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1 A origem da folia de reis na tradição oral: Formatado

2 variações de um (do) mito [IM1] Comentário: Colocar o NOME


DO AUTOR DO ARTIGO e um pé de
3 página com dados biográficos sobre ele. A
exemplo do artigo de Walter Boechat.
4 “Um mito diz respeito sempre a acontecimentos passados:
5 ‘antes da criação do mundo’, ou ‘durante os primeiros
6 tempos’, em todo caso ‘faz muito tempo’. Mas o valor
7 intrínseco atribuído ao mito provém de que estes
8 acontecimentos, que decorrem supostamente de um
9 momento do tempo, formam também uma estrutura
10 permanente. Esta se relaciona simultaneamente ao passado,
11 ao presente e ao futuro.” (Levi-Strauss, 1975, p.:241)
12
13 No “sertão” norte-mineiro, nas beiras do São Francisco, nos municípios de
14 Januária, Chapada Gaúcha e São Francisco, muitas são as manifestações tradicionais
15 populares: boi de reis, dança de São Gonçalo, folias, reis dos cacetes, reis das pastorinhas
16 e batuques são algumas das principais modalidades de expressão da cultura popular
17 encontradas nessa região. Desse vasto manancial de festas, danças e brincadeiras
18 populares, pela sua capacidade de mobilizar e relacionar pessoas, santos, objetos e
19 símbolos, certamente se destacam as folias – que na região pesquisada são muitas e
20 acontecem diversas vezes ao longo de um ano. Acompanhando o calendário católico,
21 especialmente em torno dos dias de Santos Reis (6 de janeiro), São Sebastião (20 de
22 janeiro), São José (19 de março), Bom Jesus (6 de agosto), Nossa Senhora Aparecida (12
23 de outubro), Santa Luzia (13 de dezembro), é comum encontrarmos, nas roças e cidades,
24 grupos de cantadores e tocadores (foliões), realizando um giro ritual.
25 Organizado quase sempre com o intuito de se cumprir uma promessa, o giro da
26 folia implica a movimentação e a circulação desse grupo ritual por um território, durante
27 dias e noites, com vistas a executar um plano de visitações às casas dos moradores, assim
28 como a igrejas, cemitérios, currais e roças. O território sagrado construído na folia
29 começa e termina em uma casa especial e destacada: a casa dos imperadores, como são
30 chamados os donos da promessa, organizadores e promotores do giro. É de tal lugar que
31 os foliões fazem a saída, e, depois de dias, a chegada, ocasião em que acontecem os
32 festejos que comemoram o dia do santo e o pagamento da promessa.
33 Um dos preceitos dos giros das folias na região pesquisada, em especial as que
34 saem na roça, onde as distâncias entre as moradias são maiores, é que eles aconteçam,
35 sempre, no sentido do Oriente ao Ocidente. Outro ée que os foliões visitem todas as casas
1 por onde passarem. Podemos, assim, imaginar os giros de folia construindo, ao redor de
2 um centro – representado pela casa dos imperadores, local da abertura e enceramento do
3 ciclo ritual –, um tempo-espaço sagrado: “um espaço camponês simbolicamente
4 estabelecido durante um período de tempo igualmente ritualizado, para efeitos de
5 circulação de dádivas – bens e serviços – entre um grupo precatório e moradores do
6 território por onde ele circula” (Brandão, 1981, p. 36).1.
7 Quando visita a casa de um devoto, de uma família, a folia não apenas conduz
8 foliões e acompanhantes, mas também o santo, que passa a se relacionar com as pessoas –
9 é tocado e beijado. Diante dele se reza, se pede e se canta; na ausência dele se come, se
10 bebe e se dança. Através de sua presença, os foliões abençoam os moradores, que em
11 troca oferecem comidas e bebidas, consumidas na visita, assim como donativos (ofertas
12 de alimentos, bebidas, dinheiro e outros bens), usados na realização dos festejos de seu
13 dia.
14 Na região, embora existam folias para muitos santos, a folia de reis é considerada a
15 principal e primeira, fundamento e modelo para as demais. Para os foliões, sua origem
16 remonta ao nascimento de Jesus e à viagem e adoração dos três reis magos. Esses
17 eventos, de acordo com os relatos dos foliões, teriam acontecido há muito tempo,
18 “durante os primeiros tempos” (Levi-Strauss, 1975) – no princípio do mundo: “a folia de
19 reis é muito antiga, ela veio do princípio do mundo” ou “a folia de reis não foi ninguém
20 que inventou não, já as outras folias foram inventadas”.
21 As estórias sobre a origem do ritual, ao tempo em que narram acontecimentos de
22 um passado longínquo e indefinido, estabelecem continuidades entre essa temporalidade
23 primeira e os giros rituais das folias, do passado (tempo dos antigos foliões), presente e
24 futuro. Seguindo essas pistas, neste texto miro as narrativas sobre a origem do ritual com
25 o olhar direcionado para determinados objetos, personagens, comportamentos e relações
26 que são mobilizados como mediadores entre a viagem mítica dos reis e os giros dos
27 foliões. No fundo meu interesse é descrever como se estabelecem as passagens entre mito

1
O antropólogo Carlos Rodrigues Brandão, em grande medida, inaugura a reflexão antropológica sobre a
folia, sendo referência na constituição desse campo de estudos, cuja vitalidade pode ser notada na produção
recente de um conjunto significativo de trabalhos etnográficos, realizados em diferentes contextos e
partindo de problemáticas distintas. Sem pretender esgotar essa produção bibliográfica, menciono, a quem
interessar, as seguintes monografias: Monte-Mór (1992), Frade (1996), Reily (2002), Pereira (2004 e
2012), Mendes (2005), Bitter (2010), além dos meus próprios trabalhos (Chaves, 2003 e2009).

2
1 e rito, como essas realidades estão mutuamente implicadas, conforme já havia notado
2 Leach (1996). A presente discussão será encaminhada a partir da transcrição e análise de
3 três narrativas: duas de guias ou cabeças de folia, moradores de áreas rurais do município
4 de Chapada Gaúcha, situado no norte/noroeste de Minas Gerais, e a versão bíblica,
5 presente no evangelho de Mateus capítulo 2, versículos 1-22.2. Todas as versões, com a
6 exceção desta última, foram relatadas em resposta a minha indagação sobre a origem do
7 ritual.
8
9 O mito de origem da folia em três versões
10 Embora disponha de material mais extenso, apresentado em outra ocasião
11 (Chaves, 2009), trabalho aqui com um universo de três variantes, incluindo a bíblica. As
12 narrativas foram por mim registradas em gravador de áudio e posteriormente transcritas e
13 analisadas. Para facilitar a leitura, primeiramente transcrevo as versões em separado, e,
14 em seguida, analiso-as em conjunto, estruturando minha apresentação a partir da estória
15 como se conta, que em linhas gerais segue uma sequência de quatro fases: “anunciação”,
16 “viagem”, “visita” e “volta”.
17
18 Versão 1. Jonas Ribeiro
19
20 “A folia começou por uma história. Não tinha folia não. A folia foi criada Formatado: Fonte: Itálico
21 assim: no dia que Jesus nasceu – vou fazer um começo e sai lá viu? – os
22 três reis magos foi visitar. Eles tinha um raciocínio que esse menino ia
23 nascer. É igual essa lei nossa, que nós tamo hoje, que Jesus ia voltar na
24 terra um dia. Muitos não acreditam, muitos acreditam. Fica no sonho, e
25 essa história é que ia nascer outro Deus, que é o Pai Eterno, ia nascer o
26 filho dele pra governar o mundo. E aí ninguém acreditava, só os três reis
27 magos que acreditava, porque um anjo avisou, avisou eles que ia nascer
28 outro rei, que eles era rei, todos três era rei, era da África, outro do
29 Oriente e outro do Portugal. Aí eles tinha aquela fé viva, eles fizeram a
30 doutrina, eles era católico, que nascia, aí o anjo avisou eles, no sonho,
31 que ia nascer um lá, o outro lá e outro lá, e ninguém não sabia do outro.
32 Eles teve esse aviso pelo sonho, aí ninguém sabia onde Jesus ia nascer, o
33 anjo foi na Maria, na Maria, avisou: “Ó Maria, você vai ser concebida
34 pelo Espírito Santo, você vai ser a mãe de Deus”. Aí a Maria: “Uai,
35 muito bem, de Deus seja a vontade de eu ser a mãe de Deus”. Ela era
36 moça, virgem, né? Aí só falou assim pra ela. Aí naquele encanto ela
37 purificou aquele encanto, a Maria ficou grávida de Jesus, em Belém. Aí

2
Cabeça ou guia são termos que se referem à principal liderança da equipe (ou terno), especialista ritual
dos cantos e em alguns casos também responsável pelo disciplinamento e controle da conduta dos foliões
durante o giro.

