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FACULDADE VERDE NORTE - FAVENORTE

FISIOTERAPIA
UNIDADE 1
FUNDAMENTOS, HISTÓRIA E EVOLUÇÃO DA FISIOTERAPIA
TÓPICO 1

AS MODIFICAÇÕES NA CONCEPÇÃO DO OBJETO DE


TRABALHO E A FISIOTERAPIA NOS DIFERENTES MOMENTOS
DE SUA CONSTITUIÇÃO

1 INTRODUÇÃO

Neste primeiro tópico, a abordagem será sobre as modificações que ocor-


reram em relação ao objeto de trabalho e em relação à Fisioterapia. O conheci-
mento dessas modificações vividas em diferentes períodos da História permitirá
que você tenha condições de entender como foi o período, as descobertas, as difi-
culdades, os avanços, enfim, a evolução de toda a trajetória até a atualidade.

Situações relatadas na História farão você, leitor, compreender que todas


as fases foram de extrema importância a nível social, cultural, humano, político
e econômico. Houve progressos em diversas áreas e claro que junto com todo o
progresso também se têm efeitos “colaterais”.

A trajetória histórica a seguir conduzirá você a uma aproximação desses


aspectos, principalmente levará a perceber como a Fisioterapia foi pouco a pouco
sendo vista como Ciência, como profissão regulamentada, tendo o respeito e a
valorização que se busca manter até o atual momento.

A linha cronológica representada pelas Figuras 1 e 2, a seguir, foram dis-


ponibilizadas ao leitor para melhor visualização dos períodos da História, faci-
litando o entendimento acerca do surgimento das civilizações, do modo como
viviam, do que se alimentavam, como era o uso dos recursos naturais, as desco-
bertas, os avanços, o surgimento das moléstias, a influência da arte e da cultura
sobre a vida, dentre tantas outras percepções. Vamos começar? Bons estudos!

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FIGURA 1 – TRAJETÓRIA HISTÓRICA DA HUMANIDADE

FONTE: <https://images.app.goo.gl/SST2T51ycjxogXBu8>. Acesso em: 5 jul. 2019.

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FIGURA 2 – TRAJETÓRIA HISTÓRICA DA HUMANIDADE

FONTE: <https://images.app.goo.gl/FQ5CYQqyerdtdi6A9>. Acesso em: 5 jul. de 2019.

2 A ANTIGUIDADE E O TRATAMENTO DE DESORDENS FÍSICAS


ATRAVÉS DA UTILIZAÇÃO DE AGENTES FÍSICOS
Os primeiros registros, que sem tem acesso, sobre a utilização de agentes fí-
sicos com finalidades terapêuticas vêm da China e são datados no ano de 2.698 a.C.,
especialmente por meio da prática de exercícios. Em todo o período que compreen-
deu a Antiguidade, porém, há descrições acerca dos banhos de sol, do uso das águas
termais e das massagens como formas medicinais de tratamento (GAVA, 2004).
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FIGURA 3 – REGISTROS DE ANTIGAS CIVILIZAÇÕES QUE JÁ UTILIZAVAM A MASSAGEM COMO


FORMA DE BEM-ESTAR

FONTE: <http://bit.ly/37WCSut>. Acesso em: 5 jul. 2019.

Há indícios de que a Fisioterapia surgiu quando o homem pré-histórico, para


aliviar a dor por traumatismos, esfregava a mão no local atingido de forma instintiva
e, assim, estava realizando, mesmo que nos primórdios, a técnica hoje conhecida como
Massoterapia. Na época, era utilizado o movimento de deslizamento (esfregar). Anos
mais tarde somou-se ao deslizamento outros movimentos clássicos como vibração,
percussão, amassamento, rolamento, pinçamento, entre outros (KURBAN, 2005).

Inicialmente o uso da ginástica era exclusividade dos sacerdotes que a utiliza-


vam com finalidades terapêuticas. Mais adiante, na Idade Média, o clero (representado
pelos sacerdotes) como detentor do poder entendeu que os fenômenos naturais seriam
causados por interferência divina e se fossem eventos negativos, como as desordens
físicas, seria por atuação demoníaca. Assim, caberia ao clero o uso do exercício para
exorcizar os “demônios” em alguns membros da sociedade (GALVAN, 1998).

Na mesma época, na Índia, utilizavam-se exercícios respiratórios para evitar a


constipação intestinal. Na era cristã, por intermédio de sacerdotes, os movimentos do
corpo eram racionalizados e planejados como ginástica para o tratamento de disfun-
ções orgânicas já estabelecidas (CARVALHO et al., 2014).

A preocupação com as diferenças incômodas promoveu a utilização de recur-


sos, técnicas e procedimentos que as eliminassem. Há registros de exercícios e do uso
do peixe elétrico como agentes físicos para eliminar as morbidades que assolavam a
humanidade naquela época (REBELATTO; BOTOME, 1999).

Os fundamentos da Eletroterapia estão amparados numa longa trajetó-


ria do emprego da corrente elétrica com fins terapêuticos, mesmo nos
remotos tempos em que os reais efeitos dessa energia eram desconhe-
cidos dos seus adeptos. Podemos começar a ilustrar o uso da corrente
elétrica de forma muito natural, onde o agente gerador nada mais era
que um peixe capaz de produzir uma desacarga efetiva relatada como
analgésica. Esse fato faz referência a Galeno (+/- 130 a.C) e ao médico
Scribonius Largus (+/- 50 d.C) os quais indicavam aos seus pacientes por-
tadores de gota. Entre as espécies mais citadas temos a arraia elétrica
da família Torpedinidae por isso conhecido como peixe torpedo, o peixe
“gato” da família Malapteruridae, o bagre elétrico do Congo e Nilo clas-
sificado como Malapterus electricus (AGNE, 2013, p. 11).

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FIGURA 4 – PEIXE ELÉTRICO

FONTE: <http://bit.ly/2LgddmS>. Acesso em: 5 de jul. 2019.

No século X a.C., o médico romano Scribonuius Largo utilizava as enguias


para tratar os pacientes com doenças da mente enquanto que Antero, um nobre
romano, ao caminnar pela praia de forma acidental pisou em um peixe elétrico,
vindo, assim, a descobrir a corrente elétrica como meio de aliviar a dor. Mais tarde,
a Eletroterapia foi sendo estudada e conhecidas as suas particularidades e os seus
benefícios (KURBAN, 2005).

A palavra Fisioterapia tem sua origem no grego (physis: natureza; therapeia:


tratamento) e suas raízes estão na Antiguidade no período compreendido entre
4.000 a.C. a 395 d.C., época em que os médicos já tinham o conhecimento sobre os
agentes físicos, entre eles o sol, a luz, o calor, a água e a eletricidade. Esses recursos
serviam para eliminar as morbidades que assolavam a humanidade naquela época
(CARVALHO et al., 2014).

O uso da água com finalidades terapêuticas também começou na Antigui-


dade, com Hipócrates, um dos pioneiros na sua utilização, e com os romanos e suas
famosas casas de banho. Mas, somente no final do século passado e começo des-
te, o efetivo emprego da água em seus diferentes estados e temperaturas passou a
ser utilizado com finalidade dietética, profilática e terapêutica. Nomes como Floyer,
Hahn, Einternitz, Kneipp são responsáveis pelo início das duchas, saunas, piscinas
terapêuticas, walking tank, turbilhões e equipamentos hoje indispensáveis nas clíni-
cas de reabilitação. Os povos primitivos também conheciam os efeitos curativos da
Helioterapia, pois adoravam expor-se ao Sol. Os romanos foram os primeiros a cons-
truir um sollarium para a prática curativa através da radiação natural. Mas somente
em meados do século passado, a investigação e o fomento da Helioterapia permiti-
ram que, em Zurich (Alemanha), fosse construído o primeiro Intituto da Luz, para
o tratamento da tuberculose cutânea. Hoje a Fisioterapia utiliza a fototerapia para o
tratamento de inúmeras patologias, através de dispositivos como o infravermelho, o
ultravioleta e o raio laser (KURBAN, 2005).

