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UMA ABORDAGEM PRAGMÁTICA DO CLÍTICO “SE”

NO GÊNERO TEXTUAL – ANÚNCIO

HYLÉA VALE RAMALHO (UERJ)

RESUMO:

Os princípios básicos do funcionalismo têm por objetivo


revelar a instrumentalidade da linguagem em situações de uso
social. Isso evidencia o compromisso principal do enfoque fun-
cionalista: descrever a linguagem não em si mesma, mas como
requisito pragmático da interação verbal. Assim, analisar-se-á o
emprego do clítico “se” em construções com verbos transitivos
diretos inseridos em anúncios/tabuletas no intuito de provar que é
o gênero o responsável pela “indeterminação” do sujeito nesses
casos. Essa ocorrência é direcionada por aspectos pragmáticos,
pois recuperam a existência do sujeito, ainda que de forma con-
textual.

Palavras-chave: Clítico “se”; Pragmática; gênero textual.

Introdução

As funções exercidas pelos pronomes clíticos de forma re-


flexiva, principalmente o “se” de 3.ª pessoa, têm apresentado, na
história da língua portuguesa, inúmeras polêmicas sintático-
semânticas, que este trabalho pretende elucidá-las, recorrendo à
teoria pragmática:

A questão do significado lingüístico é considerada como


função da intenção do enunciador e do reconhecimento dessa
intenção pelo ouvinte. A questão do significado é, portanto,
fundamentalmente, pragmática. O usuário na sua relação com
a linguagem é visto, desta forma, como interlocutor. (SIL-
VA, 2005)

Os fatores cognitivos e comunicativos responsáveis pelas


transformações lingüísticas são mais explicitamente revelados em
situações de dinamismo da língua, mais especificamente na fre-
qüência de uso, que comprova o grau de gramaticalização de uma
estrutura na língua.
Meillet (1948) destaca a sintaxe como primeiro nível de
gramaticalização, como conseqüência natural e previsível da con-
sagração e da convencionalização pela interação social lingüísti-
ca. Isso vem corroborar com a hipótese apresentada neste artigo:
o registro freqüente do clítico “se” como indeterminador no gêne-
ro tabuletas vem proporcionando uma falsa concepção de que em
toda e qualquer estrutura cliticizada tem-se um índice de indeter-
minação do sujeito; na verdade, isso não deve ser estendido indis-
criminadamente a todos os textos, uma vez que o gênero no qual a
frase está inscrita é responsável pela seleção de um indetermina-
dor ou de um apassivador.

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Uma grande polêmica ronda a classificação do clítico “se”
como indeterminador ou apassivador em estruturas com verbos
transitivos diretos:
(1) Vendem-se casas.
(2) (?) Vende-se casas.

Há um grande número de gramáticos que considera (2) co-


mo a ocorrência adequada para ratificar a hipótese da indetermi-
nação do sujeito. Neste artigo, objetiva-se comprovar que essa
hipótese restringe-se ao gênero tabuleta, que, de fato, indica um
indeterminador, mas que essa interpretação indeterminadora só é
considerada a partir de análise pragmática do contexto discursivo,
isto é, é preciso atentar para tudo que envolve essas tabuletas: o
locutor, o interlocutor, o ambiente social, entre outras coisas debi-
tadas na conta da investigação pragmática.
Fundamentada nos princípios funcionalistas, recortada pela
pragmática, esta pesquisa objetiva a investigação do clítico “se”
como indeterminador, presente em construções como aluga-se
casa, sob uma interpretação contextual das sentenças registradas
em tabuletas espalhadas pelo Estado do Rio de Janeiro. Acredita-
se na relevância dessa análise não como mais uma discussão em
torno da indeterminação do sujeito, mas sim, à luz da pragmática,
encontrar suporte para consolidar a tese do clítico se como inde-
terminador apenas nas construções cliticizadas com verbos transi-
tivos diretos registradas em tabuletas, reconhecendo na partícula

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“se” um autêntico dêitico, cuja função é referenciar um sujeito
exterior ao enunciado, isto é, inserido na enunciação.
Há um consenso entre os gramáticos de que as estruturas
verbo transitivo direto na 3.ª pessoa do singular + pronome se +
nome plural estão invadindo a norma culta da língua. As constru-
ções impessoais com VTD (aluga-se casas) estão cada dia mais
correntes, não só no uso oral e coloquial, mas também no escrito
e formal, uma vez que nos melhores jornais e revistas já se encon-
tram registros de não-concordância, caracterizando o sentido da
impessoalidade.
Resta saber se essa aplicação impessoal é abrangente ou es-
tá restrita à especificidade do gênero textual e, também, aos com-
ponentes pragmáticos: quem disponibiliza o objeto, o local em
que está inserido, o público-alvo, e a intenção comunicativa. Não
parece ser diferente a expressão discutiram-se os acordos de a-
cordos foram discutidos, em ambos a impessoalidade é clara e,
semanticamente, são iguais. Se acordos pode ser o sujeito pacien-
te desta oração, o que o impede de ser sujeito paciente daquela? E
se, como sujeito, o verbo puder concordar com o mesmo? Ao que
parece, a dissonância está em orações específicas do gênero anún-
cio/classificados: aluga-se casa / casa é alugada. Nesses casos, a
transposição da passiva sintética para a passiva analítica interfere
na semântica do enunciado.
Na análise do corpus desta pesquisa, tentar-se-á consolidar
a tese de que a partícula “se”, acoplada a verbo transitivo direto,

