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Universidade Federal do Rio Grande do Sul/UFRGS


Organização da Escola Básica
Ficha de Leitura 01: Movimentos Históricos da Escolarização
Texto: Jorge Alberto Rosa Ribeiro – Movimentos Históricos da Escolarização – In:
Inclusão e Escolarização: Múltiplas Perspectivas; Org. Baptista, Claudio Roberto. 1º
Edição, Mediação Editora, 2006, p. 53-71.
Aluno: Ricardo Antônio Oliveira Bonzanini
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Momentos Históricos da Escolarização procura debater alguns


questionamentos à respeito do processo histórico e evolutivo da escolarização na
civilização ocidental, através da análise do “problema da continuidade e evolução da
escola” (p.53) e “o que fez com que o fenômeno da escolarização se orientasse para a
universalização do acesso à escola” (p.53). Escolarização “diz respeito ao complexo
processo que envolve aspectos relacionados com a instituição escolar: a que é oferecida,
qual a sua função, sua organização, seu currículo, a tecnologia a sua disposição (livros,
recursos materiais utilizados para a escrita, entre outros), a forma e o princípio das ações
pedagógicas desenvolvidas em seu interior, o sistema escolar (se é constituído ou não),
entre outros, inclui os saberes culturais associados a determinados grupos profissionais
e a transformação destes em disciplinas escolares” (p.53).

Ribeiro realiza uma descrição pormenorizada das etapas de evolução dos


processos de ensino e escolarização, utilizando como divisão o Modo de Escolarização
Feudal; Modo de Escolarização Moderno e o Modo de Escolarização Contemporâneo.
No modo de escolarização feudal, segundo o autor, a escola não era importante. “Toda a
transmissão social e cultural, que incluía os aprendizados de atividades produtivas, das
artes do trabalho no campo e na cidade, se dava por meio da convivência e da
oralidade” (p.56). “O aprendizado dos ofícios corporativos estava distante de uma
possível escola e, no meio rural, onde vivia a grande maioria da população no século
XV, aprendia-se o trabalho com sua própria linhagem, com sua família, com os seus
pares, parentes. Essa forma de socialização foi responsável pela pequena necessidade de
escola nessa sociedade” (p.56).

A escolarização era oferecida para uma pequena fração da população. “O


ingresso na escola e mesmo nas faculdades de artes ocorria a partir dos 10 anos de idade
(Ariés, 1986, p.175-6), mas o aspecto marcante era a mistura das idades e mesmo da
origem social dos alunos nos espaços escolares. Era comum encontrarem-se meninos de
10-14 anos na mesma sala com rapazes de 19-25 anos. Não era comum as meninas
freqüentarem escolas e, o mais comum, era terem seu acesso à universidade impedido”
(p.57). Nesse período o que se verificava era uma “forte importância da oralidade;
ausência de um espaço infantil para as crianças; a infância ainda não tinha sido
descoberta” (p.57). “A relação professor-aluno era direta (...) nesse sentido, a instrução
implicava uma relação individualizada, não se observando aqui, como sistemática da
organização escolar, a classe ou a turma. Em virtude desta relação tutorial o tempo de
educação dos jovens não estava previamente definido” (p.57).
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No modo de escolarização moderno “a luta religiosa gerou a necessidade de os


adolescentes e das crianças serem envolvidos em um processo de escolarização. A
escolarização, que até o século XVI era restrita, como vimos, aos grupos profissionais,
envolveu novas frações sociais, grande parte recém-chegada às cidades. O movimento
reformista gerou a necessidade de formar bons cristãos para as igrejas que se
degladiavam. O ensinamento religioso e a formação catequética foram estimulados. (...)
O espaço escolar com prédio, sala de aula, dormitório, refeitório, entre outros, traduzia
não só uma nova estética, mas uma nova convivência e um novo disciplinamento
adequados, inclusive, para a sociedade que fez florescer a institucionalização.(...)
Método, autoridade e disciplina social orientaram o currículo (...) e a pretensão de
organizar, de forma enciclopédica e universalística, todo o conhecimento” (p. 58-59).

