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DIREITO PROCESSUAL PENAL I

Prof. Bruno Galvão

PROVA PENAL

1. Considerações Gerais

O Código de Processo Penal, a partir do Título VII, contemplou um


conjunto de regras que regulamentam a produção de provas no âmbito do
processo criminal, que são:
a) Perícias em geral (ars. 158 a 184), com modificações da Lei nº
11.690/2008;
b) Interrogatório do acusado (arts. 185 a 196), com alterações das
leis nº 10.792/2003 e 11.900/2009;
c) Confissão (art. 197 a 200);
d) Perguntas ao ofendido (art. 201), com redação determinada pela
Lei nº 11.69/2008;
e) Testemunhas (arts. 202 a 225), com as modificações das Leis nº
11.690/2008 e 11.900/2009;
f) Reconhecimento de pessoas e coisas (arts. 226 a 228);
g) Acareação (arts. 229 a 230);
h) Documentos (arts. 231 a 238);
i) Busca e Apreensão (arts. 240 a 250).

A Lei Adjetiva Penal não pode ser considerada de forma limitativa com
relação aos meios de prova, tanto que este rol não é taxativo, devendo
ser aceito meios de provas atípicos ou inominados, em prol da verdade real.

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1.1. Conceito e Finalidade da Prova

Prova é o conjunto de elementos produzidos pelas partes ou


determinados pelo juiz visando à formação do convencimento quanto a atos,
fatos e circunstâncias.
No Processo Penal, a produção de prova objetiva auxiliar na formação
do convencimento do juiz quanto à veracidade das afirmações das partes
em juízo (Objetivo da prova).
O Objetivo da prova, acima descrito, não se confunde com o Objeto
da prova, que são os fatos que, influindo na apuração da existência ou
inexistência de responsabilidade penal, são capazes de gerar dúvida no
magistrado, e por isso exigem a devida comprovação.
Fatos que não necessitam de comprovação:
a) Fatos Axiomáticos – são aqueles considerados evidentes, que
decorrem da própria intuição, gerando grau de certeza irrefutável, ex:
A prova da putrefação dispensa a prova da morte;
b) Fatos Notórios – assim considerados os que fazem parte do
patrimônio cultural do cidadão comum, de conhecimentos médios, ex:
Cargo Executivo – Prefeito, moeda nacional, feriado nacional;
c) Presunções Legais – são juízos de certeza que decorrem da lei e
que se classificam em absolutas (jure et de jure) e relativas (juris
tantum);
d) Fatos Inúteis – são os que não possuem qualquer relevância na
decisão da causa, dispensando, inclusive, a análise pelo julgador, ex:
as preferências sexuais do réu acusado por roubo.

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OBS – os fatos incontroversos, aqueles admitidos pelas partes por


não terem sido refutados ou impugnados pelo acusado, não dispensam a
prova.

1.2. Classificação das Provas

Quanto ao objeto:

a) Provas diretas – são aquelas que por si só demonstram o próprio fato


objeto da investigação;
b) Provas indiretas – são aquelas que não demonstram, diretamente,
determinado ato ou fato, mas que permitem deduzir tais
circunstâncias a partir de um raciocínio lógico e irrefutável.

Quanto ao valor:

a) Provas plenas – são aquelas que permitem um juízo de certeza


quanto ao fato investigado, podendo ser utilizadas, inclusive, como
elemento principal na formação do convencimento do juízo acerca da
responsabilidade penal;
b) Provas não-plenas – são aquelas inseridas na condição de provas
circunstanciais, podem reforçar a convicção do magistrado quanto a
determinado fato, não podendo, porém, ser consideradas como
fundamento principal do ato decisório.

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Quanto ao sujeito:

a) Provas reais – são aquelas que não resultam, diretamente, da pessoa,


mas de algo externo e que também comprova a existência do fato;
b) Provas pessoais – são aquelas que decorrem da pessoa.

1.3. Princípios Gerais das Provas

I – Princípio do contraditório: toda prova realizada por uma das partes


admite a produção de uma contraprova pela outra;

II – Princípio da comunhão: uma vez trazidas aos autos, as provas não


mais pertencem à parte que as acostou, mas sim ao processo, podendo,
desse modo, ser utilizada por qualquer dos intervenientes, seja o juiz, sejam
as demais partes. Há divergências quanto à dispensa de testemunha
(art. 401, § 2º do CPP redação dada pela Lei nº 11.719/2008).

III – Princípio da oralidade: tanto quanto possível, as provas devem ser


realizadas oralmente, em presença do juiz, sempre em conformidade com
determinação legal.

IV – Princípio da auto-responsabilidade das partes: por meio deste


princípio, infere-se que as partes assumirão as conseqüências de sua
inatividade, erro ou negligência.

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V – Princípio da não auto-incriminação: é a inexigibilidade da produção


de provas contra si mesmo.

1.4. Sistemas de apreciação de provas

Sistema étnico ou pagão


Sistema religioso ou ordálio
Sistema legal, tarifado ou formal
Sistema do livre convencimento ou persuasão racional
Sistema da íntima convicção

1.4.1. Sistema do Livre Convencimento

Está previsto no art. 155, caput, do CPP, com nova redação dada pela
Lei nº 11.690/2008, ao dispor que “ o juiz formará sua convicção pela livre
convicção da prova produzida em contraditório judicial, não podendo
fundamentar sua decisão exclusivamente nos elementos informativos
colhidos na investigação, ressalvadas as provas cautelares, não repetíveis e
antecipadas”. A partir da adoção desse sistema decorrem duas
conseqüências:
a) Ausência de limitação quanto aos meios de prova;
b) Ausência de hierarquia.

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1.4.2. Sistema da íntima convicção e Sistema da prova tarifada

Muito embora o Código de Processo Penal tenha adotado o sistema


do livre convencimento, existem algumas situações em que o nosso
ordenamento jurídico pátrio adotou o sistema da íntima convicção, onde o
julgador possui total liberdade na formação de seu convencimento,
dispensando qualquer motivação, como nos julgamentos do Tribunal do
Júri, bem como há casos em que se opera o sistema da prova tarifada, em
que a lei estabelece o valor da prova, não possuindo o juiz o mínimo de
discricionariedade para decidir, como no caso de prova da morte (certidão
de óbito) e prova de estado das pessoas (certidão de casamento).

1.5. Ônus da Prova

Encontra-se disposto no art. 156, caput, 1ª parte, do CPP, com


redação determinada pela Lei nº 11.690/2008, que “a prova da alegação
incumbirá a quem a fizer”, portanto, nesse contexto, caberá a acusação
provar a existência do fato imputado e sua autoria, elementos subjetivos de
dolo e culpa, a existência de circunstâncias agravantes e qualificadoras, e,
em contrapartida, caberá a defesa provar eventuais causas excludentes de
ilicitude, culpabilidade ou tipicidade, circunstâncias atenuantes e minorantes
que, por ventura, tenha alegado.

