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UNIVERSIDADE FEDERAL DO TRIÂNGULO MINEIRO

PROJETO DE PESQUISA EM HISTÓRIA

SOBREVIVENTES:
ENTRE O CAPÍTULO 4 E O VERSÍCULO 3 (1997 -2020)

Discente: Marco Antônio G. Dos Santos.


Orientador: Prof. Dr. Marcelo De Souza Silva

Uberaba, 2021
INDICE:

1. Introdução.................................................. p. 03
2. Justificativa................................................ p. 03
3. Objetivos e hipóteses............................... p. 04
4. Fundamentação teórico-metodológica....... p. 06
5. Fontes primarias ....................................... p. 07
8. Artigos.........................................................p. 07
6. Cronograma de trabalho ............................ p. 08
7. Bibliografia ................................................ p. 08

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INTRODUÇÃO

O seguinte projeto de pesquisa tem como objetivo buscar compreender o Brasil


contemporâneo em relação a seus anseios e mudanças para com uma determinada classe
sociocultural entre os anos de 1997 e 2020, sob uma perspectiva vinte e três anos após o
lançamento da clássica música ―Capítulo 4 versículo 3‖ que compõem o álbum Sobrevivendo
no inferno1, lançado em 1997 de forma independente pelo grupo paulistano de rap Racionais
Mc`s.
A faixa traz logo em sua introdução dados estatísticos alarmantes os quais se referem à
população negra, como o genocídio da juventude de periferia, a falta de estrutura familiar,
falta de oportunidades, violência policial e a discriminação racial. Mais que uma simples
herança de nosso passado escravista, essa problemática racial toca o nosso dia a dia de
diferentes formas. Neste contexto, conhecer e trabalhar a obra do grupo, é conhecer e poder ir
um pouco mais a fundo nas necessidades de uma parcela da população excluída e
marginalizada do Brasil na qual todos nós cidadãos brasileiros estamos inseridos, seja de
forma direta ou indireta conforme narram os integrantes do grupo.

JUSTIFICATIVA

De onde parte este estudo? Qual é o interesse em trazer a obra dos Racionais MC’s para
o campo universitário? Bem, a escolha do Rap usado como ponte na compreensão do país e
suas camadas sociais a partir de músicas de um grupo específico, advém de experiências e
vivências tanto pessoais quanto na escola. ―As canções de rap são textos formadores de
opinião, pois discutem a condição de excluído do sujeito da periferia‖, segundo José Carlos
Gomes da Silva (2012, p.39). Dessa forma o grupo Racionais Mc`s é considerado hoje um dos
mais influentes grupos de rap do país, com músicas que abordam temas como preconceito,
desigualdade social e a realidade na periferia de São Paulo e de todo Brasil. Sendo assim se
faz necessário e de extrema importância compreender os Racionais para também entendermos
nosso próprio país em termos de racismo estrutural, miséria e violência. Sua importância não
se limita a algo somente direcionado para o gênero Rap, mais também para a própria música
no geral e para cultura nacional. Os Racionais Mc`s também são um acontecimento político,
onde o objetivo principal da crítica social do grupo é conscientizar e denunciar, porque o

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Sobrevivendo no inferno é o quarto álbum de estúdio do grupo brasileiro de rap Racionais Mc`s, lançado pela
gravadora Cosa Nostra em dezembro de 1997.
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jovem da periferia em geral sofre muito com a questão da exclusão social, de não poder
participar daquilo que a sociedade capitalista pode oferecer de melhor, e que certamente nem
sempre é, mas nem sempre ele tem consciência disso. Então, o trabalho deles tem por base
além de conscientizar, esclarecer e explicar para os jovens algumas questões que são abstratas
dentro do sistema capitalista e até dar alguns encaminhamentos, como a valorização da
questão da família, a valorização do estudo, a desvalorização do consumismo exagerado. As
letras dizem que aquele jovem deve tentar buscar melhorar, mas que não deve buscar
simplesmente o consumo. Alguns desses jovens que em sua maioria são negros de periferias
partem para o mundo do crime exatamente por isso, para ter tudo o que eles veem na
televisão. Então, a crítica do grupo a esse tipo de atitude que os encaminham através de suas
músicas, para a questão da educação, para o trabalho honesto.
Irmão, o demônio fode tudo ao seu redor/Pelo rádio, jornal, revista e
outdoor. Te oferece dinheiro, conversa com calma/Contamina seu
caráter, rouba sua alma/Depois te joga na merda sozinho/Transforma
um preto tipo A num neguinho./ (Racionais, Capítulo 4, versículo 3).
A referência que trazem nesse trecho entre mídia e consumismo, podemos entender como um
alerta ao cidadão negro, e então podemos também buscar compreender como as classes menos
favorecidas são induzidas ao consumo compulsivo a partir dai. E nota-se que isso acontece em
uma época em que a internet não era algo comum nem de fácil acesso para todas as classes.

