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Apontamentos de Direito
Constitucional
Estes apontamentos constituem uma síntese da matéria apreendida nas aulas teóricas,
tendo por objectivo servir como material didáctico, o que não dispensa a consulta dos
respectivos manuais (os quais iremos indicar abaixo), pois que o que se pretende é
apenas uma primeira leitura simplificada, para que a leitura da bibliografia indicada não
seja indigesta.
Bibliografia:
Em sentido estrito, o Direito Constitucional traduz-se no que acima foi dito, num
conjunto de matérias, embora não directamente constitucionais, são protegidas pelo
Direito Constitucional2.
1
JORGE MIRANDA, Curso de Direito Constitucional, Vol. 1, Lisboa, 2016, pp. 11-28.
2
Para uma abordagem ao conjunto de matérias constitucionalmente protegidas, vide MIGUEL
NOGUEIRA DE BRITO, Lições de Introdução à Teoria da Constituição, Lisboa, 2017, pp. 14-19.
3
JORGE MIRANDA, op. cit., p. 13.
Constituição
1. Introdução
O liberalismo dita que o poder político reside no povo; daqui resulta o nosso conhecido
princípio da separação de poderes. O povo delega os seus poderes a uma entidade
soberana, subdividida em entidades diferentes.
4
J.J. GOMES CANOTILHO, Direito Constitucional e Teoria da Constituição, Coimbra, 2000, pp. 51 e
ss.
existência dos sistemas e regimes políticos. As regras constitucionais estão acima de
qualquer maioria conjuntural e acima das demais regras5.
A Constituição tem um valor superior às outras leis. Regula as matérias estaduais. Está
ligada a situações jurídicas, políticas e ideológicas, tendo por objectivo garantir a
separação de poderes. Está subjacente à Constituição a ideia de que o poder reside no
povo (através, claro está, dos seus representantes).
Temos, outrossim, que curar dos direitos fundamentais dos cidadãos. Anteriormente à
ideia de constitucionalismo moderno, não considerávamos os integrantes de uma
comunidade como cidadãos, mas sim como súbditos, estando estes subjugados aos
poderes do senhor absoluto. Por seu turno, na concepção liberal, o cidadão tem direitos
fundamentais, inalienáveis pelo Estado, consagrados na Constituição. Esta concepção
está ao serviço do povo e reconhece a dignidade da pessoa humana (Ex: Direito à vida,
ao casamento). O Estado não pode por em causa estes direitos, porquanto o Estado
emana da vontade geral. O Estado tem o dever de criar condições, a fim de garantir a
satisfação de necessidades e direitos dos cidadãos. O Estado define as regras, mas
posteriormente não se deve imiscuir socialmente, intervindo, economicamente, como
regulador.
5
JORGE MIRANDA, op. cit., pp. 105 e ss.
um papel fundacional, visto que é nesse conjunto que assenta a base de toda a ordem
jurídica.
A Constituição é a lei fundamental, é a “lei das leis”. Esta deve estar protegida de
ataques ao seu conteúdo, não se devendo subordinar a maiorias conjunturais (veja-se
que a revisão constitucional em Portugal exige, para a sua aprovação, uma maioria
qualificada de pelo menos dois terços dos deputados em efectividade de funções). As
normais jurídicas das demais leis devem-se-lhe subordinar (Princípio da
Constitucionalidade). As leis devem ser moldadas àquilo que a Constituição estabelece.
As constituições podem apresentar características diferentes, todavia, aquilo que lhe está
subjacente é a designação das características fundamentais do Estado.
2. Tipos de Constituição
Constituições Flexíveis e Rígidas8: Tem que ver com o processo de revisão. Uma
Constituição Flexível é aquela, cujo processo de revisão não difere do procedimento
legiferante das demais leis ordinárias. Constituição Rígida é aquela, cujo processo de
revisão é mais exigente que o procedimento das demais leis ordinárias (A Constituição
portuguesa é rígida, visto que o seu processo de revisão exige uma maioria qualificada
de dois terços dos deputados em efectividade de funções).
6
Vide Anotação ao artigo 13º, GOMES CANOTILHO, VITAL MOREIRA, Constituição da República
Portuguesa Anotada, Vol. I.
7
GOMES CANOTILHO, op. cit., pp. 182-185.
8
JORGE MIRANDA, op. cit., p. 170.
