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LEONARDO BENEVOLO

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da urbanística
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moderna

COLECÇÃO DIMENSC>ES

1. A ARTE COMO OFICIO - Bruno Munari



2, O DESIGN INDUSTRIAL E A SUA ESnTICA - Gillo Dorlles
3. ARTISTA E DES/GNER - Bruno Munari
4, APRENDIZAGEM DA FOTOGRAFIA -INICIAÇÃO - Michael Langlord
5, DESENHO DE PERSPECTIVA - Robert W, GõII
6. DESENHO BASICO - As Dinâmicas' da Forma Visual- Maurice de Sausmarez
7. PROJECTAR A CIDAOE MODERNA -lo Benevolo, Tommaso Giura Longo .
e CarIo Melograni . , :":.c ,,-,_;,;:'_"':._,;,- ,.. "".. ,.i';".' ,."'''.i " ..
B, APRENDIZAGEM DA FOTOGRAFIA - APERFEIÇOAMENTO'-'-,r..'Ilche.I.Langlo'rd&>;f':;,/é::;": ,,: ::',: ",''',
9. FATASIA. Invençã. Çri8tividad 8 'Imaginaçã.õ_;"Bn:l"tio:¥;ri:i:f:a;-j,,,Z:),: .. -::/.; .:_.'_ ';.
,,10, AS ORIGENS ,DA. URBANISTICA' MOOERNA"'L.àn.rdo';B.ne\iólo',,,,;,,:i'::'\F'd';,,,>:,,, ' '
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, EDITORIAL PRESENÇA

PORTUGAL
• LIVRARIA MARTINS FONTES

BRASIL

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A república dos iguais, esse grande


albergue aberto a todos os homens.

Do Manifesto dos Iguais, 1796.

Titulo original LE ORIGINI DELL' URBANISTlCA MODERNA


e Copyright by Gius. Latcrza & Figli - Bari
Traduçl0 de Concciçl0 Jardim c Eduardo L. Nogueira

Reservados todos os direitos


para a língua portuguesa à
EDITORIAL PRESENÇA, LDA.
Rua Augusto Gil, 3S-A - 1000 LISBOA
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PREFÁCIO

A urhanlstica moderna não surgiu con/emporaneamente aos


processos técnicos e económicos que deram origem e implicaram
a transformação da cidade industrial, mas formou-se posteriormente.
qLUUldo os efeitos quanlitaJivos das transformações em curso se tor­
naram evidentes e entraram em conflito entre si, tornando inevitável
uma intervenção reparadora.
Ainda hoje a técnica urbanística se encontra normalmente
atrasadLJ relativamente aos acontecimentos que deveria controlar e
conserva o carácter de um remédio aplicado a posteriori. Torna-se
por isso importante estudar as primeiras experiências urbanísticas
aplicadas ao ambiente industrial, para descobrir o motivo do aJraso
inicia/o
O presente ensaio tem o propósito de pôr em evidência. em
primeiro lugar, a dupla origem, técnica e moralista, dessas expe
riências, e propõe-se reconstruir paralelamente os dois tipos de mo
vimentos dos primeiros reformadores: as transformações económicas
e sociais que produr,iram os desequilíbrios dos primeiros decénios
do século XIX. e as transformações da teoria política e da opinião
pública, para quem estes desequilíbrios já não eram aceites como
uma fatalidade inevitável. mas te apresentavam como obstáculos que
podiam e deviam ser removidos.
As primeiras tentativas para corrigir os males da cidade indus­
triai polarizaram.se em dois casos extremos: ou se defendia o ne.
cessidade de recomeçar do princípio, contrapondo à cidade existente
novas formas de convivência ditadas exclusivamente pela teoria.
ou se procurava resolver os problemas singulares e remediar os
inconvenientes isoladamente, sem ter em conta as suas conexões
e sem uma visão global do novo organismo citadino.
Ao primeiro caso pertencem os cluunados utópicos - Owen.
Saint-Simon, Fourier. Cabet, Godin - que não se limitam contudo

9
.;

a descrever a SlU! cidade ideal, como Moro, Campane/la ou Bacon, o debate cultural dos últimos trinta anos ensinou a reconhecer
mas se empenham en-I' pó.la em prática,' ao segundo caso pertencem o conteúdo político virtual das opções urbanísticas, mas este reco­
os especialistas e funcionários que introduzem na cidade os novos nhecimento manter-se-á apenas no domínio teórico enquanto vigorar
reguÚNnentos de higiene e as novas instalações e que, tendo de o conceito da urbanística como um campo separado de interesses,
encontrar os meios técnicos e jurídicos para levar a cabo estas que deve depois ser relacionado com os de naJureza política, o que
modificações, dão efectivamente início à moderna legislação ur. constitui justamente a herança actual da separação entre os dois
banística. termos operada em 1848.
A maior parte destas iniciativas, mesmo as aparentemente mais Owen e Chadwick, se bem que apegados a uma ideia primi­
técnicas, possuem um fundo ideológico facilmente reconhecivel, que tiva da planilicação urbanística, mostram-nos esta simples verdade:
coincide em larga medida com os primórdios do socialismo modema, que a urbanistica é uma parte da política, necessária para concre­
de tal modo que para encontrar notícias destes acontecimentos tizar qualquer programo. operativo e simultaneamente não redutível
convém consultar os manuais de história económica e de história às fórmulas programáticas gerais.
do socialismo. mais do que os livros técnicos especializados. Para melhorar a distribuição territorial das actividades huma­
Esta coincidência só é porém verdadeira até 1848. enquanto nas é necessário melhorar as relações económicas e sociais de que
o movimento operário não está ainda organizado contra os partidos dependem essas actividades; por outro Lado, não basta melhorar
burgueses: de fac/o, nas experiências urbanísticas deste período con­ as relações económicas e sociais para que as espaciais fiquem aula­
fluem diversas correntes ideológicas. desde o comunismo igualitário maticamente corrigidas.
de Cabet ao neocatolicismo francês. Os tempos e os modos desta acção são infinitamente mais
Marx e Engels imprimem seguidamente ao movimento operário complexos do que Owen poderia supor, mas o objectivo estabelecido
a viragem decisiva, e o socialismo marxista, empenhado em explicar pela sua utopia continua ainda válido para os planos urbanisticos
a revolução de 48 e o seu insucesso em termos estritamente p0­ contemporâneos: «Encontrar uma colocação vantajosa para todos,
liticas, põe em evidência as contradições dos movimentos anteriores, num sistema que permita a continuação do progresso técnico de
mas perde de vista a interligação entre as instâncias politica e modo ilimitado ...
urbanística, que apesar de formulada de um modo simplista fora Na História da Arquitectura Moderna tentei já uma breve
até aí tenazmente mantida. reconstituição desces acontecimentos. Fui induzido a voltar ao dis.
De aí em diante. a teoria politica menospreza quase sempre curso de então, não por uma exigência dialéctica, talve::. prematu­
as investigações e as experiências sectoriais, esforçandcrse por absor ra, mas devido a algumas experiências recentes que tornaram ur.
ver, sem deixar residuos, as propostas de reformas parciais na reforma gente a definição de uma nova relação entre urbanistica e politica.
geral da sociedade. Por seu lado: a cultura urbanistica, isolada do e por conseguinte entre planificação espacial e planificação sócio­
debate político, conligurase cada vez mais como uma simples técnica -económica. Creio, além disso, ter individualizado a principal Ira.
ao serviço do poder constituído; mas não se torna por isso polili. queza daquele discurso, isto é. o omisso conlronto entre os acon­
camente neutra, caindo sim no âmbito da nova ideologia conser. tecimentos urbanísticos e arquitectónicos e a prolunda transforma­
vadora em formação precisamente nesses anos, do bonapartismo em ção da conjuntura política entre 1830 e 1850, e sobretudo a crise
França, dos grupos tories inovadores em Inglaterra, do imperialismo de 1848. O esclarecimento dado nestas páginas rectifica, a meu ver,
bismarckiano na Alemanha. inclusive a exposição dos acontecimentos do final do século e per
Daqui deriva a feição agnóstica e subalterna das principais mite uma melhor compreensão dos movimentos de vanguarda de
experiências urbanisticas posteriores a 48, por trás da qual se esconde Morris em diante. Deste modo, toda a História da Arquitectura Mo.
o paternalismo politico da nova direita. derna se poderia rever deste ponto de vista, sem qlU!lquer melindre
Esta é a tese central do livro, que contém ainda uma pista para o autor, uma vez aceite o carácter provisório de um discurso
para o debate contemporâneo. As instâncias renovadoras da cultura histórico que entra em linha de conta com os propósitos operativos
urbanistica moderna só podem efectivamente traduzir-se em realidade do nosso tempo; isto indica apenas que as condições do nosso tra­
se retomarem o contacto com as forças políticas que tendem para balhó mudam a todo o momento, exigindo uma contínua revisão
uma transformação geral análoga da sociedade. das nossas concepções sobre o passado recente.
[1963]