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1.5.1 Produção antecipada de provas ex ofício pelo juiz

A Lei nº 11.690/2008 trouxe uma inovação ao art. 156, 2ª parte,


incisos I e II do CPP, ao dispor que o juiz poderá, de ofício, “ordenar,
mesmo antes de iniciada a ação penal, a produção antecipada de provas
consideradas urgentes e relevantes, observando a necessidade,
adequação e proporcionalidade da medida, assim como determinar, no
curso da instrução ou antes de proferir sentença, a realização de diligências
para dirimir dúvidas sobre ponto relevante”.
Questiona-se a doutrina, se tal possibilidade dada ao magistrado
ofenderia o sistema processual acusatório, adotado pela Constituição
Federal de 1988, que se caracteriza pela distinção absoluta entre as funções
de acusar, defender e julgar, tendo a posição predominante decidido ser
possível a produção antecipada de prova de ofício, em virtude do princípio
da verdade real, não podendo o juiz ser uma figura estática diante dos
acontecimentos patrocinados pelas partes.
Deste modo, seguindo esta linha de raciocínio, se entende que o art.
156 por sua abrangência de redação deve ser interpretado de forma que
torne compatível o sistema acusatório e o princípio da verdade real, por isso,
não se admite que o juiz possa determinar a produção de provas antecipada
a qualquer tempo e segundo seu livre arbítrio (ex: determinar uma
interceptação telefônica a partir de simples noticia publicada na imprensa).
Assim, existem alguns requisitos que condicionam a produção
antecipada de provas ex officio pelo juiz, são eles:

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a) Presença fumus boni iuris (externado pelos indícios de autoria


e materialidade) e periculum in mora (demonstrado na
relevância e urgência da medida)
b) Existência de investigação em andamento, presidida tanto
pela autoridade policial quanto pelo Ministério Público
c) Necessidade que haja um expediente ou procedimento sob
análise judicial (representação pela preventiva, requerimento
de busca e apreensão, etc.)
d) Estar demonstrada a necessidade, a adequação e a
proporcionalidade da medida probatória.

1.6. Valoração da Prova Penal

1.6.1. Critério de valoração

Conforme já visto, o sistema adotado pelo CPP foi o do livre


convencimento do juiz, sendo assim, a regra geral é que não está o juiz
vinculado a valores predeterminados em lei, podendo valorar a prova como
bem entender, bastando que a decisão seja fundamentada. No entanto,
existe no código determinadas situações que limitam ou vinculam o juiz na
análise da prova, aplicando-se, neste caso, o sistema da prova tarifada,
a qual existem dois tipos:

a) Tarifação Absoluta – onde o juiz não possui a mínima liberdade na


formação da sua convicção, ficando restrito aos termos ditados em
lei, como nos casos do art. 62 do CPP (Certidão de óbito), art. 92

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do CPP (suspensão do processo por questão prejudicial), art. 155,


parágrafo único, do CPP (certidão de casamento) e a Súmula 74
do STJ (prova da menoridade do individuo);

b) Tarifação Relativa – quando o juiz, embora esteja vinculado a


critérios de valoração predefinidos em lei, não fica totalmente
limitado, como no art. 158 do CPP (obrigatoriedade do exame de
corpo de delito) e o art. 197 do CPP (relatividade da confissão).

1.6.2. Necessidade de exame conjunto das provas

Nenhuma prova será, por si só, suficiente para fundamentar


isoladamente a convicção do julgador, devendo integrar um conjunto
objetivo (prova documental, pericial), subjetivo (testemunhas,
reconhecimentos, palavra da vítima, acareações, confissões) e
circunstancial (indícios e deduções), por isso, há o entendimento
doutrinário de que o valor das provas é relativo, por ser necessária a sua
apreciação em conjunto.

1.6.3. Prova emprestada

Conceitua-se como sendo prova emprestada, aquela que é produzida


em processo distinto e é apresentada documentalmente em outro processo
visando comprovar determinado fato. Para ser admitida é preciso que o
processo original tenha envolvido as mesmas partes e que seja a prova
submetida ao contraditório.

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Estando ausente estes requisitos, a prova emprestada perderá


substancialmente o seu valor probatório, devendo ser considerada como
simples indício.

1.7. Provas Ilegais

A expressão prova ilegal corresponde a um gênero, do qual fazem


parte três espécies distintas de provas: as provas ilícitas, as provas
ilícitas por derivação e as provas ilegítimas.

1.7.1. Provas Ilícitas

Definidas pelo art. 157, caput, do CPP, são as provas obtidas em


violação a normas constitucionais ou legais, devendo-se, porém, entender
por “legais” como violação indireta a constituição.
São exemplos de afrontamento direto do texto constitucional: a
Interceptação telefônica realizada sem ordem judicial (art. 5º, XII, CF/88), a
prova obtida mediante violação de correspondência lacrada (art. 5º, XII,
CF/88), a gravação ambiental de som e imagem no interior de residência
privada, mediante a utilização de aparelho eletrônico clandestinamente (art.
5º, X, CF/88), a busca e apreensão domiciliar sem ordem judicial (art. 5º,
XI, CF/88), interrogatório policial do flagrado sob coação (art. 5º, LXIII,
CF/88).

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Por outro lado, considera-se como afrontamento indireto: o


interrogatório judicial do réu sem a presença de seu advogado (art. 185 do
CPP e indiretamente o 5º, LV, CF/88) , o interrogatório judicial do réu sem o
direito de entrevista reservada (art. 185, § 2º do CPP e indiretamente o 5º,
LV, CF/88) e o interrogatório judicial do réu sob coação (art. 186 do CPP e
indiretamente o 5º, LXIII, CF/88).
No atual regramento determinado pela Lei nº 11.690/2008, estabelece
o Estatuto Adjetivo que as provas ilícitas deverão ser desentranhadas dos
autos (art. 157, caput) e que uma vez preclusa a decisão de
desentranhamento da prova declarada inadmissível, esta será inutilizada
por decisão judicial, facultado as partes acompanhar o incidente (art.
157, § 3º).
Questão polêmica é a possibilidade de desentranhamento da prova ilícita,
pois afastaria a possibilidade acenada há longo tempo pela doutrina e
jurisprudência de que a prova ilícita pode ser utilizada em favor do réu,
quando for a única prova da sua inocência. Buscando harmonizar o
caput com o § 3º do art. 157, tem-se entendido que a prova reconhecida
como ilícita por decisão transitada em julgado deverá ser
obrigatoriamente desentranhada (art. 157, caput), facultando-se,
porém, ao juiz decidir por sua inutilização ou não (art. 157, § 3º).

1.7.2. Provas Ilegítimas

São aquelas produzidas a partir da violação de normas de natureza


eminentemente processual, ou seja, normas que não produzem
qualquer reflexo em nível constitucional, como no caso das perícias

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realizadas por apenas um perito não-oficial (art. 159, § 1, do CPP) ,


reconhecimento judicial realizado sem observância das formalidades do art.
226 do CPP e juntada nos autos de notícia jornalística e declarações de
testemunhas, informando a morte do réu (art. 62 do CPP).

1.7.3. Provas Ilícitas por derivação

São provas que, embora lícitas na própria essência, decorrem


exclusivamente de prova considerada ilícita ou de situação de ilegalidade
manifesta ocorridas anteriormente à sua produção, restando, portanto,
contaminadas (Teoria da Árvore dos Frutos Envenenados).
A Lei nº 11.690/2008 deu nova redação ao art. 157, § 1º do CPP e
vedou expressamente as provas ilícitas por derivação, corroborando
entendimento antigo da jurisprudência de que uma prova contaminada pela
ilicitude irá afetar todas as outras que tenham sido derivadas direta ou
indiretamente por ela.
No entanto, há algumas exceções em que estas poderão são elas:
a) Fonte independente – quando a prova não tiver qualquer nexo
de causalidade com a prova considerada ilícita (ex: testemunha
referida antes de ser descoberta por interceptação telefônica ilícita)
b) Limitação da contaminação expurgada – quando um
acontecimento posterior expurga, afasta, ilide o vício (confissão de
preso em flagrante ilegalmente, confirmada na fase judicial)
c) Descoberta inevitável – quando se evidencie que a prova seria,
inevitavelmente, descoberta por meios legais (delegado tortura
preso para descobrir o local do corpo e ao chegar no local a corpo

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já tinha sido descoberto por outra delegacia através de mandado


judicial de busca).

