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rosé Mural,o de Casual,bo

Cidadania no Brasil
O longo caminho

e
CIVILIZAÇÃO BRASILEIRA

Rio de Janeiro
2001
COPYRIGHT© 2001 óyJosé Mwilo de Carvalho

CAPA:Et/elyH Gr m cb Sumário
PROMETO GRÁFICO:
Evei'vn Gm?tlacb e Jogo de Soam Leite

INTRODUÇÃO: MAPA DA VIAGEM 7

CP-BRASA CATALOGAÇÃO-NA-FONTE
SINDICATO NACIONAL DOSEDnORES DE LIVROS, KJ 15
Capítulo 1: Primeiros passos(1822-1930)
Carvalho, JoséMurilo de, 1939- o PESOüo ASSADO (1500-1az2) 17
C324c Cidadaniano Brasil: o longo caminho/ JoséMurilo de 1822: OS DIREITOSPOLÍTICOSSAEM NA FRENTE 25
Carvalho. - Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2001.
18al:TROPEÇO 38
Inclui bibliografia DIREITOS 45
CIVISSONA LEI
ISBN 85-200-0565-9 CIDADÃOSEM NEGATIVO 64
NACIONAL 76
O SENTIMENTO
1. Cidadania - Brasil - História. 2. Democracia - Brasil
História. 3. Brasil - Política e governo. 1. Título.
Capítulo 11: Marcha acelerada (1930-1964) 85
01-0103 CDD 323.60981
1930; MARCODIVISÓRIO 89
CDU 323.2(81)
OS DIREITOS SOCIAIS NA DIANTEIRA (1930-1 945) 110
A VEZ OOS DIREITOSPOLÍTICOS(1945-19õ4) 126
CONFRONTOE FIM DA OEMOCRACIA 144

Todos os direitos reservados.Proibida a reprodução,armazenamentoou


155
transmissão de partes deste livro, através de quaisquer meios, sem prévia Capítulo 111:Passoatrás, passo adiante (1964-1985)
autorização por escrito. PASSOATRÁS: NOVA DrrADUnA (1964-1974) 158
NOVAMENTE
os OiRnTOSsoCIAiS 170
PASSOADIANTE: VogAM os DIREITOScivis E poLÍTicos (1974-198s) 173
UM BALANÇODO PERÍODOMiUTAR 190
Direitos desta edição adquiridos pela
EDITORA CIVILIZAÇÃO BRASILEIRA
um selo da Capítulo IV: A cidadania após a redemocratização 197
DISTRIBUIDORA RECORD DE SERVIÇOSDE IMPRENSA S.A. A EXnNSÃ0 FINAL OOS DIREITOS POLÍTICOS 200
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CONCLUSÃO:
A CIDADANIANA ENCRUZILHADA 219
Impresso no Brasil SUGESTÕESDE LEITURA 23 1
2001

J
CAPITULA
lll ])aso atrás, passo adiante
(1964-1985)
Como em 1937, o !ápido aumento.da participação políqSg
levou em 1964 a uma reaçêgde@nsiva q à imposição de mais
um regime ditatorial em que os direitos civis e políticos .fo:
ram restripgjdos pela.viQjêpcja.Os dois períodos se asseme-
lham ainda pela ênfase dada aos direitos sociais, agora esten-
didos aos trabalhadores rurais, e pela forte atuação do Esta-
do na promoção do desenvolvimento económico. Pelo lado
político, a diferença entre eles foi a manutenção do funciona-
mento do Congressoe da realização das eleiçõesno regime
implantado em 1964.
Do ponto de vista que aqui nos interessa,ogggvernos
militares podem ser.çllSlididQS.em ÜÊs.íãseé.A primeiravai de /
1964.a 1968 e corresponde ao governo do general Castelos/'l:
Branco e primeiro ano do governo do general Costa e Silva.\.I'-''
Caracteriza-se no início por intensa atividade repressiva.se-
guida de sinais de abrandamento'Nã economia, foi um perío'l l
do de combate à inflação, de forte queda no salário mínimo q.
de pequenocrescimento.Foi o.domínio dos.setoresmais:li-
berais dasforças armadas!.representadospelo general Caste-
lo Branco. No últimoano, 1968, a economia retomou os ak
tos índices de crescimento da década.de50.
A segunda fase vai de(l:?lillili?Z4)e compreende os anos

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JOSÉ MURILO DE CARVALHO CIDADÃ NIA N O BRASIL

mais sombrio! da história do país, do ponto de vista dQ$.di- Antes de analisar essaatividade, é preciso discutir as.r!:
reitos civis e polí$cos:. Foi o domínio do$.,militares mais zões de terem. QSmilitares assumido diretamenlç.,ggoverno,
F
truculento.s, reuniçlos eq torno do general Garrastazu Média, para surpresa de seus proprtos aliados. A presença dos milita- b
escolhido presidente após o impedimento de Costa e Silva por res na política brasileira começou na proclamação da Repú- $

»
motivo de doença. O período combinou a repressão.política blica. Mas as oligarquias conseguiramalijá-los construindo o
maijl.ltjolenta j4 vista nç?.país
çon! índices.tambénujamais]lb. sistema coronelista da Primeira República. Em 1930, eles
tg1.4E.qesgmento.çcon6mico. Em contraste com as taxas de voltaram com força, trazendo propostas de centralizaçãopo-
crescimento, o salário mínimo continuou a decrescer. lítica, industrialização, nacionalismo. cargas conseguiu usá-
A terceira fase começa em 19Z4 com a posse do general mose contê-los.Após 1945, eles se dividiram, como toda a
Ernesto Geisel, e termina eml.1991S)com a eleição indireta de sociedade,entre nacionalistas e populistas, de um lado, e li-
làncredo Neves.Caracteriza-seinicialmente pelatentativa da. berais conservadores, do outro. A divisão das forças armadas
general Geisd de liberaliza!..!!.!pllema, contra a forte oposi-. atingia o corpo de oficiais e as praças de pré, sobretudo os
çag.d?s órgão! de repressão..Aliberalização continua sob o sargentos.
general João Batista de Figueiredó' (1979-1985). A$ .leis de PQde-seexplicar 4 atitude mais !adical em.1964 pela amei
reprfssãg.vão sendo.aospoucos revogadas e a oposição faz ça que a divisão. ilieológiça signiâcava para a sobreyjvêncl4
sentir suavoz com força crescente.Na economia, a crise do aa organização militar.Para fazer o exguUgo.dQS inimigos, era
petróleo de l2.ZI'iêilui'i;; índices de crescimento, que no necêisário controlar o poder. Mas havia também razõesme-
.início dói'mos 80 chegam a ser negativos. nos corporativas. Os aDtivarguistas tinham-se preparado para
o governo dentro da escola SuperiaF de Guerra. Lá elabora-
ram uma doutrina de segurança naçbonaLeprQduziram, junto
PASSOATRÁS: NOVA.DITADURA(1964-1 974) com técnicos civis, estudos sobre os principais problemas na-
cionais. Além disso, tinham-se aproximado de lideranças
Derrubado Goulart, os políticos civis que tinham apoiado o empresariaispor meio de uma associaçãochamadaInstituto
golpe, sobretudo os da UDN, foram surpreendidos pela de- de Pesquisase Estudos Sociais (IPES), fundada em 1962 por
cisão.dos militares de assumir o poder diretamente. O gene- empresários do Rio de Janeiro e de São Paulo. O IPESatava
ralxÇasteloBranco.lbi imposto, a um Congressojá expurga- contra o comunismo e pela:preservação dg:.$gçjedgdÊ-c4pit4-
do de'ihuitos oposicionistas,como o novo presidenteda lista.Mas, ao mesmo tempo, propunha várias reformas eco-
República. Começou, então, intensa atividade governamen- nómicas e sociais. No Rio, mantinha estrito contato com a
tal na área política para suprimir.o$ pr.inlçjpds..cocosde opo- ESG. Vários membros do IPES participaram do governo Cas-
sição e na área económica para conter a-inflação que atingia telo Branco,e muitas dasidéias desenvolvidas
no Instituto
níveis muito altos. foram aproveitadaspelo primeiro governo militar. Os milita-

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JOSÉ MURILO DE CARVALHO

res tinham, assim, em 1964, motivos para assumir o governo,


julgavam-se preparados para fazê-lo e contavam com aliados
T CIDADANIA N O BRASIL

políticos, quando não a liberdade, do suspeito. Como em ge-


ral acontece em tais circunstâncias, multa!.qnganças pessoais
poderosos. foram executadassob o pretexto de motivação política: , Z

