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MUNICIPALISMO E PODER LOCAL Manuela Moreira

Tema 2
Após uma leitura atenta ao Capítulo IV - Da Revolução de 1383 até ao fim do reinado de D. João II
(1383-1495) e tendo presente a sociedade local, indico os seguintes tema de debate:
Qual o papel regulador das Câmaras, Paróquias, Ordenanças e Misericórdias?

Câmaras – eram compostas por três vereadores que formavam com os juízes, ordinários ou de fora,
a Câmara, cujas deliberações eram chamadas vereações. Inicialmente realizadas em espaços
públicos, o conselho de vereadores, por ordem régia, passaria a reunir com uma frequência semanal,
ao domingo de manhã, devendo, para tal, apartar-‑se “a um logar para falar e concordar em todas as
cousas que forem prol e bom vereamento da dicta vila”, foram sendo transportadas para espaços
fechados, numa sala ou “câmara”. As funções dos vereadores, atribuídas pelas Ordenações
Afonsinas resumiam-se a “todo o regimento da terra e das obras do concelho e qualquer cousa que
pudessem fazer e entender para que a terra e moradores dela possam bem viver”.
Mas o papel regulador não se reduzia aos vereadores, que com os Juízes decidiam sobre pequenos
casos de justiça. Quando o assunto fosse considerado de grande importância os homens-bons eram
chamados para que, com a sua experiência, pudessem colaborar nas decisões em prol da
comunidade.
Outros elementos reguladores junto da câmara; o procurador do concelho (que poderia acumular as funções
de tesoureiro), o escrivão, os almotacés (funcionários de confiança dos concelhos responsáveis pela
fiscalização de pesos e medidas e da taxação dos preços dos alimentos; sendo encarregado também da
regulação da distribuição dos mesmos em tempos de maior escassez. Ocupava o cargo da Almotaçaria
mensalmente e estava dependente dos governadores do concelho. e o alcaide-mor)

Paróquias – De uma forma geral, tem-se admitido que o papel mais relevante do estatuto paroquial
de determinado templo, desde os tempos mais recuados, é o acto religioso da pregação e da
distribuição dos sacramentos aos fiéis por delegação do bispo.
Entre os fundadores das igrejas e mosteiros que foram encontra-se, para além do clero, da nobreza,
infanções e cavaleiros, médios e grandes proprietários rurais e até comunidades locais.
Que motivações guiavam todos estes fundadores?
As novas criações de povoados e respectivos templos, tanto organizadas como espontâneas, em
zonas apelidadas de “desertas”, na realidade o restabelecimento eclesiástico dependeu da interacção
entre estes “colonizadores” vindos de fora e as comunidades locais que haviam permanecido no
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terreno. Se os benefícios espirituais a esperar de uma maior proximidade ao sagrado não eram de
desprezar, nesses tempos de insegurança e incerteza as vantagens materiais também tinham o seu
peso. Quanto às igrejas, houve-as igualmente que resultaram da acção das populações locais,
disponibilizando parte dos seus bens para as dotar e exercendo depois o padroado colectivamente.
Mas outras foram criadas por ricos proprietários rurais e membros da aristocracia guerreira nas suas
terras, como forma de para elas atrair mais homens e controlar os que já nelas habitavam.
Já no século XVI, o Concílio de Trento, veio reforçar a importância do papel da igreja, da paróquia,
com a introdução dois registos paroquiais. Com efeito, por essa altura, o Estado não se ocupava das
funções educativas, culturais, sociais, nem tão pouco de tarefas sociais. Tais funções cabiam,
essencialmente, à Igreja Católica e às demais instituições, tais como, as Misericórdias.

Misericórdias - As confrarias enquanto associações laicas de base colectiva, basearam a sua


actuação no sentido de responder a problemas de carácter espiritual e às necessidades assistenciais
de carácter material, da comunidade onde se inseriam. As Misericórdias, tal como as restantes
confrarias, assumem-se portanto, como a única rede estruturada de assistência social em território
nacional e ultramarino, papel da maior relevância num tempo de acentuadas carências materiais e de
afirmação de solidariedades baseada no pressuposto da caridade cristã como o caminho para a
salvação das almas. O universo social a que se destinava esta dupla assistência era constituído por
pobres, doentes, velhos, viúvos, órfãos, presos e cativos.
Os monarcas incentivarão, acolherão e apoiarão, através de inúmeros privilégios, estas confrarias,
em particular as Misericórdias que funcionaram sobre alçada régia, passando a oferecer aos seus
membros a possibilidade de obterem amplos benefícios. Estar dependente do rei é uma prática que
se institui desde o processo fundacional das Misericórdias.