3
1 conseguiu ela ganhar o neném, ganhou, o dia que ela, vinte cinco de
2 dezembro, ela ganhou o menino, deu luz a Deus, no campo, nasceu no
3 campo. Aí o anjo foi lá e avisou aos três reis magos que Jesus era
4 nascido em Belém. Eles tinha aquela fé: “E como é que eu vou lá?” “Vou
5 dar um sinal pra vocês, vai brilhar uma estrela, vocês segue pela
6 estrela!”. Era obra do Espírito Santo. Aí quando anoiteceu o dia que
7 Jesus nasceu a estrela brilhou, diferente. Eles tinha aquela mentalidade e
8 seguiu pela estrela, todos três, um seguiu de cá, outro de lá, outro de cá.
9 De cada estado veio um, veio um do Rio de Janeiro, outro de São Paulo e
10 outro de Goiás, e todos no rumo de Belém, pela estrela, ninguém sabia de
11 nada e foi, foi, quando chegou pertinho de Belém, ajuntaram os três.
12 Chegou numa cidade encontrou todos o três. “Pra onde é que você vai?”.
13 “Eu vou pra Belém, e você?”. “Eu vou pra Belém”. Tudo coroado,
14 espantou um do outro. “Vai fazer o quêe?”. “É que lá nasceu o menino
15 Deus, eu tenho um aviso pelo anjo.”. “Ah, eu também tenho. Como é que
16 chama o anjo?”. “Chama anjo Gabriel.”. “Ah, pois é, eu também tive o
17 aviso pelo anjo Gabriel.”. E seguiram os três reis junto, né? Quando
18 chegou lá Maria tava com o menino lá, em Belém. Foi pegando os
19 endereço, né? Como você pegou o endereço de seu Jonas e chegou aqui,
20 ele pegou o endereço de Maria e José, que eles era um casal. Aí
21 ensinaram a estrada a eles e foram, até chegou lá e visitou Maria com o
22 menino, já era criança. Nem a Maria não sabia que ele era Deus, a mãe
23 dele. Aí eles chegou e adorou o menino. Aí fez a oração e entregou os
24 presentes pro menino. Eu também recebi um presente agora, recebi dois
25 presente. Eles foi sem a toalha e voltou com a toalha. Eles não tinha, aí
26 quando ele chegou lá que visitou o menino, Maria era uma mulher muito
27 pobrezinha, a família mais pobre lá de Roma, né? Aí ele levou três
28 presentes: um levou incenso, outro levou mirra e outro levou ouro. Agora
29 ninguém sabe como é que é esses presentes. Deve ser que nem aquelas
30 joóias de ouro, né? Taça, levou uma taça pro menino Deus. O bicho era
31 rico demais. Entregou à mãe dele, a Maria. Maria ficou até sem graça.
32 “Eu não tenho nada pra dar a vocês.”. “Não, não precisa de nada não,
33 nós somos rico, nós somos rei.”. “Ah, não, vocês tem que levar um
34 presentinho também.”. Aíi a Maria, pobrezinha, menino, só tinha ela, o
35 marido e o filho. Nem casa eles não tinha, eles tavam num ranchinho, que
36 eles era pobre, pobre. Aí ela ficou apaixonada, pegou um manto, que ela
37 tinha um manto, ela tinha as roupa, né? Aí o manto ela deu pra eles, o
38 manto é tipo uma coberta, você sabe o que é ele, né? Um pano muito
39 bonito. Aí deu pra eles. “Ah, Maria, não quero não, o que é que nós faz
40 com esse manto?” Aí uma força que Deus deu. “Ah, nós é três, a não ser
41 se corta ele, e cada um leva uma tira, pr`ocês mostrar.”. “Como é que
42 nós leva essa tira?” “Vocês bota no pescoço, isso aíi é a divisa, porque
43 esse manto só quem tem é eu, ninguém tem.”. O manto tudo letrado,
44 Jesus do Nazaré. Aí eles saiu com essa toalha no pescoço, que nem nós.
45 Eles voltou com essa toalha, e o povo viram, né? Aí foi fazer igual eles,
46 como eu tô falando, aí os caras arranjou uns panos velho e fez a toalha.
47 Aí eles: “Ó Maria, vamo fazer o seguinte, você deu esse presente mas eu
48 não preciso dos presentes, nós somo ricos, os presentes eu vou deixando
49 aí pro povo aí. Os presentes eu vou dá, com a força de Deus, eu não
50 preciso de presentes não que nós tem.”. Como é que o rei precisa de
51 presente, o governo, o governo tem que mandar pra nós. Aí essa força

4
1 ficou entre nós, esses presentes, ele deu aquela força. Ele tinha aquela fé,
2 aí voltou os três reis magos fez a união lá, conversou mais o pessoal da
3 cidade, igual você ta aqui mais nós, conversou aí contou as histórias que
4 foi assim foi assim, que Jesus nasceu. Aí fizeram as visitas deles e voltou
5 pra trás, foram embora. Aí chegou logo, já era vespando o dia seis de
6 janeiro, aí eles saiu das casas dele em dezembro, acho que dia vinte e
7 sete de dezembro eles viajou, quando foi no dia seis de janeiro ele chegou
8 naquele ponto que eles encontrou. Chegou lá eles fizeram a festa. Eles
9 tinha dinheiro, né? Compraram material e coisa, fez umas festa de
10 alegria, que visitou o menino Deus. Aí fizeram aquela festa mais bonita,
11 deu de comer a todo mundo, comprou carne, comprou bebida, deu ao
12 povo. Festa bonita, mandou chamar os vizinhos, dançaram e cantaram,
13 que eles tem as músicas deles, né? E cada um cantou uma música. Cada
14 um fez uma música, fez uma da África, outra do Portugal e outra do
15 Oriente. Aí introduziu as músicas, e eles acharam bonito demais, que lá
16 não tinha essas músicas. Igual você tá levando essas músicas nossas, que
17 lá não tem não. Aí o povo invocou com aquilo. Dançaram, um dançou no
18 sistema de Portugal, outro no sistema do Oriente e outro no sistema da
19 África. Aí no dia sete, deram a despedida e foram embora. Apartaram
20 eles no mesmo ponto”. (Relato concedido e gravado no dia 10dez de janeiro de
21 2006, em sua casa, no Ribeirão de Areia, município de Chapada Gaúcha.)
22
23 Versão 2. Guilherme
24
25 O negócio da folia é isso: porque os três reis magos é assim, umas Formatado: Fonte: Itálico
26 pessoa, que não é do comando assim, de quando existisse o menino Deus.
27 É naquele comando do Pai Eterno, no causo. Agora aquele comando
28 deveria ser assim: no causo dos apóstolos, como é aquele Noel levou o
29 pessoal do outro mundo, levou algumas pessoas que ficou. Foi pouquinho
30 que ficou, né? Aí daqueles poucos que ficou, é como seja os apóstolos de,
31 de Jesus e esses seria umas pessoas assim gente, mas gente que assim,
32 que amanhã eles tinham uma possibilidade de ser santificado, mas ainda
33 não existia o menino Deus. Porque é depois do pai eterno que veio o
34 menino Deus, procedido pelo Divino Espírito Santo. Veio Maria
35 Santíssima, que é esposa de José. Mas esposa assim porque coloca em
36 essa prática, mas não é uma mulher assim, igualmente nós que tem a
37 nossa mulher aí que são, aí já é diferente. Bom, aí com esse causo, aí
38 surgiu o nascimento de menino Deus. Quando surgiu o nascimento de
39 menino Deus, já existia, no causo, essas pessoas que deveria ser os
40 apóstolos e depois ser uma pessoa que podia santificar. Aí surgiu, os
41 inocentes já existia, aí surgiu os três reis. Os três reis, ele era rei da
42 mata, rei do gado. Quer dizer que ele era rei dos inocentes e rei da
43 floresta. Quer dizer que a medicina dos três reis é cuidar dos inocentes,
44 no causo. Seria como se você tem uma fazenda e você ter aquelas rês que
45 você cria, você comandar aquilo lá, você quem resolver. Então os três
46 reis era isso. Aí quando vem a notícia de menino Deus, que iria nascer
47 esse menino para ser o rei de tudo. Aí os três reis teve a notícia, aí eles
48 ficou ansioso pra saber daquele menino. Aí surgiu o anjo da guarda, o
49 anjo São Gabriel entre eles. Surgiu o anjo São Gabriel e surgiu a estrela
50 guia. Aí os três reis morava em Ooriente. Aí naquela, quando eles soube
51 que nasceu aquele menino, eles não sabia, não tinha certeza. Soube que

