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INCIDENTE DE RESOLUÇÃO DE DEMANDAS REPETITIVAS (SEÇÃO) Nº

5054341-77.2016.4.04.0000/SC
RELATOR : PAULO AFONSO BRUM VAZ
SUSCITANTE : SILVIONEI STAHNKE
ADVOGADO : HELIO GUSTAVO ALVES
INTERESSADO : INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
MPF : MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
ASSOCIACAO SUL RIOGRANDENSE ENG SEGURANCA DO
AMICUS CURIAE :
TRABALHO
ADVOGADO : ROGER WILIAM BERTOLO
CONFEDERACAO BRASILEIRA DE APOSENTADOS,
AMICUS CURIAE :
PENSIONISTAS E IDOSOS
ADVOGADO : GABRIEL DORNELLES MARCOLIN
CONSELHO REGIONAL DE ENGENHARIA E AGRONOMIA -
AMICUS CURIAE :
CREA/PR
CONSELHO REGIONAL DE ENGENHARIA E AGRONOMIA -
:
CREA/RS
CONSELHO REGIONAL DE ENGENHARIA E AGRONOMIA -
:
CREA/SC
: DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO
INSTITUTO BRASILEIRO DE DIREITO PREVIDENCIARIO
AMICUS CURIAE :
(IBDP)
ADVOGADO : DIEGO HENRIQUE SCHUSTER
AMICUS CURIAE : INSTITUTO DE ESTUDOS PREVIDENCIARIOS - IEPREV
ADVOGADO : ROBERTO DE CARVALHO SANTOS
AMICUS CURIAE : MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO
ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL - SECÇÃO DO RIO
:
GRANDE DO SUL

VOTO DIVERGENTE

Data venia, divirjo do eminente relator. Explico.

As Leis nº 9.711/98 e nº 9.732/98 dispuseram sobre o Perfil


Profissiográfico:
Art. 58. A relação dos agentes nocivos químicos, físicos e biológicos ou associação de agentes
prejudiciais à saúde ou à integridade física considerados para fins de concessão da
aposentadoria especial de que trata o artigo anterior será definida pelo Poder Executivo.
(Redação dada pela Lei nº 9.528, de 1997) 1º A comprovação da efetiva exposição do segurado
aos agentes nocivos será feita mediante formulário, na forma estabelecida pelo Instituto Nacional
do Seguro Social - INSS, emitido pela empresa ou seu preposto, com base em laudo técnico de
condições ambientais do trabalho expedido por médico do trabalho ou engenheiro de segurança
do trabalho nos termos da legislação trabalhista (Redação dada pela Lei nº 9.732, de 11.12.98).

O PPP deverá ser emitido com base no LTCAT ou, na falta deste,
com base nas demonstrações ambientais previstas na IN 45, art. 254:

Art. 254. As condições de trabalho, que dão ou não direito à aposentadoria especial, deverão ser
comprovadas pelas demonstrações ambientais e documentos a estas relacionados, que fazem
parte das obrigações acessórias dispostas na legislação previdenciária e trabalhista.
§ 1º As demonstrações ambientais e os documentos a estas relacionados de que trata o caput,
constituem-se, entre outros, nos seguintes documentos:
I - Programa de Prevenção de Riscos Ambientais - PPRA;
II - Programa de Gerenciamento de Riscos - PGR;
III - Programa de Condições e Meio Ambiente de Trabalho na Indústria da Construção -
PCMAT;
IV - Programa de Controle Médico de Saúde Ocupacional - PCMSO;
V - Laudo Técnico de Condições Ambientais do Trabalho - LTCAT; e
VI - Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP.
§ 2º Os documentos referidos nos incisos I, II, III e IV do § 1º deste artigo poderão ser aceitos
pelo INSS desde que contenham os elementos informativos básicos constitutivos do LTCAT.
§ 3º Os documentos referidos no § 1º deste artigo serão atualizados pelo menos uma vez ao ano,
quando da avaliação global, ou sempre que ocorrer qualquer alteração no ambiente de trabalho
ou em sua organização, por força dos itens 9.2.1.1 da NR-09, 18.3.1.1 da NR-18 e da alínea 'g'
do item 22.3.7.1 e do item 22.3.7.1.3, todas do MTE.
§ 4º Os documentos de que trata o § 1º deste artigo emitidos em data anterior ou posterior ao
exercício da atividade do segurado, poderão ser aceitos para garantir direito relativo ao
enquadramento de tempo especial, após avaliação por parte do INSS.

Tal formulário contém declaração, por parte do empregador, nos


campos 15.7 a 15.9 sobre a adoção de EPI/EPC.

