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FUNDAÇÃO EDUCACIONAL “MANOEL GUEDES”

Escola Técnica “Dr. Gualter Nunes”

Curso de Habilitação Profissional de Técnico em Farmácia

Produção de Produtos Fitoterápicos

MÓDULO III

Tatuí-SP

2019

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Conteúdo
1 INTRODUÇÂO .............................................................................................................. 1
2 PLANTAS MEDICINAIS: HISTÓRIA, TRADIÇÃO E ATUALIDADE ............................. 2
3 A FITOTERAPIA NO SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE (SUS) ......................................... 8
4 LEGISLAÇÃO DE FITOTERÁPICOS ......................................................................... 10
4.1 A Situação do Registro de Medicamentos Fitoterápicos no Brasil................ 12
5 CONCEITOS BÁSICOS EM FITOTERAPIA ............................................................... 14
6 CONSTITUINTES QUÍMICOS DAS PLANTAS MEDICINAIS .................................... 16
6.1 Ácidos Orgânicos ............................................................................................... 19
6.2 Alcalóides ............................................................................................................ 20
6.3 Compostos Fenólicos ........................................................................................ 21
6.4 Compostos Inorgânicos ..................................................................................... 21
6.5 Glicosídeos ou Heterosídeos ............................................................................ 22
6.6 Antracênicos ....................................................................................................... 22
6.7 Cumarinas ........................................................................................................... 22
6.8 Saponinas............................................................................................................ 23
6.9 Flavonóides ......................................................................................................... 23
6.10 Glicosídeos Cardioativos ................................................................................. 24
6.11 Glicosídeos Cianogenéticos ............................................................................ 24
6.12 Gomas e Mucilagens ........................................................................................ 25
6.13 Óleos Essenciais .............................................................................................. 26
6.14 Taninos .............................................................................................................. 26
7 PREPARO E PADRONIZAÇÃO DE FITOTERÁPICOS.............................................. 27
7.1 Coleta ................................................................................................................... 27
7.2 Triagem ................................................................................................................ 28
7.3 Secagem .............................................................................................................. 29
7.4 Operações Mecânicas de Divisão ..................................................................... 31
7.5 Tamização ........................................................................................................... 33
7.6 Extração .............................................................................................................. 35
7.7 Fatores que influenciam na extração................................................................ 39
7.8 Tipos de Extratos ................................................................................................ 42
7.9 Padronização de extratos .................................................................................. 47
8 DESENVOLVIMENTO DE FORMULAÇÕES FITOTERÁPICAS ................................ 49
8.1 Formas farmacêuticas líquidas ......................................................................... 51
8.2 Formas farmacêuticas semissólidas ................................................................ 57
8.3 Formas farmacêuticas sólidas .......................................................................... 62
REFERÊNCIAS .............................................................................................................. 64

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1 INTRODUÇÂO

O uso de plantas medicinais pela população, em busca da cura para as mais variadas
moléstias, é um costume muito difundido não só em nosso país como em todo mundo. Esta
prática foi sedimentando-se ao longo do tempo como resultado do acúmulo de conhecimentos
sobre a ação das plantas por diversos grupos étnicos.
Atualmente constata-se um aumento marcante na utilização de plantas medicinais,
estimulado de forma pouco criteriosa pelos meios de comunicação além de outros fatores como
crise econômica, o alto custo dos medicamentos industrializados, o difícil acesso da população
a assistência médica, bem como uma tendência generalizada dos consumidores em utilizar
produtos de origem natural, atitude esta decorrente do aumento da consciência ecológica dos
últimos anos.
Paralelamente a utilização popular de chás, garrafadas, cataplasmas e outras formas de
uso, as plantas medicinais vêm sendo utilizadas também em formas farmacêuticas, elaboradas
industrialmente, para a comercialização, os denominados fitoterápicos.
Os fitoterápicos sempre se apresentaram como uma parcela significativa do mercado de
medicamentos. O setor movimenta no mundo cerca de US$ 21,7 bilhões ao ano e no Brasil
cerca de US$ 160 milhões, sendo que o maior atrativo neste setor é o crescimento das vendas
anuais que atingem cerca de 20% de crescimento contra apenas 5% dos medicamentos
sintéticos (dados de 2005).

2 PLANTAS MEDICINAIS: HISTÓRIA, TRADIÇÃO E ATUALIDADE

Ao longo da história, o homem sempre buscou a superação dos seus males. Inúmeras
etapas marcaram a evolução da arte de curar. Porém, é difícil delimitá-las com exatidão, uma
vez que a arte de curar esteve, por muito tempo, associada às práticas mágicas, místicas e
ritualísticas. Em todas estas etapas, as práticas de cura utilizaram as plantas medicinais.
Inicialmente, o homem se preocupou com o alívio imediato dos sintomas das doenças,
principalmente a dor e, posteriormente, se dedicou ao entendimento do funcionamento do
organismo, na saúde e na doença. E para curá-lo, utilizava-se daquilo que a natureza oferecia,
com destaque para a utilização das plantas.
O homem sempre observou como os animais utilizavam as plantas e os efeitos que as
mesmas eram capazes de provocar. Se determinada planta provocava um efeito benéfico para
o animal, deduzia-se que, certamente, para o homem também ocorreria o mesmo.

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Mas o conhecimento da utilização das plantas como medicamento não foi adquirido
apenas observando os animais. O homem sempre utilizou as plantas como fonte de alimentos
e observava os efeitos que elas provocavam no seu organismo. Em função disto, foi fazendo a
triagem das plantas que tinham atividades alimentícias, medicinais e tóxicas, etc.
Na antiguidade, acreditava-se na magia do reino vegetal e isto podia ser descoberto e
usado por meio do conhecimento empírico das plantas. Usadas com finalidades místicas ou
não, ao longo do tempo, as plantas adquiriram respeitabilidade em todas as civilizações pela
demonstração do seu potencial terapêutico no processo saúde-doença, bem como de suas
propriedades tóxicas.
As primeiras informações escritas sobre as plantas medicinais foram encontradas em
escavações na Mesopotâmia, em 1872, e datam do século 16 a.C. São os Papiros de Ébers,
escrito egípcio que inclui mais de 700 prescrições com produtos naturais, principalmente as
plantas, dentre elas, alho, rícino, mirra, aloe, linho, tomilho, canabis, funcho, açafrão, entre
outros.
Na verdade, as plantas foram a primeira fonte onde se buscou recurso para a
intervenção no adoecimento humano. A Bíblia faz referência ao uso de alho, poejo, cominho,
menta, urtiga, etc.
Os egípcios deram grande contribuição à Fitoterapia pelo uso que faziam das plantas,
não apenas para curar as doenças, mas também para embalsamar os corpos e para os rituais
religiosos. Os egípcios usavam muitas preparações com plantas que apresentavam
propriedades aromáticas, antissépticas e cosméticas, além de cultivarem plantas purgativas,
diuréticas, vermífugas, etc.
Já os assírios cultivavam várias plantas que serviam de matéria-prima para a
preparação de tinturas, unguentos, águas aromáticas, ao passo que os hebreus usavam as
plantas que cultivavam para a realização de suas cerimônias e oferendas, a exemplo da mirra.
Na China, existem relatos de cura com plantas, desde 3000 a.C. Por isto, a China é
considerada o berço do uso das plantas com propriedades medicinais. Na literatura, é citado
que o imperador Shen Nung, considerado o Hipócrates chinês, estudou e relatou, no livro das
ervas, o poder terapêutico e tóxico de mais de 300 espécies de plantas.
Hipócrates, considerado o pai da medicina ocidental, acreditava que a prevenção e a
cura das doenças encontravam-se na natureza, cabendo ao homem apenas a sua
decodificação. Com este entendimento, reuniu em sua obra, Corpus Hipocraticum, um conjunto
de informações a cerca do tratamento das enfermidades, com remédios à base de plantas. Ele
foi seguido por muitos outros, como Teofrasto, Plínio, Asclepíades, Pelacius, Dioscórides, etc.

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Dioscórides (40-90) realizou a primeira compilação sistemática de plantas, na sua obra
chamada de Matéria Médica. Nela, estão catalogadas 579 plantas e descritos 4.700 usos e
formas de atuação destas plantas. Este livro foi de grande importância para a medicina
européia, até o século XVII.
A Índia é o país que, ao lado da China, tem grande tradição na utilização das plantas
medicinais, que constituem a base da terapêutica da Medicina Ayurvédica. Lá, foram escritas
várias obras sobre medicamentos à base de plantas, como sândalo, canela, cardamono e
sobre a preparação de elixires, tinturas, essências, sucos, extratos, etc.
Foi no século II depois de Cristo que as plantas ganharam uma maior utilização na
terapêutica. Isto se deve ao trabalho incansável de vários estudiosos como Galeno, que
escreveu várias obras e ganhou notoriedade dentro da farmacologia pela preparação de suas
formulações, hoje denominadas fórmulas galênicas.
Com a queda do império romano, ocorreu o descrédito do conhecimento médico porque
este já não era capaz de atender à demanda das patologias existentes. Neste período, a
guarda e a reprodução de escritos relacionados à medicina foram confinadas nos mosteiros,
que passaram a funcionar como depositários dos conhecimentos médicos. Era comum, nestes
locais a existência de grandes jardins medicinais.
A igreja que já exercia um grande poder com relação à questão espiritual passou a ser
detentora de poder sobre o corpo físico, pois eram os religiosos os responsáveis pelas
transcrições dos registros. A população, no entanto, encontrava-se totalmente desprovida de
cuidados e por si só passou a desenvolver práticas de cura. É dentro desse contexto que surge
a medicina popular, permeada de práticas mágicas exercidas por curandeiros, bruxos, viajantes
e a população em geral.
Na Idade Média, há o redimensionamento dos saberes popular e erudito a cerca das
plantas. Neste período ganhou prestígio a teoria das assinaturas. Por ela, acreditava-se que a
cura se encontrava na natureza cabendo ao homem a decodificação dos sinais. Por exemplo,
para tratar uma patologia que acometia os rins usavam-se as plantas que tinham o formato de
feijão, que é o formato dos rins. Para enfermidades no cérebro, plantas com formato de nozes,
etc.
A partir do séc. XVI houve grandes transformações e inovações no campo das artes, da
filosofia, da ciência, culminando com o Renascimento.
Neste período, três fatores contribuíram para a consolidação da Fitoterapia: o avanço da
botânica que foi incrementado pelo estudo classificatório das plantas; a disseminação do
herbalismo, com a criação de herbários e jardins de plantas medicinais, principalmente junto às

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universidades e a descoberta e a troca de plantas medicinais entre diferentes regiões, devido
às grandes navegações e ao estabelecimento de rotas comerciais.
No Brasil, os primeiros registros sobre o uso de plantas datam do século XVI e
correspondem aos manuscritos do Padre. Anchieta. Nestes, ele relata que nas pescarias feitas
pelos índios que aqui habitavam, os peixes vinham à tona apenas com o toque de cipós na
água. Posteriormente, isto foi explicado com a descoberta das substâncias narcóticas e
curarizantes contidas nas plantas por eles utilizadas. Os jesuítas tiveram grande importância na
difusão dos conhecimentos dos indígenas sobre as plantas medicinais para a população em
geral.
Ao longo da história da Colônia, foi se consolidando o uso de plantas medicinais nativas
do Brasil com aquelas trazidas pelos portugueses e africanos, concomitantemente com práticas
religiosas. A movimentação de pessoas que faziam o desbravamento do interior do país, em
busca do ouro ou de índios para a escravização, foi fundamental na troca de informações sobre
o uso das plantas medicinais.
Também cabe destaque a alguns estudiosos que fizeram a compilação das plantas
usadas pelas diversas comunidades, em publicações muito importantes como fontes históricas
e científicas no uso de plantas medicinais.
No século XX, a obra mais importante sobre plantas medicinais é o Dicionário das
Plantas Úteis do Brasil e das Exóticas Cultivadas, de Pio Correia, uma coleção de 06 volumes,
publicada a partir de 1926.
O séc. XIX foi marcado pela construção do saber anatomofisiopatológico. Então, houve
o afastamento das ciências médicas do saber herbalístico e passou-se a valorizar a
sintomatologia, respaldada pelas teorias de Clark, médico biologicista.
Em 1805, pela primeira vez foi isolado um princípio ativo de planta, a morfina, um
alcalóide da papoula e em 1838 a salicina foi extraído do salgueiro. A partir dele, em 1860, foi
sintetizado o primeiro medicamento em laboratório, a aspirina. Com base nesta técnica, houve
um crescente desenvolvimento da química e novas substâncias foram isoladas em laboratório e
delas novos produtos de síntese foram surgindo, levando à paulatina substituição do uso das
plantas pelos medicamentos produzidos em laboratório, o que ocorreu de forma plena na
segunda metade do século XX, motivado por vários fatores, dentre eles um dos mais
importantes foi a descoberta dos antibióticos.
Paralelo à substituição da planta pelo medicamento feito a partir de drogas sintéticas,
houve também um intenso trabalho de desqualificação do saber popular sobre as plantas
medicinais, como prova a proibição da prática da fitoterapia por pessoas leigas e até mesmo
por médicos que ocorreu em diversos países.
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Esta ofensiva contra as plantas medicinais e o saber popular, não se restringiu aos
países mais desenvolvidos, mas se expandiu às colônias, na América, na África e na Ásia.
Como exemplo, temos a proibição, por parte da Inglaterra, do uso de plantas medicinais na
Índia, algo injustificável, tendo em vista que este país, ao lado da China, tem o uso de plantas
fortemente arraigado nos seus sistemas de cura.
Nos Estados Unidos, em 1907, o governo deixou de dar subsídios às escolas médicas
que ensinassem o uso de plantas medicinais.
No Brasil, a Fitoterapia chegou ao século XX como a terapêutica mais usada, apesar do
declínio acarretado pelo surgimento do conhecimento biológico. Esse período foi marcado pela
prosperidade econômica impulsionada pela cultura do café, pela grande imigração de
europeus, pelo aumento da urbanização, pelo incremento da exportação e pelo início da
industrialização. Tudo isto levou ao agravamento da situação sanitária das cidades, provocando
o surgimento das grandes endemias e epidemias. Neste novo contexto econômico, sanitário e
científico o uso de plantas não era mais adequado.
Neste período, em todo o mundo, em função da acelerada construção de conhecimento
na área da saúde, a Biomedicina se fortaleceu como racionalidade médica capaz de nortear o
entendimento e o manuseio do processo saúde/doença. Neste modelo biologicista, não havia
muito espaço para a utilização de plantas medicinais devido à sua vinculação com o
conhecimento popular. O método científico foi erigido à categoria de única forma de construir e
aplicar conhecimentos verdadeiros e eficazes. Foi também o início da indústria farmacêutica,
com sua promessa de descobertas de medicamentos capazes de combater todas as doenças e
com acessibilidade a toda a população. Esta nova conjuntura favoreceu a mercantilização da
saúde e a doença da população passou a ser vista como fonte de lucros.
No Brasil, e no mundo, a Fitoterapia perdeu espaço para o medicamento sintético,
produzido em larga escala. Em síntese, os motivos que levaram à diminuição do uso das
plantas medicinais, ao longo do século XX, foram:
• Desenvolvimento científico e tecnológico, com repercusões na área da saúde;
• Consolidação e expansão das profissões da área da saúde, fazendo com que
aumentasse significativamente o número de pessoas com acesso a esses profissionais, que
não usavam a Fitoterapia;
• Combate à prática de cura por pessoas leigas, que normalmente usavam as
plantas medicinais, por parte dos profissionais de saúde e suas entidades de representação;
• Desqualificação dos saberes populares e exaltação do conhecimento científico
como o único conhecimento correto e confiável;
• Desenvolvimento da indústria farmacêutica e descoberta de novos fármacos;
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• Praticidade do uso do medicamento industrializado;
• Falta ou insuficiência de estudos comprobatórios da eficácia e da segurança dos
fitoterápicos;
• Falta de contato da população urbana com as plantas medicinais, levando a sua
desvalorização;
• Mercantilização da saúde.
Posteriormente, pôde-se observar a lacuna existente entre o proposto e o real. A partir
da década de 60, começou a ocorrer o desencanto com a promessa da eficácia, da segurança
e da eficiência da medicalização da população. Sua eficácia não foi suficiente para vencer as
doenças já que estas são resultado de múltiplos fatores, dentre eles a falta de condições
econômicas que propiciem uma vida saudável, com qualidade. Além disto, o medicamento
sintético tem custos que o tornam inacessível para uma grande parcela da população. Estas
pessoas continuaram a fazer uso das plantas medicinais.
O desencanto com o medicamento sintético estava inserido no contexto do desencanto
com a sociedade tecnológica e capitalista que havia criado a expectativa de que a tecnologia
traria facilidades e abundância para todos. Isto fez com que ocorresse a busca por uma vida
natural, tendência esta que se consolidou nas décadas seguintes, levando ao ressurgimento e
ao fortalecimento da Fitoterapia, no mundo todo.
Esta tendência de crescimento tem se verificado em todo o mundo. Na Europa, em
países como a Inglaterra, a Alemanha e a Espanha, medicamentos fitoterápicos são muito
consumidos por grande parte da população. Este crescimento também se observa nas
universidades, por meio do ensino e da pesquisa sobre as plantas medicinais.
Nos Estados Unidos da América este crescimento também ocorre, mas os fitoterápicos
são comercializados como suplementos alimentares.
A Fitoterapia e outras medicinas naturais e práticas complementares podem ser usadas
ao mesmo tempo em que se usa a alopatia, de forma substitutiva ou complementar entre si,
dependendo da natureza da doença, das condições econômicas do paciente, da estrutura dos
serviços de saúde e da capacitação dos profissionais de saúde.
A retomada da Fitoterapia nos últimos tempos ocorreu em função de uma série de
fatores, como os estudos científicos que comprovam a sua eficácia, sua segurança e sua
efetividade; acesso fácil às plantas; credibilidade da população na sua eficácia e na sua
segurança; inserção da Fitoterapia no contexto cultural da população; utilização das plantas
medicinais por meio de formas de preparação simples; crença na baixa possibilidade de
provocar efeitos adversos, etc.