1.7.4. Utilização da prova ilícita pro reo e pro societate

Diante do que foi exposto, sabe-se que a prova ilícita é uma espécie
do gênero provas ilegais e não podem ser utilizadas no processo criminal
como fator de convicção do juiz, tratando-se, enfim, de uma limitação
constitucional (art. 5º, LIV) ao sistema da livre convencimento estabelecido
no art. 155 do CPP.
Entretanto, apesar dessa proibição constitucional, a doutrina e a
jurisprudência majoritária há tempos tem considerado ser possível a
utilização das provas ilícitas em favor do réu (pro reo) quando se tratar da
única forma de absolvê-lo, em face do princípio da proporcionalidade o qual
dispor que: “nenhum direito reconhecido na Constituição pode
revestir-se de caráter absoluto”, possibilitando, assim, que se analise
diante da colisão de direitos fundamentais, qual é o que deve ser protegido
pelo Estado.
Os defensores desta posição defendem que o texto constitucional não
se coaduna com o erro judiciário, portanto, não se trata de considerar a
prova ilícita como lícita por ser usada em favor do réu, já que persiste a
ilicitude da prova, sendo apenas considerada como fator de convicção do
magistrado a fim de evitar uma injustiça.
Quanto à utilização da prova ilícita em favor da sociedade (pro
societate) a maioria da doutrina e da jurisprudência tende em não aceitar
o princípio da proporcionalidade como fator capaz de justificar a

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utilização da prova ilícita para condenar o réu, ainda que se trate do único
elemento probatório passível de conduzir a condenação.

1.7.5. Provas ilegítimas pro reo e pro societate

Não há como se estabelecer para as provas ilegítimas o mesmo


raciocínio aplicado às provas ilícitas, já que importam em violação a normas
de direito eminentemente processuais e, portanto, a verificação da
natureza da nulidade (absoluta ou relativa) é que definirá a possibilidade
de sua utilização, senão vejamos:

I) Nulidade absoluta – não poderá a prova ser utilizada em


qualquer hipótese, já que são sempre insanáveis.
II) Nulidade relativa – poderá ser utilizada se for sanada em tempo
oportuno.

1.8. Interceptações telefônicas

A Constituição Federal, através do art. 5º, XII, protege as conversas


telefônicas, dispondo que: “são invioláveis o sigilo da correspondência e das
comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas, salvo
neste último caso mediante ordem judicial na forma da lei”.
Desta forma, a Carta Magna estabelece que são invioláveis as
comunicações telefônicas, no entanto, prevê uma exceção, permitindo que a
comunicação telefônica seja violada mediante ordem judicial.

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A priori, cabe destacar que a expressão interceptação telefônica lato


sensu trata-se de um gênero, que se subdivide em três espécies distintas,
que são:

I) Interceptação telefônica stricto sensu – quando um terceiro


viola a conversa telefônica de duas ou mais pessoas, registrando-
as ou não, sem que nenhum dos interlocutores tenha
conhecimento da presença do agente violador.

II) Escuta telefônica – quando um terceiro viola a conversa


telefônica mantida entre duas ou mais pessoas, sendo do
conhecimento de um ou de alguns dos interlocutores de que s
diálogos estão sendo captados.

III) Gravação telefônica – quando um dos interlocutores registra a


conversa que mantém com outra pessoa, sem que haja a
intervenção de terceiros.

A doutrina e a jurisprudência consolidaram o entendimento de que o


art. 5º, XII, da CF/88, alcança somente as interceptações strito sensu e as
escuta telefônicas, não tutelando a gravação telefônica, por não haver
nesta espécie a figura de terceiro violando a conversa telefônica, não se
podendo considerar violação a atitude de um dos interlocutores gravar o
diálogo que mantém com outro.

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IMPORTANTE – havia uma grande controvérsia acerca do valor


probatório da gravação telefônica, por não estarem protegidas no art. 5º,
XII, da CF, onde, de um lado, o Supremo Tribunal Federal defendia que
independente de ordem judicial, as gravações sempre seriam meios ilícitos
de prova, por violar o direito da intimidade protegido pelo art. 5º , X,
da CF, já que o interlocutor que tem ciência da gravação poderia induzir o
outro a falar coisas que não desejaria ou dizer em sentido diverso do que
diria se soubesse que estava sendo gravado. Já a posição do Superior
Tribunal de Justiça sempre foi no sentido de que a gravação de uma
conversa por um dos interlocutores telefônicos, por si só, não viola o
direito constitucional à intimidade, devendo tal meio de prova ser
considerado lícito, mesmo se perpetrado sem autorização judicial.
Atualmente o STF corrobora do entendimento do STJ, predominando
de forma quase absoluta também na doutrina, o entendimento de que as
gravações telefônicas são meios lícitos de prova, mesmo sem ordem
judicial, entretanto, não podem ser obtidas com traição de confiança,
cuja violação acarreta a ilicitude da gravação, podendo decorrer das
relações intersubjetivas (esposa) ou profissionais (psiquiatra), conforme
Informativo 324/2007 do STJ.

1.8.1. A extensão aplicativa da Lei das Interceptações Telefônicas –


Lei nº 9.296/96

A Lei nº 9.296/96 surgiu com o objetivo de estabelecer as condições


nas quais será possível o deferimento de ordem judicial para a violação de
conversas telefônicas, não alcançando as gravações telefônicas.

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Assim, tratando-se a violação do sigilo telefônico de uma medida


cautelar, determinada inaudita altera pars, para ser considerada válida
deverá ser autorizada pelo juiz apenas quando coexistirem os requisitos
previstos no art. 2º da Lei nº 9.296/96, que são:

a) Investigação policial ou instrução processual penal de crimes


punidos com reclusão;
b) Presença de indícios razoáveis de autoria ou participação
no crime que se pretenda investigar ou apurar (fumus boni
iuris)
c) Excepcionalidade, necessidade evidente da violação telefônica
para apuração da verdade dos fatos, inexistindo outros meios de
provas disponíveis para a obtenção das informações que se
pretende (periculum in mora)

1.8.2. Descoberta casual ou conhecimento fortuito

Entende-se por descoberta casual quando, no curso da


interceptação ou escuta telefônica, venham a serem descobertas provas do
cometimento de crime distinto daquele para a qual foi autorizada, ou o
envolvimento de pessoa diversa daquela em relação a qual havia
indícios de autoria.
A doutrina e a jurisprudência, majoritariamente, têm decidido que as
provas assim obtidas são lícitas e podem ser utilizadas como base para a
responsabilização penal, desde que haja relação de conexidade entre o

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crime para a qual foi autorizada a violação do sigilo telefônico e o crime cuja
prova foi casualmente descoberta.

1.9. Interceptações de dados

A Lei nº 9.296/96 prevê em seu art. 1º, parágrafo único, que se aplica
a interceptação do fluxo de comunicações em sistemas de informática e
telemática, referindo-se aos e-mails e aos canais ou sites de transmissão
automática (msn, chat).
IMPORTANTE – Com o advento da referida lei, autorizando a
intercepção de dados, houve quem defendesse a tese de que tal norma
seria inconstitucional, já que a exceção do art. 5º, XII, da CF, “salvo no
último caso” teria o legislador permitido apenas as interceptações
telefônicas, sendo absoluto o sigilo a correspondência, as comunicações
telegráficas e de dados, e, portanto, permitir uma interpretação extensiva do
texto constitucional seria uma exceção temerária a direito
fundamental. Em sentido contrário, é predominante o entendimento
doutrinário e jurisprudencial pela constitucionalidade da norma, entendendo
que o legislador intencionalmente usou a preposição “e” em dois momentos:
“o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas (1º caso), de
dados e das comunicações telefônicas (2º caso), salvo no último caso”.
1.10. Interceptações ambientais

Trata-se de toda e qualquer forma de capacitação de sons, imagens


ou sinais eletromagnéticos que não se utilizam da linha telefônica. Que são:

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I) Interceptação ambiental stricto sensu – quando um terceiro


registra sons ou imagens envolvendo conversa ou o
comportamento de duas ou mais pessoas sem que haja o
conhecimento destas.

