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ISSN 1678-7153 Psychology /Psicologia Reflexão e Crítica, 28(2), 213-222. – DOI: 10.1590/1678-7153.

201528218

Avaliação das Habilidades Metafonológicas (PROHFON):


Caracterização e Comparação do Desempenho em Escolares

Metalinguistic Skills Evaluation (PROHFON): Characterization and Comparison


of Students’ Performance

Giseli Donadon Germano & Simone Aparecida Capellini


Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, Marília, SP, Brasil

Resumo
Este estudo teve como objetivos caracterizar e comparar o desempenho de escolares com bom
desempenho acadêmico do 3º ao 6º ano do Ensino Fundamental I e II nas Provas de Habilidades
Metafonológicas (PROHFON). Participaram 169 escolares do 3º ao 6º ano do ensino fundamental, de
ambos os gêneros, com faixa etária entre sete e 13 anos de idade, divididos grupos (GI: 52 escolares
do 3º ano; GII: 51 escolares do 4º ano; GIII: 42 escolares do 5º ano; GIV: 24 escolares do 6º ano).
Os resultados deste estudo demonstraram que os escolares, independente da seriação escolar, apre-
sentaram dificuldades principalmente nas habilidades fonêmicas de contagem, de síntese e análise e
na habilidade suprassegmental (rima). Concluímos que o PROHFON possibilitou a caracterização
e a comparação dos escolares com bom desempenho acadêmico, sendo que não foram todas as
habilidades metafonológicas que os escolares deste estudo apresentaram domínio de acordo com o
aumento da escolarização, sugerindo falha no domínio das competências necessárias para a aquisição
do principio alfabético da Língua Portuguesa.
Palavras-chave: Avaliação, educação, leitura, Fonologia.

Abstract
This study aimed to characterize and to compare the performance of students with good academic
performance from 3rd to 6th grade of Fundamental Education I and II in Metalinguistic Skills Tests
(PROHFON). The study was composed of a total of 169 students from 3rd to 6th grade, of both gen-
ders, aged between 7 and 13 years, divided into two groups (GI: 52 students from 3rd grade; GII: 51
students from 4th grade; GIII: 42 students from 5th grade; GIV: 24 students from 6th grade). Results
showed that students, regardless of their progress across grades, presented difficulties particularly
in phonemic abilities of count, synthesis and analysis and the suprassegmental skills (rhyme). We
concluded that PROHFON allowed for the characterization and comparison of students with good
academic performance, and the students in this study did not present full domain in all metalinguistic
skills as they progressed through grades, suggesting failure in the mastery of skills necessary for the
acquisition of the alphabetic principle of the Portuguese language.
Keywords: Evaluation, education, reading, Phonology.

A relação entre a consciência fonológica, a leitura e a nos primeiros meses de vida da criança até o ingresso
escrita vem sendo documentada pela literatura há pelo me- na aprendizagem da leitura e escrita nos primeiros anos
nos 30 anos. O pressuposto de que, em sistemas alfabéticos, escolares (Cervera-Mérida & Ygual-Fernández, 2003;
a aprendizagem de habilidades como a leitura e a escrita Chard & Dickson, 1999; Gombert, 2003), sendo que a
implica uma reflexão deliberada da fala, a fim de que esta percepção de que a fala possui uma estrutura fonêmica
se torne objeto de sua atenção consciente e possibilite o subjacente é essencial para a aquisição da leitura, pois
desenvolvimento da consciência metalinguística, tem sido tal estrutura possibilita utilizar um sistema gerativo que
um consenso entre diversos autores (Bradley & Bryant, converte a ortografia em fonologia (Hayes & Slater, 2008;
1983; Hayes & Slater, 2008; Manz, Hughs, Barnabas, & Manz et al., 2010).
Bracaliello, 2010). Deste modo, para que haja a aprendizagem da leitura
Estudos referiram que o desenvolvimento das habili- e da escrita em um sistema de escrita alfabético, é neces-
dades fonológicas ocorre em progressão, iniciando logo sário que a criança faça a associação de um componente
auditivo fonêmico a um componente visual gráfico.

Endereço para correspondência: Universidade Estadual Como consequência, as habilidades metafonológicas
Paulista Júlio de Mesquita Filho, Faculdade de Filosofia e em pré-escolares revelaram serem preditoras dos futuros
Ciências, Departamento de Fonoaudiologia, Av. Hygino
Muzzy Filho, 737, Marília, SP, Brasil 17525-900. E-mail: bons leitores (Capellini & Conrado, 2009; Germano &
giseliger@yahoo.com.br e sacap@uol.com.br Capellini, 2011).

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Psicologia: Reflexão e Crítica, 28(2), 213-222.

