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Viçosa
2016
1. INTRODUÇÃO:
A paisagem e o espaço de habitação humana, ao longo do tempo, se alteram
sempre em um sentido. De maneira organizada e de acordo com os padrões
estéticos, religiosos morais e filosóficos de cada época, as cidades vão se tornando
o espelho dos homens que viveram em determinado lugar ou espaço, ficando na
paisagem as marcas de períodos pretéritos, sejam eles ruínas, prédios antigos,
catedrais góticas, igrejas barrocas, ruas angulosas ou tortuosas, etc. Desta forma,
torna-se possível uma análise histórica do espaço e esse jogo de espaço e tempo,
ou esse eterno paradoxo espaço-temporal, envolve sempre os estudos em
geografia.
No período atual, podemos dizer que o conceito de aufklärung do filósofo
alemão Immanuel Kant, em tradução literal “esclarecimento”, mais conhecido no
Brasil por Iluminismo, está sendo vitorioso desde o século XVIII, em que a razão tem
se tornado cada vez mais o norte de todas as concepções político filosóficas e a
ciência enquanto entidade e instituição tem se tornado a grande mestra das relações
humanas. Não é atoa que em cartografia aplicamos o método cartesiano, que tem
sua origem no filósofo René Descartes que para muitos é considerado o pai do
racionalismo.
Devido ao avanço da ciência em períodos de pensamento livre, foi possível
um grande avanço técnico, e as paisagens ao redor do globo terrestre nunca se
alteraram tanto em tão curto espaço de tempo. A revolução industrial trouxe avanços
em vários âmbitos da vida humana, mas trouxe também o ônus dos inchaços
urbanos. O crescimento econômico e técnico elevaram a cidade ao patamar de
categoria espacial num grau de maior importância do que o campo, uma situação
muito diferente do período medieval, fazendo surgir o fenômeno que se cunhou de
êxodo rural, que são as grandes migrações de pessoas do campo para a cidade
motivadas por fatores diversos e muitas vezes externos.
O Brasil desde a década de 50 vem sofrendo uma intensa urbanização,
fenômeno denominado por alguns autores da geografia, como Antônio Carlos
Robert Moraes, de “modernização tardia”, quando comparamos o crescimento
urbano brasileiro com o europeu por exemplo. Durante o governo de Juscelino
Kubistchek, sob o lema e ideologia claramente desenvolvimentistas de crescer 50
anos em 5, o país foi palco de intensos investimentos em infraestrutura, que
partiram tanto da esfera pública quanto privada. A atração que o estado brasileiro
criou para investidores externos foi importante para a criação de parques industriais
que se localizam preferencialmente próximos ou dentro de áreas urbanas. Em si só,
esse fator já enuncia a importância do entendimento do rápido crescimento urbano
no Brasil, apesar de claro, existirem outros fatores para além deste citado.
Diversas são as causas deste efeito, sendo que alguns autores apontam para
o desemprego estrutural causado pelo maquinário agrícola, que desestabiliza as
relações empregatícias devido ao baixo custo dos investimentos em tecnologia e
que resultam na retração da mão de obra campesina. Porém, há regiões em que o
relevo acidentado impossibilita a prática de agricultura mecanizada, portanto esta é
uma explicação plausível, mas que se aplica a certas regiões e não ao território
brasileiro como um todo. Outros apontam para o caráter de centralidade da cidade,
que é onde se concentram os maiores postos de trabalho e onde estão as melhores
oportunidades de estudo e de emprego, portanto as pessoas do campo se deslocam
para a cidade na esperança de uma melhoria na qualidade de vida. Autores de
orientação marxista tendem a criticar o sistema econômico vigente e apontar o
êxodo rural como uma consequência da busca desenfreada das empresas por
lucros.
Muitas são as explicações e tentativas de uma aproximação teórica mais
próxima possível da realidade estudada, porém, teorias à parte, o crescimento
urbano é um dado e um fato: os números do IBGE e as imagens de satélite não
mentem quando demonstram o crescimento das manchas urbanas nas cidades
brasileiras. Diferentemente de anos anteriores, quando só as grandes metrópoles
apresentaram sinais de rápido crescimento, hoje os redutos menores, as chamadas
cidades médias, apresentam concomitante às metrópoles, uma taxa de crescimento
elevado. O que faz dessas cidades uma categoria importante nos estudos urbanos.