Dado o golpe, os direitos civis e políticos foram duramente '"'Êin 1966, hõiivê'eãeiçõeé eétaaüais,Z o governo foi dera }W-
atingidos pelas medidas de repressão. Por essarazão, eles rotado em cinco estados,inclusive os estratégicos Rio de Ja-j&
merecem atenção especial. Como era maior a mobilização em negro e Minas Gerais. Em retaliação, setores militares radial
1964 e como estavam mais desenvolvidos os meios de con- cais exigiram novas mç$das repressivas.QAto Instituçjondb
sole, a repressão política dos governos militmes foi também n' 2, de outubro deá965â aboliu a eleição direta oara presi-
mais extensa e mais violenta do que a do Estado Novo. Em- ã;ite da República, dissolveu..glpartid(iipolíticos.criados e,
bora presenteem todo o período, ela se concentrou em dois jãiiii'ãe iyn e estabeleceuum sistema de dais parti.dos. O
momentos: entre 1964 e 1965, e entre 1968 e 1974. Ai-z aumentou muito o poderes dã presidente, conceden-
Os instrumentos legais da repressão.foranL9sJ'atos do-lhe autoridade para dissolver Q parlamento, intervir nos
instituciõnaiss'editados
pelospresidentes
militares.Oprimeiro estados,decretar estadode sítio, demitir funcionários civis e
foi introduzido logo em 9 de abril de 1964 pelo general Cas- militares. Reformou'aiiída ó judiciárb: aumentando o núme-
telo Branco. Por ele foram cassadosos direitos políticos, pelo ro.de.]pizes ae uibunais 'superiores ? fim de poder nomear
período de dez anos,de grande número de líderes políticos, partidários do góvenic;:ailii:oito de opinião foi restringido,
sindicais e intelectuais e de militares. Além das cassações,fo- e juízes militarçlpa$$aram:a julgar civis em;,causasrelativas à
ram também usadosoutros mecanismos, como a aposentado- segurançanacional n,,.-~
ria:&çça(!a de fundonários públicos civis e militares. Muitos Nova retomada autoritária aconteceu emÜ9(!$)Nesse ano,
sindiçatos soüeram intervenção, foram fechadpp.osBrgãos de voltaram a mobilizar-se contra o governo alguns setores da
cúpula,do.movimento operário, como o CÇI' e o PUA. Foi sociedade,sobretudoos operáriosgplptudan111$;.püãi'gí6
invadida militarmente e fechada a UNE, o mesmo acontecen- ves marcaram a retomada das manifestaçõesoperárias. Os
do com o ISEB.
, estudantessaíram àsruas em grandes marchas pela democra-
Várias comissõesde inquérito foram criadas para apurar ,c'3 tização, e um deles, Edson Luís, foi morto em uma das mani-
supostos crimes de corrupção e subversão.As mais famosas W festações.Tendo a Câmara dos Deputados negado permissão
foram os inquéritos PoliciaisMilitares(IPMs), em geral diri- para processar um de seus membros, que âzera um discurso
gidos por coronéis do Exército, que perseguiram, prenderam considerado ofensivo às forças armadas, o governo editou
e condenaram bom número de opositores. O perigo comum. novo ato institucional em dezembro. O Ato Institucional ne.5
mista era a.desculpa mq!!.psqdqln:a.justiâcaLP !Êprwsão. (Al-5) foi o mais radical de.lçgdos,o qpe.pai!.fundo atingiu
Qualquer suspeitade envolvimento com o que fosseconside- direiibs políticos e.çlyís-Q Congresso.fo.i..8lçbado,passando
rado atividade subversiva podia custar o emprego, os direitos
o.blÊ$!&Nelgelçla] CosçlêlSÍIÜ,.agovernar.dtatori@mfn-
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ROSÉ MURILO DE CARVALHO CADADA NIA..N O BRASIL

te. FQLsuspenscL-Q.óabeascofPwspara crimes contra a segu- bro de 1969,houveo primeiro ato espetacular
da guerrilha
rança nacional, e todos os atos decorrentes do Al-5 foram urbana, o seqíiestro do embaixador norte-americano. Daí até
colocados fora da apreciação judicial. o final do governo Média, em 1974, forças da repressãoe da
Paralelamente, recomeçaram as.cassaçõçg.dqmandatos, guerrilha se enfrentaram em batalha inglória e desigual. Aos
suspen$g.4g.4ilçilos políticos de.deputados.&vçre!!core», seqüestros e assaltos a bancos dos guerrilheiros,.respondia a
demissãosumária de funcionários públicos. Quando, em 1969, ;;li;:lã;áo bt)m prisões arbitrárias, tomara.sistemática de pre-
o presidente sofreu um infarto, os militares não permitiram sos, assassinatos.Opositores assassinadoseram dados como
que o vice-presidente, Pedro Aleixo, um civil da extinta UDN, desaparecidosou mortos em acidentesde carro. A imprensa
assumisseo governo, de acordo com a lei. Uma junta militar era proibida de divulgar qualquer notícia que contrariassea
assumiu, escolheu um sucessor e reabriu o Congresso para que versão das forças de segurança.
estereferendassea escolha.Em outubro de 1969, tomou posse A máquina da repressãocresceurapidamente e tornou-se
na presidência o general Garrastazu Média. Na mesma data, quaseautónoma dentro do governo. Ao lado de órgãos de in-
foi promulgada nova Constituição, que incorporava os atos teligência nacionais como a Polícia Federal e o Serviço Nacio-
institucionais.
nal de Informações (SNI), passaram a atuar livremente na
Sob o general Média, as medidas repressivas atingiram
repressão os serviços de inteligência do Exército, da Marinha,
seu ponto culminante.Nova lei de segurançanacionalfoi
da Aeronáutica e das polícias militares estaduais; e as delega-
introduzida, incluindo a pena de morte. .pgt.fuzilamento. A
dasde ordem social e política dos estados. Dentro de cada
pena de morte tinha sido abolida apósa proclamaçãoda Ministério e de cada empresa estatal foram criados órgãos de
República, e mesmo no Império já não era aplicada. No iní-
segurançae informação, em geral dirigidos por militares da
Ç cio de 1970, foi.introduzida a censura préviaem:jornais, li-
reserva. O Exército criou ainda agências especiaisde repres-
.vros e outros meios de comunicação.Isto significava que
g qualquer publicação ou programa de rádio e televisão tinha
são chamadas Destacamento de Operações de Informações e
Centro de Operaçõesde Defesa Interna, que âcaram triste-
que ser submetido aoscensoresdo governo antes de ser le-
vado ao público. Jornais, rádios e televisõesforam obriga- mente conhecidas pelas siglas DOl-CODI.
dos a conviver com a presençado censor. Com â'eqüência, A censura à imprensa eliminou a liberdade de opinião; não
o governo mandavainstruções sobre os assuntosque não havia liberdade de reunião; os partidos eram regulados e con-
podiam ser comentados e nomes de pessoasque não podiam trolados pelo governo; os sindicatos estavamsob constante
ser mencionados. ameaça de intervenção; era proibido fazer greves; o direito
Em respostaà falta de alternativa para a oposição legal, de'klefesa era cerceado pelas prisões arbitrárias; a justiça mi-
grupos de esquqd4.çomeçarao ! agiLpa clandestinidade e litar julgava crimes civis; a.inviolabilidade do lar e.da corres-
U
adorar [aucasmilitares delÉperrilha urbana e rurall; Em setem- pondencia não exista:1.2..integridade6sicajra violada:pelo

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JOSÉ MURILO DE CARVALHO CIDADANIA N O BRASIL

tortura nos cárceres do governo; o próprio direito à vida era pouco restou do movimento. Quando recomeçaram as gre-
desrespeitado.As famílias de muitas dasvítimas até hoje não ves, em 1968, elas se âzeram à margem da estrutura sindical
tiveram esclarecidas as circunstâncias das mortes e os locais oficial, naquele momento voltada apenas para tarefas de as-
de sepultamento. Foram anos de sobressalto e medo, em que sistência social. A única instituição que conseguiu defendes-
os órgãos de informação e segurança agiam sem nenhum con- se, apesarde alguns conflitos com o governo, foi a Igreja
trole
Católica. Por seu poder e influência, a hierarquia da Igreja foi
Segundo levantamento de Marcos Figueiredo, entre 1964 capazde oferecer resistência e torna-se aospoucos o princi-
e 1973 foram punidas, com perda de direitos políticos, cassa- pal foco de oposição]ega].A]guns dos movimentos anterio-
ção de mandato, aposentadoriae demissão, 4.841 pessoas, res a 1964 por elainfluenciados, como a AB foram atraídos
sendomaior a concentraçãode punidos em 1964, 1969 e pelo marxismo e enveredarampela luta armada.
1970. SÓo Al-l atingiu 2.990 pessoas.Foram cassadosos man- Paraque o quadro dos governos militares, inclusive de sua
datos de 513 senadores,deputados e vereadores. Perderam pior fase, esteja completo, é preciso acrescentar alguns pon-
os direitos políticos 35 dirigentes sindicais; foram aposenta- tos responsáveis pela ambigüidade do regime.: O primeiro é
dos ou demitidos 3.783 funcionários públicos, dentre os quais que durante todo o período, de 1964 ã 1985, salvo curtas
72 professoresuniversitários e 61 pesquisadorescientíficos. \
interrupções,o Congressopermaneceuaberto!.em.funcio-
O expurgonasforçasarmadasfoi particularmenteduro, da- namento. Expurgados de seuselementos mais combatentes,
das as divisões existentes antes de 1964. A maior parte dos -Câmara e Senado cumpriram as tarefa que lhes eram dadas
militares, se não todos, que se opunham ao golpe foi excluída pelos presidentes militares. No sistema biparddário criado em
das âleiras. Foram expulsos ao todo 1.3 13 militares, entre os 1966, o partido do governo, Aliança Renovadora Nacional
quais 43 generais, 240 coronéis, tenentes-coronéis e majores, (Arena) era sempre mdoritário e aprovava todos os projetos,
292 capitães e tenentes, 708 suboficiais e sargentos, 30 sol- mesmo os mais repressivos, como o que introduziu a censura
dados e marinheiros. Nas polícias militar e civil, foram 206 prévia. A Arena legitimou com seuvoto todos os candidatos
.ospunidos. O expurgo permitiu às forças armadaseliminar a presidente impostos pelos militares. Seuspolíticos foram
parte da oposição interna e agir com maior desembaraçono sempreinstrumento dócil do regime.
poder. O partido de oposição, Movimento Democrático Brasilei-
Orgãos estudantis e sindicais também foram alvo da ação ro(MDB), viu-se diante de difícil escolha: ou manter-se em
repressiva. Existem dados apenaspara as intervenções nos funcionamento, apesar das cassaçõesde mandatos e da impos-
sindicatos ocorridas de 1964 a 1970. Foram ao todo 536 in- sibilidade de fazer oposiçãoreal, ou autodissolver-se.No pri-
tervenções, sendo 483 em sindicatos, 49 em federações e meiro caso, conservava acesa a chama da oposição, embora
quatro em confederações. Quase todas concentraram-se em tênue, Mas ao mesmo tempo emprestava legitimidade ao regi-
1964 e 1965, indicação de que, eliminada a cúpula sindical, me ao permitir-lhe argumentar que havia uma oposição em