O leitor com problemas de aprendizagem manifesta como citado a seguir. As provas silábicas, tais como de
dificuldade em identificar palavras e realizar a consci- Contagem de Sílabas (CgS), Síntese e Análise de Sílabas
ência fonológica, sendo que a avaliação da consciência (SAS), Identificação de Sílabas (IS), Deleção de Sílabas
fonológica é eficaz em identificar precocemente esses (DS) e Combinação de Sílabas (CbS) foram selecionadas
tipos de leitores (Scarborough, 1990). De acordo com pois, de acordo com Ehri (1989), a aprendizagem da lei-
os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) da Língua tura em um sistema alfabético é feita pelo entendimento
Portuguesa (Secretaria de Educação Fundamental, 1997) consciente, de que as palavras faladas podem ser quebradas
o ensino da Língua Portuguesa deve ser considerado em em sons separados, sendo no nível de unidades maiores,
função do desenvolvimento das habilidades linguísticas como as sílabas, e, posteriormente no mais refinado nível
básicas (falar, escutar, ler e escrever) e organizado em do fonema. Otaiba, Puranik, Ziolkowski, e Montgomery
torno de dois eixos básicos: o uso da língua oral e escrita (2009) ainda referiram que a síntese e análise silábica é
e a análise e reflexão sobre a língua, os quais devem ser uma das habilidades que não depende de instrução explíci-
desenvolvidos por escolares do ciclo I e II do Ensino ta, tanto que pré-escolares ou iletrados conseguem fazê-la.
Fundamental. As habilidades de combinação de segmentos ao nível da
Desta forma, utilizar procedimentos de avaliação que palavra, ao nível silábico e ao nível fonêmico podem ser
permitam estabelecer e conhecer o perfil de aquisição observadas em crianças a partir dos três anos de idade
e desenvolvimento das habilidades metafonológica é (Hayes & Slater, 2008).
necessário, pois permite compreender as etapas de de- As prova de Rima (R) e Aliteração (A) foram selecio-
senvolvimento destas habilidades e o impacto destas na nadas devido a serem relacionadas ao desenvolvimento
aprendizagem da leitura e da escrita. Na realidade brasileira da leitura. Estudos (Bradley & Bryant, 1985; Goswami,
há vários estudos (Capovilla & Capovilla, 2000; Capovilla, 1988) revelam que a percepção de rima se desenvolve
Smythe, Capovilla, & Everatt, 2001; Cielo, 2002; Cunha naturalmente por volta dos 4 ou 5 anos de idade, e são
& Capellini, 2009; Moojen et al., 2003) que se propõem habilidades fonológicas iniciais que irão colaborar para o
a apresentar e discutir tal perfil, entretanto, ainda são aparecimento da consciência fonêmica. Essa percepção da
escassos, tanto na área da Educação como na área da rima apresenta um efeito direto, contribuindo para a crian-
Fonoaudiologia, estudos normatizados e validados que ça perceber que palavras podem compartilhar segmentos
possam contribuir para uma visão sobre o desenvolvimento sonoros idênticos. A Aliteração, segundo Hayes e Slater
destas habilidades. (2008), pode ser observada em crianças por volta dos 18
Para realizar uma avaliação efetiva, Vloedgraven meses de idade, sendo referido que as crianças já são capa-
e Verhoeven (2009) referiram que se deve respeitar a zes de identificar uma palavra ouvindo apenas a primeira
complexidade linguística, o tamanho de cada unidade de sílaba. Esta atenção ao início da palavra é particularmente
palavra, os alvos solicitados, os quais podem ser palavras, importante e ocorre devido às primeiras produções de fala
sílabas, onset (consoantes ou vogais ou agrupamentos de (balbucio), pois constitui uma tentativa de se aproximar
sons em posição inicial da sílaba), rimas (vogais e conso- às pronúncias dos adultos (atenção à sequência e gestos
antes finais em posição final de sílaba) e fonemas (menor articulatórios), seguidas da compreensão e segmentação
elemento constitutivo da cadeia falada que permite distin- das palavras da fala. Além disso, a aliteração favorece a
ções semânticas). O tipo de operação cognitiva utilizada percepção de que palavras podem ter o mesmo som no
nestes testes pode ser: a identificação, a combinação, a início (Chappell, Stephens, Kinnison, & Pettigrew, 2009).
segmentação e a manipulação de sílabas e/ou de fonemas. A segmentação da palavra e a percepção dos contrastes
Um escolar pode identificar unidades fonológicas iguais fonológicos ocorrem por volta dos sete meses e meio de
ou diferentes dentro das palavras antes que eles consigam idade, possibilitando que a criança aos nove meses, atinja
manipular estas mesmas unidades. Analogamente, os a capacidade de segmentar sílaba em onset, definida como
escolares podem adquirir a habilidade de combinar fone- consoantes ou vogais, ou agrupamentos de sons em posição
mas para formar palavras posteriormente a habilidade de inicial da sílaba (Hayes & Slater, 2008).
segmentar palavras em fonemas. As provas de Contagem de Fonemas (CgF), Síntese e
O procedimento utilizado é composto por provas ba- Análise de Fonemas (SAF), Identificação de Fonemas (IF),
seadas na revisão da literatura. Outro aspecto considerado Combinação de Fonemas (CbF) e Deleção de Fonemas
foi o fato de que os sujeitos avaliados neste estudo foram (DF) foram selecionadas a partir dos estudos que indicaram
selecionados a partir do 3º ano do ensino fundamental. Isso que a habilidade de identificar fonemas favorece o enten-
ocorreu devido ao destaque dado pela literatura, de que, dimento do alfabeto, pois as letras representam de algum
a consciência fonêmica se desenvolve simultaneamente à modo, fonemas (Torgensen & Bryant, 1993). As provas
aprendizagem da escrita, colaborando com o processo de de identificação de fonemas, contagem de fonemas ou
dominação das regras de conversão do grafema (símbolos deleção de fonemas, estariam relacionadas à alfabetização,
usados para representar um conjunto de fonemas em um já podendo ser observadas nas crianças com seis anos de
idioma determinado) ao fonema, desde os mais simples idade, sendo que essas tarefas seriam difíceis para crianças
aos mais complexos (Lamprecht, 2004). Assim, com base de até cinco anos de idade (Bryant, Maclean, Bradley, &
nesses aspectos e na revisão de literatura, foi possível sele- Crossland, 1990). A habilidade de identificar fonemas no
cionar 12 provas para compor o instrumento deste estudo, início, meio e fim e de segmentar fonema, favorece a per-