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apresenta alteração semântica na transmutação da passiva sintéti-
ca para a analítica, quando inserida em um gênero textual especí-
fico: anúncios/tabuletas.
Além disso, muitos estudiosos associam o emprego do “se”
em português como correspondente ao pronome indefinido “on”,
francês. Os falantes do francês, além de eu-tu e das formas de
não-pessoa, possuem um morfema com a seguinte estrutura: inva-
riável em gênero e número, sempre sujeito da frase e associado a
um verbo em terceira pessoa do singular. Devido à suscetibilidade
do “on” receber uma interpretação genérica ou de remeter à sub-
jetividade enunciativa, a passagem do eu ao “on” permite que se
transporte, sem a mínima ruptura narrativa, do particular ao geral
(MAINGUENEAU, 1996). Por esse motivo, estabelece-se a rela-
ção com o “se” indeterminador, que, nos casos levantados neste
artigo, também sugere uma espécie de generalização, uma vez
que remete a um sujeito não explicitado na frase.
Esta pesquisa será desenvolvida consoante os itens enume-
rados a seguir: em 2, apresenta a fundamentação teórica, as bases
funcionalista e pragmática que nortearão a discussão; em 3, relata
a metodologia utilizada para a coleta e para análise dos dados
pesquisados; em 4, procede a análise e discussão a respeito das
frases encontradas nas tabuletas (corpus); e, finalmente em 5,
apresenta as considerações finais e confirmação da hipótese de o
clítico “se” ser um índice de indeterminação do sujeito, mesmo

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com verbos transitivos diretos, ao estar inserido em um gênero
textual específico: anúncio/tabuleta.

1 – Fundamentação teórica

A teoria funcionalista concebe a língua como instrumento


de comunicação e considera que esta não pode ser considerada
como objeto autônomo, mas sim estrutura submetida a fatores
comunicativos, que exercem grande influência sobre a estrutura-
ção lingüística.
O funcionalismo analisa as construções gramaticais com
base em um todo comunicativo: atos de fala, participantes e con-
texto discursivo. Não se pode compreender um fato lingüístico
sem se considerar o sistema ao qual pertence, conforme enuncia
Maria Helena de Moura Neves:

A língua (e a gramática) não pode ser descrita como um sis-


tema autônomo, já que a gramática não pode ser entendida
sem parâmetros como cognição e comunicação, processamen-
to mental, interação social e cultura, mudança e variação, a-
quisição e evolução. (NEVES, 2002)

Esta pesquisa segue a teoria funcionalista que seleciona os


fenômenos a serem descritos, interessa-se pelo uso da língua e
tem, por princípios básicos, a concepção de linguagem como ins-
trumento de comunicação e de interação social. O funcionalismo
estabelece como objeto de estudos o uso real da língua, que mol-

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da a gramática, associado à repetição ou à freqüência de fatos
lingüísticos, considerando o contexto no qual se inserem:

Em torno da última década, tornou-se óbvio para um crescen-


te número de lingüistas que o estudo da sintaxe de sentenças
isoladas, sem o seu contexto natural é uma metodologia que
já ultrapassou sua utilidade. (...) O estudo da sintaxe quando
limitado ao nível sentencial e privado de seu contexto comu-
nicativo funcional tende a ignorar ou até mesmo a obscurecer
o papel que considerações comunicativas desempenham na
determinação das chamadas regras sintáticas. (GIVÓN,
1995)

A língua, na visão funcionalista, pode ser tomada como


modelo abstrato do mecanismo interno da mente responsável pela
produção e percepção da língua (DIK, 1989). Esses princípios
básicos do funcionalismo têm por objetivo revelar a instrumenta-
lidade da linguagem em situações de uso social. Isso evidencia o
compromisso principal do enfoque funcionalista: descrever a
linguagem não em si mesma, mas como requisito pragmático da
interação verbal.
A pragmática vem do grego pragma – ação, que se interes-
sa pelo que os usuários fazem com os enunciados:

A pragmática seria assim apresentada como o estudo não das


frases fora de contexto, mas das ocorrências das frases, desse
acontecimento singular que cada ato de enunciação é. (MA-
INGUENEAU, 1996)

É a discursividade que está em questão, o fazer discursivo


que resulta de uma intrincada trama entre sujeito, língua e histó-
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ria. Para Charaudeau (1983), o discurso diz respeito ao conjunto
da encenação da significação do qual um dos componentes é o
discurso e o outro a história.
Dessa forma, toda atividade lingüística seria composta por:
um enunciado, produzido com dada intenção (propósito), sob
certas condições necessárias para se alcançar o objetivo pretendi-
do e as conseqüências decorrentes do alcance desses objetivos.
Trata-se da focalização do emprego da língua em uso corrente,
que visa a enfatizar a heterogeneidade lingüística, tomando a va-
riação e a mudança como objeto de estudo.

