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O pronome indefinido certo e seus sentidos pela perspectiva

da TOPE

Emanuelly Nascimento Gomes

1 – INTRODUÇÃO

O presente trabalho apresenta o pronome indefinido certo numa


perspectiva de análise da Teoria das Operações Predicativas e Enunciativas
(TOPE). Para tanto, antes de explicar os fenômenos analisados diante de
situações do pronome em questão, primeiramente, precisou pincelar acerca
dos conceitos que cercam tal teoria.

Esse artigo tem como referencial teórico trabalhos realizados na linha de


investigação desenvolvida pelos seus colaboradores Franckel (2006), Vogüé &
Paillard (1997), que buscam estudar a identidade e variação das unidades
morfolexicais, a partir dos pressupostos trazidos por Benveniste quanto à
função integrativa das unidades lexicais.

Para a TOPE, o sentido das unidades lexicais não é dado, e sim,


construído no momento da enunciação. Essa teoria evidencia que a análise de
fenômenos linguísticos não se reduz diretamente a um raciocínio acerca do
mundo ou dos processos cognitivos; considera o sentido construído por meio
de unidades que integram o todo formando o enunciado. Assim, o sentido de
uma unidade lexical depende da relação entre cotexto (sequência do
enunciado) e do contexto (cenário).

Com o intuito de mostrar que o pronome certo, pautado pela TOPE, a


qual foi fundada pelo linguista francês Antoine Culioli, transpassa por
significados parecidos, mesmo em diferentes contextos, assim, reduzindo-se
aos usos de quantidade, imprecisão ou vagueza. Além disso, trazer a ideida da
quantificação e da qualificação para o pronome em questão, já que, de modo
geral, apresenta apenas traços quantificativos.

2 – Enunciado, Cotexto e Contexto


O processo de enunciação é construído, ou seja, um reagrupamento de
formas em que o resultado desse processo se constitui no enunciado. Dessa
maneira, segundo Culioli (1990), ela não é vinculada ao sujeito que a transmite,
muito menos é um ato em si. Para o autor, o enunciado é como se fosse um
arranjo recheado de mecanismos utilizados no processo enunciativo por meio
de formas específicas, assim, é um determinado encadeamento de operações
em que ele é como se fosse uma pegada. Franckel (2011) expõe que:

A justificativa pelo termo “operação” deve-se justamente à hipótese de


que o valor referencial do enunciado não é um dado, mas algo
construído. Isso significa que o arranjo de formas que o materializa
remete, não a valores, mas às operações de constituição do valor
referencial. Estudar a enunciação é, portanto, estudar as modalidades
de constituição desse valor (FRANCKEL, 2011, p.44).

Nesse sentido, visando por esse viés de que o sentido se origina apenas
na materialização verbal, não buscando sentido no extralinguístico, mostra que
o contexto é gerado pelo próprio enunciado. Dessa maneira, correspondendo à
construção de valores referentes a determinadas situações.
Consoante à Vogüé (2000, p.31), a partir de “ocorrências nocionais” é
que o valor de um enunciado é composto, tais ocorrências referenciam-se às
diferentes noções aos itens lexicais postos nos enunciados. Elas são
constituídas pela relação com as noções em que elas representam, ou seja,
pelas ocorrências e suas formas linguísticas variadas. Dessa forma, há um jogo
de noções, que é o valor referencial, entre a forma linguística e o que compõe o
enunciado no momento da enunciação.
No texto Situations, contexte, valeus référentielle de Franckel (2006),
expõe que o enunciado apenas se torna sólido e passível de interpretação se
houver uma sequência de noções em um dos possíveis contextos desse
enunciado. Ainda partindo do autor francês “[...] do esmo modo que o valor
referencial [...] é indissociável [..] do referente efetivo, do mesmo modo a
situação, o contexto e mais geralmente o que nós chamamos cenário são
sempre ao mesmo tempo da ordem do dado e da ordem do construído.”
(FRANCKEL, 2006, p.62)
Para tanto, esse tal cenário, apresentado por Franckel (2006) e
mencionado por Vogüé (2011), se diferencia completamente de um sistema de
organização simplista por conta do seu caráter dinamicista, trabalhando a
integração entre as formas linguísticas e as operações necessárias a elas.
Logo, esse cenário ou propriamente contexto, não é selecionado, muito menos
aparece de maneira aleatória, uma vez que toda e qualquer unidade linguística
nos permite inúmeras construções possíveis.
Grosso modo, uma mesma noção, ou uma mesma sequência que
comporta formas linguísticas podem se encaminhar por enunciados distintos.
Como por exemplo, na sentença “Ouvi certo barulho”, manipulada por nós,
fazendo com que o termo possa admitir pelos menos 02 caminhos diferentes:
a) Pode-se pensar na situação de que A estava sozinha em casa e
então ouviu um barulho estranho.
b) Outra situação seria que A já tem conhecimento sobre que tipo de
barulho ouviu, então fala para B com uma entonação diferente
que ouviu “certo” barulho, ou seja, aquele barulho que B também
já conhece.