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FIGURA 5 – TERMAS ROMANAS

FONTE: <http://bit.ly/37XxIOT>. Acesso em: 5 de jul. 2019.

Desde o seu surgimento, não existiu na Fisioterapia um objeto de estudo ou


de intervenção claramente definido. O que confusamente foi considerado objeto de
trabalho da Fisioterapia desenvolveu-se por caminhos diversos que dariam sentido
e autonomia à Fisioterapia como área de conhecimento, de estudo ou como profis-
são (REBELATTO; BOTOME, 1999).

2.1 DEFINIÇÃO DE DESORDENS FÍSICAS


Na Antiguidade, o olhar era voltado às pessoas que possuíam as chama-
das diferenças incômodas. Esse termo, de forma equivalente, poderia ser utiliza-
do para definir as desordens físicas ou doenças em nossa atualidade (REBELAT-
TO; BOTOME, 1999).

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FIGURA 6 – A SÍNDROME DE DOWN APARECE DOCUMENTADA NA HISTÓRIA, PELO PINTOR


RENASCENTISTA ANDREA MANTEGNA (1431 – 1506)

FONTE: <http://bit.ly/2P5BblP>. Acesso em: 5 de jul. 2019.

A preocupação estava em como eliminar essas alterações, e os médicos


desse período conheciam e já utilizavam os recursos físicos, como a eletroterapia
sob a forma de descargas elétricas, por meio do peixe elétrico, para tratar doenças
com fins analgésicos e os exercícios sob a forma de ginástica.

2.2 QUAIS ERAM OS TIPOS DE DESORDENS FÍSICAS


Não há registros claros de quais eram especificamente essas desordens físi-
cas, ou as ditas diferenças incômodas. Se formos pela linha de pensamento, o que
diferente é aquilo que “foge dos padrões e da normalidade” as desordens físicas
poderiam, comparativamente, ser definidas atualmente como todas as alterações fí-
sicas: os devios posturais (escoliose, hipercifose torácica e hiperlorode lombar), as
alterações de pé (pé cavo ou pé plano) e de pisada (supinada ou pronada), as defor-
midades e alterações ósseas (dedo em martelo, dedo em pescoço de cisne, joelhos va-
ros ou valgos), as deformidades de caixa torácica decorrente de doenças respiratórias
como as DPOC (Doença Pulmonar Obstrutiva Crôncia), entre outras alterações que
causassem dor ou desconforto, levando o indivíduo a não ser visto como uma pessoa
“normal” pela sociedade.

2.3 QUAIS OS TIPOS DE AGENTES FÍSICOS UTILIZADOS


NOS TRATAMENTOS DAS DESORDENS FÍSICAS
No ano de 2.698 a.C. o imperador chinês Hoong-Ti criou um tipo de ginásti-
ca curativa que continha exercícios respiratórios e exercícios para evitar a obstrução
de órgãos (REBELATTO; BOTOME, 1999). Lindemann (1970) citado por Rebelatto
e Botome (1999), afirma que Galeno (130 a 199 d.C.) informou que conseguiu, por
meio de uma ginástica planificada de tronco e dos pulmões, corrigir o tórax defor-
mado de um rapaz até lograr condições normais.
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FIGURA 7 – CLÁUDIO GALENO (130 – 200 D.C.)

FONTE: <http://bit.ly/2DrtZv7>. Acesso em 5 jul. 2019.

FIGURA 8 – O BADUANJIN, UMA DAS FORMAS DO CHI KUNG EM UM MANUAL DA DINASTIA


QING

FONTE: <http://bit.ly/2Oiq3CO>. Acesso em 5 de jul. 2019.

Percebe-se, através de registros da época, que os médicos conheciam os


agentes físicos e os utilizavam como forma de tratamento de morbidades. A ênfa-
se estava na ação de tratar, e eram prescritos os banhos de sol e as saunas, o que
hoje seria a Termoterapia; as descargas elétricas do peixe elétrico, a Eletroterapia
de hoje; além da utilização de movimentos corporais racionalizados e planejados,
que hoje, dentro da Fisioterapia, podem ser entendidos como a Cinesioterapia, a
Reeducação Postural Global (RPG) e o Pilates.

Todas as informações trazidas anteriormente nos remetem para uma prá-


tica com poucas ou nenhuma evidência científica, ou seja, o emprego de métodos
e técnicas sem atribuição à Ciência, mas que eram utilizados com finalidades de

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tratamento na doença instalada, perceptível e incômoda. O olhar era apenas cura-


tivo e não havia o enfoque preventivo.

3 A IDADE MÉDIA E O OLHAR PARA AS DESORDENS FÍSICAS


Na Idade Média surge a concepção de uma ordem social estabelecida no plano
divino em que os homens se organizavam hierarquicamente: clero (detentor do poder),
nobreza (guerreiros) e camadas populares (força braçal) (CARVALHO et al., 2014).

FIGURA 9 - SOCIEDADE ESTRATIFICADA E DIFERENÇAS SOCIAIS NA IDADE MÉDIA

FONTE: <https://images.app.goo.gl/RuChDtLmmAbqZABu8>. Acesso em: 5 jul. 2019.

Nesse período da História, compreendido entre os séculos IV a XV, a vi-


são sobre as diferenças incômodas estava modificando e os estudos iniciados na
Antiguidade, a respeito do emprego dos agentes físicos nas desordens físicas,
estavam sendo interrompidos. Isso se deu por dois motivos: a mudança na con-
cepção do que era desordem física e a visão do corpo humano, bem como pela
organização da sociedade. Aqui as desordens físicas ou as diferenças incômodas
precisavam ser “exorcizadas” (REBELATTO; BOTOME, 1999).

3.1 A ORGANIZAÇÃO DA SOCIEDADE EM CAMADAS


Na Idade Média a organização da sociedade acontecia de forma hierár-
quica representada pelo clero, o qual detinha o poder, pela nobreza que guerrea-
va e, por fim, pelas camadas populares que realizavam o serviço através da força
física (braçal). Além disso, havia uma organização providencial e uma ordem so-
cial estabelecida pelo plano divino (GALVAN, 1998).

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3.2 A FÉ X O CORPO FÍSICO


As camadas hierárquicas tinham dentro desse aspecto organizacional direi-
tos e deveres estabelecidos por uma ordem: a divina. Enquanto os camponeses traba-
lhavam, a nobreza participava de guerras e o clero executava o serviço divino. A fé,
nessa época, era vista como algo imprescindível ao homem, fazendo o clero ter um
poder decisivo nas escolhas da sociedade.

Na época chamada de Idade Média o corpo era apenas um recipiente. O


valor estava voltado para os conceitos religiosos do período que cultuava a alma
e o espírito (GALVAN, 1998).

Com toda essa organização social em camadas (cada qual com suas fun-
ções específicas e o forte papel do clero e da fé do homem) percebe-se que as
diferenças incômodas ou as desordens físicas têm correlação com o jeito de viver
dessa hierarquia. O exterior refletia o interior, ou seja, se o homem de determi-
nada classe dentro de suas atribuições “fugisse” dos padrões organizacionais, ou
mesmo se o seu lado religioso estivesse comprometido por falta de fé, sua desor-
dem física ocorria por influência demoníaca, ou seja, o que acontecia por fora era
ocasionado por aquilo que trazia por dentro.

Diferente do que ocorria na Antiguidade, como forma de tratamento atra-


vés da atividade física, o exercício físico na Idade Média era feito com propósitos
diferentes: os nobres o faziam para melhor se defender nas lutas e proteger os bens,
já a camada popular fazia exercício como uma forma barata de lazer. Nessa época,
os hospitais localizavam-se dentro de mosteiros e as enfermarias ficavam ao lado de
capelas.