10 II
I

A FORMAÇÃO DA CIDADE INDUSTRIAL

A história da urbanística moderna é, numa primeira fase, uma


história de simples factos: as mudan as roduzidas radualmente pela
.revolução industrial nas cida.des e nos campos só mais tar e su E.­
clarameiifee são percebidas como problemas, Quando as Quantidades
e.l!l...íº o se tornam suftclentemente randes.
A primeira mudança eC1Slva e o aumento de população, de­
vido à diminuição da taxa de mortalidade que, pela primeira vez,
se afasta decididamente da de natalidadel. Este mecanismo de

1  população inglesa começa a aumentar rapidamente a partir de


1760. Os calculos modernos, baseados nos numeros de enterros e de baptismos.
estabelecem Que em 1700 a população da Inglaterra e do Pais de Gales era
de cinco milhões e meio. e em 1750 de seis milhões e meio; mas em 180 I.
quando se faz o primeiro recenseamento. já subira para nove milhões, e
em 1831 para catorze milhões. Sabe-se, por outro lado, que a natalidade
_ após um leve aumento nos quatro primeiros decénios do século dezoito­
se mantém praticamente constante em todo o período, com um índice variável
de 36,6 a 37,7 por mil, e não parece que a imigração de outros países tenha
sido consistente, mantendse certamente inferior à emigração para as colónias.
Em contrapa.rtida a mortalidade. alta até 1740 devido às carências e ao
alcoolismo. diminuiu gradualmente de 35,8 por mil no decénio de 173040
para 21,1 por mil no decénio de 1811-21. Entre as causas desta diminuição.
Ashton enumera a introdução das culturas de tubérculos. que facilitou a
criação do gado no Inverno e [ornou possível o reabastecimento de carne
fresca durante todo o ano; a substituição dos outros cereais pelo trigo e o
maior consumo de verduras; o melhor asseio pessoal, devido ao maior consumo
de sabão e de roupa branca de algodão; a substituição da madeira pelo tijolo
para as paredes, do colmo pela ardósia e pela pedra para OS telhados das casas;
a diminuição dos fabricas industriais Que se praticavam dentro das paredes
domésticas; os progressos da medicina e da cirurgia, o aumento dos hospitais
e dos dispensários;' a localização mais racional dos depósitos de lixo e dos
cemitérios; o melhoramento dos esgotos e dos aquedutos nas cidades (CC.
T. S. ASHTüN, Industrial Revolution).

13
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crescimento..dá mesmo origem a uma mud.anç.a da comÇÃo 1i\1'bx,..1>S: era o trabalo industrial, sobretudo o .têx.til, que desde há muito
interna - aumenta a pgntagem da l1QP.11!ill9-l9'yem, pela queda  estava orgamzado nos campos, nos domicílIOS. dos camponeses. Mas
a mortalidade infantil-' Q.mPS._SQQ[,-º secular eqülll-' - a antiga organização familiar, no âmbito da qual as operações de
brIO as circunstâncias..l!.!!turais, pelo qual cada geração tendia a <.1 "V'" fiação, tecelagem e tintura eram realizadas pela mesma família, que
Ocupar o lugar das precedente e a repetir o seu destino. As suces-:RJPS .,. -'" comprava a lã bruta e vendia o produto acabado, era demasiado
slvas geraç.oeuncontram-se num!l-º.flva sltua..£ão e têm de resolver- "-"' . estática e improdutiva para fazer face à procura de um mercado
com novos meios um roblema desconhecido. --- --------- em contínua expansão; por isso, os comerciantes preferiam fornecer
. medida que aumenta o numero OoShabitantes, muda a sua a matêria-prima e receber o produto acabado, pagando o trabalho
distribuição no território como efeito das transformações económicas. feito por empreitada, podendo as diversas operações ser confiadas
As primeiras transformações dizem sobretudo respeito à organização a diferentes grupos de operários especializados.
do trabalho, criando as premissas para uma mudança completa na Esgotadas porém as margens de maior. produtividade facul-
técnica produtiva, que se reflccte à sua volta sobre a organização tadas por este sistema, as exigências da concorrência impunham
acelerando o desenvolvimento e a concentração do novo sistema uma ulterior diminuição dos custos e um aumento das quantidades,
económico. Por este motivo, a mudança da distribuição da população tendo estimulado uma série de invenções técnicas que mudaram
provocada pelas primeiras transformações organizativas e acentuada radicalmente as condições de trabalho.
pelas inovações técnicas, assume o carácter de uma verdadeira crise, Os tecelões usavam a máquina inventada em 1733 pelo relo-
alterando bruscamente o antigo equilíbrio entre cidade e campo joeiro J. Kay (//y shutt/e), que permitia que cada operário traba-
e criando novas tensões que s6 a longo prazo se poderão reequilibrar. lhasse sozinho no tear sem o auxílio de um ajudante que estendesse
Mas convém acompanhar ponto por ponto os efeitos das trans- os fios; a produção continuava porém limitada, pela impossibilidade
formações económicas sobre o povoamente urbano e rural que se de produzir fio em quantidade suficiente, até que em 1764 o car-
delinearam em Inglaterra entre 1760 e 1830. pinteiro Hargreaves inventou um novo tipo de máquina de fiação
A vedação [enclosure]" das antigas terras comuns em redor das (ienny) que tornava possivel a um s6 operário manobrar mais fios.
aldeias inglesas torna possível uma melhor utilização do solo e trans- A Jenny e a I/y shutt/e entraram assim nas casas rurais dos
forma gradualmente os cultivadores directos em rendeiros ou assaI a- distritos lanígeros e algodoeiros, modificando o ritmo de vida de
riados, coagidos a um nível de vida forçado. pouco superior ao mínimo cada componente válido da família. Mas a quantidade de fio e de
necessário para sobreviver'. A alternativa para este estado de coisas tecido produzido por cada máquina era necessariamente limitada pela
energia que o trabalho muscular permitia imprimir; para ir mais
além era necessário substituir o braço do homem por um impulso
• Emparcelamento e vedação das terras comuns, que passam a ter pro­
mecânico.
prietário individual [N. T.). Em 1771, um barbeiro de Preston, R. Arkwright. inventou a
2 Em 1795, o subsídio que a freguesia devia pagar aos trabalhadores
primeira máquina de fiação movida a energia hidráulica (water
necessitados foi estabelecido pela Spnhamland Rsolulion. determinando que Iramei, e em 1775 o tecelão S. Crompton começou a experimentar
cada familia tem direito a uma retribuição mínima, em conformidade com uma máquina mais aperfeiçoada. resultante de uma combinação
o preço do pio, e que a freguesia deve completar o salário real ate àquele da jenny com o novo tear a água.
nível: aQuando um pedaço de pão de um galão custar um x:elim. então cada
Estas in\o'enções deram à fiação uma vantagem temporária
homem pobre e laborioso receberá para a sua subsistência tres x:elins !:emanais.
ou através do seu trabalho e do da (amllia, ou do subsídio aos pobres. e para sobre a tecelagem. até que em 1778 o reverendo E. Cartwright
o sustento da sua mulher ou de qualquer outra pessoa da (amnia receberá um inventou a primeira tecedeira mecânica; pouco depois. entre 1785
xelim e seis pence. Quando o mesmo pedaço de pão custar um xelim e quatro
e 1790, descobriu-se uma forma de substituir a energia hidráulica
pence, enrlo cada homem pobre e laborioso receberá quatro x:elins semanais
para o seu rostento e um xelim e dez pence para o de um outro membro recorrendo.à máquina a vapor de Watt, patenteada em 1769.
da sua família. E assim por diante proporcionalmente ... «(cit. em The Vil/age A indústria têxtil tinha portanto de abandonar a antiga orga­
Labo",.,. l. L. e B. HAMMOND. London 1911, p. 139). nização dispersa e concentrar-se em grandes oficinas onde pudesse
Deste modo, o subsidio aos pobres serviu, até 1834 - quando o sistema
foi abolido - para m3nter os salários agrícolas baixos, assegurando aos tra.
dispor da necessária força motriz, primeiro próximo dos cursos
balhadores o mínimo vital mas excluindo qualquer melhoria da sua condição. de água e depois das minas de carvão, necessárias para alimentar

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Figura 1: A aldeia de Balscolt (Oxfordshire) em 1768. com os terrenos co­ Figura 2: A mesma aldeia após a vedação [emparcelamento] dos lerrenos
muns dados em concessão em pequenos loles (em T. SHARP. Eng/ish Panorama). comuns (em 5HARP).