“O tempo ganhou no ambiente escolar uma nova importância. Desde a


segregação que ele induz na separação de adolescentes por idade, passando pela
organização das atividades por horas, estruturando e distribuindo conteúdos escolares
por séries e graus, pressuposto de gradação metodológica, as dimensões do tempo foram
apropriadas pelo novo modo de escolarização. (...) Espaço, tempo e o livro, aliados ao
método, à disciplina e à autoridade, sintetizaram e centralizaram os campos do novo
modo de promover a socialização e a regulação social” (p.59).

Foi nesse período que a relação entre professor e aluno é alterada, a figura do
tutor deixa de existir nas escolas e agora o professor é responsável por uma classe de 20
a 30 alunos. O colégio “antes de ser uma organização pedagógica foi uma organização
administrativa. Estava mais preocupada em viabilizar esse processo de receber e atender
grande número de pessoas. Ou seja, aqui está começando o nascimento da educação
escolarizada moderna. (...). Os que eram formados pelo colégio rumavam aos estudos
superiores. Os colégios, no entanto, não formavam para nenhuma profissão específica.”
(p.60-61).

Após fazer um breve apanhado do surgimento do colégio no período moderno,


Ribeiro discorre a respeito da educação fundamental nesse período: “(...) essa escola
elementar foi estruturada de maneira dual. Ou seja, uma escola elementar que herda a
tradição da “escola elementar latina”, muitas delas incorporadas ao colégio, e uma nova
intitulada de “escola elementar de caridade”, preocupada com a língua vernácula, com o
ler, escrever, contar, com uma formação moral cristã e um disciplinamento capaz de
fazer seus alunos trabalharem com “lealdade”” (p.62). Segundo Ribeiro, o “dualismo
sustentava dois tipos de trajetórias sociais, a da “gente graúda” e a do “povo miúdo””
(p.62). “Por que surgiu a necessidade de atender crianças órfãs e empobrecidas com
escolas? Uma parte da resposta estava relacionada ao medo do populacho e de suas
possíveis revoltas. Nesse sentido, educá-los seria uma maneira de integrá-los,
amansando-os e afastando-os da ociosidade. Outra (...) ao processo de intervenção
pública sobre crianças pobres, sobre mendicância, sobre os sem-trabalho. O século
XVII foi exemplar no tocante à imposição do trabalho, mal pago e brutal, por meio de
um conjunto legal conhecido como a “lei dos pobres”. Significativa parcela da
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população adolescente foi enquadrada nessa legislação e obrigada a trabalhar na


manufatura, na mineração e na navegação” (p.62).

Nesse período, transformações econômicas importantes estavam acontecendo no


interior da sociedade, o sistema capitalista estava se formando, essas transformações
podem ser interpretadas através do processo de “transformação da produção artesanal de
caráter medieval para uma estrutura manufatureira de produção (...) surgindo, em um
processo de transformação histórica muito importante, a figura do trabalhador
assalariado ou operário. Aquele que faz uma operação, que não faz todo um processo de
produção, que faz uma parte desta. O declínio do aprendizado corporativo coincide com
este novo sujeito social” (p.63).

No período de formação do modo de escolarização contemporâneo o que se verificava


era uma crise do modelo de colégio institucionalizado no período moderno, Ribeiro
indica quais as prováveis razões para que isso ocorresse: “No século XVIII, já se
duvidava do latim como a base exclusiva da construção racional da língua e da lógica.
As línguas modernas eram tão ou mais eficazes nesta pretensão. Os avançados passos à
revolução industrial requeriam abrir-se ao novo, quer do ponto de vista metodológico,
aprender não só pela “palavra”, mas pelas “coisas”. O currículo escolar, que
compreendia todo o trabalho da escola, foi, no século seguinte, objeto de transformação
em disciplinas curriculares. (...) O currículo passava a designar as disciplinas de forma
autônoma” (p.64).