FIGURA 10 – PRÁTICA DE ESGRIMA AJUDA NA SOBREVIVÊNCIA E MELHORA O DESEMPENHO


NAS GUERRAS

FONTE: <https://images.app.goo.gl/8gHY8So2oVEDDUpS9>. Acesso em 5 de jul. 2019.

4 O RENASCIMENTO E A PREOCUPAÇÃO COM O CORPO


O período do Renascimento, inicialmente ocorrido na Itália e mais tarde
difundido por toda a Europa, foi marcado por um crescente nas áreas da arqui-

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tetura, escultura, pintura, decoração, literatura, música e política (REBELATTO;


BOTOME, 1999).

FIGURA 11 - RENASCIMENTO, MOVIMENTO INTELECTUAL CUJO AUGE OCORREU NA ITÁLIA


NOS SÉCULOS XV E XVI

FONTE: <https://images.app.goo.gl/QPbzmfibmc28rfpw7>. Acesso em 5 de jul. 2019.

4.1 A RETOMADA DO OLHAR AO CORPO FÍSICO


Foi no período do Renascimento que começou a retomada dos estudos
sobre o corpo humano e o culto ao exterior (físico) (GALVAN, 1998).

O Renascimento é um período compreendido entre os séculos XV e XVI


e é descrito como um momento de crescimento científico e literário por meio do
Humanismo e das Artes. Há a retomada dos estudos na área da saúde como uma
concepção curativa e de manutenção do estado normal existente em indivíduos
sãos. A atividade física passa a servir então para a manutenção da saúde, trata-
mento de enfermidades, reeducação de convalescentes e correção de deformida-
des (CARVALHO et al., 2014).

FIGURA 12 – RENASCIMENTO

FONTE: <http://bit.ly/2P3Gt1f>. Acesso em: 5 de jul. 2019.


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4.2 FATOS MARCANTES DO MOVIMENTO LITERÁRIO E


ARTÍSTICO
O homem dessa época teve seu interesse voltado ao mundo que o cercava
e passou a ter mais liberdade de expressão.

A beleza física do homem, de modo geral, passou a ser mais valorizada


e os valores morais da Idade Média, que eram cobrados pelo clero, começaram
a decair. A independência ganhou visibilidade, surgiram as universidades e as
pessoas que as buscavam ansiavam pela compreensão do mundo e pela busca de
conhecimento.

O movimento literário e a arte foram expressos através do naturalismo e


isso ocorreu justamente pela queda das restrições estabelecidas na Idade Média.

O humanismo e as artes passaram a se desenvolver fazendo com que os


estudos sobre o corpo, iniciados na Antiguidade e abandonados na Idade Média,
fossem retomados. Tal atitude se deu pela necessidade de cuidado com o corpo,
marcado pelo culto ao físico.

Pode-se observar que a mentalidade de cuidado com o corpo não era diri-
gida apenas ao tratamento ou cuidados com as situações já instaladas, mas havia
a preocupação com a manutenção das condições existentes em organismos sãos.
Fica claro aqui a mudança de visão do conceito de saúde: enfoque curativo x en-
foque preventivo.

4.3 A RELAÇÃO DAS DESORDENS FÍSICAS COM O CORPO


SÃO E A PRÁTICA DE EXERCÍCIOS
Foi no final do período do Renascimento que o interesse pela saúde corporal
começou a se tornar mais específico. Ao fim de 1550, o movimento renascentista na
Itália começa a declinar, entretanto em países como Alemanha, França e Inglaterra,
isso não ocorreu. Nesses três países, os estudos e trabalhos foram se solidificando.

Um estudo publicado pela Sociedade Médica de Berlim, em 1864, relata


que a prática de exercícios físicos para pessoas enfermas deveria ser distinta dos
executados em pessoas sãs. O texto traz alguns trechos como: “os enfermos e
aqueles cuja coluna vertebral sofre deformidades ou alterações posturais de om-
bros e cadeiras, correspondem às salas de cura e não às lições de ginástica para
sãos”. Essa publicação mostra a mudança na forma de praticar a atenção com a
saúde das pessoas, contribuição importantíssima para identificar o objeto de tra-
balho da Fisioterapia, que dava passos lentos para mais tarde tornar-se profissão.

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5 A INDUSTRIALIZAÇÃO, O SURGIMENTO DE DOENÇAS E


DAS ESPECIALIDADES MÉDICAS
Na Revolução Industrial ocorreu uma transformação social determinada
pela produção em larga escala. O desenvolvimento das cidades produziu condições
sanitárias precárias, jornadas de trabalho estafantes e condições alimentares insatisfa-
tórias que provocou a proliferação de novas doenças (CARVALHO et al., 2014).

FIGURA 13 – MULHERES TRABALHANDO EM MÁQUINAS TÊXTEIS, INSPECIONANDO FIOS, NA


AMERICAN WOOLEN COMPANY, BOSTON (1910)

FONTE: <http://bit.ly/2QBfH2x>. Acesso em: 5 de jul. 2019.

5.1 DEFINIÇÃO DO NOVO PROCESSO FABRIL


O período entre os séculos XVIII e XIX foi historicamente caracterizado por
uma transformação social na Inglaterra. Foi uma época determinada pela produção
em larga escala, através do processo de mecanização e do trabalho operário, o cha-
mado modelo fabril (REBELATTO; BOTOME, 1999).

O processo de Industrialização foi uma época de transformação social em


que as diferenças incômodas voltam a despertar o interesse dos estudiosos, assim
como o encaminhamento para o surgimento das especialidades e seus tratamentos
(GALVAN, 1998).

5.2 O SURGIMENTO DE PROBLEMAS DE SAÚDE


RELACIONADOS À INDUSTRIALIZAÇÃO
Embora a industrialização fosse uma forma de otimizar a produção de
bens e de serviços, tornando-os mais acessíveis a todos, sua formação contribuiu
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para um período histórico e social em que predominou a divisão da sociedade em


classes sociais bem definidas.

As pessoas com maior poder aquisitivo eram donas das terras e o povo era
dono de sua força de trabalho. A obtenção de lucros tornou-se uma obsessão para os
que controlavam a sociedade e a população de baixa renda pagava o preço para esse
crescimento.

Nos ambientes de trabalho dentro da indústria era comum a violência exer-


cida pelos chefes e mestres contra os trabalhadores. As vítimas dessa violência eram
mulheres e crianças que sofriam desde multas, castigos corporais, até brutalidade
explícita (KURBAN, 2005).

Ao passo que a industrialização ia se instalando, o ritmo de trabalho aumen-


tava e muitos trabalhadores perdiam os seus empregos. Os camponeses migravam
das áreas rurais e se fixavam ao redor das cidades.

As pesquisas eram voltadas para o aperfeiçoamento de máquinas para me-


lhorar a performance do sistema de produção e mais tarde, trazer soluções para os
diversos problemas oriundos do próprio processo de industrialização como por
exemplo, os acidentes de trabalho.

O processo de industrialização, além dos acidentes de trabalho, trouxe pro-


blemas relacionados às condições sanitárias da época, bem como as extensas e can-
sativas jornadas de trabalho, as quais não eram diferenciadas por sexo nem idade
(jornadas chegavam a 16 horas diárias). Houve epidemias de cólera e de tuberculose,
além do forte hábito do uso de álcool.

Tanto nas indústrias têxteis como nas chapelarias as condições de trabalho


eram insatisfatórias e não havia água potável, iluminação e ventilação adequadas.
As máquinas não tinham proteção e suas engrenagens e correias ficavam muito pró-
ximas aos trabalhadores, além da disposição das mesmas não ser apropriada, pois
ficavam em corredores apertados, dificultando a locomoção das pessoas que ainda
inalavam poeira e muitos resíduos (KURBAN, 2005).

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FIGURA 14 – O JOVEM RAOUL JULIEN TRABALHANDO EM CHACE COTTON MILL,


BURLINGTON, VERMONT, EM 1909

FONTE: <http://bit.ly/3490Cco>. Acesso em: 5 de jul. 2019.