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JOSÊ MUROLO DE CARVALHO CIDADANIA N O BRASIL

âlncionamento.No segundocaso,deslegitimavao regime,mas Mais estranho do que haver eleições foi o fato de çer..g
reduzia ainda mais o espaçopara a resistência legal e podia assim eleitorado crescido sistematicamente durante os governos
fortalecer o governo. O partido por mais de uma vez conside- militares. A tendência iniciada em 1945 não foi interrompi-
rou a possibilidade de autodissoluçãomas optou ânalmente por da, foi acelerada.Em 1960, nas eleiçõespresidenciais,vota-
fazer parte do jogo, utilizando a tribuna do Congressopna ram 12,5 milhões de eleitores; nas eleições senatoriais de 1970
protestar contra as propostas que agrediam a democracia. votaram 22,4 milhões; nas de 1982, 48,7 milhões; nas de
Mesmo este modesto papel tinha seus riscos: deputados e se- 1986, 65,6 milhões. Em 1960, a parcela da população que
nadores que injetavam um pouco mais de contundência em suas votava era de 18%; em 1986, era de 47(}6,um crescimento
críticasquasesempreperdiamo mandato. impressionante de 161%. Isto signiâca que 53 milhões de
Paramanter aberto o Congresso,os militares conservaram brasileiros, mais do que a população total do país em 1950,
as eleiçõeslegislativas.As eleiçõesdiretas para governadores foram formalmente incorporados ao sistemapolítico duran-
foram suspensasa pmtir de 1966, só voltando a ser realiza- te os governos militares.
das em 1982. Parapresidente da República, não houve elei- Esse é um dado cujas implicações não podem ser subesti-
ção direta entre 1960 e 1989, quase30 anos de exclusão do madas.A pergunta a se fazer é óbvia: o que significava para
povo da escolhado chefedo Executivo. Os presidenteseram essesmilhões de cidadãosadquirir o direito político de votar
escolhidos pelos comandosmilitares, de acordo com a cor- ao mesmo tempo em que vários outros direitos políticos e civis
rente dominante no momento no alto comando. Seusnomes lhes eram negados? Que sentido teria esse direito assim con-
eram levados ao Congresso para ratiâcação. A Arena nunca seguido? Mais ainda: o que signiâcava escolher representan-
deixou de emprestar sua maioria para referendar a frisa. tes quando os órgãos de representação por excelência, os par'
As eleições legislativas -- para o Senado e Câmara fede- tidos e o Congresso, eram aviltados e esvaziados de seu po-
ral, assembléias estaduais, câmaras de vereadores -- foram der, tornando-se meros instrumentos do poder executivo?
mantidas, embora com restrições. Elas foram às vezesadia- Poderia, nessas circunstâncias, o ato de votar ser visto como
das, a propaganda política era censurada, os candidatos mais o exercício de um direito político?
radicais, vetados. Quando os generais se viam surpreendidos
pelos resultados, mudavam as leis, para manter a maioria no Crescimento económico
Congresso.Em 1978, por exemplo, para conservar o controle
do Senado, o general Geisel criou senadores eleitos indireta- A complexidade do período militar não pára por aí. Vimos
mente, aos quais a malícia popular logo chamou de "biânicos". que após a fase de bonança de Kubitschek a taxa de cresci-
Houve eleiçõespara Senadoe Câmaraem 1966, 1970, 1974, mento económico caiu fortemente. O ano de 1963 foi o pon-
1978, 1982 e 1986, as quatro primeiras sob o sistema to mais baixo, com aumento do Produto Interno Bruto de
bipartidário, as duas últimas já em sistema multipartidário. apenas 1,5%. Em termos Pm capffíz, era decréscimo. Após o

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JOSÉ MURtLQ DE CARVALHO CIDADANIA NO BRASIL

golpe, a taxa de crescimento manteve-se baixa até 1967. Mas cos dados demonstram esseponto com clareza. Em 1960, os
a partir de 1968, exatamente o ano em que a repressãose 20% mais pobres da população economicamente atavaganha-
tornou mais violenta, ela subiu rapidamente e ultrapassou a vam 3,9% da renda nacional. Em 1980, suaparticipação caí-
do período de Kubitschek, mantendo-se em torno de 10% até ra para 2,8%. Em contraste, em 1960 os 10% mais ricos ga-
1976, com um máximo de 13,6% em 1973, em pleno gover- nhavam 39,6% da renda, ao passoque em 1980 sua partici-
no Média. Foi a épocaem que se falou no "milagre" econó- pação subira para 50,9%. Se subirmos na escala de renda,
mico brasileiro. A partir de 1977, o crescimento começou a cresce a desigualdade. O 1% mais rico ganhava 11,9% da ren-
cair, chegando ao ponto mais baixo em 1983, com -3,2%, su- da total em 1960; em 1980 suaparticipação era de 16,9%. êÊ.
bindo depois para 5% em 1984, último ano completo de go- o!..pobre!.gêf) âcaram muito mais pobres o!.gcq! âcaram
verno militar. muito mais.!ices.
Apesar da queda de crescimento ao final, a coincidência O aumento da desigualdadenão era evidente na época.A
do período de maior repressãocom o de maior crescimento rápida expansão da economia veio acompanhada de grandes
económico era perturbadora. O governo Média exibiu esse transformações na demografia e na composição da oferta de
aspectocontraditório: ao mesmo tempo que reprimia feroz- empregos. Houve grande deslocamento de população.do cam-
mente a oposição, apresentava-secomo fme de euforia eco- po para as cidades.Em 1960 a população urbana era 44,7%
nómica perante o resto da população. Foi também o momen- do total, o paisaindaera m4oritariamenterural. Em 1980,
to em que o Brasil conquistou no México o tricampeonato em apenas20 anos, ela havia saltado para 67,6%. Em núme-
mundial de futebol, motivo de grande exaltaçãopatriótica de ros absolutos, a população urbana aumentara em cerca de 50
que o general soube aproveitar-separa aumento da própria milhões de pessoas.Os efeitos catastróâcos dessecrescimen-
popularidade. Uma onda de nacionalismoxenófoba e reacio- to para a vida dasgrandes cidades só apareceriam mais tarde.
nário percorreu o país. Viam-se nas ruas e nos carros faixas Na época, a urbanização signiâcava para muita gente um pro-
com os dizeres: "Brasil: ame-o ou deixe-o", uma crítica ex- gresso,na medida em que as condições de vida nas cidades
plícita à oposição, sobretudo à oposição armada Pesquisasaca- permitiam maior acesso aos confortos da tecnologia, sobre-
dêmicas de opinião pública feitas na época indicaram que o tudo à televisão e outros eletrodomésticos.
presidente gozava de popularidade. A mudança na estrutura de emprego acompanhou a urba-
r, O sentido do "milagre" económico foi posteriormente nização. Houve enorme crescimento da população emprega-
desmistiâcado por análises de especialistasque mostraram seus da, que os economistaschamam de economicamenteatava.

pontos negativos. Houve, sem dúvida, um crescimento rápi- Essapopulação passou de 22,7 milhões em 1960 para 42,3
do, mas ele.beneâciou de maneira muito desigual os vários milhões em 1980, quaseo dobro. Particularmente dramático
e
setores da população. A consequência foi que, ao anal, as desi- foi o aumento do número de mulheres no mercado de traba-
«
gualdades tinham crescido ao invés de diminuir. Alguns pou- lho. Enquanto o número de homensaumentou em 67%, o de