5
1 tinha nascido aquele menino, aí eles prometeu, que se eles chegassem
2 com o adjutório do mesmo menino que ia ser o rei, eles chegasse naquela
3 conclusão de conhecer, eles ia levar os presente e saudar menino Deus,
4 no causo, e prometeu uma ladainha, como se eles encontrassem o menino
5 Deus, pra eles ter a certeza, eles prometeram de rezar, festejar e rezar
6 uma ladainha pra menino Deus. Aí os três reis pega, sai. O Anjo São
7 Gabriel, os três reis e a estrela da guia, apontando pra onde o menino
8 tinha nascido, em Belém. Aí o anjo São Gabriel e os três reis
9 acompanhando, e a estrela apontando e o anjo São Gabriel apontando
10 também, pra ir lá aonde o menino nasceu. Aí saiu, nessa viagem.
11 Cortaram ... a viagem era pra fazer de um ano, aí eles viajou, mas como
12 os poderes são grandes né? Quando, na viagem que eles fizeram,
13 arriaram os camelos, viajaram, o anjo da guarda apontando, e eles é vai.
14 Como eles é inocente, chegou numa cidade. Eles achou que aquela
15 cidade deveria ser a que o menino tinha nascido, né? Tomou a porta, era
16 o Herodes que morava. E já o Herodes tinha notícia também que o
17 menino tinha nascido e que ia ser o rei, e o Herodes queria ser o rei, não
18 é? Então ele queria saber que o menino tinha nascido, pra ele perseguir,
19 pra matar porque ele que queria ser o rei. Ao os três reis como não
20 sabia, eles foi e tomou a porta dele, e procurou pra ele, a estrada que ia
21 onde o menino Deus tinha nascido. Aí virou pra eles e perguntou: “quem
22 é vocês, quem vocês são?”. Os três reis falou: “É, nós somos os três reis,
23 e todos três somos irmãos”. Mas era os três magro, que eles era uns
24 homem magrinho. Aí falou: “Nós somos os três reis, e todos três somos
25 irmãos”. Aí ele foi e falou pra eles, perguntou eles se o menino era
26 nascido, se era nascido o messias. Eles respondeu para ele que ainda não
27 sabia. Aí os três foi e manjou, isso aqui já errado, isso aqui já tem causo
28 que não é pra nós. Aí os três reis foi e pediu licença: “Dá licença rei
29 Herodes, que nós queremos viajar, pela fé que nóos temos, nós havemos
30 de encontrar”, que eles tinham que encontrar menino Deus, né? Aí ele foi
31 e falou pra eles: (Guilherme faz silêncio por alguns segundos e
32 continua): É. “Quando vocês for, de volta por aqui torna a passar,
33 conforme for as suas visitas, eu também quero visitar.”. Mas aí os três
34 reis já manjou que o trem não era o certo. Até que chegou aonde tava o
35 menino Deus. Chegou lá já tinha sido visitado pelos inocentes, que ele já
36 nasceu na manjedoura aonde tavam os inocentes (é o boi, o carneiro, o
37 jumento, o galo). Aí os três reis chegou, os inocentes já tinham visitado
38 ele. Aí os três chegou, também, para visitar, um ofertou. O primeiro
39 ofertou incenso, que era rei Brexó. O segundo ofertou ouro, que era rei
40 Gaspar. O terceiro ofertou mirra, que era Baltazar, pra menino Deus
41 mirar. Aí visitaram, ofertou os presentes pra o menino Deus, ele
42 arrecebeu, abençoou os presentes deles. Aí eles teve a certeza de que o
43 menino era nascido. Que eles viu ele, saudô e tudo, teve aquela certeza
44 que ele era nascido. Os outros apóstolos de Jesus, que tinha, não sabia
45 que era nascido. Aí dessa visitada que eles visitou ele, aí eles voltou pra
46 cumprir a promessa que eles tinha prometido, que se avistasse o menino
47 Deus e tivesse a certeza, eles prometeu uma ladainha pra rezar pro
48 menino Deus, se encontrasse com ele. Aí já eles voltou pra trás pra rezar
49 essa ladainha que eles tinha prometido, de festejar e rezar. Voltou, pra ir
50 festejar em Ooriente, mas, como a viagem era muito grande, eles voltou
51 fazendo a visita, pedindo as avista pra trás, cantando, pedindo aquelas