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a máquina de Watt. Por sua vez, a máquina a vapor permitia resolver


definitivamente o problema da eliminação das infiltrações de água
nas minas, .revolucionando a técnica de extracção do carvão e
transformando a própria mina numa oficina moderna.
No mesmo pedodo tornou-se de uso comum a invenção de
Darby que substituía o carvão vegetal pelo coque, na laboração
dos metais ferrosos, e em 1783 H. Cor! descobriu a maneira de
utilizar o carvão nos processos de pudlagem e de laminagem; a si­
derurgia tornou-se apta a alimentar a indústria mecânica nascente,
e até as fundições, como os altos fornos, se deslocaram das regiões
de floresta para as regiões mineiras, favorecendo o nascimento de
grandes instalações de tratamento completo.
r. Assim, consumaram-se durante uma única geração, entre 1760


e 1790, os progressos técnicos que tornaram possível um aumento
ilimitado da produção industrial'; o desenvolvimento das indústrias

li
e a sua concentração em grandes oficinas atraíram muitas famílias
dos distritos agrícolas do Sul para os distritos mineiros do Norte
e do Centro, e transferiram-nas das casas isoladas do campo para
os bairros compactos construídos nas proximidades das oficinas; nas­
 ceram assim, improvisadamente, novas cidades, e muitas das cidades
,;lf antigas cresceram desmedidamente',
A associação entre indústria e cidade depressa se consolidou:
;  nas novas cidades, que se desenvolveram fora do sistema tradicional 117

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dos burgos e freguesias empresários e operários po f
. aos vínculos anacrónicos do sistema corporativo isabelin9; os empre. '.
o -1'1 sários contavam com uma reserva de mão-deobra sempre abun.

 dante e substituível, enquanto os operários, se bem que cruelmente


explorados pelos novos patrões, encontravam na cidade uma maior
r:> .­ variedade de escolha e uma possibilidade de reconhecer-se como
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":>v ... classe, de se organizarem em defesa dos interesses comuns.

 A produção de feITO passou de 17000 !oneladas em 1740 para


650000 em 1830; a indústria do algodão trabalhava em 1764 (Quando a jnny
foi descaberIa) 8800 000 libras peso por ano, que aumentaram em 1775
-com o aparecimento do tear a vapor-para 18 milhões. em 1810 para
123 milhóes, e em 1830 para 273 milhões de libras (cf. C. BARBAGALLO.
L Or;g;ni delta Grand Industria Contmporanea, Florença 1951).
, Manchester, que em meados do século XVIII era uma aldeia de Figura 3: Uma pane da perireria de Nottingham, onde o loteamento privado
12000 habitantes, transforma.se em 1800 numa cidade de 95000, e em 1850 acompanha o traçado da vedação (cf. W. C. HOSKINS, Tne Making o/
atinge os 400 000 habitantes; entre meados dos anos 700 e dos anos 800. £ng/ish Landscape).
Glasgow passou de 30000 para 300 000 habitantes, e Leeds de 17000 para
170000. Em França. Mulhouse passou de 10000 habitantes em 1812 para
36000 em 1836, e Roubaix de 8000 em 1816 'para 6S 000 em 1866 (eL P,
LAVEDAN, Histoir de I'Urbanisrne, vol. III, Paris 1958).
, As primeiras associações operárias, surgidas como antitese das cor.
porações tradicionais, incorrem nas proibições da lei francesa de 1791 e da
inglesa de 1800, revogadas respectivamente em 1813 e em 1824.

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Entretanto, devido às exigências do comêrcio e especialmente


Ir
para o transporte das mercadorias pobres e pesadas como o carvão <..
e os minerais ferrosos, foi renovada a rede das vias de comuni. ÉfI
cação; as incómodas estradas das freguesias foram substituídas depois
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de 1745 por novas estradas com portagem. construídas por com.
panhias privadas; os estuários e o curso dos rios navegáveis foram 
-- --4;;.-=
ligados por novoS canais após os anos 60; outras companhias pri. m-:K..'
vadas organizaram nas estradas c nos canais um serviço regular .1.1) \p:..'0/
de diligências e de embarcações para o transporte de passageiros ,. \\:.,.,
e de mercadorias. Em 1767, R. Reynolds constrói o primeiro carril
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em ferro fundido para o transporte de carvão. e em 1801 entrou
ao serviço a Surrey Iron Railway. a primeira empresa ferroviária
para o transporte de mercadorias; mas só depois de 1825. a seguir
à invenção da locomotiva de Stephenson, se iniciou o desenvolvi.
menta dos caminhos de ferro. marcando assim decisivamente os
\f':i---=- =:;= /'ld';";r.ll..:
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decénios seguintes.
E em função da nova rede de transportes e do movimento

..1".ti L'h:
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hl. 'f.t.:'!.;. . .:;:
comercial sempre em expansão que convém interpretar o cresci.
menta sem precedentes de algumas cidades. para onde convergiam
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-Tr'4 'C••,..'-. .:..c,.'/,
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as vias comerciais e onde se concentravam as alavancas de comando.

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financeiras e administrativas, da nova economia; no final dos anos
700, Londres tinha já um milhão de habitantes. e em 1841 estes
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eram avaliados em 2235 000. superando qualquer outra cidade pre.
sente e passada. . Il .. 1, .. "v'"ff'.' . . ..' "
'1' .'fl Este conjunto de transformações originou a mudança de do.
'. . . '""1' \. : .:.:+:
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jJ} micilio e de modo de vida da maior parte da população inglesa,

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 .....:'l', 'i (.:.:;.
.... ,.... ",('.:
e modificou a utilização do solo e a própria paisagem. E totalmente

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nova a natureza dos fenómenos - a multidão dos habitantes, o nú'
mero de novas casas, a capacidade das novas zonas industriais e i.i:. :f':':':\j
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---.:'vil:; - :,>' '.i';, .
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'8 j IÍ I ."/J-,
V '\,\.,.
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comerciais, os quilómetros de novas estradas e canais, o número de
veiculas que circulam nas estradas da cidade - e a velocidade das
.... . , . :
. £
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transformações não tem precedentes: cidades que nascem e duplicam
numa geração, iniciativas especulativas que se concretizam pronta.

 
mente em estabelecimentos, estradas, canais e minas abertas em

!',-,{-' 
poucos anos na paisagem agreste, altos fornos e chaminés apon.
tadas para o céu ao lado das torres das catedrais.
"tt A cultura política e económica dUPoca é tOCi!.c!JLMO tanto
.por aquilo que de nOYlLiCwnllrói,..maLp.cla queda ds estt}l.""'.
. ,dlclonalS e teoriza sobretudo a oposio aos YíncuLs e institujçs.
gue impedema!iYr.e....e..pansão-liasnov..J!..i\..l!.Jivas.
Os reformadores políticos usam a crítica racional para demolir
os privilégios do absolutismo. da hierarquia social. do dirigismo eco. Figura 4: A aldeia industrial de Sunny Brow, Durham (em SHARP).
nómico, e enquanto estudam com cuidado as garantias do cidadão

20 21
..... __ .-=:..:- .;:> _.; :-.:>o ..:P' .'::.. - .. ::...:-:...:..... ........"'....;;..;.;...., -,- -- .

contra os abusos da autoridade, deixam na sombra o tipo de orga­


nização do novo Estado, concebido de preferência como um espaço INGLATERRA E GALES
Pnndpaia canais lt Iios
vazio onde o individuo e o poder público se confrontam directa­ SCOTLAND no lnldo dO sêaJlo XIX
mente, abstraindo de qualquer estrutura intermédia que perturbe essa ltl'\as inglesas

relação: a realização do ideal democrâtico parece de facto condi-41l.1 >JWAS \)\A e'OJ)
,
... to ..

cionada à absorção de todas as «sociedades parciais» pela «república» c T'«J'!.lt:AS S;O A c.n.;,_

"100_
soberana'. ....1 .."Ç,.;, t'-5,.;eU>.\.
Esta posição teórica,enquanto coloca em primeiro plano os \.\Ir;-) ""R, 1>\:1><" S<c
problemas políticos gerais ç coostjtt!cjooais, menospreza os QI..Q.:...b,alNe\e- o :fl2.OT>l.£1.f
blemas orgamzativos sectoriais ou redu-los a simples deducÕes dos POV"ttlCill (tIJ::!é bV'll€:"M -«,
enunciados teoncos gerais. IJP. -;)\l 'v'" (.>;ltAI1VfZ.
Qualquer dificuldade encontrada, relacionada com a sobrevi-t;)f.:. OfZ.";I'eIX.
vência de alguma instituição tradicional, favorece a formação de
teorias que excluem qualquer forma de intervenção pública nesse
sector. Durante a fome de 1797, Malthus enuncia a sua teoria da
população, demonstrando a inutilidade de qualquer lei para a assis-
tência aos pobres, e em 1817, durante a depressão do pós-guerra.
Ricardo publica o seu tratado de economia política defendendo a
abolição dos impostos e das alfândegas.
Assim, enquanto o pensamento liberal consegue levar â re­
moção das velhas restrições legais e consuetudinârias - o que na
Europa e na América se realiza quase completamente entre 1776
: e 1832 - as cidades e os campos permanecem praticamente privados
!' de controlos urbanísticos adequados.
!
A parte mais progressiva da cultura económica e política
persuade os governos e a opinião pública a não interferirem, e
portanto a não reconhecerem os problemas derivados das transfor­
mações em curso no território; desacredita e enfraquece os métodos
tradicionais de controlo urbanístico, sem propor outros métodos em
alternativa, . do pelo contrário nesta matéria uma absurda
extensão d laissez faire (Adam Smith aconselha o governo a liber-

'1 r-se as proprte a es do Estado para pagar as dividas).