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ROSÉ MURILO DE CARVALHO CADA DA NtA N O BRASIL

mulheres cresceu 184%. Isso fazia com que, apesar da que- Em 1966 foi afinal criado o Instituto Nacional de Previ-
da no valor do salário mínimo, que em 1974 era quase a me- dência Social/ãNPSI que acabavacom os IAPs e unificava o
tade do que valia em 1960, a renda familiar se mantinha es- sistema,com exceçãodo funcionalismo público, civil e mili-
tável ou mesmo aumentava devido ao número maior de pes- tar, que ainda conservavaseuspróprios institutos. As contri-
soasque trabalhavam, sobretudo ao número de mulheres em- buições foram definidas em 8% do salário de todos os trabalha-
pregadas. dores registrados, descontadosmensalmente da folha de paga-
Houve, ainda, mudança nos tipos de emprego. A ocupa- mento; os benefícios, como aposentadoria, pensão, assistência
ção no setor primário da economia (agricultura, pecuária, médica, foram também uniformizados. Acabaram os podero-
sos IAPs, e os sindicatos perderam a influência sobre a previ-
mineração)caiu de 54% do total em 1960 para 30% em 1980.
A ocupação no secundário (indústria) cresceu de 13% para dência, que passou a ser controlada totalmente pela burocra-
cia estatal. Em 1967 o INPS venceu outra resistência e tomou
24% no mesmo período, e o terciário(transporte, serviços,
das empresasprivadas o seguro de acidentesde trabalho.
administração) cresceude 33% para 46%. Isso quer dizer que
O objetivo da universalização da previdência também foi
paralelamente à.migração para as cidades houve um desloca-
atingido. Em 1971, em pleno governo Média, ponto alto da
mento maciço de pessoasdo primário:para o secundário e para
repressão, foi criado o Fundo de Assistência Rural(Funrural),
o terciário. Dadasascondiçõesde trabalhQlural no Brasil,3
que efetivamenteincluía os trabalhadores rurais na previdên-
mudança não podia deixar de causar sensaçãode.melhoria dç cia. O Funrural tinha ânanciamento e administração separa-
Vlu.d.P
dos do INPS. É sintomático que nem os governos militares
tenham ousadocobrar contribuição dos proprietários rurais.
Mas não cobrarem também dos trabalhadores. Os recursos
NOVAMENTEOS DIREITOS
SOCIAIS
do Funrural vinham de um imposto sobre produtos rurais,
pago pelos consumidores, e de um imposto sobre asfolhas de
Houve outras mudanças.Ao mesmo tempo em que cercea- pagamento de empresas urbanas, cujos custos eram também,
vam os direitos políticos e civis,, os governos militares inves- naturalmente, repassadospelos empresários para os consumi-
tiam najexpansão dos direitos sociais. O que cargas e Goulart dores. De qualquer maneira, os eternos párias do sistema, os
não tinham conseguido fazer, em relação à unia.çaçãp..q trabalhadoresrurais, tinham, aânal, direito a aposentadoria
un.iyçlsalilação.da previdência, os militares e tecnocratas 6l- e pensa;;;'ãém; de assistência médica. Por mais modestas que
zeram após 1964. O primeiro ministro do Trabalho dos go- fÜ;;êih. asaposentadorias, eram &eqüentemente equivalentes,
vernos militares era um técnico da previdência que colocou se não superiores, aosbaixos salários pagosnas áreasrurais.
interventores nos institutos e preparou um plano de reforma A distribuição dos benefícios do Funrural, assimcomo de
com a ajuda de outros técnicos, muitos deles nomeados outras formas de assistência,foi entregue aos sindicatos ru-
interventores. rais. Em muitas localidades do interior, o único médico dis-

170 17 1
JOSÉ MURILO DE CARVALHO CIDADANIA NO BRASIL

punível, inclusive para os proprietários, passavaa ser o médi- ásentiilgS a expansão df?sdireitos sociais em.!nomentode res-
co do sindicato. A repressão inicial exercida contra essessin- trição de direilgsLçly!!.ç.pglÍqçç!$.
dicatos, aliada às tarefa de assistênciaagora a eles atribuída, \
contribuiu muito para reduzir sua combatividadepolítica e
gerou dividendos políticos para os governos militares. O elei- PASSOADIANTE:VOltAM OS DIREITOS
CIVISE
torado rural o! apoiou em todas as eleições. Parte desse apqiQ POLÍTICOS
(1974-1985)

pode ser atribuída ?Q traÜçional conservadorismo rur:ilxlnas


senil.dúvida.4 legislação .social contribuiu para reforçar es$ê. Logo depois de empossadona presidência da República, em
aadiSãg. Como a previdência rural não onerava os proprie- 1974, o general Ernesto Geisel deu indicações de que estava
tários e não iiídava mais em reforma agrária, também'êíã" disposto a promover um lento retorno à democracia. São
,tinham motivõi para apoiar o governo'' complexas as razões para o que se chamou de "abertura"
Não ficaram aí as inovações no campo social. As duasúni- política. Discutiu-se muito se ela partiu dos militares ou da
pressão oposicionista. Há evidência su6lciente para se admi-
cas categorias ainda excluídas da previdênda --.empregadas
domésticas e trabalhadores autêQo2pioq..-:foram ihcorpç)ra- tir que o pontapé inicial partiu do general e dos militares a
dar em..1972ç 1973, respectivamente, tudo ainda no gover- ele ligados. A oposiçãoaproveitou com inteligência o espaço
no do general Média. Agora âcavam de fora apenas os que que se abria e contribuiu decisivamente para levar a bom êxi-
não tinham relação formal de emprego. Outras medidas ain- to a empreitada. Onze anos depois, era eleito o primeiro pre-
da podem ser mencionadas. O primeiro governo militar, para sidente civil, marco anal do ciclo militar.
atender a exigências dos empresários, acabara com a estabili-
dade no emprego. Paracompensar,foi criado em 1966 um A iniciativa do govwno
Fundo de Garantia por Tempo de Serviços(FÇI'$), que fundo-
nava como um seguro-desemprego.O fundo era pago pelos A abertura começou em .pZ4, quando o general presidente
empresários e retirado pelos trabalhadores em caso de demis- diminuiu as restrições à propaganda eleitoral, e deu um gran-
são. Criou-se também um Banco Nacional de Habitação de passo em 1978, com a revogação.do Al-5, o âm da censu-

IÍBNH);lcuja ânalidade era facilitar a compra de casaprópria ra prévia e a volta dos primeiros exilados políticos. Por que
aõi trabalhadoresde menor renda. Como coroamento das teriam o general Geisel e seus aliados tomado a iniciativa de
políticas sociais, foi criado em 1974 o Ministério da Previ- começar a desmontar o sistema autoritário? Uma das possí-
dência e Assistência Social. veis razões foi o fato de o general pertencer ao grupo de ofi-
'\

íq-
A avaliaçãodos governos militares, sob o ponto de vista ciais ligados ao general Castelo Branco, primeiro presidente
;da cidadania, tem, assim,que levar em conta a manutenção militar. Essegrupo nunca pretendeu prolongar indeânidamen-
'-9

ldo dinilQ..4qlpto.çombinadg:çom o esvaziamentodq.seu te o controle militar do governo. Eram liberais conservado-


a

]'
V
17 2 173
ROSÉ M URILQ DE CARVALHO CIDADANIA NO BRASIL

res, ligados à Escola Superior de Guerra. Desagradava-lhes o como um todo o estigma çiçlo!!uradores:.A imagem da
populismo varguista, mas não eram partidários de uma dita- corporação ficara profundamente desgastada,o que não po-
dura. Sua.convicçãopolítica era liberal, embora não demo-. dia interessar aos oficiais que tivessem visão mais proâssio-
crática. O geneialCastelo fora derrotado pelos setoresmais nal do papel das forças armadas, como era certamente o caso
autoritários das forças armadas, a linha dura, que colocaram do general Geisel e de seus amigos.
no poder o general Costa e Salva.O auge do poder dos linhas- Sejacomo for, em 1974 o general Geisel permitiu propa'
duras foi durante o governo do general Média. Com o gene- ganda eleitoral mais livre para as eleições legislativas desseano.
ral Geisel voltavam os liberais conservadores. A oposição teve acessoà televisão e pôde falar com alguma
Havia outras razões para a abertura. Em 1973 tinha acon- liberdade. O resultado surpreendeu a todos, ao governo e à
tecido o primeiro choquedo petróleo, isto é, um aumento própria oposição. O governo foi am11
lamente dçrrQt4dQ.nas
bruscono preço do produto, promovido pela OPEN!a Organi- elçjçêçs para Q Senado. Havia 22 cadeiras em disputa, das
zação dos PaísesExportadores de Petróleo. A triplicação do quais a oposição, isto é, o MDB, ganhou 16. Nas eleições para
preço atingiu o Brasil com muita força, pois 80% do consumo a Câmara, o MDB não conseguiu maioria, mas aumentou sua
dependia do petróleo importado. O general Geisel fora presi- bancada de 87 para 165 deputados; aArena caiu de 223 para
dente da Petrobrase podia bem avaliar a gravidade da situa- 199. Com isso o governo perdeu a maioria de dois terços,
ção. Os anos do "milagre" estavam contados e eram necessá- necessáriapara aprovar emendas constitucionais. Assustado
rias novas estratégias para en6'entar os tempos diBceis que se com a derrota e sob pressão dos militares radicais, Geisel deu
anunciavam. Nessaconjuntura, seriamelhor para o governo um passoatrás. Com receio de noy4:derrota nas.e.leiçõesde
e para-os militares promover a redemocratização enquanto. 1978, tentou fazer mudanças nalegislação eleitoral. Como não
ainda houvesseprosperidade económica do que aguardar paro:. podia mais contar com a maioria parlamentar necessária,sus-
fazê-lo em época de crise, quando os.Sustos.da manutenção pendeu o Congresso por 15 dias e decretou as mudanças
do controle dos acontecimentos seriam muito mais altos. salvadoras. Entre elas estavam a conârmação da el$çãqlpçlj:
Um terceiro argumento diz respeito às próprias forças ar- Tetapara governadores eiB:j9:78, a eleiçaqltdireta de unlterço
madas.A ditadura tirara os militares de suasatividades pro- dos senadores,'a limitação da propaganda eleitoral, sobretu-
âssionais, atraíra-os para a vida política, para altos cargos na do na televisão, a eliminação da exigência de dob .terços dos
administração pública e privada. A ambição do poder qdo votos para aprovaçãode reformas constitucionais.
lucro passaraa prlçlomypar.sobre.# obrigações plgfi.sssonais, Mas o reRocessonão interrompeu o movimento de aber-
minqndQO.moral do oíicijlla1(2:.Mais ainda, 4 montagemdos Ém 1978ÕoCongressovotou o âmgg.ê!:!».Q fim da
aparelhos de repressão criara dentro das forças armadas uln gru- censuraprévia no.réçljg e na televisão, e o.çesiãtÍêledlnento
po quase independente que ameaçava a hierarquia. Essegrupo do #abeaéo@#s para crimes po+8iços..O governo ainda ate-
envolvera-se em repressão e tortura, jogando sobre os milj!!!çs . nuou a Lei de Segurança Nacional e permitiu o regresso de