Classificação Ontológica de Loewenstein9: O autor supracitado revela-nos três
classificações de Constituição, em função da prática constitucional pelos detentores do
poder político. Temos assim as Constituições Normativa, Nominal e Semântica:
Constituição Nominal – tem o objectivo de limitar o poder político, ainda que este não
se lhe submeta totalmente (Ex: Constituição Corporativa de 1933).
9
JORGE MIRANDA, op. cit., p. 113.
10
GOMES CANOTILHO, op. cit., pp. 52-60.
11
JORGE MIRANDA, op. cit., pp. 115-120.
Constituição Formal - é a forma e consistência da Constituição. Corresponde ao
procedimento específico de formação, lugar específico no ordenamento, sistematização.
É o conjunto sistemático com unidade e coerência próprias.
12
NOGUEIRA DE BRITO, op. cit., pp. 48-50.
Poder Constituinte
Para existir Constituição, primeiro esta tem de ser criada. A função de elaborar a
Constituição traduz-se na Função Constituinte.
O Poder Constituinte corresponde ao momento inicial do Estado, que irá traduzir a sua
ordem jurídica. Podemos visualizá-lo num quadro de criação, no momento inicial, ou
num momento de reconstrução, de reformulação, de transição; aí estamos no domínio
das vicissitudes constitucionais, constituindo o paradigma do Poder Constituinte a
Revolução Constitucional. Numa palavra, o Poder Constituinte mais não é que o poder
de criar a Constituição, que irá ditar a nova ordem jurídico-constitucional13.
O Poder Constituinte pode ser originário, sendo este o poder de criar a Constituição, ou
derivado, sendo este o poder de rever a Constituição.
13
GOMES CANOTILHO, op. cit., pp. 65-74.
14
GOMES CANOTILHO, op. cit., pp. 75-76.
Assembleia Constituinte Soberana/Representativa15 – corresponde à elaboração da
Constituição, através de uma assembleia representativa do povo, a Assembleia
Constituinte, com capacidade para elaborar, discutir e aprovar a nova Constituição em
nome deste (Ex: Assembleia Constituinte de 1975).
15
GOMES CANOTILHO, op. cit., pp. 78-79.
16
GOMES CANOTILHO, op. cit., p. 79.
17
GOMES CANOTILHO, op. cit., pp. 79-80.
18
GOMES CANOTILHO, op. cit., p. 80.
19
JORGE MIRANDA, op. cit., pp. 142-143.
20
JORGE MIRANDA, loc. cit.
4. Limites ao Poder Constituinte Originário
Não podemos olvidar que, apesar de ser um poder primário, que está na base da criação
na nova ordem jurídica, o Poder Constituinte não é ilimitado, não é omnipotente, como
alguns defendem. Este tem, outrossim, os seus limites, limites materiais21 ao Poder
Constituinte Originário, limites esses de índole transcendente, imanente ou heterónoma:
21
JORGE MIRANDA, op. cit., pp. 150-151.
22
JORGE MIRANDA, op. cit., p. 151.
23
JORGE MIRANDA, op. cit., p. 152.
24
JORGE MIRANDA, op. cit., p. 153.
Vicissitudes Constitucionais
25
JORGE MIRANDA, op. cit., p. 154.
26
JORGE MIRANDA, op. cit., p. 159.
27
JORGE MIRANDA, op. cit., p. 160.
28
JORGE MIRANDA, op. cit., p. 161.
29
JORGE MIRANDA, op. cit., pp. 136-142.
Constituição Material (matérias com dignidade constitucional subsumidas ao corpus
constitucional), mas permanece a Constituição Instrumental.30
30
JORGE MIRANDA, op. cit., p. 162.
31
JORGE MIRANDA, op. cit., pp. 162-163.
Da Revisão Constitucional em Especial: Seus Limites (Limites ao
Poder Constituinte Derivado)
1. Introdução
32
JORGE MIRANDA, op. cit., pp. 176-178.
se reúna uma maioria qualificada de quatro quintos dos deputados em efectividade de
funções, ser revista a Constituição – Art. 284ª CRP.
Limites Materiais – Art. 288º CRP (Há discernimento e rotura de convergência, pelo
que apontamos as várias teses a respeitos destes limites):
33
JORGE MIRANDA, op. cit., pp. 182-187.
34
JORGE MIRANDA, op. cit., p. 181.
Tese da Relevância Jurídica35 – aqui releva cura-se de limites superiores ao poder de
revisão constitucional. Há certas normas na Constituição que não podem ser objecto de
revisão. São as normas que constituem o cerne da Constituição, a sua identidade.
