Você está na página 1de 15

FILIPE MELANCHTHON

LOCITHEOLOGICI

TÓPICOS TEOLÓGICOS, de 1521:


EDIÇÃO CRÍTICA BILÍNGUE, LATIM E PORTUGUÊS

Editor e tradutor
Eduardo G ross

2018
© Editora Sinodal, 2018 A PR ESE N TA Ç Ã O
Rua Am adeo Rossi, 467
Caixa Postal 11
93001-970 São Leopoldo/RS Esta é uma importante e grande obra. Disponibilizamos ao público de língua
Tel.: (51) 3037 2366 portuguesa a prim eira dogmática evangélica da história: as loci communes - tópicos
editora@ editorasinodal.com.br comuns na teo lo g ia -, da autoria de Filipe M elanchthon (1497-1560), que configuram
www.editorasinodal.com.br um a síntese dos assuntos teológicos mais relevantes. Foram publicados pela prim ei­
Produção editorial e gráfica: Editora Sinodal ra vez em 1521. E essa versão que serviu como base da presente tradução e edição,
magistralmente elaborada por Eduardo Gross. Como ocorre aqui, o livro também foi
Publicado sob a coordenação do Fundo de Publicações Teológicas/Programa de intitulado de loci theologici - tópicos teológicos, ou loci praecipui theologici - prin­
Pós-Graduação em Teologia da Faculdades EST. cipais tópicos teológicos.
Tel.: (51) 2111 1400 est@ est.edu.br Melanchthon, nome oriundo da costumeira grecicização dos nomes alemães pe­
Fax: (51) 2111 1411 www.est.edu.br
los humanistas, originalmente se chamava “Schwartzerdt” [“terra preta”]. O nome é de
difícil pronúncia até em alemão, de modo que o próprio Melanchthon deixava, com o
Conselho editorial:
tempo, de utilizar o “ch” e passou a denominar-se de “M elanthon”. Penso que não seja
Prof. Dr. R udolf von Sinner (coordenador)
por isso, mas Melanchthon, apesar do seu grande reconhecimento entre os estudiosos
Prof. Dr. Iuri Andréas Reblin
da Reforma, tendeu a ficar na sombra de Lutero. Essa pessoa tão erudita, inteligente,
Prof.a Dr.a K arin Hellen Kepler Wondracek
trabalhadora, da qual o próprio Lutero dependia na dieta de Worms (1521) para lhe
Prof.a Ms. Selenir Corrêa Gonçalves Kronbauer
dar argumentos para sua defesa, talvez não tenha recebido o devido reconhecimento,
mesmo que teve mais estudantes do que Lutero no início de carreira. Quando chegou à
Universidade de Wittenberg como professor de grego na Faculdade de Filosofia, era um
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
desconhecido e encontrou bastante ceticismo, inclusive da parte de Lutero. Contudo,
M 517 M elanchthon, Filipe após poucas frases de seu primeiro discurso proferido na cátedra, Lutero reconheceu
que “fez um discurso de grande erudição, no melhor dos estilos”1. Melanchthon era
Loci theologici: tópicos teológicos, de 1521 /F ilipe Melanchthon; 14 anos mais novo do que Lutero. E enquanto ele aprendia teologia com Lutero (“dele
[editado e traduzido por] Eduardo Gross. - Ed. crítica, bilíngue. —São aprendi o evangelho”, chegou a afirmar), este aperfeiçoava seu grego com Melanchthon.
Leopoldo: Sinodal;.EST, 2018. Nem por isso logo desenvolveu seu próprio pensamento e estilo.
477 p. ; 16 x 23 cm Pessoa bem mais ponderada, sistemática, irênica e afeita a negociações em bus­
ca de compromissos do que Lutero, vem sendo redescoberto nessa sua habilidade
Edição bilíngue latim e português. de, sem abrir mão do que acreditava ser a verdade evangélica, construir pontes tanto
ISBN 978-85-8194-131-8 entre as tendências no próprio luteranismo como em direção ao catolicismo e aos
reformados, até os suíços seguidores de Zwínglio, fortemente rejeitados por Lutero.
1. História eclesiástica. 2. Luteranismo. 3. Reforma luterana. I. Existe hoje um centro de Estudos em M elanchthon sob a direção de Günter Frank, em
Gross, Eduardo. II. Título. Bretten, local de nascimento do reformador, próxim o à cidade de Karlsruhe. Enquanto
professor em Tübingen, Joseph Ratzinger, hoje papa emérito Bento XVI, realizava
CDU 270.6 seminários de estudos sobre M elanchthon, de quem esperava muito para a promoção
do ecumenismo.
Bibliotecária Débora Zschom ack - CRB 10/1390 O próprio Lutero reconheceu: “Meu espírito é tosco, barulhento e tempestuoso.
Sou o rude derrubador de mato, que precisa abrir picada. O mestre Filipe, no entanto,
passa por ali de maneira refinada e calma, semeia e irriga com prazer [...]”2. Outro

Todos os direitos reservados. Nenhum a parte desta obra poderá ser reproduzida
ou transm itida por qualquer forma e/ou quaisquer meios (eletrônico ou mecânico,
incluindo fotocópia e gravação) ou arquivada em qualquer sistema ou banco de dados 1 Apud SCHE1BLE, Heinz. Melanchthon: uma biografia. Tradução Walter O. Schlupp. São
Leopoldo: Sinodal; EST, 2013. p. 151.
sem permissão escrita da editora. 2 Apud RIETH, Ricardo Willy. O pensamento teológico de Filipe Melanchthon (1497-1560).
Estudos Teológicos, São Leopoldo, v. 37, n. 3, p. 223-235, 1997. à p. 224.
conscriberet, num de mysteriis trinitatis, de filosofava a respeito do mistério da trindade, do
modo incamationis, de creatione activa, {10} et modo da encarnação, de criação ativa {10} e criação
creatione passiva" philosophabatur? At quid agit? passiva? 18 E o que faz? Com certeza trata da
certe de lege, peccato, gratia, e quibus locis solis lei, do pecado, da graça, de cujos únicos tópicos
depende o conhecimento de Cristo. 19 Quantas
Christi cognitio pendet. Quoties Paulus optare se
vezes Paulo recomenda aos fiéis desejarem para
testatur fidelibus locupletem Christi cognitionem. si um abundante conhecimento de Cristo. Pois
Praevidebat {15} enim fore, ut relictis salutaribus previa {15} vir a ser que, tendo sido abandonados
locis, animos converteremus ad frigidas et alienas a os tópicos salvíficos, voltássemos nossos ânimos
Christo disputationes. Itaque nos aliquam (3, b.) para disputas frias e alheias a Cristo. 20 Por isso,
nós (3, b.) delinearemos uma outra lógica desses
delineabimus eorum locorum rationem qui
tópicos, de forma que te recomendem o Cristo,
Christum tibi commendent, qui conscientiam fortaleçam a consciência, {20} encorajem o ânimo
confirment, {20} qui animum adversus Satanam contra Satanás. 21 E a maioria busca somente
erigant. Plerique locos virtutum et vitiorum tópicos das virtudes e dos vícios nas Escrituras, mas
tantum in scripturis requirunt, sed ea observatio essa perspectiva é mais filosófica do que cristã.0
philosophica magis est, quam Christiana. Quod em­ Por que digo isso assim, mais tarde aos poucos
ita dicam, paulo post intelliges. compreenderás.