6
1 avistas como o menino era nascido e voltou, aquelas avistas, todo lugar
2 que eles cantava, cantava pedindo as avistas que ele era nascido, e tinha
3 a certeza. Quando chegou no dia que era de festejar, que era o dia seis
4 de janeiro, aí não deu para alcançar o Ooriente. Aí eles pegou e festejou
5 debaixo de uma árvore, fez a festa e rezou a ladainha que era o que eles
6 tinham prometido pro menino Deus. Rezou essa ladainha, festejou e
7 rezou, aí agora eles foram pro Ooriente, foram embora pro Ooriente”.
8 (Relato concedido e gravado no dia 14quatorze de janeiro de 2006, na casa do
9 folião, no Galheiro, localidade que pertence à região da Catarina, município de Formatado: Fonte: Não Itálico
10 Chapada Gaúcha.)
11 Formatado: Fonte: Itálico
12 Versão 3. Mateus
13
14 Tendo, pois, Jesus nascido em Belém da Judá, no tempo do rei Herodes, Formatado: Fonte: Itálico
15 eis que do Oriente vieram magos a Jerusalém e perguntaram: ‘‘onde está
16 o recém-nascido rei dos Judeus? Pois vimos a sua estrela no Oriente e
17 viemos adorá-lo’’. Ao ouvir isso, perturbou-se o rei Herodes e, com ele,
18 toda Jerusalém. Tendo reunido todos os Sumos Sacerdotes e escribas do
19 povo, indagava deles onde Cristo deveria nascer. “‘Em Belém de Judá”’,
20 respondiam eles, pois assim foi escrito pelo profeta: “‘E tu, Belém, terra
21 de Judá, não és o menor entre os clãs de Judá; porque é de ti que há de
22 sair o chefe, que há de pastorear o meu povo, Israel”’. Então, Herodes
23 chamou ocultamente os magos, inquiriu deles o tempo exato do
24 aparecimento da estrela, e enviou-os a Belém, dizendo: “‘Ide e informai-
25 vos cuidadosamente acerca do menino; e comunicai-me quando o
26 tiverdes encontrado, a fim de que eu também o vá adorar”’. A tais
27 palavras do rei, partiram. E eis que a estrela, que haviam visto no
28 Oriente, os precedia, até que chegou e ficou parada sobre o lugar onde
29 se achava o menino. Ao verem o astro, exultaram com grandes
30 transportes de alegria. Entrando na casa, viram o menino com Maria,
31 sua mãe, e, prostrando-se, o adoraram; a seguir, abrindo seus tesouros
32 ofereceram-lhe de presente ouro, incenso e mirra. Instruídos em sonho
33 para que não voltassem a Herodes, regressaram a seu país por outro
34 caminho. (Relato concedido... [IM2] Comentário: Colocar como nos
dois relatos anteriores.
35
36
37 Primeira sequência: “Anunciação”
38 Relacionando as versões, a primeira observação que gostaria de fazer diz respeito
39 ao caráter condensado e sintético da narrativa bíblica quando comparada com os relatos
40 dos foliões. Nesse sentido, os momentos da “anunciação” e “volta”, que para eles sãoé o
41 ponto inicial e final da narrativa, sequer aparecem na versão de Mateus.
42 Outro aspecto a considerar inicialmente é que, nos relatos dos foliões, o
43 nascimento de Cristo é visto como um evento inaugural, que estabelece passagem entre
44 duas temporalidades, instaurando um novo tempo. A existência, nas narrativas, dessas
45 duas temporalidades, distintas e articuladas, remete-nos à grande divisão da narrativa

7
1 bíblica entre o velho e novo testamento. As narrativas, ao enfatizarem personagens
2 mediadores (entre os comandos), como os três reis e o próprio menino Jesus, estão
3 evidenciando, para além das descontinuidades e distinções entre o que Malinowski
4 (1976) chamou “mitos mais antigos” e “mitos culturais”, as continuidades, relações e
5 passagens entre esses planos.3.
6 Embora se valorizem as transições entre o comando do Pai Eterno, quando o
7 universo e os homens foram criados, e o comando de seu filho, o messias, o evento do
8 nascimento de Jesus assume um caráter inaugural e até certo ponto de ruptura quando
9 percebemos que ele é constantemente referido como estando no e fundando um princípio.
10 Não negando, por um lado, as continuidades, articulações e pontes – em parte construídas
11 pelos reis, mas também pela filiação pai e filho, divino e humano –,- as narrativas, por
12 outro lado, também não negam que o nascimento instaura um corte, mudança, rompendo
13 com uma ordem mais antiga.
14 Outro ponto central que aparece nessa primeira sequência é como e por quem a
15 notícia do nascimento chega até os reis. Na versão 1, o anjo aparece como mediador,
16 aquele que leva a notícia, que dá o aviso: - "um anjo avisou, avisou eles que ia nascer
17 outro rei". Ainda nessa versão, o sonho é o meio privilegiado do contato entre anjo e reis.
18 É através desse meio de comunicação que o anjo aparece para os reis, transmitindo o
19 aviso de que havia nascido o menino Jesus. A versão 2 menciona a chegada da notícia
20 aos três reis, masno entanto não esclarece como nem quem a transmitiu.
21 A presença do anjo como mediador e do sonho como veículo de comunicação e
22 transmissão da informação evoca várias passagens bíblicas: através do sonho, que “um
23 anjo do senhor apareceu para São José, despertando-o” (Mat. 1;1); em Lucas menciona-se
24 que coube ao anjo avisar a Zacarias que sua esposa Isabel lhe daria um filho, mesmo esta
25 sendo estéril (Luc.1-3). Embora a passagem de Mateus, que se inicia já na viagem dos
26 reis, não mencione o anjo nem o sonho, ao se constatar a presença não apenas do
27 personagem, mas também do sonho como veículo de comunicação em diversas outras
3
Nesse sentido, enquanto o mito de Deus Pai ou Pai Eterno, por se relacionar com a própria criação – do
universo e dos seres –, estaria próximo ao que Malinowski chamou de “mitos mais antigos”, o mito do
nascimento de Cristo, ao narrar a vinda de um messias, de um salvador, que venceu o mal, se aproxima aos
“mitos culturais”. Assim, se o Pai Eterno é um Deus transcendente – onipotente e onipresente –- Jesus, seu
filho, encarnado, é um tipo de “Herói cultural” (Malinowski, 1976, cap. XII). Na folia, portanto, a solução
de continuidade entre esses domínios ou comandos, parece estar em sintonia com a doutrina cristã da
encarnação, quando esta postula que, em Cristo, se deu a união das naturezas divina e humana.

8
1 passagens bíblicas, podemos interpretar as narrativas dos foliões como reapropriações
2 criativas (Chartier, 1992) de temas e personagens bíblicos.
3 Desse modo, a recorrência da presença do anjo e do sonho nos relatos, antes de
4 apontar para um processo de mão única, nos faz pensar que estamos diante de uma
5 tradição oral que incorpora elementos e temas bíblicos criativamente, modificando
6 contextos, como nesse caso em que anjo e sonho, elementos bíblicos, se fazem presentes,
7 nas narrativas dos foliões, ocupando as mesmas funções, mas em situações outras que não
8 aquelas referidas no relato bíblico.
9 Na versão 2, destaque é dado para a atitude dos reis quando receberam do anjo a
10 notícia – “aí eles ficou ansioso pra saber daquele menino”. Nesse momento, entre eles
11 surgem o anjo da guarda e a estrela guia. Diante da dúvida dos reis em relação à
12 veracidade da notícia, os indícios produzidos pelas presenças do anjo e da estrela,
13 parecem tê-los conduzidos à ação seguinte – fazer uma promessa, descrita nos seguintes
14 termos: “que se eles chegassem com o adjutório do mesmo menino que ia ser o rei, eles
15 chegasse naquela conclusão de conhecer, eles ia levar os presente e saudar menino
16 Deus, no causo, e prometeu uma ladainha, como se eles encontrassem o menino Deus,
17 pra eles ter a certeza, eles prometeram de rezar, festejar e rezar uma ladainha pra
18 menino Deus”. A promessa dos reis, como descreve o folião, envolveu um pedido –-
19 presentear e saudar o menino – e uma retribuição – rezar uma ladainha e organizar uma
20 festa.
21 Essa versão é a única a fundamentar no mito a prática da promessa, que é a
22 principal motivação para a organização de uma folia. Nesses termos, assim como os reis,
23 no mito, o imperador, no giro, como forma de retribuição pela graça alcançada, se
24 compromete a rezar uma ladainha e organizar uma festa. Organizados e promovidos
25 pelos imperadores em sua casa, os festejos de encerramento, como já vimos, representam
26 o pagamento daquela promessa.
27 Guilherme, narrador da versão 2, em outra passagem, esclarece que a origem da
28 folia e da promessa, nesse sentido, é uma só:
29
30 "Aí é que veio a origem de folia, e a origem de promessa, porque se você tem Formatado: Fonte: Itálico
31 uma necessidade, tem qualquer uma coisa pra você depender dos três reis
32 magos, aí você vai prometer pros três reis, pra socorrer você naquele ato que
33 você tá sentindo, você vai prometer para os três reis, que se ele fazer aquilo