2 – Metodologia

Interessa, neste trabalho, identificar a variação no uso da


linguagem em ação, usando para tal a teoria funcionalista sob um
recorte pragmático, como anteriormente mencionado. O registro
sociolingüístico é um ambiente empírico para a análise semânti-
co-sintático-pragmática das estruturas cliticizadas presentes nas
tabuletas distribuídas pelas ruas.

2.1 – Seleção dos anúncios

Procedeu-se a uma verificação nos anúncios/tabuletas no


Estado do Rio de Janeiro, mais precisamente na Região dos La-
gos, com o intuito de observar a incidência de construções com o

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pronome “se” em sentenças com verbo transitivo direto, ou seja,
as emblemáticas estruturas aluga-se casa/vende-se casa.
A seleção não se ateve apenas às frases com desvio da
norma culta, isto é, que não realizavam a concordância verbal
entre verbo com “se” acoplado e substantivo, mas a todas as cons-
truções cliticizadas. O objetivo era fazer um levantamento das
ocorrências de forma ampla, entre desvios e não-desvios e suas
incidências nas diversas camadas sociais, a fim de verificar, tam-
bém, a influência do fator escolaridade na escolha de cada cons-
trução sintática.
A catalogação dos anúncios foi realizada, agrupando-os de
acordo com: a estrutura da oração: verbo no singular + se + subs-
tantivo singular; verbo no plural + se + substantivo no plural;
verbo no singular + se + substantivo no plural.
Após essa seleção, verificou-se se havia possibilidade de
uma interpretação passiva, sem acarretar modificação semântica,
para as estruturas encontradas nos anúncios, revertendo-as para a
passiva analítica. O objetivo dessa transposição era verificar o
desempenho do clítico “se”: indeterminador ou apassivador? A
análise dessa conversão não se restringiu a aspectos semântico-
sintáticos; a interpretação pragmática do contexto sociolingüístico
no qual a tabuleta estava inserida foi aspecto relevante na investi-
gação, isto é, o local, a escolaridade, o produto a ser comerciali-
zado e o público-alvo a ser conquistado.

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Além disso, muitos gramáticos atribuem o uso do “se” in-
determinador a uma associação ao “on” francês (cuja função é
indeterminadora), por esse idioma já ter exercido grande influên-
cia na língua portuguesa, principalmente na época do Brasil Im-
pério (século XIX), em que o povo brasileiro copiava o modelo
francês em todos os campos: na arte, na cultura e nos costumes.
Para refutar essa analogia, utilizou-se o livro Rio antigo nos a-
núncios de jornais do historiador Delso Renault (1984). A ocor-
rência do clítico “se” como indeterminador em construções transi-
tivas diretas foi muito pouca nos anúncios daquele período, e isso
ratifica a não-relação entre o “on” do francês e o “se” indetermi-
nador.

3 – Análise do corpus

Este trabalho, com bases funcionalistas, apresenta uma in-


vestigação recortada pelos gêneros textuais:

O gênero não deve centrar-se na substância nem na forma do


discurso, mas na ação em que ele aparece para realizar-se, em
outras palavras, o propósito do texto é o responsável pelo en-
quadramento em um determinado gênero, cujas características
são “construção composicional”, “conteúdo temático” e “esti-
lo”. (BAKHTIN, 2003)

O pensamento bakhtiniano vem ao encontro do que é de-


fendido pelos funcionalistas, isto é, a análise lingüística a partir

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do locus enunciativo. A intenção comunicativa é a responsável
pela inserção dos textos em um determinado gênero.
Pretende-se provar, na análise do corpus, que em estruturas
transitivas diretas associadas à partícula “se” é do gênero a res-
ponsabilidade de o elemento seguinte só ser objeto direto quando
se tratar de sentenças inseridas em tabuleta/anúncio.

