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FSG – Centro Universitário da Serra Gaúcha

Disciplina: Análise Experimental do Comportamento


Professora Responsável: Dra. Natalia Becker
Nomes e RGM:

Atividade Avaliativa 3 – Nota A2 (0,5 ponto)


1) Leia o relato de caso clínico abaixo:

Marcos é um servidor público de 29 anos que trabalha no poder judiciário e mora com os pais. É
formado em Direito e cursa uma especialização lato sensu em sua área. Faz musculação em uma academia
cinco vezes por semana e joga futebol aos sábados. Veio à terapia queixando-se estar em uma “sinuca de
bico”.
Marcos namora Paula (28 anos) há três anos. Eles se conheceram em um curso preparatório para
concursos públicos. Marcos relata que sua namorada é muito ciumenta, possessiva e agressiva. Além disso,
no último ano do namoro, ela tem cobrado constantemente “um compromisso mais sério”, isto é, que se
casem, ou que, pelo menos, noivem. O cliente relata não querer mais continuar com o relacionamento,
desejando “escapar” do casamento a qualquer custo. Entretanto, não consegue romper com Paula, relatando
as seguintes razões: “Não quero quebrar minha coerência. Você sabe, no início do namoro, apaixonado, a
gente fala muitas coisas que depois se arrepende. Então, eu falei que a amaria para sempre, que ela era a
mulher da minha vida, que queria casar com ela, etc. Como é que agora, de uma hora para outra, digo que
não a amo mais e que quero terminar? Além disso... eu sei que não... mas há vezes que penso que ela vai
morrer ou fazer alguma besteira se eu terminar. Ela é tão nervosa e tão dependente de mim que eu fico
preocupado”. De fato, em algumas brigas em que Marcos sugeriu que interrompessem temporariamente o
namoro (“dessem um tempo”), Paula teve atitudes extremas, como sair correndo sozinha de um bar onde
estavam, de madrugada em um lugar perigoso, e ameaçar pular do carro em movimento.
Marcos, desde que começou a flertar com 14 anos, nunca ficou solteiro. Sempre “emendava” um
relacionamento em outro e, em geral, traía a sua namorada do momento com a seguinte. Ele teve mais três
namoros com duração superior a um ano e meio. Relatou ter passado por situações similares nos outros
namoros, querendo terminar e não conseguindo. Essas relações duraram mais do que Marcos gostaria, e ele
somente conseguiu rompê-las quando se envolveu com outra pessoa.
Os poucos amigos de Marcos estão todos comprometidos, e ele não tem com quem sair caso fique
sozinho. Afirma ser muito tímido para fazer amigos, apesar de ter uma excelente fluência verbal e conseguir
falar sobre diversos assuntos quando já conhece a pessoa. Marcos não parece ter problemas para conseguir
parceiras, uma vez que sempre manteve casos fora do relacionamento. Entretanto, relatou que, desde
criança, se achou inferior aos outros. Achava-se feio, sem graça, muito magro, cabelo esquisito, dentes
tortos, etc. Toda situação de conquista o fazia se sentir melhor. Relatava que só sentia que tinha valor
quando alguém queria ficar com ele. As suas investidas amorosas realmente não foram bem-sucedidas em
sua adolescência: seus amigos costumavam ter seus flertes bem-sucedidos e se vangloriavam disso,
enquanto Marcos experimentou algumas rejeições dolorosas.
Apesar de não relatar sentir culpa pelas traições, Marcos relata que queria mais liberdade para viver
esses casos: “Eu pegaria muito mais mulher se não estivesse encoleirado”. Ele também relata invejar os
homens solteiros na atualidade que podem conhecer inúmeras mulheres por meio de aplicativos de celular.
Algumas das mulheres que conheceu ao trair a sua namorada eram, segundo ele, muito interessantes, e ele as
teria perdido por estar namorando.
Para conseguir manter sua infidelidade em segredo, Marcos inventa todo o tipo de desculpa para sair
sozinho. Costuma deixar sua namorada em casa cedo para sair com outras mulheres depois. É extremamente
