produzir fenômenos de somação temporal e espacial. A
figura abaixo ilustra isso.

Os potenciais pós-sinápticos (excitatórios ou inibitórios) têm durações muito maiores que


a de um potencial de ação. Um potencial pós-sináptico típico tem uma fase de subida que
leva de 1 a 2 ms e um tempo de decaimento mais lento, que leva de 3 a 5 ms. A figura a
seguir ilustra um potencial pós-sináptico típico.

O principal neurotransmissor excitatório do cérebro é o glutamato e o principal


neurotransmissor inibitório é o GABA (ácido γ-aminobutírico). Os dois podem atuar tanto
sobre receptores ionotrópicos como metabotrópicos.

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Os principais receptores ionotrópicos para o glutamato são os chamados receptores AMPA


e NMDA. Eles recebem estes nomes por causa das drogas agonistas que os ativam (ácido
α-amino-3-hidroxi-metil-4-isoxazolepropriônico, ou AMPA; e N-metil-D-aspartato, ou
NMDA). Tanto os receptores AMPA como NMDA, quando ligados ao glutamato, atuam
como canais iônicos para cátions em geral (Na+, Ca2+, etc), embora o receptor NMDA seja
mais permeável ao Ca2+ do que o receptor AMPA. As correntes resultantes (para dentro da
célula) têm potenciais de reversão em torno de 0 mV.

A corrente iônica associada ao receptor AMPA é ativada e inativada muito rapidamente. Já


a corrente associada ao receptor NMDA é ativada mais lentamente e a sua inativação é
muito mais lenta. Além disso, a condutância dos receptores NMDA tem uma dependência
com a voltagem mais complicada e o seu comportamento não pode ser reproduzido pelo
modelo padrão de Hodgkin-Huxley. Para modelá-la, é necessário modificar um pouco o
modelo de Hodgkin-Huxley.

O neurotransmissor inibitório GABA ativa dois tipos de receptores, chamados de GABAA


e GABAB. O receptor GABAA é ionotrópico e constitui um canal iônico para o Cl cuja −

condutância se ativa e inativa de maneira relativamente rápida. Já o receptor GABAB é


metabotrópico e produz um aumento mais lento e duradouro da condutância ao K+. As
correntes resultantes (para dentro ou para fora da célula) têm potenciais de reversão em
torno de −75 mV.

Estudos experimentais com o uso da técnica de patch-clamp (ver aula 10), que permite o
registro da atividade de um único canal, mostram que os potenciais pós-sinápticos são
eventos macroscópicos resultantes do comportamento de uma população de canais iônicos
que transitam rapidamente entre os seus estados condutor e o não condutor.

Por causa disso, a geração dos potenciais pós-sinápticos pode ser bem modelada pelo
formalismo de Hodgkin e Huxley, que descreve o comportamento temporal de voltagens e
correntes em termos de alterações em condutâncias (a única exceção é condutância dos
receptores NMDA). Como se trata de sinapses, essas condutâncias são chamadas de
condutâncias sinápticas.
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Segundo o formalismo de Hodgkin-Huxley, a corrente sináptica pela membrana do


neurônio pós-sináptico produzida após a chegada de um potencial de ação ao terminal do
neurônio pré-sináptico é dada por

(1)
onde gsin(t) é a condutância sináptica (que descreve a variação na condutância dos canais
sinápticos na membrana do neurônio pós-sináptico), Vpós(t) é a voltagem de membrana do
neurônio pós-sináptico e Esin é o potencial de reversão (equilíbrio) da sinapse.

Existem várias maneiras de modelar a condutância sináptica gsin(t). Uma maneira muito
popular em modelos de redes de neurônios é assumir que gsin(t) é uma função pré-
determinada de t que vale 0 para t < t0, onde t0 é o instante da chegada do potencial de ação
ao terminal pré-sináptico, e é positiva para t > t0:

(2)
onde 𝑔sin é uma constante cujo valor é o da condutância sináptica máxima para o tipo de
sinapse modelada e a função z(t) é escolhida de forma a reproduzir a variação temporal da
condutância: subida em direção ao valor de pico igual a 1 (para que gsin(tpico) = 𝑔sin )
seguida por decaimento em direção a 0.

As formas funcionais pré-determinadas mais usadas para a função z(t) são:


a) Decaimento exponencial simples:

(3)
que corresponde a um crescimento instantâneo da condutância sináptica de 0 para
𝑔sin em t0 seguido por um decaimento exponencial com constante de tempo τ.