Defende-se que não se deve banalizar a Constituição, no sentido em que esta só
necessita de uma maioria qualificada para ser alterada. Há que assegurar a sua
continuidade, não só pela proibição de uma revisão total, mas também por estabelecer
limites que não podem ser superados por um mero exercício de revisão, limites esses
que são absolutos, que constituem os limites materiais; isto no sentido do garante da
continuidade histórico-identitária da Constituição. O Professor Gomes Canotilho
considera que a tese da dupla revisão se traduz, não na possibilidade da revisão de certas
normas através da supressão de determinados limites materiais, mais sim num indício de
fraude à Constituição, ou mesmo numa ruptura constitucional, visto que os limites
materiais constituem a garantia de princípios identitários da Constituição.
35
GOMES CANOTILHO, op. cit., pp. 1030-1036.
Inconstitucionalidade
Quando uma norma ou acto legislativo padece de vício, no âmbito da sua conformidade
com a lei fundamental, estamos perante uma inconstitucionalidade36 – comportamento
que infringe uma norma constitucional.
Não obstante, acresce que para ser inconstitucional, o acto tem, não só de estar
desconforme à Constituição, como emanar de entidade de poder público.
2. Tipos de Inconstitucionalidade37
36
JORGE MIRANDA, Curso de Direito Constitucional, Vol. 2, Lisboa, 2016, p.231.
37
JORGE MIRANDA, Curso de Direito Constitucional, Vol. 2, Lisboa, 2016, pp. 233-234.
Originária e Superveniente – é originária desde o momento da formação da norma; é
superveniente quando uma norma anteriormente estava conforme à Constituição, por
efeito de revisão constitucional ou por vigência de nova Constituição passa a ser
inconstitucional.
38
GOMES CANOTILHO, op. cit., pp. 243-276.
No que concerne aos direitos fundamentais, a Constituição assegura o primado do
respeito pela dignidade da pessoa humana, assegurando ao homem autonomia face ao
Estado (Arts. 12º a 79º CRP).
Releva, outrossim, a consideração da reserva de lei, o que se traduz na ideia da lei como
instrumento para definir o regime mais apropriado. Dito de outra forma, certas questões
só podem ser objecto de acto legislativo (Ex. Arts 164º e 165º CRP). Os Poderes
executivo e administrativo não estão acima da lei.
2.2.Princípio Democrático39
A nossa CRP não podia ser mais clara, quando afirma, no seu Art. 1º, que Portugal é
uma República soberana baseada na vontade popular. O Art. 2º estatui que “A
República portuguesa é um Estado de Direito Democrático, baseado na soberania
popular (…)”. O Art. 3º dispõe que a soberania reside no povo. O Art. 9º vincula o
Estado a defender a democracia política e assegurar o respeito pelo Estado de Direito
Democrático.
Estatui o Art. 108º que o poder político reside no povo e o Art. 109º compreende a
participação directa e activa dos cidadãos na vida política.
2.3.Princípio Republicano40
O Princípio Republicano comporta uma dimensão laica (Art. 41º CRP) (Separação entre
o Estado e a Igreja), a simbologia republicana (Art. 11º CRP) (adoptada desde a
revolução de 1910) e a unidade e indivisibilidade da República (Art. 3º/1 CRP).
40
J.J. GOMES CANOTILHO, Direito Constitucional, Coimbra, 1991, pp.491-501.
Normas Constitucionais
1. Normas programáticas41
São dirigidas a certos fins e transformações, não só da ordem jurídica, como das
estruturas sociais ou da realidade constitucional. Implicam uma concretização
inseparável dessa realidade. São normas dirigidas ao Estado. Traçam um programa ao
Estado e a correspondente obrigação do Estado cumprir o programa, dependendo da
realidade. Dependem, outrossim, de factores económicos e sociais (Ex: normas de
Direitos Económicos, Sociais e Culturais). O elemento “ao Estado incumbe” é objecto
de identificação das normas programáticas, porquanto é um compromisso a que o
Estado se vincula, no sentido de desenvolver certa matéria constante da norma.
2. Normas preceptivas42
As normas exequíveis por si mesmas são aplicáveis por si só, sem necessidade de lei
que as complemente. Concretizam-se por si mesmas. Aqui, os comandos constitucionais
actualizam-se por si só (Ex: Art. 24º CRP “A vida humana é inviolável”).
