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16/06/2021 Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
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assente uma contrapartida séria, justa e aprazada, pelo que, com a falta
de cumprimento dos encargos por banda do réu, sofreu o autor um
prejuízo que se pode quantificar e qualificar pela expectativa e pela
certeza que se verteram no referido contrato, não se tendo conferido à
violação do encargo modal o direito à resolução do contrato de doação,
assistindo assim ao autor o direito de obter uma indemnização, nos
termos do disposto nos artigos 801º e 966º do Código Civil,
indemnização essa que ascende a €288.000,00 (duzentos e oitenta e
oito mil euros), cujos cálculo se efetua da seguinte forma: €2.000,00 x
12 = €24.000,00 x 12 anos = €288.000,00, acrescidos dos juros legais.
Conclui que a conduta do réu causou ao autor enorme transtorno
pessoal, social e tem afetado a sua saúde, pugnando assim, e na
procedência da ação por provada, pela condenação do Réu a pagar ao
Autor a quantia de €288.000,00 (duzentos e oitenta e oito mil euros)
acrescido de juros à taxa legal desde a citação e na procuradoria
condigna.
*
Citado para contestar, o Réu ofereceu contestação, por exceção e por
impugnação.
Excecionou desde logo a incompetência do Tribunal em razão da
matéria do tribunal em razão da matéria, com os fundamentos
constantes da contestação apresentada, pugnando pela absolvição do
Réu. da instância, nos termos do nº 2 do artigo 576º e nº 1 do artigo 99º
todos do Código do Processo Civil.
Excecionou ainda o Caso Julgado, alegando ter corrido termos neste
juízo, ação com o nº ... finda e já transitada em julgado por transação
homologada por sentença; que tal ação foi intentada pelo aqui Autor
contra o Réu Município de ..., peticionado a resolução do negócio que
configurou a doação do “Espólio do ...”, definindo o seu objeto pela
referência aos bens entregues constantes dos cadernos juntos na
referida ação e que, por não ter sido concretizado o fim a que se
destinaria tal doação viria o negócio a ser resolvido por devolução dos
bens, o que se operou em conformidade com a sentença, vindo agora o
Autor, com nova ação, sustentada na mesma causa de pedir mas dela
pretendendo extrair outras consequências que não peticionou na
anterior ação, apesar de ter transigido no sentido de que a questão do
“espólio entregue/doado”, ficava definitivamente resolvida,
verificando-se assim a exceção de caso julgado prevista nos artigos
576º, 577º alínea i) , 580º, todos do Código de Processo Civil,
importando assim a absolvição da instância.
Em sede de impugnação, veio arguir a nulidade do contrato de doação,
alegando que o aludido contrato não é escritura pública nem tão pouco
poderá ser considerado como contrato de doação modal, tal com
configurado pelo Autor; que as declarações subscritas pelo então
Presidente do Município de ... e o Autor, sem qualquer deliberação
prévia do órgão competente e sem posterior ratificação do órgão
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competente para tal, põe em crise toda a validade jurídica que daí se
possa ou pretenda extrair por via da presente ação, uma vez que atuou o
então Presidente da Câmara de ..., sem poderes para tal, agindo de
modo próprio em representação do Município, aceitando a dita doação
e aí consignando uma obrigação “modal” cujo conteúdo não poderia
vincular então ou para o futuro, o Réu.