Tais exemplos evidenciam que uma mesma estrutura linguística pode


significar vários tipos de enunciados, assim os sentidos nunca são os mesmos.
Conforme dito por Lima (2013, p.47), “o enunciado é uma sequência que se
torna interpretável pela estabilização de um de seus contextos possíveis, sendo
estes desencadeados a partir da sequência”. Logo, o interessante se torna em
apreciar que tipos de usos, que tipos e marcas o linguista consegue detectar.
Segundo Franckel (2006, p.65) “[...] este contexto é ele mesmo variável,
mas de forma não aleatória: ele é restrito pela unidade que faz parte do
contexto, absolutamente como o cenário é restrito pela forma do enunciado na
qual ele se inscreve”. Em suma, o Cotexto é uma estrutura linguística que pode
vir a configurar-se enunciado e o Contexto são os diferentes cenários,
situações que serão construídos com base na sequência linguística
estabelecida no momento da enunciação.
Por conseguinte, os diferentes caminhos que um enunciado por seguir
somente são possíveis através do cotexto, logo, as interpretações são
puramente construídas por meio da interação da sequência linguística no
cotexto. Assim, a TOPE, por intermédio do estudo das unidades lexicais,
considera que o sentido da palavra não é dado, mas sim construído. Como
afirma Franckel (2011):
Passamos de um sentido ancorado em um referente para um
sentido que decorre de valores referenciais construídos,
observáveis em meios textuais definidos. [...] A linguagem [...]
consiste[...] em realizar ‘operações de orientação’que
determinam os valores referenciais e que são [...] constitutivas
do sentido dessas unidades (FRANCKEL, 2011, p.54).

À vista disso, fica claro que a TOPE propõe que as unidades linguísticas
possuem um sentido construído, pois fundamenta-se na interação e
envolvimento das unidades com o Cotexto e o Contexto. Dito isso, não é um,
nem o outro que estabelece os sentidos, e sim, que o primeiro, por meio da
indução, leva os sentidos das unidades aos enunciados.
A seguir, trataremos de outros conceitos essenciais para a compreensão
das nossas análises, tais como: Noção, Domínio, Tipo e Atrator.

3 – Domínio Nocional, Noção e Tipo e Atrator

A base da TOPE, cuida do objeto principal, o estudo da linguagem.


Assim como diz Culioli (1990):
[...] de um lado, estou dizendo que o objeto da linguística é a atividade
da linguagem [...]; de outro, que só temos como apreender essa
atividade, a fim de estudar seu funcionamento, por meio de
configurações específicas, agenciamentos em uma dada língua. A
atividade de linguagem remete a uma atividade de produção e
reconhecimento de formas; ora, essas formas não podem ser
estudadas independentemente dos textos, e os textos não podem ser
independentes das línguas. (CULIOLI, 1990, p.14).

Assim, pode-se desmembrar duas questões,1- como articular linguagem


e línguas; 2- como tratar da relação entre a materialidade do texto e a
imaterialidade da atividade significante dos sujeitos” (CULIOLI, 1999, p.7). A
partir dessas questões, algumas noções teóricas culiolianas surgem, a primeira
delas remete ao que chamamos de domínio nocional, que está vinculado a um
dos níveis de representação expostos pelo linguista francês.
Dessa maneira, postula-se que para entender a existência desses níveis
é necessário apreender como as representações mentais são desencadeadas
e absorvidas pelas línguas. Como mencionado anteriormente, o primeiro nível
de representação, nível I, está relacionado com o cognitivo, ou seja, o ideal de
cognição, referente ao mental, mas num sentido mais amplo.
Tal nível, comumente conhecido como nocional, referente a um outro
princípio culioliano, a noção, “representações que organizam experiências
elaboradas desde nossa primeira infância, que construímos a partir de nossas
relações com o mundo, com os objetos, com os outros, de nosso
pertencimento a uma cultura, do interdiscurso no qual estamos imersos. [...]”
(CULIOLI, 1990, p.21). Para melhor entender esse nível e sua importância,
outra explicação de Culioli (1999):
Esse nível é o de nossas representações mentais, relacionadas à
nossa atividade cognitiva e afetiva, quer se trate de nossa atividade
sensório-motora no mundo físico ou de nossas elaborações culturais.
Na verdade, não existem noções enquanto feixes de propriedades
oriundas de uma cultura. Esta última se encontra, ela mesma,
frequentemente imbricada com práticas técnicas, nas quais o gesto e a
ferramenta se combinam nas condutas significantes, ritualizadas ou
não [...] (CULIOLI, 1999, p.161-162).

