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TURMAS: 91, 92, 93, 10, 12,

PORTUGUÊS
21, 23, 31, 32, 17, 26, 35.
Atividades 2021-1
Professor: Vanda Heberle
1º TRIMESTRE

Data: ____/____/ Nº Nota:


Nome:
2021

Caros estudantes, sejam bem vindos!


Considerando que este será mais um ano atípico de modo geral na vida da humanidade e,
consequentemente, na questão do atendimento aos estudantes, procuraremos atendê-los de modo a
garantir os melhores resultados a partir dos recursos de que dispusermos.

A língua portuguesa, também designada português, é uma língua românica flexiva ocidental


originada no galego-português falado no Reino da Galiza e no norte de Portugal.

Uma reflexão sobre variação linguística em tempos de pandemia a partir de estudos apresentados
por Carlos Eduardo Deoclecio - Doutorando em Estudos de Linguagem na Universidade Federal
Fluminense (UFF), em cotutela na Universidade de Santiago de Compostela (USC), com bolsa pelo
Programa Capes/PrInt. Tem mestrado em Estudos Linguísticos pela Universidade Federal do Espírito
Santo (Ufes), onde também se graduou em Letras/Português. É professor do Instituto Federal do Espírito
Santo (Ifes), Campus Vitória, há 10 anos, onde atua em disciplinas de Linguística, Língua Portuguesa e
Língua Espanhola.

Tarefa: Tomando como base as observações feitas pelo autor, referentes aos telejornais
espanhóis e galego, assista os telejornais brasileiros e faça um comentário apresentando a
sua observação e opinião a respeito do uso masculino e feminino.

“O” Covid-19 ou “A” Covid-19? Fatos linguísticos em tempos de pandemia

A intuição linguística não é um recurso valioso somente para aqueles que lidam
cientificamente com os fatos da língua, os linguistas, como também para os usuários em geral.
Exemplo disso é o tratamento que damos, especialistas ou não, ao gênero gramatical dos
substantivos da língua que crescemos falando ou mesmo de uma língua estrangeira. Em línguas
românicas como o português, o espanhol e o galego, impera a tendência geral de que palavras
terminadas em -o são masculinas, o livro, el libro, o libro, e as terminadas em -a são femininas, a
casa, la casa, a casa, respectivamente. Há, certamente, casos nas línguas que não seguem essa
tendência, pois existem nomes com tais terminações que podem pertencer aos dois gêneros ou
ser de gêneros opostos ao que se espera. Além disso, não vou entrar aqui no pormenor de -o ser
vogal temática e -a ser desinência de gênero, porque não é o objetivo. Por outro lado, os
substantivos terminados em outras vogais e em consoantes podem ser de um ou de outro gênero
— a ponte, el puente, a ponte / o sol, el sol, o sol — ou, ainda, de ambos.

  Voltando à questão da intuição, na região de onde sou, no norte do estado do Espírito


Santo, e acredito que em muitas outras partes do Brasil também, é muito comum ouvir “o alface
de hoje tá murcho”, ou “o couve ficou muito bom”, quando nos dicionários, nas gramáticas e na
escola aprendemos que essas palavras terminadas em -e são femininas. Depois dessa
informação, muitos de nós adotamos o gênero dado como oficial, ou passamos a variar entre uma
forma e outra, ou, ainda, podemos manter o uso anterior ao da escolarização. Um caso
interessante é o da palavra caçula (o/a filho/a mais novo/a), que, apesar de também dicionarizada
como caçulo, conforme o Houaiss e o Aurélio (pressão do uso?), tem sido considerada a forma
padronizada e pode ser empregada para os dois gêneros, sem a alteração da vogal final, com a
mudança do artigo que a antecede: o caçula /a caçula, o filho caçula / a filha caçula. Sou o filho
mais novo dos sete que meus pais tiveram, e minha mãe, com apenas quatro anos de
escolarização, mas dotada de intuição e sentimentos linguísticos como qualquer um de nós,
sempre diz que sou “o caçulo”, porque na cabeça dela o homem é o caçulo, e a mulher é a
caçula.

Fiz essa breve introdução porque, dado o contexto de pandemia que estamos vivendo, tem
me deixado curioso o gênero gramatical atribuído a Covid-19, principalmente nos usos feitos por
órgãos oficiais e imprensa, falada e escrita. Covid-19 é uma sigla em inglês para a doença
causada pelo vírus Sars-CoV-2 (também uma sigla vinda do inglês), que desdobrada significa
Coronavirus disease 2019, isto é, uma doença causada pelo coronavírus descoberto no ano de
2019. No momento, estou na Espanha, mais precisamente na Galiza, em Santiago de
Compostela. Naturalmente, tenho ouvido e lido as notícias sobre o novo vírus e suas “peripécias”
em galego e em espanhol, as duas línguas oficiais da Comunidade galega. Por isso, se tornaram
comuns aos meus ouvidos e olhos as formas o Covid-19 (galego) e el Covid-19 (espanhol),
ambas tratadas como masculinas, portanto.