3.1 – Análise dos anúncios/tabuletas atuais

Os anúncios/tabuletas espalhados pelo Rio de Janeiro são


verdadeiros marcadores sociológicos. A partir de um estudo
pragmático, pode-se inferir o contexto social em que se encon-
tram as pessoas que elaboram esses anúncios.
Atualmente o emprego do pronome “se” com função inde-
terminadora vem ganhando espaço no uso cotidiano. O registro
coloquial tende a não empregar o “se” como um apassivador,
possivelmente por não considerar o sintagma posposto ao verbo
como um sujeito, mas sim como alvo de um processo verbal.
Apesar das inúmeras discussões, teorias e pontos divergen-
tes, acredita-se que o termo posposto ao verbo em estruturas tran-
sitivas diretas associadas à partícula “se” só não é sujeito em situ-
ações comunicativas restritas ao gênero anúncio/tabuletas. É nes-
se ponto que incide a discussão deste trabalho. Não se pode gene-
ralizar toda e qualquer situação com verbo transitivo direto +
partícula “se” como um sinal de sujeito indeterminado. Em frases

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não pertencentes ao gênero anúncio/tabuleta, essa conclusão in-
determinadora não procede:
(3) Discutem-se os acordos.
(4) Os acordos são discutidos.

Em ambos, recupera-se um agente como realizador da a-


ção, mas fica explicitado apenas o sujeito paciente; logo, tanto em
(3) quanto em (4), o termo acordo exerce o papel semântico de
paciente, e sintático de sujeito.
A fim de ratificar essa hipótese, elencam-se, a seguir, fra-
ses, que se encontram disponibilizadas no anexo, extraídas do
registro fotográfico do corpus. Em 42,8% dos casos, não se esta-
beleceu concordância entre o verbo e o complemento. Isso se
deve a questões semântico-sintáticas e também pragmáticas. O
falante reconhece um sujeito “agente” a realizar a ação, embora
não explicitado na sentença, logicamente que não irá reconhecer
no elemento posterior outro sujeito, até porque no gênero anún-
cio/tabuleta de fato não é. Cerca de 30% das ocorrências no cor-
pus foram de frases em que a concordância estabeleceu-se dentro
da norma culta da língua, concordando no singular ou no plural.
Registraram-se placas (23,7%) em que só aparece a infor-
mação relativa ao evento verbal; nesses casos, deve-se inferir que
(quem) está sendo comercializado a partir de uma observação
pragmática, isto é, a construção do sentido vai ocorrer na interre-
lação com o outro, dentro do contexto no qual a tabuleta estiver

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inserida. Nessas placas, o apagamento do sintagma posposto ao
verbo corrobora com a tese deste ser um objeto direto (alvo da
ação) porque, ao ser omitido, faz com que a interpretação recaia
sobre o local onde se encontra a placa, portanto o alvo da ação
enunciada na tabuleta. Nesses casos, a partícula “se” remete a um
sujeito qualquer – fenômeno dêitico – indeterminado, que se pro-
põe a realizar uma ação específica, valorizando o processo verbal,
não o agente. Trata-se de uma herança latina, em que a passiva
sintética do latim imputava ênfase ao processo desencadeado pelo
verbo e não ao agente. Os verbos quando empregados de forma
impessoal por essa passiva atendiam a uma intenção do autor/
falante de omitir o sujeito-agente, por questões discursivas diver-
sas.
Em relação à questão sociocultural, das dez ocorrências de
desvio da norma culta, sete foram registradas em locais da perife-
ria da cidade de Araruama; demonstrando, assim, que o fator es-
colaridade tem influência direta na seleção das normas gramati-
cais.
No corpus pesquisado, foram selecionados três verbos (a-
lugar, vender e cortar), que se encontram na mesma situação
comunicativa, pois estão registrados no gênero anúncios/ tabule-
tas. Para não tornar enfadonha a leitura, será selecionado um e-
xemplo de cada verbo para promover a análise. Todas as ocorrên-
cias estão disponibilizadas no anexo.

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O registro das tabuletas foi realizado ao longo do mês de
abril/2007. Sabe-se que esse corpus poderia ser mais extenso,
portanto fica aqui a proposta de ampliação desta pesquisa, e que a
mesma sirva de base para investigações futuras.

I) ALUGAR
a) Aluga-se 2 casas 2 quarto
a’) 2 casas 2 quarto são alugados

Uma análise pragmática desses enunciados deixa clara a


distinção entre os itens. A primeira (a) apresenta um texto infor-
mando que há algo ainda a ser alugado; a segunda (a’) não cor-
responde semanticamente à anterior. Na verdade, se essa tabuleta
for colocada diante de uma vila, por exemplo, a mensagem deco-
dificada por um transeunte qualquer é de que não há proprietários
naquela vila, são todos inquilinos, que já estão ocupando seus
respectivos espaços.

II) VENDER
b) Vende-se roupas
b’) Roupas são vendidas

No item (b), sabe-se que a ação de vender as roupas é reali-


zada por alguém; em (b’), a mensagem é outra. O vocábulo ven-
didas aponta uma característica do substantivo roupas, inclusive

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pelo uso do verbo ser, que indica algo inerente ao sujeito, dire-
cionando o foco da informação para o sujeito roupas, não mais
para a ação verbal.