174 1 7S
ROSÉ MURILO DE CARVALHO CIDADANIA NO BRASIL

120 exilados políticos. Eq.]979, já no governo do general tro do partido graças ao amplo espaçoexistente para a discus-
João Batísta de Figueiredo, o Congresso votou.]lmaJei.de sãointerna.
anistia, havia muito exigida pela oposição..A lei era polémica Outra medida liberalizante permitiu eleições diretas para
na medida em que estendia a anistia aos dois lados,:isto é- aos
governadores de estados.Elas serealizaram pela primeira vez
acusados de crime contra a segurança nacional e aos agentes emi1982) junto com as eleições para o Congresso.A oposi-
de segurança que tinham prendido, torturado e matado mui-
ção ganhou em nove dos 22 estados,inclusive nos mais im-
tos dos acusados.Além disso, não previa a volta aos quartéis portantes, como São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro, e
dos militares cassadose reformados compulsoriamente. Mas conseguiu maioria na Câmara dos Deputados. Como ato fi-
eladevolveu os direitos políticos âosque os tinham perdido e nal da transição, os militares se abstiveram.de impor .um ge-
ajudou arenovar alutapolítica. neral como candidato à sucessãopresidencial de 1985, em-
Ainda em it979, fi2i.!!)olido .o bipartidarismo forçado. bom tivessemmantido a eleição indireta. Uma coalizão de
Desapareceram Arena e MDB, dando lugar a seis novos pm- forças da oposição e do partido do governo, PDS,levou à vi-
tidos. A Areníi"transformou-seno Partido Democrático So- tória do candidatooposicionista, Tancredo Neves,do PMDB,
cial (PDS), o À4DBno Partido do Movimento Democrático
em janeiro de 1985. Por cruel ironia do fado, Tancredo mor-
Brasileiro(Pb4DP), os antigos trabalhistas doía)TBIUividiram- reu antes de assumir, causando um trauma nacional. Assumiu
se em dois partidos, PTB e Partido Democrático Trabalhista seuvice, José Sarney antigo servidor dos militares: Mas era
(PDT), este último sob a liderança de Leonel Brizola, recém- um civil, eleito pela oposição.Chegaraao fim o período de
retornado do exílio. Os moderadosdo MDB reuniram-se em
governos militares, apesar dq.permanecerem resíduos..do
torno do PartidoPopular(PP),quelogo depoisvoltou afun- autoritarismo nas leis e nas práticas sociais e políticas.
dir-se com o PMDB. A grangç:govidgde.no campo pqrtidá- '''Outras medidas importantes do general Geisel foram to-
rlozno entanto, foi.ê.criação.dodartido dos Trabalhadores madas na área da repressão. Como foi visto, os órgãos de re-
Kljjlj2ien!,!g99, Todos os partidos brasileiros, antes e depois pressão tinham adquirido durante o governo do general
de 1964, com exceçãodo PartidoComunista,tinham sido Média grande independência, inclusive em relação à própria
criados por políticos proâssionais ou por influência do Po-
presidênciada República. Eram um quisto dentro do gover-
0 der Executivo, e haviam sido sempre dominados por mem- no. O general Geisel buscou restabelecer o controle sobre eles.
Ú' bros da elite social e económica.Q.PT-surgiu dç reunião Os anos cruciais foram 1975 e 1976. Em 1975, um conheci-
ampla e aberta de que participaram centenasde militantes.
do jornalista, Vladimir Herzog, tendo-se apresentado espon'
1-
A, Sustentou-se em três grupos principais, a ala progressista da taneamente aos órgãos de segurança do ll Exército, de São
Igreja Católica, os.sindicalistasrenovadores, sobretudo os Paulo, apareceu morto na cela no dia seguinte. Como já havia
met4úrgicolpaixli$taf;i'4g11ipasíigiírai i;nportmtes dajnte- maior liberdade de imprensa, o fato teve ampla divulgação e
lectu4idadS. Eram grupos heterogêneosque conviviam den-
gerou protestos. Os órgãos de segurança alegaram, como de
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17 7
ROSÉ MURILO DE CARVALHO GIBA DANIA N O BRASIL

costume, que teria havido suicídio, versão em que ninguém Digo retomada e renovaçãoporque em alguns casostrata-
acreditava No ano seguinte, outro casosemelhante,agora com va-se de renascimento, em outros do surgimento de movi-
o operário Manoel Fiel Filho, se deu no mesmo local. Desta mentos novos ou com característicasnovas. O fenómeno
vez o presidente deixou clara suadiscordância, demitindo o tornou-se possível inicialmente graças às medidas libera-
comandante do ll Exército, sob cuja jurisdição os crimes ti- lizantes de Geisel, mas, com o correr do tempo, ele apres-
nham acontecido. sou e reorientou a abertura.
Era a primeira vez, desde1964, que um presidente mili- Já foi mencionadaa luta do partido deoposição,o MDB,
tar desautorizava abertamente a açãoda repressão, e o fato e seu dilema hamletiano: ser ou não ser.A maioria do partido
indicou que algo semodificava nessaárea. Em 1977, o ge- optou por mantê-lovivo, apesardasconstantescassações de
neral Geisel confirmou sua autoridade sobre a linha dura mi- mandatos e violações da lei por parte do governo. Mantinha-
litar, demitindo seuministro da Guerra, que seopunha à po- se com isso a possibilidade de haver sempreuma voz crítica,
lítica de abertura. A dilçjta militar ainda resistiu durante o embora frágil, no Congresso. Os resultados positivos dessa
gqverng.4o gçnqalEjgueirççlgz.!ççglreg!!g.ggções çerlorj$- opção não apareceram até 1974. Nas eleições para o Congres-
tas nosanos.çlg.198Q.ç..!ggl; Os aros de maior repercussão so, em 1966 e 1970, boa parte do eleitorado manifestou seu
aconteceram no Rio de Janeiro. Em 1980 foi morta a secre- desencanto abstendo-se ou anulando o voto. Apesar de ser o
tária da OAIZ.;4na Lídía, devido.ê explosão de.uma çart3- voto obrigatório e haver punições para os faltosos, a absten-
bomba. qEm 1981Ê,êipiodiu uma bomba no Riocentrç du- ção foi de 23% nas duas eleições. Os votos brancos e nulos
rante espetáculomusical'em homenagemao Primeiro de foram 21% em 1966 e 30oHo em 1970. Isto é, entre 40% e 50%
Maio, matando um sargento envolvido no atentado. Embo- do eleitorado manifestou sua descrençanos partidos e no
ra tivesse sido escolhido pelo general Geisel para ocupar a Congresso.
presidência, o general Figueiredo não tinha a mesma vonta- Em 1973, contra a opinião dosradicaisdo partido, o MDB
de política de seu antecessor para acabar com o terrorismo lançou seu presidente, Ulysses Guimarães, candidato à presi-
militar. Foi conivente com a farsa de um inquérito montado dência da República para concorrer com o general Geisel. A
pelo Exército para acobertar os responsáveispelo atentado luta era puramente simbólica, pois a Arena detinha o contro-
do Riocentro. 9.desmantelamento do sistema repressivo s(i le do colégio eleitoral. Mas para as liderançasdo MDB signifi-
foi feito nos anos 901' cou nova oportunidade de denunciar a farsa eleitoral, enâ'en-
tendo o cinismo dos líderes da Arena, que insistiam no cará-
Reli.ascemos movimentos de oposição ter democrático da eleição e acusavamde antidemocrática a
posiçãodo MDB. Os resultados positivos da luta solitária do
Paralelamente às medidas de abertura, houve, a partir de partido surgiram nas eleiçõesde 1974. Podendo ter acessoà
1974, a retomada e renovação de movimentos de oposição. televisão, o MDB conseguiu motivar o eleitorado e derrotar