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b) Função alfa (assim chamada porque Rall lhe deu este nome em 1967):

(4)
onde k é uma constante de normalização escolhida para que o valor máximo de z(t)
seja 1. O instante em que z(t) dada por (4) atinge o pico é tpico = t0 + τ, de maneira
que o fator k deve ser e (mostre como exercício). Logo, a função alfa pode ser
reescrita como:

(5)

c) Diferença de duas exponenciais:

(6)
onde τs e τd são constantes de tempo que controlam a subida e a descida da
condutância, respectivamente, e k é um fator de normalização para que o valor
máximo de z(t) seja 1. O instante em que z(t) dada por (6) atinge o pico é,

(7)
de maneira que o fator de normalização é (mostre como exercício):

(8)

A figura abaixo mostra comportamento típicos dessas três formas funcionais para z(t). No
caso do decaimento exponencial simples, τ = 3 ms; no caso da função alfa, τ = 1 ms; e no
caso da diferença de duas exponenciais, τd = 3 ms e τs = 1 ms.

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No caso em que o neurônio pré-sináptico emite um trem de disparos de potenciais de ação,


produzindo uma sequência correspondente de potenciais pós-sinápticos no neurônio pós-
sináptico, neste esquema em que gsin(t) é uma função pré-determinada de t a condutância
sináptica do neurônio pós-sináptico é dada pela soma das funções individuais gsin(t)
resultantes de cada disparo pré-sináptico:

(9)
onde ti são os instantes de chegada dos disparos do neurônio pré-sináptico no terminal pré-
sináptico. Um exemplo de resposta a um trem de disparos pré-sinápticos é dado na figura
abaixo. No exemplo da figura, as condutâncias sinápticas individuais são descritas por
funções alfa (equação 5) com τ = 10 ms e os instantes de chegada dos disparos pré-
sinápticos ao terminal pré-sináptico são 20, 40, 60 e 80 ms.

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Os instantes de tempo em que as funções fixas gsin(t) começam a crescer são os instantes
de chegada dos potenciais de ação ao terminal pré-sináptico e não os instantes de emissão
dos potenciais de ação pelo neurônio pré-sináptico. A função disso é modelar o tempo de
propagação do potencial de ação pelo axônio do neurônio e outros processos que possam
ocorrer no terminal sináptico retardando o início do efeito do disparo pré-sináptico sobre o
neurônio pós-sináptico.

A combinação dos atrasos de condução e sináptico pode ser de vários milissegundos e,


portanto, comparável à duração de um potencial pós-sináptico. Por causa disso, muitos
modelos de redes de neurônios, principalmente para regiões extensas do cérebro, incluem
atrasos na resposta de neurônios pós-sinápticos a disparos dos neurônios pré-sinápticos a
eles.

Foi mencionado acima que a condutância dos canais formados pelos receptores NMDA
(canais NMDA) tem um comportamento diferente das condutâncias dos canais formados
pelos receptores AMPA e GABA. Ela depende da voltagem do neurônio pós-sináptico, o
que faz com que a equação (1), em que gsin só depende de t, não seja apropriada para
modelá-la.

A dependência da condutância dos canais NMDA com a voltagem Vpós do neurônio pós-
sináptico é devida ao fato de que quando Vpós está próxima do seu valor de repouso os
receptores NMDA são bloqueados por íons de magnésio (Mg2+). Quando o neurônio pós-
sináptico é despolarizado, esses íons de magnésio são removidos dos receptores e
permitem a passagem de carga elétrica.

Jahr e Stevens (1990) propuseram, a partir de um ajuste de curvas experimentais, uma


expressão para descrever a fração u(Vpós) de canais NMDA que não estão bloqueados por
íons de magnésio em função de Vpós que tornou-se amplamente utilizada em modelos
computacionais. A expressão deles é:

10
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ó
ó

(10)
onde a = 0,062 mV-1, b = 3,57 mM e [Mg2+] é a concentração extracelular de magnésio.
Em geral, usa-se um valor pré-definido para [Mg2+], por exemplo 1 mM.

A corrente sináptica pelos canais NMDA pode, portanto, ser modelada pela expressão,

ó ó

(11)
com gNMDA(t) dada por (2). Os canais NMDA conduzem íons de cálcio (Ca2+) e cátions
monovalentes (principalmente Na+).

Note que a abertura dos canais NMDA depende tanto da despolarização do neurônio pré-
sináptico (o que faz com que ele emita um potencial de ação) como da despolarização do
neurônio pós-sináptico (para que haja a retirada dos íons de magnésio). Portanto, os
receptores NMDA atuam como detectores de coincidência de atividade nos neurônios pré-
e pós-sináptico. Isso faz com que os receptores NMDA tenham importante papel em
mecanismos de modificação temporal da eficácia sináptica, ou plasticidade sináptica,
como será visto em aulas futuras.

Uma maneira alternativa de modelar sinapses que não assume funções pré-fixadas consiste
em usar algum esquema cinético. Um exemplo simples será dado aqui.