Alegou ainda que é inquestionável que o autor quis transferir
gratuitamente para o domínio e posse do Município bens de sua
pertença em momentos distintos, e que alguns deles se mantém na
posse do Município, nomeadamente os que se reportam à entrega de
2002, doação manual que se consumou com a traditio, sem que tivesse
sido outorgado qualquer contrato ou outra formalização, para além do
inventário realizado por A. e os serviços do R. e que o que se pode e
deve extrair das declarações negociais em causa é que o A. doou os
bens que entendeu doar, por transmissão gratuita ao R., para que este os
destinasse a um futuro museu que e se viesse a edificar e tal condição
apenas se teria por incumprida pelo R. se tal museu já tivesse sido
edificado e aos bens em causa tivesse sido dado destino diferente, o que
não ocorreu, nem se tendo o R. vinculado perante o A. a levar a cabo
tal edificação, não sendo ele o titular do direito subjetivo inerente a tal
edificação, pois que a opção de tal obra caberia estritamente no âmbito
dos poderes de gestão do interesse público, definidas pelos órgãos
colegiais próprios (Câmara Municipal e Assembleia Municipal).
Impugnou ainda alegando que a doação do quinhão hereditário nos
bens imóveis teve por base a sua incapacidade de manutenção dos
mesmos e a evidência da sua degradação.
Mais alega, e em conclusão, que a opção de edificação de um museu
sempre dependeria de variáveis que o Réu por si só não poderia
garantir, nomeadamente as que se prendem com a colegialidade dos
órgãos decisores e os ciclos políticos que lhes estão subjacentes, e bem
assim por força das regras de tutela administrativa do interesse público,
no que tange a opções orçamentais e de tesouraria, em cada momento e
que o valor histórico e material do espólio em causa não revestia de
facto o interesse e dimensão com que o Autor “o quis cunhar”, pelo
que existiria um enorme desvalor entre a doação e o encargo pelo que,
para além de ter sido devolvido ao Autor parte do espólio, aqui
peticionado como parte da causa de pedir e que veio a revelar-se de
nenhum valor, o demais fora já entregue em 2002 sem qualquer
condição à data da traditio, que o Réu aceitou.
Conclui assim pela procedência das exceções invocadas, com a
consequente absolvição do Réu da instância, ou, assim não se
entendendo, julgada a ação totalmente improcedente e o Réu absolvido
dos pedidos.
*
O autor apresentou resposta às exceções.
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*
Por sua vez, apresentou o A. contra-alegações a esse recurso,
das quais extraiu as seguintes conclusões:
...
*
Colhidos os vistos e nada obstando ao conhecimento do
objeto do recurso, cumpre apreciar e decidir.
2 – QUESTÕES A DECIDIR, tendo em conta o objeto do
recurso delimitado pelos RR. nas conclusões das suas alegações (arts.
635º, nº4, 636º, nº2 e 639º, ambos do n.C.P.Civil), por ordem lógica e
sem prejuízo do conhecimento de questões de conhecimento oficioso
(cf. art. 608º, nº2, “in fine” do mesmo n.C.P.Civil), face ao que é
possível detetar o seguinte:
- rejeição desse recurso por não apresentação de
conclusões e por não indicação das normas jurídicas violadas?
(como questão prévia suscitada nas contra-alegações do A.,
relativamente ao recurso do R.);
- erro de decisão quanto à improcedência da exceção de
caso julgado;
- erro na decisão da matéria de facto, quanto aos pontos de facto
“provados” sob “1.4.”, “1.6.” e “1.7.” [relativamente aos quais pugna
por que sejam julgados como “não provados” ou por uma distinta
redação];
- incorreto julgamento de direito [pois que ainda que se formulasse
uma condenação, essa condenação errou no juízo de equidade].
3 – QUESTÃO PRÉVIA
Cumpre começar pela apreciação da invocada rejeição do recurso do
Réu, por não apresentação de conclusões e por não indicação das
normas jurídicas violadas (como questão prévia suscitada nas contra-
alegações do A., relativamente ao recurso do R.).
Sustenta, em síntese, o A./recorrido nas suas contra-alegações, que
«(…) neste caso as conclusões perfazem outro tanto das alegações
recurso apresentadas pelo Apelante; não sendo propriamente a
reprodução ipsis verbis das alegações, estão longe de ser conclusões.