FIGURA 15 – CRIANÇAS TRABALHANDO NAS FÁBRICAS DURANTE A INDUSTRIALIZAÇÃO

FONTE: <http://bit.ly/2O5ItH6> Acesso em: 5 de jul. 2019.

As classes sociais dominantes tinham suas atenções voltadas ao sistema pro-


dutivo e às atividades que geravam lucros por meio do uso do trabalho da população
operária. A preocupação dessas classes dominantes era não perder ou diminuir a fonte
de ganhos gerados pela classe econômica mais baixa e socialmente dominada. Para a
classe dominante não interessava como a classe dominada vivia e sim, apenas tratar as
doenças quando as condições de saúde prejudicassem a produção e os ganhos.

Fora da indústria, as condições de vida não eram muito diferentes, pois


essa mão de obra não especializada era basicamente formada por escravos livres
e imigrantes italianos. Alguns, com mais sorte pelo bom comportamento e alta
produtividade, conseguiam morar em vilas operárias junto às fábricas, com uma

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infraestrutura mais adequada de subsistência. Outros, entretanto, acabavam mo-


rando em cortiços ou favelas, onde as condições de higiene e salubridade eram
péssimas. Sem poder reverter esse quadro, devido aos baixíssimos salários e uma
grande concorrência, essa população padecia miseravelmente (KURBAN, 2005).

FIGURA 16 – PATRÃO E CLASSE OPERÁRIA

FONTE: <http://bit.ly/2Orz3oa>. Acesso em: 5 de jul. 2019.

5.3 A DESCOBERTA DE NOVOS MÉTODOS DE TRATAMENTO


DAS DOENÇAS E DE SUAS SEQUELAS
O abuso da exploração até os limites das possibilidades de vida dos operá-
rios e camponeses fazia explodir as “patologias” que desconhecidas naquelas di-
mensões impressionavam.

As explicações e “teorias” que predominavam — e convinham às classes


dominantes — não indicavam os determinantes das “patologias” (ou “diferenças
incômodas”) no ambiente físico ou social (no sistema econômico e social do regime
político, por exemplo) e sim no próprio “indivíduo doente”. Esse tipo de expli-
cação era conveniente às classes dominantes, assim como convinha “tratar” essas
patologias para não perder ou diminuir a fonte de riqueza e de bem-estar, gerados
pela força de trabalho das classes de poder econômico mais baixo (e socialmente
dominadas) (REBELATTO; BOTOME, 1999).

A medicina teve muitos desafios na tentativa de intervir nas patologias que


surgiam em função do advento da mecanização e industrialização. Inovações me-
todológicas começaram a ser implantadas nas faculdades de Medicina, assim como
o surgimento de novos equipamentos e novas formas de observar e de identificar
as doenças.

Essa época foi muito marcada pela assistência curativa e reabilitadora, não
havia preocupação com a prevenção ou mesmo com a manutenção da saúde, até
porque, nessa época cabia essa responsabilidade ao empregador e não ao Estado e
o empregador tinha apenas visão de lucro.
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5.4 INICIAÇÃO DAS ESPECIALIDADES MÉDICAS


Foi assim que a clínica, a cirurgia, a farmacologia, a aplicação de recursos
elétricos, térmicos e hídricos, além da prática de exercícios físicos evoluiram e a ideia
do atendimento hospitalar surgiu. Nessa fase, a medicina se subdividiu e iniciaram
as especialidades. Surgiram a Dermatologia, a Pediatria, a Obstetrícia, seguidas da
Psiquiatria, da Oftalmologia e da Otorrinolaringologia.

FIGURA 17 - CESÁREA (OBSTETRÍCIA)

FONTE: <http://bit.ly/2OtjDQs>. Acesso em: 5 de jul. 2019.

FIGURA 18 - LOUCURA: DIRETO AO PROBLEMA (PSIQUIATRIA)

FONTE: <http://bit.ly/2KFXr4n>. Acesso em: 5 de jul. 2019.

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FIGURA 19 – CATARATA (OFTALMOLOGIA)

FONTE: <http://bit.ly/2O5ZCjH>. Acesso em: 5 de jul. 2019.

Os doentes da época eram tratados por profissionais treinados e em locais


propícios para o desenvolvimento de pesquisas e estudos anátomo clínicos da época.

Durante a guerra, escolas de cinesioterapia surgiram a partir de clínicas uni-


versitárias ortopédicas. Além disso, as lesões, a mutilações, as alterações físicas de
várias naturezas e gravidades fizeram com que tratamentos fossem necessários para
recuperar os combatentes ou mesmo reabilitá-los para que tivessem condições de
vida social e produtiva.

Como consequência das guerras eram necessárias as mínimas condições


de retorno às atividades sociais de forma integradora e com produtividade, devido
à presença de mutilações e de alterações físicas de vários tipos e graus (GALVAN,
1998).

É possível perceber pelos relatos da época que a preocupação maior não


era em ter a percepção geral dos problemas nem de suas determinantes, mas sim,
como “consertá-los”, a fim de que o indivíduo pudesse voltar para a sua função.

Na Revolução Industrial houve o predomínio de uma assistência curativa,


recuperativa e reabilitadora. A Fisioterapia passou, mesmo sem ter sido ciência e
muito menos vista como profissão, por quatro importantes acontecimentos históri-
cos (CARVALHO et al, 2014).

A partir desse contexto houve um interesse mundial pelo termo reabilita-


ção. O que contribuiu para esse interesse foram alguns aspectos históricos como: o
processo acelerado de industrialização e de urbanização, trazendo os acidentes de
trabalho e o processo tecnológico e social, além das duas grandes guerras mundiais.

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TÓPICO 1 | AS MODIFICAÇÕES NA CONCEPÇÃO DO OBJETO DE TRABALHO
E A FISIOTERAPIA NOS DIFERENTES MOMENTOS DE SUA CONSTITUIÇÃO

6 A FISIOTERAPIA NO BRASIL E NO MUNDO NA TRANSIÇÃO


ENTRE OS SÉCULOS XIX, XX e XXI
Diversos materiais internacionais fazem uma analogia entre as duas grandes
guerras mundiais e a poliomielite, afirmando que a polio seria equivalente ou superior
às guerras e contribuiram para que, através de suas técnicas e métodos, a fisioterapia se
desenvolvesse a nível mundial (BARROS, 2008).

A Fisioterapia teve seu nascimento na metade do século XIX, na Europa. As


primeiras escolas apareceram na Alemanha, nas cidades de Kiel, em 1902, e Dresdem,
em 1918. Depois disso, a Fisioterapia, na Inglaterra, apareceu em destaque no cená-
rio mundial, com os trabalhos de massoterapia realizados pelos doutores Mendell e
J. Cyriax, os trabalhos de cinesioterapia respiratória feitos por Winifred Linton, no
Brompton Hospital, em Londres, e, sobretudo, os trabalhos de Fisioterapia neurológi-
ca realizados em conjunto com a fisioterapeuta Berta Bobath e o neurofisiologista Karel
Bobath que criaram o Método Bobath, para tratamento de pacientes com paralisia cere-
bral (SANCHES, 1984 apud GAVA, 2004).

FIGURA 20 – JAMES CYRIAX, ORTOPEDISTA BRITÂNICO QUE DESENVOLVEU A TÉCNICA DE


MASSAGEM CYRIAX

FONTE: <https://iphysio.files.wordpress.com/2010/04/dr_cyriax_j.gif>. Acesso em: 6 jul. 2019.

21
UNIDADE 1 | FUNDAMENTOS HISTÓRICOS DA FISIOTERAPIA

FIGURA 21 - KAREL E BERTA BOBATH, CRIADORES DO MÉTODO BOBATH

FONTE: <http://bit.ly/37od7mq>. Acesso em: 6 jul. 2019.