9
1 pra você, você vai festejar e rezar uma ladainha pra ele. É igualmente como o
2 três reis prometeu pra o menino Deus. Aí que vem a origem, não é? Porque se
3 não fosse assim, não tinha origem de folia, e nem tinha origem de promessa.
4 Como é que você ia fazer com promessa, né?4".
5
6 A origem da promessa e da folia, assim, estáão fundamentadas no mito e se o
7 imperador de hoje é como os reis de ontem, já que ambos prometem a mesma coisa –-
8 festejar e rezar uma ladainha – estes últimos ainda se identificam com o menino Jesus, na
9 medida em que para ambos é que se fazem promessas.
10
Ação Mito Rito
Fazer promessa Três Reis Imperador
Receber promessa Menino Jesus Três Reis

12 Nem todos os pedidos podem ser feitos para qualquer santo. A versão 2, ao
13 atribuir qualidades específicas aos três reis – reis da mata e reis do gado –, nos indica a
14 área de atuação principal desse santo. No caso, principalmente na região Ooeste do São
15 Francisco, é recorrente a reputação dos Santos Reis como protetores do gado, e não é à
16 toa que muitas promessas são feitas com essa intenção. Como esclarece o próprio
17 Guilherme, em outra passagem,
18 É a promessa de você dá um gado, e três reis socorrer, que as vez você tem
19 um gado, ele adoece, ‘`esse gado vai morrer ... não! Se esse gado escapar, aí
20 eu dô ele pros três reis magos’. Aquele gado, os três reis vai pôor a mão nele,
21 porque ele é rei ... dos inocentes, é rei da mata e rei dos inocentes. Ele põe a
22 mão, aquele gado melhora, sara. Daí a pouco ele é o melhor dos seus gados.
23 Se o seu gado não tá muito encaminhado, tá perdendo vaca, perdendo
24 bezerro, morrendo, no causo, aí você faz uma promessa com os três reis, que
25 ele há de ajudar, que daquele dia em diante se ele ajudar, não ter mais
26 atrapalho, você tira uma vaca, um bezerro pros três reis. Ali é aquela fé,
27 porque o origem dele é esse" 5.
28
29 Outro aspecto que convém ressaltar dessa primeira sequência

4
Os reis, embora três, são cultuados pelos devotos como sendo uma única entidade. A rigor, ninguém se diz
devoto ou que está pagando promessa para um rei em particular, e sim para os três reis enquanto unidade.
Como lembra Brandão (1981, p.:51), “é muito comum a fala: Santos Reis é um santo milagroso”.
5
Assim cComo Santos Reis aparece aqui como protetor do gado, a atuação de muitos santos se concentra
em determinadas áreas. É comum ouvirmos, por exemplo, sobredos poderes de Santa Luzia em lidar com
problemas relativos à visão, Santo Antônio compara o casamento, e assim por diante. Menezes (2004), em
reflexão sobre modalidades de relação entre santo e devoto no convento de Santo Antônio, Rio de Janeiro,
mostra como, para este, não basta pedir ao santo, e sim pedir a coisa certa para o santo certo.

10
1 do mito, antes de passarmos para a seguinte, refere-se à identidade e à procedência dos
2 reis. Enquanto na versão 1 eles são singularizados, já que vieram de diferentes lugares – -
3 África, Oriente e Portugal –,- na versão 2 eles se identificam como procedentes do
4 Oriente. No evangelho de Mateus, nota-se que os magos são genericamente referidos
5 como do Oriente (se aproximando-se das versão 2), mas, diferentemente dessta versão,
6 Mateus não menciona se eram reis, nem se eram três.
7
8 Segunda sequência: “viagem”
9 Um aspecto que destaco inicialmente nessa segunda sequência é a presença da
10 estrela como mediadora entre os reis e Jesus. Através de seu brilho, que naquela noite é
11 diferente (versão 1), a estrela vai ser descrita como a guia, apontando (versãoões 2) para
12 os reis o caminho de Belém. Signo visível de um lugar (Belém) para alguém (reis), o
13 papel da estrela como indicadora de um caminho, de um norte, é recorrente tanto nas
14 versões dos foliões, quanto no relato de Mateus (versão 3). Interessante lembrar aqui que
15 as folias que acompanhei a Lleste do rio São Francisco, no município de mesmo nome,
16 assim como os reis, realizam seus giros rituais somente à noite, procurando manter
17 atitude solene, silenciosa, especialmente quando caminham entre as casas. Além desses
18 preceitos, os foliões se preocupam sobremaneira com a direção, o sentido do giro, sempre
19 realizado de Oriente para Ocidente, ou pelas direitas, como dizem. Tudo para tornar mais
20 eficaz e real a identificação dos giros dos foliões com a viagem dos reis.6.
21 A partir da caracterização comum da estrela como elemento de orientação e
22 mediação, cada versão vai enfatizar aspectos distintos da “viagem” empreendida pelos
23 reis desde suas terras até o local onde havia nascido o menino Jesus.
24 Na versão 1, o foco está no encontro dos três reis entre si, que até então
25 caminhavam sozinhos, e em determinado momento passam a caminhar juntos. Não só o
26 encontro é fundamental, como também o local onde aconteceu – numa cidade. Outra
27 dimensão dessa versão que gostaria de salientar, em relação ao modo da narração, é a

6
Vale mencionar aqui uma importante distinção que os foliões da Taboquinha, localidade rural pertencente
ao município de São Francisco, fazem entre folias de reis, dedicadas aos Santos Reis, e folias de bandeira,
para os demais santos: enquanto a de reis, que estamos vendo ser o modelo e fundamento para as demais,
não usa bandeira e realiza a visitação às casas do giro somente à noite, tal como os reis magos, que
andaram guiados pela luz da estrela, as folias de bandeira, além do uso da bandeira com o retrato do santo,
executa seus deslocamentos somente durante o dia.

11
1 habilidade do narrador em associar personagens e ações do princípio com as
2 circunstâncias do presente. Quando faz referência aos "de fora" como sendo os reis, já
3 que, à semelhança destes em sua viagem original, os visitantes também chegam de outras
4 terras –- Rio de Janeiro, Goiás e São Paulo –- à procura de um lugar, endereço –- o
5 Ribeirão e a casa de Jonas –-, o narrador está associando os personagens e ações da
6 narrativa à sua experiência. Articulando e estabelecendo continuidades entre os reis e sua
7 vida, a narrativa incorpora, no relato, elementos do contexto, aproximando mito e
8 presente, princípio e hoje.
9 Essas aproximações se dão principalmente através das relações, veiculando reis e
10 visitantes, a família do narrador e a família sagrada. Jonas busca essas articulações de
11 dois modos: ora incorporando elementos e situações vivenciadas no presente napara sua
12 narrativa, como quando menciona que, tal como os reis, os que chegam vêm de
13 procedências distintas, ora através de analogias, como quando compara reis e visitantes, a
14 partir da observação de que realizam a mesma ação –- como você pegou o endereço de
15 seu Jonas e chegou aqui, ele pegou o endereço de Maria e José .
16 Outro aspecto da versão 2 é a referência aos poderes dos reis, que realizam em
17 apenas 12doze dias uma viagem normalmente feita em um ano. Aqui, essta versão, se por
18 um lado aponta distância ontológica entre reis e homens, por outro, estabelece, entre eles,
19 continuidades. Esses 12doze dias correspondem exatamente ao ciclo ritual da folia de
20 reis, que, nessa região, se inicia no dia 25vinte e cinco e se encerra do dia 5cinco para o
21 6seis de janeiro. Desse modo, o narrador, ao fundamentar uma temporalidade ritual,
22 implicitamente, estabelece uma relação de identificação entre "eles", foliões, e os reis.7.
23 Em todas as versões, com a notável exceção da primeira, um evento importante da
24 viagem dos reis é o encontro com Herodes. Associado ao polo negativo, em oposição ao
25 mMenino Jesus, José e Maria, Herodes, embora presente no mito, é evitado no rito.8.