O cerne da controvérsia do presente IRDR, como bem resumido pelo


eminente relator, pode ser identificado da seguinte maneira: o fato de serem
preenchidos tais campos com a resposta 'S' é, por si só, condição suficiente para
reputar-se que houve uso de EPI eficaz e afastar a aposentadoria especial?

Minha resposta é: depende.

É certo que, quando o LTCAT e o PPP informam não ser eficaz o


EPI, não há mais discussão, isso é, há a especialidade do período de atividade.

Nesse sentido e para manter o paralelismo probatório, também se faz


necessário garantir, pelo menos em princípio (sujeito à confirmação futura), que a
afirmação contrária (qual seja, o EPI é eficaz) possa ser aceita acaso não
'desafiada' pelo segurado, afastando a especialidade.

De fato, o que se quer (diferentemente da jurisprudência dos juizados


especiais) é possibilitar que, tanto a empresa, quanto o segurado, possam
questionar - no movimento probatório processual - a prova técnica da eficácia do
EPI.

E como o segurado poderá realizar este 'desafio' probatório?

A primeira (e mais difícil via) é a juntada de uma perícia (laudo)


particular que demonstre a falta de prova técnica da eficácia do EPI - estudo
técnico-científico considerado razoável acerca da existência de dúvida
científica sobre a comprovação empírica da proteção material do
equipamento de segurança.

Também pode ser juntada uma prova judicial emprestada, por


exemplo, de um processo trabalhista onde tal ponto foi questionado. Outrossim,
deve ser lembrado que existem já experiências com banco de perícias tanto na
Justiça Federal como na Justiça Laboral, que podem ser utilizados como prova
emprestada.

Reconheço que essas duas primeiras vias são 'dolorosas' para o


segurado, pois sobre ele está todo o ônus de apresentar um estudo técnico
razoável que aponte a dúvida científica sobre a comprovação empírica da
eficácia do EPI.

Nesse sentido, entendo que a terceira (e última via que sugiro) será a
de maior uso. E ela é a prova judicial solicitada pelo segurado (após analisar o
LTCAT e o PPP apresentados pela empresa ou INSS) e determinada pelo juiz com
o objetivo de requisitar ao perito judicial que ateste a existência de estudo técnico
prévio ou contemporâneo encomendado pela empresa ou pelo INSS acerca
da inexistência razoável de dúvida científica sobre a eficácia do EPI.

Ou seja, se está invertendo - no foro e momento adequado - o


ônus da prova, tudo para contemplar o princípio da proteção do segurado
hipossuficiente, bem como o da precaução ambiental-laboral. Quero dizer, ao
determinar a produção dessa perícia específica, o juiz obrigatoriamente irá impor
ao INSS ou empresa o ônus de demonstrar que não há dúvida científica razoável
sobre a eficácia do EPI, isso através da apresentação de um estudo técnico-
acadêmico (com aplicação empírica) prévio ou contemporâneo.

Acaso o perito judicial não encontre tal estudo, a conclusão será a de


que o EPI não pode ser considerado eficaz no caso concreto.

Assim, a presente distribuição dinâmica do ônus da prova se mostra


a melhor solução neste caso, até porque detalha, efetiva e dá aplicação prática
àquilo lançado no precedente vinculante do STF formado no julgamento do ARE
664.335:
'11. A Administração poderá, no exercício da fiscalização, aferir as informações prestadas pela
empresa, sem prejuízo do inafastável judicial review. Em caso de divergência ou dúvida sobre a
real eficácia do Equipamento de Proteção Individual, a premissa a nortear a Administração e o
Judiciário é pelo reconhecimento do direito ao benefício da aposentadoria especial. Isto porque
o uso de EPI, no caso concreto, pode não se afigurar suficiente para descaracterizar
completamente a relação nociva a que o empregado se submete'.

Em termos esquemáticos, segue um roteiro resumido do


procedimento, já levando em conta as considerações lançadas acima:

1 º Passo:

O juiz (a requerimento das partes ou de ofício) deve oficiar ao


empregador para que apresente os registros do fornecimento de EPI ao trabalhador,
podendo ser 'livros, fichas ou sistema eletrônico' (previsão contida na NR-06 - item
6.6.1 'h').
Não existindo esse controle de fornecimento do EPI a prova pericial
será inócua, pois não basta o equipamento ser cientificamente adequado para
afastar ou neutralizar a nocividade se não houve o controle do fornecimento e
substituição do EPI pelo empregador.