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Contudo, é necessário saber que a ação terapêutica da planta medicinal e do
medicamento fitoterápico é baseada no mesmo princípio do medicamento alopático que é a
cura por meio de princípios ativos que também podem ter efeitos adversos, o que demanda
cuidados. É preciso superar o mito de que planta, por ser natural, não faz mal.
Quando não se utiliza a dose correta, a preparação e a via adequadas, a planta, mesmo
sendo medicinal, poderá causar transtornos ao indivíduo, como uma intoxicação.

3 A FITOTERAPIA NO SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE (SUS)

Com a criação do Sistema Único de Saúde (SUS), em 1990, estabeleceu-se a


universalização do atendimento e sua integralidade. Como consequência, passou-se a valorizar
as múltiplas formas de tratamento. Dentro deste novo enfoque, a Fitoterapia ganhou muitos
adeptos entre os profissionais de saúde, os gestores e os usuários do SUS e entre professores
e pesquisadores das universidades.
Atualmente, a atenção básica no SUS é feita principalmente por meio das equipes do
Programa Saúde da Família (PSF) que atendem nas Unidades Básicas de Saúde da Família
(UBSF). Estas unidades estão situadas nas próprias comunidades. As situações de
adoecimento atendidas pelas equipes do PSF, na sua maioria, podem ser tratadas com a
Fitoterapia. Disto resulta a importância de que a Fitoterapia seja incrementada no Sistema
Único de Saúde (SUS).
Em 1988, portanto antes da criação do SUS, a Resolução Nº. 08 da Comissão
Interinstitucional de Planejamento e Coordenação (CIPLAN) disciplinou a implantação e
implementação da Fitoterapia nos serviços de saúde. Contudo, a mera existência da lei não foi
capaz de levar este objetivo a termo. Mas, apesar das dificuldades, a Fitoterapia e outras
medicinas naturais e práticas complementares cresceram bastante.
Reflexo deste crescimento, em 03 de maio de 2006, o Ministério da Saúde por meio da
PORTARIA GM nº 971, publicada em Diário Oficial da União, propôs a Política Nacional de
Práticas Integrativas e Complementares (PNPIC), incluindo plantas medicinais e fitoterapia,
homeopatia, entre outras, como opção terapêutica no Sistema Único de Saúde (SUS). A
criação desta política foi muito importante já que ela estabelece diretrizes e medidas para a
implantação e o desenvolvimento das práticas que ela contempla. Na área da Fitoterapia as
diretrizes são:
1- Elaboração da Relação Nacional de Plantas Medicinais e da Relação Nacional de
Fitoterápicos;
2- Provimento do acesso a plantas medicinais e fitoterápicos aos usuários do SUS;
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3- Formação e educação permanente dos profissionais de saúde em plantas medicinais
e Fitoterapia;
4- Acompanhamento e avaliação da inserção e implementação das plantas medicinais e
Fitoterapia no SUS;
5- Fortalecimento e ampliação da participação popular e do controle social;
6- Estabelecimento de política de financiamento para o desenvolvimento de ações
voltadas à implantação das plantas medicinais e da Fitoterapia no SUS;
7- Incentivo à pesquisa e desenvolvimento de plantas medicinais e fitoterápicos,
priorizando a biodiversidade do país;
8- Promoção do uso racional de plantas medicinais e dos fitoterápicos no SUS;
9- Garantia do monitoramento da qualidade dos fitoterápicos pelo Sistema Nacional de
Vigilância Sanitária;
No sentido de operacionalizar esta política, a Secretaria de Atenção à Saúde do
Ministério da Saúde publicou a Portaria Nº. 853, em 17/11/2007 que faz a inclusão das práticas
contidas na Portaria 971 na tabela de serviços/classificações do Sistema Nacional de
Estabelecimentos de Saúde (SCNES), com o código 068. Esta portaria estabelece os
profissionais que pode exercer no SUS as práticas que fazem parte da PNPIC.
Além disto, no intuito de consolidar a Fitoterapia no SUS, o país instituiu a Política
Nacional de Plantas Medicinais e Fitoterápicos (PNPMF) (BRASIL, 2006) e o Programa
Nacional de Plantas Medicinais e Fitoterápicos.
Como parte da PNPMF, em fevereiro de 2009, foi publicada a Relação Nacional de
Plantas Medicinais de Interesse do SUS – RENISUS. Essa Relação contém 71 espécies
vegetais que podem ser utilizadas/dispensadas pelo SUS (BRASIL, 2009). A criação de uma
lista de plantas de interesse do SUS foi uma iniciativa importante, pois direciona as pesquisas
científicas e a capacitação técnica de prescritores, visando este conjunto de plantas para o
favorecimento da prescrição de medicamentos fitoterápicos e de plantas medicinais
(FIGUEREDO, 2008).
Em 2010, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) publicou uma norma
para melhor regulamentar a produção e o uso de algumas espécies vegetais, a RDC 10/2010.
Ampliando, as informações constantes na RE 89/2004 que contem a lista de registro
simplificado de fitoterápicos. Na RDC 10/2010 para cada espécie, foram padronizadas
indicações terapêuticas, forma de uso, quantidade a ser ingerida e os cuidados e restrições a
serem observados no seu uso, conforme informações de uso tradicional.
Em novembro de 2011, a ANVISA publicou a RDC 60/2011 que aprova a primeira
edição do Formulário de Fitoterápicos da Farmacopéia Brasileira. O formulário traz 83
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monografias de medicamentos, como infusões, xaropes e pomadas. Estão registradas
informações sobre a forma correta de preparo e as indicações e restrições de uso de cada
espécie. Segundo a ANVISA, esse foi, portanto, o primeiro de vários passos a serem dados
para a construção de um formulário contendo preparações elaboradas e dispensadas com o
grau de segurança que se deseja em formulações dessa natureza levando à população
maiores conhecimentos sobre a biodiversidade brasileira.
Em função da perspectiva de incremento da Fitoterapia no SUS, as universidades
brasileiras estão diante do desafio de introduzir ou incrementar o seu ensino nos cursos de
graduação, a extensão e a pesquisa com plantas medicinais.
A consolidação da Fitoterapia no SUS justifica-se por diversas razões, como: possibilita
aos profissionais de saúde uma outra forma de tratamento; os custos financeiros são menores;
menor potencial de provocar efeitos adversos; facilidade de acesso; inserção cultural da
Fitoterapia nos usos e costumes da população; garante ao usuário o seu direito de escolha do
tratamento preferido; facilita a participação popular no SUS, resgata o conhecimento popular;
constitui uma fonte de emprego e renda.
No entanto, muitas dificuldades precisam ser superadas, como: o desconhecimento e/ou
o descrédito de alguns profissionais de saúde e gestores; o número insuficiente de profissionais
com conhecimento em Fitoterapia; a deficiência do ensino da Fitoterapia na graduação e na
especialização; a necessidade de investimento inicial como a criação de laboratórios para
produzir o medicamento fitoterápico; o desconhecimento da população sobre a Fitoterapia ou o
seu conhecimento deturpado, etc.

4 LEGISLAÇÃO DE FITOTERÁPICOS

A legislação brasileira que engloba os produtos fitoterápicos vem sofrendo alterações ao


longo dos últimos 20 anos, visando melhorar a qualidade dos produtos que estão no mercado
e, aqueles que serão introduzidos; melhorar as condições de comercialização e racionalizar o
uso.
Estas alterações legais iniciaram em 1995, com a publicação da Portaria 006/95 da
Secretaria Nacional de Vigilância Sanitária (SNVS), do Ministério da Saúde, estabelecendo
normas e condutas específicas para registro de produtos fitoterápicos.
Em 21 de dezembro de 1998, surge a portaria 1029 também do SNVS (Serviço de
Vigilância Sanitária do Ministério da Saúde), que modifica a 006/95 e acrescenta algumas
exigências, ainda para o registro daqueles produtos.

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A Resolução de Diretoria Colegiada, RDC 17/2000, da Agencia Nacional de Vigilância
Sanitária (ANVISA) passa a considerar ainda algumas outras classificações para produtos
desta categoria.
A RDC 48/2004, determinou aspectos essenciais para o registro, como a identificação
botânica das espécies vegetais utilizadas, padrão de qualidade e identidade e provas de
eficácia e segurança que validem as indicações terapêuticas propostas.
Tanto na RDC 17/2000, quanto na RDC 48/2004, que tratam do registro de
medicamentos fitoterápicos serão encontradas definições de termos específicos aplicados aos
produtos fitoterápicos.
A Legislação em vigor, recentemente publicada pela Agencia Nacional de Vigilância
Sanitária apresenta algumas modificações bastante significativas.
Conforme disposto da RDC 10/2010, que dispõe sobre a notificação de drogas vegetais
junto à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), nota-se a intenção de agilizar e
racionalizar o uso e a comercialização de fitoterápicos.
As drogas vegetais relacionadas no Anexo I, da RDC 10/2010 estão os produtos de
venda isenta de prescrição médica destinados ao consumidor final. Sua efetividade encontra-se
amparada no uso tradicional e na revisão de dados disponíveis em literatura relacionada ao
tema.
Outras resoluções também foram recentemente publicadas e complementam a RDC
10/2010 e que versam sobre o registro de medicamentos fitoterápicos, a RDC 14/2010 ANVISA
e a Instrução Normativa N° 05 de 31/03/2010, que lista a bibliografia necessária para embasar
os processos de registro.
Existem ainda as resoluções 88, 89, 90 e 91 de março de 2004 que ainda não foram
revogadas e que versam sobre a lista de referências bibliográficas para a avaliação de
segurança e eficácia de fitoterápicos, sobre uma lista de registro simplificado de fitoterápicos
que incluem 34 preparações, publica o guia de estudo de toxidade pré-clínica para fitoterápicos
e por fim o guia de alterações, inclusões notificações e cancelamento pós-registro de
fitoterápicos, respectivamente.
Além das resoluções anteriormente descritas, se aplicam também ao registro de
fitoterápiocs todas as legislações que normatizam o registro de medicamentos, dentre elas:
RDC 102/2000 que versa sobre as normas de publicidade; RDC 210/2003 que versa sobre a
certificação para Boas Práticas de fabricação e Controle de Qualidade, RDC 001/2005 que
versa sobre o guia para o estudo de estabilidade de medicamentos, entre outras.

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4.1 A Situação do Registro de Medicamentos Fitoterápicos no Brasil
Informações sobre o registro de medicamentos fitoterápicos no Brasil podem ser obtidas
em diversas fontes, sendo as mais utilizadas o site da ANVISA e o Visalegis, de livre acesso.
O levantamento pode ser feito por meio do nome comercial do produto, da substância ativa, do
nome científico da espécie, CNPJ da empresa, número de registrou ou número do processo na
ANVISA. A ANVISA possui o seu cadastro de registro interno, o chamado DATAVISA, que é de
acesso restrito e contem informações sobre a natureza do produto, sua composição, forma
farmacêutica e apresentações registradas além de dados de embalagem entre outras
informações técnicas.
Em recente levantamento realizado por Carvalho e colaboradores foi encontrado um
total de 512 medicamentos registrados sendo que 80 deles são associações e 432 são
considerados medicamentos simples, ou seja, derivados de apenas uma espécie vegetal.
Dentre as formas farmacêuticas cadastradas estão: as cápsulas (47,13%), os comprimidos
(20,62%) e as soluções orais (12,82%), seguidos de xaropes, drágeas, elixires, tinturas e
outras.
Há 162 espécies vegetais que possuem derivados registrados na ANVISA, conforme
dados da tabela abaixo:
Tabela 1: Espécies vegetais com maior número de derivados registrados como fitoterápicos simples:
Espécie vegetal Nº. de registros
Ginkgo biloba (Ginkgo) 33
Aesculus hippocastanum (Castanha-da-India) 29
Cynara scolymus (Alcachofra) 21
Hypericum perforatum (Erva-de-São-João) 20
Glycine max (Soja) 20
Valeriana officinalis (Valeriana) 20
Panax ginseng (Ginseng) 17
Cassia angustifolia,Cassia senna (Sene) 14
Cimicifuga racemosa (Cimicífuga) 14
Mikania glomerata (Guaco) 14
Maytenus ilicifolia (Espinheira-santa) 13
Peumus boldus (Boldo) 13
Fonte: Carvalho e col. 2008
As espécies nativas mais registradas como fitoterápicos simples e com indicação
terapêutica são o Guaco, a Espinheira-Santa e o Guaraná.

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Estão também cadastradas na ANVISA, um total de 119 empresas que são detentoras
do registro de produtos fitoterápicos, concentradas especialmente nas regiões Sul e Sudeste,
seguindo o padrão de desenvolvimento e distribuição muito próximo da indústria de
medicamentos sintéticos.
A classificação a seguir elaborada por Francisco Abreu Mattos, em 1998, classifica de
maneira mais detalhada, a situação do comércio de Fitoterápicos no Brasil.
Os fitoterápicos em uso pela população formam um conjunto de preparações
farmacêuticas complexas e heterogêneas onde se encontram excelentes medicamentos ao
lado de misturas enganosas e, até mesmo prejudiciais. Estes medicamentos podem ser
classificados como:
1. Fitoterápicos legalmente registrados, produzidos industrialmente, cujas informações
sobre sua eficácia, segurança e controle de qualidade, ou seja, cuja "monografia" existente é
completa. Exemplo: Tebonin ou Tanakan medicamento feito à base de extratos padronizados
de Gingko biloba, utilizado como restaurador da circulação sanguínea periférica,
principalmente a nível cerebral.

Gingko biloba
2. Fitoterápicos registrados, produzidos industrialmente, cuja monografia inexiste ou
apresenta dados insuficientes. Exemplo: Preparados de jurubeba (Solanum paniculatum L.) e
numerosos outros análogos.