Como feito anteriormente, vamos supor que a condutância de uma sinapse é representada
pela condutância máxima da sinapse (quando todos os canais sinápticos estão abertos) 𝑔sin
multiplicada pela fração de canais sinápticos abertos, s(t), onde s é uma variável com valor
entre 0 e 1.

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A dependência temporal de s é governada pela dinâmica de liberação de


neurotransmissores pelo neurônio pré-sináptico após a chegada de um potencial de ação ao
seu terminal e pela dinâmica de ligação desses neurotransmissores com os receptores
localizados no neurônio pós-sináptico.

Essa dinâmica pode ser modelada por um modelo cinético de dois estados (ver, por
exemplo, Destexhe et al., 1998)
α

R+T TR , (12)

β
onde R representa a quantidade de receptores não-ligados, T representa a quantidade de
transmissores liberada, TR representa a quantidade de receptores ligados a transmissores e
α e β representam as taxas de transição entre os dois estados do sistema.

Este modelo implica que a concentração de receptores ligados a transmissores obedece à


seguinte equação diferencial (considerando que existe um grande número de canais
iônicos e desprezando flutuações estatísticas):

(13)
As concentrações de R e de TR devem obedecer à seguinte equação de conservação:

onde [Rtot] é a concentração total de receptores. Dividindo a equação acima por [Rtot],

(14)
onde r é a fração de receptores não ligados e s é a fração de receptores ligados, que é igual
à fração de canais sinápticos abertos definida acima. Dividindo (13) por [Rtot] e usando a
equação (14), chega-se à seguinte equação diferencial para s(t):

12
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(15)
Esta equação pode ser resolvida exatamente a partir da hipótese de que a liberação de
neurotransmissores ocorre em pulsos quadrados e idênticos disparados sempre que o
potencial no terminal pré-sináptico ultrapassa um dado limiar (por exemplo, 0 mV).

Considerando que um pulso se inicia em t0 e vai até t1 (duração igual a t1 − t0) e que a sua
amplitude é constante e igual a Tmax, podemos dividir o pulso em duas fases distintas: (a)
durante um pulso; e (b) após um pulso. A equação (15) pode ser resolvida analiticamente
para cada uma dessas duas fases. Seja:

a) Durante um pulso (t0 < t < t1): [T] = Tmax;


b) Após um pulso (t > t1): [T] = 0.

Durante o pulso – caso (a) –, a equação (15) fica,

Dividindo-se ambos os lados por (αTmax+β),

Definindo,

(16)
e
1
τ≡
(αTmax + β ) , (17)

pode-se reescrever a equação (15) como,

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(18)
Esta equação tem como solução (lembre-se que ela é válida para t0 < t < t1):

(19)

Após o pulso – caso (b) –, a equação (15) torna-se,

(20)
cuja solução (lembre-se que ela é válida para t > t1) é:

(21)
Segundo este esquema, a condutância sináptica é modelada pela equação,

(22)
e para cada fase de um pulso (durante ou depois dele) s(t) obedece, ou à equação (19), ou à
equação (21).

Da mesma forma, a corrente sináptica associada à condutância acima é dada por:

(23)
onde Vpós é o potencial de membrana do neurônio pós-sináptico, Esin é o potencial de
reversão da corrente sináptica e gsin(t) é a condutância da sinapse dada por (22). Para cada
fase de um pulso, ela é modelada pelas equações (19) ou (21).

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A aproximação de tratar as quantidades de neurotransmissores liberadas como pulsos


quadrados idênticos simplifica bastante a resolução numérica de um sistema de neurônios
acoplados sinapticamente. Ao invés de ter que resolver uma equação diferencial como a
(15) para cada sinapse, basta calcular numericamente a equação (19) ou a (21),
dependendo da fase do pulso em que se esteja, e isto envolve basicamente o cálculo de
exponenciais (que podem ser pré-calculadas e tabeladas para facilitar a eficiência
computacional). É por isso que o uso de funções fixas para modelar as condutâncias
sinápticas é popular entre modeladores de redes de neurônios.

Para maiores detalhes sobre como implementar numericamente o modelo descrito pelas
equações (19) e (21), sugere-se o artigo de Destexhe et al. (1998).

Uma simulação de uma sinapse excitatória entre dois neurônios modelada pelas equações
(19) e (21) foi feita por Giugliano e Arsiero (2006). Uma figura desse artigo é reproduzida
abaixo, mostrando que o modelo captura as propriedades de saturação e somação temporal
quando ocorrem múltiplos eventos pré-sinápticos.

Os modelos de sinapses mostrados acima não incluem efeitos do passado das atividades
dos neurônios pré- e pos-sináptico sobre a eficácia sináptica. Em outras palavras, a
amplitude do potencial pós-sináptico é independente de terem havido ou não no passado
recente outros potenciais sinápticos gerados na mesma sinapse.