cuidadoso com o celular, nunca o deixa disponível para que Paula não comece a mexer no aparelho. Além
disso, está sempre apagando as chamadas e as mensagens. Só leva suas amantes para locais onde não possa
ser identificado por alguém conhecido. É extremamente vigilante quanto às redes sociais, apagando
imediatamente qualquer postagem que possa comprometê-lo.
Marcos também relata que gostaria de passar mais tempo com seus amigos, mas como Paula exige
muito a sua presença, ele não consegue vê-los com a frequência que gostaria. Relata que adora encontrar
seus amigos e contar seus casos de infidelidade. Seus amigos riem muito das suas histórias e chamam-no de
“canalha, calhorda, garanhão, pegador, ‘com mel’, etc.”.
Diante de questionamentos acerca das consequências de curto e longo prazo de seus
comportamentos, Marcos começa a chorar, dizendo que é “um monstro mesmo”, “que não tem jeito” e “que
arrasa com a vida de quem gosta dele”. Fica repetindo isso até que a psicóloga mude de assunto.
Já elogiou a aparência e as roupas da psicóloga algumas vezes, puxando assuntos cotidianos com ela.
Praticamente em toda sessão, leva um chocolate ou outro doce para a profissional. Além disso, em uma
sessão, Marcos emitiu as seguintes falas: “Se minha namorada fosse como você, assim, uma mulher
controlada, decidida e compreensiva, eu gostaria muito mais dela” e “Se eu encontrasse você num bar,
certamente ia te passar uma cantada”. Marcos também fala de si mesmo em muitas sessões de forma
sedutora (olhares e expressões corporais), como se estivesse se vangloriando das mulheres que conquista.
Marcos explica a sua infidelidade dizendo que se sente mais homem ao trair. Teve vários namoros
longos e sempre traiu suas namoradas. Aprendeu a admirar homens assim. Seu pai traia sua mãe com
frequência. Quando bebia, seu pai contava seus casos para os filhos e sobrinhos homens, dizendo: “Eu sei
que é errado, mas homem é assim mesmo. Se pintar uma gostosa, você vai dar para trás?”. Marcos e seus
irmãos gargalhavam quando o pai contava essas histórias. Ele também fala com um sutil sorriso no canto da
boca que trai sua namorada porque ela briga demais com ele, é como se fosse uma forma de se vingar de sua
agressividade. Outra razão apontada foi a de que “precisava experimentar outras pessoas” para testar o seu
amor por Paula: “Só chifro para ver se é dela mesmo que eu gosto”.
Apesar da conivência com o pai, Marcos tem uma forte relação de afeto com a mãe, que, segundo
seus relatos, parece muito com a namorada do ponto de vista comportamental: controladora, possessiva e
agressiva. Ele frequentemente abre mão do que gostaria de fazer quando sua mãe e Paula ficam contrariadas.
Já deixou de sair sozinho várias vezes com seus amigos quando Paula reclamou. Em uma oportunidade,
chegou a negociar a compra de uma motocicleta de um amigo e desistiu do negócio quando sua mãe o
proibiu. Marcos relatou trocar as palavras “amor” por “mãe” e “mãe” por “amor” com muita frequência. Em
algumas dessas vezes, elas, a mãe e a namorada, nem notaram a troca; em outras, brigaram com ele.
Neste caso clínico, o comportamento verbal de Marcos de dizer a Paula que, depois de deixá-la em casa
na sexta à noite, foi direto para casa está sob o controle das consequências apresentadas por Paula a relatos
verbais similares no passado, por exemplo. Porém, ir a uma festa com os amigos depois de deixá-la em casa
na sexta-feira está sob o controle de outras variáveis. Relatar que foi para a festa depois de deixá-la em casa
é um comportamento que provavelmente seria punido, como já ocorreu com Paula e com as demais
namoradas de Marcos no passado. Portanto, relatar com precisão o próprio comportamento de ir à festa com
os amigos é menos provável. O relato não correspondente “fui para casa dormir” é mais provável nessa
situação em função das consequências providas por Paula a relatos como esse no passado.