Dito isso, o nível I compreende o acesso mental às representações de


conhecimentos que adquirimos ao longo de nossa vida, principalmente em
nossa infância. Porém, não há como ter acesso a esse “conteúdo” a não ser
por intermédio do segundo nível de representação, nível II, que tem a ver com
a ordem linguística.
Importante ressaltar que nesse nível não existem representações do
nível I, nada de textos, ou imagens, ou texto oral que nos façam entender algo,
pois são apenas traços da atividade cognitiva. Além disso, vale relembrar que
texto para Culioli, é enunciado, uma sequência de formas, com mascas,
através de agenciamentos, mudanças na entonação, de contexto e tudo mais.
Segundo Márcia Romero (2019, p.178), “representantes do nível II não
apresentam vínculo direto com as representações do nível I: as formas
empíricas não são etiquetas, não estabelecem uma relação na qual haveria um
marcador – um valor”. Grosso modo, os agenciamentos do nível II não são
traduções do nível I, ou delas seriam independentes ou viriam a partir delas.
Assim:
[...] os textos e os arranjos de unidades morfolexicais que os
constituem não são considerados como a tradução de um sentido que
lhes preexistiria ou que existiria independentemente desse material. A
linguagem é constitutiva de uma forma de pensamento específica que
não tem as mesmas propriedades que as que correspondem a outros
sistemas de representações comunicáveis (desenho, imagem) ou não
[...] (FRANCKEL & PAILLARD, 2011, p.16).

Com isso, por conta da não abrangência de todas as formas linguísticas,


percebeu-se que em virtude das construções ambíguas ou específicas de cada
situação, os níveis I e II não seriam suficientes para dar conta de tais mal-
entendidos, assim, o terceiro nível entra em cena.
O nível III é aquele em que todo linguista se encontra, de analisar as
formas representadas para que se possam simular a integração entre os dois
primeiros níveis. É nesse nível que se propõe “um sistema de representação
metalinguístico enquanto tal, i.e. construído, a partir de descrições teóricas de
fenômenos linguísticos, pelos procedimentos canônicos de abstração e de
formalização” (CULIOLI, 1990, p.22).
Diante disso, por intermédio de uma gama de conhecimento empírico,
esses procedimentos, pautados no nível III e no aporte teórico do linguista,
pelejam na busca de uma melhor construção teórica e constantemente bate de
frente com novos dados analisados por meio do empirismo e estudos
linguísticos. Assim, os fenômenos da representação de níveis são intrínsecos à
linguagem, visto que as formas traçam a atividade dos sujeitos, confirmando
que a linguagem é inata.
Passado a primeira parte, sobre os níveis de representação, sobre
domínio nocional e mesmo sobre noção, encaminhamo-nos para outros
pressupostos necessários para o entendimento das análises na linha da TOPE.
Conforme dito por Franckel e Paillard (2011), a noção não possui uma relação
estática com determinada ocorrência, uma vez que esse processo de
ocorrência perpassa por dois polos organizadores: Tipo e Atrator.
Consoante a Culioli (1999, p.12) O Tipo é uma “[...] ocorrência
representativa que pode definir uma enumeração de propriedade, mas não
necessariamente. Ela pode se exprimir sob as formas a que eu chamo X, a
ideia que faço de X um verdadeiro X para mim, etc.” Dessa forma, é por meio
do Tipo que identificamos o que é um carro, por exemplo. Além disso, o Tipo
nos permite dizer que o carro é pertencente à classe dos carros, ou seja, “um
exemplar está conforme a propriedade que ele identifica e da qual constitui
uma amostra.” (FRANCKEL & PAILLARD, 2011, p.93)
Já o Atrator é o outro organizador que “permite determinar em que e em
qual parâmetro uma ocorrência tem a ver com a noção” (LIMA, 2014, p. 351).
Em virtude disso, ele apresenta duas singularidades, da noção e dos
indivíduos, assim, o Atrator é sua própria referência, pois sua marca acontece
em relação a si mesmo. Sinteticamente, o Tipo remete a uma ocorrência
representativa e o Atrator remete a uma representação única, absoluta.
Em síntese, a noção perpassa de maneira abstrata pelo processo de
construção das ocorrências, o domínio nocional é a variedade dessas
ocorrências. A seguir, serão abordadas as Operações de Qualificação e
Quantificação, que resumidamente chamamos Qlt e Qnt, respectivamente.