“A criação da escola elementar única (...) veio associada a, pelo menos, dois
movimentos. O primeiro com a manifesta intervenção do Estado no oferecimento desta
escola, O segundo, relacionado às forças sociais e políticas, especialmente ao
proletariado industrial e ao movimento socialista, que defendiam o direito à escola e
abominavam o acesso à escola como uma caridade” (p.64). “O Estado, por sua vez, vem
sendo analisado e problematizado no que diz respeito às possíveis razões do
oferecimento da educação escolar” (p.64). Através do ingresso do Estado na educação
escolar o que pode ser verificado é uma disputa entre Igreja e Estado por esse espaço
que até pouco tempo atrás era dominado pela Igreja, através da entrada do Estado no
processo de formação escolar o que se verificou foi uma laicização e a democratização
do ensino. “Se a estatalidade, a laicidade, a gratuidade e a universalidade foram aspectos
decisivos para compreender as particularidades do modo de escolarização
contemporâneo, eles não estavam sozinhos. Pelo menos outros três aspectos devem ser
comentados para compreender as distinções quanto ao conteúdo, aos métodos e à
natureza da escolarização contemporânea em relação aos outros modos de
escolarização” (p.66). “O primeiro aspecto, conteúdo, esteve pautado pela renovação
cultural do século XIX. Esta implicou que as escolas tivessem um conteúdo único
nacional que incorporava, gradativamente, o desenvolvimento da ciência ou das várias
ciências. As escolas infantis, por sua vez, passaram a dar grande espaço ao trabalho, à
atividade autônoma da criança, seja sob a forma de jogo, seja na forma de trabalho
manual. (...) O segundo aspecto, mais próximo ao método adequado ao novo modo de
escolarização, diz respeito à introdução da temática do trabalho na escola. (...) observa-
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se a criação da instrução profissional pela via escolar” (p.67). “Por fim, o terceiro
aspecto vem na esteira das anteriores. No final do século XIX, com o avanço da
pesquisa e do desenvolvimento da psicologia, esta disciplina científica passou a dar uma
forte contribuição na discussão de como as crianças aprendem e se desenvolvem. (...)
No último decênio do século XIX, uma parte da psicologia acompanhou a experiência
da difusão da escola nova, também chamada de escola ativa” (p.68).

“O surgimento desta proposta de escolarização (...) provocou debates e muitas críticas


ao escola-novismo, que, com o seu caráter de movimento internacional de uma nova
orientação organizacional, metodológica e de política escolar, ameaçava “todos” os
sistemas escolares” (p.68).

Ribeiro afirma que “o modo contemporâneo de escolarização vem sendo colocado em


xeque. Não só pelas enormes dificuldades para fazer com que ele realmente se efetive,
haja vista a crise financeira dos Estados e a redução dos gastos em educação em vários
países, inclusive desenvolvidos. Mas também pelo conjunto de transformações que, no
final do século XX, a sociedade vem sofrendo e que, na perplexidade em dar alguma
resposta positiva, acaba por expor a própria crise do sistema educacional” (p.69).

Ao final do ensaio, Ribeiro apresenta vários questionamentos a respeito do que


podemos esperar da escola e do seu papel e sua análise carece de uma reflexão mais
aprofundada, que devemos fazer em sala de aula. No que me diz respeito transcrevo
abaixo os pontos mais importantes: “Por fim, qual o propósito da escola? O mercado de
trabalho? Dada as atuais transformações ocorridas nos sistemas produtivos que têm
tornado imprevisível o mercado de trabalho, qual o novo propósito da escola? Oferecer
aos alunos uma educação genérica preparatória para a ciência superior na vida madura?
Manter a pretensão virtuosa da educação geral, formando o cidadão culto ideal? Ou a
aprendizagem escolar deveria ser organizada em torno da imagem de um hipertexto
aberto, com a tecnologia da informação favorecendo atalhos entre diferentes tópicos? É
claro que seria pertinente perguntar-se, como Hamilton, pelo propósito de cada uma
destas possibilidades?” (p.70).

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