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Germano, G. D. & Capellini, S. A. (2015). Avaliação das Habilidades Metafonológicas (PROHFON): Caracterização e Comparação do
Desempenho em Escolares.

cepção que esses fonemas podem ser tanto deletados das aquisição da linguagem, a fim de possibilitar a avaliação
palavras formando uma nova palavra, como combinados dos mesmos nas provas do instrumento. Foram empregadas
para formar outra palavra (Chappell et al., 2009). palavras monossílabas, dissílabas, trissílabas e polissílabas
Posteriormente à escolha das provas, iniciou-se a e considerou-se a abertura e fechamento das vogais, ou
escolha dos estímulos linguísticos que comporiam esse seja, a resposta manteve a abertura ou o fechamento de
instrumento. Para a realização deste estudo, utilizamos a vogal compatível com a solicitação (evitar possíveis erros
perspectiva fonológica, a qual compreende dois modelos fonológicos, como por exemplo, foram excluídas palavras
principais que fornecem explicações para a estrutura da como “bolacha” [ô]/ “bola” [ó], “floresta” [é]/ “flores” [e]).
sílaba: o modelo linear e o modelo hierárquico, de acor- Estes critérios foram adotados para que o escolar tivesse a
do com a proposta de Câmera (1970a, 1970b) e Selkirk compreensão de que todas as habilidades podem ocorrer
(1982). O procedimento de avaliação ele foi composto por independentemente do tamanho da palavra. A maioria das
palavras e figuras retiradas de bancos de palavras e figuras palavras empregadas do Português brasileiro apresentava
elaboradas para este estudo. a estrutura silábica simples, como consoante-vogal (ex.:
Ambos foram escolhidos de acordo com os princípios tatu, boneca, pipa, vela, fogo), consoante-vogal-consoante
fonológicos da Língua Portuguesa, passando por critérios (ex.: tartaruga, canguru, balde), consoante-consoante-
linguísticos de inclusão e exclusão de palavras (Capellini, -vogal (ex.: chaminé).
Germano, & Cardoso, 2008). As palavras foram extraídas No Brasil, há vários procedimentos com a proposta de
do vocabulário escolar que consta do banco do Laboratório avaliar as habilidades metafonológicas, como A Prova de
de Investigações dos Desvios da Aprendizagem (LIDA) Consciência Fonológica por Figuras (PCFF; Capovilla &
/ Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho Capovilla, 2000), Perfil de Habilidades Fonológicas (PHF;
(UNESP) – Marília/SP, composto por palavras extraídas Carvalho, Alvarez, & Caetano, 1998), Protocolo de Tarefas
dos livros de Língua Portuguesa de 1º ao 4ª séries do en- de Consciência Fonológica (Cielo, 2002), Consciência
sino fundamental, utilizados na Rede Municipal de Ensino fonológica: instrumento de avaliação sequencial (Moojen
(Germano & Capellini, 2008). Este banco foi atualizado, et al., 2003), Teste de Desempenho Cognitivo - Linguís-
sendo composto por palavras que foram extraídas dos tico – versão individual do Teste (Smythe, Capellini, &
livros de língua portuguesa de 1º ao 6º ano do Ensino Silva, 2012), Provas de Habilidades Metalinguisticas e de
Fundamental I e II, utilizados na Rede Municipal de En- Leitura (Cunha & Capellini, 2009) de forma individual.
sino da cidade de Marília/SP (Germano, 2011; Germano O procedimento de avaliação elaborado neste estudo se
& Capellini, 2008). Este banco contava com palavras de diferencia dos demais, pelo fato do mesmo ser totalmente
várias classes gramaticais, como pronomes, preposições, elaborado com figuras. Essa particularidade visa diminuir
adjetivos, advérbios, verbos e substantivos. Como critérios a sobrecarga de memória fonológica e, dessa forma, obter
de exclusão, visto que o instrumento tinha como objetivo o resultados fidedignos dos escolares nas diferentes faixas
uso de figuras, foram excluídas as palavras que não pudes- etárias e com diferentes tipos de problemas de aprendiza-
sem ser representadas por figuras (pronomes, preposições, gem. Além disso, este procedimento pode ser aplicado de
adjetivos, advérbios, verbos). Além disso, como critérios forma coletiva, o que pode favorecer aos profissionais que
linguísticos para a exclusão de palavras do Português Bra- atuam na área da saúde e da educação identificar por meio
sileiro, considerou-se a “redução de sílabas” (Ex.: fósforo de rastreio as dificuldades metafonológicas de uma ma-
> [fósfuru] ~[fosfru]), “abertura e fechamento de vogais” neira rápida e precisa. Cabe ressaltarmos que a aplicação
(ex. bolacha [ô]/ bola [ó]); “Palavras com ditongo e hiato” coletiva também auxilia o escolar realizar uma atividade
(ex.: vai.da.de, va.i.da.de) e/ ou a “monotongação” (c[aj] de avaliação muito próxima da dinâmica vivenciada pelo
xa, c[a]xa); “palavras com nasalidade” (ex.: órgão, fala- mesmo em situação de sala de aula, oferecendo ao escolar
ram, homem); “tonicidade das vogais das sílabas” (seleção avaliado mais autonomia e conforto para escrever e/ou
de palavras cujos alvos solicitados estivessem presentes expressar suas respostas.
na posição de sílaba tônica); “neutralização” (ex. p[e]pino Desta forma, este seria mais um instrumento impor-
~ p[i]pino); “vocalização da consoante” (palavras com /l/ tante, dada as suas especificidades e particularidades,
pós-vocálico, realizado como consoante velar, pode mudar para verificar o desempenho de escolares em testes de
para /u/ assilábico ou /w/). consciência fonológica que depende da complexidade
Como critério de inclusão foi selecionado apenas subs- linguística do teste elaborado, pois o mesmo contempla
tantivos, que pudessem ser representados por figuras. O habilidades necessárias para verificar o mecanismo gera-
tipo de estímulo escolhido foi o visual (figuras de substan- tivo de memória de trabalho fonológica que outros pro-
tivos), a fim de fornecer o modelo de fonema ou de sílaba cedimentos já publicados e disponíveis não contemplam
alvo para o avaliador e aliviar a sobrecarga de memória em sua estrutura.
de trabalho fonológica para o escolar. As palavras sele- A partir dos estudos (Bradley & Bryant, 1983; Ca-
cionadas foram classificadas de acordo com a extensão da pellini, Butarelli, & Germano, 2010; Capellini et al.,
palavra (monossílabas, dissílabas, trissílabas e polissílabas) 2008; Cervera-Mérida & Ygual-Fernández, 2003; Chard
e colocadas em ordem alfabética. Além disso, buscamos & Dickson, 1999; Germano & Capellini, 2011; Gombert,
utilizar palavras que tivessem os fonemas /b/, /p/, /t/, /d/, 2003; Hayes & Slater, 2008; Manz et al., 2010) referidos
/k/, /g/, /f/, /v/, /s/, /z/, / /, / /, /l/ e /r/, de acordo com a na literatura nacional e internacional sobre a importância