Os arranjos urbanisticos barrocos, sobretudo algumas realiza.
ções da corte da primeira metade dos anos 700, antecipam âs vezes
de modo sugestivo a dimensão espacial da cidade moderna (podemos
imaginar as alamedas de Versailles transformadas nos bou/evards de
uma cidade do final dos anos 800, do mesmo modo que a forma
radiada desenhada pelos jardineiros reais nos Campos Elisios virâ
de facto a constituir o traçado da Étoile haussmanniana), mas man-
tém-se de facto estranhos â dimensão temporal que condiciona assim
doravante, e decisivamente. o novo ambiente urbano. Figura S: A rede de rios e canais navegáveis ingleses em 1800 (cr. E. L.
BOGART, Hilldria Económica da Europa).

li Esta é a terminologia de Rousseau no seu Canlral Social de 1762.

23
22
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Figura 6: Vista de uma cidade católica em 1440 (cf. A. W. PUGIN, Con.


(rasis. 1836)
Figura 7: Vista de uma cidade católica em 1840 (em PUGIN).

A cidade antiga mudava assim tão lentamente que podia a


qualquer momento considerar.se imutável por tempo indefinido. Con­ Luís XV, Gabriel constrói igualmente apenas as fachadas dos
ceber uma praça, um quarteirão ou uma cidade inteira significava edifícios de cabeceira da Place de la Concorde, e as dos edir'ícios
impor-lhe, de uma vez para sempre, uma forma arquitectónica ao longo da Rue Royale (1755-63), mas os edifícios da retaguarda
precisa, dotada de margens suficientes para absorver sem modifi­ só foram completados muitos anos depois. Finalmente, quanto à
cações os previsíveis crescimentos futuros; por Qutras palavras. signi. Rue de Rivoli. os arquitectos de Napoleão I, Percier e Fontaine.
ficava aplicar a uma realidade em movimento lentíssimo a maior forneceram em 1805 apenas o desenho das fachadas, que os cons­
aproximação possível de uma imagem de facto invariável. trutores individuais se comprometiam a executar.
Mas esta aproximação torna-se cada vez mais difícil à medida Analogamente. muitos dos mais admirados arranjos do final
que aumenta a velocidade das transformações. enquanto a cultura dos anos 700 .em Inglaterra - o Circus e o Royal Crescent de
liberal destrói a confiança na iniciativa autoritária, da qual depende Bath (J. Wood. 1764 e 1769), as cêlebres sgugres londrinas de....
a possibilidade de levar a cabo, com coerência, este tipo de ope­ Bloomsbury (1775-1827), e mais tarde Regent's Street em Londres

gi
ração. Por isso. a partir de meados dos anos 700 - enquanto a ar­ (l, Nash, 1812) - çQ!ll.ig'tIl-OUlDa arqJlilectllla unj[ormt sobrep'o,,ª.
quitectura atingia por si própria o máximo apuramento no planea­ a yma multidão de casas independentes: a simçtria e a unidade

 i 1
mento dos espaços monumentais e na sua harmonização com a de rs ectiva assam d meios de controlo estrutural a meios
paisagem urbana ou natural - diminui a coerencia executiva e a ,de controlo paisagístico. O re Inamento e a elegância destes úl­
capacidade de actuar duradoiramente, com semelhantes meios. no timos produtos da tradIção clássica encobrem a separação agora
-3 ' .
tecido da cidade.
t <n1 total relativamente aos problemas da nova cidade, e impedem de

  1
Nas praças reais de Paris, a regularidade arquitectónica ê facto qualquer contacto entre esta tradição e o ambiente que se
obtida impondo uma fachada uniforme a muitos edifícios inde­ vai formando por efeito da revolução industrial.
penden'es. Mas Luís XIII. que completa em 1609 a realização V\U Enquanto a grande burguesia londrigna se reúne nos ambientes

'2  $
da Place des Vosges, reserva para si próprio a propriedade dos requintados de Bedford PIace e de Russel Square, os miseráveis
dois pavilhões axiais. Sob o reinado de Luis XIV. Mansart constrói bairros orientais crescem compactos, sem pausa nem esperança.
(entre 1685 e 1699) apenas as fachadas da Place Vendõme e da Rapidamente. a sua extensão e os seuLintonvcnjentes hjgjénjco1
 j; i .
, f5' 
Place des Victoires, que são v<ndidas aos proprietários dos terrenos, 1?useram em crise roda a cidade e foi necessário conceber de raiz
contribuindo eles próprios para a construção de alguns edificios uma nova metodologia urbanístjca sem quaisquer li£ações com

.jA>    'ãllnliga.,
circundantes, que foram executados em rápida sucessão. Para

24
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Figura 8: Paris, Place Vcndôme (vista do plano de Turgot, 1737). A praça
foi projectada por Mansart entre 1685 e 1699, em bonra de Luís XIV. mas

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iHE£.
a partir de finais de 1677 o arquitecto associara-se a outros financeiros para
adquirir e lotear os terrenos circundantes. Quando os terrenos foram postos

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à venda, foi estabelecido que tiOS compradores dos terrenos fronteiros à praça

16i!U; D i". . nU ::!(


tornar.se.ão propríetários das fachadas que Sua Majestade fizer construir. e
poderão adquirir a extensão desejada, desde que não seja inferior a duas
arcadas. Os compradores dos terrenos em redor da praça e das ruas que
circundam não terão de pagar quaisquer direitos por esta aquisição, salvo
a

-
.-
os direitos senhoriais devidos aos anteriores proprietários. segundo o decreto
do Conselho de Estado de 2 de Maio de 1686. --D' '-., - ri 
..- .
Figura 9: Paris, Place de la Concorde (em R. AUZELLE. Encyc/opédie de
/'Urbanirmt). Gabriel projectou em 1755 a decoração da praça, dedicada a
pr!lil
j,mn>,. /"\..
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Luís XV, com os arranjos ajardinados do lado das Tulherias C' dos Campos
Elísios. a perspectiva para o Sena do lado do Palácio Bourbon, e as fachadas
's:=J I  i:.
dos dois edifícios na embocadura da Rue Royale. As fachadas foram cons­ " ê5iê5
'--w- -
truídas pela autoridade comunal e postas à venda do seguinte modo: ctA Mu­
nicipalidade encarregar-se-! da construção das grandes fachadas na praça e
da sua continuação para as ruas: o terreno sobre o qual se encontram tais
fachadas continuará a pertencer aos respectivos proprietários. com as fachadas
que a municipalidade cederá nas seguintes condições: 350 liras por braça
de colunata, 300 por braça de rachada de pedra. 250 por braça da continuação
pelas ruas, com serventia de passagem no pórtico. que será calculada para
tal em um quarto do valor do terTeno (1. INSOLERA. Asptti dd Paesa'ggio
Urbano di Parigi, em .Urbanisticu, n,' 32, p. 21).

26 27
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Figuras 10 e 11:
John Wood
Bath, Queen's Square e o Royal Crescent (em AUZELLE).
iniciou a sua actividade de arquitecto e empreiteiro
precisamente com O complexo de Queen's Squarc. Arrendou o terreno cm
1724, por 99 anos, e subarrendou os lotes por 98 anos, deixando ao critério
em 8ath,

de cada um o interior dos edifícios, mas impondo fachadas uniformes. A ope.
ração foi repelida mais tarde no Royal Circus c, por seu filho John Júnior, no
Royal Cresccnt (1769), com maiores dimensões c exigências arquitectónicas

28
29
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Figura 12: Paris, Rue de Rivoli. A fachada foi desenhada por Pereier e
Fontaine. em 1806, e imposta a todos os edifícios do lado setentrional da rua.
Neste caso, a municipalidade forneceu apenas um desenho. deixando à ini­
ciativa privada todos os encargos da construção.

Figura 13: Londres, os arranjos concebidos por John Nash para o Príncipe
Regente (em H. R. HITCHCOCK, Archilclurt!. Nineteenlh and Twen/ieth Cen.
luries). Nash iniciou o projecto em 1812, para valorizar um grande terreno
de propriedade da Coroa; entre 1820 e 1830 foi feito o parque publico - o
Regent 's Park - com as casas circundantes, enquanto era aberta a nova rua
de acesso a Picadilly Circus - Regent's Street - através de um populoso quar­
teirão. Nash construiu alguns dos edifícios em redor do parque e da rua.
actuando ainda como empreiteiro privado, enquanto em 1813, na qua­
lidade de superintendente geral, teve a possibilidade de coordenar as iniciativas
dos outros empresários e dos outros projectistas.
Nash teve a colaboração de Humphry Repton para os arranjos ajardi­
nados. O conjunto de Regent's Park compreende ainda algumas vivendas
senhoriais isoladas e dois agregados de cottages. algumas em estilo clássico e
outras em estilo Tudor; as casas construídas ao longo dos terrenos periféricos
são destinados à grande burguesia, enquanto as casas ao longo de Munster
$quare são acessíveis aos recursos da clas."c média, e todo o complex.o é
servido por um mercado localizado na margem oriental.
Assim, o parque é concebido quase como uma cidade ideal, idílica
e abstracta, alheando-se dos verdadeiros problemas da cidade que se iam
agravando naqueles anos, como Chadwick se esforçava por demonstrar,