O surgimento da Fisioterapia em nosso país deu-se pela necessidade de


se reabilitar os portadores de sequelas decorrentes da poliomielite, do crescente
aumento do número de casos de acidentes de trabalho e das mutilações em muitos
combatentes da Segunda Guerra Mundial (CARVALHO et al, 2014).

“A história da profissão de fisioterapeuta a nível nacional tem sido objeto


de estudo de professores e pesquisadores, principalmente fisioterapeutas vincu-
lados a programas de pós-graduação e áreas como saúde coletiva, educação e na
própria fisioterapia” (BARROS, 2008, p. 942). O autor ainda continua sua linha de
pensamento afirmando que o marco histórico da profissão, de caráter institucional,
é o Decreto Lei 938, porém, no período que o antecedeu, pouco se tem de material
e relatos de como o processo foi viabilizado. Seu foco principal é utilizar outro
momento da História, partindo da criação e do reconhecimento da Escola de Rea-
bilitação do Rio de Janeiro (ERRJ).

O profissional fisioterapeuta surgiu em decorrência das grandes guer-


ras fundamentalmente para tratar de pessoas fisicamente lesadas. As
perdas totais ou parciais dos membros, atrofias e paralisias são exem-
plos do objeto de trabalho da fisioterapia em sua gênese. Naquelas
circunstâncias, porém, a preocupação fundamental, ou mesmo única,
com doenças ou lesões e suas consequências, parecia adequada. A de-
corrência natural das condições existentes na época fez toda a atuação
profissional ficar voltada para atenuar ou diminuir o sofrimento, reabi-
litar organismos lesados ou, quando possível, recuperar as condições
de saúde preexistentes dos organismos cujas condições haviam sido
alteradas. Então ocorrem os princípios militares do condicionamento e
o esforço físico e a incrementação das técnicas com recursos de tecnolo-
gia como a Mecanoterapia (máquinas e equipamentos para exercícios)
e a eletroterapia (corrente elétrica para fins terapêuticos), substituindo
gradativamente a Cinesioterapia (terapia por exercícios físicos) da har-
monia dos movimentos. Neste enfoque a profissão segue o caminho da
especialização fragmentada, afastando-se da visão do homem como um
todo, visível no Ocidente, e bem forte nos Estados Unidos da América
(GALVAN, 1998, p. 54-55).

22
TÓPICO 1 | AS MODIFICAÇÕES NA CONCEPÇÃO DO OBJETO DE TRABALHO
E A FISIOTERAPIA NOS DIFERENTES MOMENTOS DE SUA CONSTITUIÇÃO

FIGURA 22 – CENTRO DE TRATAMENTO PARA ALTERAÇÕES RESPIRATÓRIAS EM CRIANÇAS


ATINGIDAS PELA POLIOMIELITE NA DÉCADA DE 50

FONTE: <http://f.i.uol.com.br/livraria/capas/images/12110329.jpeg>. Acesso em: 6 jul. 2019.

FIGURA 23 – CRIANÇAS COM SEQUELAS MOTORAS DEVIDO À POLIOMIELITE

FONTE: <http://bit.ly/2D0iI4m>. Acesso em: 6 de jul. 2019.

No final do século XIX, no Brasil, a Fisioterapia inicia suas atividades por


meio da criação do Serviço de Eletricidade Médica e Hidroterapia na cidade do Rio
de Janeiro. E em 1884, no Hospital de Misericórdia, na mesma cidade, é criado o
primeiro Serviço de Fisioterapia da América do Sul, através do médico Arthur Silva
(GAVA, 2004).

23
UNIDADE 1 | FUNDAMENTOS HISTÓRICOS DA FISIOTERAPIA

FIGURA 24 – O MÉDICO ARTHUR SILVA PARTICIPA DA CRIAÇÃO DO PRIMEIRO SERVIÇO DE


FISIOTERAPIA DA AMÉRICA DO SUL NO HOSPITAL DE MISERICÓRDIA DO RIO DE JANEIRO

FONTE: <http://bit.ly/2OuFrLh>. Acesso em: 5 de jul. 2019.

6.1 A TRANSIÇÃO DO SÉCULO XX PARA O SÉCULO XXI


EM RELAÇÃO AOS OBJETOS DE TRABALHO E DE ESTUDO
Os tipos de preocupação e olhar em cada época da História passaram por
oscilações de grande impacto. Todas essas preocupações contribuíram para que
houvessem estudos e reflexões, decorrentes das próprias situações em cada perío-
do, resultando no modo de enxergar a doença e o modo de tratá-la (REBELATTO;
BOTOME, 1999).

Na Antiguidade surgiram os primeiros estudos para entender os distúrbios


que acometiam o homem, bem como a tentativa de explicar o surgimento e as pro-
postas de solucionar esses problemas.

A Idade Média foi marcada pela interrupção de pesquisas relativas à saúde


e o interesse por ações práticas, substituídas por concepções religiosas.

O Renascimento permitiu que esses estudos fossem retomados, além da


descoberta de novas formas de olhar a saúde, cuja preocupação era preservar as
condições de saúde que o indivíduo apresentasse.

A Industrialização foi caracterizada por precárias condições de vida e a


proliferação de doenças fazendo com que surgissem as especialidades médicas,
mantendo a preocupação com a doença instalada.

Os diferentes momentos da História determinaram a influência das re-


lações de produção dentro da organização da sociedade e o direcionamento das
ações em saúde em cada momento. Ao passo que essas relações de produção per-
mitiram maior acesso da população à melhor condição de vida, o modo de assis-
tência disponível se alterou. Os problemas de saúde que a população apresentava

24
TÓPICO 1 | AS MODIFICAÇÕES NA CONCEPÇÃO DO OBJETO DE TRABALHO
E A FISIOTERAPIA NOS DIFERENTES MOMENTOS DE SUA CONSTITUIÇÃO

eram considerados o resultado de uma somatória de problemas individuais de


cada membro dessa população e não mais visto como unicausalidade.

6.2 O CUIDADO DAS ESPECIALIDADES MÉDICAS E A


PREOCUPAÇÃO COM A DOENÇA INSTALADA
Aos gabinetes de curiosidades do século XVII, tantas vezes entulhados de
quinquilharias, sucederão, após um intervalo de investigações puramente clínicas,
os laboratórios onde o saber médico encontrará um verdadeiro fundamento cientí-
fico (STAROBINSKI, 1967 apud REBELLATO; BOTOME, 1999). A citação acerca dos
laboratórios como caminho para o verdadeiro fundamento científico é o ponto de
partida para a prática da pesquisa, da descoberta de novas tecnologias e formas de
se tratar, do entendimento de novas doenças que foram surgindo com o avanço da
industrialização e com as áreas da Medicina que estão conectadas.

Anos mais tarde no século XX, precisamente em 1957, viria a descoberta da


vacina Sabin, pelo microbiologista Albert Bruce Sabin. De acordo com pesquisas de
dados no Acervo do jornal O Globo (2018), a primeira tentativa de erradicar a pa-
ralisia infantil (veremos mais a frente) aconteceu em 1952 quando o americano de
origem polonesa Jonas Edward Salk, que cultivara o vírus da poliomielite, produ-
ziu uma vacina injetável à base de vírus mortos. Na prática percebeu-se que os efei-
tos eram de curta duração. Na continuação das pesquisas cinco anos depois, outro
microbiologista: Albert Bruce Sabin desenvolveu uma nova vacina com benefícios
que a de Salk não apresentou como: era uma vacina oral, com tempo prolongado
de imunização e com custo reduzido.

FIGURA 25 – ALBERT SABIN E JONAS SALK (ÓCULOS), OS PESQUISADORES DA VACINA ANTI PÓLIO

FONTE: <http://bit.ly/2KGptg1>. Acesso em: 6 de jul. 2019.