2) Como é realizada a formulação comportamental para o caso:


Mediante a coleta de dados, a primeira etapa é elencar os comportamentos-alvo, ou seja, aqueles que,
de alguma forma, têm relação direta ou indireta com as queixas/demandas do cliente. Eles podem ocorrer na
sessão de terapia, conhecidos como comportamentos-alvo emitidos, os quais podem ser observados
diretamente pelo psicólogo. Porém, eles também podem não ocorrer na sessão, sendo chamados de
comportamentos-alvo relatados, que são aqueles aos quais o psicólogo tem acesso apenas mediante relato.
Os comportamentos-alvo ainda podem ser classificados como a enfraquecer, ou seja, aqueles cuja
frequência, após a realização da análise funcional, deva ser diminuída como objetivo terapêutico; e como
comportamentos-alvo a fortalecer, isto é, aqueles que devem ter a frequência aumentada como objetivo
terapêutico. Na categoria comportamento a fortalecer, também é possível listar aqueles que ainda não fazem
parte do repertório do cliente. A classificação de comportamentos-alvo a enfraquecer ou a fortalecer leva em
consideração as topografias e as funções do comportamento.
Os objetivos em um tratamento clínico analítico-comportamental envolvem a modificação na frequência,
duração, magnitude, latência e topografia, etc., dos comportamentos-alvo. Esses objetivos só podem ser
definidos após a realização da análise funcional que é parte da formulação comportamental.
A formulação comportamental é uma maneira de organizar as informações de um caso clínico de modo
que permita o acompanhamento e a comunicação com outros profissionais. A formulação comportamental
envolve um conjunto de tópicos que devem ser apresentados: 1. Dados do caso; 2. Queixa; 3. Histórico; 4.
Comportamentos-alvo; 5. Análises funcionais; 6. Propostas de intervenção; 7. Resultados obtidos; e 8.
Conclusões.
Após as primeiras três sessões, é esperado que o psicólogo já seja capaz de elaborar a formulação
comportamental até o quinto tópico. Os demais tópicos serão elaborados após a conclusão do caso ou após
um período que permita observar alguns resultados da intervenção. A parte mais importante de uma
formulação comportamental é a análise funcional dos comportamentos-alvo do cliente. Será apresentada a
seguir a formulação comportamental do caso de Marcos até as análises funcionais.
Dados pessoais: 29 anos; homem; solteiro, porém namorando há três anos; trabalha como funcionário
público; estuda em nível de pós-graduação; reside com os pais.
Queixas: As queixas de Marcos dizem respeito ao seu relacionamento que, segundo ele, não é mais
satisfatório. A despeito disso, o cliente se queixa de não conseguir rompê-lo, temendo as reações da
namorada. As cobranças de sua namorada acerca de uma relação mais estável, como um noivado ou
casamento, também, segundo Marcos, o incomodam. Relata, ainda, desejar ter mais tempo para passar com
os seus amigos e para ter relacionamentos com outras mulheres. Também se queixa do modo como é tratado
pela sua namorada e pela sua mãe, as quais julga agressivas e controladoras.
Dados históricos úteis à análise funcional: Marcos relata um histórico de fracasso em flertar na sua
adolescência, fase na qual se considerava feio e inferior aos demais. Também quanto ao histórico de
relacionamentos afetivos, relatou nunca ter ficado sozinho, de modo que raramente teve um momento de
solteirice entre um namoro e outro. Muitas vezes, Marcos estava envolvido com duas pessoas ao mesmo
tempo, a namorada atual e a que viria a ser sua futura namorada. A relação com seus irmãos e seu pai ilustra
uma condescendência e até incentivo à infidelidade masculina, na medida em que o genitor se gabava
quanto aos casos de traição. Marcos relata que aprendeu a admirar homens promíscuos, sendo, segundo ele,
um indicativo de valor pessoal como homem.
Comportamentos-alvo: Os comportamentos-alvo são aqueles que, de acordo com a análise
funcional, têm relação direta ou indireta com as queixas do cliente; e, caso tenham a sua frequência