{86}
{86}
A RESPEITO DAS CAPACIDADES DO SER
DE HOMINIS VIRIBUS ADEOQUE DE LIBERO
HUMANO, OU SEJA, DO LIVRE-ARBÍTRIO.d
ARBÍTRIO. 1 Agostinho e Bernardo escreveram sobre
Scripsere de libero arbitrio Augustinus et o livre-arbítrio. e aquele de fato se retratou, em {5}
Bemardus, et ille quidem sua posterioribus {5} livros posteriores que editou contra os pelagianos,
libris quos adversus Pelagianos edidit multipliciter de suas posições em muitos pontos; Bernardo não
retractavit, Bemardus non est similis sui. Sunt é coerente. Há desse assunto também algo entre
hac de re etiam apud graecos quaedam sed os gregos, mas de modo disperso. 2 Eu, uma vez
que não sigo opiniões humanas, o mais simples
sparsim. Ego, quandoquidem non sequar hominum {10} e diretamente exponho o assunto que com
opiniones et simplicissime, {10} etplanissime o passar do tempo tanto os autores antigos como
rem exponam, quam fere obscurarunt autores os novos obscureceram, porque interpretavam as
tum veteres tum novi, quia sic interpretabantur Escrituras de tal modo a. por outro lado, quererem
scripturas, ut simul vellent tarnen rationis humanae simultaneamente satisfazer o iuízo da razão,
iudicio satisfied. Param civile videbatur docere, humana. 3 Parecia pouco civilizado ensinar {15}
que o ser humano necessariamente peca, parecia
{15} necessário peccare hominem, crudele
cruel repreender a vontade se ela não pudesse se
videbatur, reprehendi voluntatem, si non posset converter do vício para a virtude. Por isso também
se a vitio ad virtutem convertere. Ideo et plura
c A passagem mostra como, para Melanchthon, à filosofia está reservada a questão da ética,
não a do conhecimento das coisas divinas. Trata-se de uma concepção que lhe é fundamental.
Christian Preus (MELANCHTHON, 2014, n. 24) afirma que nessa passagem Melanchthon
está dirigindo uma crítica a Erasmo, particularmente à sua philosophia Christi.
Veja a discussão a respeito do desenvolvimento da concepção do livre-arbítrio nas obras
" et creatione] Ed. 1. et de creatione. [TRADUÇÃO: “A Ia edição repete a preposição ‘de’”.] Posteriores de Melanchthon na Introdução desta edição, no ponto 3.3 dedicado ao tema.

42 43
viribus humanis, quam par erat, tribuere, et mire atribuíram mais à capacidade do ser humano
variarunt cum rationis iudicio {20} vidèrent do que era insto, e oscilaram espantosamente
ubique refragari scripturas. Et in hoc quidem loco, quando viam as Escrituras contestarem o
cum prorsus Christiana doctrina a philosophia, et juízo da razão {20} em toda parte. 4 E, como
humana ratione dissentiat, tarnen sensim irrepsit nesse tópico de fato a doutrina cristã discorda
diretamente da filosofia e da razão humana,
philosophia in Christianismum, et receptum
ainda assim, gradualmente a filosofia se insinuou
est impium (6, a.) de libero arbitrio dogma, et no cristianismo, e o ^ g £ g â iS Ê Í 0 (6, a.) do
obscurata Christi beneficentia per prophanam illam ljvre^u^bítng foi recebido, e os benefícios de
et animalem rationis nostrae sapientiam. Usurpata Cristo foram obscurecidos por essa sabedoria
est vox liberi arbitrii12, a divinis {5} literis, a profana e animalesca da nossa razão.
sensu et iudicio spiritus alienissima, qua videmus 5 O termo livre-arbítrio. totalmente estranho
às letras divinas 15). ao sentido e ao iuízo do
sanctos viros non raro offensos esse. Additum est
espírito, foi assumido, por meio do que vemos
e Platonis philosophia vocabulum Rationis aeque não raramente homens santos serem atacados.
pemiciosum. Nam perinde atque his posterioribus 6 Foi acrescentado da filosofia de Platão o
ecclesiae temporibus {10} Aristotelem pro termo razão, igualmente pernicioso. Pois tal
Christo sumus amplexi, ita statim post ecclesiae como nestes últimos tempos da igreja também
auspicia per Platonicam philosophiam Christiana {10} abraçamos Aristóteles em lugar de
doctrina labefactata est. Ita factum est, ut praeter Cnsto^assim, imediatamente após os inícios
da igreja, a doutrina cristã foi abalada pela
Canonicas scripturas nullae sint in ecclesia {15}
filosofia platônica. 7 Assim ocorreu que não haja
sincerae literae. Redolet philosophiam, quidquid quaisquer escritos genuínos na igreja além das
{4, a.} omnino commentariis proditum est.13Ac Escrituras canônicas {15}. Qualquer coisa
primum quidém in describenda hominis natura non {4, a.} que se tenha produzido como comentários
habemus opus multiplicibüs {20} philosophorum cheira a filosofia. 8 E, em primeiro lugar, para
partitionibus. Sed paucis in duo partimur descrever a natureza do ser humano de fato não
temos necessidade das muitas subdivisões dos
hominem.14 Est enim in eo vis cognoscendi, est et
filósofos. Mas, em poucas palavras, dividimos o ser
vis qua vel persequitur, vel refugit, quae cognovit. humano em duas nartes. Pois há nele a capacidade
Vis cognosendi, est qua sentimus, aut intelligimus, de conhecer e a capacidade pela aual busca ou
(6, b.) ratiocinamur, alia cum aliis comparamus, evita o aue conheceu.e 9 A capacidade de conhecer ^
é aquela com que percebemos ou compreendemos,
(6, b.) raciocinamos, comparamos umas coisas
com as outras,

12 Editt. 1. 2. 7. in marg. verba “Vox liberi abritrii” repetunt. [TRADUÇÃO: “A s edições Ia, 2a,
7a repetem na margem as palavras ‘O termo livre-arbítrio’”.]
13 comentariis proditum est] Ed. 7. comentariorum extant. [TRADUÇÃO: “Em lugar de ‘se
tenha produzido como comentários’, a 7a edição traz ‘é proeminente nos comentários’”.]
14 Editt. 1. 2. 7. in marg.: Duae hominis partes intellectus et voluntas. [TRADUÇÃO: “As
' Conforme Põhlmann (MELANCEITEION, 1997, p. 26-27, n. 36), Melanchthon assume essa
edições Ia, 2a, T trazem na margem: ‘Duas são as partes do ser humano, intelecto e vontade”’.]
divisão da natureza humana em duas partes da Theologia mystica de Gerson.

