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1) Título: Nietzsche e os deuses.

2) Objetivo:

Quando anunciamos Nietzsche em relação com os deuses, estando estes no plural,


estamos evocando a multiplicidade o os diversos aspectos da divindade na obra deste.
Em geral, ouvimos a sentença da “morte de Deus” ao longo do pensamento do filósofo,
e acreditamos que ele está a se debater com um deus monocrático da tradição bíblica.
Com mais atenção, veremos que a sua menção é mais ampla, pois esse “além” a que faz
referência a expressão nietzschiana, quer dizer que toda a expectativa implícita nesta,
está em superar este momento crucial na história da humanidade e estabelecer uma
situação de “transvalorazação dos valores”. E ainda mais, ampliando o espectro desse
aspecto da divindade na obra de Nietzsche, encontraremos outros momentos
importantes em que Deus deverá ser interpretado de alguma forma, como quando da
exaltação do deus grego Dionísio já no primeiro de seus trabalhos, e também do Deus
cristão com seus valores reativos, fartamente elaborado em “O Anticristo”. É nosso
objetivo, portanto, resgatar esses sentidos todos que a figura de Deus vem assumir ao
longo de toda a obra de Nietzsche. Não tanto com um olhar teológico, quanto no sentido
de acompanhar a atitude crítica do autor em questão, procurando analisar suas posições,
tendo em vista sua perspectiva principal que é a da afirmação da vida antes de tudo.

Essa tendência pluriteísta apresentada por Nietzsche no decorrer de seus trabalhos se


inicia já em sua primeira obra “O Nascimento da tragédia”, onde Apolo e Dionísio se
alternam, contradizem-se e por fim, harmonizam-se a fim de comporem a obra de arte
que foi a tragédia. Cabe destacar que Dionísio cumprirá um papel mais relevante, indo
sustentar a sua presença para além deste momento puramente grego. Dionísio, o deus
extático do riso e da embriaguez, representará muito do espírito libertador e afirmador
que Nietzsche irá contrapor ao espírito de gravidade e de negação sustentado pela moral
cristã e seu aspecto em tudo niilista. Cabe ressaltar que este Deus cristão é também o
Deus dos idealistas, dos metafísicos e dos filósofos.

Seguindo esta pista do cristianismo, daremos na famosa afirmação nietzschiana de que o


cristianismo é um platonismo para o povo. A chave, pois, para a interpretação desta
“morte de Deus” poderá ser encontrada nessa implicância de Nietzsche com o
platonismo desde seus primórdios, com seu estabelecimento crucial dos dois mundos na
realidade, com o valor que irá dispor no “além” desde o início. A partir dessa
constatação, a “morte de Deus” irá ganhar múltiplas formas de interpretação e de
relação com vários aspectos do pensamento e da realidade. Assim, será também nosso
objetivo descortinar diversos outros temas da filosofia nietzschiana que se encontram
estritamente relacionadas ao fato da “morte de Deus”. São eles o niilismo, a vontade de
poder, a questão moral, o eterno retorno, o super-homem, e mais algum outro.

De tudo o que foi dito, cabe-nos reforçar exatamente um aspecto essencial dessa
presença de Deus no pensamento nietzschiano explícita na expressão da “morte de
Deus”. Trata-se da metafísica e do plano traçado para esta desde a estrutura dualista
intrínseca à filosofia de Platão. Será nosso objetivo explorar essa relação entre o
pensamento platônico, desde a antiguidade até o momento moderno, propriamente o
tempo de Nietzsche, e o aspecto moral a este subjacente. Nietzsche anunciar-se-á como
aquele filósofo único a poder declarar o fim da metafísica. Nesse sentido, Heidegger
dirá que este aspecto “anti” em relação à metafísica, coloca exatamente o filósofo da
“filosofia do martelo” numa posição claramente de dependência a esse pensamento da
dualidade.

E de todos os temas por nós anunciados da filosofia nietzschiana, cabe-nos ressaltar um


deles em especial, que é a questão do niilismo. Vivemos em um mundo, em uma
cultura, em uma realidade niilista, e o diagnóstico de Nietzsche vem desde a instauração
do platonismo até os nossos dias. E por que não dizer que o niilismo somente se
instaurou no momento no enorme vazio que Deus morto nos deixou? Exatamente
porque o pensamento metafísico, enquanto um afirmador do além-mundo, supõe já uma
negação da vida. Mas com a morte de Deus, o niilismo torna-se um momento único na
história do ocidente, pela “desvalorização de todos os valores” produzida por este
evento. Pretendemos realçar o empenho de Nietzsche em valorizar todos os aspectos
contrários ou neutralizantes deste sentido niilista que a tradição metafísica instaurou ao
longo de todos esses séculos, seja na afirmação da vida e da terra em primeiro lugar,
seja na ênfase da dimensão dionisíaca da realidade, seja também ressaltando o aspecto
da moral do forte antes de tudo. De tantos deuses cabe a Nietzsche exaltar a vida em
primeiro lugar e acima de tudo. Viva a imanência!
3) Justificativa:

Afinal, cabe-nos perguntar, qual a principal justificativa em apresentar um tema já


tantas vezes repetido quanto a relação entre Nietzsche e algum aspecto da
divindade? Em especial, a sentença de “Deus está morto” tornou-se lugar comum
para todo estudante de filosofia que irá se debruçar sobre o pensamento
nietzschiano. E é exatamente por isso, por essa presença tão marcante da figura de
Deus neste filósofo tão pouco religioso, que entendemos ser tão importante
estudarmos essa ênfase e essa aparente contradição.

E porque sabemos que, para além da presença de Deus na realidade, é seu aspecto
metafísico e dual, que justificarão nosso interesse nesse estudo, uma vez que, desde
Nietzsche, uma série de outros filósofos contemporâneos se debruçaram sobre esse
aspecto da filosofia nietzschiana, seja no aspecto da superação de um pensamento
reativo, seja no empenho em delimitar o niilismo para neutralizá-lo.

Levaremos a sério Heidegger e a sua afirmação de que Nietzsche e sua filosofia,


enquanto mera contramovimento, permanece preso à essência disso contra o qual se
volta. Nesse caso, essa filosofia de afirmação não seria senão um irremediável
enredamento na metafísica. Mas também, Heidegger valoriza em Nietzsche o que
em sua filosofia determina o ente em sua essência como “vontade de poder”.
Assim, vontade de poder, devir, vida e Ser no sentido mais amplo significam na
linguagem nietzschiana o mesmo. Aqui está todo o esforço no pensamento de
Nietzsche de estabelecer um valor, uma “transvaloração de todos os valores. Não
cabe apenas exconjurar o niilismo implícito na sentença da “morte de Deus”, deve-
se estabelecer novos critérios de estar na realidade para além de seus valores
supremos e morais.

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