II) Escuta ambiental – quando um terceiro registra sons ou imagens


envolvendo duas ou mais pessoas havendo o conhecimento de um
dos envolvidos.

III) Gravação ambiental – não há a figura do terceiro elemento,


sendo a conversa captada por um dos interlocutores, sem que o
outro interlocutor tenha ciência dessa circunstância.

Impende ressaltar que não existe norma na Constituição Federal que


tutele as interceptações ambientais, sendo a ilicitude da matéria vista sob o
prisma do art. 5º, X, da Lei Maior, que compreende uma proteção
genérica a intimidade, sem haver, no entanto, a ressalva da possibilidade
de ser a intimidade violada por ordem judicial.
Atualmente, consolidou-se o entendimento que as interceptações
ambientais lato sensu não importam, necessariamente, em violação ao
direito da intimidade, sendo considerada ilícita em duas circunstâncias:
a) Quando realizadas em ambiente onde exista expectativa de
privacidade;
b) Quando praticadas com violação de confiança (intersubjetiva
ou profissional);

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2. Exame de Corpo de Delito (arts. 158 a 184 do CPP)

É a perícia destinada à comprovação da materialidade das infrações


que deixam vestígios, como nos crimes de homicídio, lesões corporais, furto
qualificado pelo arrombamento etc.
O art. 158 prevê que o exame de corpo de delito poderá ser Direto,
quando realizado por expert diante do vestígio deixado pela infração penal
(ex: necropsia), ou Indireto, quando realizado com base em informações
verossímeis fornecidas aos peritos quando não dispuserem estes do vestígio
deixado pelo delito (exame por fotografia).
OBS: não se confunde o exame de corpo de delito indireto com a
possibilidade de suprimento da perícia pela prova testemunhal, em razão do
desaparecimento do vestígio prevista no art. 167 do CPP, já que no exame
indireto há um laudo firmado por peritos, laudo este que não existe na
prova testemunhal.

2.1. Formalidades do exame de corpo de delito

O art. 159, caput, do CPP, com redação determinada pela Lei nº


11.690/2008, estabelece que o exame de corpo de delito deverá ser
realizado por perito oficial, portador de curso superior, entretanto, o § 1º
do mesmo artigo, prevê que, na falta de perito oficial, poderá a perícia ser
realizada por dois peritos não-oficiais, que são pessoas idôneas,
portadoras de curso superior preferencialmente na área que constitui o
objeto da perícia e que prestem o compromisso de bem e fielmente
desempenharem a função.

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IMPORTANTE – Consolidou-se o entendimento de que a ausência do


termo de compromisso pelos peritos não-oficiais é causa de nulidade.
Entretanto, tem entendido o STJ que a inexistência do referido termo mera
irregularidade, incapaz de inibir o exame de corpo de delito (REsp
181.937/ES, DJ 24.09.2001). Da mesma forma é controvertido o
entendimento sobre a obrigatoriedade da graduação dos peritos não-oficiais,
tendo o STJ se posicionado pela nulidade do exame, caso não seja
cumprido este requisito legal, porém, há posição em contrária afirmando
trata-se de mera irregularidade o fato dos peritos não possuírem curso
superior, a exemplo das leis mais recentes (drogas e propriedade material).

2.2. Atuação processual das partes em relação à perícia

Ao modificar a redação do art. 159 do CPP, a Lei nº 11.690/2008


facultou ao Ministério Público, ao assistente de acusação, ao ofendido, ao
querelante e ao acusado o direito à formulação de quesitos e a
indicação de assistente técnico (§ 3º). Outrossim, também ficou
estabelecido que o assistente técnico atuará a partir de sua admissão
pelo juiz e após a conclusão dos exames e elaboração do laudo
pelos peritos oficiais, devendo as partes ser intimadas da decisão de
admissão (§ 4º).
A partir de tais considerações, extraímos as seguintes conclusões:
a) O direito de formulação de quesitos e a indicação de assistentes
técnicos é restrito a fase judicial, não sendo aplicada na fase policial;

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b) Ao determinar qualquer perícia é obrigatória notificação dos


sujeitos processuais para, querendo, apresentarem quesitos e
indicarem assistentes, sob pena de nulidade relativa;
c) É necessária a admissão do assistente técnico por pronunciamento
judicial;
d) É possível a indicação de apenas 01 (um) assistente técnico por
acusado, excetuando-se o caso de perícia complexa que abranja mais
de uma área de conhecimento especializado;
e) A atuação do assistente técnico ocorrerá após a intimação das partes
quanto à admissão do assistente, que deverá ocorrer após a
elaboração e conclusão do laudo confeccionado em perícia oficial;
f) O juiz, não havendo óbices processuais, está obrigado a admitir o
assistente técnico, por ser uma faculdade das partes, cabendo, em
caso de indeferimento, habeas corpus, mandado de segurança ou
correição parcial;
g) As conclusões do assistente técnico serão examinadas com
reservas, como todo meio de prova produzido pelas partes, sendo
auferido pelo sistema do livre convencimento;

2.3. Oitiva dos peritos em audiência

O art. 159, § 5º, inciso I do CPP, também acrescentado pela Lei nº


11.690/2008, possibilitou as partes requererem ao juiz a oitiva dos
peritos, a fim de ampliar o contato dos interessados com os peritos e
facilitar a obtenção de esclarecimentos em torno do exame realizado, não se
confundindo com o previsto no art. 159, § 3º, que possibilita serem

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apresentados quesitos a serem respondidos pelos peritos por ocasião do


laudo principal em juízo.

2.4. Divergência entre os peritos

Apesar da alteração introduzida ao art. 159, caput, do CPP, de que o


exame de corpo de delito e outras perícias serão realizados por um único
perito oficial, existem hipóteses em que persiste a obrigatoriedade de ser a
perícia realizada por mais de um expert, como no caso das perícias
realizadas por peritos não-oficiais, onde o art. 159, § 1º, exige o
mínimo de dois profissionais e no laudo toxicológicos, o qual também traz
essa exigência através do art. 50, § 2º, da Lei nº 11.343/2006.
Nestes casos, havendo divergências quanto as conclusões dos peritos
no laudo, o art. 180 do CPP, determina que a autoridade judicial poderá
nomear um terceiro perito, chamado de desempatador e se este divergir
de ambos poderá determinar nova perícia.

2.5. Laudos complementares

São aqueles laudos resultantes de perícias realizadas em momento


posterior à perícia principal e que devem ser realizados, se possível, pelos
próprios peritos que fizeram o primeiro exame, quando for necessário:

a) Esclarecimento de omissões, obscuridades ou contradições


(art. 181 do CPP), ex: laudo que atesta a causa mortis por
afogamento e refere-se aos pulmões como íntegros e seco;

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b) Aguardar o decurso de certo tempo para viabilizar a resposta


a quesitos relevantes na apuração do delito, ex: exame para
constatar a incapacidade para ocupações por mais de 30 dias.

2.6. Momento da perícia

O art. 161 do CPP estabelece que o exame de corpo de delito pode


ser feito em qualquer dia e hora, sem restrições, portanto, quanto aos
feriados e períodos noturnos. Tal regra, no entanto, não é absoluta,
havendo algumas exceções:
I – Necropsia, prevista no art. 162 do CPP, deve ser realizada no
mínimo de 06 horas após a morte (tal norma vem perdendo força em
razão dos avanços tecnológicos capaz de atestar a morte aparente);
II – Atuação dos assistentes técnicos, disposto no art. 159, § 4º
do CPP, os quais somente poderão atuar e ter contato com o material
periciado após a conclusão da perícia oficial.