31
30
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,/

II

A ÉPOCA DAS GRANDES ESPERANÇAS ­

(1815 -1848)

Quando em Junho de 1815 chega a Inglaterra a noticia da


vitória de Waterloo, o alívio pelo final da guerra foi rapidamente
superado pelas preocupações relativas à situação interna, agravada
por muitas dificuldades que o sucesso militar deixava inalteradas.
O velho Jorge III estava louco e as suas funções eram exer­
cidas pelo corrupto Principe Regente. A política externa era dirigida
pelo frio e impopular Castlereagh, que sete anos mais tarde se sui­
cidaria perante a indiferença e a hostilidade dos seus concidadãos.
As despesas da guerra tinham causado uma progressiva inflação,
duplicando quase o custo de vida entre 1790 e 1813; agora, o final
das restrições de guerra colocava em crise quer o monopólío dos co­
merciantes ingleses nas rotas oceànicas, quer o monopólio dos agri­
cultores ingleses no abastecimento do mercado interno. O Parla­
mento, dominado pelos proprietârios fundiârios, preparava-se para
aprovar a infausta lei proteccionista sobre o trigo que iria transferir
para os consumidores, e indirectamente para o custo da mão-de-obra
industrial, os encargos da crise agricola. O medo da Revolução
Francesa transformara muitos conservadores iluminados, como Burke,
em pregadores da violência, e induzira o governo a reprimir com
desusado rigor qualquer manifestação não conformista.
Entretanto, a revolução demogrâfica e industrial transformara
jâ radicalmente a distribuição dos habitantes no território, e as

33
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o capital investido só podíam portanto ser aumentados reduzindo
COO TA' OH'"
os custos e baixando o mais possível o nível das construções. Para
além disso, a maioria das casas operárias de Manchester, de Leeds,
de Birmingham e dos subúrbios de Londres fora construída durante
as guerras napoleónicas, quando a madeira importada dos países
CHlU o, 01l .... 1.l COII 'U"':I.
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j CU"O".O bálticos começava a escassear, a mão--de-obra da construção civil
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se tornara mais dispendiosa e sobretudo as taxas de juro sobre o
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I . 'II OH "UfTIIU capital aplicado iam subindo, mantendo-se altas ainda durante muitos
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,., I " i L_ anos após o final do conflito. As condições do tempo de guerra
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contribuíram pois decisivamente para piorar a .qualidade dos novos


IIH:1 .10
O 'OH) bairros. .
100' IJ.ll
Com tudo isto, ê provável que as casas ocupadas pelas famí­
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lias operárias nas cidades não fossem piores, consideradas uma a


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uma, do que as casas do campo de onde essas mesmas famílias
-
CH'I.O , 2 'I.S)

-- provinham em grande parte.


As paredes eram construídas em tijolo em vez de madeíra,
vl.Y 011.': CO •• IOo. e os telhados em ardósia ou em pedra em vez de colmo; os quartos
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eram mais acanhados, mas sem o estorvo e a poeira das máquinas


c .. l o, '11T
fiandeiras domésticas; os sanitârios estavam ausentes ou eram igual­
mente primitivos em ambos os casos.
A diferença é, em contrapartida, evidente, se se considerarem:

I
- os problemas derivados das relações recíprocas entre as
Figura 14: Glasgow, uma casa superapinhada ainda existente em 1948 (do casas e os outros edifícios, no corpo compacto da cidade industrial;
Idournal» do Royal Institute of British Architects, 1948).
- a mudança de atitude dos habitantes relativamente aos in­
cómodos que são constrangidos a suportar .

carências dos novos locais de fixação começavam a manifestar-se . As carências higiénicas relativamente suportáveis no campo
em larga escala, na ausência de providências adequadas. tornam-se insuportáveis na cidade, pela contiguidade e o número
As famílias que abandonavam o campo e afluíam aos aglome­ enormíssimo das novas habitações.
rados industriais ficavam alojadas nos espaços vazios disponiveis Enquanto cada casa tinha muito espaço á sua volta, os de­
dentro dos bairros antigos. ou nas novas construções erigidas na jectos líquidos e sólidos podiam ser eliminados com facilidade, e
periferia, que depressa se multiplicaram formando bairros novos e as diversas actividades que se realizavam ao ar livre - criação dos
extensÍssimos em redor dos núcleos primitivos. animais, tráfego dos peões e dos carros, os ;ogos das crianças­
A construção das novas casas ou a adaptação das existentes
podiam processar-se sem interferirem demasiado entre si. Mas agora,
era obra de especuladores privados - os ;erry builders - e, devido
ao jogo da concorrência, a qualidade dos alojamentos, tal como o adensamento e a extensão sem precedentes dos bairros operários
o valor dos salários ou a extensão dos horários de trabalho na oficina, tornam quase impossível o escoamento dos detritos; ao longo das
era quase em toda a parte a pior que as famílias operárias estavam ruas correm. os regos dos esgotos a descoberto, e qualquer recanto
dispostas a suportar. Os alugueres podiam variar apenas dentro de afastado está cheio de amontoados de imundícies. Nos mesmíssimos
limites muito estreitos, nivelados pelo mínimo compatível com a espaços, promiscuamente, circulam os carros e os peões, vagueiam
sobrevivência dos vendedores de força de trabalho; os lucros sobre os animais, brincam as crianças.

34 35
,--...., ------_ '._----------------------------------=--- .. ----._.- +--- ._ .

Os bairros de habitação são construídos preferencialmente pró­


ximo dos locais de trabalho, pelo que as casas e as oficinas ficam
amiúdo em contacto, alternando-se sem qualquer ordem e pertur-
bando-se mutuamente. As oficinas impregnam as caSas de fumo,
inquinam os cursos de água com resíduos, enquanto o tráfego
industrial é penosamente tolhido pelo tráfego residencial.
Este quadro caótico vai sendo continuamente alterado pelo
dinamismo dos seus próprios factores: as oficinas transformam-se
e ampliam-se, as casas são demolidas c reconstruídas, as orlas da
cidade avançam para o campo sem se ordenarem num equilibrio
definido.

Eis a clássica descrição de Manchester feita por Engels em


1845, utilizando muitos dados dos inquéritos e dos estudos efectua­
dos nos decénios precedentes:




{Na cidade velha] as ruas, mesmo as melhores, são estreitas e tor­


tuosas, as casas são imundas, velhas, a cair. e o aspecto das ruas laterais
é absolutamente horrível. Chegando a Laog MiIIgate pela Igreja Velha. tcm.se ó"i;,"':"
 ,.r.A
logo à direita uma fila de casas antiquadas. nas quais nem uma só das paredes

rrontais se manteve de pé: são os restos da velha Manchester pré-industrial.

cujos antigos habitantes se transferiram com os seus descendentes para bairros
melhor construidos, abandonando as casas, que para eles se tinham tornado
demasiado miseráveis, a uma casta de operários fortemente mesclada de sangue
irlandes. Aqui encontramo-nos realmente num bairro quase manifestamente
operário, visto que nem as lojas nem as tabernas se dão ao trabalho de
mostrarem um pouco de asseio. Mas isto ainda náo é nada comparado com
as vielas e os pátios que se estendem por detrás. e aos quais apenas se chega
E_lendo • anles de lM31Z!!!J de 1&&3 a 1m o o. 1920 a 1940
por meio de estreitas passagens cobertas através das quais não passam nem
duas pessoas ao lado uma da outra. O 60sQun • parques C' Chareos  C&rw marítimo
- Outros taNIS -- UMa ''''••

ê difícil imaginar a mistura desordenada das casas, escarnecendo de


qualquer urbanistica racional, o seu apinhamento, de tal ordem que se en.
contram literalmente em cima uma das outras. E a culpa não é somentC'
imputável aos ediffcios sobreviventes dos velhos tempos de Manchester: em
tempos mais recentes a confusão foi levada ao máximo, pois onde quer que
houvesse um bocadinho de espaço entre as construções da época precedente
continuou-se a construir e a remendar, até arrebatar entre as casas a ültima
unha de terreno livre ainda susceptfvel de ser utilizado. A prová-lo, apre­
sentamos uma pequena pute da planta de Manchester; não é sequer a parte
Figura IS: O crescimento de Manchester (em P. GEORGES, L.f Vi/1e).
mais chocante e nio representa nem um décimo de toda a cidade velha.