44 45
{87} {87}
aliud ex alio colligimus. Vis e qua adfectus deduzimos uma coisa a partir de outra. A capacidade
oriuntur, est qua aut aversamur, aut persequimur a nartir da qual se originam os afetosf é aquela
cognita, hanc vim alias voluntatem, alias {5} pela qual ou nos afastamos ou buscamos as coisas
adfectum, alias appetitum nominant. Non puto conhecidas - chamam a essa capacidade algumas
vezes de vontade, outras {5} de afeto, outras de
magnopere referre, hoc loco separare sensus ab
qpetite. 10 Não considero importar demasiadamente
intellectu, quem vocant, et adpetitum sensuum,
separar nesse tópico a percepção do intelecto, como
ab adpetitu superiore. Nos enim de superiore o chamam, e separar o apetite das percepções do
loquimur, hoc est, non modo de eo in quo {10} apetite superior. 11 Pois nós falamos do superior,
fames, sitis, et similes brutorum adfectus sunt, sed isto é, não só daquele em que {10} estão a fome,
de eo in quo amor, odium, spes, metus, tristitia, a sede e semelhantes afetos dos animais, mas
ira et qui ex his nascuntur affectus insunt, ipsi daquele em que se encontram o amor, o ódio, a
voluntatem vocant. Cognitio'5 servit voluntati, esperança, o medo, a tristeza, a ira e os afetos que
ita liberum arbitrium novo vocabulo vocant a partir deles nascem, [o que] aqueles [filósofos]
coniunctam {15} voluntatem cum cognitione, seu chamam de vontade. 12 O conhecimento serve
consilio intellectus. Nam perinde, ut in republica à vontade; assim chamam, com um novo termo,
de livre-arhítrio a vontade conjugada {15} com o
tyrannus, ita in homine voluntas est, et ut senatus
conhecimento, ou com a resolução do intelecto.
tyranno obnoxius est, ita voluntati cognitio, ita ut,
13 Pois tal como um tirano na república, assim
quanquam bona moneat cognitio, respuat tamen
no ser humano há a vontade, e como o senado
earn voluntas, {20} feraturque adfectu suo, ut está sujeito ao tirano, assim está o conhecimento
posthac clarius explicabimus. Rursum intellectum à vontade. Assim que, embora o conhecimento
cum voluntate coniunctum, vocant rationem. Nos recomende boas coisas, a vontade no entanto o
neque rationis, neque liberi arbitrii voce utemur, rejeita {20} e é conduzida pelo seu afeto, como a
sed hominis partes nominabimus vim cognoscendi, seguir explicaremos mais claramente. 14 De novoj}
et vim obnoxiam {25} adfectibus, hoc est amori, intelecto mningado com a vontade eles chamam de
odio, spei, metui, (7, a.) et similibus. Haec oportuit razão. Nós não utilizaremos nem o termo razão nem
monere quo facilius postea indieari posset legis ac o termo livre-arbítrio. mas chamaremos as partes
gratiae discrimen, Imo quo certius etiam cognosci do ser humano de capacidade de conhecer e de
posset, num qua sit penes hominem libertas. Et capacidade suieita aos (251 afetos, isto é, ao amor,
ao ódio, à esperança, ao medo (7, a.) e similares.®
in hac re mirum {5} est, quam operose versati
15 É oportuno chamar atenção para isso, a fim de
sint turn veteres, turn novi. Nos, si quis haec
que adiante possa mais facilmente ser indicada a
calumniabitur, libenter et fortiter tuebimur nostra. distinção entre lei e graça. Ainda mais, a fim de que
Volui enim modo pinguisssime delineare hominem, também mais seguramente se possa conhecer se há
et videor mihi, quantum omnino retulit, de hom in is liberdade em poder do ser humano.
partibus dixisse.

fVèja a discussão relativa à concepção melanchthoniana dos afetos na Introdução à presente


Quae inde ab hoc loco foi. 6, b. lin. 13. usque ad foi. 13, a. lin. 2. leguntur (“Cognitio servit edição, no ponto 3.2 dedicado ao tema.
voluntati non potest quin erumpat.”) perquam mutata habes in Ed. 7. (foi. V, a. lin 15. gMelanchthon se contrapõe a uma visão da razão como livre dos afetos, concebida de uma
usque ad foi. IX, b. lin 22.), vide infra p. 93 sqq. annotationem 23. [TRADUÇÃO: “O que maneira abstrata. Sua antropologia é concreta. Conforme Põhlmann (MELANCHTHON,
se lê daqui desta passagem, folha 6, b. linha 13 até a folha 13, a. linha 2 ( ‘O conhecimento 1997, p. 28, nota 37), ele segue nisso a tradição escotista, embora rejeite a liberdade da
serve à vontade não podes fazer com que não irrompa.’), na 7a edição está extremamente vontade. Trata-se de influência da via nova, adotada por ele durante os estudos em Tübingen,
modificado (folha V, a. linha 15 até folha IX, b. linha 22, cf. abaixo, nota 2 3 ”.] em distinção à via antiqua que representa a apropriação da escolástica tomista daquela época.

46 47
E nesse assunto é admirável {5} quão operosamente
tanto os antigos como os novos se ocuparam.
16 Se alguém depreciar essas coisas, nós com prazer
e vigor defenderemos nossas posições. Pois eu quis
só muito grosseiramente traçar um esboço do ser
humano, e percebo ter dito a respeito das partes do
ser humano somente o/fSànto foi importante.
{10} Pertinet autem ad vim cognoscendi {10} 17 Mas a lei Hiz respeito à capacidade
lex, (4, b.) id est cognitio faciendorum. Ad He conhecer. (4, b.l ela e conhecimento das coisas
vim adfectuum virtus, peccatum. Libertas non que devem ser feitas. A virtude e o pecado dizem
dicitur proprie cadere in partem cognoscentem, resneito à canacidade do^afetos) Não é apropriado
verum ea voluntati obtemperans, hue aut illuc classificar a liberdade na nàrte cognoscente: na
rapitur. Est {15} autem libertas, posse agere, aut verdade, ela, obedecendo à vontade, é forçada em
non agere, posse sic aut aliter agere. Itaque in uma direção ou em outra. {15} 18 No entanto, a
quaestionem vocatur sit ne libera voluntas16, et liberdade é poder agir ou não agir, poder agir de tal
quatenus libera sit. ou qual modo. Assim, coloca-se em questão se a
vontade não é livre, e quão livre ela é.
RESPON. RESPOSTA
Quandoquidem omnia quae 19 Uma vez que todas as coisas que

{88} {88}
eveniunt, necessário iuxta divinam ocorrem, necessariamente ocorrem de acordo com
praedestinationem {20} eveniunt, nulla est .a predestinação divina. {20} nada é liberdade da
voluntatis nostrae libertas. Paul, ad Ro. XI. nossa vontade. 20 Paulo aos Romanos, 11 {v. 36:}
{vs. 36.:} Quoniam ex ipso et in ipso etc. Ad “Uma vez que dEle mesmo e nEle mesmo” etc.
Ephe. 1. {vs. 11.:} Qui operatur omnia secundum Aos Efésios 1 {v. 11:} “Que realiza tudo segundo
consilium voluntatis suae. Mat. X. {vs. 29.:} a decisão da sua vontade”. Mateus 10 {v. 29:}
Nonne duo passeres asse veneunt, et unus ex {25} “Acaso não se vendem dois pássaros por uma
illis non cadet super terram sine patre vestro. (7, b.) moeda? E um único deles {25} não cai sobre a
Obsecro quid hac sententia clarius dici potuit? terra sem vosso pai”. (7, b.) 21 Eu peço: algo
Proverb. XVI. {vs. 4.:} Universa propter semet já pôde ser dito mais claramente do que essa
ipsum operatus est dominus, impium quoque ad sentença? Provérbios 16 {v. 4:} “O Senhor fez
diem malum. Et rursus XX. {vs. 24.:} A domino todas as coisas por causa de si mesmo, também o
{5} diriguntur gressus viri, quis autem hominum ímpio para o dia mau”. E ainda, 20 {v. 24:}: “Pelo
potest intelligere viam suam. Rursum XVI. Senhor são {5} dirigidos os passos do ser humano,
{vs. 9.:} Cor hominis disponit viam suam, dominus porém quem dentre as pessoas pode compreender
autem dirigit gressus eius. Hiere. X. {vs. 23.:} a sua jornada?” Ainda, 16 {v. 9:}. “O coração do
ser humano determina a sua jornada, mas o Senhor
dirige os seus passos”. 22 Jeremias 10 {v. 23:}

16In marg. Editt. 1. 2.: Num voluntas sit libera. [TRADUÇÃO: “Na margem das edições Ia e
2a: “É livre a vontade?”]