Importante lembrar que o magistrado não esta vinculado às


conclusões do laudo pericial, conforme preconiza o art. 182 do CPP, tendo a
Lei Adjetiva Penal adotado o sistema liberatório de apreciação da
prova pericial, segundo o qual o juiz possui liberdade para poder acatar ou
rejeitar a perícia, estando tal teoria em sintonia com o sistema do livre
convencimento motivado (art. 155, caput), já que pode o juiz, como regra,
atribuir à prova o valor que bem entender.
IMPORTANTE – tem causado polêmica a possibilidade do magistrado
contrariar as conclusões de laudo pericial no tocante à própria existência

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do corpo de delito, tendo a doutrina entendido que a faculdade atribuída


pelo art. 182 do CPP não é ilimitada, não podendo ser desprezada a
existência do corpo de delito, por exemplo: Se o laudo pericial incorporado
ao processo conclui o sentido de que a vitima sofreu lesões corporais de
natureza grave, o magistrado poderá entender, fundamentadamente, que as
lesões foram leves ou gravíssimas, contrariando o laudo, não podendo,
contudo, negar a existência das lesões, por isso importaria em negar o
próprio vestígio constatado, ou seja, o próprio corpo de delito. Tal limite
não se aplica aos jurados nos julgamentos dos Tribunais do Júri.

2.7. Hipóteses específicas de perícias

a) Necropsia
b) Exumação
c) Lesões corporais graves pela incapacidade para as ocupações
habituais por mais de 30 dias
d) Rompimento de obstáculo à subtração de coisa e escalada
e) Incêndio
f) Reconhecimento de escritos
g) Instrumentos do crime

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2.8. Quadro sinótico

Natureza da perícia Regra legal Jurisprudência dominante

Necropsia Exame interno do cadáver “a simples ausência do laudo de


(art. 162 do CPP) obrigatório no caso de morte exame de corpo de delito da
violenta, ressalvadas as vítima não tem o condão de
hipóteses de certeza da conduzir à conclusão de
causa mortis e da inexistência de provas da
inexistência de indicativos de materialidade do crime, se nos
que tenha ocorrido infração autos existem outros meios de
penal prova capazes de convencer o
julgador quanto à efetiva
ocorrência do delito” (STJ, HC
33.300/RJ, DJ 09-05-2005)

Exumação Ato de desenterrar o “a exumação exige ordem judicial,


(art. 163 do CPP) cadáver, não se confundindo caso realizada à revelia das
com inumação, que consiste formalidades legais, será
no ato de sepultar considerada prova ilegítima,
importando, ainda, na
contravenção do art. 67 da LCP

Lesão corporal grave No caso de incapacidade “o prazo de 30 dias a que alude o


(art. 168, §§ 2º e 3º do para as ocupações habituais § 2º do art. 168 do CPP não é
CPP) por mais de trinta dias, logo peremptório, mas visa prevenir
após o decurso desse prazo que, pelo decurso do tempo,
deverá ser feito o exame desapareçam os elementos
complementar visando necessários a verificação da
atesta que a vítima ficou existência de lesões graves”. (STF,
incapacitada no período, não DJU 11.10.1996, p. 38.499)
se aceitando o prognostico
da incapacidade realizado
antes da fluência do trintídio

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Furto qualificado Como regra, deve ser feito a “a ausência de laudo pericial não
pelo rompimento de perícia para materializar a afasta a caracterização da
obstáculo violação qualificadora, prevista no § 4º, I,
(art. 171 do CPP) do art. 155 do CP, quando
existentes outros meios aptos a
comprovar o rompimento de
obstáculo”. (STJ, REsp 809-
912/RS, DJ 05-06-2006)

Roubo majorado A exigibilidade do exame “não se afigura imprescindível a


pelo uso de arma de pericial na arma de fogo apreensão da arma de fogo ou a
fogo fundamenta-se no art. 175 realização da respectiva perícia
(art. 157, § 2º, I, do CP) do CPP, visando constatar o para fins de caracterização da
poder vulnerante e a eficácia causa de aumento de pena
do instrumento prevista no art. 157, § 2º, I do CP,
se as provas carreadas nos autos
efetivamente comprovam a
ocorrência da majorante”.

Incêndio No caso de incêndio, os Em tese, a realização da perícia


(art. 173 do CPP) peritos verificarão a causa e técnica é necessária para
o lugar em que houver comprovação da irrestrita
começado, o perigo que dele intencionalidade de causar
tiver resultado para a vida incêndio, no entanto, se o
ou para o patrimônio, a conjunto probatório, ai incluído a
extensão do dano e o seu prova testemunhal, permitir a
valor e as demais conclusão acerca dessa
circunstâncias que intencionalidade a perícia pode ser
interessarem à elucidação do dispensada
fato

Reconhecimento de Visa à confrontação de grafia Entendimento consolidado no


escritos aposta em documento com a sentido de que, embora possa a
(art. 174 do CPP) letra do suspeito autoridade requisitar material para
a comparação de órgãos públicos,
não pode obrigar o investigado a
fornecê-lo, sob pena de violar o
princípio da não auto-incriminação

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3.0. Interrogatório do réu (arts. 185 a 196 do CPP)

O interrogatório consiste no ato pelo qual o magistrado procede à


oitiva do réu acerca da imputação que lhe é dirigida, corolário da ampla
defesa e do contraditório, encontra-se previsto em todos os procedimentos
criminais, podendo, no entanto, variar o momento da sua realização, já que
nos procedimentos comuns ordinários e sumários (arts. 400 e 531 do CPP),
no procedimento das infrações de menor potencial ofensivo (art. 81 da Lei
nº 9099/95) e no procedimento do júri (art. 411 do CPP) é realizado após
instrução criminal e nos procedimentos relativos aos crimes de drogas (art.
57 da Lei nº 11.343/2006) e abuso de autoridade (art. 17 e 22 da Lei nº
4898/65), é realizado antes da instrução criminal.

3.1. Características

a) Obrigatoriedade: por ser a oportunidade de que dispõe o réu de


informar ao juízo sua versão quanto aos fatos;
b) Ato personalíssimo do imputado: somente o imputado é que pode
e deve ser interrogado, não sendo possível sua representação,
substituição ou sucessão neste ato por qualquer pessoa;
c) Oralidade: o interrogatório, em regra, será realizado por meio de
perguntas e respostas orais, entretanto, o CPP prevê algumas
exceções nos arts. 192 e 193, ao estabelecer normatização própria
para o interrogatório do surdo, do mudo, surdo-mudo e do
estrangeiro;

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d) Publicidade: deverá ser um ato público, podendo qualquer pessoa


assistir a ele;
e) Individualidade: na hipótese de existirem dois ou mais réus no
mesmo processo, não é permitido o interrogatório em conjunto;
f) Faculdade de perguntas pela acusação e defesa: as alterações
da Lei nº 10.792/2003, afastou a característica de ser um ato
personalíssimo do juiz os questionamentos ao acusado.

3.2. Natureza Jurídica

A doutrina, até o advento da Lei nº 10.792/2003, apontava três


posições acerca da natureza do interrogatório do acusado, a saber: meio de
prova, meio de defesa e meio de prova e meio de defesa.
Atualmente, consolidou-se o entendimento de que o interrogatório,
embora não tenha perdido sua natureza e meio de prova, assume,
predominantemente, a condição de meio de defesa, sendo sua natureza,
portanto, meio de prova e meio de defesa.

3.3. Obrigatoriedade de assistência por advogado

As discussões acerca da imprescindibilidade ou não da presença de


advogado no ato do interrogatório perdurou durante muito tempo, pois,
embora a jurisprudência minoritária entendesse necessária a assistência,
não havia regra processual obrigando tal presença. Contudo, a partir da
alteração do CPP pela Lei nº 10.792/2003, o qual deu nova redação ao art.