36
37
terrificante das condições deste pátio naqueles tempos. Desde então, parece
que alguma coisa foi demolida e reconstruída; pelo menos, da Dueie Bridge
vêem.se ainda algumas paredes em ruinas e altos montões de entulho ao
lado de casas de construção recente. A vista desta ponte - delicadamente es.
condida dos mortais nio muito altos por um parapeito de pedra e cal da
altura de um homem - é em geral característica de toda a zona. Em baixo
corre, ou melhor. estagna o Ir":, um rio estreito, escuro, fedorento, cheio
­

,,; de imundícies e de detritos que atira para cima da margem direita, mais
plana: com o tempo seco, esta margem fica coberta de repugnantes poças
r
lamacentas, esverdeadas, de cujo fundo saem continuamente até à superfície
bolhas de gás fê tido que difundem um mau cheiro intolerável até para quem
está sobre a ponte. quarenta ou cinquenta pés acima do nível da água. Para
ali:m disso, a cada passo o rio é interrompido por altos diques, dentro dos
quais se depositam e apodrecem em grandes quantidades o lodo e os detritos.
Acima da ponte ficam grandes oficinas de curtumes, e mais acima ainda
tinturarias, moinhos para pulverizar ossos e gasómetros, cujos canais de escoa­
mento e detritos desembocam todos no Irk, que recebe ainda o conteúdo dos
esgotos e latrinas vizinhos. :£ fácil imaginar, portanto, Qual a natureza do!:
depósitos Que o rio encerra. Aos pés da ponte ve-se o entulho, a imundície,
a sujidade e as ruínas dos pátios Que dão para a íngreme margem esquerda;
as casas sucedem-se imediatamente umas às outras e, devido à inclinação da
margem, consegue ver-se um bocado de cada uma: todas negra do fumo.
Figura 16 desfeitas, velhas, com os caixilhos e os vidros das janelas em pedaços. O fundo
i: constituído por velhos estabelecimentos industriais semelhantes a quartéist.
Este esboço é suficiente para caracterizar o urbanismo absurdo de todo o [ ..• 1
bairro, particularmente na vizinhança do lrk. A margem meridional do Irk: é A cidade nova estende-se depois da cidade velha, sobre uma colina ar­
aqui muito íngreme e com uma altura entre Quinze e trinta pés; sobre este ín. gilosa entre o Irk e SI. George's Road. Aqui desaparece Qualquer fisionomia
greme declive estão construídas na maior parte das vezes tres filas de casas, a de cidade; filas, de isoladas casas ou grupos de ruas encontram-se dispersas
mais baixa das quais se ergue quase imediatamente sobre o rio, enquanto a fa­ aqui e acolá como pequenos aglomerados, sobre o desnudado terreno argiloso
chada da mais alta se encontra ao nível das colinas de Long MiIlgate. Ao longo onde nem a erva cresce; as casas, ou ante, as coltages, encontram-se em
do rio estão ainda intercaladas fábricas: também aqui as construções são portanto estado degradado, sem nunca terem sido reparadas, sujas. com Quartos em
apertadas e desordenadas. tal como na parte inferior de Long MiIIgate. A direita caves húmidas e insalubres; as ruas não são pavimentadas nem possuem
e à esquerda, uma quantidade de passagens cobenas conduzem da rua principal canais de escoamento, mas albergam inúmeras colónias de porcos, fechados
aos numerosos pátios, entrando nos quais se depara com uma revoltante em pequenos pátios e chiqueiros ou percorrendo livremente a encosta. E!tas
imundície Que não tem igual, particularmente nos pátios virados ao Irk. que ruas são tão lamacentas Que somenle quando O tempo está muito seco se
contem as mais horrendas habitações que eu alguma vez vira. Num destes tem alguma possibilidade de as atravessar sem afundar os pés até ao tornozelo
pátios, mesmo à entrada, onde termina a pasgem coberta, existe uma latrina a cada passo. Nas vizinhanças de St. George's Road, as ilhas de casas tornam-se
privada de porta e tão imunda Que os moradores, para entrarem e sairem mais densas, e deparamos com uma série interminável de caminhoS', becos.
do pátio, têm de atravessar uma poça lamacenta de urina putrefacta e de ruelas secundárias e pátios, cada vez mais numerosos e desordenados à medida
e:\crementos que a circunda. I:: o primeiro pátio junto ao lrk, por cima de que nos vamos aprox.imando do centro da cidade. Em compensação, tornam.se
Ducie Bridge, se alguém tiver vontade de o ir ver; em bai:lto, sobre o rio. mais frequentes as ruas pavimentadas ou pelo menos com passeios calcetados
encontram-se numerosas fábricas de curtum.:s, que empestam toda a zona e canais de escoamento; mas a porcaria e as carências das cas, particular.
com o fedor da putrefacção animal. Nos pátios por baixo de Ducie Bridge mente as caves, mantêm.se exactamente as mesmas.
dee-se ali:m disso por escadas estreitas e sujas, e só atravessando montóes t oportuno fazer aqui algumas observações de carácter geral sobre
de escombros e de imundicies se consegue chegar às casas. O primeiro pátio o tipo de construções próprias dos bairros operários de Manchester. Vimos
por baixo de Ducie Bridge chama-se Allen's Court, e durante a cólera encon­ como na cidade velha foi na maior parte das vezes o acaso a presidir ao
trava.Se em condições tais que a polícia sanitária teve de o desimpedir. limpar agrupamento das casas. Cada casa i: construída sem qualquer preocupação
e desinfectar com cloro: o doutor Kay faz numa sua publicação I um relato com as restantes, e os recantos livres entre aS' casas recebem, à falta de outro,

1 J. P. KAY, The Mora/ and Physica/ Condition o/ th Working C/aHes.


Employd in the Corton Manufacture in Manchester, London 1832 (Nota
de Engels]. F. ENGELS. A Situação da Classe Operária em lnglatrra (1845),

38 39
--j.------------------------------'---- --

o nome de pátios (courts). Nas partes mais novas deste e doutros bairros para a rua do lado oposto e pagam um aluguer inferior ao da primeira fila,
operários, construfdos nos primeiros tempos de norescimento da indústria, mas superior ao da segunda. Eis pois, aproximadamente, a disposição das ruas:
observase um maior esforço de sistematização. O espaço entre duas casas
 dividido em pátios mais regulares, na maior parte de forma quadrada,
aproximadamente do seguinte modo:

....

T ',l

do,"",

Rua FIIiI cen1tat

 Rua
Ru.

Figura 18

Com este sistema de construçio, a ventilação das cottags da primeira


Figura 17 fila é bastante boa. e a das COl/ages da terceira fila não é pelo menos pior
do que a das construções correspondentes do velho sistema; mas a ma central
dispostos assim de enfiada e aos quais se tem acesso das ruas através de é mal ventilada, pelo menos tanIa como as casas dos pátios. e a rua secunária
passagens cobertas. Mas se a disposição do todo, privada de um plano, era  suja e sórdida, não menos do que os pr6prios pátios. Os empreiteiros pre­
já nociva para a saúde dos habitantes porque impedia a ventilação, este modo ferem este sistema de construção porque economiza espaço e permite eltplorar
de encerrar os operários em pátios cercados de construções por todOS" OS lados ainda mais os operários melhor pagos, mediante os alugueres mais elevados
é-o ainda muito mais. O ar não tem Qualquer possibilidade de sair de lá; das coitares da primeira e da terceira fila. Em toda a Manchester se encontram
as próprias chaminés das casas constituem, até se acender o lume. a única estes três tipos de coitares, ou melhor. em todo o Lancashire e Yorkshire.
via de escape para o ar viciado dos pátios. A isto vem juntar-se ainda o facto frequentemente misturados, mas na maior parte das vezes bastante separados,
de as casas em volla destes pátios serem na sua maioria duplas, unidas duas o que permite deduzir a idade relativa dos vários bairros citadinos. O terceiro
a duas pela parede posterior, o que  já de si suficiente para impedir uma boa sistema, o das ruas secundárias, predomina decididamente no grande bairro
ventilação. E na medida em que a polícia não se ocupa das condições deS1es operário a Este de SI. George's Road, dos doj:s..lados -de Oldham Road e de
pátios, pelo Que tudo aquilo que para lá é arremessado ai pode permanecer Great Ancoats Street, e  também o mais difundido nos outros bairros
tranquilamente, nl0 é caso para ficar admirado com a porcaria e os montões operários de Manchester e dos seus subúrbios.
de cinzas e de imundícies que neles existem. Estive em pátios - nas proximi­ No grande bairro já mencionado, conhecido pelo nome de Ancoats, estão
dades de MilIers Slrect - que se encontravam pelo menos a meio pé abaixo situadas ao longo dos canais a maior parte das grandes fábricas de MancheS1er,
do nível da rua, e que não possuiam o mínimo canal de escoamento para edifícios colossais de seis a sete andares, que com as suas chaminés altaneiras
as águas que aí se concentram durante as chuvas! Em tempos mais recentes sobranceiram as pequcnas COlttJres operárias. Por isso a população do bairro
passou-se a um outro modo de construção, que agora se tornou geral. é principalmente constitufda por operários fabris e, nas ruas piores, por te­
As cottagf!s oper4.rias já não são construídas isoladamente, mas quase sempre celões manuais. As ruas mais pr6ximas do centro da cidade sio as mais
às dúzias, ou verdadeiramente aos montões, construindo um s6 empreiteiro antigas, e portanto as piores, mas mesmo assim lageadas e providas de valetas
uma ou mais ruas à volta. A disposiçio  então a seguinte: um lado é cons­ de escoamento: entre estas contam-se as paralelas mais próximas de Oldham
tituído por cottares de primeira fila, muito afortunadas por possuirem uma Road e de Great Ancoats Street. Mais para 14., na direcção Nordeste. existem
porta traseira e um pequeno pátio. e pelas quais  pedido o aluguer mais algumas ruas de constNção nova; aqui as cottags enfileiram-se limpas e
elevado. Por trás do muro dos pátios destas colllJtf!S fica uma estreita ruela, polidas, com portas e janelas novas e envernizadas de fresco. e as divisões
a via secundária (back slruI), que é obstrurda por c'onstruç6es nas duas extre­ interiores bem caiadas; as próprias Nas sio mais arejadas. com espaços livres
midades e na qual desemboca uma estreita viela ou uma passagem coberta. maiores e mais frequentes. Mas isto reporta.se apenas a uma parte e não à
As COt/IJIf!! que dão para esta ruela secundária pagam um aluguer menor maioria das habitaçõcs; ao que vem ainda somar.se o facto de em quase
do que as restantes, e em geral sio as mais descuradas. As suas paredes todas as" cottares nistirem caves habitadas. de muitas ruas não serem pavio
posteriores são comuns com a terceira fila de cotttJrf!S, que por sua vez dão mentadas nem providas de valetas e. obretudo, o facto de este aspecto limpo