48 49
Scio domine, quod non est hominis via eius, {10} “Senhor, eu sei que a jornada do ser humano não é
nec viri est, ut dirigat gressus suos. Praeterea idem dele, {10} nem é [próprio] do homem que ele dirija
docent divinae historiae, Gene. XV. {vs. 16.:} os seus passos”. Além disso igualmente ensinam as
Nec dum completae sunt iniquitates amorreorum. histórias divinas, Gênesis 15 {v. 16:} “Ainda não
estão completas as iniquidades dos amorreus”.
In secundo capite primi libri Regum. {1. Sam.
23 No segundo capítulo do primeiro livro dos Reis
2,25.:} Et non audierunt vocem patris sui, quia {1 Samuel 2.25:} “E não ouviram a voz do seu pai,
voluit dominus {15} occidere eos. Quid similius porque o Senhor quis {15} matá-los”. 24 O que é
casui fortuito, quam quod Saul abit, quaesiturus mais similar a um caso fortuito, do que o fato de
asinas, et ungitur a Samuele, inauguraturque regno. que Saul sai para buscar jumentas, e é ungido por
Rursum in primo regnorum17 cap. X. {1. Sam. Samuel, e é consagrado para o reino? Adiante, no
primeiro [livro] dos Reis, capítulo 10
10, 26.:} abiit cum Saule pars exercitus, quorum
{1 Samuel 10.26:} “Uma parte do exército dos
{20} tetigerat corda deus. In tertio regnorum, reis, aqueles dos quais {20} Deus tinha tocado os
cap. XII. {1. Reg. 12, 15.:} non acquievitrex corações, saiu com Saul”. 25 No terceiro {livro}
populo, quoniam aversatus fuerat eum dominus, dos Reis, capítulo 12 {1 Reis 12.15:} “O rei não
ut suscitaret verbum suum, quod locutus fuerat aquiesceu ao povo, porque o Senhor tinha se
in manu Ahiae Silonitae ad Hieroboam filium afastado dele para que suscitasse a sua palavra que
Nabath. (8, a.) Et quid aliud in nono capite, et tinha sido pronunciada por meio de Aias o silonita
para Jeroboão, filho de Nabate”. (8, a.) 26 E o que
XI. ad Romanos Paulus agit, quam ut omnia quae
mais faz Paulo no capítulo nono, e no 11, [na carta]
fiunt in destinationem divinam referat. Abhorret aos Romanos, do que atribuir à determinação
ab hac sententia iudicium camis seu {5} rationis divina todas as coisas que acontecem? O juízo da
humanae, contra amplectitur earn iudicium Spiritus. carne ou {5} da razão humana tem aversão a esse
(5, b.) Neque enim vel timorem dei, vel fiduciam pensamento, o juízo do espírito, pelo contrário,
in deum certius aliunde disces, quam, ubi imbueris o abraça. (5, b.) 27 Pois não aprenderás nem o
temor de Deus, nem a confiança11em Deus de
animum hac de praedestinatione sententia. An non
maneira mais segura em qualquer outro lugar do
earn ubique {10} in proverbiis inculcat Salomon?
que onde fores tocado no ânimo por essa noção da
ut alias timorem, alias fidem doceat. An non predestinação. Por acaso Salomão não a inculca
inculcat earn in eo libello cui Ecclesiastae titulus {10} nos Provérbios por toda parte? Com a
est? Multum enim omnino refert ad premendam, finalidade de algumas vezes ensinar o temor, outras
damnandamque vezes a fé. 28 Por acaso não a inculca naquele
livrinho cujo título é Eclesiastes? Pois, em geral,

h Confiança é a característica fundamental da fé. D e modo generalizado, a compreensão


expressa no texto é de que a fé que importa para a justificação é aquela que expressa a
17 regnorum i. e. Regum. “Interdum libri Samuelis et Regum iuxta Graecorum fSaaiXiiov confiança na obra redentora de Cristo, nos benefícios outorgados por esta obra. O uso do
[g r e g o : basiléoon\ et paciiAitui’ [g r e g o : basileiõõn\ quod etiam Hieronymus per R e g n o r u m termo fidu cia o demonstra expressamente. A ssim , muitas vezes também fides deve ser
expressit, ita inscribuntur. Cf. Heideggeri Enchirid. bibl. Ed. IV. Tigur. 1713. 8. p. 79.” Augusti compreendido nesse sentido, embora fides também possa ter um sentido mais genérico,
in Append. Ed. Loc. p. 254. [TRADUÇÃO: “Dos reinos, isto é, dos Reis. Ocasionalmente os dependendo do contexto. Outras noções de fé que aparecem no texto são a de assensus,
livros de Samuel e dos reis, são inscritos assim, como os [livros] gregos dos reis e dos reinos, que representa o assentimento humano ao que Deus revela, e a de notitia, que representa a
que também Jerônimo verteu por R e g n o r u m”. Segue a referência à fonte de tal afirmação.] dimensão cognitiva implicada no ato de fé.