Solanum paniculatum
3. Fitoterápicos não registrados, produzidos artesanalmente, de forma organizada,
porém não industrial, cujos dados para a preparação da respectiva "monografia" existem, a
exemplo de algumas plantas medicinais já estudadas, como por exemplo: Mikania glomerata
Baker, (guaco) e o Plectranthus barbatus Benth. (boldo brasileiro). Exemplos: Alguns xaropes
13
expectorantes, soluções antissépticas de uso local e, "digestivos", preparados por orientação
farmacêutica direta, em Instituições assistenciais, como as Secretarias de Saúde municipais, e
projetos isolados.

Mikania glomerata Plectranthus barbatus


4. Fitoterápicos não registrados oficialmente, mas produzidos de modo organizado,
cujos dados para a preparação da respectiva "monografia" inexistem. Exemplo: Preparações
feitas nos serviços assistenciais, como, por exemplo, as Pastorais, utilizando plantas de modo
empírico, preparações outras com indicações terapêuticas atribuídas, porém não comprovadas,
mas designadas e vendidas como suplementos alimentares, entre outros.
5. Fitoterápicos não registrados, produzidos sem orientação farmacêutica, de modo
desorganizado, cujos dados para a preparação das respectivas monografias, inexiste, a
exemplo de numerosas plantas de uso popular com propriedades medicinais atribuídas, mas
não determinadas cientificamente. Exemplo: Garrafadas e "ervas" vendidas por raizeiros nos
mercados e feiras livres.

Garrafadas e Ervas

5 CONCEITOS BÁSICOS EM FITOTERAPIA

Adjuvante: Substância de origem natural ou sintética adicionada ao medicamento com


a finalidade de prevenir alterações, corrigir e/ou melhorar as características organolépticas,
biofarmacotécnicas e tecnológicas do medicamento.
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Carminativo: Agente que favorece e provoca a expulsão de gases intestinal.
Catártico: Purgante mais enérgico que o laxante e menos drástico.
Colagoga: Agente/Substância que provoca e favorece a produção da bílis.
Colerética: Agente/Substância que aumenta a liberação de bílis.
Derivado de droga vegetal: Produtos de extração da matéria prima vegetal: extrato,
tintura, óleo, cêra, exsudato, suco, e outros.
Droga vegetal: Planta ou suas partes, após processos de coleta, estabilização e
secagem, podendo ser íntegra, rasurada, triturada ou pulverizada.
Emenagoga: Agente que restabelece o fluxo menstrual.
Estomáquico: Agente que estimula a atividade secretora do estômago.
Etnofarmacologia: Disciplina que estuda como as populações tradicionais interagem
com as plantas e como as usa, no tratamento de suas doenças.
Fórmula Fitoterápica: Relação quantitativa de todos os componentes de um
medicamento fitoterápico.
Fitofármaco: Medicamento feito a partir de substância de origem vegetal, porém de
forma isolada.
Fitoterápico: Medicamento obtido empregando-se exclusivamente matérias-primas
ativas vegetais. É caracterizado pelo conhecimento da eficácia e dos riscos de seu uso, assim
como pela reprodutibilidade e constância de sua qualidade. Sua eficácia e segurança são
validadas por meio de levantamentos etnofarmacológicos de utilização, documentações
tecnocientíficas em publicações. Não se considera medicamento fitoterápico aquele que, na
sua composição, inclua substâncias ativas isoladas, de qualquer origem, nem as associações
destas com extratos vegetais.
Marcador: Componente ou classe de compostos químicos (ex: alcalóides, flavonóides,
ácidos graxos, etc.) presente na matéria-prima vegetal, idealmente o próprio princípio ativo, e
preferencialmente que tenha correlação com o efeito terapêutico, que é utilizado como
referência no controle de qualidade da matéria-prima vegetal e dos medicamentos fitoterápicos.
Matéria prima vegetal: Planta medicinal fresca, droga vegetal e derivado de droga
vegetal.
Medicamento: Produto farmacêutico, tecnicamente obtido ou elaborado, com
finalidade: profilática, curativa, paliativa ou para fins de diagnósticos.
Nomenclatura botânica oficial completa: Gênero, espécie, variedade, autor do
binômio, família. Nomenclatura botânica oficial: Gênero, espécie e autor.
Nomenclatura botânica: Gênero e espécie.

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Princípio ativo de medicamento fitoterápico: Substância, ou classes químicas (ex:
alcalóides, flavonóides, ácidos graxos, etc.), quimicamente caracterizada, cuja ação
farmacológica é conhecida e responsável, total ou parcialmente, pelos efeitos terapêuticos do
medicamento fitoterápico.
Medicamento fitoterápico novo: Aquele cuja eficácia, segurança e qualidade, sejam
comprovadas cientificamente junto ao órgão federal competente, por ocasião do registro,
podendo servir de referência para o registro de similares.
Medicamento fitoterápico tradicional: É aquele elaborado a partir de planta medicinal,
de uso alicerçado na tradição popular, sem evidências, conhecidas ou informadas, de risco à
saúde do usuário, cuja eficácia é validada através de levantamentos etnofarmacológicos e de
utilização, de documentações tecnocientíficas ou publicações indexadas.
Medicamento fitoterápico similar: Aquele que contém as mesmas matérias-primas
vegetais, na mesma concentração de princípio ativo ou marcadores, utilizando a mesma via de
administração, forma farmacêutica, posologia e indicação terapêutica de um medicamento
fitoterápico considerado como referência.
Planta medicinal: Espécie vegetal designada pelo seu nome científico e/ou popular
utilizada com finalidades terapêuticas.
Princípio ativo: Substância, ou grupo delas, quimicamente caracterizada, cuja ação
farmacológica é conhecida e responsável, total ou parcialmente, pelos efeitos terapêuticos do
medicamento fitoterápico.
Produto natural: É toda substância encontrada na natureza (vegetal, mineral ou
animal) de origem orgânica ou inorgânica que pode ser utilizada diretamente ou processada
pelo homem.

6 CONSTITUINTES QUÍMICOS DAS PLANTAS MEDICINAIS

As plantas sintetizam compostos químicos a partir dos nutrientes e da água, extraidos


do solo e da luz que recebem. Muitos desses compostos, ou grupos deles, podem provocar
reações nos organismos. São os princípios ativos. Algumas dessas substâncias podem ser
tóxicas, dependendo de dose utilizada.
Na combinação de plantas medicinais para se preparar fitoterápicos, deve-se observar a
sua composição química, de modo que atuem sinergicamente. É ainda importante lembrar que
a dose é fundamental em alguns casos, pois muitas substâncias podem inverter o efeito ou
mesmo tornarem-se tóxicas se a dose for aumentada.

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Nem sempre os princípios ativos de uma planta são conhecidos, mas mesmo assim ela
pode apresentar atividade medicinal satisfatória e ser usada, desde que não apresente efeitos
tóxicos, agudos ou crônicos, já verificados pela pesquisa, ou até mesmo pelo conhecimento
popular, em alguns casos.
Na Fitoterapia, a planta, ou as suas partes são utilizadas integralmente, com todos os
seus constituintes químicos, conferindo atividade terapêutica um pouco diferente daquela
apresentada pelos princípios ativos isolados, pois pode haver sinergismos que favorecem a
atividade farmacológica da planta. São os chamados fitocomplexos.
As plantas, em geral, possuem uma gama variada e rica de princípios ativos no seu
interior. Algumas plantas podem possuir dezenas de princípios ativos, muitos deles atuando em
interação, o que explica porque certas plantas têm atuação em diversas doenças.
Os princípios ativos podem ser divididos em grupos que têm semelhanças químicas e
estruturais. Há vários grupos de princípios ativos. Estes são resultados do metabolismo
secundário das plantas. No metabolismo primário são produzidas substâncias necessárias às
funções de crescimento, respiração e fotossíntese como os aminoácidos, as proteínas, as
vitaminas, os carboidratos, os lipídios, etc. Os metabólitos primários são amplamente
distribuídos nas plantas. No metabolismo secundário, os metabólitos produzidos são restritos a
certas plantas e tem função de defesa, adaptação ao meio e competição biológica.
A) Metabolismo Secundário
As substâncias medicinais são produzidas pelo vegetal e apresentam funções bem
específicas dentro da planta. Na maioria das vezes, são frutos do metabolismo secundário,
tendo, portanto, função ligada à ecologia da planta, isto é, ao relacionamento da planta com o
ambiente que a envolve.
O metabolismo secundário diferencia-se do primário basicamente por não apresentar
reações e produtos comuns à maioria das plantas, sendo específico de determinados grupos. A
respiração, por exemplo, faz parte do metabolismo primário. Os metabólitos secundários
apresentam algumas características, como:
• Não são vitais para as plantas, na maioria das vezes, como os alcalóides;
• São as expressões da individualidade química dos indivíduos e diferem de espécie para
espécie, qualitativamente e quantitativamente;
• São produzidos em pequenas quantidades.
Além disso, essas substâncias podem estar presentes na planta o tempo inteiro ou só
serem produzidas mediante estímulos específicos. Assim, a regulação do metabolismo
secundário depende da capacidade genética das plantas em responder a estímulos internos ou
externos e da existência desses estímulos no momento apropriado.
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Geralmente, as espécies vegetais apresentam mais de um desses grupos de
substâncias. O que normalmente diferencia as plantas medicinais é que as concentrações
dessas substâncias são maiores, daí o seu emprego na terapêutica. Alguns gêneros e algumas
famílias de plantas apresentam substâncias bem específicas que podem caracterizá-los.
B) A Influência do Ambiente na Produção de Princípios Ativos
A concentração de princípios ativos ou fármacos na planta depende do controle genético
(capacidade inerente à planta) e dos estímulos proporcionados pelo meio. Normalmente, estes
estímulos são caracterizados como situações de “stress”, como excesso ou deficiência de
algum fator de produção para a planta. Uma vez que o vegetal apresenta “competência” para
produzir fármacos, sua concentração de substâncias ativas pode ser alterada por fatores
climáticos, edáficos, exposições a micro-organismos, insetos, outros herbívoros e poluentes.
Dentre os fatores climáticos, a temperatura exerce função muito importante na
sobrevivência do vegetal, por estar mais ligada ao crescimento e ao desenvolvimento da planta.
Espécies pouco adaptadas às temperaturas de uma região terão sérios problemas em produzir
biomassa e princípios ativos, pois essa condição influi no metabolismo primário (respiração e
fotossíntese) e, em consequência, no secundário. Todos os outros fatores climáticos estão
direta ou indiretamente relacionados com a temperatura.
A luz também é de grande importância nos processos fotossintéticos e de indução floral
(fotoperíodo). Algumas plantas, quando expostas à luz solar direta, produzem mais cumarinas,
como o chambá ou chachambá (Justicia pectoralis). Em plantas umbrófilas (de sombra) talvez
este efeito possa ser inverso.
Algumas plantas necessitam de determinado número de horas de luz por dia
(fotoperíodo) para que possam florescer. Assim, as plantas de regiões tropicais precisam de
um número de horas de iluminação inferior a um dado valor (fotoperíodo crítico) ou são
insensíveis, isto é, podem florescer normalmente, independentes desse fator. Já as plantas de
regiões temperadas normalmente necessitam de um fotoperíodo maior que o crítico da espécie,
como a alfazema (Lavandula officinalis), que precisa de um fotoperíodo superior a 12 horas por
dia, por três ou quatro dias.
A importância disto está principalmente na determinação da colheita destas espécies,
pois a alfazema tem mais óleo essencial no início da floração (nas sumidades floridas) e,
também, na reprodução, pois pode haver necessidade da produção de sementes, o que não é
possível sem haver floração e fecundação. Outro aspecto a ser considerado em relação ao
fotoperíodo está no ajustamento da época de plantio. É preciso equilibrar o crescimento
vegetativo com a floração, caso contrário, a indução floral pode ocorrer antes do desejado,
diminuindo a produção de folhas e flôres.
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O estresse hídrico (deficiência de água no solo) pode promover aumentos na
concentração de princípios ativos (óleos essenciais e alcalóides). No entanto, pode haver
redução da produção de massa verde, o que em determinados limites poderá ser desvantajoso.
É o que ocorre em vinagreira (Hibiscus sabdariffa), cujo teor de ácido ascórbico nas folhas
decresce sob déficit hídrico, assim como a produção de biomassa.
Além dos fatores climáticos, os fatores edáficos (relacionados com o sólo) também são
importantes.
Aqui, serão abordados apenas alguns constituintes químicos. Os referidos grupos não
se excluem, pois são separados ora por características físicas, ora por propriedades químicas
ou atividade biológica.

Principais fatores que podem influenciar o acúmulo de metábolitos


secundários em plantas

6.1 Ácidos Orgânicos


São encontrados em todo o reino vegetal, podendo desempenhar funções importantes
no metabolismo primário da planta (fotossíntese e respiração). Os ácidos málico, cítrico,
tartárico e oxálico são os mais comuns. Outros como o ácido fórmico, podem ser menos
frequentes. O ácido tartárico e seus sais podem ter ação laxativa suave. Os ácidos cítrico e
tartárico podem aumentar o fluxo de saliva (sialagogo), contribuindo para reduzir o número de
bactérias que causam cáries.
De modo geral, os ácidos são laxativos, diuréticos, estimulantes da respiração celular e
do seu metabolismo. São antioxidantes e regeneradores dos tecidos. O acido oxálico e seus
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sais de potássio e cálcio podem estimular o surgimento de cálculos renais e reduzir a
proporção de cálcio no sangue, o que pode afetar o funcionamento do coração. Portanto,
plantas com muito ácido oxálico ou oxalato, como a cana-de-macaco, (Costus sp.), não devem
ser utilizadas por longo período.

Cana-de-macaco, (Costus sp.)

6.2 Alcalóides
Os alcalóides constituem um grupo heterogêneo de substâncias nitrogenadas (em
forma de aminas), geralmente de origem vegetal, de caráter básico e que apresentam
acentuada ação farmacológica em animais.
No corpo humano, atuam no sistema nervoso central (calmante, sedativo, estimulante,
anestésico e analgésico). A morfina extraída da papoula (Papaver somniferum) é um
anestésico. A cafeína, do café e do guaraná, é um estimulante. A hiosciamina, presente na
trombeteira (Datura stramonium), é exemplo de analgésico. Na trombeteira ainda podem ser
encontrados outros alcalóides que podem ser tóxicos e cujo antídoto é um outro alcalóide de
uma planta brasileira, a pilocarpina, encontrada no Jaborandi (Pilocarpus microphilus), usado
no tratamento do glaucoma.
Alguns alcalóides podem ser cancerígenos e outros, antitumorais. Os alcalóides
pirrolizidínicos, presentes no confrei (Symphytum officinal L.), são exemplos de causadores de
câncer. A vincristina presente numa planta chamada boa noite (Chantarantus roseus) é um
exemplo de um alcalóide com ação antitumoral. Dos cerca de 60 alcalóides presentes na boa
noite, destacam-se a vincristina e a vimblastina pelo seu uso contra alguns tipos de leucemia.
Geralmente, as plantas que têm alcalóides podem ser tóxicas, se usadas em
quantidades maiores ou de forma inadequada. Os alcalóides foram os primeiros princípios
ativos isolados das plantas. Em 1803, o alemão Sertarmer isolou a morfina.

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Papoula Jaborandi
6.3 Compostos Fenólicos
Considera-se compostos fenólicos, numa definição genérica, todas as estruturas que
não possuem nitrogênio, possuem pelo menos um núcleo benzênico com uma ou mais
hidroxilas livres ou fazendo parte de ésteres, éteres ou heterosídeos. Um exemplo de composto
fenólico é o ácido salicílico, isolado pela primeira vez da casca do salgueiro (Salix alba), possui
ação antisséptica, analgésica e anti-inflamatória. É utilizado na medicina alopática, sob a forma
de um derivado, o ácido acetilsalicílico.

Salgueiro
6.4 Compostos Inorgânicos
São constituintes normais dos vegetais que formam as cinzas ou resíduos, após a
retirada da matéria orgânica. Os mais importantes são os sais de cálcio e de potássio. Os sais
de potássio apresentam propriedades diuréticas, principalmente se acompanhados de
saponinas e flavonóides, com capacidade de eliminar o sódio do corpo juntamente com a água,
além de expulsar substâncias residuais acumuladas na circulação sanguínea. Os sais de cálcio
contribuem para a formação da estrutura óssea e para a regulação do sistema nervoso e do
coração, proporcionando ao paciente maior resistência às infecções. Os sais de silício têm
importância no fortalecimento de tecidos conjuntivos, especialmente dos pulmões. Aumenta a
resistência à tuberculose, além de fortalecer unhas, pele e cabelos.