7
Os foliões costumam usar categorias como semelhança ou imitação para se referir ao tipo de relação que
seus giros mantéem com a viagem original dos reis. Embora não caiba aprofundar a discussão de tais
categorias nos limites deste texto, o que fiz em outro trabalho (Chaves, 2009), gostaria de salientar que para
os foliões, quando dizem que estão fazendo a semelhança dos reis, a relação, além de envolver um sentido
representacional (referencial, de estar no lugar ou fazendo como os reis), é eficaz no sentido de que cria,
entre o que imita (foliões) e o imitado (reis), um elo existencial e de identificação.
8
As folias de reis, nas localidades pesquisadas, de modo a não encontrarem Herodes, como vimos,
realizam seus giros obedecendo a preceitos como andar à noite e em silêncio. Em outros locais, como no
eEstado do Rio de Janeiro, se observa, nas folias, a presença de personagens mascarados, chamados de
palhaços, acompanhando os foliões. Estes, por serem associados a Herodes e seus soldados, quando não

12
1 Nos relatos, o local do encontro dos reis com Herodes, não sendo consensual, é sempre
2 mencionado: em uma cidade que eles achavam ser Belém (versão 2), em Jerusalém
3 (versão 3). Nessas versões, são os três reis que tomam a iniciativa da interação com
4 Herodes, em geral perguntando-lhe a este sobre o caminho e o local onde havia nascido
5 o mMenino Jesus. Na versão 2, eles procuram diretamente Herodes, enquanto na versão
6 3 não está claro se foram os reis que perguntaram diretamente a Herodes ou se este
7 apenas ouviu a indagação deles.
8 Estabelecido esse primeiro contato entre reis e Herodes, as narrativas passam a
9 descrever a sequência de atos na qual se desenvolve a relação propriamente dita.
10 Variações à parte – se Herodes já sabia do nascimento (versão 2) ou não (versãoões 3) –,
11 em ambas, as verdadeiras e não reveladas intençãoões dele ésão sempre a mesma: matar
12 o menino Jesus. Tanto é que, ao final do diálogo, recomenda aos reis que depois de suas
13 visitas voltem pelo mesmo caminho para avisá-lo pois ele também queria adorar o
14 menino: ‘Ide e informai-vos cuidadosamente acerca do menino; e comunicai-me quando
15 o tiverdes encontrado, a fim de que eu também o vá adorar’ (versão 3); “Quando vocês
16 for, de volta por aqui torna a passar, conforme for as suas visitas, eu também quero
17 visitar” (versão 2).
18
19 Terceira sequência: “visita”
20 A terceira sequência se centra na saudação e adoração que os reis fizeram diante
21 do menino Jesus e de Maria (a ausência de José é notável em todas as narrativas). As
22 trocas simbólicas e interações entre os personagens e objetos presentes na situação, na
23 narrativa de Jonas (versão 1), se tornam o contexto em que se origina a toalha, signo
24 visual de distinção, identificação e divisa do grupo. Para o folião, os reis, primeiramente,
25 adorou o menino (mais uma vez os reis são referidos na terceira pessoa do singular). A
26 adoração, nessa versão, envolve orações e trocas de presentes (incenso, mirra e ouro,
27 nessa sequência) entre os reis e o menino, por intermédio de Maria, que em determinado

identificados com entidades como o diabo ou exu, embora acompanhem os foliões, são objetos de restrições
rituais, como não entrarem mascarados nas casas, não andarem na frente ou distantes da bandeira, etc.
(Castro e Couto, 1957; Monte-Mor, 1992; Chaves, 2003; Bitter, 2008). Certa vez contei esse fato a um
folião da Taboquinha e ele, bastante surpreso, me disse que não entendia como uma folia poderia levar
como acompanhante justamente a figura do perseguidor de Jesus, de quem eles, foliões, estavam se
desviando e evitando o encontro.

13
1 momento retira de seu manto, três tiras e as entrega para aos visitantes. A princípio, eles
2 não sabem o que fazer com os pedaços de pano, até que Maria explica como se deve usá-
3 los –- vocês bota no pescoço –- e seu significado –- isso aíi é a divisa, porque esse
4 manto só quem tem é eu, ninguém.
5 Símbolo no sentido forte e performativo do termo, a toalha aparece, na região
6 pesquisada, como importante fundamento da folia. Originária do manto de Maria,
7 abençoada por Jesus, o movimento leva a toalha aos foliões, por meio dos próprios reis.
8 Os reis, assim, se tornam mediadores diretos entre a visita original que fizeram e os
9 foliões do presente. Tendo sua origem ou fundamento no mito, a toalha, na folia, é
10 importante signo visual, que distingue e separa o grupo de folião, como explica Amador,
11 cabeça de folia da Taboquinha
12
13 Ali é um distintivo do folião. A toalha é importante porque além de ser um Formatado: Fonte: Itálico
14 distintivo, e se tem aquela multidão de gente, qualquer um que chegar já fica
15 sabendo qual que é o folião, né? Porque já tando com a toalha todos que
16 chegar, mesmo que não conhecer quem é folião já sabe, só no ver com a
17 toalha já sabe que ele é o folião. A toalha é a única coisa que divide o terno
18 com outros que vem na festa, visitar. Que às vezes a outra roupa é normal
19 como dos outros, né?
20
21 Nesse primeiro plano de significado, a toalha aparece como um emblema, signo
22 visível de identidade e pertencimento à equipe ritual. Sinal de identidade coletiva, de
23 divisa, que separa e distingue foliões e não foliões, a toalha é também considerada um
24 objeto sagrado, dotado de poder e eficácia, transformando quem a usa, como destaca
25 Joaquim Goiabeira, folião e construtor de instrumentos musicais.9:
26 Oh, é duas coisas que tenho ciência na folia, você pode ter seus Formatado: Fonte: Itálico
27 encambalacho pra lá, mas o dia que você pegou a toalha e laçou no pescoço
28 pode vir que hoje eu tô sendo a semelhança de um santo. Que é uma coisa
29 muito respeitada quando você pega a toalha e põe no pescoço, é um respeito
30 muito grande, não pode abusar.
31

9
Joaquim Goiabeira, já falecido, morava da cidade de São Francisco e foi um dos construtores de
instrumentos musicais a participar do projeto “Instrumentos Musicais Tradicionais de São Francisco, Minas
Gerais”, que integrou o Paca (Programa de Apoio às Comunidades Artesanais) do Centro Nacional de
Folclore e Cultura Popular (CNFCP). Como um dos resultados da pesquisa, da qual tive o prazer de
participar, organizamos, na Sala do Artista Popular (SAP) do referido centro, uma mostra intitulada “Sons
de Couros e Cordas: instrumentos musicais tradicionais de São Francisco, MG”, e de um catálogo com o
mesmo título (Chaves e Fonseca, 2005).