Segundo dados do censo demográfico do Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística de 2010, o Brasil apresenta uma população urbana de 160.925.792
habitantes, sendo a população rural composta por 28.830.007 habitantes. Estes
números demonstram o caráter marcadamente urbano da sociedade brasileira.
Nesse cenário, tem-se destacado as cidades de porte médio, por apresentarem
intenso ritmo de crescimento populacional criando um processo de reestruturação
sócio-espacial.
No Brasil, há relativo consenso em considerar cidades de porte médio
aquelas que estão entre 50 mil e 500 mil habitantes, ainda que esse intervalo esteja
sujeito a alterações a cada divulgação dos resultados dos censos demográficos
(SPOSITO, 2010). Monad (1974) considera que o estabelecimento de uma definição
científica para estas cidades seria inútil em função da sua complexidade e
variabilidade de um país para outro e até mesmo de uma região para outra.
Em Minas Gerais, verificou-se um acelerado ritmo de crescimento das
cidades de porte médio principalmente por a partir da década de 80. Tal processo
gera efeitos na desigualdade regional, uma vez que se tem uma relativa
desaceleração do crescimento demográfico em algumas cidades e, em
contrapartida, a intensificação desse crescimento em outras.
A dinâmica urbana destas cidades reflete numa complexa organização
socioeconômica a partir da articulação destas com os centros metropolitanos,
principalmente em função do sistema produtivo. As cidades médias adquirem
crescente importância na rede urbana nacional devido, sobretudo, aos processos de
descentralização e reestruturação produtiva.
O espaço urbano é marcado por relações sociais, econômicas e culturais em
constante e acelerada mudança. As transformações das cidades demandam
crescentes esforços de planejamento e gerenciamento por parte dos gestores
urbanos, sendo, nesse sentido, de grande importância o estudo e monitoramento da
cidade e suas transformações. Pode-se dizer que essa expansão das áreas
urbanizadas é acompanhada por uma crescente demanda de infraestrutura urbana e
serviços.
Uma das características mais marcantes do recente processo de urbanização
brasileiro é a mudança das tradicionais tendências de concentração - tanto da
população quanto dos agentes econômicos - nas metrópoles do país, igualmente
tradicionais. Tem-se observado que as grandes metrópoles tem apresentado um
ritmo muito mais lento de crescimento enquanto, por outro lado, as cidades médias
vêm apresentando os índices de crescimento mais elevados e, como efeito, maiores
concentrações econômicas e demográficas.
O estudo do crescimento urbano de um município possibilita a identificação e
a análise de tendências quanto à expansão das áreas urbanizadas, sendo de
grande importância para atividades de planejamento e política urbana. Novas
tecnologias têm impulsionado significativos avanços em relação a estes estudos a
partir de ferramentas que possibilitam uma análise das interações entre a
população, o espaço e a paisagem. O uso de imagens de satélites tem se mostrado
cada vez mais presente nos estudos e diagnósticos urbano-regionais
proporcionando resultados mais rápidos e precisos em comparação a levantamentos
tradicionais.
O sensoriamento remoto se mostra como uma ferramenta bastante eficiente
para avaliar os processos de expansão do espaço urbano uma vez que possibilitam
a obtenção de imagens regionais e informações em tempo real tornando possível a
delimitação dos limites e monitoramento urbano. A análise da expansão urbana
através do sensoriamento remoto, juntamente com o Sistema de Informação
Geográfica (SIG), permite uma interpretação do crescimento urbano auxiliando na
metodologia para elaboração de planos de gestão, manejo recursos naturais,
planejamento urbano, direcionamento dos crescimentos físico e econômico dos
municípios, etc. (SANTOS, et al. 2011)
A análise espacial num SIG pressupõe o conhecimento das relações
espaciais entre as entidades geográficas fundamentais, podendo promover a
agregação de dados de várias fontes que podem ser representadas espacialmente,
exprimindo a totalidade e a complexidade da realidade ambiental. Segundo Silva et
al. (2002) tratar situações e/ou fenômenos que se dão no espaço exige informações
especializadas e integradas que auxilie na tomada de decisão. Nesse sentido, a
análise espacial contribui para subsidiar a tomada de decisões e a consequente
intervenção no espaço.