Ordenanças - As ordenanças constituíam outra das instituições relevantes da sociedade local


portuguesa, certamente uma das mais originais. Todo o reino se encontrava dividido em capitanias-
mores de ordenanças, coordenadas por um capitão-mor, que devia ser o senhorio donatário ou
alcaide-mor em terras onde existisse, coadjuvado por um sargento-mor. Cada capitania-mor dever-
se-ia subdividir num número variável de companhias de ordenanças, chefiadas pelo respectivo
capitão, com o apoio de outros oficiais. Assim, fruto da reorganização censitário-militar do Reino,
iniciada nos finais da Idade Média e culminando, já no tempo de D. Sebastião (1570), na criação das
Companhias de Ordenanças (também chamadas dos capitães-mores das ordenanças), os capitães-
mores tornaram-se a suprema autoridade militar a nível municipal (sendo os responsáveis pela
defesa dos castelos em que eram investidos); substituindo assim o velho cargo de alcaide-mor, que
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durante os séculos subsequentes à Reconquista detivera idênticas prerrogativas nos concelhos


portugueses. À hierarquia das ordenanças competia ter arrolados todos homens maiores de 16 anos,
exceptuando os privilegiados e os velhos, para que pudessem, quando solicitados, ser recrutados
para o exército de 1 ª linha ou ainda para operarem localmente como milícias quando tal fosse
necessário, pelo que deviam reunir-se regularmente para receberem treino militar.

Tema 3
Na Época Medieval não faz sentido falar em Administração Pública nem em Estado, porque não
existe apenas um elemento regulador da sociedade; pelo contrário, existem vários centros
impulsionadores de poder como a Coroa, Senhores Feudais e a Igreja. Concorda?

Na Idade Média o rei era o centro do poder. O poder efectivo era exercido pelos diversos funcionários
que substituíam o rei, nomeadamente, no comando militar, na administração civil do reino e na
promulgação das leis.
A concentração dos poderes administrativos, político e judicial na pessoa do rei aumenta no período
da expansão colonial. Com efeito, introduzem-se alterações no sistema administrativo, em especial
na Administração Central, com a criação de um gabinete composto por ministros ou secretários que
tinha por objectivo a justiça (fiscalização e administração da justiça) nas terras senhoriais.
O reino de Portugal, nos séculos XIV e XV, conheceu um poder concelhio activo e actuante, sujeito,
porém, a regras, comportamentos e actuações específicas. A Coroa apoiava-se nestes poderes locais
de concelhos e senhorios para dominar burocrática e administrativamente territórios e homens.
Conseguiu que os municípios fossem cadeias da sua máquina de guerra e de fisco.
As Ordenações Afonsinas foram a primeira grande compilação das leis dispersas em vigor. Criadas
no reinado de D. Afonso V, que reinou em Portugal de 1438 a 1481, são divididas em cinco livros que
tratam desde a história da própria necessidade daquelas leis, passando pelos bens e privilégios da
Igreja, pelos direitos régios e de sua cobrança, pela jurisdição dos donatários, pelas prerrogativas da
nobreza e pela legislação especial para os judeus e mouros; o livro IV trata mais especificamente do
chamado direito civil; e o livro V diz respeito às questões penais.
Henrique de Barros, na sua obra sobre a História dos Munícios, refere que:
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Mas, «os capitães-mores e os párocos, são as Autoridades, que mais podem servir a Nação em
qualquer ramo de economia pública por possuírem as «listas sempre apuradas, conhecerem os indivíduos
todos da povoação do maior ao mais pequeno», e são estas autoridades que mais perto estão do poder
local, pela influência directa que exercem sobre a comunidade que servirão, também, como base de
sustentação do poder real.
Poderemos levantar a questão se toda esta hierarquia não nos poderá levar a falar de Estado. Um
Estado ainda débil a nível organizacional, mas se considerarmos a afirmação efectuada, no primeiro
parágrafo desta resposta, como verdadeira então encontraremos esse “Estado” e até mesmo o início
ténue da Administração Pública.

BARROS, Henrique de Gama ; História da Administração Pública em Portugal. Séculos XII a XV, 2ª ed.,
Sá da Costa, 1947
CARMO, Mário – Unidade Curricular Municipalismo e Poder Local, dos Forais ao Liberalismo –
Universidade Aberta – Lisboa, 2018
MATTOSO, José - A história das paróquias em Portugal. In Portugal Medieval. Novas interpretações.
Lisboa: INCM, 1985
MONTEIRO, Nuno Gonçalo - Elites locais e mobilidade social em Portugal nos finais do Antigo
Regime - Análise Social, vol. xxxii (141), 1997 (2.°), 335-368

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