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185, caput, a presença do defensor no ato do interrogatório do réu passou a


ser considerada obrigatória, sob pena de nulidade absoluta.
Tendo em vista que o art. 6º, V, do CPP, ao tratar do interrogatório
policial, estabelece que este obedecerá as formalidades do interrogatório
judicial, no que for aplicável, existe certo questionamento acerca da
exigência da presença do advogado, também, nessa fase. No entanto, a
imensa maioria da doutrina e da jurisprudência não acatam este
posicionamento.

3.4. Direito de entrevista pessoal e reservada

O art. 185, § 5º, 1ª parte, do CPP, com a alteração determinada pela


Lei nº 11.900/2009, assegura ao réu, antes do início de seu interrogatório, o
direito de entrevistar-se reservadamente com o seu advogado,
devendo o juiz consignar em ata que, efetivamente, foi assegurado o direito
de entrevista, já que a sua não concessão importa em nulidade processual.
Quanto à natureza dessa nulidade, embora existam oscilações
jurisprudências, tem-se percebido a tendência dos Tribunais em considerá-la
relativa, e não absoluta, devendo-se, ainda, ser comprovado a ocorrência
de prejuízo sob pena de não reconhecimento da mácula.
Tratando-se de interrogatório por videoconferência (Lei nº
11.900/2009), deverá ser disponibilizado linhas telefônicas reservadas para
a comunicação entre o acusado e seu defensor.

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3.5. Direito ao silêncio

Nos termos do art. 186 do CPP, antes de iniciar o interrogatório,


deverá o juiz advertir o acusado de seu direito de permanecer calado,
sendo que tal silêncio não importará em confissão e nem poderá ser
interpretado em prejuízo de sua defesa, salientando-se que tal garantia tem
igual aplicabilidade ao interrogatório policial.

3.6. Procedimento

O art. 187 do CPP, com a nova redação dada pela Lei nº 10.792/2003,
estabelece que o interrogatório será realizado em duas partes, versando, a
primeira, sobre a pessoa do réu (art. 187, § 1º) e, a segunda, sobre o
fato (art. 187, § 2º).
IMPORTANTE – O direito ao silêncio aplica-se somente a segunda
parte do interrogatório, no que concerne ao mérito, não tendo
aplicabilidade a primeira parte, estando, portanto, o réu obrigado a se
qualificar, sendo, inclusive, responsabilizado penalmente caso minta sobre a
sua identidade.
Importa frisar que a qualquer momento poderá o juiz realizar novo
interrogatório do réu, podendo, inclusive este novo interrogatório ser
determinado pelos Tribunais nos julgamentos de recursos interposto pelas
partes, conforme preconiza o art. 616 do CPP.
Outro fato relevante é o interrogatório do surdo, do mudo, do
surdo-mudo e do estrangeiro, pois, evidentemente, a deficiência de

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audição e voz não impede a realização do interrogatório, devendo ser


aplicada às regras do art. 192 do CPP, que diz:

MUDO – PERGUNTAS ORAIS – RESPOSTAS ESCRITAS


SURDO – PERGUNTAS ESCRITAS – RESPOSTAS ORAIS
SURDO-MUDO – PERGUNTAS E RESPOSTAS ESCRITAS
ESTRANGEIRO – AUXÍLIO POR MEIO DE INTÉRPRETE

Quanto ao interrogatório do réu preso, dispõe o art. 185, § 1º,


que o interrogatório será realizado, em sala própria, no estabelecimento em
que estiver recolhido, desde que estejam garantidas a segurança do juiz, do
parquet e dos auxiliares, bem como a presença do defensor e a publicidade
do ato.

3.7. Interrogatório por meio de videoconferência

Com a vigência da Lei nº 11.900/2009, o art. 185, § 2º do CPP passou


a autorizar que o interrogatório judicial do preso, em dadas circunstâncias,
seja realizado mediante o sistema da videoconferência ou de outro recurso
tecnológico de transmissão de sons e imagens em tempo real, ressaltando-
se que tal modo deve ser adotado pelo juiz excepcionalmente, impondo-
se, para tanto, decisão fundamentada, com intimação das partes com no
mínimo de 10 dias de antecedência em relação a data aprazada para o
interrogatório (§ 3º), condicionando-se, ainda, a que não tenha sido
possível ao juiz interrogar o réu no estabelecimento prisional (§ 2º)
e à ocorrência de algumas hipóteses (§ 2º), que são:

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a) Prevenir risco à segurança pública, quando houver fundada suspeita


de que o preso integre organização criminosa;
b) Prevenir risco à segurança pública quando possa o acusado fugir
durante o deslocamento;
c) Viabilizar a participação do réu no interrogatório judicial, quando haja
relevante dificuldade para o seu comparecimento em juízo, por
enfermidade ou outra circunstância pessoal;
d) Impedir a influência do réu no ânimo de testemunha ou da vítima
desde que não seja possível colher o depoimento destas por
videoconferência, nos termos do art. 217 do CPP;
e) Responder a gravíssima questão de ordem pública.

4. Confissão (arts. 197 a 200 do CPP)

Trata-se do reconhecimento pelo réu da imputação que lhe foi feita


por meio da denúncia ou da queixa-crime, devendo, por determinação legal
(art. 190 do CPP), ser perguntado sobre o motivo e circunstâncias do fato,
bem como se outras pessoas concorreram para a infração.
Quanto à validade da confissão, a doutrina aponta alguns requisitos
necessários, os quais são divididos em requisitos intrínsecos e
requisitos formais.

Requisitos intrínsecos:
a) Verossimilhança – probabilidade de o fato ter ocorrido da forma como
confessada

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b) Clareza – caracterizada por meio de uma narrativa compreensível e


com sentido inequívoco
c) Persistência – que é a repetição dos mesmos aspectos e
circunstâncias, sem modificação no relato quanto aos detalhes do
crime
d) Coincidência – entre o relato do confitente e os demais meios de
prova angariados no processo

Requisitos formais:
a) Pessoalidade – deve a confissão ser realizada pelo próprio réu, não
podendo ser feita por defensor ou mandatário
b) Caráter expresso – deve ser reduzida a termo
c) Oferecimento perante o juiz competente – o que esta oficiando no
processo
d) Espontaneidade – deve ser oferecida sem qualquer coação
e) Saúde mental – não podendo ser fruto de imaginação ou alucinações

4.1. Valoração

A confissão não tem força probatória absoluta, mesmo que tenha


sido prestada judicialmente e na presença de advogado, deve ser
confrontada e confirmada pelas demais provas dos autos para embasar
eventual decisão condenatória, sendo esta a exegese do art. 197 do CPP.

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4.2. Classificação

Várias são as classificações referidas na doutrina acerca da confissão,


estando entre as mais comuns:

Quanto ao momento:
a) Confissão extrajudicial – é aquela que não é realizada perante o juízo;
b) Confissão judicial – realizada perante o juiz, ocorrendo, normalmente,
na oportunidade do interrogatório, podendo ocorrer em outro
momento do processo.

Quanto à natureza:
a) Confissão real – é a confissão realizada efetivamente pelo investigado
ou réu, perante a autoridade, revelando-se a autoria, circunstâncias e
motivação do delito cometido;
b) Confissão ficta – é a confissão decorrente de uma ação ou omissão
prevista em lei, como no caso da revelia ou do silêncio do réu. Não é
reconhecida como prova pelo direito processual penal brasileiro.