4 – QLT E QNT

Com o intuito de melhor entendermos sobre a área da TOPE, as noções


desse tópico (Qlt e Qnt), são de extrema importância, pois elas “fundamentam
a metodologia de análise da atividade da linguagem por meio da diversidade
das línguas para a Teoria das Operações Enunciativas.” (ROMERO, 2019,
p.195)
Para tanto, essas noções juntamente com os procedimentos puramente
analíticos da linguagem baseiam esse modo específico de reformulação, que
busca, primariamente, desvencilhar os procedimentos de construção da
significação. Logo, visando o estudo lexical, tal análise se dá por meio da
identificação e estudo afinco de diferentes contextos linguísticos.
De acordo com LIMA (2014), a operação de Qualificação (Qlt) remete
aos processos de identificação/diferenciação, assim, dando abertura para
expor se as ocorrências são ou não da mesma linha. A importância dessas
operações vão além de simplesmente localizar as ocorrências, mas
possibilitam a construção de uma ocorrência que se torna representativa por
algum motivo, logo, quando tiverem outras ocorrências da mesma propriedade
fica mais fácil de realoca-la junto com outras ocorrências da mesma natureza,
ou seja, que possuem as mesmas características.
Em paralelo, a operação de Quantificação (Qnt), conforme dito por
Culioli (1999, p.4), “[...] remete não à quantificação lógica, mas à operação pela
qual se constrói a representação de alguma coisa que se pode distinguir e
situar em um espaço de referência.” Dessa forma, Culioli (1999) afirma que
uma noção qualitativa gera uma noção quantitativa, assim um fragmento de
qualitativo perpassa por outro.
Afim de exemplificar essa operação, passemos para um exemplo de
Neves (2000, p.209): “Depois de um grupo GRANDE, forte se organizará à
esquerda da praça”. Assim, mostra-se que o adjetivo destacado exerce um
papel fundamental de quantificador dos indivíduos componentes desse grupo,
logo, torna-se um grupo forte, passa-se da noção qualitativa para a noção
quantitativa.
Em seguida, apresentaremos outros conceitos que serão de grande valia
para entender as análises, tais como: extração e flexagem.

5 – EXTRAÇÃO E FLEXAGEM

Segundo Culioli (1999), a quantificação e qualificação somente ocorrem


por meio de operações que desencadeiam as ocorrências. A primeira delas é a
operação de extração, que consiste na efetuação de uma lista de ocorrências
que são individualizadas de uma determinada noção que se encontra
privilegiada em determinado contexto.
Para que haja uma extração é necessário um caminho que parte do
momento de individualização de uma ocorrência em relação à sua localização
em determinada situação. Segundo Pria (2009, p.66) “Uma ocorrência
pertencente a uma classe abstrata passa a ser uma ocorrência com a
propriedade de ter sido situada no tempo e no espaço”.
Os artigos indefinidos, os determinantes zero e os numerais costumam
ser marcas de extração dentro das línguas de modo geral. Como por exemplo:
“um livro caiu da mesa”, o artigo indefinido um expõe uma ocorrência de livro
singular, única, posto que pode ser quaisquer tipos de livro, sem nenhum traço
distintivo.
Juntamente com a operação de extração, segue-se a operação de
flexagem, que somente ocorre após a primeira, remetendo a identificação de
uma ocorrência antecessora de uma noção à uma ocorrência posterior. Como
por exemplo: “O menino entrou na sala”, o artigo definido o remete a noção em
P. noção de ser menino/domínio nocional, identificando a ocorrência extraída
anteriormente. Dessa forma, entende-se que não é qualquer menino, é um
menino já conhecido, uma ocorrência específica.
A seguir, será exposto o pronome indefinido analisado com base nas
operações e fenômenos da TOPE, o pronome certo.