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6.5 Glicosídeos ou Heterosídeios
São compostos orgânicos, geralmente de origem vegetal, que são compostos por uma
porção de açúcar ligada a um agrupamento não-açúcar. O açúcar é chamado porção glicona,
enquanto que a porção não-açúcar é chamado aglicona ou genina. Esta é a responsável pela
ação terapêutica. Têm gosto amargo. Há vários tipos de glicosídeos como os cardioativos, os
alcoólicos, os cianogenéticos, os antraquinônicos, os flavonóides, os saponínicos, os
cumarínicos, etc.
6.6 Antracênicos
Fármacos de origem vegetal que contém heterosídeos antraquinônicos (antracênicos).
São empregados desde a antiguidade como laxativos e purgativos.
Dentre as drogas mais importantes utilizadas na terapêutica, podemos citar o ruibarbo
(Rheum palmatum), a cáscara sagrada (Rhamnus purshiana), a sene (Cassia angustifolia, C.
senna, Senna alexandrina) e a babosa (Aloe vera, A. barbadensis).

Antraquinona Ruibarbo Cáscara Sagrada


6.7 Cumarinas
As cumarinas são heterosídeos que apresentam diversas propriedades, dentre elas a do
dicumarol que é anticoagulante, a dos furanoderivados com ação sobre o vitiligo. Também
possuem ação antimicrobiana e desde tempos remotos são usadas no tratamento de doenças
de pele como psoríase, leucoderma, micoses, dermatites e eczemas. Estão presentes no fruto
do Cumaru (Dipteryx odorata), nas folhas no Guaco (Mikania guaco), entre outras plantas.

Cumarina Frutos de Cumaru Folhas de Guaco

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6.8 Saponinas
Também são heterosídios. Sua característica marcante é a de formar espuma quando
colocadas em água. São utilizadas para a síntese de cortisona (anti-inflamatório) e de
hormônios sexuais.
Alta concentração de saponinas na corrente sanguínea pode ser perigosa, pois pode
provocar hemólise, devido à desorganização das membranas das hemácias. São laxativas
suaves, diuréticas, digestivas, anti-inflamatórias e expectorantes. Têm ação irritativa para as
mucosas do aparelho digestório, provocando vômito, cólicas e diarréias. O fato das saponinas
auxiliarem na absorção de certos medicamentos faz com que as plantas que as contêm
possam ser utilizadas em combinações com outras, nos chás. Um exemplo da presença de
saponinas: folhas de Carqueja (Baccharis trimera) e flôres da Calêndula (Calendula officinalis).

Carqueja Calêndula
6.9 Flavonóides
São heterosídeos com 15 carbonos. São conhecidos mais de 2000 flavonóides, sendo o
maior grupo de compostos fenólicos naturais encontrados na natureza Seu nome deriva do
termo em latim flavus, que significa amarelo, embora a flavona pura seja incolor.
O grupo é conhecido pelos seus efeitos anti-inflamatórios, antialérgicos e vasoprotetores
(tratamento de tromboses). Rutina e hesperidina são importantes flavonóides empregados em
tratamentos de fragilidade capilar. Exemplos da presença de flavonóides são a Carqueja
(Baccharis trimera), ginco (Ginkgo biloba L.), o maracujá (Passiflora incarnata) e espécies do
gênero Citrus.

Flavonóide Carqueja Maracujá


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6.10 Glicosídeos Cardioativos
Drogas cardioativas possuem em sua composição glicosídeos cardiotônicos, que são
compostos que atuam diretamente no miocárdio. Estimulam a contratilidade cardíaca e a
diurese. Regulam a condução elétrica e têm efeito bradicardizante. São substâncias cuja
absorção pelo organismo se dá de forma cumulativa, podendo causar intoxicações crônicas. O
seu uso no tratamento de doenças cardíacas é restrito à droga extraída e purificada sob
recomendação médica, uma vez que não se pode ter um controle adequado da quantidade
dessas substâncias ingeridas sob a forma de chás ou outras.
A digitoxina, presente na Dedaleira (Digitalis lanata e Digitalis purpurea) é o glicosídeo
mais importante desse grupo. Uma dose de cerca de 10 mg pode ser letal para uma pessoa
com peso de 70 kg.

Digitoxina Dedaleira
6.11 Glicosídeos Cianogenéticos
Por hidrólise, liberam ácido cianídrico ou prússico. O ácido cianídrico liberado no
estômago pela ação do suco gástrico bloqueia a citocromooxidase, produzindo a morte por
anóxia. Exemplo deste glicosídeo é a linimarina presente na parte mais externa da mandioca
(Manihot esculenta). Daí a necessidade de se retirar as cascas da raiz, antes de usá-la. As
raízes da mandioca são moídas na presença de calor, antes de serem ingeridas, pela facilidade
com que o ácido cianídrico é inativado, quando submetido ao calor.

Ácido cianídrico

Mandioca

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6.12 Gomas e Mucilagens
GOMAS são exudatos patológicos de órgãos vegetais que sofreram algum tipo de
traumatismo e cuja formação está relacionada com a destruição das membranas celulares.
As gomas têm diversas aplicações em farmácia. Internamente são usadas como
laxativas por causarem um aumento do peristaltismo intestinal. Mas suas principais aplicações
são no preparo de emulsões, pastilhas, como fixador para cabelos, pós compactos, cremes e
outros produtos cosméticos. Algumas gomas são também empregadas na indústria de
alimentos no preparo de confeitos, geleias, xaropes e maionese.
São utilizadas pela sua grande capacidade de retenção de água formando soluções
mais ou menos viscosas, por possibilitar o inchamento de diversos produtos alimentícios, por
estabilizar suspensões ou espuma de cerveja, etc. Em geral são indigeríveis pelo organismo
humano, ainda que uma parte seja degradada por micro-organismos do intestino. Entre as
gomas oficiais de interesse econômico e industrial estão: Goma arábica (ou acácia), goma
adragante (ou alcatira) e goma caraia (ou indiana).

Gomas
MUCILAGENS são exsudatos "fisiológicos" que se formam naturalmente durante o
desenvolvimento do vegetal sem precisarem de estímulos externos para a sua formação.
Possem efeito laxativo, lubrificante e, ao mesmo tempo, aumenta o volume no interior
do intestino, estimulando seus movimentos peristálticos. Também são muito eficientes nos
casos de tosses ocasionadas pela irritação das mucosas do aparelho respiratório, contribuindo
ainda para aumentar a secreção de muco. Exemplo desta atividade se encontra na Hortelã de
folha grossa (Plectrantus amboinicus). Ainda são utilizadas em ferimentos na pele e nas úlceras
gástricas.

Hortelã
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6.13 Óleos Essenciais
Os óleos essências de plantas são fonte de inúmeros compostos presentes em diversos
produtos utilizados no nosso cotidiano, de essências aromatizantes a temperos, remédios e
medicamentos.
O grande número e a diversidade de substâncias incluídas neste grupo de princípios
ativos é que determinam a ampla variedade de ações farmacológicas. As propriedades dos
óleos são variadas: antivirótico, antiespasmódico, analgésico, bactericida, cicatrizante,
expectorante, relaxante, vermífugo, etc. O mentol da Hortelã (Mentha piperita) tem ação
expectorante e antisséptica; o timol e o carvacrol encontrados na Hortelã da folha grossa
(Plectrantus amboinicus) e no Alecrim-pimenta (Lippia sidoides) são antissépticos; o eugenol do
Cravo-da-índia (Eugenia coryophyllata) é um anestésico local e analgésico; e o ascaridol,
presente na Erva-de-santa maria (Chenopodium ambrosioides), é vermífugo.

Óleo de Hortelã Óleo de Cravo-da-índia Ascaridol (Vermífugo)

6.14 Taninos
O nome tanino designa um grupo de compostos químicos polifenólicos, de alto peso
molecular, de origem vegetal, capazes de precipitar proteínas em solução, provocando na pele
íntegra a sensação de adstringência e na pele sem vida um fenômeno conhecido por
curtimento, que a transforma em couro.

Barbatimão

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Em farmácia são empregados, principalmente, pela sua ação adstringente, o que os torna úteis
como agentes hemostáticos, antidiarréicos, cicatrizantes etc.
Os taninos são encontrados no Barbatimão (Stryphnodendron adstringens), na
Espinheira santa (Maytenus ilicifolia), entre outras plantas.

7 PREPARO E PADRONIZAÇÃO DE FITOTERÁPICOS

A transformação tecnológica do material vegetal para um produto tecnicamente


elaborado, que pode ser intermediário ou acabado, implica na utilização de operações de
transformação, estas operações se inserem num contexto de produção em forma sequencial,
constituindo um processo coerente, cujo produto final é um fitoterápico.
A complexidade das operações de transformação depende do grau de transformação
requerido pelo produto, podendo ser mínimo, como no caso dos chás ou, muito maior como, no
caso de formas farmacêuticas sólidas revestidas.
A escolha das operações de transformação para a obtenção do fitoterápico depende
exclusivamente das características físicas e físicoquímicas da matéria-prima vegetal e do
fitoterápico a ser obtido e do volume de produção exigido.
Por exemplo: Se a matéria-prima é moída para uma extração subsequente, o tamanho
das partículas requeridas é diferente daquele necessário para a preparação de chás embalados
em sachês.
Vale lembrar que o conjunto de operações de transformação adotadas deve assegurar a
conservação das propriedades químicas e farmacológicas originais assim como a eficácia,
reprodutibilidade e segurança do efeito terapêutico.

7.1 Coleta
Na coleta, precisamos prestar atenção a
diversos fatores que interferem na maior ou menor
quantidade de princípios ativos, como o estágio de
desenvolvimento da planta, o órgão da planta, a
época do ano e a hora do dia.
Quanto às partes da planta, as
recomendações gerais para sua coleta são as
seguintes: cascas e entrecascas devem ser colhidas quando a planta já tiver botado flôres. As
flôres, quando do início da floração. Frutos e sementes devem ser colhidos maduros. Quanto
às raízes, elas devem ser colhidas quando a planta estiver adulta e os talos e as folhas, antes

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da planta botar as flôres. Contudo, o ideal seria que cada planta tivesse estudos conclusivos
sobre a melhor época de coleta.
Para que se obter matéria-prima de boa qualidade, alguns cuidados devem ser
observados:
• Quanto à sanidade da planta e sua qualidade fitoquímica: não colher plantas velhas ou
doentes, comidas por insetos ou com ovos destes. Não coletar plantas em lugares
contaminados. Colher a planta bem madura e bem viva. Em se tratando da coleta de partes
específicas, saber a idade e a época adequadas para a sua coleta.
• Quanto ao momento adequado: não colher as plantas em dias de chuva, úmidas de orvalho
ou sob o sol forte. Coletar preferentemente de manhã, cedo ou à tardinha.
• Quanto à preservação das espécies: não retirar todas as folhas de um galho. No caso de
cascas, recomenda-se retirar pequenos pedaços apenas de um dos lados da planta de cada
vez. Se retirar grandes pedaços, circundando o tronco, poderá provocar a morte da planta.
• Quando a coleta de plantas ocorrer em local público ou de forma extrativista, deixar sempre
algumas plantas de cada espécie, para que possam crescer e multiplicar.
• Quanto à acomodação das plantas coletadas: para a coleta, usar cestos ou caixas de
papelão, tomando o cuidado para não amontoar as plantas ou amassá-las e levar as plantas
coletadas o mais rápido possível para a secagem, sem deixar que “esquentem ou
escureçam”.

7.2 Triagem
A triagem é uma operação preliminar a que
todas as drogas vegetais devem ser submetidas antes
da transformação em formas medicamentosas. Sua
finalidade é eliminar tudo que possa contaminar o
material vegetal, fazendo baixar a sua atividade
farmacológica, por efeito de diluição, ou alterar esta
atividade.
A triagem pode ser feita por vários processos, conforme a natureza da droga. Em geral
a triagem é feita à mão. A área para a triagem e seleção deve obedecer a alguns parâmetros,
como por exemplo:
- Localização da área dentro da planta baixa da empresa;
- Dimensões e mobiliário;
- Material específico para a seleção das partes adequadas, como exemplo tesouras,
podões e facas.

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- Procedimentos de limpeza e descontaminação;
- Condições de ventilação e iluminação;
- Equipamentos de proteção individual (EPI) para funcionários.
Após a obtenção das plantas medicinais, normalmente o material pode seguir três
caminhos: uso direto do material fresco, extração de substâncias ativas ou aromáticas do
material fresco e secagem do material fresco. Este último destino é o que requer mais atenção,
por preservar os materiais, possibilitando o uso das plantas a qualquer tempo, dentro dos
prazos normais de conservação.

7.3 Secagem
Em sua maioria, as plantas medicinais são comercializadas na forma dessecada,
tornando o processo de secagem fundamental para a qualidade da matéria prima vegetal.
A secagem é importante para impedir que o material se estrague, pois a redução do teor
de água dificulta a ação das enzimas que inativam os princípios ativos e a proliferação dos
micro-organismos.
A secagem, em virtude da evaporação da água contida nas células e nos tecidos das
plantas, reduz o peso do material. Por essa razão, ela promove aumento percentual de
princípios ativos em relação ao peso do material. Quando uma planta é seca, suas folhas
perdem de 20 a 75% de seu peso. As cascas perdem de 45 a 65%. As raízes perdem de 25 a
80% e as flores, em geral, perdem entre 15 a 80%.
A secagem pode ser conduzida em condições ambientais (secagem natural) ou com o
uso de estufa ou secadores, etc. (secagem artificial).
A secagem natural é um processo lento. Este processo, de uso doméstico, é
recomendado para regiões que apresentam condições climáticas favoráveis, como: boa
ventilação, baixa umidade relativa do ar e altas temperaturas.
Cuidados importantes na secagem natural:
Quanto ao momento de iniciá-la: a secagem deve ser iniciada imediatamente após a
coleta, pois quando as plantas são coletadas suas enzimas entram em ação e modificam as
moléculas dos princípios ativos, podendo torná-las inativas. Daí a necessidade da estabilização
dos princípios ativos
Quanto à limpeza das partes da planta: as raízes, as cascas e as folhas devem ser
lavadas. Porém se nelas houver óleos essenciais, a lavagem deve ser leve. O ideal é lavar a
planta um ou dois dias antes de coletá-la. As flôres não devem ser lavadas.
Quanto ao local de secagem: este deve ser limpo, com boa ventilação, sem
contaminação de poeira, insetos e animais.

29
Quanto à exposição ao sol: em geral, as plantas devem ser secas à sombra. No caso
das cascas e raízes que foram lavadas e que absorveram água, elas podem ficar um pouco ao
sol.
Quanto ao manuseio durante a secagem: as plantas devem ser secas separadamente e
identificadas; em vasilhames que permitam uma boa aeração; cortadas em pequenos pedaços;
dispostas em camadas finas, que devem ser revolvidas frequentemente para acelerar a
secagem.

Em pequenas oficinas de produção de fitoterápicos, a secagem natural é feita em uma


sala específica, onde as diversas partes das plantas são colocadas em bandejas de telas de
arame colocadas em gaiolas de telas com furos menores para se evitar que os insetos pousem
na planta. Sobre as bandejas, coloca-se luz incandescente para aumentar a temperatura e
diminuir a umidade.
A secagem artificial pode ser feita por diversos métodos. Falaremos aqui apenas da
secagem pelo ar quente. A secagem pelo ar quente é o processo mais corretamente utilizado
para a secagem de corpos sólidos, desde que estes sejam resistentes ao calor.
Os aparelhos geralmente utilizados são as estufas de circulação de ar. A temperatura
utilizada varia de 35 a 45ºC. Temperaturas acima de 45ºC danificam os órgãos vegetais e seu
conteúdo, pois proporcionam cozimento das plantas e não uma secagem, apesar de inativarem
maior quantidades de enzimas.
O tempo de secagem, natural ou artificial, varia de acordo com cada planta e com a
parte da planta, pela maior ou menor quantidade de água no seu interior.