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COSE M URI LO DE CARVALHO CIDADANIA N O BRASIL

o governo naseleiçõespara o Senadoe quaseigualar a Arena tica do novo sindicalismo, em contraste radical com o antigo
nos votos para a Câmara. Daí em diante, ele foi um dos pila- sistema, era a insistência em se manter independente do con-
res do processo de abertura, até eleger um de seusmembros, trole do Estado. Não era movimento paralelo ao anterior: bus-
Tancredo Neves, primeiro presidente civil depois de 1960. cãb;ãKansformaro sistemaantigo em representaçãoautênti-
!!!pva$õq houve, e grande, na criação do PT e nQ nQÜ- ca do gpÊrari4dQ. Essatendência consolidou-se com a forma-
mentg.sj!!dias. Sobre o primeiro já se falou. A inovação no ção de organizações sindicais nacionais. Reuniu-se em 1981,
movimento sindical veio sobretudo dos operários de setores a primeira Conferência Nacional das ClassesTrabalhadoras
novos da economia que se tinham expandido durante o "mi- (Conclat) para criar uma entidadenacional, ignorando a proi-
lagre" do período Média: o debens de consumo durável e de bição legal ainda em vigor. Dividiam-se os trabalhadores ejn
bens de capital. Eram os metalúrgicos de empresasautomo- duas tendências principais, os ligados a Lula, que insistiam no
bilísticas multinacionais e de empresas nacionais de siderur- fortalecimento dasbasese na greve como instrumento de ação,
gia e máquinas e equipamentos, concentrados nas cidades e os ligados ao Pntido Comunista, que ainda pensavamno
industriais ao redor de São Paulo. O;!nQvimenlQ Começou:em controle das cúpulas e nas alianças políticas típicas da prática,
.19Z7a
cgWumacampanha
por recuperação
salarial,e culmi- anterior. A reunião não chegou a um acordo. Após dois anos'
nou em 197$ :e;1979, com grandes greves que se estenderam de debates, o movimento dividiu-se em duas organizaçõesl
a outras partes do país.Em 1978, cercade 300 mil operários nacionais, a Central única dos Trabalhadores(ÇgD, dos que
entraram em greve; em 1979, acima de 3 milhões, abrangen- se chamavam "autênticos", vinculados ao PT, e a Coordena-

do as mais diversascategoriasprofissionais, inclusive traba- ção Nacional da Classe Trabalhadora(ÇonclaD, ligados ao


lhadores rurais. Eram as primeiras greves desde 1968. PMDB e ao Partido Comunista. A postura mais agressivada
Q.ggv ent(2..dj$dDguia-se.da
sindiçqlismg.heldçj: CUT Ihe rendeu maiores ganhos nas lutas sindicais e maior
ro do Estado Novo em.vário!.pontos. Um deles era o de ser influência sobre as categorias profissionais mais modernas. A
organizado de baixo naradlpa, de começar naÉábricp,..!gb 4.. Conclat tinha influência sobre grande número de sindicatos
liderança de operários que.yjnham .das linhas,iiç. p11oçluçãQ, menores e mais tradicionais. Transformou-se em 1986.em
em.contraste.com 4 estrutura.burocratizada.4o©Ínad4 pelQ$ Central Geral dos Trabalhadores(CGTP referência à organiJ
pelego!. Grande.ênfase era dada às comissõeldÊ.fábElçê.e .aos zação criadanoinício dosanos60.
delegados sindicais que funcionavam dentro da$.fábricas. As Outro aspecto da luta pela independência dos sindicatos
decisões anais eram.tomadas em grandes assembléias que reu- era a busca de negociação direta çoh os empregadores por
niam às vezes até 150.mil operários, q não por pequenos co- meio de contratos coletivos, fugindo da justiça do trabalho.
mitês de dirigentes.. Os novos líderes tinham grande carisma, De início, houve reação do governo, intervenção nos sindica-
sobretudo Luís Inácio da Salva,Lula, que se tornou um dos tos, brutalidade policial, prisão de líderes, inclusive do pró-
principais nomes da vida política nacional. Outra caracterís- prio Lula Aos poucos} a prática foi sendo aceita, em parte

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ROSÉ MURILO DE CARVALHO CID A D A NIA NO BRASIL

talvez por terem os operárioscomo interlocutoras asgrandes tinham a vantagem de um contato estreito com asbases,o que
empresasmultinacionais acostumadasa essetipo de negocia- não se dava com os grupos guerrilheiros.
ção. Aos poucos, os alicerces da CLT iam sendo minados. Dentro da Igreja Católica, no espírito da teologia da li-
Era também nova a forte presença de sindicatos rurais. bertação, surgiram as Comunidades Eclesiais de Base(CEBs).
Ausentes até 1963, eles não tiveram seu crescimento inter- A Igreja começou a mudar sua atitude a partir da Segunda
rompido durante os governos militares. Os líderes mais mi- Conferência dos Bispos Latino-Americanos, de 1968, em
litantes foram afmtados, os sindicatos mais agressivos sofre- Medellín. Em 1970, o próprio Papadenuncioua tortura no
ram intervenção. Mas continuaram a crescer,transformados Brasil. A hierarquia católica moveu-se com ârmeza na dire-
em órgãos assistencialistas.O número de sindicatos rurais ção da defesa dos direitos humanos e da oposição ao regime
cresceu rapidamente, a ponto de em 1979 ser praticamente militar. Seu órgão máximo de decisão era a Conferência Na-
igual o número de trabalhadores sindicalizados rurais e ur- cional dos Bisposdo Brasil (CNBB). A reaçãodo governo le-
banos (5 milhões para cada lado). Como sindicatos assisten- vou a prisões e mesmo a assassinatos de padres. Mas a Igreja
cialistas, não se podia esperargrande mobilização política como um todo erapoderosademaispara ser intimidada, como
de sua parte. Mas a própria naturezaviolenta dos conflitos o foram os partidos políticos e os sindicatos. Ela sç.tornou
de terra ç ! açãoda Igreja Católica por meio de $ua Çomis- um baluarte da luta contra a ditadura.
sãoPastoral da Terra conçibüíram para alterar o quadro. Em As CEBs surgiram eni'torno de 1975. Antes de 1964, os
1979 houve greves entre os cortadores de cana de setoresmilitantes da Igreja atuavam nos sindicatos e no movi-
Pernambuco, e a Confederação Nacional dos Trabalhadores mento estudantil por meio da Juventude Operária Católica
na Agricultura (Contag) colocou-se à mesma altura das ou- (IOC) e dasJuventudes Estudantil e Universitária Católicas(JEC
tras confederações nas negociações nacionais para a forma- e JUC). Dentro do novo espírito de aproximar-sedo povo,
ção de uma central sindical, embora sem o poder de fogo de sobretudo dos pobres, a Igreja passoua trabalhar também com
suas congéneres. as populações marginalizadas das periferias urbanas. O traba-
Fora do mundo partidário e sindical, houve também gran- IhgreligiosQ.ligava-se dirççamente às condições sociais desses
desmodificações no movimento popular. Após o hacasso da .©upo$ ç era ao mesmolgnpo um.esforço de conscientização
guerrilha no início dos anos 70, desapareceramas várias or- polítjça. Alguns teóricos da teologia da libertação aproxima-
ganizações
militarizadasformadasa partir de 1968.Muitos ram-se abertamente do marxismo. As CEBsexpandiram-se por
de seus membros foram presos, exilados, mortos, ou deixa- todo o país abrangendotambém as áreasrurais. Por volta de
ram a militância por perceberema impossibilidade de uma 1985, seunúmero estavaem torno de 80 mil. A atuação políli,
solução revolucionária por meios violentos. Em seu lugar, ca fez com que elas se aproximassem do PT. apesar dos esfor-
desenvolveram-se outras organizações, civis ou religiosas, cujas ços da hierarquia em evitar vinculação partidária. A identifica-
ânalidades nem sempre eram diretamente políticas, mas que ção com o PT já era nítida naseleiçõesde 1982. Sem discutir

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ROSÉ MURILO DE CARVALHO
Y CIDADANIA NO BRASIL

as dificuldades que tal envolvimento político poderia trazer, lanças políticas. Muitos presidentes de associações ingressa-
inclusive para a dimensão religiosa da ação da Igreja, é impor- ram na política partidária.
tante notar que asCEBsconstituíam outro exemplo da tendên: Houve ainda grande expansão de associações de profissio-
cia dos anos 80 de abandonar orientações de cúpula e buscar o nais de classemédia, Pomo professores, médicos, engenhei-
cantata direto com a popul4çãQ: Isto se veriâcou no movimento ros, funcionáriospúblicos. Muitas dessasassociações coexis-
sindical, no PT. nas CEBs e nos chamados movimentos sociais tiam com os sindicatos, mas para as categoriasprofissionais
urbanos de que se fda a segue. proibidas de se sindicalizar, como os funcionários públicos,
Desdea segundametade dos anos 70, acompanhando o elas eram os únicos canais de atuação coletiva. As associações
início de abertura do governo Geisel, houve enorme expan- de classemédia, juntamente com os sindicatos, tornaram-se
são dos éjgyjmêiitãs sociais urbanoOComo diz o nome, eram focos de mobilização profissional e política. A medida que os
movimentos típicos das cidades,sobretudo das metrópoles. efeitos do "milagre" desapareciam, as greves dos setores mé-
Entre eles estavam os movimentos. dos .favçlados:Eles já exis- dios tornaram-se mais freqüentes do que asgreves operárias.
tiam desde a década de 40ãias adquiriram maior força e visi- A própria CUT teve sua composição alterada pela adesão
bilidade nos anos 70. A eles se juntaram as associaçõesdê dessessindicatos de classemédia.
moradores de classemédia, que semultiplicaram da noite para Além do MDB e da Igreja Católica, duasoutras organiza-
o dia No início dos anos 80 já havia mais de 8 mil delas no çõesse afirmaram como poqçoli..4ç..!çq$qciâ,aq.governa
pais militar. A primeira delasfoi a Ordem dosAdvogados do Bra-
Essesdois tipos de organização se caracterizavam por es- sil (OAB). Criada em 1930 por decreto do governo, a OAB
tarem voltados para problemas concretos da vida cotidiana. de início so&eu oposição da maioria dos advogados,que ti-
A enorme expansãoda populaçãourbana causaragrande de- nham organizaçãoprópria, o Instituto dosAdvogadosdo Bra-
terioração nas condições de vida, de vez que as administra- sil, criado em 1843. Concebida dentro do espírito corporativo,
çoes municipais não conseguiam expandir os serviços na mes- a OAB signiâcava para elesperda de liberdade e de autono-
ma rapidez. O que os movimentos pediam eram medidas ele- mia. Mas aospoucosela conseguiuatrair advogadosinfluen-
mentares, como asfdtamento de ruas, redes de água e de es- tes e se armou como representante da classe. Sua posição em
goto, energiaelétrica, transporte público, segurança,serviços relação ao movimento de 64 foi de início ambivalente, divi-
de saúde. Os movimentos de íàveladosreclamavam ainda a dindo-se seusmembros entre o apoio e a oposição. À medida
legalizaçãoda possede seuslotes. A.lática mais comum.dos que o regime se tornava mais repressivo, a OAB evoluiu para
movimentosde moradorese faveladoserã'icõni:ailídireto uma tímida oposição.A partir de 1973, no entanto, assumiu
com as administraçõesmunicipd$. Embora sem conotação oposição aberta. Muitos advogados e juristas continuaram,
partidária, essesmovimentos representaram o despertar da naturalmente, a prestar seusserviços ao governo, redigindo
consciência de direitos e serviram para o treinamento de lide- os ates de exceção, defendendo-os, assumindo postos no Exe-