6.3 A FISIOTERAPIA FAZENDO PARTE DA EQUIPE DE SAÚDE


A Fisioterapia integrada com a área da saúde sofreu os mesmos tipos de
alterações no decorrer da história. Basicamente todos os recursos e ações eram
voltados quase que de forma exclusiva ao indivíduo com a doença manifesta.
25
UNIDADE 1 | FUNDAMENTOS HISTÓRICOS DA FISIOTERAPIA

Mesmo com o conhecimento da tecnologia a atenção estava voltada, quando


a saúde se encontrava em seus piores estágios, para reabilitar ou recuperar as
condições perdidas pelo indivíduo (REBELATTO; BOTOME, 1999).

Então surge o questionamento sobre como a Fisioterapia foi se desenvol-


vendo e se modificando ao longo dos tempos, até vir a ser uma profissão e os
rumos que ela tomou para ser considerada o que hoje realmente é a Fisioterapia.

Parece que, conforme for entendido o que seja o objeto de trabalho da Fi-
sioterapia, serão desenvolvidos atenção, atividades, esforços e estudos
na direção das patologias (“diferenças” ou alterações incômodas nos
organismos) ou de atividades, estudos e esforços na direção de mais do
que apenas as patologias. O objeto de trabalho da Fisioterapia no Brasil,
de certa forma, não se apresenta de maneira diferente do que já pode ser
percebido até agora na história do desenvolvimento da concepção de
trabalho com a “saúde” das pessoas. Vale eliminar melhor o que pode
ser caracterizado como objeto de trabalho de estudo dessa área ou dessa
profissão no País (REBELATTO; BOTOME, 1999, p. 20).

Provavelmente esse questionamento, feito pelo autor e por muitos outros


autores, pesquisadores e ou profissionais que já o fizeram, ocorra devido ao fato de
que no surgimento da atuação do fisioterapeuta, sua profissão era codependente
de outras, como a do médico, por exemplo. Os médicos da época eram conhecidos
como reabilitadores e os fisioterapeutas ainda sem profissão regulamentada eram
denominados como auxiliares de médicos.

Nos anos 30, tanto na cidade do Rio de Janeiro como em São Paulo, os
primeiros serviços ligados à fisioterapia foram idealizados por médicos. Esses
estabelecimentos não visavam apenas a estabilidade clínica do paciente, como
em hospitais por exemplo, mas sim a recuperação física permitindo o retorno à
sociedade, com funções idênticas anteriores à lesão ou mesmo semelhantes. Essa
visão dos médicos fez com que eles fossem chamados de médicos de reabilitação e
os profissionais de fisioterapia de auxiliares de médico (CARVALHO et al., 2014).

DICAS

Acesse os links a seguir e leia algumas informações adicionais a respeito


da prática da Fisioterapia, mesmo sem ainda ser uma Ciência nem mesmo profissão
regulamentada:

• https://blog.inspirar.com.br/fisioterapia-na-idade-media/
• http://www.bodyworks.med.br/historia-da-fisioterapia/
• http://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/CarolinaCristinadoNascimento.pdf/

26
AUTOATIVIDADE

1 Quando se falou em Antiguidade, viu-se que o termo “diferenças incômodas”


foi mencionado. O que esse termo significava na época e como era feita a inter-
venção para ajudar o indivíduo que apresentasse essas alterações?

2 Comentou-se sobre a prática de ginástica curativa nas pessoas no período da


Antiguidade. Como era realizada e qual o seu objetivo?

3 Citou-se recursos físicos, como o uso da luz, do sol, dos banhos e do peixe elétri-
co, como agentes terapêuticos. Analogamente, hoje são utilizadas essas formas
de tratamento, mas com denominações e classificações diferentes. Como são
chamados, atualmente, esses agentes terapêuticos?

4 Quando a Industrialização foi citada como um período histórico, viu-se que


acidentes de trabalho fizeram parte do processo de mecanização e que muitas
vezes eram resultados de extensas jornadas de trabalho. Como isso poderia ser
freado? E atualmente, o que se faz em relação à repetição das funções durante as
jornadas de trabalho?

5 Em vários momentos da história viu-se que a visão da época era apenas cura-
tiva, sem haver o enfoque preventivo. O que você, como estudante da área da
saúde, entende sobre a importância da prevenção nos aspectos sociais e econô-
micos?

28
UNIDADE 1
TÓPICO 2

A ORIGEM E A EVOLUÇÃO DA FISIOTERAPIA

1 INTRODUÇÃO

Neste segundo tópico, dar-se-á ênfase na trajetória da Fisioterapia em nos-


so país como Ciência e profissão iniciada em 1919 na cidade de São Paulo, com a
fundação do Departamento de Eletricidade Médica e, mais tarde, em 1929, com a
instalação do Serviço de Fisioterapia junto ao Hospital Central da Santa Casa de
Misericórdia. Paralelamente a esses marcos, o aparecimento de epidemias, entre
elas a Poliomielite que assolou o mundo, os acidentes de trabalho e as mutilações
dos combatentes de guerra, fizeram com que anos mais tarde começasse a ser ofer-
tado o primeiro Curso de Fisioterapia do Brasil, em 1951, no Instituto Central do
Hospital das Clínicas.

Toda essa trajetória fez com que a profissão de fisioterapeuta, até então não
regulamentada, começasse a ser vista como indispensável à sociedade, claro que
em um primeiro momento sem autonomia profissional e com pouca estrutura, mas
aos poucos o entendimento de que era necessário lutar pelo reconhecimento e va-
lorização da classe.

Aconteceram várias tentativas de reformular a oferta de cursos (disciplinas/


carga horária/ nível de ensino), afinal a demanda estava aumentando. Surgiram
associações e projetos de reconhecimento junto ao Congresso Nacional. Conhecen-
do essa retrospectiva histórica, você perceberá que através da apresentação e dis-
cussão de informações e documentos legais, houve a regulamentação do ensino e
exercício profissional, bem como a representatividade de órgãos de classe e norteio
aos profissionais da área. Vamos entender como tudo isso ocorreu?

2 O SURGIMENTO DA FISIOTERAPIA COMO CIÊNCIA E


PROFISSÃO
Baseado nos aspectos históricos vistos no Tópico 1, entende-se que o pro-
cesso sofrido ao longo do tempo culminou para o surgimento da Fisioterapia atra-
vés da necessidade primária de reabilitar.

A época colonial foi um momento decisivo para que a Fisioterapia tivesse


início. A saúde dos trabalhadores e dos escravos nos campos e lavouras, as con-
dições de vida precária, as frequentes mazelas da sociedade como a pneumonia,
a diarréia e a tuberculose não eram preocupação, exceto para aqueles escravos
que tinham perfil de rentabilidade e de maior produtividade (KURBAN, 2005).
29
UNIDADE 1 | FUNDAMENTOS HISTÓRICOS

No decorrer da História, várias passagens deixam claro que a prática se


dava através de recursos físicos, utilizados puramente como agentes curativos e
isso ocorreu desde a Antiguidade até o século XX, através dos marcos da Industria-
lização, da Poliomielite e da Segunda Guerra Mundial.

Veremos na sequência, as modificações que a Fisioterapia sofreu de acordo


com a realidade e a necessidade da época, iniciando com a atuação do fisioterapeuta
junto à classe médica (então chamado de auxiliar de médico); a oferta de cursos; a
epidemia que atingiu a população infantil em nível mundial; os acidentes de traba-
lho; as mutilações por bombas; as associações de classe; as indas e vindas com pedi-
dos de reconhecimento de classe profissional, até finalmente, em 1969, a Fisioterapia
ser regulamentada como profissão em que o fisioterapeuta atua de forma autônoma
e independente, através de métodos e técnicas privativos. Mais tarde, ao longo das
próximas seções, veremos de que modo a criação e a regulamentação de leis foram
importantes às atribuições profissionais e à fiscalização do exercício profissinal.