50 51
{89} {89}
humanae rationis tum sapientiam tum prudentiam, crer com firmeza que todas as coisas acontecem
por [ação de] Deus diz muito respeito a oprimir
constanter credere, quod a deo fiant omnia.
e condenar tanto a sabedoria como a prudência
An non hoc uno loco efficacissime consolatur da razão humana. 29 Por acaso com esta uma
discipulos Christus, cum inquit, {Luc. 12, 7.:} passagem Cristo não consola os discípulos do
Omnes capilli capitis vestri numerati sunt. Quid modo mais eficaz, quando diz {Lucas 12.7:}
{20} igitur inquies nulla ne est in rebus, ut istorum “Todos os cabelos da vossa cabeça foram
vocabulo utar, contingentia, nihil casus, nihil contados”? 30 Que {20}, pois, dirás, que acaso
há nas coisas alguma contingência, para usar o
fortuna? Omnia necessário evenire scripturae
termo daqueles [pensadores], algum acaso, alguma
docent. Esto, videatur tibi esse in rebus humanis sorte? As Escrituras ensinam que todas as coisas
contingentia, iudicio rationis hie imperandum ocorrem por necessidade. 31 Que seja, para ti
est. (8, b.) Sic Solomon, cum in praedestinationis parece haver contingência nos assuntos humanos,
cogitatione versatus esset, inquit, {Eccl. 8, 17.:} aqui há de se reger com o juízo da razão. (8, b.)
“Et intellexi, quod omnium operum dei nullam 32 Assim Salomão, quando se voltava à reflexão
possit homo invenire rationem eorum {5} quae sobre a predestinação, diz {Eclesiastes 8.17}:
“E compreendi que, de todas as obras de Deus
sub sole hunt.” Sed ineptus videar, qui statim initio
{5} que acontecem sob o sol, o ser humano não
operis de aspérrimo loco, de praedestinatione possa descobrir nenhuma razão delas”. 33 Mas
disseram. Quanquam quid attinet in Compendio parecerei inepto, eu que falei imediatamente no
primo, an postremo loco id agam, quod in omnes início da obra sobre o tópico mais áspero, sobre a
disputationis {10} nostrae partes incidet. Et cum predestinação. Mas o que importa que eu o coloque
de libero arbitrio omnino primo loco agendum em primeiro ou em último lugar no compêndio
aquilo que diz respeito a todas as partes do nosso
esset, qui potui dissimulare sententiam scripturae
debate? 34 {10} E como com certeza deve ser
de praedestinatione, quando voluntati nostrae
tratado do live-arbítrio no primeiro tópico, quem
libertatem, per praedestinationis necessitatem {15} [sou eu para que] pudesse dissimular a sentença
adimit scriptura. Quanquam non omnino nihil puto da Escritura a respeito da predestinação, quando
referre, statim pueriles mentes hac sententia imbui, a Escritura priva a liberdade da nossa vontade em
quod omnia eveniant, non iuxta hominum consilia troca da necessidade da predestinação? 35 {15}
et conatus, sed iuxta dei voluntatem. An non Embora certamente não julgo trazer nada de novo,
com essa sentença instruí de início as mentes
hoc Solomon {20} in illis gnomis quas pueritiae
jovens quanto a que tpdas as coisas acontecem
scripsit, statim a principio monet. Et quod asperior não conforme as decisões e o empenho dos
paulo sententia de praedestinatione vulgo videtur, seres humanos, mas conforme a vontade de
debemus illi impiae Sophistarum theologiae, quae Deus. 36 Por acaso Salomão não admoesta {20}
sic inculcavit nobis (9, a.) rerum contingentiam isso imediatamente desde o princípio naquelas
et libertatem voluntatis nostrae, ut a veritate máximas que escreveu para a juventude? 37 E
que a sentença sobre a predestinação parece um
scripturae molliculae aures abhorreant. (5, b.)
pouco mais áspera para o vulgo, devemos isso à
Proinde ut iis etiam consulamus, quibus haec

52 53
duriora videntur, quae {5} de praedestinatione ímpia teologia dos sofistas que inculcou em nós
diximus, ipsam voluntatis humanae naturam (9, a.) de tal modo a contingência das coisas que
propius contemplabimur, ut intelligant18 studiosi, os suscetiveizinhos ouvidos sentem aversão à
non modo in re theologica falsos Sophistas, verdade da Escritura. (5, b.) 38 Portanto, para que
sed et in naturae iudicio. Dicemus autem de aconselhemos também aqueles para quem essas
praedestinatione {10} paulo post suo loco, coisas que {5} falamos a respeito da predestinação
revellemusque quam licebit brevissime quae hac parecem mais duras, olharemos mais propriamente
de re impie commenti sunt Sophistae. Vallam ait a natureza da vontade humana mesma, para que
Eccius19 quod scholarum sententiam de libero os estudantes entendam os sofistas como errôneos
arbitrio confutarit, plura voluisse scire quam não somente no tema da teologia, mas também
didicisset, scilicet egregie festivus nugator. Quod si no juízo natural. 39 Mas falaremos um pouco
idem nobis obiecerint istae lamiae versari sobre a predestinação {10} depois no seu tópico
próprio, e mostremos bem brevemente quanto
valerá o que os sofistas comentaram impiamente
sobre esse assunto. 40 Eck' diz sobre Vallaj, porque
ele confutou o pensamento sobre o livre-arbítrio
das escolas, que teria querido saber mais do que
tivesse aprendido; isto é, um bobo enormemente
brincalhão. Porque se essas feiticeiras igualmente
objetaram contra nós

{90} {90}
hominem grammatistam in re theologica, Quid que um gramático se ocupe de questão teológica,
responderimus, nisi, ut ne ab auctore rem o que responderemos, senão que não avaliem a
aestiment. Nunc enim non referre {20} quid matéria a partir do autor?k 41 Agora, pois, não se
profiteamur, sed utrum vera sint quae docemus conteste {20} que coisa ensinemos publicamente,
an contra. Neque vero a nobis aliéna censeri mas se são verdadeiras as coisas que ensinamos
debet rerum sacrarum professio, nisi non sumus ou o contrário. De fato, o professar dos assuntos
Christiani, quandoquidem communis omnium esse sagrados não deve ser considerado estranho a nós,
debet Christiana disciplina. a não ser que não sejamos cristãos, uma vez que a
disciplina cristã deve ser comum para todos.

1João Eck (1486-1543), renomado teólogo adversário da Reforma.


' Laurentius Valia (1407-1457). Veja a respeito a discussão no ponto 3.3 da Introdução desta
18 intelligant] Ed. 2. intellegant. [TRADUÇÃO: “A 2a edição traz uma grafia alternativa para a edição, relativa ao tema do livre-arbítrio; cf. a edição Loci de 1559 (MELANCHTHON, 1978,
palavra correspondente a ‘entendam’”.] p. 263), em que Melanchthon acusa Valia de estar submetido a uma visão determinista estóica.
19 In marg. Editt. 1. 2.: Ridiculum scomma Eccii de Valia. [TRADUÇÃO: “Na margem das k Melanchthon se contrapõe aqui ao argumento a d hominem lançado contra si por Eck, de que
edições Ia e 2a: ‘Uma brincadeira ridícula de Eck sobre Vala” ’.] não teria competência para discutir teologia sendo um professor de línguas.