2. OBJETIVOS:
Tem-se como objetivo geral deste trabalho a geração de dez mapas
temáticos que retratem a evolução da mancha urbana das cidades trabalhadas em
questão. Tais mapas visam apresentar a mancha urbana num recorte temporal de
trinta anos. Especificamente para cada cidade, objetiva-se produzir um mapa a cada
dez anos, ao longo dos anos de 1986, 1996, 2006 e 2016.
Como objetivos específicos, tem-se: a) observar possíveis padrões e eixos de
crescimento urbano; b) relacionar tais feições obtidas com fenômenos e ações
praticadas de acordo com a característica político-econômica de cada município; c)
correlacionar as cidades com características econômicas semelhantes mesmo que
estejam distantes ou localizadas em regiões diferentes.
3. MATERIAIS E MÉTODOS:
A metodologia de trabalho escolhida divide-se em três etapas citadas a
seguir e explicadas em sequência: obtenção de imagens de satélite apropriadas
para a finalidade da pesquisa; processamento dessas imagens; análise e discussão
dos resultados obtidos.
Como primeira etapa, buscou-se imagens de satélite cujo foco principal fosse
uma cena de abrangência grande e com resolução espacial que permitisse a
visualização das manchas urbanas, assim como a existência de imagens dos anos
escolhidos para tal pesquisa: 1986, 1996, 2006 e 2016. Com isso, optou-se pelas
imagens do satélite LANDSAT-5 e LANDSAT-8, pois a resolução temporal destes
abarca as necessidades e objetivos deste trabalho, sendo que o primeiro nos
forneceu as imagens dos 3 primeiros anos escolhidos e o segundo, do último ano. É
válido ressaltar também, que a opção pelos satélites LANDSAT obedecem o critério
de uma padronização das cenas, isto é, seguem limites semelhantes por possuírem
ambos órbitas polares conforme pode-se observar no site www.stuffin.space. Todas
as imagens foram obtidas gratuitamente do site do Instituto Nacional de Pesquisas
Espaciais (INPE), motivo este que também se configurou como critério de escolha
dos satélites em questão por facilitar o acesso às informações necessárias para o
trabalho.
A segunda etapa da pesquisa envolveu o uso do software ArcGIS 10.1 para
se processar as imagens chegando-se no resultado final dos layouts que serão
apresentados nos resultados e discussões deste trabalho. Como o conjunto de
dados obtidos online exigiu um processamento mais eficiente, conforme
apresentaremos no passo à passo a seguir, utilizou-se os equipamentos e materiais
que o Laboratório de Geoprocessamento do Departamento de Solos da
Universidade Federal de Viçosa nos disponibilizou.
Pela opção de se trabalhar com 10 cidades mineiras, pré-definiu-se um
recorte temporal de trinta anos de evolução, sendo que para cada cidade, se obteve
4 imagens referentes à anos representativos num intervalo de 10 anos, sendo eles
os anos de 1986, 1996, 2006 e 2016. Obteve-se então, por meio de download dos
dados diretamente do site do INPE, quarenta imagens a serem processadas, sendo
que para o satélite LANDSAT-5 cada cena é composta por sete bandas espectrais,
característica do sensor TM (Thematic Mapper), e o LANDSAT-8 11 bandas,
característica dos sensores OLI (Operacional Land Imager) e TIRS (Thermal Infrared
Sensor).
Tomando como exemplo a cidade de Uberaba, descreveremos a seguir o
passo à passo do processo de produção dos layouts finais, explicando cada etapa e
apresentando as capturas de tela (printscreen) que demonstram as ferramentas
utilizadas no software.