41
NOGUEIRA DE BRITO, op. cit., p. 152.
42
NOGUEIRA DE BRITO, op. cit., p. 151.
43
NOGUEIRA DE BRITO, op. cit., pp. 151-152.
As normas não exequíveis por si mesmas carecem de normas legislativas ulteriores que
as tornem plenamente aplicáveis. São normas prescritivas, imposições legiferantes: o
legislador ordinário é obrigado a fazer a lei necessária para a sua efectivação. Pode não
de imediato produzir efeitos. Fica dependente de uma concretização jurídica ulterior.
Postulam apenas a intervenção do legislador (e não um programa vinculativo). Se estas
não forem concretizadas poderá incorrer-se numa inconstitucionalidade por omissão
(Ex: Art. 26º/2 “A lei estabelecerá (…)”).
Direitos Fundamentais44
1. Introdução
São posições jurídicas activas das pessoas singulares, tendencialmente frente ao poder,
visando garantir tutelar a dignidade da pessoa humana, isto é, direitos subjectivos
públicos, que irão consubstanciar, de certa forma, o estatuto dos indivíduos na
sociedade política.
Desta forma, os direitos fundamentais surgem para proteger as pessoas face ao poder,
porquanto regulam uma relação entre a comunidade e o poder, isto é, nascem para
defender os indivíduos face a um poder muito superior ao seu; limitam o poder e criam
um conjunto de posições jurídicas activas individuais.
44
Não cabe no presente capítulo traçar um desenvolvimento assaz substancial acerca dos Direitos
Fundamentais, porquanto esta matéria será objecto de estudo de uma disciplina autónoma, a ser lecionada
no segundo ano do curso jurídico. Para desenvolvimentos, vide JOSÉ DE MELO ALEXANDRINO,
Direitos Fundamentais – Introdução Geral, 2ª edição, Lisboa, 2011; JOSÉ CARLOS VIEIRA DE
ANDRADE, Os Direitos Fundamentais na Constituição de 1976, 5ª edição, Coimbra 2017; J.J. Gomes
Canotilho, op. cit., pp. 369-512.
Os direitos fundamentais, sublinhe-se, não assumem apenas a forma de direitos
subjectivos, mas sim de direitos que valem, universalmente falando, para a toda a
comunidade, o mesmo é dizer que se apresentam, outrossim, sob a veste de direitos
objectivos.
No catálogo dos DLG reúnem-se aqueles que são considerados os direitos tradicionais
(v.g. direito à vida, à integridade pessoal, à liberdade, garantias processuais, liberdade
de consciência, religião e de culto, liberdade de expressão, etc.).
O regime especial dos DLG confere uma maior segurança e estabilidade, bem como
uma eficácia com maior acentuação, aos respectivos preceitos constitucionais, em
relação às demais normas constantes da nossa lei fundamental.
Estes podem ser restringidos, v.g., para acautelar outro direito com maior peso ou
dignidade fundamental, contudo têm de respeitar os seguintes requisitos (Art. 18º/2/3
CRP):
Não podem ter efeitos retroactivos e devem ter um alcance geral e abstracto;
Estão ligados à intervenção do Estado na vida social (v.g. direito dos trabalhadores,
direito a segurança social, direito ao repouso, direito à habitação, etc.).
São, em primeiro lugar, direitos a uma realização estatal (facere), a uma acção,
prestação. Têm sempre uma natureza parcial, progressiva e futura, porquanto dependem
de determinados pressupostos (v.g. conjuntura económico-financeira; regime político-
ideológico) para lograrem uma ulterior concretização.
Os DESC não têm aplicação directa, antes uma aplicação mediata, porquanto são
direitos a prestações. Os preceitos a eles referentes não estão determinados na
Constituição. Na Constituição apenas há uma previsão prestacional e não determinação,
pelo que carecerão sempre de mediação legislativa.
Nesta medida, os DESC não são verdadeiros direitos subjectivos, porquanto não podem
ter uma sanção jurídica perfeita.
1. Constituição de 1822
A Carta Constitucional é obra pessoal de D. Pedro IV, tendo sido redigida num tempo
curto, antes de abdicar da coroa. Com a abolição da Constituição de 1822 por D. João
VI em 1823, Portugal regressou ao Absolutismo. No entanto, com a sua morte em 1826,
45
Referência superficial. Para estudos mais aprofundados ver Marcello Caetano – Constituições
Portuguesas.