54 55
{9, b. 1} Quod si voluntatis humanae {9, b. 1} 42 Porque se avaliares a
vim, pro naturae captu aestimes, negari non capacidade da vontade humana em relação à
potest iuxta rationem humanam, quin sit in ea compreensão natural, não podes negar de acordo
libertas quaedam extemorum operum, ut ipse com a razão humana que não haja nela alguma
experiris {5} in potestate tua esse, salutare liberdade das obras exteriores, como estar em teu
hominem, aut non salutare, indui hac veste, vel poder tu mesmo experimentares {5} saudar uma
non indui. vesci camibus aut non vesci. Et in hanc pessoa ou não saudar, se vestir com essa roupa
extemorum operum contingentiam defixerunt ou não se vestir, se alimentar com cames ou não
oculos philosophastri, qui libertatem voluntati se alimentar. 43 E nessa contingência das obras
{10} tribuere. Verum quia deus non respicit opera exteriores se fixaram os olhos dos filosofastros
extema, sed intemos cordis motus, ideo scriptura que atribuíram liberdade para a vontade. {10} De
nihil prodidit de ista libertate. Qui extema et fato, poraue Deus não atenta para obras exteriores.
personata quadam civilitate mores fingunt, huius mas para os impulsos intemos do coração, por
modi libertatem docent, {15} nempe philosophi ac isso a Escritura nada proclamou a respeito dessa
recentiores theologistae. .liberdade. Os que concebem os costumes com
{II} Contra, intemi adfectus, non sunt uma certa civilidade exterior e fingida, ensinam
in potestate nostra, Experientia enim usuque uma liberdade desse tipo, {15} naturalmente os
comperimus non posse voluntatem sua sponte filósofos e teologistas mais recentes.
ponere amorem, odium, aut similes adfectus, sed {II} Em oposição a isso, osafetos intemos
{20} adfectus adfectu vincitur, ut quia laesus es ab não estão em nosso poder. Pois pela experiência
eo quem amabas, amare desinis. Nam te ardentius, e pela prática verificamos não poder a vontade
quam quemvis alium, amas. Nec audiam Sophistas, .espontaneamente estabelecer amor, ódio ou afetos
si negent peitinere ad voluntatem adfectus similares, mas {20} que um afeto é vencido
humanos, amorem, odium, gaudium, (6, a.) {10, a.} por outro, assim como porque foste lesado por
moerorem, invidentiam, ambitionem, et similes, aquele que amavas, paras de amar. Pois amas
nihil enim nunc de fame, aut siti dicitur. Quid mais ardentemente a ti do que a qualquer outro.
enim est voluntas, si non adfectuum fons est? Et 45 E não ouvirei os sofistas se negarem pertencer
cur {5} non pro voluntatis vocabulo cordis nomen à vontade os afetos humanos, o amor, o ódio,
usurpamus?20 Siquidem scriptura potissimam a alegria, (6, a.) {10, a.} a tristeza, a inveja, a
hominis partem cor vocat, adeoque earn in qua ambição e assemelhados, pois agora nada se diz
nascuntur adfectus. Fallunt autem scholae cum da fome e da sede. 46 Que é, pois, a vontade,
fingunt voluntatem per naturam suam adversari se não é a fonte dos afetos? E por que {5} não
adfectibus, aut posse ponere adfectum, quoties hoc empregamos em lugar do vocábulo “vontade” o
monet consulitve intellectus. termo “coração”? Uma vez que a Escritura chama
o coração de parte mais importante do ser humano,
e de fato diz a seu respeito que nela nascem os
afetos. Mas as escolas falham quando elaboram
que a vontade esteja por sua natureza em oposição
aos afetos, ou que o intelecto possa estabelecer um
afeto quantas vezes indique ou resolva isso.
20 In marg. Editt. 1. 2.: Cordis vocabulo pro voluntate utendum. [TRADUÇÃO: “Na margem
das edições Ia e 2a: “O vocábulo ‘coração’ deve ser usado em lugar de ‘vontade’”.]

56
{Ill} Qui fit igitur cur saepe diversum {III} 47 O que, então, faz com que nós
ab adfectu homines eligamus? Principio, quod seres humanos muitas vezes escolhamos o oposto do
nonnunquam aliud in opere extemo eligimus, quam afeto? Primeiro, porque algumas vezes escolhemos
quod cupit cor seu voluntas, fieri potest ut adfectu com a obra extema algo diferente em lugar daquilo
vincatur adfectus. que deseja o coração ou a vontade, pode acontecer
que um afeto seja vencido por outro.

m
ut negari non potest quin voluptatum amans sit
{91}
Como não se pode negar que Alexandre da
Alexander Macedo, tarnen quia gloriam magis Macedônia seja um amante dos prazeres; entretanto,
ardet, deligit laborem, voluptates adspematur, {20} aprecia o trabalho e evita os prazeres porque se
non quod eas non amet, sed quod vehementius inflama mais em relação à glória; {20} não porque
amet gloriam. Videmus enim in aliis ingeniis alios não os ame, mas porque ame a glória com mais
regnare adfectus, sua quenque cupidine trahi. In veemência. 48 Vemos, pois, que reinam afetos
sordidis ingeniis dom inate habendi cupiditas. diferentes em diferentes disposições humanas, que
{10, b.} In liberalioribus, iuxtahominum iudicium, cada qual é levado por sua paixão. Em disposições
famae ac popularis gratiae Studium. humanas sórdidas a paixão de nossuir domina.
{1111} Deinde fieri fortasse potest, ut {10, b.} Nas mais liberais, de acordo com o juízo
prorsus contra omnes adfectus deligatur aliquid. humano, o zelo pela fama e pelo agrado popular.
Quod {5} cum fit per simulationem fit, ut cum {IV} 49 Portanto pode talvez acontecer que
quispiam eum, quern ex animo odit, cui ex animo algo seja apreciado de modo a confrontar-se
male vult, benigne, comiter, blande tractat, nulla diretamente com todos os [demais] afetos. O
fortasse certa causa. Is etiam si non sentiat aliquo que {5} quando ocorre, ocorre por simulação,
alio se adfectu vinci, sunt enim ingenia {10} como quando alguém trata benigna, afável e
quaedam adeö blanda, ut etiam eos, quos oderunt, aduladoramente, talvez sem nenhuma causa segura,
palpent. Is, inquam, simulat comitatem in extemo aquele a quem em seu interior odeia, a quem em
opere, in quo secundum naturam videtur esse seu interior quer mal. 50 Aquele, mesmo se não
quaedam libertas. Atque haec est ilia voluntas sentir ser vencido por algum outro afeto (pois
quam nobis stulti scholastici finxerunt21, {15} há certas disposições humanas {10} a tal ponto
Scilicet vim talem, quae utcunque sis adfectus, aduladoras aue baiulem mesmo aqueles a quem
possit tarnen adfectum moderari temperareque, ut odiaram), aquele, digo, simula afabilidade na ação
quom fictitias suas poenitentias docent. Ut ut sis externa, em que, segundo a natureza, parece haver
adfectus, censent voluntati vim esse eliciendi, sic alguma liberdade. 51 E essa é aquela vontade que
os estultos escolásticos elaboraram para nós, {15}
ou seja, uma capacidade tal que, toda vez que
tenhas sido afetado, ela possa, entretanto, moderar
e ordenar esse afeto, como quando ensinam suas
I fictícias penitências. 52 Como quer que tenhas

21 In marg. Editt. 1. 2.: Fictícia voluntas scholasticorum. [TRADUÇÃO: “Na margem das
edições Ia e 2a: “A fictícia ‘vontade’ dos escolásticos”.]