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Psicologia: Reflexão e Crítica, 28(2), 213-222.

das habilidades e o desenvolvimento da leitura, a hipótese escola para apresentação do projeto original da pesqui-
deste estudo é de que o desempenho das habilidades me- sa. A pesquisadora, após autorização para realização da
tafonológicas melhora com a progressão da escolaridade. pesquisa se direcionava para a sala de aula, solicitava a
Com base nesta hipótese, o objetivo foi caracterizar e com- permissão do professor para a retirada dos escolares de
parar o desempenho de escolares com bom desempenho sua sala e transferi-los até a sala de aula disponibilizada,
acadêmico do 3º ao 6º ano do Ensino Fundamental I e II onde foi realizada a coleta. A pesquisadora informava à
nas Provas de Habilidades Metafonológicas (PROHFON), professora a duração de tempo médio necessário para
a fim de verificar se houve progressão no desempenho dos a aplicação do procedimento de avaliação. Caso algum
escolares nas provas silábicas e fonêmicas com o aumento escolar tivesse faltado naquele dia, o mesmo era convi-
da escolaridade. dado a participar no próximo dia de coleta. Já na sala
da coleta, a pesquisadora solicitava aos escolares que
Método sentassem em uma carteira, mantendo uma carteira vazia
entre eles. Após se acomodarem, cada escolar recebia
Este estudo foi submetido e aprovado pelo Comitê de um “Caderno de Respostas”, um lápis e uma borracha.
Ética em Pesquisa da Faculdade de Filosofia e Ciências A pesquisadora solicitou o preenchimento da folha de
(FFC/UNESP) – Marília/SP, sob número 1880/2008. To- rosto do “Caderno de Resposta” com o nome, a série e a
dos os responsáveis pelos escolares assinaram o Termo de idade e, em seguida passava pelas carteiras conferindo se
Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE). todos tinham preenchido. Somente após o preenchimento
da folha, iniciou as instruções contidas no “Caderno de
Participantes Questões” (avaliador).
Participaram deste estudo um total de 169 escolares Em seguida, foi realizada a leitura das instruções do
com bom desempenho acadêmico do 3º ao 6º ano do ensino “Caderno de Respostas” acompanhada pelos escolares. A
fundamental, de ambos os gêneros, com faixa etária entre pesquisadora ficou em posição visível à frente dos escola-
7 e 13 anos de idade, matriculados em escola regular do res e de posse de um “Caderno de Respostas”. Conforme
município de Marília/SP. Os escolares foram divididos ia lendo as instruções da folha de rosto de seu caderno, a
em: Grupo I (GI): 52 escolares do 3º ano do Ensino Fun- pesquisadora usava-o para demonstrar os exemplos conti-
damental; Grupo II (GII): 51 escolares do 4º ano do Ensino dos da folha de rosto do “Caderno de Resposta”.
Fundamental; Grupo I (GIII): 42 escolares do 5º ano do A pesquisadora deu início à aplicação do instrumento
Ensino Fundamental; Grupo IV (GIV): 24 escolares do 6º propriamente dito, a partir dos exemplos de cada prova.
ano do Ensino Fundamental. Todos escolares participantes Os exemplos eram realizados juntamente dos escolares
deste estudo apresentaram desempenho satisfatório (nota e, se houvesse necessidade, repetiam-se os exemplos e
acima de 5,0) em dois bimestres consecutivos em provas as explicações. Para cada pergunta foi dado um tempo
de Língua Portuguesa e Matemática, segundo a indicação para que os escolares escrevessem as respostas nos locais
dos professores e prontuários escolares. Esses critérios apropriados, passando para a pergunta seguinte. A pesqui-
são baseados no relatório do professor, previstos nos sadora orientou os escolares que só iria repetir a pergunta
Relatórios Pedagógicos do SARESP (Secretaria da Edu- uma única vez. Após o término da aplicação, recolheu os
cação do Estado de São Paulo, 2011). Neste estudo, foram cadernos, acompanhava os escolares até suas respectivas
considerados como critérios de exclusão dos participantes: salas de aula, e dava início à seleção do próximo grupo.
escolares com deficiência sensorial, motora ou cognitiva Esse processo foi repetido com os outros grupos de esco-
e a não apresentação do Termo de Consentimento Livre e lares até completar a amostra.
Esclarecido assinado pelos pais ou responsáveis. Como cri- Os resultados foram realizados a partir da análise es-
térios de inclusão: escolares com Termo de Consentimento tatística, sendo utilizado o programa Statistical Package
Livre e Esclarecido assinado pelos pais ou responsáveis e for Social Sciences (SPSS) 21.0 através da aplicação do
sem anotação referente à presença de deficiência sensorial, teste de Kruskal-Wallis, com o intuito de verificar possí-
motora ou cognitiva, queixa auditiva, visual ou motora, veis diferenças entre os quatro grupos estudados, quando
constante em prontuário escolar. comparados concomitantemente, para as variáveis de
interesse. Também foi aplicado o teste de Mann-Whitney,
Procedimentos ajustado pela Correção de Bonferroni, cujo objetivo foi
Os escolares foram submetidos à aplicação do pro- identificar quais grupos diferenciaram-se entre si, quando
cedimento de avaliação das habilidades metafonológicas comparados. Foi adotado o nível de significância de 5%
(PROHFON) desenvolvido por Germano (2011) e des- (0,05), indicado por asterisco*.
crito em Germano e Capellini (2011). A aplicação do
procedimento foi realizada em grupos (com no máximo Resultados
20 escolares), regularmente matriculados em escola
regular do município de Marília/SP. Antes de iniciar a A Tabela 1 traz os resultados dos desempenhos dos
aplicação do instrumento, a pesquisadora realizou uma grupos GI, GII, GIII e GIV em relação à média, desvio-
reunião com a diretora e a coordenadora pedagógica da -padrão e valor de significância.