Quanto à forma:
a) Confissão escrita – é aquela realizada pelo próprio réu por meio de
cartas, bilhetes ou qualquer documento escrito que venha a ser
juntado aos autos;
b) Confissão oral – é aquela que decorre da verbalização do réu perante
o juiz ou é registrada por meio de interceptação telefônicas ou
ambientais.

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Quanto ao conteúdo:
a) Confissão simples – que se limita a admitir como verdadeiros os fatos
que são atribuídos;
b) Confissão qualificada – é aquela em que o autor da infração penal,
embora atribua a si a prática do crime, agrega, em seu favor, fatos ou
circunstâncias que excluem o delito ou que isentem de pena.

4.3. Divisibilidade e retratabilidade

Nos termos do art. 200 do CPP a confissão pode ser divisível e


retratável.
Divisibilidade – significa que o juiz pode considerar verdadeira parte
da confissão e inverídica outra parte, não sendo obrigado a valorar a
confissão como um todo.
Retratabilidade – quer dizer que se o réu, mesmo confesso em juízo,
voltar atrás, caberá ao magistrado confrontar a confissão e a retratação que
lhe sucedeu com os demais meios de prova incorporados ao processo.
Assim, uma vez retratada a confissão não quer dizer que perderá seu valor
como prova.

4.4. Voluntariedade e espontaneidade

Faz-se mister uma diferenciação da confissão espontânea, que é


aquela em que o réu por sua livre e intima vontade, sem nenhuma pressão
externa, confessa o crime (confissão no interrogatório), e a confissão

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voluntária, não espontânea, onde fatores externos à sua vontade íntima de


confessar, colaboram para o reconhecimento da culpa, como no caso em
que o réu, indagado pelo juiz, negue seu envolvimento no crime e depois,
premido pelas circunstâncias, entra em contradição e acaba confessando.
Tal diferenciação se faz necessária porque a doutrina defende que
apenas a confissão espontânea poderá beneficiar o réu com a atenuante
prevista no art. 65, III, “d” do CP, no entanto, não é este o entendimento
jurisprudencial vigente.

4.5. Confissão delatória ou delação

Consiste na afirmação realizada pelo acusado, por ocasião de seu


interrogatório, de que além de seu próprio envolvimento, uma terceira
pessoa, agindo como seu comparsa, também concorreu para a prática
delituosa.
Segundo Mirabete, embora a delação seja um meio de prova atípico
ou anômalo, por não ser regulamentada de modo específico no âmbito do
CPP, possui valor probatório, principalmente quando realizada pelo acusado
sem o sentido de inocentar-se.

4.6. Delação premiada

É o benefício concedido ao criminoso que denunciar outras pessoas


envolvidas na prática do mesmo crime que lhe está sendo imputado, em
troca de redução ou até mesmo isenção da pena imposta, tratando-se,
na verdade, de uma colaboração do criminoso com a justiça.

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No direito brasileiro a delação premiada está prevista em diversas leis,


a saber: Lei dos crimes contra o sistema financeiro nacional (art. 25, § 2º da
Lei nº 7492/86), Código Penal (art. 159, § 4º), Lei dos crimes hediondos
(art. 8º da Lei nº 8072/90), Lei dos crimes contra a ordem tributária e
relação de consumo (art. 16 da Lei nº 8137/90), Lei do crime organizado
(art. 6º da Lei nº 9034/1995), Lei de lavagem de capitais (art. 1º, § 5º da
Lei nº 9613/98) Lei de proteção a vitimas e testemunhas (art. 13 e 14 da lei
nº 9807/99) e Lei de drogas (art. 41 da Lei nº 11343/2006).
Dentre as várias questões que surgem com relação à delação
premiada, a primeira refere-se a espontaneidade, aquela que resulta da
iniciativa pessoal do agente e a voluntariedade, que é sugerida por outra
pessoa. Neste caso, não há uniformidade a respeito e depende da
legislação, sendo que a Lei de proteção à vítima e testemunhas e Lei de
drogas exige a mera voluntariedade do ato, quanto que as demais leis
exigem a espontaneidade.
Aspecto controvertido é a delação de concorrentes por crimes
diversos, quando o agente ao ser interrogado pela pratica de um crime,
delata co-autores de crime distinto, sem qualquer relação com a infração
pela qual processada e o qual não tenha participado. Neste caso, tem-se
entendido não se admitir a concessão do benefício por ser requisito do
dispositivo a condição de coautor ou participe do delator.
Outro aspecto divergente é a delação premiada após o trânsito
em julgado de sentença condenatória, da qual três posições são
acenadas pela doutrina:

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1ª posição – que indica a inviabilidade de o beneficio ser aplicado


após sentença.
2ª posição – a qual considera possível a concessão do benefício
também após o trânsito em julgado, mediante revisão criminal
ajuizada com base no art. 621, III, do CPP. (posição mais aceita)
3ª posição – sustenta a possibilidade de ser deferida pelo próprio
juiz da execução, mediante simples requerimento, independentemente
de revisão criminal.

5. Perguntas ao Ofendido (art. 201 do CPP)

Estabelece o art. 201 do CPP, com redação determinada pela Lei nº


11.690/2008 que, sempre que possível, o ofendido será qualificado e
perguntado sobre as circunstâncias da infração, podendo ser conduzido
coercitivamente (§1º), caso seja notificado e não compareça.
Importante salientar que o ofendido não se encaixa no contexto da
prova testemunhal, pois não presta compromisso e não responde por falso
testemunho, podendo, no entanto, responder por denunciação caluniosa.

5.1. Valor da palavra da vítima

Embora a palavra do ofendido deva ser recebida com reservas,


exigindo-se que seja sempre confrontada com os demais elementos de
prova existentes nos autos, não se pode deixar de reconhecer que, em
alguns casos, possui alto valor, como nas hipóteses dos crimes contra a
dignidade sexual, sendo este o entendimento pacífico da jurisprudência.

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5.2. Alterações introduzidas pela Lei nº 11.690/2008

As alterações incorporadas pela referida lei ao art. 201 do CPP estão


inseridas nos §§ 2º a 6º, que são:

a) Obrigatoriedade de comunicação ao ofendido quanto a determinados


atos processuais e sobre a prisão ou liberdade do acusado (§§ 2º e
3º)
b) Reserva de lugar em separado para que o ofendido permaneça antes
e durante a realização da audiência (§ 4º)
c) Encaminhamento do ofendido a atendimento multidisciplinar (grupo
de especialistas nas áreas psicossocial, de assistência jurídica e de
saúde), se for o caso, às expensas do Estado ou do ofensor, após o
trânsito em julgado da sentença (§ 5º)
d) Adoção das medidas necessárias para resguardar a imagem, honra e
vida privada do ofendido, trata-se da chamada publicidade restrita,
podendo o feito correr em segredo de justiça (§ 6º)

6. Prova testemunhal (arts. 202 a 225 do CPP)

Entende-se por testemunha a pessoa que, perante o juiz, declara o


que sabe acerca dos fatos sobre os quais se litiga no processo penal, ou as
que são chamadas a depor, perante o juiz, sobre as suas percepções
sensoriais a respeito dos fatos imputados ao acusado (Mirabete).

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DIREITO PROCESSUAL PENAL I

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Doutrinariamente, tem-se classificado a testemunha da seguinte


forma:
a) Testemunha referida – é aquela que, embora não tenha sido
arrolada nos momentos ordinários (denúncia, queixa ou defesa),
poderá ser arrolada pelo juiz ex officio ou a requerimento das partes
em razão de ter sido citada por uma testemunha, chamada de
referente (art. 209, § 1º do CPP). De acordo com o art. 401, § 1º do
CPP, esta categoria não é considerada para efeito de contagem do
máximo de testemunhas.

b) Testemunha judicial – é aquela inquirida pelo juiz


independentemente de ter sido arrolada por qualquer das partes ou
de ter sido requerida a sua oitiva.

c) Testemunha própria – é a testemunha chamada para ser ouvida


sobre o fato objeto do litígio, seja porque os tenha presenciado, seja
porque deles ouviu dizer.

d) Testemunha imprópria – é a que prestará depoimento sobre fatos


que não se referem diretamente ao mérito da ação penal,
(testemunha da prisão em flagrante do acusado e testemunha da
confissão em interrogatório).

e) Testemunha numerária – corresponde a testemunha regularmente


compromissada, na forma do art. 203 do CPP.