D. Pedro, então Imperador do Brasil, é aclamado rei de Portugal e decide doar aos
portugueses a Carta Constitucional, baseada na Constituição brasileira de 1824 e na
francesa de 1814. A outorga da Carta Constitucional traduz-se na manifestação
absolutista por parte do monarca. Este texto fundamental atribui ao Rei o poder
moderador.
Em 1826, D. Pedro abdica do trono, entregando-o a sua filha, D. Maria I, que haveria de
casar-se com D. Miguel, irmão de D. Pedro e absolutista fervoroso, a quem era
concedida a regência de Portugal em 1827. Em 1828, reunindo influencias, D. Miguel
proclama-se Rei absoluto. Devido a este facto, o país embarca numa série de lutas entre
absolutistas e liberais, com devidas alternâncias no poder, que, num último momento, se
repercute na Convenção de Évoramonte, saindo vitoriosos da guerra civil os liberais.
Esta tinha 145 artigos, tendo como objectivo solucionar a crise dinástica, estabelecer um
compromisso entre legitimistas e constitucionais, através do estabelecimento de um
parlamento bicameral, surgindo ao lado do Rei, com Câmara de Deputados electiva e
Câmara de Pares hereditária. O princípio monárquico e o princípio representativo
coexistem. Para além dos poderes anteriormente referidos (legislativo, executivo e
judicial), temos a novidade do poder moderador detido pelo monarca. O sistema de
governo era parlamentar, o que tendeu para um sistema rotativista (rotatividade entre
governos de facções políticas, v.g. Partido Regenerador, Partido Histórico, Partido
Progressista).
A Carta Constitucional teve várias vigências. A primeira vigência deu-se entre 1826 e
1828, entre o reinado de D. Miguel e os conflitos políticos. A segunda vigência observa-
se entre 1834 e 1836, aquando da vitória dos liberais na guerra civil até à agudização
conflitual entre Cartistas e Vintistas, revolta que ficou conhecida como o Setembrismo,
que veio reinstituir a Constituição de 1822, por força da vitória dos Vintistas (não
obstante a sua dificuldade de aplicação, que culminou na sanção da Constituição de
1838). Por último, visualiza-se a vigência da Carta Constitucional entre 1842, golpe de
Estado por Costa Cabral que repõe a Carta Constitucional, e 1910, revolução
republicana.
3. Constituição de 1838
Constituição, também conhecida como Setembrista, resultante do acordo entre as Cortes
e o Monarca (Constituição pactícia), justificando-se a falta de eficácia da Constituição
de 1822, na sequência do Setembrismo, do qual saíram vitoriosos os liberais. Esta foi
jurada por D. Maria II.
Representa uma síntese entre os textos de 1822 e 1826, reafirma a soberania nacional, o
princípio democrático, o sufrágio directo, elimina o poder moderador e aumenta os
poderes do rei em relação à lei fundamental de 1822. No sistema de governo, verifica-se
o regresso à tripartição de poderes, sendo o poder legislativo atribuído a duas câmaras
(Câmara Alta e Câmara Baixa), ambas eleitas por sufrágio directo, restringindo-se a
elegibilidade para Senadores a critérios censitários e capacitários. O Poder executivo
está a cargo do monarca, o qual detém poder de sanção das leis, o poder de dissolver a
Câmara dos Deputados. Verifica-se um pendor parlamentar mitigado.
4. Constituição de 1911
5. Constituição de 1933
Mais tarde, já como Presidente do Conselho de Ministros, Salazar preparou uma nova
Constituição que o Governo publicou nos jornais diários de 28 de Maio de 1932 para
efeito de discussão no país e, posteriormente, refundiu-a e submeteu-a a plebiscito
nacional, sendo então aprovada em 1933. Esta não foi elaborada por uma Assembleia
Constituinte, mas sim pelo Governo, sendo legitimada através de sanção popular.