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Germano, G. D. & Capellini, S. A. (2015). Avaliação das Habilidades Metafonológicas (PROHFON): Caracterização e Comparação do
Desempenho em Escolares.

Tabela 1
Resultados dos Desempenhos dos Grupos GI, GII, GIII e GIV em Relação à Média, Desvio-Padrão e Valor de
Significância

Variável Grupo n Média Desvio-padrão Percentil 25 Percentil 75 Valor de p


I 52 13,73 2,69 14,00 15,00
II 51 12,82 3,46 12,00 15,00
0,161
CgS III 42 14,14 1,54 14,00 15,00
IV 24 14,29 1,37 14,00 15,00
Total 169 13,64 2,63 13,00 15,00
I 52 6,75 5,33 1,00 12,00
II 51 7,49 5,23 3,00 13,00
0,829
CgF III 42 7,62 5,04 2,75 12,00
IV 24 7,33 5,41 2,00 13,00
Total 169 7,27 5,21 2,00 12,00
I 52 9,54 0,96 10,00 10,00
II 51 9,84 0,46 10,00 10,00
0,309
SAS III 42 9,81 0,55 10,00 10,00
IV 24 9,63 0,97 10,00 10,00
Total 169 9,71 0,75 10,00 10,00
I 52 8,92 2,30 8,00 10,00
II 51 9,69 0,79 10,00 10,00
0,002*
SAF III 42 8,86 1,87 9,00 10,00
IV 24 9,58 1,21 10,00 10,00
Total 169 9,23 1,73 9,00 10,00
I 52 12,87 3,28 12,25 15,00
II 51 13,57 1,88 12,00 15,00
0,256
IS III 42 13,83 1,94 12,75 15,00
IV 24 14,38 0,92 14,00 15,00
Total 169 13,53 2,37 13,00 15,00
I 52 8,56 3,80 7,00 12,00
II 51 11,22 3,33 9,00 14,00
0,001*
IF III 42 10,98 3,21 8,00 14,25
IV 24 9,96 2,48 8,25 11,75
Total 169 10,16 3,51 8,00 13,00
I 52 5,33 1,79 4,00 6,00
II 51 5,84 1,93 5,00 7,00
< 0,001*
R III 42 6,24 2,30 5,00 8,00
IV 24 7,75 2,36 5,25 9,75
Total 169 6,05 2,18 5,00 7,50
I 52 6,10 3,03 4,00 8,00
II 51 7,71 3,05 5,00 10,00
0,002*
A III 42 7,81 2,87 5,00 10,00
IV 24 8,00 1,75 6,25 9,00
Total 169 7,28 2,94 5,00 10,00
217
Psicologia: Reflexão e Crítica, 28(2), 213-222.