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ROSÉ MURILO DE CARVALHO CIDADANIA NO BRASIL

cutivo. Vários juristas de prestígio ocuparam o Ministério da dores, como O Esfízdode S. Ea#/o, não aceitavam a censura.
Justiça. Essejornal, um dosmais sólidos e tradicionais do país,foi dos
A OAB, no entanto, em parte por convicção, em parte que mais resistiram à censura. Nos piores momentos, deixa-
por interesseprofissional, caminhou na direção oposta. O va espaçosem branco na primeira página, denunciando notí-
interesse profissional era óbvio, na medida em que o estado cias censuradas, ou então publicava poemas de Camões, ou
de exceção reduzia o campo de atividade dos advogados. O receitas culinárias. O interesse proâssional não tira, é claro, o
A[-5, como vimos, excluía da apreciaçãojudicial os atou pra- mérito da luta. A ABI ajudou a reconstruir-a democracia..Seu
ticados de acordo com suasdisposições.As intervenções no presidente, Barbosa Lama Sobrinho, foi candidato à vice-pre-
Poder Judiciário também desmoralizavam a justiça como um sidência da República na chapa da oposição em 1984.
todo. Os juízes eram atingidos diretamente, mas, indireta- A terceira instituição a assumir papel político importante
mente, igualmente os advogados eram prejudicados. Mui- foi a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBllÇ}.
tos membros da OAB, porém, agiam também em função de Fundada em 1948, a SBPC se dedicava exclusivamente a as-
uma sincera crença na importância dos direitos humanos. A suntos profissionais relacionados à pesquisacientífica. Dela
V Conferência anual da Ordem, realizada em 1974, foi participavam pesquisadores de todas as áreas do conhecimen-
dedicada exatamente aos direitos humanos. A OAB tornou- to, dasciências exatas às ciências humanas. Uma vez por ano,
se daÍ.çm diante uma dastrincheiras de defesada legalidade promovia uma grande reunião com milhares de participantes
constitucional,e.civil. Como represália, o governo tentou para debate de temascientíficos. Durante os governos.miljla-
retirar sua autonomia,vinculando-aao Ministério do Tra- res, as reuniões anuais começaram.a adquirir crescente
balho, massemêxito. Em 1980, seu presidentefoi alvo do conotaçãopolítica de.aposição:..Em1977, o governo tentou
atentado em que perdeu a vida uma secretária. O prestígio impedir a reunião anual, suspendendotodo o apoio financei-
político da OAB atingiu o auge em 1979, quando seu presi- ro que tradicionalmente era dado para essafinalidade. A reu-
dente, Raimundo Faoro, foi cogitado como candidato da nião foi realizada na Pontifícia Universidade Católica de São
oposição à presidência da República. Paulo, à revelia do governo, em clima emocional de conâon-
Outra instituição atuante na resistência..F)i a Associação to político. O número de participantes dasreuniões cresceu
Brasileira de Imprensa (ABI), cuja tradição de luta era menos muito, atingindo 6 mil na reunião de 1977. O mundo acadê-
ambíguado que a da OAB. Em seucasotambém, o interesse mico tinha nessasocasiõesoportunidade ímpar de manifes-
corporativo era inegável.A procissãode jornalista exige liber- tarsua oposição.
dade de expressão e de informação para poder exercer-se com Menos organizados, mas não menos eâcientes na ação
plenitude. A censura à imprensa e aos meios de comunicação oposicionista, foram os artistas.lljntelecHais. Apesm da cen-
em geral, sobretudo a censura prévia, não podia deixar de sura, compositores e mqliços:foram particularmente eficazes
merecer a repulsa dos jornalistas. Mesmo jornais conserva- graças a sua grande populqidg4çuO nome que melhor per-

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ROSÉ MURILO DE CARVALHO CIDADÃ NIA NO BRASIL

soni6lcou a resistência foi, sem dúvida, o de Checo Buarque 'A ampla cobertura da imprensa, inclusive da Rede Globo,
de Holanda, cujascançõesse transformaram em hinos opo- tornava quaseimpossível deter o movimento. Interrompê-
sicionistas. Embora a crítica direta fosse proibida, para bom lo só seria possível com uso de muita violência, uma tática
entendedor as letras eram suâcientemente claras. Com me- que poderia ser desastrosapara o governo.
nor alcance,atires, humoristas, intelectuais em geral deram Os comícios transformaram-se em grandes festas.cívicas.
sua contribuição à luta pela redemocratização, pagando às Compareciam os líderes dos partidos de oposição, os presi-
vezeso preço da prisão ou do exílio.
dentes de associaçõesinfluentes como a ABI e a OAB, e, so-
O auge da mobilização popular foi a campanha pelas elei- bretudo, os mais populares jogadores de futebol, cantores e
çõe! dir.eta$.Sm 1984. As eleições estavam previstas para ja- \

artistas de televisão. Músicas populares de protesto eram can-


neiro de 1985 e seriam feitas por um colégio eleitoral que
tadas com acompanhamento da multidão, tudo sempre em
incluía senadores,deputados federais e representantes das
perfeita ordem. As cores nacionais, o verde e o amarelo, tin-
assembléias estaduais. Desta vez, as forças de oposição deci-
giam roupas, faixas, bandeiras. A bandeira nacional foi recu-
diram ir além do simples lançamento de um candidato que
competisse simbolicamente com o candidato oâcial. Sob a li- perada como símbolo cívico. A última vez em que fora usada
publicamente tinha sido nas manifestações de. nacionalismo
derança do PMDB, com a participação dos outros partidos
conservador e xenófoba do governo Média. Mais que tudo,
de oposição, da CNBB, OAB, ABI e outras organizações, lan-
o hino nacional foi revalorizado e reconquistado pelo povo.
çou-se uma campanha de rua pela eleição direta do presiden-
I'\ Ao final de cadacomício, era cantadopelamultidão num es-
te. O objetivo imediato era forçar o Congresso, onde o go-
verno detinha maioria simples, a aprovar emenda à Consti- petáculo que a poucos deixava de impressionar e comover.
Uma versão personalizada do hino, executada por Fafá de
tuição que permitisse a eleição direta. A emenda teria que ser
aprovada por dois terços dos votos, o que exigia que parte do Belém, tornou-se o grande símbolo da campanha.
PDS,partido do governo, a apoiasse. & Faltaram 22 votos para a maioria de dois terços em fa-
A.campanha das diretas foi, sem dúvida, a maior mobi- n vor da emenda.Os 55 votos dos dissidentesdo PDSnão
lizaçl! popular da história do país,se medida pelo númem foram suficientes para a vitória das diretas. Apesar da frus-
de pessoasque nas capitais e nas maiores cidades saíram às tração, a campanha das ruas não foi inútil. A oposição lan-
ruas. Ela começou com um pequeno comício de 5 mil pes- çou o experiente Tancredo Neves, governador de Minas
soas em Goiânia, atingiu depois as principais cidades e ter- Gerais, como candidato para enfrentar o candidato oficial.
minou com um comício de 500 mil pessoasno Rio de Janei- O candidato a vice-presidente foi escolhido entre dissiden-
ro e outro de mais de l milhão em SãoPaulo. Tentativas tes do PDS que tinham formado o Partido da Frente Liberal
esporádicas de impedir as manifestações, partidas de alguns (PFL). A eleição seria feita em um colégio eleitoral domina-
militares inconformados com a abertura, não tiveram êxito. do pelo governo. Foi intensa a campanhaem favor de