58 59
ipsi loquuntur, {20} actus bonos. Si quem odio sido afetado, decretam a respeito da vontade
habeas, posse voluntatem statuere, quod hunc que ela é uma capacidade, como os mesmos
porro nolit odisse. Sic, quom natura simus impii, dizem, produtora {20} de atos bons. $e tens ódio
deique21a non dico (6, b.) non amantes, sed prorsus de alguém, feles ensinam auel a vontade pode
contemptores, docent isti, posse voluntatem elicere, estabelecer que não auer mais odiá-lo. Assim,
quod {11, a.} deum porro sit amatura. Quaeso te como por natureza somos ímpios - e não digo
mi lector, an non putas insanire, qui talem nobis (6, b.) que não amemos a Deus, mas que
voluntatem finxerint. Atque utinam contingat mihi frontalmente O desprezamos - , aqueles ensinam
Sophista, qui haec calumnietur, {5} ut possim que a vontade, pelo contrário, pode produzir o fato y
illam impiam, stultam, male philosophicam de de aue 111. a.l ela venha a amar a Deus.
voluntate sententiam iusto volumine, et integra 53 Pergunto-te, meu leitor, acaso não julgas estarem
disputatione confutare. Nam cum is qui odit, statuit loucos os que elaboram para nós uma tal vontade?
ponere odium, nisi revera fuerit vehementiore E tomara que um sofista que diga essas falsidades
adfectu {10} victus, plane est fictitia quaedam {5} dispute comigo, para que eu possa confutar
intellectus cogitatio, non voluntatis opus. Si statuai essa sentença ímpia, estulta e filosoficamente má
Paris, ponere Oenones amorem, nisi fuerit victus a respeito da vontade num volume adequado e
revera vehementiore adfectu, fucata fallaxque num debate integralmente dedicado a tal. 54 Pois,
cogitatio intellectus est. {15} Fieri potest ut como aquele que odeia teria decidido criar o ódio, a
diversum imperet cum intellectu cor tuum membris não ser que na verdade tenha sido vencido por um
exterioribus, linguae, manibus, oculis, atque est afeto mais veemente {10}, manifestamente é uma
adfectus animus, quia natura mendaces sumus, certa ideia fictícia do intelecto, não é uma obra da
veluti linguae oculisque imperabat Ioab, ut quam vontade. Caso Páris decida descartar o amor por
blandissime Enone, a não ser que tenha de fato sido vencido
por um afeto mais veemente, trata-se de uma ideia
embelezada e falaz do intelecto. {15} 55 Podes
fazer que o teu coração comande com o intelecto
os teus membros exteriores, a língua, as mãos, os
olhos, de modo diverso de como está o afeto do
espírito, porque por natureza somos mentirosos.
Assim como Joabe comandava com a língua e com
os olhos, a fim de que

{92} {92}
{20} videretur compellare Amasan, cordi vero {20} parecesse compelir Amasa com adulações,
imperare non potest, ut ponat adfectum quem mas não pode comandar o coração, como se quem
concepit. Ponit autem cum vehementiori cupiditate decidiu descartasse o afeto. Mas descarta esse afeto
victus fuerit hie adfectus quo occupatur. pelo qual é possuído quando tiver sido vencido por
um desejo mais veemente.

2la deique] Ed. 1. denique. [TRADUÇÃO: “A Ia edição, em vez de ‘e não digo que não amemos
a D eus’ traz ‘portanto, não digo que não amemos’”.]

60 61
{11, b. V} Non negant adfectus scholae, {11, b. V} 56 As escolas não negam
sed vocant infirmitatem naturae, satis esse si actus o afeto, mas [o] chamam de fraqueza natural,
bastando que a vontade tenha atos elícitos1
elicitos diversos habeat voluntas. At ego nego vim contrários. Mas eu nego haver tal capacidade no
esse ullam in homine, quae serio adfectibus {5} ser humano aue nossa (51 se contrapor seriamente
aos afetos. E iulgo não serem aaueles atos lícitosm
adversari possit. Censeoque actus illos licitos, non
nada mais do aue uma ideia fictícia do intelecto.
nisi fictitiam cogitationem intellectus esse. Nam 57 Pois como Deus iulga os corações, é necessário
cum corda deus iudicet, necesse est cor cum suis ser o coracão com os seus afetos a parte mais
elevada e excelsa do ser humano. Por outro lado,
adfectibus summam ac potissimam hominis partem {10} por que Deus estimaria o ser humano a
esse. Alioqui {10} cur hominem ab imbecilliore partir da parte mais débil, e não antes a partir da
parte deus aestimaret, et non potius a meliore, melhor, se a vontade é até certo ponto diferente
do coração, e melhor e mais forte do que a parte
si qua voluntas est alia a corde, et adfectuum dos afetos? 58 O que aqui responderão os sofistas?
parte melior ac fortior. Quid hie Sophistae Porque se preferíssemos usar o termo “coração”,
{15} que a Escritura emprega, em vez do termo
respondebunt? Quod si vocabulo cordis, {15}
aristotélico “vontade”, facilmente estaríamos a
quod usurpat scriptura, uti maluissemus, quam salvo desses erros tão grosseiros, tão crassos. De
Aristotelico vocabulo voluntatis, facile cavissemus fato, Aristóteles chamava de vontade aquela opção
entre coisas nas obras exteriores, {20} a qual
hos tarn pingues tam crassos errores. Vocabat geralmente é enganadora. 59 Mas que [importam]
quidem Aristoteles voluntatem, delectum ilium para a {7, a.} disciplina cristã as obras exteriores,
rerum in extemis operibus, {20} qui fere mendax se o coração for insincero? Além disso, também o
próprio Aristóteles não produziu aquela concepção
est, sed quid ad {7, a.} Christianam disciplinam de “atos lícitos”11que Scotus elaborou. Mas agora
externa opera, si cor sit insincerum? Praeterea não estou procedendo tanto a fim de {12, a.}
confutá-los, quanto a fim de te ensinar, leitor, o
ipse etiam Aristoteles non prodidit actus illos
que devas seguir. Reconheco haver uma certa
licitos, quos Scotus confinxit. Sed nunc non tam liberdade na escolha exterior das coisas. rnas_nego
ago ut illos {12, a.} confutem, quam ut doceam te frontalmente estarem os afetos internos em n osso
{5} poder. 60 Nem permito haver algum a vontade
Christiane lector quid sequi tu debeas. Fateor in aue nossa se contranor seriamente aos afetos, e
extemo rerum delectu esse quandam libertatem, afirmo essas coisas de fato a respeito da natureza
internos vero adfectus prorsus nego in potestate do ser humano. Pois os que são justificados pelo
espírito, n eles os bons afetos lutam com os maus.
{5} nostra esse, Nec permitto aliquam esse assim como lecionaremos abaixo.
voluntatem quae adfectibus adversari serio possit.
atque haec quidem de hominis natura dico, Nam
1Atos produzidos pela própria vontade, conceito escolástico. Cf. TOMÁS DE AQUINO, 2008,
qui spiritu iustificati sunt, in iis adfectus boni cum H) 2, q. 81, art. 1.
malis pugnant, sicut infra docebimus. mNeste ponto, a edição de Stupperich (MELANCHTHON, 1978, p. 29) adota uma leitura do
texto latino distinta da utilizada para a presente tradução. Ao invés de “lícitos”, sua edição
traz “elícitos”, em harmonia com o termo utilizado várias vezes no contexto. A s traduções
alemã, espanhola e inglesa consultadas também seguem a leitura da edição de Stupperich.
” Cf. nota m, acima.