Variável Grupo n Média Desvio-padrão Percentil 25 Percentil 75 Valor de p


I 52 12,13 3,61 11,00 15,00
II 51 13,76 2,41 13,00 15,00
0,107
DS III 42 13,45 2,86 12,00 15,00
IV 24 13,67 1,79 12,25 15,00
Total 169 13,17 2,93 12,00 15,00
I 52 12,13 3,94 9,00 15,00
II 51 13,18 2,54 13,00 15,00
0,764
DF III 42 13,14 2,62 12,00 15,00
IV 24 13,08 2,59 11,25 15,00
Total 169 12,83 3,07 12,00 15,00
I 52 9,50 4,68 6,25 13,75
II 51 12,92 2,96 12,00 15,00
< 0,001*
CbS III 42 13,40 2,79 13,00 15,00
IV 24 10,38 3,46 9,00 13,00
Total 169 11,63 3,96 10,00 15,00
I 52 7,67 4,95 3,00 12,00
II 51 11,39 3,83 9,00 14,00
< 0,001*
CbF III 42 10,83 3,73 8,75 14,00
IV 24 8,13 4,13 5,00 11,00
Total 169 9,64 4,51 7,00 14,00
I 52 56,54 14,19 48,00 67,00
II 51 62,92 7,97 59,00 69,00
0,001*
TS III 42 64,64 6,72 61,00 69,25
IV 24 62,33 5,26 57,75 66,75
Total 169 61,30 10,27 58,00 68,00
I 52 44,04 13,64 33,50 55,75
II 51 52,96 10,95 43,00 63,00
0,003*
TF III 42 51,43 11,16 43,00 58,75
IV 24 48,08 8,50 42,25 55,75
Total 169 49,14 12,10 42,00 58,00
I 52 113,23 26,83 93,75 132,00
II 51 129,43 19,80 120,00 146,00
0,003*
T III 42 130,12 19,20 118,00 143,00
IV 24 126,17 13,25 119,75 138,50
Total 169 124,15 22,45 112,00 142,00
Nota. Legenda: contagem de sílaba (CgS) e de fonema (CgF), síntese e análise de sílaba (SAS) e de fonema (SAF), identificação de
sílaba (IS) e de fonema (IF), rima (R), aliteração (A), deleção de sílaba (DS) e de fonema (DF), combinação de sílaba (CbS) e de
fonema (CbF), total silábico (TS), total fonêmico (TF) e total das provas (T). *Valores significativos (p≤0,05).

Na Tabela 1 pudemos observar que houve diferença combinação de sílaba (CbS) e de fonema (CbF) e os totais
estatisticamente significante entre os grupos GI, GII, GIII silábicos (TS), fonêmicos (TF) e total da prova (T).
e GIV, nas provas de síntese e análise de fonema (SAF), A Tabela 2 apresenta a comparação do desempenho
identificação de fonema (IF), rima (R), aliteração (A), entre os escolares dos quatro grupos avaliados, em relação
às provas de habilidades metafonológicas.

218
Germano, G. D. & Capellini, S. A. (2015). Avaliação das Habilidades Metafonológicas (PROHFON): Caracterização e Comparação do
Desempenho em Escolares.

Tabela 2
Comparação do Desempenho entre os Escolares dos Quatro Grupos Avaliados, em Relação às Provas de Habilidades
Metafonológicas

Par de Grupos
Variável
I x II I x III I x IV II x III II x IV III x IV

CgS 0,186 0,579 0,355 0,077 0,060 0,633


CgF 0,469 0,408 0,526 0,892 0,887 0,941
SAS 0,102 0,143 0,556 0,940 0,489 0,546
SAF 0,002* 0,826 0,025 0,003* 0,886 0,024
IS 0,609 0,131 0,107 0,274 0,185 0,892
IF < 0,001* 0,003* 0,079 0,629 0,069 0,224
R 0,091 0,016 < 0,001* 0,283 0,001* 0,023
A 0,004* 0,003* 0,001* 0,815 0,982 0,638
DS 0,117 0,026 0,134 0,256 0,857 0,509
DF 0,492 0,363 0,387 0,775 0,850 0,899
CbS < 0,001* < 0,001* 0,711 0,184 0,001* < 0,001*
CbF < 0,001* 0,002* 0,801 0,406 0,002 0,010
TS 0,009 < 0,001* 0,228 0,198 0,282 0,019
TF 0,001* 0,011 0,314 0,470 0,040 0,165
T 0,002* 0,002* 0,071 0,957 0,258 0,217

Nota. Legenda: contagem de sílaba (CgS) e de fonema (CgF), síntese e análise de sílaba (SAS) e de fonema (SAF), identificação de
sílaba (IS) e de fonema (IF), rima (R), aliteração (A), deleção de sílaba (DS) e de fonema (DF), combinação de sílaba (CbS) e de
fonema (CbF), total silábico (TS), total fonêmico (TF) e total das provas (T). Alfa de Bonferroni = 0,008512. *Valores significativos
(p≤0,05).