6. Constituição de 1976
A CRP de 76 tem uma origem revolucionária, por força de uma difícil situação do país,
dominado por um regime caduco, por condições económico-sociais degradadas e pelo
adiamento constante da questão da descolonização. Desta forma, Portugal sairia desse
impasse com a revolução de 25 de Abril de 1974, protagonizada pelo Movimento das
Forças Armadas. O 25 de Abril representava o início de uma verdadeira revolução, que
iria permitir o restabelecimento da democracia de a descolonização. O processo que
levaria à CRP de 76 passa, em primeiro lugar, pelo programa do MFA, consagrado e
formalizado num documento sem precedentes no Direito Público português. O 25 de
Abril teve, igualmente, como referência, a nível jurídico, a Declaração Universal dos
Direitos do Homem (documento que viria inspirar a CRP de 76). O Programa do MFA
previa a restauração da democracia e dos direitos e deveres dos cidadãos, uma solução
política da questão colonial, o programa de salvação dos três d’s (descolonizar,
desenvolver, democratizar), uma nova solução político-económica e social e a definição
no novo sistema político, através de uma legitimação emanada do povo, com a eleição
dos Deputados à Assembleia Constituinte, assembleia que iria ser objecto de criação da
nova Constituição. Todavia, circunstâncias houve que assinalaram o processo que se
desenrolaria até à Constituição, entre as quais, a turbulência dos dois anos entre a
revolução e a Constituição (desacatos políticos e sociais), a celebração de duas
Plataformas de Acordo Constitucional entre os principais partidos políticos e o MFA e o
pluralismo partidário que assolou o país e se manifestou na Assembleia Constituinte,
tendo cada partido apresentado o seu projecto constitucional. Destas circunstâncias
resultaria uma Constituição fortemente influenciada pelos elementos factuais registados
nesse período.
Num primeiro momento, o MFA nomeia uma Junta de Salvação Nacional, a quem são
entregues, provisoriamente, os poderes do Estado, na qual são criadas sucessivamente
Leis Constitucionais Revolucionárias. A nova ordem política deve versar na supressão
do anterior regime, nomeadamente, na repartição do poder político por vários órgãos
constitucionais, primeiramente, órgãos provisórios. Os poderes constituintes assumidos
em consequência do MFA foram conferidos ao Conselho de Estado e os poderes
Constituídos ao Governo Provisório. Este paradigma manter-se-ia até à eleição da
Assembleia Constituinte.
A 25 de Abril de 1975 dá-se, em Portugal, uma eleição livre, com sufrágio universal,
para a Assembleia Constituinte. A Constituição nasce dessa Assembleia, onde estão
representadas todas as ideologias políticas eleitas, com a intervenção de todos os
partidos. Só a AC tinha poder para decretar e sancionar a Constituição. A elaboração da
Constituição passou por uma fase de sistematização, uma fase de elaboração e
aprovação e uma fase de redacção final e aprovação global.
46
JORGE MIRANDA, op. cit., pp. 93-96.
3ª Revisão, de 1992 (extraordinária) – Necessidade de revisão, no sentido de
compatibilizar a Constituição com o tratado de Maastrich;
O Art. 112º da CRP prevê os diferentes tipos de actos normativos (podem ser
legislativos ou não legislativos). Retira-se, outrossim, do artigo supra-referido o
Princípio da Tipicidade, no qual só existem actos normativos que a CRP prevê.
Nunca é de mais afirmar que a lei é geral e abstracta (Veja-se que a lei orgânica não
constitui outra categoria de acto legislativo. Quanto muito é uma subcategoria de lei
ordinária).
Por seu turno, o Governo tem também competência para realizar actos de natureza
administrativa. Aqui identificamos o acto normativo não legislativo, que irá
corresponder ao regulamento (Art. 112º/6/7 CRP).
47
JORGE MIRANDA, Curso de Direito Constitucional, Vol. 2, Lisboa, 2016, pp. 179-215.
O Art. 165º da CRP consagra a reserva relativa da AR em sede de competência
legislativa. As matérias dispostas nesse preceito são objecto de legislação por parte da
AR e podem ser delegáveis ao Governo, através de um acto de autorização, para efeitos
de legislação – leis de autorização legislativa (Art. 165º/2 CRP). Claro está, dentro de
certos limites. A lei de autorização deve definir o seu objecto, o sentido e a duração da
autorização, não podendo ser prorrogada (impedindo certas arbitrariedades).
O Governo pode ainda ter iniciativa legislativa, com o lançamento de uma proposta de
lei, segundo o Art. 167º/1 CRP.
Segundo o Art. 232º CRP, é da competência exclusiva das Assembleias Legislativas das
Regiões Autónomas o poder legislativo, não sendo este delegável nos respectivos
Governos.
A CRP estabelece que em certas matérias existam leis de valor reforçado, às quais as
restantes leis se devem subordinar.
Se uma lei ordinária, em regra, for desconforme a uma lei de valor reforçado é ilegal.