30
7.4 Operações Mecânicas de Divisão
Estas operações têm por finalidade, reduzir mecanicamente a droga, em partículas ou
fragmentos de pequenas dimensões, utilizando-se meios adequados à natureza do material
que se pretende dividir. O grau de divisão ao qual se submete uma droga varia de acordo com
o fim a que se destina, e ainda com a natureza desta.
Algumas regras gerais podem ser estabelecidas:
• As drogas que serão administradas sob a forma de pós, pílulas, cápsulas ou
suspensões, devem ser fragmentadas o máximo possível, para possibilitar processos
adequados de moagem;
• Quanto mais lenhosa a estrutura da droga, maior deve ser o grau de divisão para
viabilizar processos de extração, ou seja, melhor penetração do solvente nas células
que compõem o material vegetal;
• Drogas com substâncias ativas pouco solúveis devem ser mais finamente divididas do
que aquelas com substâncias ativas mais solúveis.

7.4.1 Processos de Divisão Grosseira


Trata-se de operações preliminares que devem transformar o material vegetal e deixá-lo
em condições para ser moído ou pulverizado. Esta preparação ou divisão pode ser realizada
manualmente ou por meio de aparelhos.
A divisão grosseira pode ocorrer por:
Secção: Realizada por facas, tesouras, guilhotinas, capazes de cortar o material mais ou
menos consistente de folhas e flôres até raízes, cascas, frutos, sementes do tamanho e forma
desejada.
Contusão: Trata-se da divisão grosseira obtida por contusão ou choques repetidos sobre o
material. De modo geral é aplicada para materiais duros e secos, como raízes, cascas e
sementes ou mais raramente folhas muito secas.
Rasuração: Mecanismo idêntico ao dos raladores e limas de dentes grossos.

7.4.2 Pulverização
A pulverização ao contrário da divisão grosseira, reduz o material vegetal à partículas de
tamanho determinados e previamente estabelecidos. A pulverização implica não só na
fragmentação do material a dividir, como também na calibração das partículas obtidas.
A redução das drogas ao estado de pó é uma operação complexa e pode ser dividida
em três fases: operação preliminar, operação principal e operação acessória.

31
A redução definitiva do tamanho de partículas só deve ocorrer no momento prévio às
fases de extração ou de mistura como, por exemplo, no caso de partes ou órgãos ricos em óleo
essencial.
A moagem é uma operação que libera calor (exotérmica) e cuidados diferenciados tem
que ser adotados, principalmente quando as substâncias contidas na droga vegetal são
termolábeis.

7.4.2.1 Pulverização por Moinhos


- Moinhos Manuais:
Os moinhos manuais têm mecanismo muito semelhante ao dos moinhos domésticos
(utilizados para alimentos), possuem superfícies planares ou cônicas de moenda. A droga é
moída por meio de um esmagador helicoidal, frente a uma superfície ou grade cortante. Sua
utilização, em geral, se faz para pequenas quantidades.
-Moinhos acionados por motores:
São aqueles utilizados para moagem em grande escala e podem estar divididos em 2
grandes classes:
- Moinho de facas (moinho de Wiley):
Utilizado para moer raízes, folhas e cascas, por secção, através de uma câmara de
pulverização que contém uma peça única, contendo 4 navalhas que giram contra outras seis
montadas na parede da câmara. Esta câmara contém uma tela (ou tamis) de modo que o
material só pode sair da câmara ao atravessar o tamis.
Este tamis, em geral pode ser encontrado nas aberturas: 0,5 mm; 1mm e 2mm.

- Moinho de martelos (moinho de Raymond):

32
Este moinho é construído segundo o princípio dos martelos oscilantes, funcionando com
até oito martelos presos a um disco encaixado a um eixo central movido por motor, e a
moagem ocorre por contusão e esmagamento do material e também por atrito entre as
partículas formadas dentro da câmara de moagem. Da mesma maneira que os moinhos de
facas o material moído atravessa um tamis para sair da câmara e previamente homogêneo.

7.5 Tamisação
A tamisação é uma operação de separação de partículas sólidas por meio de malhas de
um tecido apropriado, denominado Tamis. A tamisação pode ser considerada uma operação
acessória à pulverização, determinando a tenuidade e homogeneidade dos pós.

7.5.1 Tamises e Classificação


Os tamises são os instrumentos utilizados para realizar a tamisação. Os tecidos
utilizados na fabricação dos tamises são constituídos por fios da mais variada natureza, como:
ferro galvanizado, latão, aço inoxidável, seda e fibras sintéticas.
Os tamises podem ser classificados de acordo com o número de aberturas por unidade
de superfície.

Para esta classificação são necessárias algumas definições:


Malha: É a unidade constitutiva de um determinado tecido. A malha é igual à soma do diâmetro
dos fios com a distância que separa dois fios consecutivos que é denominado lúmen. Qualquer
tecido tem um número de malhas por cm ou por cm². A superfície útil de um tamis pode ser
cosiderada como sendo apenas a superfície correspondente ao lúmen ou orifício da malha. A
classificação dos tamises pode variar de país para país. Em geral os tamises são designados
por número. Um tamis só é definido quando for estabelecido o número de malhas por unidade
de comprimento, fixando as respectivas aberturas e diâmetro dos fios. Atualmente a maioria
das farmacopéias baseia a classificação dos tamises nestes três elementos, limitando-se a
pequenas diferenças.
33
A Farmacopéia Americana (USP) considera dezenove tamises designados por números
correspondentes às normas E11-70 da American Society for Test Materials (ASTM), na qual os
tamises estão seriados de modo que a relação que existe entre a abertura das malhas de um
tamis e a do seu subsequente é igual a 42.
Os tamises são em geral, designados pelo nº de malhas por polegada linear (= 2,54
cm), denominado mesh.
Na USP o número do tamis coincide, praticamente com o número de mesh.
A Farmacopéia Brasileira 4ª edição descreve 6 tamises, designados por um número
correspondente ao número de malhas por polegada linear, ou seja, 2,54cm, que é igual ao
mesh.
São os tamises n°.10, 20, 40, 60, 80 e 100 cujas características correspondem as da
USP. A tamisação tem por objetivo a calibração do pó.
No caso de drogas vegetais só uma pulverização não consegue reduzir o material
vegetal, em partículas que apresentem um mesmo tamanho e portanto, um mesmo grau de
tenuidade.
As drogas vegetais apresentam estrutura bastante heterogênea, pois a constituição
histológica do material é extremamente variada apresentando estruturas diferentes.
Como a constituição química dos vegetais não é a mesma em todos os tecidos é
necessário homogeneizar perfeitamente os pós tamisados para permitir a distribuição
homogênea de substâncias ativas dentro da quantidade total do pó obtido.

7.5.2 Classificação dos Pós


A classificação dos pós, em geral, é feita por tamisação, em relação a dois tamises. Um
pó deve passar integralmente pelo tamis que o corresponde nominalmente. O mesmo pó
quando passar por tamis menor (malhas mais apertadas, abertura nominal menor), não deverá
originar mais de 40% de tamisado, o que coresponde a porcentagem máxima de fragmentos de
menor tamanho.

7.5.3 Determinação do Grau de Tenuidade do Pó (Critérios adotados pela USP XXVII)


Qtdade. de Pó Tempo de tamização
Pós grosseiros ou 25 - 100g 20 min. *
medianamente grosseiros

Pós finos ou muito finos < 25g 30 min. *

34
*Pesar o pó retido no tamis e o que atravessa o tamis.
Existem pós que precisam ser escovados para que passem pelo tamis.
Ao realizar a pulverização é necessário proceder a tamisação, no decorrer do processo,
pois a variação histológica das drogas vegetais permite obter partículas de tamanho variado,
uma vez que comparativamente os tecidos celulósicos são moídos mais facilmente podendo
atingir menor tamanho, que os tecidos lignificados. A tamisação selecionará a parte do pó que
deverá retornar ao moinho para alcançar o tamanho desejado.

7.6 Extração
É um processo tradicional, milenar, utilizado para extrair do material vegetal, as
substâncias ou conjunto de substâncias com utilidade terapêutica deixando o resíduo ou
marco, que não tem utilidade e pode ser até inconveniente, em muitos casos.

7.6.1 Mecanismo da extração


Durante o processo de extração ocorrem dois fenômenos ao mesmo tempo, a lixiviação
das substâncias solúveis das células rompidas e a dissolução ou difusão das substâncias
solúveis das células intactas.
Quando uma membrana semipermeável separa duas soluções, uma diluída (o solvente)
e outra mais concentrada (o suco celular), o solvente desloca-se no sentido da solução mais
concentrada e portanto penetra no interior das células. A penetração do solvente nas células
induz a um momento dipolar nas moléculas dos compostos a extrair, ocorrendo uma
associação, de força variável das substâncias químicas às moléculas do solvente. A
capacidade de ligação pode ser expressa em termos da constante dielétrica, que é própria de
cada solvente. Quanto mais polar o solvente maior será sua constante dielétrica.
Compostos ionizáveis ou altamente polares se dissolvem em líquidos de elevada
constante dielétrica, ao passo que compostos apolares se dissolvem em solventes de baixa
constante dielétrica.
A constante dielétrica da água (a 25°C) é de 78,3 e a constante dielétrica do benzeno é
2,28, ou seja, a água é um solvente altamente polar e o benzeno um solvente fortemente
apolar.
Os principais processos de extração são:
A - Infusão
A infusão é o modo tradicional de se preparar o chá, ou seja, adicionando-se água
fervente sobre as partes do vegetal dessecado que contém substâncias ativas, em geral,
substâncias termossensíveis ou voláteis como óleos essenciais e se aplica às partes mais
35
frágeis como folhas membranáceas e flôres ou pétalas de flôres, que facilmente liberam seus
ativos.

A proporção entre droga vegetal e água pode variar, conforme a espécie e a sua quantidade
de ativos. De maneira geral pode-se usar uma concentração de 5g de droga seca para 100ml
de água fervente.
B - Decocção
A decocção pode ser realizada com a planta fresca ou com a droga vegetal, colocando-
as em contato com a água fria e aquecendo-se até a ebulição e mantendo-se o aquecimento
por alguns minutos. O resultado deste processo é chamado decocto. Esta técnica é utilizada
para plantas e drogas cujas partes usadas são lenhosas e, portanto, dificultam a liberação das
substâncias ativas e só pode ser aplicada quando estas substâncias não são termossensíveis.
A decocção também pode ser feita sob refluxo, com a recuperação do solvente
utilizado.

C - Maceração
A maceração é o processo de extração onde a droga, em geral pulverizada é deixada
em contato com um volume relativamente grande de solvente, até que as substâncias solúveis
36
se distribuam uniformemente em toda massa do líquido e ocorra o equilíbrio osmótico entre o
suco celular e o solvente. Quando o equilíbrio é atingido não há mais difusão e a extração
cessa. É fácil deduzir que quanto maior a quantidade de material a ser extraída por este
processo, mais longa e demorada será a extração e grandes quantidades de solventes são
necessárias. A solução extrativa é denominada macerado. O tempo de extração é variável,
podendo ir de horas até dias.
Este processo não leva ao esgotamento total da droga e também depende de fatores
ligados à droga vegetal, a granulometria, teor de umidade, concentração e seletividade do
solvente e do grau de intumescimento das células.
Existem dois tipos de maceração:
1. Estática: onde a droga fica em contato com o solvente por vários dias, com agitação
ocasional.
2. Dinâmica: a droga vegetal e o solvente entram em contato e são mantidos em agitação
constante, em extratores com ou sem aquecimento, que em geral utilizam o movimento
de rotação, melhorando a eficiência da extração e diminuindo o tempo do processo.
Vale lembrar que o processo de maceração deve ocorrer em recipientes ou extratores
confecionados de material inerte, como vidro, inox ou mesmo PVC.
As principais desvantagens do processo de maceração são: a lentidão do processo e a
possibilidade de não alcançar o esgotamento total da droga vegetal.
Para proceder ao esgotamento total do material vegetal, podem ser utilizadas prensas,
com sistema hidráulico ou mecânico, que espremem a droga umedecida com solvente, após o
tempo de extração, aumentando o rendimento.

D - Percolação

37
Consiste em submeter uma droga vegetal pulverizada, sujeita a uma maceração prévia,
para o umedecimento e início da difusão das substâncias extraíveis para fora da célula,
realizado em um recipiente adequado fora do extrator.
Após o umedecimento, a droga é acondicionada em um percolador ou lixiviador de
formato cônico, confeccionado em material inerte: inóx, vidro ou PVC.
Ao conjunto adiciona-se quantidade suficiente de solvente para cobrir droga e a ação
do solvente, se processa no sentido vertical, de cima para baixo. O mecanismo deste processo
extrativo se resume na interação entre duas forças que atuam no líquido e na droga, a pressão
hidrostática da coluna de líquido (no sentido da gravidade) e a capilaridade (em sentido
contrário). O resultado deste processo extrativo é chamado lixiviado ou percolado.
O abastecimento de solvente deve ser contínuo no sistema, após o início da percolação
que será finalizada quando do completo esgotamento da droga que pode ser verificado pelas
características organolépticas do lixiviado, que não deve mais apresentar cor, cheiro ou sabor
da droga que está sendo extraída. Ou ainda, quando pequena quantidade de lixiviado ao ser
evaporado, não apresente mais quantidade apreciável de resíduo.
Trata-se de um processo dinâmico, ao contrário da maceração, pois, o solvente está
em constante movimento através da droga. A velocidade de escoamento do solvente deve ser
tal que a cada 24 horas, sejam obtidos em lixiviado ou percolado 1 1/2 vezes o peso de droga
colocado no aparelho. A percolação pode ser simples ou em série (repercolação).
A percolação simples apresenta como desvantagem a utilização de grande quantidade
de solvente, para possibilitar o esgotamento dos ativos, resultando na necessidade da
concentração do grande volume obtido, na maior parte das vezes utilizando-se a evaporação
do solvente, ou seja, com uso de calor, o que pode alterar a composição química do extrato.
A repercolação ou percolação em série, ou ainda percolação cíclica, permite a utilização
da mesma quantidade ou volume de solvente para extrair várias porções de droga, utilizando-
se uma corrente de solvente sob pressão (Diacolação) ou vácuo (Evacolação).

38
E - Turbólise
A turbólise é um processo extrativo, no qual se utiliza um turbolisador, onde a droga
vegetal submersa no solvente é triturada por um rotor-estator, liberando e dissolvendo os
conteúdos celulares. Este processo de extração é exotérmico, sendo necessário o controle
constante da temperatura e quando necessário proceder ao resfriamento.
O rendimento em geral é alto, devido à redução da droga vegetal em partículas muito
pequenas e também devido à contínua homogeneização entre solvente e droga.
Dentre todos os métodos apresentados a turbólise é o mais utilizado, em qualquer
escala e para as mais diferentes drogas vegetais.
Algumas desvantagens deste método podem ser
apontadas:
A geração de calor durante o processo, restringindo-se
os solventes utilizados; a difícil separação da solução extrativa
por filtração e dificuldade de utilização para matérias-primas
muito duras ou lignificadas, como caules, raízes, rizomas e
cascas.

7.7 Fatores que influenciam na extração


Existem muitos fatores que influenciam os processos extrativos e o seu rendimento,
entre os mais importantes podemos citar:
- Estado de divisão da droga;
- Natureza e a concentração do solvente;
- Temperatura;
- Influência da tensão superficial do líquido extrator;
- Agitação;
- influência do pH;
- Método e o tempo de extração;
- Constituição química da droga.
Desta forma deve-se sempre lembrar que os extratos preparados com um mesmo lote
de matéria-prima, mas extraídos por métodos diferentes podem resultar em soluções extrativas
diferentes e portanto, com diferentes respostas terapêuticas.

7.7.1 Natureza e concentração do solvente


De acordo com a solubilidade das substâncias ativas presentes no material vegetal é
que devem ser escolhidos os solventes para a extração.