Os resultados da Tabela 2 indicaram que houve dife- (R) e aliteração (A). Para essa comparação, observamos
rença estatisticamente significante na comparação entre que a habilidade de rima foi adquirida apenas tardiamente,
os escolares do GI e GII nas provas de síntese e análise ou seja, a diferença entre os desempenhos só ocorreu quan-
fonêmica (SAF), identificação de fonema (IF), aliteração do os escolares dos grupos GI e GII (Ensino Fundamental
(A), combinação de sílaba (CbS) e de fonema (CbF), total I) foram comparados com os escolares de GIV (Ensino
fonêmico (TF) e total das provas (T). Desse modo, quando Fundamental 2; não houve diferença estatisticamente
observamos as habilidades em relação à progressão da significante nas comparações GI x GIV e GII x GIV para
escolaridade, verificamos que a habilidade de síntese e as provas de rima e aliteração). Na comparação entre os
análise fonemica (SAF), identificação de fonema (IF), grupos GII e GIII, observou-se diferença estatisticamen-
aliteração (A), combinação de sílaba (CbS) e de fonema te significante na prova de síntese e análise fonêmica
(CbF) foram adquiridas e, posteriormente sistematizadas (SAF), indicando que as habilidades foram adquiridas e,
entre o 3º e 4º ano (comparação GI x GII). posteriormente sistematizadas entre o 3º e 4º ano (com-
Na comparação entre os escolares do GI e GIII, hou- paração GI x GII). Na comparação entre os grupos GII e
ve diferença estatisticamente significante nas provas de GIV, observou-se diferença estatisticamente significante
identificação de fonema (IF), aliteração (A), combinação nas provas de rima (R) e combinação de sílaba (CbS) e
de sílaba (CbS) e de fonema (CbF), total silábico (TS) e fonema (CbF).
total das provas (T), sendo que o desempenho do GI foi Na comparação entre os grupos GIII e GIV, observou-
inferior ao do GIII, evidenciando que houve melhora da -se diferença estatisticamente significante na prova de com-
aquisição das habilidades mencionadas em relação ao binação de sílaba (CbS), evidenciando que houve melhora
aumento da escolaridade. na aquisição das habilidades mencionadas, em relação ao
Na comparação entre os grupos GI e GIV, observou-se aumento da escolaridade, tanto na comparação entre GII
diferença estatisticamente significante nas provas de rima e GIV, como na comparação de GIII e GIV.
219
Psicologia: Reflexão e Crítica, 28(2), 213-222.

A Tabela 3 traz os valores de percentil 25 e 75, os A classificação foi realizada “sob atenção” referente ao
quais foram utilizados para a classificação dos grupos GI, desempenho abaixo do valor do percentil 25 (exclusive) e
GII, GIII e GIV, em relação às provas metafonológicas. “Esperado” - para os valores acima do valor do percentil
25 (inclusive).

Tabela 3
Valores de Percentil 25 e 75 e Classificação de GI, GII, GIII e GIV em Relação às Provas Metafonológicas

3º ANO 4º ANO 5º ANO 6º ANO


Variável
SA E SA E SA E SA E

CgS 0-13 14-15 0-11 12-15 0-13 14-15 0-13 14-15


CgF 0-1 2-15 0-2 3-15 0-2 3-15 0-1 2-15
SAS 0-9 10 0-9 10 0-9 10 0-9 10
SAF 0-8 8-10 0-9 10 0-8 8-10 0-9 10
IS 0-11 12-15 0-11 12-15 0-11 12-15 0-13 14-15
IF 0-6 7-15 0-8 9-15 0-7 8-15 0-8 9-15
R 0-3 4-10 0-4 5-10 0-4 5-10 0-5 6-10
A 0-3 4-10 0-4 5-10 0-4 5-10 0-6 7-10
DS 0-11 12-15 0-12 13-15 0-11 12-15 0-12 12-15
DF 0-8 9-15 0-12 13-15 0-11 12-15 0-11 12-15
CbS 0-6 7-15 0-11 12-15 0-12 13-15 0-8 9-15
CbF 0-2 3-15 0-8 9-15 0-8 9-15 0-4 5-15
TS 0-47 48-70 0-58 59-70 0-60 61-70 0-57 58-70
TF 0-33 34-70 0-42 43-70 0-42 43-70 0-42 43-70
T 0-93 94-160 0-121 122-160 0-117 118-160 0-119 120-160

Nota. Legenda: contagem de sílaba (CgS) e de fonema (CgF), síntese e análise de sílaba (SAS) e de fonema (SAF), identificação de
sílaba (IS) e de fonema (IF), rima (R), aliteração (A), deleção de sílaba (DS) e de fonema (DF), combinação de sílaba (CbS) e de
fonema (CbF), total silábico (TS), total fonêmico (TF) e total das provas (T). SA: sob-atenção; E: esperado.

Discussão rima representa unidades denominadas unidades intra-


-silábicas e, em termos de tamanho, ficariam entre a sílaba
Os escolares deste estudo não apresentaram dificulda- e fonemas finais (Antony & Francis, 2005; Bryant et al.,
des em relação a maioria das habilidades silábicas (con- 1990). Assim, os autores referiram que a habilidade de
tagem de sílaba, síntese e análise, identificação, deleção rima é uma das primeiras habilidades metafonológicas a
e combinação). Já em relação às habilidades fonêmicas, ser desenvolvida, ocorrendo antes mesmo da alfabetização,
os escolares apresentaram dificuldades na maioria das ao longo do desenvolvimento da fala na oralidade. Além
provas, com exceção das provas de identificação, deleção disso, o desenvolvimento dessa habilidade irá impactar a
e combinação. Isto demonstrou que com a progressão da aprendizagem da leitura e escrita, pois constituem a base
escolaridade, os escolares do GI ao GIV, apresentaram para a leitura e a escrita. Assim, quanto mais sensível a
aumento do número de acerto nestas habilidades, princi- criança for aos componentes dos sons (sílabas, rimas,
palmente as silábicas, mas o mesmo não ocorreu com as fonemas), melhor leitora ela será, independentemente
habilidades fonêmicas. Os resultados deste estudo demons- da inteligência, recepção de vocabulário, habilidades de
traram que os escolares, independente da seriação escolar, memória e classe social (Antony & Francis, 2005; Bryant
apresentaram dificuldades nas habilidades fonêmicas de et al., 1990).
contagem, de síntese e análise e na habilidade supras- Os resultados deste estudo indicaram que os escolares
segmental (rima); sendo que para essas habilidades, os apresentaram dificuldades nas habilidades de síntese e
escolares não apresentaram melhora de seus desempenhos análise fonêmica, contagem de fonema e rima, sendo que
mesmo com o aumento da escolaridade. Por definição, a essa dificuldade de percepção do menor segmento da fala