III) CORTAR
c) Corta-se gramas
c’) Gramas são cortadas

Se uma pessoa quiser valorizar a grama de um determinado


lugar, usará a sentença (c’), pois o verbo ser, de aspecto perman-
sivo, confere ao vocábulo gramas uma caracterização permanen-
te; mas, se o intuito discursivo for informar a respeito do evento a
ser realizado, opta-se pela frase (c), que, inclusive, topicaliza o
verbo.
No registro das imagens, houve uma situação inusitada.
Um mesmo local abrigava duas placas:
d) Vende-se cofres.
e) Vendem-se cofres.

As duas ocorrências demonstram a fragilidade da concor-


dância verbal, e a dificuldade que as pessoas apresentam em rela-
ção ao emprego da norma culta.
Para enfatizar o emprego do “se” como indeterminador no
registro do gênero anúncio/tabuleta, ainda se pode recorrer a pla-
cas de imobiliárias que se colocam na posição de sujeito-agente:

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logicamente omitindo a partícula “se”, por ser esta um indicativo
de sujeito exteriorizado e, no caso, encontra-se na própria placa:
f) Soguima aluga
g) Geraldo Imóveis vende

Essas tabuletas indicam o desencadeador da ação (Soguima


e Geraldo Imóveis) e direcionam para um alvo inferido pragmati-
camente, ou seja, o local onde a tabuleta se encontra, que está
para ser vendido ou alugado. A explicitação do agente no anúncio
deve-se à ausência do clítico “se”, por ter este, no registro das
tabuletas, função dêitica: remeter a um sujeito exteriorizado.

3.2 – Anúncios de jornais do século XIX (1808-1850)

Esta investigação baseada no livro de Delso Renault tem


como um dos objetivos comprovar que o uso do “se” indetermi-
nador não está associado ao “on” indeterminador do francês, uma
vez que no período mais “afrancesado” da história do Brasil, não
houve número de registros relevantes no uso do clítico “se” com
função indeterminadora.
Nos anúncios de jornais do século XIX, recolhem-se inú-
meros dados curiosos que apresentam os costumes dos habitantes
do Rio de Janeiro, que também são informações relevantes para
este trabalho, pois a proposta é apresentar uma análise do clítico
“se” a partir de uma abordagem semântico-sintático-pragmática.

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Encontraram-se 32 ocorrências de partícula “se” nos anún-
cios investigados, das quais 10,4% foram de não-concordância
entre o complemento no plural e verbo no singular. As demais
realizaram as devidas concordâncias: 36,4% de complemento no
singular e verbo também no singular e 53,2% de complemento no
plural e verbo também no plural.
Os números indicam que a sociedade valia-se da norma
culta na maior parte das ocorrências. Explica-se esse comporta-
mento devido ao conservadorismo da época. O ensino da língua
portuguesa estava atrelado às aulas de gramática, à metodologia
da memorização das regras gramaticais. No livro de Delso Re-
nault (1984), é explicitado o modelo tradicional de ensino:

As aulas de gramática, de decoração maciçao de regras gra-


maticais, abrem-se nas ruas que hoje caracterizam o centro da
cidade. Predominam os padres neste sistema de aulas particu-
lares. (RENAULT, 1984, p. 40)

As sentenças abaixo relacionadas apresentam a partícula


“se” em uso corrente; demonstrando, assim, o funcionamento da
língua em um determinado momento da evolução lingüística.
Ressalta-se, ainda, que os vocábulos estão registrados como eram
grafados no século XIX.
I) Verbos no singular e complemento no singular:
a) “No Largo da Lapa n.º 24, abrio-se hum Collegio de educa-
ção de meninas, onde se ensina a ler, escrever, contar, Gram-

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matica Franceza e Ingleza; e a cozer, marcar, bordar de todas
as qualidades, dança e musica.” GRJ 2 – 16/8/1817 (p. 62).

Hum Collegio de educação de meninas foi aberto

b) “no recôncavo desta Corte se oferece lugar de coadjutor de


huma Freguezia (...) além do ordenado de Coadjutor (...) tão
bem terá huma Capellania para dizer Missa aos Domingos e
Dias Santos, por doze doblas por anno, além de outros interes-
ses mais que se lhe fará.” DRJ 3 – 22/1//1827 (p. 111).

Lugar é oferecido

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c) “em uma casa aonde se vende carne.” JC – 24/1/1829 (p.
123).

Carne é vendida

d) ”deseja-se hum rapaz Portuguez ou Francez.” JC – 19/2/1830


(p. 142).

Hum rapaz é desejado

e) “Collegio de Minerva, dedicado a Mocidade Brasileira, Fran-


ceza e Ingleza, rua da Cadeia nº 161, abre-se no 1º do corrente

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e nelle se ensinaraão segundo os methodos os mais expeditos,
tudo o que pode ornar o espírito humano.” JC – 11/02/1835 (p.
176).

Collegio de Minerva é aberto

f) “vende-se na rua de S.Pedro n.29, canto da Candelária, hum


pardo moço de bonita figura, próprio para pagem, tendo al-
gumas habilidades, quaes sejam servir bem em huma mesa, fa-
lar francez, entender bem de Typographia.” JC – 4/11/1835 (p.
179).