Entendendo-se por isso que esta circunstância equivale à não
apresentação de conclusões, pelo que o recurso deve ser rejeitado nos
termos do art.º 641.º, n.º 2, al. b), do CPC. Sem prescindir, é certo que
não obstante o ónus que lhe é imposto pelo art.º 639.º, n.º 2, al. a), do
CPC, o Recorrente no seu requerimento de Recurso não indica as
normas jurídicas violadas».
Será assim?
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------------------
2º
Em consequência de tal resolução, o Município devolverá ao Autor
todos os bens que constituem o acervo descriminado no CD que se
encontra a fls. 159, que constitui o espólio existente, no prazo máximo
de 90 dias, assumindo o R. o transporte desde o local onde se
encontram ao local a indicar pelo Autor, sito na localidade do ... –-------
------------------------------------------------------------------
3º.
Com a celebração do presente acordo, as partes consideram
definitivamente encerrado o litígio relativo ao denominado espólio do
Sr. Prof. ...----------------------------------
4º
As custas serão suportadas em partes iguais, sem prejuízo do benefício
de apoio judiciário concedido ao Autor. --------------------------------------
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***
Seguidamente, pela Mmª Juiz foi proferida a seguinte: --------------------
------------------------------
=SENTENÇA=
Na presente Ação de Processo Comum, que R... propôs contra o
Município de ..., homologo, por sentença, a transação que antecede,
atento o seu objeto e a qualidade dos intervenientes, condenando as
partes a cumprirem o acordado nos seus precisos termos e declarando
extinto o direito pretendido fazer valer na parte sobrante do pedido
formulado nos autos – artºs 283º, 289º a contrario sensu e 290º do
C.P.C.. -----------------------------------------------------------------
As custas serão suportadas em partes iguais, nos termos acordados -
artº 537º nº2 do C.P.C.. ----
Tendo em consideração a postura de colaboração das partes na
composição amigável do litígio-dos autos, e a fase processual em que
colocam, por acordo, termo à presente ação, bem como-o objeto do
processo e o valor da ação, dispenso as partes do pagamento da taxa de
justiça-remanescente, nos termos do nº 7 do artº 6º do R.C.P.. ------------
--------------------------------------------------------------------------------
Em consequência, dou sem efeito a audiência para hoje agendada. ------
------------------------------
Registe e notifique.»
Por sua vez, é do seguinte concreto teor o “Termo de Entrega”
que foi lavrado nesses autos:
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5 - FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO
Cumpre agora entrar na apreciação da última questão igualmente supra
enunciada, esta já diretamente reportada ao mérito da sentença, na
vertente da fundamentação de direito da mesma, a saber, ter havido
incorreto julgamento de direito [pois que ainda que se formulasse
uma condenação, essa condenação errou no juízo de equidade].
Que dizer?
Nesta parte – e releve-se o juízo antecipatório! – assiste alguma razão
ao Réu/recorrente, embora se conclua em termos diversos do por ele
pretendido.
Na verdade, impõe-se começar por afirmar que, quanto a nós, face ao
quadro fáctico apurado – e que subsistiu face à improcedência da
impugnação à decisão sobre a matéria de facto pretendida pelo mesmo
Réu/recorrente! – a condenação do Réu/recorrente afigura-se
incontornável, apenas se discordando dos termos em que ela foi
operada, pois que, quanto a nós, essa condenação terá que ser a liquidar
em decisão ulterior.
Com efeito, a prova, ou melhor, a não prova pelo Réu de não ter
incumprido com o que se havia vinculado [face à presunção de culpa
do incumprimento], tem a consequência jurídica que lhe está
consabidamente associada, isto é, a obrigação de ressarcir/indemnizar
os prejuízos sofridos pela contraparte.
