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Sobre a musicalidade e expressão preta.

O que é música de preto? Faz alguns anos que eu fui interpelado por um amigo, dos tempos de
escola, nos quais eu me dedicava quase que exclusivamente a ouvir rock... “Porque eu tava
escutando, postando e falando só sobre música de preto? ”.

Parei para pensar e tentar descobrir qual seria o fundamento desse processo de divisão da
música e sobre o real significado que havia por traz daquela fala.

Evidentemente, a musicalidade afro, seja nos EUA, América Central e na América do Sul é
predominante. Desde os primeiros cantos das lavouras que nas terras gringas deram origem ao
blues e nas terras tupiniquins aos batuques e sambas, a influência da musicalidade afro nos
mais diversos ramos da arte musical, é inegável.

Nomes como Louis Armstrong, Dillie Gillispie, Miles Davis, no Jazz, BB King, Aretha Franklin, no
Blues, Litte Richard, Chuck Berry, Mama Rosseta no Rock N Roll, passando pelas influencias da
cultura hip hop, com Tupac, Coolio, chegando nos nossos ouvidos e sentimentos tupiniquins,
no choro de Pixinguinha, no samba de Cartola e Dicró, no batuque do Olodum, nas rimas e
reflexões do Rap nacional, com Racionais MC’s, alcançando os patamares nacionais com o
samba pop do Seu Jorge.

A musicalidade afro, já está entranhada no nosso cotidiano, mas para além disso, o
preconceito também está entranhado em nosso estranhamento cotidiano com a musicalidade
vinda e relacionada diretamente com o sofrimento, a exclusão e o racismo, velado ou explicito.

Little Richard, precursor do rock nos EUA, negro, gay, estrela do rock, entrava para fazer os
shows pelos fundos, pois as casas de shows não permitiam negros. Foi designado ao segundo
lugar, pois a mídia preferiu o caucasiano Elvis, que tem músicas muito boas, mas não chega aos
pés da genialidade dos músicos pretos.

O Brasil vive um momento parecido com o dos EUA nos anos 50, dentre os hits mais populares,
estão o FUNK e o RAP (acho que o certo seria TRAP, mas realmente eu não sei a diferença).
Porém, o mais interessante desse fenômeno é perceber que, muito dessa musicalidade
anteriormente banalizada e segregada nas comunidades periféricas, alcançou os condomínios
de luxo e o mundo.

Mas o que isso pode nos ensinar? Primeiro percebemos que o processo da indústria musical,
continuamente vai buscar meios de explorar todos os elementos, da maneira mais absurda
possível sempre se aproveitando dos meios e momentos.

Mas pessoalmente, minha jornada com a musicalidade afro é antiga. Desde o samba e do rap,
passei pelo pagode da adolescência, chegando ao refinamento do jazz e do blues.

Já havia refletido sobre as mazelas da periferia, junto com as letras do Racionais MC’s, Xis,
Criolo, também compreendi a realidade do mangue com Chico Science, então de maneira geral
já ouvia a musicalidade afro, porém com o tempo consegui refinar e compreender o impacto
social da mensagem da musica afro.

Mas nada assemelha – se a musicalidade que conheci a alguns poucos anos atrás,
naturalmente levado pela descoberta pessoal da minha ancestralidade através dos meus
estudos sobre o candomblé e da umbanda.
A partir disso, compreendi sobre a forma como os orixás e espíritos ancestrais nos ajudam e
falam conosco diretamente das músicas que se apresentam pelos interpretes devotos. Então
quando escuto as interpretações de Baco Exu do Blues, sinto a influência musical de Esú,
quando ouço Djonga cantando, sinto a força e a influência de Ogum nas letras.

Da mesma forma como anteriormente, pude compreender melhor meu caminho, ao


compreender os sons e ritmos afro na América, que foram trazidos pelos meus ancestrais. É
um caminho pessoal, onde consegui compreender minha personalidade e a minha
ancestralidade, vindas das longínquas terras da África.

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