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não passar de aparência. Aparência essa que não dura mais de dez anos. suas exalações e escurecida e adensada por uma dúzia de chaminés; uma
De Cacto, a estrutura das próprias coltags não é menos reprovável do que massa de mulheres e de crianças maltrapilhas circulam pelas imediações, sujas
a disposição das ruas. De inicio, todas se apresentam limpas e sólidas, as como oS' porcos que se deleitam nos montões de cinzas e nos lameiros; em
suas paredes maciças de tijolo enchem a vista, e percorrendo uma destas suma, toda a zona apresenta um aspecto talvez mais desagradável e repug­
ruas operárias. de construção recente, sem ter em conta as ruas secundárias nante do que os piores pátios junto ao Irk. A raça humana que vive nestas
ou sem observar melhor a construção das próprias casas, não se pode deixar cottales a cair, por trás de janelas partidas e remendadas com tela, por trás
de partilhar a afirmação dos industriais liberais de que em parte alguma os de portas desconjuntadas e de caixilhos podres, ou nas caves húmidas e
operários se encontram tão bem alojados como em Inglaterra. Mas, olhando eScuras, no meio de toda esta porcaria sem limites e deste mau cheiro, numa
um pouco mais de perto, vê-se que as paredes destas cottags são o mais atmosfera que parece propositadamente Cei:hada, esta raça humana deve per­
Crágil que é possível construir. As paredes exteriores, que sustêm a cave, O tencer realmente ao mais baixo degrau da humanidade; esta é a impressão
andar térreo e o telhado têm. no máximo. a espessura de um tijolo, de tal e a conclusão que somos conctrangidos a tirar t10 s6 pelo aspecto exterior
modo que cm cada estrato horizontal os tijolos se encontram unidos pelo do bairro. Mas que dizer ao tomar conhecimento de que em cada uma destas
lado mais comprido; mas tenho visto muitas coflages da mesma altura - e casitas, que contêm no máximo dois quartos e as águas.Curtadas. e quando
algumas ainda em construção - nas quais as paredes exteriores tinham apenas muito ainda uma cave. habitam em média vinte pessoas, ao saber que em
a espessura de meio tijolo, e em que os tijolos eram ponanto aplicados não ao todo o .bairro existe uma única latrina - naturalmente, na maior parte das
largo mas ao comprido. unindo--se assim uns aos outros pelo lado mais curto. Isto VeZe impraticável- para cada 120 pessoas, apro'l:imadamente. e que não
acontece em pane para poupar material. e em parte também porque O!; em. obstante todas as advertências dos médicos, nlo obstante a agitação provocada
preiteiros não são os proprietários do terreno mas, segundo o costume inglês, na p'>lícia sanitária na época da cólera pelas condições da «Pequena Irlandu,
têm-no alugado por vinte, trinta, Quarenta, cinquenta ou até por noventa anos, ainda hoje, no ano da graça de 1844, as condições se mantêm quase as
decorridos Os quais retorna ao antigo proprietário com tudo o que sobre ele mesmas de 1831? O doutor Kay relata que nl0 somente as caveS' mas também
se encontra. sem que este último tenha de reembolsar seja o que for pela os andares térreos de todas as casas deste bairro são húmidos; que numerosas
construção erguida. Por isso o arrendatário constrói 'os ediricios de tal modo caves. inicialmente aterradas, pouco tempo volvido foram de novo desob!;1:ruídas
que, no fim do prazo conlratual. estejam o mais possível privados de valor; e são agora habitadas por irlandeses; que numa cave cujo pavimento e en­
e na medida em que essas cotlags são frequentemente construídas apenas contrava abaixo do nível do rio, a água brotava continuamente por um buraco
vinte ou trinta anos antes de tal data. é fácil compreender que os emprei­ subterrãneo tapado com argila, pelo que o inquilino. um tecelão manual,
teiros não estejam interessados em Cazer COm elas grandes despesas. A isto era obrigado a esvaziar a sua cave atirando a água para a rua.
vem juntar-se o (acto de estes construtores, na sua maioria pedreiros, car­
pinteiros ou industriais, gastarem pouco ou nada em reparações, em parte Engels descreve os casos piores e não a média. Todavia, a sua
para não diminuírem os rendimentos provenientes dos alugueres. e em parte
também porque se avizinha o momento da restituição do terreno onde se
recolha de situações-limite é justificada na medida em que a opinião
erguem as construções; e a tudo isto vem ainda somar-se o facto de. devido pública já não as considera admissíveis, independentemente da sua
às crises comerciais e à consequente falta de trabalho. ficarem frequente­ difusão estatístíca. Aqui reside o verdadeiro móbil das denúncias
mente ruas inteiras desertas. caindo as coltages rapidamente em ruínas e literãrias contemporâneas e das sucessivas acções reformadoras.
tornaodo--se inabitâveis='.
Os inconvenientes do ambiente préindustrial eram entendidos
como um destino inelutâvel; existiam desde tempos irnemoráveis e
Eis efectivamente a descrição de um bairro de cOI/ages
pareciam - pelo menos no horizonte de cada geração - substancial­
degradado:
mente imutáveis.
Em contrapartida, a cidade industrial é um facto novo, surgido
Numa depressão bastante profunda. rodeada em semicirculo pelo Medlock
num tempo limitado sob os olhos das mesmas pessoas que lhe
e em lodos os quatro lados por altas fábricas e altas margens cobertas de
construções e áreas terraplenadas, estão cerca de 200 cottages reunidas em suportam os incómodos. É um facto singular, perturba os hábitos
dois grupos. na sua maior parte com a parede posterior comum duas a duas. e a capacidade de compreensão dos contemporâneos, mas parece
e nas quais habita um total de cerca de 4 000 pessoas, quase todas irlandesas. tudo menos fixo e inevitável. Ainda não se encontrou um sistema
As collags são velhas. sujas e do tipo mais pequeno. as ruas são desiguais. razoável para controlar os seus processos, mas parece natural que
cheias de buracos e em parte não pavimentadas e sem valetas. Imundicies.
detritos e lama nauseabunda estão dispersos por todo o lado em enormes a inventiva do homem e a força das máquinas, tal como originaram
Quanlidades, no meio de lameiros permanentes; a atmosCera é empestada pelas esta realidade, possam também mudar-lhe o curso.
Em todas as épocas existiram misérias equiparáveis e talvez
mesmo mais graves do que as de,critas por Engels e pelos outros

Op. cit. Op. cito

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------:1-  i--
1! .l3'5
£ I'  l( escritores. dos primórdios do século XIX, e é passiveI contrapor às o "Policial Registem de Cobbett, que desde 1816 era vendido a
I'.. I'! Q.. suas descrições outros escritos mais antigos que repetem quase lite­ dois pence, e o governo respondia mobilizando polícia e exército,
:= ralmente a mesma coisa; foi o que fez Barbagallo, citando textos ordenando prisões preventivas, fazendo suspender as seculares garan­
. Ir   de Vauban (1698), de Boisguillebert (1697) e de Mercier (1783)'. tias do habeas corpus.
<t' u. De facto, a diferença não reside nas coisas descritas, lJ!.no tom
  iras descnçoes: tnste e reslgnaao º.ª---'RQÇlLR.:.!!)Çhl.s!J.iaJ,3_agora A 16 de Agosto de 1819 - conta Trevelyan - foi autorizada para o
  . -carregado de revolta e duminad - O-JlbstanlLa...grandJ:_mis.érLa campo de S. Pedro. cm Manchester. a reunião de uma multidão ordenada
 .;a,;. . o presente, pe a coo lança_mIm fJltllr.o.-melhor. e desarmada de 60 000 homens, mulheres e crianças; mas depois, as autoridades
15 - A pobreza - condicão suportada bá-séculos-1.ellL..c.Sl1er:m..a encarregadas da vigilância, alarmadas à vista de uma tal multidão, mandaram

rc\< 1 .de alternativas razoãveis - é agQta.reco_coI])9..J!.miséria», q,!! a milfcia a cavalo prender o orador, o conhecido radical Hunt, na altura em
que a reunião atingia o auge. Quando os militares, embrenhando-sc entre a
li> dizer, é vISta na perspectiva moderna de um mal que pode e deve multidão para cumprirem a missão. (oram vaiados e repelidos. as autoridades
_ ser elimmado com os melaS à disposição. . ordenaram à cavalaria de reserva que carregasse. O embate empurrou a densa
 .evan escreve: "Por mISéria entendo uma consciência geral massa de seres humanos praguejando e gritando para fora do campo. enquanto
.Q i de privações não necessãrias - e esta é a condição normal de a milícia, formada por partidários lories, brandia os sabres com gosto. Nos
recontros desse dia, pelo menos onze pessoas foram mortas ou morreram
milhões de pessoas na moderna cidade industrial - unida a um na sequência de ferimentos; mais de uma centena ficou ferida pelos sabres
profundo sentimento de desilusão e de insatisfação pela situação e várias outras centenRS foram colhidas pelos cascos dos cavalos ou saíram
local actual. De nada serve replicar que as coisas sempre estão maltratadas da rixa. O número de mulheres feridas elevou.se a mais de uma
melhor que outrora_. As pessoas vivem no presente, não no passado. centena' .