2.1 A FUNDAÇÃO DO DEPARTAMENTO DE ELETRICIDADE


MÉDICA DA FACULDADE DE MEDICINA DA UNIVERSIDADE
DE SÃO PAULO (FMUSP)
A Fisioterapia começou a se desenvolver com maior atenção e cuidado no
Rio de Janeiro com a implantação dos serviços de Hidroterapia, na época chama-
da de Casa das Duchas e de Eletricidade Médica. Período por volta de 1879 que
coincidia com o processo de industrialização e com o surgimento dos acidentes
de trabalho (SANCHES, 1984 apud KURBAN, 2005).

A Casa das Duchas que existe até hoje foi tombada como patrimônio his-
tórico. Localiza-se em Petropólis, no estado do Rio de Janeiro e na época de fun-
cionamento atendia cerca de cinquenta pessoas por hora, com o intituito de tratar
enfermidades pelo uso da água. Era um dos pontos mais bem frequentados da
cidade. Integrantes do Império, homens de Estado e toda a elite da época iam
muito ao local, como por exemplo D. Pedro II, Joaquim Nabuco, Visconde de
Mauá, Paulo Barbosa, entre outros. Com a queda da Monarquia o estabelecimen-
to foi decaindo havendo então o colapso total de sua frequência.

30
TÓPICO 2 | A ORIGEM E A EVOLUÇÃO DA FISIOTERAPIA

FIGURA 26 – CASA DAS DUCHAS NA ÉPOCA EM QUE FOI FUNDADA

FONTE: <http://bit.ly/33btS1a>. Acesso em: 5 jul. 2019.

FIGURA 27 – CASA DAS DUCHAS ATUALMENTE

FONTE: <http://bit.ly/2rgkVpJ>. Acesso em: 5 jul. 2019.

No período de 1879 a 1883, no Rio de Janeiro, a Eletroterapia e outros


agentes terapêuticos naturais, iniciados na Antiguidade com a prática e sem evi-
dência científica, tiveram início com a criação dos serviços de eletricidade e de
hidroterapia. Foi graças aos resultados e aos efeitos fisiológicos produzidos, além
dos esforços profissionais e de vários estudos que atualmente dipõem-se de vá-
rias tecnologias no âmbito da reabilitação (AGNE, 2013).

O médico e professor Raphael de Barros, em 1919, fundou o Departamento


de Eletricidade Médica da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo
(USP) (GAVA, 2004).

31
UNIDADE 1 | FUNDAMENTOS HISTÓRICOS

FIGURA 28 – MÉDICO DR. RAPHAEL DE BARROS

FONTE: <http://bit.ly/2O4LyqC>. Acesso em: 5 de jul. 2019.

O curso oferecido em 1950, e que levava o nome do médico Dr. Raphael


de Barros, tinha como objetivo capacitar profissionalmente pessoas que atuavam
como auxiliares dentro do serviço médico do Hospital das Clínicas da Faculdade
de Medicina da Universidade de São Paulo (BARROS, 2008).

2.2 A INSTALAÇÃO DO SERVIÇO DE FISIOTERAPIA NO


HOSPITAL CENTRAL DA SANTA CASA DE MISERICÓRDIA DE
SÃO PAULO
Aproximadamente em 1929, o médico Dr. Waldo Rolim de Moraes insta-
lou o Serviço de Fisioterapia do Radium Arnaldo Vieira de Carvalho em São Pau-
lo, cujo objetivo era atender de forma assistencial os pacientes carentes do Hospi-
tal Central da Santa Casa de Misericórdia e, posteriormente, organizou o Serviço
de Fisioterapia do Hospital das Clínicas. Ambos se tornaram grandes centros de
reabilitação e estão em atividade até hoje (KURBAN, 2005).

Em 1929, também em São Paulo, o médico Waldo Rolim de Moraes instala


o Serviço de Fisioterapia nas dependências do Hospital Central da Santa Casa de
Misericórdia de São Paulo (GAVA, 2004). Em 1951, esse importante médico pla-
nejou o primeiro curso de Fisioterapia do Brasil cuja intenção era formar técnicos
em fisioterapia.

32
TÓPICO 2 | A ORIGEM E A EVOLUÇÃO DA FISIOTERAPIA

FIGURA 29 – DR. ROLIM EM 1951 PLANEJOU O PRIMEIRO CURSO DE FISIOTERAPIA DO


BRASIL, PATROCINADO PELO CENTRO DE ESTUDOS RAPHAEL DE BARROS

FONTE: <https://s3.amazonaws.com/s3.timetoast.com/public/uploads/photos/12176863/
historia_ rehabilitaci% C3%B3n_fisioterapia.jpg>. Acesso em: 5 de jul. 2019.

Foi na década de 1950 que o perfil industrial e os cenários nacional e in-


ternacional, no que se refere à produção de bens e de serviços, modificaram-se.
A predominância de indústrias têxteis foi dando espaço à implantação do setor
automobilístico, de eletrodomésticos e de maquinarias. Mesmo assim, a realidade
salarial, assim como o esgotamento físico, as horas extras e o sistema de produção
baseado no Taylorismo ainda eram um desafio na relação com os acidentes de tra-
balho. Outro apontamento de grande importância feito pelo autor foi o surto de
Poliomielite no país e fora dele, forçando o estabelecimento de políticas voltadas à
construção de centros de reabilitação para tratamento e recuperação dos pacientes
(KURBAN, 2005).

Em 1951, o médico Dr. Waldo Rolim de Moraes organizou o Serviço de


Fisioterapia do Hospital das Clínicas iniciando-se o primeiro curso técnico (GAL-
VAN, 1998).

FIGURA 30 – DR. ARNALDO VIEIRA DE CARVALHO E SUA CONTRIBUIÇÃO PARA A MEDICINA


PAULISTA

FONTE: <https://images.app.goo.gl/uifLPCR4khiQf7xs9>. Acesso em: 5 de jul. 2019.

33
UNIDADE 1 | FUNDAMENTOS HISTÓRICOS

2.3 O SURGIMENTO DO PRIMEIRO CURSO DE FISIOTERAPIA


A NÍVEL TÉCNICO NO BRASIL NO INSTITUTO CENTRAL DO
HOSPITAL DAS CLÍNICAS DE SÃO PAULO
Conforme os anos foram passando, a prática da Fisioterapia foi se eviden-
ciando através da instalalação de vários serviços ligados à reabilitação. Foi assim
que surgiu também o primeiro curso de Fisioterapia a nível técnico.

Para suprir a demanda de técnicos em Fisioterapia, o Dr. Waldo Rolim


criou, em 1951, o primeiro curso Técnico em Fisioterapia do Brasil. O curso tinha
duração de um ano no formato de aulas em período integral e era necessário que
o aluno tivesse o segundo grau completo. Os professores eram médicos do Hos-
pital das Clínicas, local da realização das aulas (GAVA, 2004).

O curso tinha em seu corpo docente, médicos do próprio hospital e as au-


las eram ministradas no sétimo andar do Instituto Central do Hospital das Clíni-
cas. Ao final do curso, a fim de serem aprovados, os alunos realizavam uma ava-
liação, cujos avaliadores eram médicos e enfermeiros do Serviço de Fiscalização
Profissional do Estado de São Paulo. A oferta desse curso foi de grande impor-
tância, pois a nova classe profissional, ainda engatinhando, iniciaria o processo
de reflexão sobre a carreira e o futuro profissional (MARQUES; SANCHES, 1994).

Na década seguinte, para melhor adequação, pois a demanda de alunos


aumentou, a duração do curso passaria a ser de dois anos (CARVALHO et al., 2014).

2.4 A EVOLUÇÃO DO CURSO DE FISIOTERAPIA


A Fisioterapia foi evoluindo no cenário nacional e internacional, através de
sua contribuição com a sociedade. Fez-se necessário melhorar a oferta de cursos
com aprimoramento de técnicas e um número maior de pesquisas com evidências.

Os primeiros cursos ofertados no Brasil tinham o objetivo de auxiliar os


médicos, mas conforme a visão sobre o corpo humano, o conceito de saúde e de
doença foi sendo estabelecido, percebeu-se que os cursos deveriam ter formatos
diferentes que melhor atendessem a necessidade e a realidade da época.