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ROSÉ MURILQ DE CARVALHO LIDA DANÇA N O BRASIL

Tancredo Neves. Pesquisasde opinião pública Ihe davam a direitos políticos foi também maior. O custo externo também
preferência de 69% da população. A pressão popular sobre foi maior, pois a situação internacional não era favorável ao
os deputados governistas desta vez foi irresistível. Tancredo autoritarismo, em contraste com a décadade 30. Os custos
Neves ganhou 480 votos do colégio eleitoral, contra 180 interno e externo eram tão altos que os militares mantiveram
dados ao candidato do governo. Terminava o ciclo dos go- uma fachada de democracia e permitiram o funcionamento
vernos militares. dos partidos e do Congresso.
Outra razão é que um dos aspectos da política social dos
governos militares -- a uniformização e unificação do siste-
UM BALANÇODO PERÍODOMILITAR ma previdenciário -- feria interessescorporativos da máqui-
na sindical montada durante o Estado Novo. Como foi visto,
Como avaliar os 21 anos de governo militar sob o ponto de essamáquina controlava os institutos de aposentadoria e pen-
vista da construção da cidadania?Houve retrocessosclaros, sõesdasvárias categoriasprofissionais. Como a cúpula sindi-
houve avançostambém claros, a partir de 1974, e houve situa- cal se politizara muito nos anos 60, a racionalização previ-
ções ambíguas. Comçlemqf pela relação entre direitos.$gciais denciária signiâcou para ela uma perda política e, portanto,
q .e políticos= Nesse ponto os governos militares ;lçpSlglêip..a um custo para o governo.
tática do Estado Novo: ampliaram.os.dirçiços soçlai!!.ao.ipçs- Uma terceira razão tem a ver com o setor rural. Foi sobre
mo tempo em que.restringiam os direitos polítiços? O perÍQ- ele, sem dúvida, que a ação social do governo se fez sentir com
0
do democrático entre 1945 e 1964 se caracterizara pelo opos- maior força e redundou em ganho político muito grande. Mas
to: ampliação dos direitos políticos ç paralisação! ou avanço púae-se também dizer que o ganho político da extensão da
lento; di5i'direitos.sociais. Pode-sedizer que o autoritarismo legislação social ao campo foi menor do que o conseguido por
l brasileiro pós-30 sempreprocurou compensara falta de li- Vargasao estendê-laao setor urbano. O operariado urbano
Q
berdade polÍti.ca com o paternalismo soa.al. Na década de 30, era mais militante e crescia rapidamente. Neutraliza:lo.e
Ê. cooptá-lo politicameqtf:..bi.pma-íaça1111ê..ççlg!!çlçlgyFI. Em
sobretudo durante o Estado Novo, a tática teve grande êxito,
8 contraste,o setor rural em 1964 tinha apenasum ano de
como atestama popularidade do varguismo e sualonga vida
na política nacional. Q corporativismo sindical e a vbãq..do sindicalização intensa. Além disso, a população rural declina-
a Poder Executivo como dispensador de benefícios sociais fica: va rapidamente. Daí o impacto social menor que o obtido no
ram gravados na experiência de uma geraçãointeira de .tra- Estado Novo.
balhadores. A eficácia da tática foi menor no período militar. Entende-se, assim, mais facilmente, por que o apoio aos
4 Uma das razões para o fato fQi..gue a mobilização: política governos militares foi passageiro. O "milagre" económico dei-
anterior ao golpe foi muito mai.o!,doque a que precedeu 1930. xara a classe média satisfeita, disposta a fechar os olhos à per-
Comi;'iibnseqüência, o custo, para o governo, de suprimir os da dos direitos políticos. Os trabalhadores rurais sentiam-se pela

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JOSÉ MURILO DE CARVALHO CIDADANIA N O BRASIL

primeira vez objeto da atençãodo governo. Os operários urba- em 1984 foi o ponto culminante de um movimento de
nos, os mais sacrificados, pelo menos não perderam seus direi- mobilização política de dimensõesinéditas na história do país.
tos sociais e ganharam alguns novos. Enquanto durou o alto Pode-sedizer quç o movimento.pelas.dirçtasserviu de aprçn;
crescimento, eles tinham mais empregos, embora menores sa- dizado para a campanha posterior em:favor do impedimentQ.
lários. Mas, uma vez desaparecido o "milagre", quando a taxa de Fernando Collor,,outra importante e.inédita demonstra-
de crescimento começou a decrescer, por volta de 1975, o cré- ção.deiniciativacidadã.
dito do regime esgotou-serapidamente. A classemédia inquie- Apesar do desapontamentocom o fracassoda luta pelas
tou-se e começou a engrossar os votos da oposição. Os operá- diretas e da hustração causadapela morte de Tancredo Ne-
rios urbanos retomaram sualuta por salários e maior autono- ves, os brasileiros iniciaram o que se chamou de "Nova Re-
mia. Os trabalhadoresrurais foram os únicos a permanecer pública" com o sentimento de terem participado de uma gran-
governistas. As zonas rurais foram o último bastião eleitoral do de transformação nacional, de terem colaborado na criação
regime. Mas, como seu pesoera declinante, não foi capaz de de um país novo. Era uma euforia comparável àquela que
compensar a grande força oposicionista das cidades. marcou os anosde ouro de Juscelino Kubitschek. Certamen-
Assim, o efeito negativo da introdução de direitos sociais te era muito mais autêntica e generalizada do que a da con-
em momento de supressãode direitos políticos foi menor quista da Copa em 1970, marcada pela xenofobia e mancha-
durante os governos militares do que no Estado Novo. Se o da pelo sofrimento das vítimas da repressão.
Qp.avanço! nos .dileito$.sociais e a retomada dos direitos .
3
apoio ao governo Média revelou baixa convicção democrá-
tica, o rápido abandonodo regime mostrou maior indepen- polÍçiços não resultaram, no entanto, em avançosdos Édirei-
dência política da população. Do mesmo modo, se a manu- tos civji:'Pelo contrário, forais.çlçg ç)s;qqçmais soüeram d+:
tenção de eleições conjugada ao esvaziamento do papel dos imite os goylrpg!#llj4aresJO #abeascozPz#s foi suspensopara
$

partidos e do Congressoera desmoralizadora para a demo- crimes políticos, deixando ol cidadãos indeÊsos nas mãos dos
cracia, a população mostrou que, no momento oportuno, era agentesde segurança A privacidade do lar e o segredo da
capaz de revalorizar a representação e usá-la contra o go- correspondência eram violados..impunemente. Prisões-eram G

verno. feitas sem.manlbtdQjudiçjal, gs preso! eram mantidosisola:. g


Ainda do lado positivo, a queda dosgovernos militares teve d(;i"Íincomunicáveisxsem dilecta,a.defesa. Pior ainda:.eram
submetidos a torturas sistemáticasPQIHétDdos bárb©os qBÇ F
muito .mais participação..popular do que a queda do Estado &

Novo,.quando o povo estava, de fato, ao lado de Vergas.A não raro levavam à morte.da.vítima-A liberdade.de.pelis4:. k

ampliação dos mercados de consumo e de emprego e .o gran- mento era cerceadapela.censuraprévia à mídi4.ç.h.manifes-
de crescimento das cidades durante o período militar criaram tações artísticas,..ç, nas universidzldes, pela aposent4doriai] b
condições para a ampla mobilização e organização social que cassaçãode professora!.gpçb: prQjbçãa.de-atividades-políüH
aconteceram após 1974. O movimento pelas eleições diretas cas estudantis.

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ROSÉ MURILO DE CARVALHO CI DADAN tA NO BRAS l L

O poder judiciário, em teseo garantidos dos direitos ci- controladas por traficantes, devido à ausênciada segurança
vis, foi repetidamentehumilhado. Ministros do Supremo Tri- pública. Seushabitantesficavam entre a cruz dostraficantes e
bunal foram aposentadose tiveram seusdireitos políticos cas- a caldeirinha da polícia, e era muitas vezes difícil decidir qual
sados. Outros não fizeram honra à instituição, colaborando a pior opção. Pesquisasde opinião pública da época indica-
com o arbítrio. O número de ministros foi aumentado para vam a segurançapública como uma das demandasmais im-
dar maioria aospartidários do governo. Além disso, a legisla- portantes dos habitantes das grandes cidades.
ção de exceção, como o Al-5, suspendeua revisão judicial dos A.precariedade.do:Lgjigitgg çiyi$.lançava sombras amea-
atos do governo, impedindo os recursos aostribunais. çadoras sobre.o.futuro!,.da.çidadani4, que, de outro modo,
Como consequênciada abertura, essesdireitos foram res- parecia risonho ao final dos governos militares.
tituíd(iê continuarambeneficiandoapenasparcelaliedll
zida da população, os mais ricos e os mais educados. A maio-
ria continuou fo;a 2io alcance da proteção. da1leis.e.dos trF"
bunais. A forte urbanização favoreceu os direitos políticos mas

a
levou à formação de metrópoles com grande concentração de
populações marginalizadas. Essaspopulações eram privadas
Ê
de serviços urbanos e também de serviços de segurança e de
justiça. Suas reivindicações, veiculadas pelas associações de
\ moradores, tinham mais êxito quando se tratava de serviços
urbanos do que de proteção de seusdireitos civis. As polícias.
1: militares, encarregadasdo policiamento ostensivo, tinham sido
d''''
colocadassob o comando do Exército durante os governos
militares e foram usadaspara o combateàs guerrilhas rurais e
urbanas. Tornaram-se completamente inadequadas, pela filo-
C
sofa e pelas táticas adotadas,para proteger o cidadão e res-
Ç
peitar seusdireitos, pois só viam inimigos a combater.A polí-
b cia tornou-se, ela própria, um inimigo a ser temido em vez.de
.um aliado a ser respeitado.
A expansãodo tráfico de drogas e o surgimento do crime
organizado aumentaram a violência urbana e pioraram ainda
mais a situação das populações faveladas. Muitas favelas, so-
bretudo em cidades como o Rio de Janeiro, passarama ser

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