6 – PRONOME INDEFINIDO “CERTO”

Segundo Câmara Jr. (1985), os pronomes indefinidos são provenientes


do latim e passaram por uma peneira até chegar aos que ainda existem e são
utilizados hoje em dia, tanto no português quanto nas outras línguas
românicas. Os pronomes que são usados no português são oriundos do latim
vulgar, uma vez que são mais pobres que os do latim clássico, porém essa
“pobreza” acabou resultando na mesclagem de pronomes do latim vulgar com
os pronomes clássicos.
Bueno (1963) divide os pronomes indefinidos em dois grupos de acordo
com sua função morfológica, dentro de determinado enunciado, o grupo dos
adjetivos indefinidos acompanhando um substantivo e pronomes indefinidos
com função de substantivo propriamente:
Os adjetivos indefinidos modificam os substantivos, acrescentando-lhes
certa ideia vaga, imprecisa, de quantidade, de totalidade, ou parte do
todo, tais como: algum, nenhum, certo, outro, todo, muito, pouco, um,
qualquer, nada. Em geral todos estes e seus respectivos femininos
funcionam como adjetivos, aparecendo na frase ao lado de
substantivos. Há ainda: alguém, ninguém, tudo, algo, nada, outrem etc.,
que funcionam como pronomes indefinidos. (BUENO, 1963, p.114, grifo
nosso)

De acordo com Rocha Lima (1991) em sua obra Gramática normativa


da Língua portuguesa, os pronomes indefinidos são termos que se aplicam à
terceira pessoa do discurso, somente quando não tem sentido completo, ou
quando exprimem uma indeterminação da quantidade de pessoas do discurso.
Lima (1991) divide os pronomes em dois grupos, o pronome em questão “certo”
encontra-se no segundo grupo. Pronome esse que é variável em gênero e em
número.
Neves (2018) diz que o pronome indefinido certo se encaixa nos
pronomes adjetivos, uma vez que buscam qualificar um ser expresso na frase,
dando noção de quantidade e intensidade. Em síntese, os pronomes
indefinidos servem de base para acrescentar informações para os substantivos,
seja de quantidade, seja de vagueza, imprecisão ou de um todo.
7 – ANÁLISES

Após análises minuciosas, se percebeu que o pronome indefinido certo


possui dois tipos de comportamentos, de imprecisão, quando remete à
quantidade ou de inexistência e de precisão, quando dá ideia de que tudo está
nos conformes ou quando remete à uma indagação.
1- Primeiro grupo de exemplos: precisão.
a- “Saímos de o Rio de Janeiro em busca de a liderança e deu tudo certo.”
b- “A estratégia de a arquiteta parece ter dado certo.”
c- “A mulher do eu tio pediu um pouco de sopa, fiz certo em dar um pouco
a ela?”

Nos enunciados a, b e c, as ocorrências do pronome indefinido certo


trazem noções parecidas, pois enquanto qualificador, dá a ideia de precisão, de
algo correto, mesmo não possuindo a mesma posição nos três enunciados.
Não possui nem operação de extração e nem de flexagem nesses três
primeiros enunciados, mas diferente do nome, o pronome certo não apresenta
nenhuma indefinição em nenhuma dessas situações.

2- Segundo grupo: imprecisões


d- “Porque se um clube divulga que um certo jogador está à venda, ele tem
que arcar com as consequências”.
e- “Já faz um certo tempo que me correspondo com esse pessoal da
Suíça”.
f- “O que acontece é que existe um certo anseio e receio de o Congresso
em pautar questões mais inclusivas”.

Nos enunciados d, e e f, o pronome certo possui extração em todas as


situações, isso se dá por conta do determinante, o artigo indefinido. Além disso,
também se tem uma operação de quantificação, trazendo o ideal de quantidade
imprecisa ou de sujeito inexistente. No exemplo da letra d, o trecho “um certo
jogador” revela o sentido de que ainda não há um jogador que deverá ser
vendido, seria apenas uma suposição, uma hipótese. Assim como nos
exemplos seguintes, em que “um certo tempo” e “um certo anseio”, remetem às
ideias de quantidade imprecisa e de um sentimento impreciso (não
mensurável), respectivamente.

8 – CONSIDERAÇÕES FINAIS

Diante do exposto, identificamos que o pronome indefinido certo admitiu


sentidos diferentes perante as situações, pospostos ou não de artigo indefinido.
Logo, pôde-se agrupar em dois pequenos grupos conforme os enunciados
coletados, grupo de precisão e imprecisão.
Assim, fica evidente que a TOPE comporta as variâncias dependendo
dos cenários que se são construídos ao longo da enunciação. Por isso,
conforme diz Lima (2014, p.363) o enunciado é um produto do relacionamento
entre noções e operações, pois as ocorrências linguísticas constituem os
termos de um enunciado. Tais termos ganham forma e proporcionam
interações entre os sentidos e os usos.

REFERÊNCIAS

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Volume dirigé par A. Deschamps et J. Guillemin-Flescher. Paris: Ophrys, 1999.
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