Só são leis de valor reforçado as que resultam da Constituição (Art. 112º/3 CRP).
O Tribunal Constitucional tem competência para decidir, em matéria de conformidade,
a relação entre leis de valor reforçado e leis ordinárias.
Leis Orgânicas – Art. 168º/5 CRP – Requerem maioria absoluta dos deputados em
efectividade de funções para serem aprovadas (mínimo de 116 deputados).
Constituem forma de lei orgânica as matérias constantes do Art. 164º, alíneas a. a f., h,
j, l (primeira parte), q, t (Art. 166º/2 CRP).
Leis que carecem de aprovação por maioria de dois terços – Arts. 112º/3 e 168º/6 –
São leis que carecem de uma dupla maioria para serem aprovadas: maioria de dois
terços dos deputados presentes desde que superior à maioria absoluta dos deputados em
efectividade de funções (mínimo 117 deputados).
Leis que são pressuposto normativo necessário de outras leis – Arts. 112º/3 e 198º
al.c. – A CRP estabelece que, em função da matéria de que se ocupa, a lei deve ter
especial protecção. Assim, a lei A é pressuposto normativo da lei B. A lei B só pode
subsistir mediante a existência da lei A (Ex: Leis Base – DL de desenvolvimento).
Leis que devem por outras ser respeitadas – Uma lei para existir não depende de
outra. Mas se essa outra existir, a lei deve respeitá-la. Assim, para existir B, não tem que
existir A. Mas se A existir, B tem de respeitá-la. Caso paradigmático deste tipo de delis
é a Lei do Orçamento. Se esta existir, todas as restantes se lhe devem submeter (Art.
106º/1 CRP).
Processo Legislativo Parlamentar48
1. Introdução
2. Fases
2.1. Iniciativa
2.2.Fase de Apreciação/Instrutória
48
JORGE MIRANDA, Curso de Direito Constitucional, Vol. 2, Lisboa, 2016, pp. 215-230.
GOMES CANOTILHO, op. cit., pp. 843-852.
Tem por finalidade a recolha e elaboração de dados e elementos, que permitam analisar
a oportunidade do procedimento. GOMES CANOTILHO considera que o trabalho
fundamental decorrente desta fase cabe às comissões especializadas, às quais serão
enviados os projectos/propostas de lei, tendo estas como função apreciar e dar parecer
devidamente fundamentado, no que tange à sua matéria.
2.3.Fase de deliberação/Constitutiva
Cabe ao Presidente da Assembleia da República fixar a ordem do dia (Art. 176º/1 CRP),
não obstante a possibilidade de ser solicitada prioridade, por parte do Governo, dos
Grupos Parlamentares ou das Assembleias Legislativas Regionais, para assuntos de
interesse nacional ou regional, respectivamente, de resolução urgente (Art. 176º/2/4
CRP).
Por seu turno, a votação compreende uma votação na generalidade (versa sobre cada
projecto em geral, sendo aqui que se toma a decisão de legislar; as restantes votações
são consequenciais), uma votação na especialidade (versa sobre cada artigo, número,
alínea) e uma votação final global, votação esta que irá incidir sobre a forma final do
projecto/proposta de lei e não é precedida de discussão (as anteriores são; cada Grupo
Parlamentar pode apenas produzir uma declaração de voto não superior a dois minutos).
A inexistência de cada votação pressupõe a nulidade da lei, porquanto constitui um
vício de procedimento.
Não obstante, a promulgação está associada ao direito de veto do PR, bem como ao
direito de ser suscitada a fiscalização da constitucionalidade do diploma (fiscalização
preventiva da constitucionalidade (Arts. 136º/1, 134º al.g. e 278º/1 CRP).
O PR pode exercer o direito de veto (veto político), nos termos do Art. 136º/1 CRP,
devendo devolver o diploma à AR com mensagem fundamentada, o que não obsta que a
AR possa recorrer ao mecanismo da confirmação (Art. 136º/2/3 CRP).
Sem embargo, a AR não fica obrigada a deliberar de novo. Pode fazê-lo ou não. A AR
pode expurgar a norma viciada, ou mesmo reformular todo o diploma (Art. 279º/2
CRP), sendo enviado novamente o diploma ao PR para efeitos de promulgação. Não
obstante, a AR pode não recorrer a nenhum desses mecanismos e insistir na mesma
formulação do diploma. Nesse sentido, pode a AR recorrer ao mecanismo da
confirmação, sendo necessária maioria de dois terços dos deputados em efectividade de
funções para haver confirmação (Art. 279º/2 CRP).