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DIREITO PROCESSUAL PENAL I

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f) Testemunha não compromissada ou informante – contempladas


no art. 208, são aquelas dispensadas do compromisso em razão de
presunção jure et jure no sentido de que são suspeitas as suas
declarações. Esta categoria também não é computada no máximo de
testemunhas.

g) Testemunha direta – trata-se de testemunha que presenciou o fato


por meio dos sentidos.

h) Testemunha indireta – é aquela que declara ao magistrado sobre o


que não presenciou, mas soube ou ouvir dizer.

6.1. Número máximo de testemunhas

O número de testemunhas oscila conforme o procedimento:

Procedimento Número de testemunhas

Comum Ordinário 08 testemunhas

Tribunal do Júri 08 testemunhas

Crimes de responsabilidade de 08 testemunhas

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funcionário público

Crimes contra a honra 08 testemunhas

Crimes contra a propriedade imaterial 08 testemunhas

Crimes de Imprensa (pena máxima 08 testemunhas


superior a 4 anos)

Comum Sumário 05 testemunhas

Crimes Falimentares 05 testemunhas

Juizados Especiais Criminais 05 testemunhas

Crimes de Drogas 05 testemunhas

Crimes de Imprensa (pena máxima 05 testemunhas


inferior a 4 anos)

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Crimes de Abuso de Autoridade 03 testemunhas

Regra geral, para a acusação, o número é definido segundo a


quantidade de fatos imputado, independente de quantos agentes tenham
sido denunciados (ex: 3 réus cometem 1 roubo – 8 testemunhas; 1 réu
comete 2 roubos – 16 testemunhas).
Já para a defesa leva-se em consideração não apenas o numero de
fatos, como também o número de réus (ex: 1 réu comete 1 roubo – 8
testemunha; 2 réus cometem 1 roubo – 16 testemunhas; 1 réu comete 2
roubos – 16 testemunhas; 2 réus cometem 2 roubos – 32 testemunhas).
Registre-se, ainda, que o art. 202 do CPP estabelece que toda pessoa
é capaz de ser testemunha, desde que tenha a capacidade de entender os
acontecimentos ao seu redor, independente de idade, integridade mental e
condições físicas.
No que tange ao compromisso, é importante frisar que este é
irrelevante para o crime de falso testemunho, conforme tem decidido o STJ
e o STF.

Quanto às testemunhas não sujeitas ao compromisso, são


expressamente mencionadas no art. 208 do CPP, que são:

a) Doentes mentais

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b) Menores de 14 anos
c) Parentes do réu enumerados no art. 206 do CPP (ascendentes,
descendentes, irmão e cônjuge, ainda que separado judicialmente e
por fim, os afins em linha reta, como sogro e sogra)

Por ser taxativo o rol do art. 208 do CPP, surgem algumas questões
com relação ao compromisso quanto a:

I) O ex-conjuge do réu divorciado dele (prestam compromisso)


II) O companheiro do réu (não presta compromisso)
III) Amigo intimo e inimigo capital do réu (prestam compromisso)
IV) Parentes da vítima (prestam compromisso)
V) Tio, primo, sobrinhos e cunhados do réu (prestam
compromisso)

6.2. Contradita e argüição de defeito

São formas distintas de impugnar-se a narrativa de testemunhas


arroladas, as quais deverão ser realizadas antes de iniciado o
depoimento e após a qualificação. A contradita e a argüição de defeito
não são sinônimos e estão previstas no art. 214 do CPP que elenca as
formas de impugnação da testemunha:
a) Pessoas que não poderão depor como testemunha, devem ser
excluídas (contradita). Ex: médico, psicólogo, padre, advogado, etc
b) Pessoas que prestarão depoimento como testemunhas não
compromissadas (contradita). Ex: art. 206 do CPP

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c) Pessoas que devido particularidades especiais, apesar de não ficarem


impedidas de depor e nem prestar compromisso, não são
absolutamente isentas, por serem suspeitas de parcialidade
(argüição de defeito). Ex: amigo intimo, inimigo capital, parentes
da vítima, etc.

7. Reconhecimento de pessoas e coisas (arts. 226 a 228 do CPP)

É o ato pelo qual não apenas vítimas ou testemunhas, mas também


acusados ou investigados identificam terceira pessoa, não se tratando de
ato informal, sendo estabelecido pelo art. 226 do CPP as formalidades para
que se proceda ao reconhecimento de pessoa, quais sejam:

a) A pessoa convidada a fazer o reconhecimento deverá descrever a


pessoa que deva ser reconhecida (inciso I)
b) Em seguida, deverá o reconhecer, apontá-lo entre outras pessoas que
com ela guardarem semelhanças, se possível (inciso II)
c) Ao final da diligência lavrar-se-á o competente auto, subscrito pela
autoridade, pela reconhecedor e por duas testemunhas presenciais
(inciso IV)
d) Havendo receio de que, por intimidação, a pessoa chamada para o
reconhecimento não fale a verdade, a autoridade poderá providenciar
para que não seja vista por quem deve ser reconhecido (inciso III).

IMPORTANTE - O parágrafo único do art. 226 diz que o inciso III só


terá aplicabilidade na fase policial, sendo inviável na instrução criminal ou

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em plenário de julgamento. Entretanto, a jurisprudência e a doutrina


majoritária tem optado pela não aplicação desta regra, existindo em alguns
Fóruns salas especiais para reconhecimento, preservando a figura do
reconhecedor.
Quanto ao reconhecimento de pessoas através de fotografias e o
reconhecimento de coisas seguem a mesma regra do art. 226 do CPP.

8. Acareações (arts. 229 a 230 do CPP)

É o procedimento consistente em colocar-se frente a frente pessoas


que já prestaram depoimentos em momento anterior, para que esclareçam,
mediante confirmação ou retratação, aspectos que se evidenciaram
contraditórios.

8.1. Fases e legitimados

A acareação poderá ser realizada tanto na fase do inquérito


policial como na fase do processo judicial, sendo que na fase
inquisitorial a acareação poderá ocorrer por iniciativa da própria autoridade
policial ou por requisição do juiz ou do MP, nada obstando que venha a se
realizar por requerimento da vitima ou do acusado, sendo que, neste ultimo
caso, trata-se de 0um ato discricionário da autoridade policial.
Na fase judicial poderá ser decretada, inclusive, ex officio pelo
magistrado.

8.2. Sujeitos da acareação

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O art. 229 do CPP determina que podem ser acareados acusados,


testemunhas e ofendidos, entre si uns com os outros. Questão polêmica
é a possibilidade de haver acareação entre peritos, sendo tal hipótese aceita
pela doutrina e afastada pelo STJ.
Vale ressaltar que embora as partes não estejam obrigadas a se
submeter ao procedimento de acareação, elas estão obrigadas a estar
presente quando forem intimadas para o ato, sob pena de condução
coercitiva.

8.3. Acareação através de carta precatória

O art. 230 do CPP prevê a possibilidade de realizar-se a acareação


por meio de carta precatória quando as pessoas a serem acareadas
encontrarem-se em localidades distintas.
Embora esta previsão legal descaracterize o instituto da acareação,
por não deixar frente a frente os declarantes, tal modalidade de acareação é
aceita por expressa previsão legal.

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