62 63
{10} {V} Praeterea quid attinet iactare {10} {V} 61 Além disso, o aue importa
extemorum operum libertatem, cum cordis puritatem ostentar a liberdqde das obras exteriores quando
deus requirat. Pharisaica prorsus traditio est, quidquid Deus reauer/a nurefea do coracão? É uma tradição
de libero arbitrio, de iustitia operum stulti homines frontalm entd farisaicaSaualauer coisa que pessoas
et impii conscripserunt. {15} lam ubi adfectus paulo estultas e ímp't»s'cxnnpuseram sobre livre-arbítrio
vehementior fuerit, fieri non potest quin erumpat, id e sobre iustica das obras. (15} 62 Já onde o afeto
quod dici solet. Naturam licet expellas fiirca, tamen tiver sido um pouco mais forte, não podes fazer
usque recurret. Iam et quam multa fiunt a nobis com que não irrompa, é o que costuma ser dito:
et in speciem optima, et quae nos ipsi pro bonis “Podes expulsar a natureza com um forcado, mas
iudicamus, {20} quod turpem adfectum non videmus só até que ela retome”. Agora, quantas coisas são
unde proficiscitur opus. Est enim via quae videtur, realizadas por nós, tanto muito boas na aparência
inquit Solomon {Prov. 14, 12.} homini bona, cuius quanto por nós mesmos consideradas como boas,
extrema ducunt ad mortem. Et cor hominis pravum et {20} cujo afeto torpe de onde a obra se origina não
inscrutabile esse dicit Hiere- enxergamos. 63 “Pois há um caminho que parece
bom ao ser humano”, diz Salomão {Provérbios
14.12}, “cujos fins conduzem à morte”. E “o
coração do ser humano é falho e inescrutável”, diz
Jeremias,

{93} { 12, b.} {93} {12.b}


miaspropheta {17, 9.}. Et David, {Ps 18, 13.} o profeta {17, 9.}. E Davi, {Salmo 18.13} “Os
Delicta quis intelligit. Et {Ps. 24,7.:} ignorantias delitos, quem compreendeu?” E {Salmo 24.7:}
meas ne memineris. Adeo ad multa adfectus “não te lembres de offiíBàs ignorâncias”.
rapit coecos homines, quae iudicare plane non 64 Efetivamente, o afçto cxmduz os homens
possumus. Proinde Christianam {5} mentem cegos a muitas coifesTjue não podemos avaliar
oportet spectare, non quale sit opus in speciem, claramente. Portanto {5} importa que a mente
sed qualis apud animum adfectus sit. Non qualis cristã observe não qual seja a obra na aparçnçia,
est operum libertas, sed num22 qua sit adfectuum mas qual seia o afeto iunto ao ânimo. Não qual
libertas. Praedicent liberi arbitrii vim Pharisaei é a liberdade das obras, mas sim ernNue esteja a
scholastici. Christianus {10} agnoscet nihil minus liberdade dos afetos. 65 Os fariseus escolásticos
in potestate sua esse, quam cor suum. Atque aue nreguem a capacidade 5o livre^arbítrio. O
utinam viderent stulti scholastici quot animarum cristão {10} reconhece que não há nada menos em
„ millia enecarint pharisaica sua deuterosi de libero seu poder do que o seu coração. E tomara que os
arbitrio. Dicemus autem de adfectibus plura {15} estultos escolásticos percebam quantos milhares de
mox, ubi de peccato originali agemus. almas destruíram com sua interpretação0 farisaica
sobre o livre-arbítrio. Mas diremos mais coisas
sobre os afetos {25} adiante, onde trataremos do
pecado original.

22 num] Ed. 2. nun. [TRADUÇÃO: “A 2a edição tem uma grafia alternativa na palavra latina ‘Deuterosi” é derivação de termo grego que significa na antiguidade a tradição oral dos
‘num’, partícula interrogativa não traduzida literalmente nesta versão”.] rabinos (cf. Mishná).

64 65
(7, b.) SUMMA. SÍNTESE.
Si ad praedestinationem referas hum anam 66 Se referires a vontade humana à
voluntatem nec in extemis nec in intemis operibus nredestinacão. nem nas obras exteriores nem nas
ulla est libertas, sed eveniunt omnia {20} iuxta interiores há qualquer liberdade, mas todas as,
destinationem divinam. coisas ocorrem de acordo com a destinacão divina..
67 Se referires a vontade às obras
Si ad opera externa referas voluntatem,
exteriores, parecerá haver uma certa liberdade para
quaedam videtur esse iudicio naturae libertas. o iiiízo natural.
Si ad adfectus referas voluntatem, nulla 68 Se referires a vontade ao afeto,
plane libertas est etiam naturae iudicio. claramente não há nenhuma liberdade, mesmo para
Iam ubi adfectus coeperit furere et o juízo natural.
aestuare, cohiberi non potest quin erumpat.23 69 Já onde o afeto tiver começado a
enfurecer-se e a inflamar-se, não podes impedir
que irrompa. {OBS. EDITOR BRASILEIRO: CF.
{SEGUE TEXTO CONSTANTE NA NOTA 23 ' NOTA 23}
DA FONTE DA TRADUÇÃO}
Quae in Ed. 2. a nobis h. 1. repetita a fol. 6, b. lin.
{SEGUE A TRADUÇÃO DO TEXTO
13. med. ad fol. 13, a. lin. 2. leguntur (“Cognitio
CONSTANTE NA NOTA 23 DA FONTE DA
servit voluntati non potest quin erumpaf ’ TRADUÇÃO} O que se lê na 2a edição da folha 6,
perquam mutata habes in Ed. 7. fol. V, a. lin. 15. ad b. linha 13 (meio) até a folha 13, a. linha 2. foi por
fol. IX, b. lin. 22. hoc modo: nós repetido neste lugar (“O conhecimento serve à
Sic mihi pinguissime discerni partes vontade... não podes fazer com que não irrompa”);
hominis posse videntur. Caeterum nomenclatura tens isto mudado na 7a edição folha V, a. linha 15
partium variat, Aristotelicum vulgus intellectum até a folha IX, b. linha. 22 deste modo:
et voluntatem vocat. Theologi quidam veteres, Assim me parece que em grandes traços
voluntatem, cum consilio intellectus coniunctam, possam ser distinguidas as partes do ser humano.
liberum arbitrium nuncupavere, petito et hoc A nomenclatura dessas partes varia. A massa
ab Aristotelicis vocabulo, volueruntque penes aristotélica nomeia o intelecto e a vontade. Certos
voluntatem regnum esse, Intellectum prospicere, teólogos antigos chamaram de livre-arbítrio a
vontade conjugada com a decisão do intelecto,
consulere, monere, quae videtur, adeoque servire
tendo tomado também esse termo dos aristotélicos,
voluntati. Rursum Platonici vocarunt Rationem e quiseram que houvesse um reino da vontade para
intellectum coniunctum cum voluntate, ita ut buscar, consolar e admoestar o intelecto, o que
priores tribuantur intellectui, qui voluntatem in parece de fato servir à vontade. Os platônicos, por
officio contineat. Nos neque liberi arbitrii neque sua vez, chamaram de razão o intelecto conjugado
rationis nomine utemur, ne qua d |ic t> iß o X L a [ g r e g o : com a vontade, assim como os anteriores atribuem
amphibolía] lectorem moremur. Est autem hoc loco ao intelecto que ele em atividade abarca a vontade.
potissimum spectandum, quatenus intellectus vis, Nós não usaremos nem o termo livre-arbítrio nem
quatenus voluntatis impetus pateat. razão, para que não retardemos o leitor com essa
ambiguidade. Mas principalmente nesse tópico
deve ser observado até que ponto é evidente a
capacidade do intelecto e até que ponto o é o
23 O longo texto seguinte desta nota seguirá na coluna do texto principal acima, conforme
indicação, para possibilitar visualização paralela da sua tradução. Para compreensão do texto
ímpeto da vontade.
desta nota, cf. nota 15.]

66

Você também pode gostar