39
Em geral são utilizadas misturas de álcool e água em diferentes proporções, pois estes
compostos extraem a maioria dos compostos polares presentes nas plantas, como por
exemplo: taninos, flavonóides, terpenos, alcalóides, entre outros.
Solventes de menor polaridade podem ser utilizados para a extração de substâncias
apolares, como óleos e ácidos graxos.
A tabela abaixo apresenta diferentes solventes para a extração de diferentes classes de
compostos químicos presentes nas plantas.
Classes químicas Solventes
Óleos volateis Vapor de água, éter, diclorometano.
Cumarinas Água, etanol, diclorometano, acetato de etila.
Lignanas Diclorometano, metanol, etanol, butanol.
Flavonóides Clorofórmio, diclorometano, acetato de etila,
acetona, metanol, água, ácidos.
Taninos Metanol, água e acetona.
Quinonas Clorofórmio, acetona, metanol.
Heterosídeos cardioativos Água, etanol, metanol, clorofórmio.
Saponinas Água, etanol, metanol, diclorometano,
clorofórmio, butanol.
Alcalóides Água, clorofórmio, diclorometano, hexano,
ácidos e bases.

As misturas hidroalcoólicas podem ser utilizadas em variadas proporções para a


extração de diferentes classes de compostos químicos, como mostra a tabela a seguir:
Planta Solvente (V/V) Classe química
Guaco Etanol 80% Cumarinas
Carqueja Etanol 50% Flavonóides
Uva-ursi Metanol a 50% Quinonas
Castanha-da-Índia Etanol 70% Triterpenos
Sene Etanol 50% Derivados hidroxiantracênicos
Polígala Etanol 70% Saponinas

7.7.2 Temperatura
A temperatura influencia o processo extrativo de maneira decisiva, pois pode facilitar a
dissolução das substâncias que estão sendo extraídas, mas também, pode acelerar a
decomposição de substâncias termossensíveis e causar a perda de substâncias voláteis.
Exemplo:
Efeito da temperatura sobre o rendimento do processo de extração de alcalóides
Parâmetros Experimento 1 Experimento 2 Experimento 3
Teor alcoólico (%) 50 50 50
Tempo de extração (h) 1 1 1
Temperatura (ºC) 40 60 80
Rendimento (%) 2 2,3 1,4
40
Neste exemplo pode-se observar que não há uma correlação positiva entre um
aumento da temperatura e o rendimento do processo de extração de alcalóides.

7.7.3 Método de extração


Esta também é uma variável que em muito influencia o processo extrativo, pois de
acordo com a parte da planta e as substâncias a serem extraídas, o método determinará o
rendimento do processo.
Em geral a turbólise é o método que oferece a melhor relação custo/benefício, dentro
dos processos extrativos, principalmente quando se trata do tempo de extração.
Exemplo:
Efeito do método sobre a extração de alcalóides de beladona.
Método Tempo Concentração
(mg/100ml)
Percolação 5 dias 52
Maceração 10 dias 45
Agitação simples 15 minutos 43
Turbólise 10 minutos 54

7.7.4 Tempo de extração


O tempo de extração pode variar de minutos até dias, dependendo do tamanho do lote,
do produto a ser extraído, da solubilidade, da concentração de ativos entre outras
características. O prolongamento do tempo de extração muitas vezes é necessário para o
esgotamento total da droga, mas muitas vezes para isso é necessária uma maior quantidade
de solvente, tempo, mão-de-obra, encarecendo o processo. Exemplos:
Diferentes tempos de extração direcionados a identificação de classes químicas de
drogas vegetais
Planta Tempo (min) Classe química Método de extração
Boldo 120 Alcalóides Maceração
Carqueja 20 Flavonóides Turbólise
Castanha-da-Índia 15 Triterpenos Refluxo
Espinheira-Santa 35 Taninos Refluxo
Macela 60 Flavonóides Refluxo
Malva 15 Mucilagem Agitação simples
Ruibarbo 15 Antracênicos Agitação simples
Uva-ursi 10 Quinonas Refluxo

7.7.5 Agitação
A eficiência do processo de extração muitas vezes depende da agitação, pois esta
variável age no equilíbrio de saturação dos solventes, aumentando o rendimento do processo.
41
7.8 Tipos de Extratos
Extratos são preparações farmacêuticas sólidas obtidas pela concentração, das
soluções resultantes do esgotamento de drogas por um solvente, como água, álcool
(necessariamente álcool de cereais, para o consumo humano) éter, acetona e outros solventes.
Extratos obtidos com outros líquidos extratores impróprios para consumo humano terão
que ser concentrados, para total eliminação do líquido extrator.

EXTRATOS = Por conceito farmacopéico são preparações sólidas, (antigamente chamados


tinturas sólidas).

OBSERVAÇÃO:
As preparações farmacêuticas fitoterápicas, na forma líquida, que não satisfazem as
definições ou conceitos oficiais, devem ser designadas genéricamente como soluções
extrativas.
Para utilização destas preparações em formulações, tanto de uso interno como de uso
externo, são necessárias informações detalhadas sobre a forma de preparo, a concentração da
droga, a concentração de ativos, expressa em ativos, ou em marcadores e a quantidade
necessária para uso terapêutico recomendado.

7.8.1 Tinturas
As tinturas são soluções extrativas alcoólicas ou
hidroalcoólicas preparadas a partir de uma droga vegetal
ou animal. As tinturas podem ser simples ou compostas,
conforme o número de drogas vegetais que lhe deu
origem.
Soluções obtidas pela diluição de extratos
dessecados ou concentrados em misturas hidroalcóolicas também são denominadas tinturas.
As tinturas podem ser preparadas por maceração ou por percolação à temperatura
ambiente. As tinturas simples recebem o nome da droga a partir da qual foram obtidas. As
tinturas compostas têm nomes especiais, como por exemplo, a tintura de ópio canforada,
também denominada elixir paregórico.
O teor alcóolico das tinturas pode variar de acordo com a solubilidade dos ativos e
geralmente isto está definido em monografia farmacopeica.

42
A relação de concentração droga/solvente, em geral é
determinada de acordo com a atividade da droga, ou seja,
para drogas muito ativas (drogas heróicas), como por
exemplo, aquelas ricas em alcalóides, a proporção droga-
solvente é de um 1:10, ou seja, 1 parte de droga para 10
partes de solvente, ou seja 10%.
Para as drogas, pouco ativas (não heróicas), a relação
é de 1:5, uma parte de droga para 5 partes de solvente, ou
seja 20%.

Exemplos de tinturas farmacopeicas:


Droga Processo Quantidade Solução hidroalcoólica
(g) (%)
Babosa Maceração 200 75
Benjoim Maceração 200 100
Capsicum Maceração 200 33,3
Ipecacuanha Percolação 200 75
Tuia Maceração 200 50

7.8.2 Extrato fluído


Extratos fluídos são preparações extrativas concentradas, líquidas, que equivalem em
substâncias ativas às drogas vegetais de onde foram extraídos, portanto:
1g ou 1ml de extrato fluído = 1g de droga vegetal seca, em substâncias ativas.
Todos os extratos fluídos contêm álcool, cuja concentração é variável e depende da
natureza da droga extraída. Os extratos fluídos apresentam algumas vantagens em relação às
tinturas e as demais soluções extrativas, pois permitem o estabelecimento de esquemas
posológicos.
Os extratos fluídos são preparados sempre por percolação, sendo o álcool e misturas
de álcool e água os veículos mais empregados. O álcool pode ser usado nas seguintes
graduações: 30, 45, 60, 70 e 80ºGL. Há processos extrativos onde o álcool pode ser
adicionado de outros agentes que facilitem o processo extrativo e até mesmo de conservantes,
como o ácido ascórbico, antioxidantes e agentes quelantes entre outros.
A análise realizada para os extratos fluídos é muito semelhante a das tinturas. Sua
conservação está baseada nos métodos tradicionais e o prazo de validade é, em geral,
reduzido.

43
Os extratos fluídos podem ser padronizados, em termos de concentração do solvente e
teor de constituintes.

7.8.3 Extrato Glicólico


Os extratos glicólicos são obtidos pelos processos de maceração ou percolação da
droga vegetal em um solvente hidro-glicólico, podendo ser o propilenoglicol ou a glicerina. A
relação droga/solvente varia, sendo indicadas normalmente as mesmas relações
droga/solvente utilizadas para as tinturas, ou seja, 10 ou 20% (m/v).
Os extratos glicólicos são indicados para utilização em soluções de base aquosa, géis
sem álcool, emulsões água/óleo e em tensoativos, como sabões líquidos e xampus).

7.8.4 Extratos secos


Os extratos secos são sólidos, pulverulentos ou
granulados e se apresentam sob a forma de pó, como teor
de água entre 2 a 8%. Este processo de secagem em
geral é por aspersão ou por liofilização.

44
7.8.4.1 Aspersão ou Nebulização ou Atomização (Spraydryer)

É um processo que consiste em introduzir um líquido sob a forma de gotículas em uma


câmara aquecida por corrente de ar quente e seco e a evaporação dos líquidos das gotículas
se dá instantaneamente.
O processo de nebulização consiste na transformação de um líquido ou de uma
solução, em pó, envolvendo 4 etapas:
• Atomização do líquido através de um bico atomizador;
• Contato com spray de ar;
• Secagem das gotículas atomizadas;
• Coleta do material seco (micropartículas);
Devido à rápida evaporação do solvente, a temperatura das gotículas pode ser preservada
da temperatura do ar de secagem e por esta razão pode ser aplicada para substâncias
sensíveis ou não.
Os aparelhos de spray-dryer podem ser classificados de acordo com os seus
componentes, que são:

- Aquecedor de ar;
- Bico ou agulha de atomização;
- Câmara de spray, ou de secagem;
- Ventilador;
- Ciclone;
- Frasco coletor.

A nebulização pode ser realizada em condições


assépticas, condição importante na obtenção de formas
farmacêuticas que exigem esterilidade como os colírios e as
preparações parenterais.
A secagem por nebulização pode ser aplicada em
várias áreas do campo farmacêutico:
- Obtenção de insumos farmacêuticos;

45
- Obtenção de granulados;
- Dispersão de sólidos em polímeros solúveis em água;
- Complexação de substâncias com ciclodextrinas;
- Alteração do polimorfismo de drogas;
- Preparação de pós para aerossóis;
- Encapsulamento de produtos voláteis (microencapsulação).
O processo de nebulização deve ser realizado para soluções que contenham em média
20% de sólidos solúveis ou suspensos, para tanto, pode ser necessário a adição de adjuvantes
para alcançar este percentual e tornar possível o processo. Das substâncias que podem ser
adicionadas, o mais utilizado é o dióxido de silício (SiO2), pó amorfo, insolúvel em água, e que
absorve grande quantidade de umidade sem alterar-se de forma significativa, funcionando como
agente absorvente.
Os extratos secos obtidos por spray-drying podem ser facilmente manipulados, apesar
de serem muito higroscópicos. A incorporação de adjuvantes tecnológicos como amido,
sacarose, lactose, maltodextrina ou dióxido de silício coloidal aumentam a estabilidade dos
extratos e os torna mais adequados para manipulação, mas devem ser igualmente conservados
em recipientes herméticamente fechados sem presença de desidratantes e ao abrigo da luz.
Em relação à solubilidade dos extratos pode-se optar pela adição de maltodextrina, para
extratos solúveis em água e a adição de amido para torná-los insolúveis.
A adição de corantes também pode ocorrer no sentido de melhorar o aspecto do extrato
seco e consequentemente a sua aceitação. Os corantes mais utilizados são os caramelos, e
nos extratos de frutas aqueles que correspondem à cor original das frutas.

7.8.4.2 Liofilização
Liofilizar é desidratar um produto congelado pelo vácuo, sublimando o gelo. A sublimação
consiste em passar do estado sólido para o gasoso, sem passar pelo líquido. O ponto
fundamental do processo está em evitar que o gelo seja fundido durante a operação, que é
realizada abaixo do ponto triplo. O ponto triplo representado esquematicamente é o ponto de
equilíbrio entre pressão e temperatura onde a água coexiste em seus três estados: o líquido, o
sólido e o gasoso. Portanto, o ideal é trabalhar em condições de temperatura e pressão abaixo
do ponto triplo para que se obtenha a sublimação do gelo sem a sua fusão. Dois pontos são
muito importantes no processo de liofilização: o congelamento prévio do material a ser liofilizado
e a rápida sublimação do gelo formado. Para alcançar uma redução da temperatura de maneira
uniforme e rápida o produto a congelar deve ser acondicionado em frascos de pequenas
dimensões, em pequeno volume, entretanto em grande superfície. Para um rápido

46
congelamento o refrigerante mais utilizado é o gelo seco (neve carbônica) em conjunto com
álcool ou acetona, ou também nitrogênio-líquido, atingindo a temperaturas de -86°C.

A liofilização é considerada o método ideal para a secagem de produtos termolábeis ou


de substâncias de natureza complexa sensíveis aos agentes atmosféricos.
➢ Vantagens:
- O produto mantém suas características inalteradas devido à baixa temperatura em que o
processo é realizado, como por exemplo, a composição química e a atividade terapêutica,
entretanto deve ser acondicionado e armazenado em condições adequadas;
- Mínima perda de constituintes voláteis;
- Os produtos liofilizados têm rápida dissolução e reconstituição perfeita em seu produto original;
- O desenvolvimento de qualquer tipo de contaminação é muito pequeno tendo em vista o baixo
teor de água dos produtos liofilizados.

7.9 Padronização de extratos


A padronização de extratos vegetais é muito importante para o fornecimento de subsídios
que comprovem a reprodutibilidade dos efeitos dos produtos fitoterápicos, melhorando a sua
qualidade e atendendo às necessidades crescentes dos consumidores e órgãos de fiscalização.
Extratos padronizados são aqueles em que o teor de um ou mais constituintes é ajustado
a valores previamente definidos. Esta padronização emprega técnicas analíticas com o objetivo
de garantir que os extratos tenham a mesma quantidade de substâncias ativas ou de
marcadores.
O ajuste do teor de constituintes de um extrato pode ser feito adicionando-se solvente,
adicionando-se outro extrato mais diluído (obtido com o mesmo material e mesmo solvente)
adição de adjuvantes tecnológicos ou pela concentração.

47
7.9.1 Padronização feita pela relação droga/extrato
A padronização de extratos pode ser feita pelo estabelecimento de uma relação
droga/extrato, ou seja, quanto em peso foi inicialmente utilizado de planta seca para fornecer a
quantidade determinada de extrato seco.
Em geral, um extrato líquido sem a adição de adjuvantes ao ser levado à secagem por
evaporação, resulta em um resíduo seco em torno de 30%, ou seja, estão presentes no extrato
líquido obtido cerca de 30% de sólidos solúveis. Portanto a relação droga/extrato é de 3:1, ou
seja, são necessários 3kg de planta seca para obter-se 1kg de extrato seco. Existem plantas
cuja relação droga/extrato é diferente, e esta variação pode ir de 5 a 50%.
Exemplos:
Para uma planta que fornece 50% de resíduo seco a relação é de 2:1, ou seja, são
necessários 2 kg de planta seca para a obtenção de 1 kg de extrato seco.
Para plantas que fornecem 5% de resíduo seco a relação é de 20:1, ou seja, são
necessários 20 kg de planta seca para a obtenção de 1 kg de extrato.
Um exemplo bem conhecido é o do extrato de Ginkgo biloba, cujas folhas são extraídas
por um longo e complexo processo, originando o extrato padronizado conhecido como EGB 761.
A proporção entre as folhas e o extrato final é relatada como sendo de 50:1 (2%), demonstrando
quão concentrados estão os ativos, em relação a quantidade original das folhas.
Como quase sempre ocorre a adição de adjuvantes com o objetivo de melhorar as
características tecnológicas do extrato, estas proporções podem ser alteradas, em geral para
menos, ou seja, os excipientes “diluem” a concentração de ativos no extrato seco.
Cuidados têm que ser tomados, pois há alguns absurdos nos extratos secos
comercializados, como por exemplo, extratos 1:2, isto é, 1kg de planta originaram 2Kg de
extrato seco, o que seria impossível acontecer após os processos de extração e concentração,
um exemplo claro de grande adição de adjuvantes e diluição excessiva dos ativos.