14
1 Desse modo, a toalha é ao mesmo tempo insígnia da identidade social e objeto
2 sagrado, que sacraliza o folião, tornando-o mais próximo – semelhante –- ao santo. Nos
3 municípios pesquisados, as toalhas recebem bordados diversos –- flores, santos, etc. –,
4 juntamente com as iniciais do nome e sobrenome de seus proprietários. Desse modo, cada
5 folião tem a sua toalha, sendo ela um objeto pessoal e intransferível. Na região da
6 Taboquinha, a relação entre a toalha e o folião é de tanta proximidade, que os principais
7 guias e cabeças de folia, quando morrem, são sepultados vestidos com as suas toalhas.10.
8 Enquanto a primeira versão evidencia o fundamento da toalha, assim como a
9 passagem do objeto de Maria a Jesus, dos reis aos homens, a segunda se concentra em
10 detalhar os nomes dos reis, as ofertas dadas, assim como a ordem em que chegaram –- o Formatado: Português (Brasil)

11 primeiro, Brexó, ofertou incenso; o segundo ofertou ouro, que era o rei Gaspar; o terceiro
12 ofertou mirra, que era Baltazar. Maria, central na primeira variante, não aparece aqui em
13 destaque. A troca, sempre envolvendo os reis e Deus menino, tem nos presentes os
14 objetos mediadores. Através dos presentes oferecidos, os reis estabelecem relação –
15 denominada como sendo de adoração –- com o mMenino Jesus e Maria. No relato de Formatado: Português (Brasil)

16 Mateus (versão 3), também se enfatiza a adoração dos magos (lembrar que nessa variante
17 não se menciona quantos eram nem se eram reis) e os presentes oferecidos. No entanto,
18 diferentemente da segunda versão, no relato bíblico, os presentes foram dados na seguinte
19 sequência: ouro, incenso e mirra.
20
21 Quarta sequência: “volta”
22 Chegamos agora à última sequência da narrativa, que representa o retorno, a volta
23 dos reis após a visita. A versão bíblica, nesse particular, das três, é a mais econômica e
24 sintética. A única menção de Mateus é para a revelação que os reis tiveram, em sonho,
25 para que não retornassem a seu país pelo mesmo caminho. Essa recomendação, ou
26 instrução, evitaria que, naem sua volta, eles fossem ao encontro de Herodes, cujas reais

10
Durante a pesquisa de campo observei também algumas situações, até certo ponto incomuns e bem
menos frequentes, em que as toalhas usadas pelos foliões são providenciadas pelo imperador, como forma
de pagar sua promessa. Também tive a oportunidade de observar algumas folias, especialmente as
localizadas nos municípios de Januária e Chapada Gaúcha, que não usavam toalhas, e sim camisas
(uniformes, como chamam), com o nome da folia, que pode ser uma pessoa (folia dos Senhorinho), uma
família (folia dos Ferreira) ou mesmo uma localidade, (folia do Ribeirão), e, em alguns casos,
agradecimentos e menções de apoio a políticos locais.

15
1 intenções, como já foi dito, eram perseguir e matar o menino.11.
2 Nas versões 1 e 2, a “volta” ocupa um lugar central na mediação entre o mito e o
3 rito, o tempo da viagem dos reis e os giros dos foliões. Guilherme (variante 2) menciona
4 que os reis, após a visita e adoração que fizeram ao menino Jesus, quando retornam às
5 suas terras de origem, voltam “fazendo as avistas, cantando e pedindo as avistas como o
6 menino era nascido”. Nesse momento, como relata Jonas (variante 1), os reis, eles
7 próprios, passam a contar, para as pessoas, “as histórias que foi assim, foi assim que
8 Jesus nasceu”. As folias de reis de hoje, como os reis do princípio, também anunciam aos
9 devotos a boa- nova –- a cada nova visita, os foliões cantam determinado conjunto de Formatado: Português (Brasil)
12
10 versos, ou partes, que narram o nascimento de Cristo. .
11 As relações entre o tempo mítico dos reis e o tempo do rito, do giro dos foliões,
12 envolvem ainda mediações espaciais e simbólicas. Nessa direção, percebe-se
13 correspondência entre a manjedoura, onde havia nascido Jesus e de onde saem os reis
14 para anunciar o nascimento, e a lapinha montada pelo imperador em sua casa, diante da
15 qual os foliões cantam a saudação da lapinha antes de iniciarem as visitas aos moradores.
16 A casa do imperador e a lapinha, assim, se associam a Belém e à gruta. Nesse esquema,
17 o tempo mítico dos reis e o tempo ritual dos giros dos foliões estariam articulados do
18 seguintee modo:
Mito Rito
Quem visita Reis Foliões
Onde começam Belém/ gruta Casa do imperador/ lapinha
Quem recebe Moradores Moradores

11
Revelação semelhante, na versão 2, como já vimos, aconteceu em outro momento: na “viagem”, quando
os reis estão diante de Herodes e percebem, naquela situação, as intenções do rRei da Judeia.
12
Os foliões afirmam ainda que as partes cantadas hoje nas casas são as mesmas que os reis cantaram
durante sua viagem de volta. Quando explicam como se deu a transmissão, dos reis aos foliões, eles
mencionam a existência de determinado livro, supostamente escrito a partir dos cantos feitos pelos próprios
reis. Nesses livros, como postulam, estão as principais partes que um guia de folia deve aprender a cantar,
como por exemplo: vinte cinco de dezembro, dedicada a narrar o nascimento de Ccristo, longas terra, que
descreve a viagem, visita e adoração que os reis fizeram ao menino. Tais livros, todavia, não são mais
encontrados –- diz-se que circularam no tempo dos antigos foliões, mas desapareceram. Não tendo acesso Formatado: Português (Brasil)
mais aos livros, como tinham os velhos foliões, os mais novos devem aprender de outro modo. Se
antigamente se aprendia dos e com os livros, hoje se aprende através de cópias, supostamente retiradas dos
livros. Durante minha pesquisa percebi que os guias de folia guardam cadernos, preenchidos com os versos
das principais partes que deve aprender. , através de determinados livros Aí está o fundamento dos cantos
de folia.

16
1
2 Além de precisar o momento e a situação que originou o primeiro canto de folia,
3 essa sequência da narrativa também fundamenta um importante rito realizado pelas
4 folias: - os festejos que marcam o encerramento do giro.
5 Na versão 1, os reis, cada qual de um lugar (Portugal, África e Oriente), quando
6 retornam para suas terras, chegam ao mesmo lugar onde se encontraram, no princípio da
7 narrativa. É nesse local preciso que realizam uma grande festa. Jonas, em seu relato,
8 evidencia determinados aspectos do evento festivo – como a fartura e o consumo de
9 comida e bebida, as performances musicais e coreográficas dos reis e a presença das
10 pessoas, especialmente os vizinhos que foram convidados. A chegada ano local –- Formatado: Português (Brasil)

11 naquele ponto que eles encontrou – é descrita como tendo ocorrido no dia 6seis de
12 janeiro, que passou a ser considerado e celebrado como o dia de reis.
13 A versão 2, apesar de manter a mesma sequência narrativa, apresenta pequenas
14 variações. Diferentemente da primeira, que enfatiza origens diversas para os reis, nesta
15 eles são retratados como procedentes de um mesmo lugar: – Oriente. Desse modo, eles
16 não se separaram na “volta”, como vimos no outro relato. A celebração de uma festa
17 também aparece em destaque aqui. No entanto, a razão para a sua realização não estava
18 atrelada a um lugar determinado, e sim a uma data específica. Segundo Guilherme, esse
19 dia, 6seis de janeiro, foi a data estabelecida, pelos próprios reis, na ocasião em que
20 fizeram a promessa. Como diz, iniciando essa parte do relato:, “Aí dessa visita que eles
21 visitou ele, aí eles voltou pra cumprir a promessa que eles tinha prometido, que se
22 avistasse o menino Deus e tivesse a certeza, eles prometeu uma ladainha pra rezar pro
23 menino Deus, se encontrasse com ele.”.
24 A versão 2, desse modo, agrega à dimensão festiva do evento, bem evidenciada
25 no relato de Jonas, a dimensão religiosa ou devocional, expressa na alusão à reza da
26 ladainha. Aqui festa e reza se combinam como duas dimensões de um evento que, para os
27 reis de ontem e imperadores de hoje, têem como motivação principal o pagamento da
28 promessa que fizeram.13.