A publicação é feita através do jornal oficial “Diário da República”, sob pena de, em
caso de não publicação, ineficácia jurídica (Art. 119º CRP).
49
JORGE MIRANDA considera que a fase de publicação já se encontra fora do
procedimento legislativo parlamentar.
Fiscalização da Constitucionalidade
1. A Fiscalização da Constitucionalidade
Quando se observa que uma norma constitucional padece de vício, concluímos que a
Constituição tem de prever mecanismos com capacidade para suprimir, ou no mínimo,
criar condições atenuantes para fazer face à norma viciada. Afirma-se, pois, que à
inconstitucionalidade corresponde a garantia da constitucionalidade. Daí decorre que
dessa garantia existam mecanismos para prosseguir essa mesma garantia: daí a
fiscalização da constitucionalidade50.
Este tipo de fiscalização respeita a normas que “hão-de ser”, normas que ainda não
estão em vigor, ainda não são eficazes. Aqui, ainda o processo legislativo não está
concluído.
De acordo com o Art. 278º da CRP, a fiscalização preventiva pode abranger disposições
constantes de tratado e acordo internacional e de acto legislativo.
50
JOSÉ DE MATOS CORREIA, Introdução ao Direito Processual Constitucional, Lisboa, 2011, pp. 63-
84.
51
JOSÉ DE MATOS CORREIA, op. cit., pp. 91-113.
A iniciativa de desencadear o processo de fiscalização preventiva cabe, por regra, ao PR
(Art. 278º/1 CRP), ou ao Representante da República para as Regiões Autónomas (Art.
278º/2 CRP).
Esta actuação tem lugar na fase final do processo, em regra, do processo legislativo
parlamentar, antes da promulgação dos actos legislativos.
Aqui, a CRP não estabelece qualquer prazo para o veto jurídico, aplicando-se,
analogicamente, o Art. 136º/1/4, que estabelece o prazo de vinte dias para a lei e
quarenta dias para decreto-lei do Governo.
Este tipo de fiscalização incide sobre actos já concluídos e adoptados. Tem por objecto
normas jurídicas perfeitas.
52
JOSÉ DE MATOS CORREIA, op. cit., pp. 115-138.
efeitos directamente por ela produzidos, como os efeitos dos actos ao abrigo dela
praticados (Ex. Negócio Jurídico).
Não obstante, estatui o Art. 282º/3 que ficam ressalvados os casos julgados
(insusceptibilidade de uma decisão ser objecto de recurso).
As decisões judiciais que não sejam passíveis de recurso ordinário não são objecto de
retroactividade.
No entanto, admite-se uma excepção, no que respeita aos casos em matéria de domínio
penal. O caso pode ser reaberto, desde que da declaração da inconstitucionalidade
resulte benefício para o arguido (redução de pena) e que essa decisão decorra do TC
explicitada e fundamentada (Art. 29º/4 CRP – Princípio da Retroactividade da Lei
Penal).
53
JOSÉ DE MATOS CORREIA, op. cit., pp. 139-178.
Sobrevém num processo, que tem por finalidade decidir sobre uma determinada
situação controvertida e não sobre a inconstitucionalidade de uma norma. É como que
um incidente no decorrer do processo.
Podemos identificar quatro tipos de decisões que irão dar fundamento a recurso de
constitucionalidade:
Decisões Negativas de Ilegalidade – Art. 280º/2 al.d. CRP – o tribunal recorrido aplica
a norma proveniente dos actos já produzidos, cuja legalidade haja sido suscitada.
O recurso não pode ser utilizado para solicitar ao TC a pronuncia sobre o conteúdo
material da decisão tomada pelo tribunal “a quo”. O recurso deve ater-se apenas à
questão da constitucionalidade/legalidade da norma em causa. O TC está vinculado à
decisão judicial recorrida.
A decisão do TC, em sede de fiscalização sucessiva concreta, pode ser de dois tipos:
No caso de provimento, os autos devem baixar ao tribunal “a quo”, para que este
reformule a sua decisão em função do acórdão do TC.
Visa a apreciação do não cumprimento das normas da CRP por ausência de medidas
legislativas necessárias para lhes dar exequibilidade (Art. 283º/1 CRP).
54
JOSÉ DE MATOS CORREIA, op. cit., pp. 179-184.