Hum pardo moço de bonita figura é vendido

g) “vende-se huma preta de nação, com uma filha de 8 dias, a


qual tem bom leite, cozinha perfeitamente á moda franceza e
entende o francez.” JC – 24/7/1838 (p. 191).

Huma preta de nação é vendida

h) “na rua S. José n. 33 vende-se huma linda rapariga prenda-


da que falla bem o francez.”JC – 03/3/1838 (p. 199).

Huma linda rapariga prendada é vendida

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i) “elephante, este raro e monstruoso objecto da historia natu-
ral”, que “acha-se na rua dos Ciganos n. 67, tendo crescido
dous palmos e meio e com mais ensino do que tinha.” JC –
1/12/1840 (p. 206).

Elefante é achado

j) Vende-se uma preta moça, bastante prendada e bem educada,


sabendo cortar e fazer camisas, vestidos e enfeites, engomma,
veste, prega e pentêa uma senhora e falla francez e hespa-
nhol.” JC – 22/3/1842 (p. 232).

Uma preta moça é vendida

l) “Leite de vacca puro, sem água, vende-se pela manhã, de 4 a


5 garrafas, a 160rs cada huma, na chácara n. 214 defronte da
Casa de Correção.” JC – 03/02/1842 (p. 229).

Leite de vacca puro é vendido

m) “Oleo de Urso para os cabellos, tão procurado e estimado


vende-se na Pharmacia Ingleza.”JC – 10/8/1842 (p. 279).

Oleo de urso é vendido

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De todas essas sentenças, em quatro delas (e, i, l, m) verifi-
ca-se a anteposição do sintagma nominal, uma tendência da lín-
gua à personificação de seres inanimados. No latim clássico, já
havia esse processo de metaforização, permitido na voz medial
dinâmica. É um recurso de expressão utilizado na linguagem de
propaganda e de anúncios, em que a posição tópica assumida pelo
sintagma aponta para uma interpretação medial, ou seja, este é o
ponto de partida e de chegada do evento, não revelando os verda-
deiros responsáveis pela venda, apresentando o sintagma antepos-
to como o único responsável pela qualidade do produto anuncia-
do.
Em relação ao clítico “se”, nessas estruturas apresentadas
no corpus (verbo transitivo direto + se + sintagma nominal), ser
considerado pela gramática normativa como apassivador e cor-
responder à sua versão analítica, verifica-se que isso não se com-
prova devido ao gênero anúncio. Em todas as ocorrências, rees-
truturar as frases para a versão analítica comprova que há altera-
ção semântica, portanto o “se” não pode ser enquadrado como
apassivador; trata-se de um sinal de indeterminação do sujeito.

II) Verbos no plural e complemento no plural


a) Nesse tempo as seges já estão em uso: “na cocheira da Rua de
Santa Teresa” – diz o anúncio – “há duas seges muito assea-
das, e com boas parelhas, as quaes se alugão por cinco patacas

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(...) até a distancia da praia de Botafogo ou São Christovão.”
GRJ – 31/5/1809 (p. 34).

Duas seges são alugadas

b) Loja da Gazeta “vendem-se dicionários Hespanhol-Francez,


Francez-Inglez, Francez-Portuguez e uma grammatica Mestre
Francez”, de 2 vols., pelo elevado preço de 21$000. GRJ –
30/6/1810. (p. 42).

Dicionários são vendidos.

c) No largo do Caeté, na venda do Machado, vendem-se 2 pro-


priedades de Casas: a primeira de três janellas e huma porta á
frente, com mirante, e vista para o mar, e a segunda de duas
janellas e huma porta, e com seus quintaes”.GRJ – 13/4/1811
(p. 46).

2 propriedades são vendidas.

d) A Academia Real Militar (4 de dezembro de 1810) começa sai


atividade; seu secretário Luís Prates d’Almeida de Albuquer-
que, avisa “que em o dia 11 de Abril do presente ano se a-
brem algumas Aulas”, no edifício da Sé nova, recentemente

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preparado no Largo de São Francisco de Paula. GRJ –
1/4/1812 (p. 46).

Algumas aulas são abertas.

e) além do idioma francês “se ensinao differentes ramos de


instrução á mocidade.” GRJ – 27/3/1819 (p. 68).

Differentes ramos são ensinados.

f) Nesta escola que fica “hindo para a Lapa lado direito ensi-
nam-se as primeiras letras, latime francês tudo muito com-
modado.”DRJ – 12/11/1821 (p. 77).

As primeiras letras são ensinadas.

g) Anúncio de uma escola com o método Lancaster- em que os


alunos receberão princípios de comércio, e navegação, gramá-
tica portuguesa e “se admitem meninas, não só para ler, es-
crever, contar até a regra de trez, mas para cozer, cortar vesti-
dos de Senhoras, marcar, bordar, e fazer meia, e toda qualida-
de de renda, e tudo pelos mesmos 2$000 reis mensaes: mas
não se lhes dá papel, penas, tinta, livros & C.” DRJ –
30/3/1822 (p. 83).