2 º Passo:

Havendo documentação que comprove o fornecimento de EPI,


poderá ser designada a realização de perícia nos termos parametrizados neste
voto, inclusive para apurar se houve o cumprimento das demais condições
previstas na IN INSS 77/2015, art. 279, § 6º, quais sejam:

I - da hierarquia estabelecida no item 9.3.5.4 da NR-09 do MTE, ou


seja, medidas de proteção coletiva, medidas de caráter administrativo ou de
organização do trabalho e utilização de EPI, nesta ordem, admitindo-se a utilização
de EPI somente em situações de inviabilidade técnica, insuficiência ou interinidade
à implementação do EPC ou, ainda, em caráter complementar ou emergencial;
II - das condições de funcionamento e do uso ininterrupto do EPI ao
longo do tempo, conforme especificação técnica do fabricante, ajustada às
condições de campo;
III - do prazo de validade, conforme Certificado de Aprovação do
MTE;
IV - da periodicidade de troca definida pelos programas ambientais,
comprovada mediante recibo assinado pelo usuário em época própria; e
V - da higienização.

Cumpre ainda observar que existem situações que dispensam a


produção da eficácia da prova do EPI, pois mesmo que o PPP indique a adoção de
EPI eficaz, essa informação deverá ser desconsiderada e o tempo considerado
como especial (independentemente da produção da prova da falta de eficácia) nas
seguintes hipóteses:

a) Períodos anteriores a 3 de dezembro de 1998:


Pela ausência de exigência de controle de fornecimento e uso de EPI
em período anterior a essa data, conforme se observa da IN INSS 77/2015 -Art.
279, § 6º:

'§ 6º Somente será considerada a adoção de Equipamento de Proteção Individual - EPI em


demonstrações ambientais emitidas a partir de 3 de dezembro de 1998, data da publicação da
MP nº 1.729, de 2 de dezembro de 1998, convertida na Lei nº 9.732, de 11 de dezembro de 1998,
e desde que comprovadamente elimine ou neutralize a nocividade e seja respeitado o disposto na
NR-06 do MTE, havendo ainda necessidade de que seja assegurada e devidamente registrada
pela empresa, no PPP, a observância: (...)'

b) Pela reconhecida ineficácia do EPI:

b.1) Enquadramento por categoria profissional: devido a presunção


da nocividade (ex. TRF/4 5004577-85.2014.4.04.7116/RS, 6ª Turma, Rel. Des.
Fed. João Batista Pinto Silveira, em 13/09/2017)

b.2) Ruído: Repercussão Geral 555 (ARE 664335 / SC)

b.3) Agentes Biológicos: Item 3.1.5 do Manual da Aposentadoria


Especial editado pelo INSS, 2017.

b.4) Agentes nocivos reconhecidamente cancerígenos: Memorando-


Circular Conjunto n° 2/DIRSAT/DIRBEN/INSS/2015:
Exemplos: Asbesto (amianto): Item 1.9.5 do Manual da
Aposentadoria Especial editado pelo INSS, 2017; Benzeno: Item 1.9.3 do Manual
da Aposentadoria Especial editado pelo INSS, 2017.

b.5) Periculosidade: Tratando-se de periculosidade, tal qual a


eletricidade e vigilante, não se cogita de afastamento da especialidade pelo uso de
EPI. (ex. APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5004281-
23.2014.4.04.7000/PR, Rel. Ézio Teixeira, 19/04/2017 )

Por fim, resta esclarecer, quanto a esse aspecto, que nos casos de
empresas inativas e não sendo obtido os registros de fornecimento de EPI, as partes
poderão utilizar-se de prova emprestada ou por similaridade (de outros processos,
inclusive de reclamatórias trabalhistas) e de oitiva de testemunhas que trabalharam
nas mesmas empresas em períodos similares para demonstrar a ausência de
fornecimento de EPI ou uso inadequado.

3º Passo:

Esgotada a produção da prova na via judicial e não sendo possível


constatar a eficácia do EPI, cabe observar o item 11 do Acórdão do STF no
julgamento da Repercussão Geral n.555 (ARE 664335/SC):

'Em caso de divergência ou dúvida sobre a real eficácia do Equipamento de Proteção Individual,
a premissa a nortear a Administração e o Judiciário é pelo reconhecimento do direito ao
benefício da aposentadoria especial. Isto porque o uso de EPI, no caso concreto, pode não se
afigurar suficiente para descaracterizar completamente a relação nociva a que o empregado se
submete.'

Pelo exposto, voto por solver o IRDR estabelecendo a seguinte tese


jurídica: a mera juntada do PPP referindo a eficácia do EPI não elide o direito do
interessado em produzir prova em sentido contrário.

Des. Federal JORGE ANTONIO MAURIQUE

Documento eletrônico assinado por Des. Federal JORGE ANTONIO


MAURIQUE, , na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de
2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência
da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico
http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do
código verificador 9256778v15 e, se solicitado, do código CRC 452AAD0E.
Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): Jorge Antonio Maurique
Data e Hora: 11/12/2017 17:25

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