13
Nas festas de folia das quaise participei, o caráter festivo e o devocional (ora se usa o termo festa, ora
reza para denominá-las), estão juntos. Assim, ao lado de momentos de maior sacralidade, com os cantos e a
reza da ladainha, podemos observar situações menos formais, quando se come, se bebe, se brinca e se
dança.

17
1 Ao final, depois da festa, os reis retornam, juntos (versão 2), ou separados (versão
2 2) para suas terras. Os foliões também, terminado o giro com a festa na casa dos
3 imperadores, voltam às suas casas e à rotina da vida diária até que para o ano,
4 novamente, são convocados para mais uma folia de reis, ocasião em que esse mundo de
5 relações é recriado e uma vez mais, vivenciado.
6
7 Considerações finais
8 Neste texto, em que descrevi e interpretei a folia focalizando algumas narrativas
9 acerca de sua origem, observamos como determinadas ações, objetos e atitudes presentes
10 no plano do ritual, são justificadoas no mito. Assim vimos a origem das promessas, dos
11 cantos e festejos, da toalha, do caminhar à noite, em silêncio e de Ooriente para
12 Oocidente. Mediadores, já que articulam mito e rito, princípio e presente, passado e hoje,
13 esse conjunto de símbolos articulados, oferecem aos participantes um mapa dinâmico, em
14 queonde se desenrolam suas ações, relações e os múltiplos sentidos assumidos pelo
15 evento ritual folia.
16 Nesse exercício de descrever etnograficamente um conjunto de narrativas, todavia,
17 não procurei determinar a versão original e mais autêntica, considerando-a como
18 referência para as demais. Tratar a narrativa bíblica como sendo mais uma versão, e não a
19 versão de referência, não nos impediu de investigar como se relacionam figuras e dogmas
20 bíblicos com os relatos dos foliões. Assim, observamos, ao longo da descrição, como se
21 dão as articulações entre temas bíblicos universais e temas locais, partindo da ideéia de
22 que, em suas narrativas, os foliões, ao modo de um “bricoleur”, estão continuamente Formatado: Fonte: Itálico

23 construindo sentidos para suas ações a partir de fragmentos que são por eles aproprirados,
24 combinados e recombinados criativamente (Chartier, 1992).
25 Nessa direção, a pluralidade de versões do mito, se por um lado mostra a
26 existência de um repertório comum, reconhecido e compartilhado – em sua composição,
27 personagens, ações, relações e sequências narrativas –-, por outro, como já havia notado Formatado: Português (Brasil)

28 Goody (2012) em sua reflexão sobre variação e criatividade na recitação do “mito do


29 Bagre”, entre os LoDagaa, do Nnoroeste de Gana, revela como cada versão é única,
30 enfatizando ou condensando determinadas passagens, acrescentando detalhes narrativos e

18
1 combinações próprias.
2 Observando as versões como um todo, percebemos que cada uma é ao mesmo
3 tempo única, distinta –- construindo ênfases próprias, condensando passagens ou Formatado: Português (Brasil)

4 desenvolvendo outras, acrescentando detalhes narrativos e combinações –- e a mesma –, Formatado: Português (Brasil)

5 trabalhando com os mesmos personagens, sequências, formas e intenções narrativas.


6 Cada relato, assim, paradoxalmente, é único e o mesmo. O mito de origem da folia, assim
7 entendido, é o dispositivo que conecta mundos, relaciona temporalidades, revelando-se
8 ainda como o fundamento de práticas, símbolos e relações que fazem da folia um evento
9 ritual. Ao final, o exercício aqui proposto mostrou como, na folia, o rito se fundamenta
10 no mito e o mito, por seu turno, sempre deságua no rito. Mito e rito, desse modo, se
11 mostram inseparáveis e mutuamente implicados.
12
13 Referências bibliográficas
14 BIBLIA SAGRADA. 1967. São Paulo: Editora Ave Maria, 1967.
15 BITTER, Daniel. 2010. A bandeira e a máscara: a circulação de objetos rituais nas Folias Formatado: Fonte: Não Itálico
16 de Reis. Rio de Janeiro: Sete Letras, 2010. Formatado: Português (Brasil)
17 BRANDÃO, Carlos Rodrigues. 1977. “A Folia de Reis de Mossâmedes”. Cadernos de
18 Folclore n.º 20. Rio de Janeiro: Campanha de Defesa do Folclore Brasileiro, 1977.
19 ______. 1981. Sacerdotes da viola. Petrópolis: Vozes, 1981.
20 CHARTIER, Roger. 1992. “Textos, impressões e leituras”. In: HUNT, Lynn. A nova
21 história cultural. São Paulo: Martins Fontes, 1992.
22 CHAVES, Wagner; e FONSECA, Edilberto. 2005. Sons de cCouros e cCordas: Formatado: Fonte: Não Itálico
23 instrumentos musicais tradicionais de São Francisco, MG. Rio de Janeiro: Iphan/CNFCP,
24 2005. 44p, il. (Sala do Artista Popular; 124).
25 CHAVES, Wagner. 2003. Na Jornada de Santos Reis: uma etnografia da folia do mestre
26 Tachico. Dissertação de Mestrado, PPGAS/Museu Nacional/UFRJ, 2003.
27 ______._____________2009. A Bandeira é o santo e o santo não é a bandeira: práticas Formatado: Fonte: Não Itálico
28 de presentificação do santo nas Folias de Reis e de São José. Tese de Doutorado, Formatado: Português (Brasil)
29 PPGAS/Museu Nacional/UFRJ, 2009. Formatado: Português (Brasil)
30 FRADE, Cáscia. 1997. O saber do viver: redes sociais e transmissão do conhecimento. Formatado: Fonte: Não Itálico
31 Tese de Doutorado em Educação, PUC Rio, 1997. Formatado: Português (Brasil)
32 GOODY, Jack. 2012. O Mito, o rRitual e o oOral. Col. Antropologia. Petrópolis: Vozes,
Formatado: Português (Brasil)
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34 LEACH, Edmund. [1954] (1996). Sistemas pPolíticos da Alta Birmânia. São Paulo:
35 Edusp, 1996.
36 LÉVI-STRAUSS, C. 1975. Antropologia estrutural. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro,
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38 MALINOWSKI, B. [1922] (1976). Os argonautas do pacífico ocidental. São Paulo:
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2 espetacularidade através do Reisado do Mulungu. Tese de Doutorado, Programa de Pós-
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4 MENEZES, Renata de Castro. 2004. A Dinâmica do sagrado: rituais, sociabilidade e Formatado: Fonte: Não Itálico
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6 MONTE-MÓR, Patricia. 1992. Hoje é dia de Santo Reis. PPGAS/Museu
7 Nacional/UFRJ,: Dissertação de Mestrado, 1992.
8 PEREIRA, Luzimar. 2004. Os andarilhos dos Santos Reis: um estudo etnográfico sobre Formatado: Fonte: Não Itálico
9 Folia de Reis e bairro rural. Dissertação de mestrado, UFRRJ, 2004.
10 ______.________________ . 2012. Os giros do sagrado: um estudo etnográfico sobre as Formatado: Fonte: Não Itálico
11 folias em Urucuia, MG. Rio de Janeiro: Sete Letras, 2012. Formatado: Inglês (EUA)
12 REILY, Ana Suzel. 2002. Voices of the magi: enchanted journeys in southeast Brazil. Formatado: Fonte: Não Itálico
13 Chicago studies in Ethnomusicology. The University of Chicago Press, 2002.
14 Formatado: Inglês (EUA)
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