alterada após os procedimentos terapêuticos, conclui-se que os objetivos terapêuticos foram atingidos.
No caso de Marcos, foram elencados os seguintes comportamentos-alvo para análise:
Continuar o namoro com Paula. Este comportamento, a despeito de Marcos relatar que gostaria de
deixar de emiti-lo, possui alta frequência, uma vez que ele emitiu poucas respostas que resultassem no
término ao longo dos três anos que está no relacionamento. O comportamento-alvo de continuar a namorar
Paula representa um conjunto de classes de respostas muito amplo e difícil de definir, envolvendo
comportamentos bem diversos, como sair com ela, apresentá-la como namorada, frequentar sua casa, usar
anel de compromisso, manter contato por mídias diversas, fazer planos para o futuro do casal, etc. Todas
essas respostas geram consequências próprias que também afetam a sua ocorrência; entretanto, estamos
agrupando-as aqui na classe continuar a emiti-las resulta em consequências comuns.
Trair. O comportamento de trair tem baixa valoração social, entretanto, não é por isso que foi incluído
como um comportamento-alvo a enfraquecer. No caso de Marcos, o comportamento de trair tem relação,
conforme será descrito na análise funcional, com a baixa probabilidade de ocorrência do comportamento de
terminar o namoro, de modo que possui uma relação indireta com a queixa. O comportamento de trair, no
caso de Marcos, pode ser definido como as respostas de entrar em contato, flertar, beijar e ter relações
sexuais com outras mulheres que não Paula, ocorrendo pelo menos uma vez por semana.
Prevenir a descoberta de traição. Comportamento que ocorre diariamente. Marcos toma diversas
medidas preventivas que resultam na diminuição da chance de seu comportamento de trair ser descoberto,
como apagar mensagens/chamadas de celular, gerenciar com cuidado as redes sociais e frequentar locais
discretos ao trair. Gabar-se para os amigos. Esse comportamento possui alta probabilidade e ocorre
praticamente todas as vezes que Marcos está com os seus amigos, ou seja, uma vez por semana. Pode ser
definido como os relatos
sobre as relações de Marcos com outras mulheres.
Acatar as imposições agressivas de Paula e de sua mãe. Comportamento a enfraquecer, com frequência
semanal. Pode ser definido como se comportar de acordo com as determinações de Paula e de sua mãe,
alterando a sua opinião a partir da argumentação agressiva de ambas. Como exemplo dessa categoria
podemos citar as vezes que Marcos desistiu de sair sozinho com os seus amigos para encontrar Paula ou
abriu mão de comprar uma motocicleta após a proibição da mãe.
Justificar respostas de traição. Comportamento frequente nas sessões de terapia e que pode ser definido
como emitir verbalizações acerca das razões que o levaram a trair, como, por exemplo, “Precisava
experimentar outras pessoas” e “Só chifro para ver se é dela mesmo que eu gosto”. Essas respostas ocorrem
praticamente todas as vezes que o tema traição é abordado em terapia.
Chorar e apresentar fala autodepreciativa diante de questionamentos da psicóloga. Ao ser questionado
acerca das consequências de suas atitudes com relação às mulheres, mais especificamente em relação à
Paula, Marcos começa a chorar e se descrever com adjetivos pejorativos, como “Sou um monstro mesmo”.
Assediar a psicóloga. Esse comportamento pode ser definido como presentear e elogiar a psicóloga, de
forma similar como faz com as demais mulheres com as quais interage. Em todas as sessões esse
comportamento ocorre pelo menos uma vez.
Lapso verbal envolvendo a mãe e a namorada. Marcos, cerca de duas vezes por mês, chama a mãe de
“amor” e Paula de “mãe”.

3) Escolha um dos comportamentos-alvo listados e realize a análise funcional deles, de acordo com as
contingências, conforme esquematizado em aula. Observe que vocês deverão relacionar esses
comportamentos com outros apresentados por Marcos e pelas contingências do ambiente, os quais
explicam que ele continue sendo reforçado a emiti-los.

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