220
Germano, G. D. & Capellini, S. A. (2015). Avaliação das Habilidades Metafonológicas (PROHFON): Caracterização e Comparação do
Desempenho em Escolares.

continuou, mesmo com o aumento da seriação (do 3º ao na leitura e escrita em decorrência da escola não enfatizar
5º ano). As habilidades de contagem de fonema e síntese o ensino da ortografia, pela frágil fundamentação teórica e
e análise de fonema estão relacionadas ao período de al- pratica de seus educadores (Capellini et al., 2010; Germano
fabetização, o que não ocorre com a habilidade de rima, a & Capellini, 2011).
qual deve ser adquirida antes mesmo do ingresso na escola Com base no exposto, talvez possamos explicar o fato
(Bryant et al., 1990; Gray & McCutchen, 2006). A aqui- dos escolares deste estudo apresentarem dificuldades na
sição dessas habilidades fonêmicas e de rima favorecem realização das provas metafonológicas elaboradas para
o entendimento do alfabeto, pois as letras representam este estudo, pois quando o princípio alfabético da Língua
de algum modo fonemas (Torgensen & Bryant, 1993). Portuguesa não é ensinado sistematicamente no contexto
A percepção do fonema possibilita que o escolar faça a de sala de aula, os escolares em fase de desenvolvimento
associação grafema-fonema, e perceba que os fonemas da leitura e escrita podem e vão apresentar falhas em ha-
podem ser combinados para formar outra palavra, contri- bilidades de detectar, discriminar, comparar e memorizar
buindo, assim, para o mecanismo gerativo de memória, sons e silabas, conforme os achados encontrados neste
que converte a fonologia em ortografia (Chappell et al., estudo; o que pode acarretar dificuldade no acionamento
2009). Este mecanismo dará condições à criança para que do mecanismo gerativo para a formação de palavras para
ela leia qualquer palavra nova, apesar de cometer erros em a leitura e escrita (Germano & Capellini, 2011).
palavras irregulares.
Apesar de vários autores, como Cervera-Mérida e Conclusão
Ygual-Fernández (2003), Chard e Dickson (1999) e Manz
et al. (2010) referirem que as habilidades metafonológi- A partir dos achados desse estudo, foi possível concluir
cas se desenvolvem num continuum, que evolui a partir que houve melhora no desempenho dos escolares, quando
da habilidade da rima até as habilidades mais complexas comparados os desempenhos do 3o ao 6o ano para a maio-
(combinação e segmentação de sílabas e de fonemas). ria das habilidades silábicas (contagem de sílaba, síntese
Observamos neste estudo, que os escolares, independente e análise, identificação, deleção e combinação) e para
da seriação, tiveram dificuldades em desenvolver desde algumas habilidades fonêmicas (identificação, deleção e
as habilidades mais primitivas, tais como a rima e a ali- combinação). Os escolares dos grupos GI, GII, GIII e GIV,
teração, até as mais complexas (deleção e combinação), apresentaram dificuldades principalmente nas habilidades
mesmo com o aumento da escolaridade. Haase (1990) e fonêmicas de contagem, de síntese e análise e de rima.
Lamprecht (2004) referiram que, sem a oportunidade de Sendo assim, o PROHFON pode vir a ser um instru-
acesso à instrução direta, a consciência fonológica não é mento de auxílio tanto os profissionais da saúde quanto os
adquirida por aproximadamente 25% dos estudantes da da educação, no estabelecimento do perfil de habilidades e
primeira série do ensino fundamental de classe média, dificuldades em habilidades metafonológicas, o que pode
podendo acarretar dificuldades na aprendizagem da leitura contribuir futuramente para uma melhor compreensão
e da escrita. Esses achados não corroboram com o referido entre estas habilidades e o desenvolvimento da leitura
na literatura científica nacional e internacional e aos PCNs e da escrita em escolares em fase de alfabetização. Este
(Secretaria de Educação Fundamental, 1997). Os PCNs, instrumento também contribuiu para verificar que, não fo-
utilizados nas escolas brasileiras, fizeram referência de que ram todas as habilidades metafonológicas que os escolares
a capacidade cognitiva tem grande influência na postura do deste estudo apresentaram domínio durante o avanço na
indivíduo em relação às metas que quer atingir nas mais escolarização; isto porque quando estas habilidades não são
diversas situações da vida. Assim, de acordo com o mesmo, trabalhadas sob controle de instrução formal em situação
a língua é um sistema que se estrutura no uso e para o uso, de sala de aula, os escolares não dominam competências
escrito e falado, sempre contextualizado. Entretanto, a necessárias para a aquisição do principio alfabético da
condição básica para o uso escrito da língua, que é a apro- Língua Portuguesa.
priação do sistema alfabético, envolve, da parte dos alunos,
aprendizados muito específicos relativos aos componentes Referências
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Jornal da Sociedade Brasileira de Fonoaudiologia, 23(2), Recebido: 04/10/2013
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Gombert, J. E. (2003). Atividades metalinguísticas e aquisição 2ª revisão: 23/03/2014
Aceite final: 08/05/2014

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