[...] A motivação principal para sua criação foi o grande número de


portadores de sequelas da poliomielite - então com elevada incidência -
com distúrbios do aparelho locomotor, bem como o crescente aumento
de acidentes de trabalho. Considerada profissão recente, com menos de
quarenta anos de regulamentação, a formação em fisioterapia no Brasil
evoluiu de forma lenta nas décadas de 1970 e 1980, elevou considera-
velmente o número de cursos e de vagas na década de 1990 e atingiu
acelerada expansão a partir de 1997 (BISPO JÚNIOR, 2009, p. 3).

A epidemia de poliomielite exerceu grande influência no desenvolvimento


e fortalecimento da Fisioterapia no cenário mundial. No ano de 1916, nos Estados
34
TÓPICO 2 | A ORIGEM E A EVOLUÇÃO DA FISIOTERAPIA

Unidos, um número alarmante de vinte e sete mil pessoas foram infectadas, em um


total de vinte e seis estados atingidos. Esses números significaram uma média de
seis mil óbitos e milhares de casos de pacientes portadores de sequelas motoras. No
período em que a poliomileite assolou os norte americanos, de 1916 a 1955, foram
cerca de trinta e oito mil infectados ao ano. No ano de 1952 eram quase trinta e cinco
habitantes infectados a cada cem mil habitantes (BARROS, 2008).

Conforme o cenário nacional e internacional ia sendo influenciado por inten-


sas mudanças, também se modificava a realidade da atuação do fisioterapeuta. Sur-
giram epidemias, sequelas e a preocupação com a saúde pública, mas também com
a economia, já que todas essas pessoas, crianças e adultos, precisariam de atenção e
cuidados especiais.

2.4.1 A fundação da ABBR e a iniciação do curso técnico


em reabilitação
Em 1954, no Brasil, a Associação Brasileira Beneficente de Reabilitação (ABBR)
foi fundada, e em 1956, como parte de suas atividades, iniciou-se a oferta do Curso
Técnico em Reabilitação. Aqui, pela primeira vez na história, o fisioterapeuta foi visto
como auxiliar de médico, mas além disso, como profissional com formação de nível
técnico. As aulas do curso ocorriam nas dependências da própria associação e os alu-
nos deslocavam-se também para outras instituições, como, por exemplo, a Policlínica
do Rio de Janeiro, além dos Hospitais Carlos Chagas, Getúlio Vargas, Jesus e Pedro
Ernesto, além da Cruz Vermelha. O Regimento Interno da ABBR trazia a informação
de que deveria ser um centro de caráter beneficente, filantrópico e sem fins lucrati-
vos, cuja prioridade era a preparação para o exercício profissional (BARROS, 2008).

FIGURA 31 – DEPENDÊNCIAS DA ABBR, REFERÊNCIA EM REABILITAÇÃO NO JARDIM


BOTÂNICO, RIO DE JANEIRO

FONTE: <http://bit.ly/2OAQdQn>. Acesso em: 5 jul. 2019.


35
UNIDADE 1 | FUNDAMENTOS HISTÓRICOS

FIGURA 32 - CERIMÔNIA DE FORMATURA DA PRIMEIRA TURMA DE FISIOTERAPEUTAS E


TERAPEUTAS OCUPACIONAIS DO BRASIL GRADUADOS PELA ESCOLA DE REABILITAÇÃO DO
RIO DE JANEIRO – ERRJ, CRIADA PELA ABBR

FONTE: <http://bit.ly/2D4jJJ2>. Acesso em: 5 jul. 2019.

No dia da formatura da primeira turma da ABBR, em 1958, dos 23 alunos


formandos, 16 eram fisioterapeutas e 7 eram terapeutas ocupacionais. E, dos 23
formandos, quinze foram imediatamente contratados para trabalhar no centro de
reabilitação (BARROS, 2008).

A oferta do Curso da ABBR durou até quando a Lei n° 5.029 criou, anexo
à cadeira de Ortopedia e Traumatologia da FMUSP – Faculdade de Medicina da
Universidade de São Paulo, o Instituto de Reabilitação. O curso formou inúmeros
fisioterapeutas de 1951 até 1958. Esse Instituto de Reabilitação iniciou suas ativida-
des através do engajamento de médicos do cenário nacional, entre eles, o brasileiro
Dr. Godoy Moreira, através de acordos com algumas organizações internacionais
(MARQUES; SANCHES, 1994).

• A fundação da Associação Paulista de Fisioterapia (APF)

Na época a realidade já era um pouco diferente, pois os técnicos formados


já encontrariam uma profissão mais organizada que os colegas anteriores, egres-
sos do Curso do Dr. Raphael de Barros. Esses fundaram a Associação Paulista de
Fisioterapia (APF) que foi a primeira associação de classe. A APF foi pioneira para
outras entidades (GAVA, 2004).

Entende-se que o Curso de Fisioterapia também era um curso da Uni-


versidade de São Paulo, contudo, isto confirmou-se somente em 7 de
abril de 1967, através da portaria G-R nº 347, quando a Universidade
de São Paulo regulamenta os Cursos de Fisioterapia e Terapia Ocupa-
cional do Instituto de Reabilitação da Faculdade de Medicina. A Por-
taria nº 1025 de 16 de janeiro de 1970 afirma que os certificados de con-
clusão dos Cursos de Técnicos em Fisioterapia e Terapia Ocupacional,
expedidos pelo Instituto de Reabilitação da Faculdade de Medicina,
da Universidade de São Paulo, nos anos de 1958 a 1966, consideram-
-se, para efeitos de direito equivalentes aos diplomas expedidos nos
termos deste regulamento (GALVAN, 1998, p. 55-56).

36
TÓPICO 2 | A ORIGEM E A EVOLUÇÃO DA FISIOTERAPIA

2.4.2 O curso de Fisioterapia da FMUSP


Em abril de 1967, a Universidade de São Paulo fixa o regulamento dos Cursos
de Fisioterapia e de Terapia Ocupacional do Instituto de Reabilitação da Faculda-
de de Medicina. Como o curso estava vinculado a um Instituto em uma cadeira da
FMUSP, era considerado um curso da Universidade de São Paulo. Inicialmente, as
disciplinas ofertadas estavam mais voltadas à reabilitação, visão da época e eram
pouco específicas (MARQUES; SANCHES, 1994).

O curso de Fisioterapia da FMUSP, com duração de três anos, permaneceu


até 1979, período em que as disciplinas eram pouco específicas e voltadas à reabilita-
ção. No ano de 1980 o curso passaria a ter duração de quatro anos (GALVAN, 1998).

FIGURA 33 – PRÉDIO DO DEPARTAMENTO DE FISIOTERAPIA DA USP NA ATUALIDADE

FONTE: <http://www.imagens.usp.br/?p=19971>. Acesso em: 5 jul. 2019.

DICAS

Acesse os links a seguir e leia algumas informações adicionais a respeito do


surgimento da Fisioterapia enquanto ciência e profissão:

• http://terapiadomovimento.blogspot.com/2009/05/fisioterapia-fisioterapia-e-o.html
• http://www.hcte.ufrj.br/downloads/sh/sh9/SH/trabalhos%20orais%20completos/
ATUALIZACOES-SOBRE-A-HISTORIA-DA-FISIOTERAPIA-NO-BRASIL.pdf

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AUTOATIVIDADE

1 Qual a importância da instalação do Departamento de Eletricidade Médica


da FMUSP para a profissão de fisioterapeuta?

2 Tendo sido instalado o Departamento de Eletricidade Médica e mais tarde


o serviço de Fisioterapia na Santa Casa de Misericórida de São Paulo, qual a
necessidade de o fisioterapeuta não ser mais visto como um auxiliar médico
e sim como um profissional independente?

3 Qual a importância do surgimento das associações como a ABBR e a APF?

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