De referir ab initio que, em nosso entender, apenas está validamente em
causa nestes autos a indemnização pelo incumprimento da cláusula
modal constante da escritura de 17.05.2006 relativamente aos bens
móveis, na medida em que, tendo sido celebrada nessa mesma data e
entre as mesmas partes, uma escritura de doação de bens imóveis,
independentemente da conexão objetivamente temporal e até lógica
entre as duas doações, relativamente à da doação de bens imóveis não
existe qualquer cláusula modal que tenha sido incumprida e que por
essa via possa conferir ao Autor a indemnização reclamada nos autos.
Sem embargo do vindo de dizer, isto é, operando a ressalva respeitante
à situação dos bens imóveis igualmente doados, até subscrevemos o
segmento da sentença recorrida que procedeu ao enquadramento geral
neste particular, a saber
«No caso concreto, como referido, está-se perante uma situação de
incumprimento contratual, consistente no incumprimento do encargo
ou modo aposto na doação, respeitante ao fim a que se destinavam os
imóveis doados, por parte do réu Município de ... e remuneração a
pagar ao autor, como compensação pela utilização desses bens,
considerados de valor histórico relevante, para fins de utilidade pública
e de utilização do Município, encarregue de os preservar.
Nos termos do disposto no artigo 798º do Código Civil, o devedor que
falta culposamente ao cumprimento da obrigação, “ou mesmo quando
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Atente-se que, como preceitua o art. 566º do C.Civil, nos seus nos 1 e
2, sendo impossível a restauração natural, a indemnização é fixada em
dinheiro, calculando-se o seu “quantum” de harmonia com a chamada
“teoria da diferença” – ou seja, a indemnização em dinheiro tem como
medida a diferença entre a situação patrimonial do lesado na data mais
recente que puder ser atendida pelo tribunal e a que ocorreria nessa data
se não existissem danos.
Sendo certo que a obrigação indemnizatória “só existe em relação aos
danos que o lesado provavelmente não teria sofrido se não fosse a
lesão” [cfr. art. 563º do mesmo C.Civil, onde se consagra a teoria da
causalidade adequada) e que o dever de indemnizar compreende não
apenas “o prejuízo causado” - dano emergente -, mas também “os
benefícios que o lesado deixou de obter em consequência da lesão” -
lucros cessantes [cfr. art. 564º nº1 do dito C.Civil], e configura uma
típica dívida de valor, em que o dinheiro intervém como um meio de
liquidação da prestação, não sendo o dinheiro, em si mesmo, o objeto
da prestação, a qual é constituída por um valor patrimonial.
Dito de outra forma: o art. 609º, nº 2 do n.C.P.Civil estipula que «Se
não houver elementos para fixar o objeto ou a quantidade, o tribunal
condena no que vier a ser liquidado, sem prejuízo de condenação
imediata na parte que já seja líquida»; a aplicação desta norma depende
da verificação, em concreto, de uma indefinição de valores de
prejuízos; mas como pressuposto primeiro de aplicação do dispositivo,
deverá ocorrer a prova de existência de danos; este preceito tanto se
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[2] De referir que também foi deduzido um recurso “per saltum” para o
STJ pelo A., mas na medida em que houve também recurso de apelação
deduzido pelo Réu [o supra aludido, de cuja apreciação se vai cuidar de
seguida], encontra-se impedida a imediata intervenção do STJ quanto
àquele, como, aliás, logo foi determinado pelo despacho oportunamente
proferido pelo Tribunal a quo.
[3] Assim, inter alia, o acórdão do STJ de 16.12.2020, no proc. nº
2817/18.0T8PNF.P1.S1, acessível em www.dgsi.pt/jstj.
[4] Cf., para além do aresto citado na precedente nota, o acórdão do
mesmo STJ de 11.07.2019, proferido no proc. nº 334/16.2T8CMN-
G.G1.S2, igualmente acessível em www.dgsi.pt/jstj.
[5] Assim o acórdão do TRC de 03-03-2015, no proc. nº
1381/12.9TBGRD.C1, acessível em www.dgsi.pt/jtrc.
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