  Por outro lado, comecei a perceber nos usos vindos do Brasil, principalmente da imprensa,
a forma sendo posta no feminino: a Covid-19. Antes mesmo de investigar o significado
de Covid-19, minha intuição, com um quê de conhecimento especializado, me direcionou para
um possível uso metonímico no Brasil, pois até então eu estava entendendo Covid-19 como o
nome do vírus, não da doença que ele causa (percebo que muita gente ainda entende dessa
forma). Feitas as devidas verificações, a adoção do feminino pela mídia brasileira, como o Grupo
Globo e a Folha de S.Paulo, entre outros, se justificava pelo entendimento do “d” de Covid, ou
seja, disease em inglês, doença (palavra feminina) em português.

  Fato é que aqui na Espanha, a Real Academia de la Lengua (RAE), por tradição e poder,
costuma se manifestar quando surgem novidades na língua como a que estou comentando. Por
meio do Twitter, um internauta dirigiu a seguinte pergunta à RAE: “Es ‘la Covid-19’ o el
“Covid-19?”. Num primeiro momento, a manifestação da instituição foi a de indicar que o
emprego no feminino seria o correto, tendo em vista o mesmo entendimento que provavelmente
ocorreu no Brasil: se disease é enfermedad (palavra feminina), então “la Covid-19”. Entretanto,
pelos canais de comunicação da RAE, chegaram muitos comentários em discordância desse
posicionamento. Em função disso, outra resposta veio (e que pode ser encontrada ao lado de
outros dados no seguinte endereço
eletrônico: https://www.rae.es/noticias/crisis-del-covid-19-sobre-la-escritura-de-coronavirus): “O
acrônimo Covid-19 que dá nome à doença causada pelo vírus Sars-CoV-2 é usado normalmente
no masculino (el Covid-19) por influência do gênero de coronavírus e de outras doenças virais (o
ebola), que pegam por metonímia o nome do vírus que as causa. Mesmo que o uso no feminino
(la Covid-19) se justifique por ser doença (disease, em inglês) o núcleo do acrônimo
(COronaVIrus Disease), o uso majoritário no masculino, pelas razões expostas, é considerado
totalmente válido” (tradução e adaptação minhas). No final das contas, está legitimado o uso
masculino por quem costuma legislar sobre a língua espanhola, embora já se pudesse ouvir e ler
por aqui em espanhol o emprego feminino assim que a RAE promoveu a primeira manifestação.

  Interessante observar que nem a Real Academia Galega (RAG) nem a Academia Brasileira
de Letras (ABL) se manifestaram a esse respeito — o que não é bom nem ruim, penso, mas
apenas uma constatação. Acredito, inclusive, que no caso da ABL não há nenhuma expectativa
sobre isso, tendo em vista seu histórico de pouca ou nenhuma ingerência na normatização
linguística do português brasileiro. Notável, no entanto, é que numa visita à página da ABL
(http://www.academia.org.br/noticias/), podemos encontrar o emprego no masculino:  “ABL lança
ações culturais de enfrentamento ao isolamento social provocado pelo COVID-19”.  

Retorno, pois, à intuição linguística. Algo além do metonímico parece estar em jogo nesses
usos. Parece haver uma tendência geral nas três línguas para o masculino que pode estar
atrelada à forma em si: a finalização em consoante (d) e, em seguida, a presença de um numeral
(19). A pronúncia do português brasileiro, de forma geral, acrescenta a vogal [i] após o “d”.
Mesmo assim, sua presença não pode ser considerada decisiva, já que não faz parte do grupo da
tendência geral de -o para masculino e -a para feminino. Seria então a força do numeral que
indica tal tendência? A isso só um aprofundamento na questão poderia responder. 

Mas é interessante como os apresentadores de telejornal e os repórteres em chamadas ao


vivo na televisão brasileira tendem a usar o masculino quando estão em situação de fala menos
monitorada. Se leem o teleprompter, temos o feminino convencionado (a Covid-19); se se
manifestam com algo de espontaneidade, tende a emergir o masculino (o Covid-19) ou a
variação entre os gêneros. Nos telejornais espanhóis e galegos, tanto na leitura como na fala
(mais) espontânea predomina o masculino (tendência natural), com um ou outro raro uso no
feminino (força normatizadora). 
Por ora, é essa a reflexão.

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