O primeiro passo foi, ao abrir um novo projeto em branco no ArcMap,
adicionar as bandas espectrais da cena do ano de 1986, estas capturadas pelo
satélite LANDSAT-5 com resolução espacial de 30m, resolução temporal de 16 dias
e cena de 185km². Tendo em vista que o satélite LANDSAT-8 entrou em órbita
apenas no ano de 2013, as imagens dos anos de 1986, 1996 e 2006 foram obtidas
pelo LANDSAT-5. Utilizando o comando Add Data, adicionou-se as bandas para, em
seguida, compor a imagem pelo comando Composite Bands, no menu ArcToolbox >
Data Managment Tools > Raster > Raster Processing > Composite Bands. Para o
LANDSAT-5 utilizamos as bandas de 1 à 5 na composição da cena, pois para o
objetivo do trabalho as bandas 6 e 7 demonstraram ser pouco efetivas pela
abrangência espectral das mesmas. Com a cena composta, passamos para a
edição das bandas e cores, de modo a atingir uma composição funcional para se
destacar a mancha urbana. Conforme a tabela 1 abaixo, que apresenta as
especificações de cada banda espectral, optou-se por utilizar a banda 3 no
vermelho, banda 2 no verde e banda 1 no azul, tendo como resultado final uma
composição bem próxima do visível:
Tabela 1 - Bandas espectrais do LANDSAT-5 e suas especificações:
(Fonte: IBGE)
É possível notar que a cidade de Montes Claros tem sua maior expansão da
mancha urbana no decorrer dos anos 2000, tendo em 2006 maior crescimento
direcionado majoritariamente no sentido oeste e noroeste da cidade. Nota-se em
2016 um crescimento abaixo do ano anterior estudado apesar da população neste
ano ser de 370.216 habitantes (Tabela 2), mas mesmo assim de grande relevância.
Porém, o adensamento urbano se estende de forma mais visível, em questão de
espacialidade, para as regiões sul, leste e nordeste, muito devido a alteração na
distribuição espacial de diversas atividades. Importante ressaltar que apesar da
mancha urbana ter se expandido ao entorno da cidade ao longo desses anos, a
região sudeste foi a única que não se ampliou nesses dois últimos anos de análise,
tendo apenas um mero crescimento nos dados de 1996.
Figura 10: Layout do mapa da expansão urbana de Pirapora:
4.3. Observações:
É válido ressaltar que o crescimento da malha urbana não está diretamente
relacionado com o crescimento populacional, isto é, a expansão horizontal da
mancha urbana observada nos mapas produzidos não representa necessariamente
uma correlação com o crescimento demográfico. A área pode aumentar
exponencialmente, não sendo acompanhada de um crescimento populacional nas
mesmas proporções, sendo que isso se deve à inúmeros fatores, como por
exemplo, loteamentos com poucas casas, áreas de condomínios e realocação de
populações por programas sociais governamentais de moradia, como o “Minha
Casa, Minha Vida”. No caso da cidade de Viçosa, o que se observa é uma
particularidade no fenômeno da expansão urbana, já que o crescimento
populacional foi elevado e o aumento da mancha urbana não foi equivalente, devido
à intensa verticalização do hipercentro ou “área core”, segundo Santos (2011).
Abaixo, segue a Tabela 2 com os dados populacionais obtidos no site do SUS
para os anos trabalhados. Nota-se, pela análise desta comparando-a com os mapas
das cidades apresentadas, um boa correlação dos anos de maior crescimento
urbano com crescimento populacional, levando-se em conta a particularidade de
alguns casos, como citado no parágrafo anterior. Além disso, percebe-se também
um maior aumento populacional no período de 1996 à 2006, por exemplo, tomando
como base os dados das cinco primeiras cidades, em ordem alfabética, Conselheiro
Lafaiete, Governador Valadares, Ipatinga, Juiz de Fora e Montes Claros, observa-se
um aumento demográfico de, aproximadamente, 19.000, 28.000, 40.000, 85.000,
77.000, respectivamente, sendo estes os maiores índices de crescimento no recorte
temporal adotado. Este padrão se repete para as demais cidades, salvo exceções,
como é o caso de Pirapora e Unaí, cujos valores de expansão populacional são
muito baixos quando comparados com as cidades estudadas de maior porte.
Tabela 2: Populações das cidades nos anos em questão:
(Fonte: datasus.gov)
5. LITERATURA CITADA:
Até 2050, dois terços da população mundial viverão em cidades, afirma ONU.
Disponível em:
<http://oglobo.globo.com/sociedade/ate-2050-dois-tercos-da-populacao-mundial-vive
rao-em-cidades-afirma-onu-13208935>. Acesso em: 25/11/2016
FILHO, Elpídio Inácio Fernandes. et al. Roteiro de Aula Prática ArcGIS 10. 1. ed.
Universidade Federal de Viçosa. Viçosa - MG, 2012.
LIPIETZ, Alain. O Capital e Seu Espaço. (Trad. Manoel Seabra). São Paulo: Nobel,
1988, pp.15-31.
Site com as órbitas dos satélites. Disponível em: < http://stuffin.space/ >. Acesso em
22/11/2016.