23
Meninas são admitidas.

h) “rua da Cadea esquina da Quitanda, lado direito hindo para o


Campo (...) em cujo não só se encinão todas as prendas que
se constituem indispençaveis ao feminino sexo, como também
a muzica, Grammatica Portugueza e Franceza (...) por cômodo
preço” – adverte o anúncio – “se lava, engoma, e marca na
mesma casa toda a qualidade de roupa, perfeitamente.” DRJ –
5/10/1822 (p. 84).

Todas as prendas são encinadas.

i) “no beco do Propozito (Almirante Barroso), encinam-se as


matérias pertencentes ao 1.º anno Mathematico, e aprender a
escrever, ler, e a fallar a Lingoa Franceza.” DRJ – 19/10/1822
(p. 86).

As matérias são ensinadas.

j) “R. Campbell adverte, que a sua salla nº 100 rua Direita, está
agora aberta, aonde se achão todas as Gazetas principais da
Inglaterra, França e Alemanha.” DF – 5/4/1826 (p. 103).

Gazetas são achadas.

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k) “Alguns escravos cegos, que se dão gratuitos”, na rua dos
Pescadores. DRJ – 2/3/1827 (p. 111).

Escravos são dados

l) “sendo endecoroso que em huma Capital como esta, em despei-


to da saúde publica, e decência, se facão despejos.” DRJ –
20/3/1829 (p. 124).

Despejos são feitos.

n) ”Vinhos de Bordeaux em barries (sic) aguardente em caixas, e


muitas outras cousas que se venderão por preços commodos”,
são encontradas “na rua d’Ajuda n. 58 (Rua Chile, quase desa-
parecida) perto da de Santo Antonio.” JC – 24/8/1829 (p. 126).

Outras cousas são vendidas.

o) “os elegantes trastes modernos de Paris que se vendem em


leilão.” JC – 9/01/1844 (p. 251).

Trastes são vendidos.

25
p) “quanto aos castigos aplicão-se segundo o moderno systema
penitenciário, em uso nas Escolas dos Estados Unidos da Amé-
rica.” Diário Oficial – 18/7/1834 (p. 172)

Castigos são aplicados.

Assim como no item anterior, ocorrem frases que metafori-


zam o sujeito, colocando-o anteposto ao verbo, como um recurso
estilístico, próprio do apelo comercial inserido no gênero anún-
cio. Somam quatro incidências, itens (a), (l), (n) e (p). Com essas
frases, a mudança para a voz passiva analítica afasta-se muito
mais do sentido inicial das orações:

(5) Os elegantes trastes modernos de Paris que se vendem em


leilão. JC – 9/01/1844 (p. 251).

Toda a responsabilidade da venda parte do núcleo trastes,


sendo este considerado o agente da oração, embora sob forma
metafórica. Se houver modificação para passiva analítica – trastes
são vendidos –, o sentido modifica-se totalmente, porque o agente
pode até ser recuperado pelo contexto, ao passo que na frase (5) o
núcleo trastes já se imbui desse papel semântico.

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III) Verbos no singular e complemento no plural

a) Anúncio de uma escola com o método Lancaster – em que os


alunos receberão princípios de comércio, e navegação, gramá-
tica portuguesa e “se admitem meninas, não só para ler, escre-
ver, contar até a regra de trez, mas para cozer, cortar vestidos
de Senhoras, marcar, bordar, e fazer meia, e toda qualidade de
renda, e tudo pelos mesmos 2$000 reis mensaes: mas não se
lhes dá papel, penas, tinta, livros & C.” DRJ – 30/3/1822 (p.
83).

b) “acha-se comidas á moda Franceza, Ingleza, e Brasileira e


tambem se fazem comidas para fora” JC-1/7/1831(p.152)

c) “vende-se hum moleque de 16 a 18 annos, bem parecido,


perfeito cozinheiro de forno e fogão; e huma negrinha de 14
a 16 annos, muito bonita, que cose, engomma e falla francez”
JC – 12/6/1839 (p. 202).

d) “vende-se na rua Direita n.15, queijos londrinos muito fres-


caes a 600 rs. A libra.” (Fac-similes – p. 204).

e) ”vendem-se dous vistosos e reforçados molecões sem ponta de


barba, próprios para casa de café, cedeirinha ou roça no que
tem sido occupados; hum destes cozinha alguma cousa; affi-

27
ança-se boa saúde e conducta; na rua de S. Bento n.85.(Fac-
similes – p. 204).