Resultados experimentais mostram que muitas sinapses possuem o que se chama de


plasticidade sináptica de curta duração (para diferenciar de plasticidade sináptica de
longa duração, que tem a ver com aprendizado e memória e que será discutida mais
tarde).
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A plasticidade sináptica de curta duração refere-se ao aumento, chamado de facilitação,


ou à diminuição, chamada de depressão, da amplitude do potencial pós-sináptico durante
uma ativação sináptica repetitiva. Ele é chamada de curta duração porque ocorre em
escalas de tempo de milissegundos a minutos, enquanto que a escala de tempo da
plasticidade sináptica de longa duração é bem maior, podendo durar a vida inteira.

A figura abaixo, adaptada de Markran et al. (1998), mostra exemplos de depressão e


facilitação sináptica em neurônios corticais. Disparos repetidos do neurônio pré-sináptico
podem levar à diminuição da amplitude dos potenciais pré-sinápticos (figura da esquerda)
ou ao aumento dessa amplitude (figura da direita). A figura da direita também mostra
porque esse tipo de plasticidade é de curta duração: um disparo pré-sináptico ocorrido um
curto tempo após a sequência inicial provoca um potencial pós-sináptico de amplitude
reduzida em relação ao potencial aumentado do fim da sequência inicial.

Um modelo simples para depressão sináptica é o proposto por Abbott et al. (1997).
Segundo esse modelo, a condutância de uma sinapse é modelada por

(24)
onde z(t) é uma variável que controla a eficácia sináptica. O valor de repouso dessa
variável é tomado como 1, mas sempre que ocorrer uma transmissão sináptica esse valor é
reduzido por um fator constante f (f < 1),
z → fz.
Após a redução, z(t) retorna exponencialmente ao seu valor de repouso com uma constante
de tempo τrec,
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dz (t )
τ rec = 1 − z (t ). (25)
dt

Caso o intervalo entre dois disparos seja grande o suficiente, a variável de controle da
eficácia sináptica voltará ao seu valor de repouso. Com a diminuição do intervalo entre
disparos, isto é, com o aumento da frequência dos potenciais de ação pré-sinápticos, a
variável de controle sofre forte redução. Isto implica em potenciais pós-sinápticos menores
e na consequente depressão pós-ativação.

Este mesmo modelo também pode ser usado para modelar a facilitação sináptica, basta
fazer f > 1. Normalmente, usam-se constantes de tempo τrec diferentes para depressão e
facilitação.

Resultados de simulações da mesma sinapse entre dois neurônios do exemplo anterior


(Giugliano e Arsiero, 2006) sem plasticidade sináptica de curta duração (esquerda), com
depressão sináptica (meio) e com facilitação sináptica (direita) estão mostrados na figura
abaixo.

Com relação às sinapses elétricas, pode-se modelá-las como resistências elétricas


conectando os citoplasmas de dois neurônios. A figura abaixo ilustra o circuito equivalente
correspondente a esse modelo. A sinapse elétrica é modelada como uma junção
comunicante (gap junction) conectando dois compartimentos modelados segundo o
esquema de Hodgkin-Huxley.

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A conexão entre os citoplasmas das duas células é feita por uma resistência ôhmica RGJ.
As resistências variáveis modelando os canais ativos das duas células não estão mostradas
para não sobrecarregar a figura. A figura também ilustra o processo de estimulação de uma
célula por injeção de corrente externa, Iinj, mostrando que parte dela pode escapar pela
junção comunicante e ir para a outra célula.

A corrente passando pela junção comunicante é dada por

(26)
e o potencial de membrana do neurônio 2 pode ser relacionado ao potencial de membrana
do neurônio 1 por um coeficiente de acoplamento k:

V2 = kV1. (27)

Referências

1. Abbott, L. F., Varela, J. A., Sen, K. and Nelson, S. B., Synaptic depression and cortical
gain control. Science, 275:220-224, 1997.
2. Destexhe, A., Mainen, Z. F. and Sejnowski, T. J., Kinetic Models of Synaptic
Transmission. In: Koch, C. and Segev, I. (eds.), Methods in Neural Modeling: From
Ions to Networks, 2nd. Edition. Cambridge, MA: MIT Press, 1998, pp. 1-25.

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3. Giugliano, M. and Arsiero, M., Modeling of biological neuronal networks. In: Akay,
M. (ed.), Wiley Encyclopedia of Biomedical Engineering, New York, Wiley, 2006.
4. Jahr, C. E. and Stevens, C. F., A quantitative description of NMDA receptor channel
kinetic behavior. Journal of Neuroscience, 10:1830-1837, 1990.
5. Markran, H., Wang, Y. and Tsodyks, M., Differential signaling via the same axon of
neocortical pyramidal neurons. Proceedings of the National Academy of Sciences of the
USA, 95:5323-5328, 1998.

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