.o descontentamento nasce do contraste entre a . QJle se sabe


..l.cr passIve e o que e ec Ivamente e1tlSte...Hã-a.uniY.ersaLejuslifica.da. Este episódio rapidamente sensibilizou a imaginação dos con'
. convicção de Que a grande massa de homens e mulheres se encontra temporâneos, que o baptizaram com o nome de "batalha de Peterloo» .
ior do que poderia estar»'. A história corroborou esta apreciação, e em todos os manuais o
Convém portanto buscar as origens do urbanismo moderno nome de Peterloo vem lado a lado, com significativa simetria, com o
de Waterloo, realçando o contraste entre o esplendor da politica
!. na época em que as situações de facto se concretizaram em medida
suficiente para provocar não somente o mal-estar, mas também o externa e a obscuridade da politica interna.

protesto das pessoas nelas envolvidas; aqui o discurso histórico deve Os contemporâneos foram sensibilizados não pela natureza dos
ser necessariamente alargado das formas de povoamento à proble­ factos nem pela crueldade das autoridades responsáveis, que cederam
mâtica social da época, mostrando o correcto posicionamento da ao pânico e não propriamente a um plano pré-estabelecido, mas pelo
urbanística moderna como parte da tentativa em curso para es. sentimento de inutilidade no comportamento das duas partes, ambas
aparentemente bloqueadas num impasse sem saída.
tender a todas as classes os beneficias potenciais da revolução indus­
triai, e pondo a claro de uma vez por todas a inevitãvel implicação A autoridade, adoptando uma posição de força, não podia
política inerente ao debate técnico. esperar qualquer resultado duradouro razoãve1 (a história inglesa
Não é por acaso que se dã precisamente em Manchester, em tornara desde há tempo impossivel governar com tais meios); e oS
1819, o primeiro incidente importante que inaugura os conflitos so­ manifestantes, por sua vez - os moradores das vielas e dos pãtios
ciais do século XIX: o episódio de Peterloo. descritos por Engels - eram movidos por uma revolta elementar.
A política repressiva do governo levara as associações operãrias ainda privada de perspectivas de acção definidas.
e os radicais extremistas a porem-se de acordo. Os operãrios liam Cobbett inventara um termo significativo, a coisa. "para de.
signar o conjunto de ministros, de traficantes eleitorais. de jubilados.
de senhores, de eclesiásticos, de industriais que acorrentavam, tira.
nizavam e sangravam a lnglaterra)M; e contra uma imagem deste

:t C. BARBAGALLO, Le Origin; della Grande Industria Contempo­


ranea, cito cap. XIX. T G. M. TREVELYAN, British Hiuory ;n Ninttttnth Cenlury and
A/ter (1922).
• Cit. in «II Mondo», 20 de Dezembro de 1960.
 Op. cil..

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....-". " '.' •• -'.' ,"-' •• 0._ - •• ------- •••----- r =". - ....... --- .. =---

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tipo é que era dirigido o protesto dos manifestantes de Peterloo, Por isso este período - que quanto aos efeitos das realizações
\ ainda incapaz de apontar para objectivos precisos. concretas pertence antes à pré,história do urbanismo moderno - é
A constata ão dos males da cidade industria o1l:s.ta....da£..í l1>'M.r'i,N 'PI pelo contrário rico de assomos metodológicos tanto mais significativos.
seus a Itantes perfilam-se pois, por agora,.--num vazia ideolÓg i'JQVQ Torna-se finalmente claro O duplo carácter, cientifico e mora­
'que deIxa a . sociedade dos primei[QLdecénios do s.é_o_XlX_m.Q:.   lista, da urbanística moderna; delineia-se a combinação particular de
menfaneamente pnvada de instrumentos ara corri ir esses m_,!les DE:- tJlAlZ (, motivos que distingue tão claramente a acção responsável dos seus
. iia-prãl1ca: inSUfIcIentes e esacre ,tados os antl,g..intrum PI.Mlli: o promotores, da acção subalterna ou literariamente evasiva dos artistas
ainda não caractenzados os novos, VO de uma época, e que pode ser descrita através das palavras de Breche;
I?aravante trata-se de encher este YazUL&.om uma série de
iniciativas indiViduais de propostas,-de-Jeis capazes....df:se desdém e tenacidade, conhecimento e rebelião
compreensão do particular e do geral'.
por uma noya e coerente experjê.n..c.i.a;-de-carae.t.e.rizaL!lma a uma
!'S fe.çoes da «coisa», para &onseguit..mJ!iIª,I,!,. -:-
O urbanismo moderno não é apenas uma tentativa para re­
Neste ámbito existem dus linhas de acção, que por agora
se apresentam claramente divididas: a que aborda os problemas da
presentar visualmente este fenÓmeno, transferindo-o para a organi­
urbanística moderna partindo de um modelo ideológico global, que
zação dos espaços, mas intervém concretamente como um dos facto.
é apresentad0 em alternativa à cidade existente e que se procura
res que cooperam na construção de uma comunidade democrática.
realizar experimentalmente longe desta, ou então a que parte das
A urbanística perde assim a posição de aparente distanciamento c..tJ exigências técnicas individuais, ligadas ao desenvolvimento <ia cidade
dos conflitos sociais, mantida até então à sombra do poder absoluto,
industrial, e procura corrigir os seus defeitos isolados.
e perde inclusive a aparente capacidade para regular com carácter "\:l.,..

derinitivo, do alto, o equilíbrio do povoamento; apresenta-se, mais \lVvõ\)l Ambas tendem a convergir e integrar-se, pois as tentativas
para realizar os modelas teóricos levam a teoria a confrontar-se
modestamente, como uma das técnicas necessárias para definir este rJO.);!<9,JJ(>,
com a realidade, enquanto as providências para resolver os pro­
equilíbrio; não insiste já numa forma perfeita a realizar à partida,
blemas técnicos isolados trazem à luz a interligação entre os di­
mas numa série de modificações parciais, num compromisso razoável
versos problemas, e finalmente o problema unitário da planifi­
entre as forças em jogo, a renovar continuamente de acordo com
cação territorial.
o seu movi'mento recíproco.
Por isso, a nossa exposição será dividida em duas partes:
No periodo entre 1815 e 1848 - de Waterloo à revoluçãõ<le
na primeira fàlar-se-á das utopias do século XIX - as de Owen
Fevereiro - os aspectos técnicos e os aspectos políticos da pesquisa
de Saint-Simon, de Fourier e de Cabet - e das experiências para
urbanística apresentam-se fortemente ligados e quase incorporados
põ-las em prática; na segunda examinar-se-âo as experiências teóricas
entre si.
que alteraram o equilibrio tradicional da utilização do solo, e intro-
Este é um aspecto característico da cultura da época: bastará
recordar o caso de Bentham, o filósofo radical que empenhou os
melhores anos da sua vida e uma boa parte do scu património na
vã tentativa de realizar o seu «pan.óptico), uma prisão modelo cons
truida de tal modo que um só carcereiro pudesse ver todos os pri­
sioneiros através de um sistema de espelhos, Sem ser visto por eles.
A facilidade com que eram asociados argumentos técnicos e
ideológicos em urbanística parece-nos hoje desconcertante e ingénua,
na medida em Que resulta de uma avaliação imperfeita das forças
em jogo e dos obstáculos reais a superar,. e que virão gradualmente
a clarificar-se nos períodos sucessivos. Todavia, esta capacidade de Figuras 19 e 20: O Pan.óptico de Beotham.
associação manlém-se ainda fonemenle sugesti.va, e testemunha a
unidade ideal subjacente às diversas experiéncias urbanísticas do
século XIX, encaminhadas após 1848 num sentido consideravel­ , B. BRECHT, A Linha d Conduta (1932).
mente divergente.

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..

duziram portanto a exigência de um novo equilíbrio calculado. Como


veremos, as principais iniciativas não partem das grandes obras
públícas, mas dos múltiplos inconvenientes de ordem higiénica da
cidade industrial, que dependem de uma combinação de muitos
factores e requerem uma legislação que rapidamente se estende do
campo sanitârio ao campo mais geral da urbanística.

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