O emprego do “se” como indeterminador em construções


transitivas diretas apresentou pouca incidência nessa etapa da
pesquisa. Das cinco ocorrências, apenas duas infringem de fato as
regras sintáticas de concordância verbal, os itens (b) e (d); os
demais optaram por outro tipo de concordância, a atrativa. Nesse
caso, a combinação sintática é feita com o elemento mais próximo
do verbo, e isso não acarreta erro.
Os dois anúncios que mantêm o verbo no singular, apesar
de o sintagma posposto se encontrar no plural, procedem de um
ambiente pouco letrado, de um comércio varejista sem muita pro-
ximidade com as normas da língua, portanto não-seguidores dos
padrões gramaticais.
Naquela época já se percebia a instabilidade da flexão ver-
bal de número, haja vista em um mesmo anúncio (b) surgirem os
dois modelos, isto é, com e sem concordância verbal.

Conclusão

As construções impessoais com verbo transitivo direto –


aluga-se casas – estão cada dia mais correntes, não só no uso oral
e coloquial, mas também no escrito e formal, uma vez que nos
melhores jornais e revistas já se encontram alguns registros de

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não-concordância, caracterizando o sentido da impessoalidade.
Resta saber se a aplicação impessoal é abrangente ou está restrita
a um gênero textual específico. Não parece ser diferente discuti-
ram-se os acordos de acordos foram discutidos. Em ambos os
casos, o agente pode ser recuperado contextualmente e as orações
são semanticamente iguais. Se não há discordância quanto a a-
cordos ser o sujeito (paciente) desta, nada impede de ser também
sujeito (paciente) daquela e, como sujeito, o verbo concordar com
o mesmo.
Ao que parece, a dissonância está em orações específicas
do gênero anúncio/ tabuletas, como em casa é alugada / aluga-se
casa. Nesses casos, é o contexto discursivo o responsável pela
não-correspondência entre as passivas analítica e sintética, uma
vez serem muito diferentes as duas orações quando inscritas em
uma tabuleta. A primeira revela que o local é alugado, oposto de
casa própria; a segunda indica que há algo à venda. Essa inter-
pretação realiza-se à luz da pragmática, percebe-se no clítico “se”
uma função dêitica ao remeter a um sujeito fora da cena enuncia-
tiva.
Acredita-se, ainda, que a diferença semântica entre as ora-
ções passivas analíticas e pseudo-passivas sintéticas também está
relacionada à questão do tempo verbal, haja vista em anúncios /
tabuletas só serem usados verbos no presente do indicativo, e ao
se realizar a mudança para passiva analítica, surgem as formas
permansivas é / são, indicando características próprias de deter-

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minado objeto, pessoa ou lugar, direcionando a interpretação não
para a suposição de um agente, mas sim para o próprio sujeito,
ainda que paciente. Já na pseudo-passiva sintética, é no clítico
“se” que está lexicalizada a indeterminação.
Vários lingüistas afirmam que o uso indeterminador do clí-
tico “se” em português relaciona-se ao pronome indefinido “on”
da língua francesa, que também tem a função indeterminadora;
porém se esquecem que em francês há o uso da partícula “se”
como forma sintética tal qual o português. O auge da influência
francesa no Brasil foi no século XIX, portanto, para comprovar a
teoria desses lingüistas, dever-se-iam encontrar inúmeros exem-
plos de “se” indeterminador no corpus retirado do Rio antigo nos
anúncios de jornais; no entanto, isso não acontece, o que se en-
contram são apenas algumas ocorrências. Esse levantamento de
costumes e hábitos do início do século XIX corrobora para uma
análise pragmática da sociedade da época, demonstrando, assim, a
teoria funcionalista – as estruturas lingüísticas em uso corrente.
Muitos gramáticos, para ratificar o “se” como indetermina-
dor em estruturas transitivas diretas, utilizam exemplos chavões
inseridos no gênero anúncio/tabuletas. Isso só vem reforçar a tese
de que há uma restrição quanto ao gênero textual na classificação
do “se” com função indeterminadora; não pode ser expandida a
toda e qualquer construção com verbo transitivo associado ao
pronome “se”.

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Conclui-se que só não há correspondência na estrutura se-
mântico-sintática das orações em forma passiva analítica e passi-
va sintética quando essas pertencerem ao gênero tabuletas. Essa
análise é garantida pelo contexto discursivo no qual as tabuletas
estão inseridas. Debita-se na conta da pragmática a constatação do
“se” indeterminador em construções como vende-se casa; reco-
nhecendo, assim, sua função dêitica. Esse tipo de frase está restri-
to às tabuletas, que são afixadas em locais a serem comercializa-
dos, fazendo com que as pessoas percebam o local em que está
afixada como o objeto de venda, e que há alguém por trás daquela
ação, um sujeito indeterminado qualquer, cuja intenção
comunicativa é apresentar à comunidade o objeto a ser vendido.

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Referências bibliográficas:

BAHKTIN, M. Estética da Criação Verbal. São Paulo: Martins


Fontes, 2003.
CHARAUDEAU, P. Langages et discours. Paris: Hachette, 1983.
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representações do EU e seus efeitos de sentido. Rio de Janeiro:
Enelivros, 2005.

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