7.9.2 Padronização pelo doseamento químico


Esta padronização envolve a quantificação das substâncias químicas relacionadas aos
efeitos terapêuticos. Estas substâncias podem ser as efetivamente ativas ou então os
marcadores (teor de constituintes ativos padronizados)
No caso do EGB 761, o extrato é padronizado pelo doseamento de dois grupos químicos
principais, as lactonas terpênicas em concentração de 6% e os flavonóides presentes à 24%.
Um extrato hidroalcoólico preparado por metodologia diferente da do EGB 761, fornece
um extrato com 0,2%de lactonas e 4% de flavonóides, ou seja, uma composição totalmente
diferente daquela com o qual foram feitos os estudos farmacológicos e clínicos e, portanto sem

48
a garantia de produzir os mesmos efeitos. Para que este extrato apresentasse resultados
similares aos do EGB761, seria necessário administrar ao paciente, doses de 6 a 30 vezes
maiores que a estabelecida.
Muitos exemplos como estes são encontrados no comércio de extratos vegetais,
agravado pelo fato da adulteração por sofisticação, ou seja, pela adição, na droga ou no extrato
de substâncias naturais isoladas ou substâncias sintéticas de estrutura química semelhante à
dos princípios ativos contidos originalmente; adulterações estas que só podem ser verificadas
através do doseamento químico, utilizando-se, metodologias mais sensíveis e sofisticadas como
a CLAE (Cromatografia Líquida de Alta Eficiência).
Embora a técnica de doseamento de ativos ou de marcadores seja a mais segura e
aceita atualmente, há muitos problemas e dificuldades para sua efetivação. Uma delas está na
dificuldade em obter-se padrões isolados e puros que possam ser utilizados de maneira rotineira
em análises de controle de qualidade, outro problema é que há muitas plantas que mesmo
sendo conhecidas e estudadas não se sabe ainda quais são seus ativos.

8 DESENVOLVIMENTO DE FORMULAÇÕES FITOTERÁPICAS

O desenvolvimento e a correta formulação de uma forma farmacêutica requerem o


conhecimento das características físicas, químicas e biológicas de todas as substâncias ativas e
adjuvantes a serem usadas na preparação, visando garantir uma eficiente absorção e
distribuição e o efeito terapêutico preconizado.
Grande parte das plantas medicinais pode ser encontrada na forma de extratos vegetais,
disponíveis para ser consumidas na forma extratos líquidos e secos. No entanto os extratos
vegetais podem apresentar características indesejáveis para o consumo e a administração,
como a instabilidade química e características organolépticas indesejáveis.
Um mesmo extrato vegetal pode ser preparado em diferentes formas farmacêuticas,
visando atender exigências de seu consumo pelo paciente, como também características
farmacotécnicas.
Entre os fatores determinantes para a preparação de um fitoterápico, está a possibilidade
de mascarar o sabor desagradável e amargo de alguns extratos, a proteção dos metabólitos
ativos dos agentes do ambiente como ar (oxigênio) e umidade, além de outros fatores como o
suco gástrico após administração oral.
O desenvolvimento de uma preparação também deve buscar um teor de constituintes
ativos padronizados (marcadores) de fácil administração, oferecendo ao paciente um maior
conforto e assegurando a inocuidade e ação farmacológica desejada. Exemplos:
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Tabela 1: Exemplos de fitoterápicos segundo a sua forma farmacêutica, a dose
de marcadores ativos e a via de administração.
Espécie Forma Via de Marcador Dose diária
vegetal farmacêutica administração
Aloe vera Creme, gel tópica Polissacarídeos Preparação
totais com 35 a 70%
de gel
mucilaginoso
2x ao dia
Calendula Tintura e tópica Flavonóides Equivalente a
officinalis extratos totais 8,8 – 17,6mg
expressos em de flavonóides
quercetina
Matricaria Tintura e Oral e tópica; Apigenina-7- Equivalente a
recutita extratos tintura apenas glicosídeo 4-24mg de
uso tópico apigenina-7-
glicosídeo
Centella Extrato seco oral Ácidos Equivalente a
asiatica triterpênicos 6,6-13,6mg de
(asiaticosídeos) asiaticosídeos
Panax ginseng Tinturas, Oral Ginsenosídeos Equivalentes a
extratos totais 5-30mg de
ginsenosídeos

Atualmente, observa-se uma tendência de utilização de formulações monodroga, em


fitoterápicos, ou seja, formulações contendo um só extrato vegetal.
A escolha da forma farmacêutica para veicular um extrato vegetal deve levar em
consideração:
1. Características físico-químicas do extrato (solubilidade, pH, estabilidade).
2. Velocidade e local de absorção do(s) ativo (s) que compõem o extrato.
3. Ação local ou sistêmica.
4. Individualidades do paciente (idade, outras doenças e/ou disfunções).
As principais formas farmacêuticas para administração de fitoterápicos são:
Tabela 2: Formas farmacêuticas e vias de administração de fitoterápicos:
Via de administração Forma farmacêutica
Oral Tintura, extrato fluído, suspensão,
xarope, elixir, cápsula e comprimido.
Tópica Emulsão (creme), pomada, pastas, gel,
loções, solução, tintura e aerossol.
Retal Supositório

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8.1 Formas farmacêuticas líquidas
As formas farmacêuticas líquidas podem ser preparadas a partir de tinturas e extratos
vegetais fluídos, moles ou secos. Os extratos moles são os pouco empregados, pois
apresentam dificuldades na manipulação, conservação e padronização.
As formas fitoterápicas líquidas apresentam algumas vantagens como: homogeneidade
do produto, facilidade no ajuste da dose, adsorção rápida e facilidade de administração. Como
desvantagens, devido à presença de grande variedade e quantidade de substâncias químicas, a
formação de precipitados, menor estabilidade físicoquímica, comparado às formas sólidas e em
alguns casos a necessidade da adição de adjuvantes para mascarar o sabor desagradável.
Na composição de uma forma fitoterápica líquida fazem parte, além do extrato vegetal, o
veículo e os adjuvantes.
- Veículos
O veículo é o componente presente em maior quantidade na fórmula, chamado também
de solvente. Além do fator solubilidade é necessário estudar em relação ao solvente,
características como: transparência, baixa toxicidade, viscosidade, compatibilidade com os
outros componentes da formulação, palatabilidade, odor, cor e custo. A tabela abaixo apresenta
alguns dos principais solventes utilizados nas formas farmacêuticas líquidas.
Tabela 3: Principais solventes e suas características.
Solvente Vantagens Desvantagens
Água purificada Solvente universal, inerte e de baixo Passível de contaminação e
custo. reações de hidrolise
Álcool etílico Pode ser utilizado juntamente com a Restrição para uso interno,
água em diferentes proporções concentração máxima permitida
para uso pediátrico 0,5% e
adultos 2% (RE 01/2002
ANVISA).
Glicerina Miscível em água e álcool tem ação Aquecida acima de 150oC,
umectante, e atividade antimicrobiana decompõem-se produzindo
em concentração superior a 20%. acroleína; em excesso pode ter
efeito laxante; é higroscópica.

Propilenoglicol Miscível com água e álcool; útil em Higroscópico


aplicações orais e tópicas; miscível
com a maioria dos óleos essências e
fixos, tem ação antimicrobiana em
concentrações de 15 a 30%
Sorbitol Sabor adocicado, solúvel em água e Levemente laxativo; higroscópico.
álcool, pode substituir a sacarose em
preparações para pacientes
diabéticos.
Óleos vegetais Mais estáveis que as soluções Sabor desagradável, sofrem
aquosas reações de hidrolise e oxidação e
formam ranço.
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- Adjuvantes
São substâncias empregadas para auxiliar o desenvolvimento e garantir a estabilidade
das preparações. Devem ser inócuos nas quantidades utilizadas e não interferir na atividade
farmacológica do ativo. São adjuvantes as substâncias conservantes, estabilizantes, corretivos
de pH, corretivos de sabor, de viscosidade, antioxidantes, quelantes, etc., os principais para
formas líquidas são:
Tabela 4: Principais adjuvantes utilizados em formas líquidas
Adjuvantes Função Exemplos Características
Conservantes Previnem o Parabenos: metil e Concentração usual: 0,1 a 0,2%. A
crescimento propilparabeno associação entre metil e propil parabenos
microbiano exerce efeito sinérgico.
pH 4,0 a 8,0
Atividade aumenta quando associado à
propilenoglicol (10%). Podem ser
parcialmente antivados pela presença de
Tweens (polioxietilenoglicol).
Álcool etílico Concentração usual 15 a 20%.
Ácido benzóico Concentração usual 0,1 a 0,2%
pH 2,5 a 4,5
Benzoato de sódio Concentração usual 0,02 a 0,5%
(mais solúvel que o pH 2,0 a 5,0
ácido benzóico em
água)
Corretivos de Flavorizantes Correção de sabor Fornece odor e sabor agradáveis a
sabor doce: baunilha, formulação.
tutti-frutti, uva,
morango,
framboesa e
amora.
Correção de sabor
azedo: limão,
laranja, amêndoas.
Correção de sabor
salgado:
Amêndoa, xarope
de canela e xarope
de laranja.
Correção de sabor
amargo: anis, café,
chocolate com
menta, limão.
Correção de sabor
oleoso: menta, anis
e hortelã.
Correção de sabor
metálico: morango,
framboesa, cereja
e uva.
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Fornecem Sacarose Base do xarope simples, inconveniente no
sabor caso de diabéticos e intolerantes ao
adocicado açúcar.
Glicose Cariogênica.
Sorbitol, manitol e Podem ser associados a outros
outros açúcares. adoçantes não calóricos e mascaram o
sabor residual.
Edulcorantes Sacarina (500 Concentração usual: 0,02 a 0,5%,
não calóricos vezes mais doce decompõem-se a altas temperaturas
que o açúcar) (125ºC). Possui sabor residual metálico.
Aspartame (180 Estável em pH de 3,5 a 5,0.
vezes mais doce Fenilcetonúricos não podem utilizá-lo.
que o açúcar)
Ciclamato de sódio Usado em associação com a sacarina, é
(30 vezes mais estável em ampla faixa de pH.
doce)
Acessulfame de Mais estável que o aspartame.
potássio (de 180 a
200 vezes mais
doce)
Stevia rebaudiana Tem sbor residual acentuado, pode ser
(20 vezes mais usada em associação com o ciclamato,
doce) acessulfame K e aspartame, mas não
com sacarina.
Sucralose (600 Sabor persiste por mais tempo.
vezes mais doce)
Corretivos de Ajuste do pH Hidróxido de sódio Soluções diluídas de 10 a 50% (p/v).
pH do meio para e ácido cítrico
estabilizar a
preparação
Tampões citrato e
fosfato
Quelantes de Formam EDTA Concentração usual: 0,005 a 0,1%, o de
metais complexos ser associado ao α-tocoferol.
com metais
que podem
catalisam
reações de
oxidação
Antioxidantes Substâncias Metabissulfito de Concentração usual: 0,05%, estável em
que sódio (sistema pH ácido.
interrompem aquoso)
ou previnem
reações de
oxidação
Bissulfito de sódio Concentração usual: 0,1%, estável em pH
(sistema aquoso) neutro.
Sulfito de sódio Concentração usual: 0,1%, estável em pH
(sistema aquoso) alcalino.
Ácido ascórbico Concentração usual: 0,05% a 3%, estável
(sistema aquoso) em pH neutro.
53
BHT Concentração usual: 0,03 a 0,1%.
BHA Concentração usual: 0,005 a 0,1%.
Podem ser utilizados em conjunto com o
BHT.
Vitamina E (α- Concentração usual: 0,05 a 2%.
tocoferol)
Tensoativos Promovem a Tweens Concentração usual: 1,0 a 10%.
dispersão de
substancias
imiscíveis no
veículo
Agentes Aumentam a Polímeros Considerar carga iônica entre ativos e o
espessantes consistência formadores de polímero escolhido.
géis, CMC sódica,
Carbopol e
Natrosol
Corantes e Oferece cor Podem ser Concentração usual: 0005 a 0,05%.
pigmentos a preparação orgânicos naturais
e devem ser (curcumina, beta–
inertes (não caroteno) ou
alergênicos) sintéticos (amarelo
de tartrazina,
vermelho de
eritrosina) ou então
minerais (dióxido
de titânio, óxidos
de ferro)

8.1.1 Xaropes
São soluções aquosas com elevada concentração de açúcar (sacarose ou outros
açúcares). Geralmente contem cerca de 2/3 do seu peso em sacarose (de 60 a 80% p/v), no
entanto soluções com 45% p/v já são consideradas xaropes. Os xaropes são formulações
multidose, de pH entre 4,0 e 8,0 e são soluções saturadas hipertônicas. Portanto, xaropes que
contem somente sacarose e água, não precisam de conservantes.
Entretanto, quando esta hipertonicidade for diminuída, pelo aumento de água ou adição
de outro constituinte a adição de conservantes é necessária.
Entre os mais utilizados estão: ácido benzóico, benzoato de sódio e combinações dos
parabenos.
Os principais componentes dos xaropes são: sacarose, conservantes, aromatizantes,
corantes, solventes, espessantes, estabilizantes e água. O xarope que contem açúcar e água,
somente deve ser preparado à quente. A temperatura não pode ultrapassar a 80°C, para não
ocorrer a hidrólise da sacarose, em glicose e frutose, denominados de açúcares invertidos.

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A decomposição da sacarose favorece a contaminação microbiana e também a
fermentação.
Os xaropes são soluções hipertônicas, ou concentradas e podem cristalizar, muito
facilmente. Este efeito pode ser reduzido pela presença de polióis, como sorbitol e glicerina, em
concentrações de 15 a 30%.
Os xaropes fitoterápicos podem ser preparados a base de extratos fluídos e tinturas, em
geral a concentração de 10%. Como por exemplo: Xarope de Agrião (Nastartium officinale), de
Alho (Allium sativum), de Limão (Citrus lemon), de Eucalipto (Eucaliptus spp.), de Guaco
(Mikania glomerata) e de Poejo (Mentha pulegium).
Nestes casos o xarope base é preparado com sacarose e água, adicionados de um
conservante, pois a adição do extrato vegetal ou da tintura pode alterar a hipertonicidade da
formulação.
Exemplos:
Xarope base com conservantes:
Sacarose 85%
Metilparabeno (Nipagin) 0,15%
Extrato vegetal Até 10%
Água purificada qsp 100ml

Extrato fluído de agrião 10%

Extrato fluído de guaco 10%

Xarope-base com conservante qsp 100ml

Xarope Fitoterápico Expectorante

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Xaropes também podem ser produzidos sem sacarose, para atender as necessidades de
pacientes diabéticos e também de pacientes pediátricos, cuja tendência é diminuir a ingestão de
açúcar, evitando a incidência de cáries e também para não colaborar com os casos de
obesidade infantil.
Para xaropes sem sacarose, os chamados edulitos, a viscosidade da preparação é
obtida por meio de um agente de viscosidade como a CMC-Na (carboximetilcelulose sódica) e
com a adição de edulcorantes e conservantes.
Exemplo:
Veículo-base para xarope sem sacarose
Carboximetilcelulose sódica 0,6%
Sorbitol 10%
Sacarina sódica 0,10%
Metilparabeno 0,15%
Extrato vegetal Até 15%
Água purificada q.s.p. 100 ml

O mel pode ser utilizado em associação ao xarope simples, na concentração de 10%, ou


ainda em preparações onde o próprio mel é o veículo, os chamados melitos, com a seguinte
composição: mel, água purificada e caulin, na proporção de 1:1:0,6.

8.1.2 Formas líquidas de uso odontológico


O principal representante destas preparações é o enxaguatório bucal, destinado a
aplicação na cavidade oral, possuindo ação local e não devendo ser ingerido.
Exemplo:
Enxaguatório bucal com extrato vegetal

Adoçante artificial 0,1%

Conservante 0,2%
Sorbitol 10%
Essência de hortelã Qs
Extrato vegetal de Salvia ou de alecrim Até 10%
Água purificada qsp 100ml

56
8.1.3 Controle de qualidade e estabilidade de formas farmacêuticas fitoterápicas líquidas
As principais análises de controle de qualidade para formas farmacêuticas líquidas
fitoterápicas são:
Aferição de peso e volume final, densidade, pH, perfil cromatográfico, teor dos
marcadores ou de ativos, propriedades reológicas, características organolépticas, que incluem,
aspecto, cor, limpidez, sabor e odor e testes individuais, conforme prescrição farmacopéica ou
outros compêndios oficiais.
A estabilidade é definida como o tempo durante o qual o produto é capaz e menter
conservado dentro dos limites pré-estabelecidos, abrangendo período de estocagem e de uso,
as mesmas propriedades e características físicas, químicas e microbiológicas que possuía,
quando da sua fabricação.
A estabilidade física baseia-se na manutenção das propriedades físicas do produto
original, tal como cor, odor, aspecto, palatabilidade, uniformidade, dissolução, viscosidade, entre
outras.
A estabilidade química de um fármaco na forma líquida está diminuída, em comparação
com aqueles na forma sólida.
A formação de precipitados nas formas farmacêuticas líquidas é o principal indicativo da
instabilidade destas preparações.
A estabilidade microbiológica trata da manutenção dentro de limites pré-estabelecidos da
resistência do crescimento microbiano na preparação. Exige a determinação da concentração
efetiva de conservantes.

8.2 Formas farmacêuticas semissólidas


Um extrato vegetal raramente é aplicado na pele na sua forma bruta ou original. É
necessário um veículo, que pode ser composto por um conjunto de substâncias que promovem
a penetração dos componentes do extrato na pele, com mais ou menos profundidade. Este
veículo pode também ter efeitos específicos sobre a pele como refrescância, proteção,
emoliência, oclusão, entre outros.
A capacidade do veículo de alterar a condição da superfície cutânea pode ser atribuída a
sua influencia nos lipídios e no conteúdo de água da pele. Não há um veículo universal para
todas as formulações semissólidas, cada fármaco em cada concentração, requer um veículo
para aperfeiçoar sua ação terapêutica.
De maneira geral pode-se afirmar o fator que condiciona o grau de permeação cutânea
de fármacos é a sua lipossolubilidade, ou melhor, o seu coeficiente de partição óleo/água.

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8.2.1 Pomadas
Pomadas são preparações tópicas constituídas de base monofásica, na qual podem
estar dispersas substâncias sólidas ou líquidas. As pomadas são dotadas de propriedades
plásticas que permitem mediante um mínimo esforço que sua consistência se modifique
adaptando-se à superfície da pele. As pomadas podem ser classificadas de acordo com o
veículo que as constituem ou de acordo com o local da ação terapêutica pretendida.
As pomadas podem ser: epidérmicas, endodérmicas e diadérmicas.
As pomadas podem ser classificadas de acordo com a composição de seus veículos:
Pomadas: veículos hidrofóbicos, baixa penetração, utilização como oclusivas ou de
proteção, protetoras ou emolientes.
Vaselinas, parafinas, cera de abelha, plastibase, óleos vegetais e lanolina. Estes veículos
podem sofrer reações de oxidação e, portanto podem e devem ser adicionados de agentes
antioxidantes, como alfa-tocoferol ou BHT.

Estes veículos podem ser incorporados de extratos vegetais secos, moles ou líquidos. De uma
forma geral a adição de extratos em pomadas, cremes, loções ou géis pode afetar a
viscosidade, a transparência e o aspecto geral da preparação.
Exemplos de pomadas contendo extratos vegetais:
Tabela 1: Exemplo de pomadas contendo extratos vegetais

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Pomada de lanovaselina
Constituintes
Vaselina sólida 70%
Lanolina anidra 30%
Extrato vegetal á escolha Concentração usual (10 a 15%)

Pomada de hidrocarbonetos
Constituintes
Vaselina sólida 30%
Vaselina líquida 70%
Extrato vegetal Hidrofóbico ou oleoso Concentração usual (5 a 10%)

Pomada “dermatológica”
Constituintes Quantidades
Babosa (extrato glicólico 1:5) 5g
Guaçatonga (extrato glicólico 1:5) 5g
Arnica (extrato glicólico 1:5) 3g
Benjoim (Tintura 1:5) 10g
Óleo de Lavanda 2 gotas
Essência de rosas q.s
Lanolina 10g
Vaselina 10g

8.2.2 Emulsões (cremes A/O ou O/A) ou Loções


Formas semissólidas constituídas de uma fase hidrofílica e
uma lipofílica e uma fase emulsionante. São formas que permitem
melhor espalhabilidade que as pomadas e são removidas com mais
facilidade.
Vários são os extratos que podem ser incorporados nas
diferentes fases das emulsões. O mais importante é verificar a
compatibilidade das cargas iônicas, entre os componentes ativos e os
agentes emulsionantes.

59
8.2.3 Géis
Podem ser definidos como sistemas
semissólidos constituídos por dispersões de pequenas
partículas inorgânicas ou de grandes moléculas
orgânicas, encerradas ou interpenetradas por um
líquido.
Em geral os géis são formados por polímeros,
que quando dispersos em meio aquoso fornecem
viscosidade à preparação.
Géis hidrofílicos são os mais comuns e são
obtidos pela incorporação de agentes gelificantes à água, ao glicerol ou ao propilenoglicol. Os
géis hidrofóbicos (menos comuns) constituem-se em parafina líquida com polietileno ou óleos
com sílica coloidal ou sabões de alumínio ou zinco.
Principais grupos de constituintes presentes na composição de um gel:
Constituintes Função Exemplos
Veículo Responsável pela Água, álcool etílico óleos minerais
característica do gel, isoparafinas e silicones.
hidrofílico ou
hidrofóbico.
Estabilizante Constituído pelos EDTA, BHT, vitamina E, benzofenona e os
agentes antimicrobianos parabenos.
sequestrantes
antioxidantes e
fotoprotetores
Umectante Melhora a solubilidade Glicerina, propilenoglicol, dipropilenoglico.l
dos conservantes e dos
princípios ativos, retarda
a evaporação da água
ou atua como veículo.
Espessante Apresenta capacidade CMC-Na, hidroxietilcelulose, carbômeros.
polimérico e mineral de absorver e
intumescer em água ou
solventes miscíveis com
água formando géis de
viscosidade variável.
Agente Promove a gelificação e Aminometilpropanol, trietanolamina,
neutralizante polímeros neutralizáveishidróxido de sódio,
tetrahidroxipropiletilenodiamina(Neutrol®)
Agente solubilizante Promove a solubilização Polissorbato 20, óleo de rícino
de compostos hidrogenado e etoxilado
lipossolúveis nas bases
de géis hidrossolúveis

60
Modificador de Modifica a preparação Triacetato de glicerila etoxilado, dimeticona
características quanto a sua sensação copoliol e mistura de silicones
organolépticas. na pele e aparência, multifuncionais.
podem diminuir o
aspecto pegajoso de
alguns polímeros.
Extrato vegetal Os critérios para sua Extratos glicólicos de babosa, camomila,
utilização dependem de calêndula, hamamélis, entre outros.
suas propriedades como
pH, solubilidade,
estabilidade no curto e
longo prazos e forma de
liberação no local de
ação.

Um dos principais problemas que pode acontecer com as formulações em gel é a


incompatibilidade entre o polímero formador do gel e os outros constituintes da formulação,
principalmente os extratos vegetais.
Isso acontece quando se associa um extrato rico em constituintes que apresentam carga
iônica positiva, como alguns derivados de amina quaternária, com um polímero que apresenta
carga iônica negativa, ocorrendo a desestruturação do esqueleto de gel, verificando-se a
fluidificação da formulação.
Devido à capacidade de proporcionar refrescância, os géis são muito utilizados para
incorporação de ativos para o tratamento da acne, exemplos: Gel contendo óleo de Melaleuca
(Melaleuca alternifolia), produtos pós-sol, produtos de limpeza cutânea e controle da oleosidade
como os extratos de Chamomilla recutita (camomila), Hamamelis virginiana (hamamelis),
Symphytum officinale (confrei) e Calendula officinalis (calêndula).
Os géis também podem ser utilizados no tratamento de ferimentos e queimaduras,
quando adicionados de extratos de Calêndula, Aloé vera e Arctium lappa (gobô).

8.2.4 Estabilidade e controle de qualidade de preparações semissólidas


Estudos realizados na fase de desenvolvimento e avaliação da formulação devem
investigar possíveis incompatibilidades físicas entre tinturas ou extratos e o veículo, estabilidade
preliminar da formulação (pH e reologia) como também perfis de liberação dos constituintes
ativos presentes no fitoterápico.
As principais análises para o controle de qualidade de preparações semissólidas são:
Características organolépticas: Avaliação sensorial; Aspecto; Peso/volume; pH; viscosidade e
contaminação microbiológica. O controle de qualidade dos metabólitos ativos pode ser feito
segundo especificação farmacopeica, após a sua extração utilizando-se veículos imiscíveis no
veículo da emulsão e ultrassom.
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8.3 Formas farmacêuticas sólidas
Grande parte dos medicamentos fitoterápicos disponíveis no mercado se apresenta sob
a forma de cápsula e comprimidos, principalmente aqueles para adultos e por via oral. O
principal inconveniente para a utilização destas formas farmacêuticas está em se obter o extrato
seco padronizado para sua elaboração. Os mais comuns no mercado brasileiro, hoje, são os
extratos secos de Ginkgo biloba, Hypericum perforatum, Valeriana officinalis, Panax ginseng,
Allium sativum, Equinacea purpurea, Aesculus hippocastanum, Cimicifuga racemosa e Agnus
castus.
A utilização de extratos secos padronizados, em que os componentes químicos do
vegetal são ajustados em níveis concentrados e conhecidos, serve para o estabelecimento de
um esquema posológico confiável, diferentemente da administração de cápsulas contendo a
droga vegetal pulverizada, onde a concentração das substâncias ativas é bastante inferior e
também por que o organismo humano, não tem condições de digerir e de absorver todo o
conteúdo das células vegetais, por exemplo a celulose.

8.3.1 Cápsulas
Cápsulas são receptáculos moldáveis de
consistência sólida (dura ou mole) de capacidade
variável, que deve ser utilizada para administração de
dose única pré-estabelecida de medicamento. Estão
disponíveis em diferentes tamanhos e formatos
podendo ser utilizadas para administrar substâncias
sólidas, líquidas ou pastosas.
A maioria das formas fitoterápicas sólidas produzidas nas farmácias de manipulação é
constituída por cápsulas gelatinosas duras, contendo extratos secos padronizados mais
adjuvantes farmacêuticos. O principal problema para a produção de cápsulas duras contendo
extratos secos vegetais está na higroscopicidade (capacidade de absorver água) destes que
muitas vezes pode levar a deliquescência e ao amolecimento da cápsula.
A utilização de dióxido de silício coloidal como excipiente, reduz em parte esta
dificuldade, melhorando os teores de umidade, facilitando o escoamento do pó e garantindo
homogeneidade das preparações. O enchimento de cápsulas duras pode ser manual, ou com o
auxílio de encapsuladores manuais, semiautomáticos ou ainda, encapsuladores totalmente
automatizados.

62
8.3.2 Comprimidos
São formas farmacêuticas sólidas que podem ser
utilizadas para a administração de fitoterápicos, entretanto
a maior dificuldade para sua utilização está na falta de
compressibilidade de alguns extratos secos vegetais.
Os extratos vegetais secos têm características
físicas que muitas vezes impedem a sua compressão
como, por exemplo: sua natureza amorfa, densidade
reduzida, sensibilidade à luz, à umidade e ao oxigênio,
além de dificuldades de escoamento que impossibilitariam um processo de compressão direta,
por exemplo. Muitos são os trabalhos científicos que relatam estas dificuldades.
Os excipientes que podem ser empregados para a obtenção de formas sólidas
fitoterápicas, comprimidos ou cápsulas devem garantir o melhor desempenho da formulação
(estabilidade e eficácia), as melhores condições de manufatura e ao mesmo tempo um custo
adequado.
Vale ressaltar que a escolha do excipiente requer considerações prévias das
características físicoquimicas e biológicas de todas as substâncias ativas adjuvantes assim
como a anatomia e a fisiologia do local de administração.
Podem ser utilizados como excipientes: amido, lactose, celulose microcristalina, gomas,
gelatina, polividona, dióxido de silício coloidal, estearato de magnésio, talco, acido esteárico,
croscarmelose sódica, laurilsulfato de sódio, além de corantes e edulcorantes.

8.3.3 Estabilidade e controle de formas farmacêuticas sólidas


Tanto para o controle de cápsulas quanto para o de comprimidos, um fator importante é
a determinação da umidade. As cápsulas gelatinosas duras podem conter de 10 a 15% de
umidade, entretanto o excesso de umidade pode provocar o amolecimento e a deformação das
cápsulas e o ressecamento pode ocasionar a trincagem e o rompimento das mesmas.
Os principais ensaios para o controle de formas sólidas são: teste de desintegração,
dissolução, determinação de peso médio, uniformidade de conteúdo, análise de dureza e
friabilidade. O controle de qualidade do extrato vegetal contido no comprimido ou na cápsula
deve seguir parâmetros farmacopeicos ou de outros compêndios oficiais, tomando-se por base a
presença de ativos ou de marcadores.

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REFERÊNCIAS

ALBIEIRO, A. L. M. Tecnológia de Fitoterápicos. Maringá, 2010, 63p. Apostila do Curso de


Farmácia da Disciplina de Tecnólogia de Fitoterápicos – Universidade Estadual de Maringá

BRASIL, Ministério da Saúde. Secretaria de Ciência, tecnologia e Insumos estratégicos.


Departamento de Assistência Farmacêutica. Política Nacional de Plantas Medicinais e
Fitoterápicos, 60p. 2006.

BRASIL, Ministério da Saúde. Agencia Nacional de Vigilância Sanitária Resolução de Diretoria


Colegiada 10. Dispõe sobre o regulamento técnico para o registro de medicamentos
fitoterápicos, 2010.

BRASIL, Ministério da Saúde. Agencia Nacional de Vigilância Sanitária Resolução de Diretoria


Colegiada 48. Dispõe sobre o regulamento técnico para o registro de medicamentos
fitoterápicos, 2004 (revogada pela RDC 10/2010).

BRASIL, Ministério da Saúde. Agencia Nacional de Vigilância Sanitária Resolução 88. Dispõe
sobre a lista de referencias bibliográficas para a avaliação de segurança e eficácia de
fitoterápicos, 2004.

BRASIL, Ministério da Saúde. Agencia Nacional de Vigilância Sanitária Resolução 89. Dispõe
sobre a lista de registro simplificadode fitoterápicos, 2004.

BRASIL, Ministério da Saúde. Agencia Nacional de Vigilância Sanitária Resolução 90. Dispõe
sobre o guia para estudos de toxicidade de medicamentos fitoterápicos, 2004.

BRASIL, Ministério da Saúde. Agencia Nacional de Vigilância Sanitária Resolução 91 Dispõe


sobre o guia para realaização de alterações, inclusões, notificaçãoe e cancelamento pós-
registro de fitoterápicos, 2004.

BRASIL, Ministério da Saúde. Agencia Nacional de Vigilância Sanitária Resolução de Diretoria


Colegiada 17 Dispõe sobre o regulamento técnico para o registro de medicamentos
fitoterápicos, 2000 (revogada pela RDC48/2004).

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CARVALHO, et al. Situação do registro dos Fitoterápicos no Brasil. Revista Brasileira de
Farmacognosia, 18(2) 314-319, 2008.

SIMÕES & SCHENKEL A pesquisa e a produção brasileira de medicamentos a apartir de


plantas medicinais: a necessária interação da indústria com a academia. Revista Brasileira
de Farmacognosia, 12(1): 35-40, 2002.

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