OBJETIVOS E HIPÓTESES

Buscar compreender a obra comparando-a uma determinada época como o Brasil da


década de 90 (ano de lançamento do álbum e música), faz com que a pesquisa se torne algo
extremamente relevante, pois o período traz consigo acontecimentos que são fundamentais
para se pensar a importância do grupo Racionais para as periferias do país, e o porquê de
serem considerados os grandes responsáveis num modo de formulação política da identidade
da periferia. Podemos partir desse pressuposto e então levar e trabalhar os dados junto com a
música para dentro de salas de aula com alunos do ensino médio, instigando-os a pensar e a
formular opiniões junto a cada situação narrada na canção e da mesma forma questionar e
buscar respostas sobre um Brasil da década de noventa em termos de racismo e miséria.
Buscaremos também levantar questões sobre quais rumos o ouvinte ―chave‖, ou seja, os
considerados ―excluídos‖ os quais a música busca dialogar diretamente tomaram a partir de
ouvirem suas letras, onde buscavam por alternativas de sobrevivência no interior de uma
organização de estado neoliberal, cujo princípio de atuação era o gerenciamento da miséria

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por meio da violência, o que traz basicamente a criminalização e encarceramento em massa de
pretos, pobres e moradores da periferia. A partir dai podemos perceber uma série de
organizações fora do estado que está tentando criar estratégias de sobrevivência como grupos
de teatro, sarau, escritores e o hip hop faz parte desses grupos. No mesmo sentido o disco de
maior relevância para o grupo o ―Sobrevivendo no inferno‖ se torna fundamental para dar
maior visibilidade a esses grupos e fortalecer de certa forma política e culturalmente. De certa
forma o sucesso do grupo a partir dai permite que esses tantos outros grupos também se
beneficiem dos caminhos abertos.
A presente pesquisa também busca dialogar com a obra de René Remond Por uma
história politica, onde Para Rémond (2003), é necessário admitir que em função, nos últimos
tempos, de maior demanda por parte da sociedade em relação ao Estado – o que fez crescer
enormemente as atribuições políticas, sociais, econômicas e culturais do mesmo– houve um
despertar cada vez crescente sobre a esfera do político.
No ano de 1997 em que o disco Sobrevivendo no inferno foi lançado, o país era então
governado pelo presidente Fernando Henrique Cardoso e sua política de privatização de
empresas públicas e estatais. Sua política neoliberal andava de mãos dadas com a premissa
ideológica da democracia racial, que buscava afirmar a inexistência do racismo, negando a
própria paisagem social que escancarava que a democracia racial ainda não havia chegado
para os negros, pois estes ainda são minoria nas profissões mais bem remuneradas, nas
posições de maior reconhecimento, ou melhor, renda, principalmente a mulher negra que
ainda ocupa uma posição econômica e social extremamente desvantajosa.
Até então, Sobrevivendo no inferno foi o disco que mais e melhor representou a
experiência social, racial e emocional do jovem negro periférico. A profundidade e reflexão
sobre a subjetividade, angústias, anseios, medos e desejos de um jovem negro, que ressoava
com milhões de outros jovens negros no Brasil todo, nunca havia sido abordada de maneira
tão poética e feroz, como por exemplo, os dados estatísticos citados por Primo Preto2 na
introdução da música capítulo 4 versículo 3:
“60% dos jovens de periferia sem antecedentes criminais já sofreram
violência policial. A cada 4 pessoas mortas pela polícia, 3 são negras.
Nas universidades brasileiras apenas 2% dos alunos são negros. A
cada 4 horas, um jovem negro morre violentamente em São Paulo.
Aqui quem fala é Primo Preto, mais um sobrevivente” (Capítulo 4,
Versículo 3 - Racionais MC's.)

2
Paulo Brandão. Conhecido pelo pseudônimo de Primo Preto é ex-integrante do grupo de rap paulista SP Funk
e ex-apresentador do programa na versão brasileira do Yo Mtv Rap no inicio da década de 90
5
Comparando a época de lançamento com os dias atuais, buscaremos compreender
porque as estatísticas pouco mudaram em relação à idade e à cor das vítimas, com exceção ao
ingresso às universidades onde segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística (IBGE)3 houve um aumento significativo onde à pesquisa mostra que a população
negra está melhorando seus índices educacionais, tanto de acesso como de permanência,
apesar de ainda se manter bem atrás dos índices medidos entre as pessoas brancas. A
proporção de jovens de 18 a 24 anos pretos ou pardos no ensino superior passou de 50,5% em
2016 para 55,6% em 2018. Entre os brancos, a proporção é de 78,8%. Na mesma faixa etária,
o número de pretos e pardos com menos de 11 anos de estudo e que não estavam
frequentando a escola caiu de 30,8% em 2016 para 28,8% em 2018, enquanto o indicador
para a população branca é de 17,4%. (IBGE). Dessa forma buscaremos levar a música para
dentro das salas de aula e relacionar com as últimas décadas de acontecimentos históricos
políticos e sociais no Brasil.

FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICO METODOLOGICA

Pretende-se utilizar da análise do discurso crítico dos Racionais MC's como forma
metodológica onde o objetivo, então, é expor as discussões realizadas a partir da audição e
leitura desse rap, as quais evidenciam que essa canção possui, retrata situações cotidianas da
periferia, como a violência física e simbólica. Destacamos, assim, como as relações de poder
e a relação entre narrador e personagem emerge, discursivamente, na letra do rap, onde de
acordo com integrantes dos Racionais, em entrevista à Revista Rolling Stones Brasil (n. 86,
2013): ―A ideia do rap é fazer a molecada pensar. Tem de debater, questionar. Depois que
despertamos, vamos querer combater?‖ (p. 81). E KL Jay acrescenta: ―Racionais é utilidade
pública‖ (p. 75). Essa utilidade pública está no fato, do nosso ponto de vista, de levarem à
reflexão, à crítica, ao questionamento, ao ensinamento, ao combate a diversas questões, como
preconceitos étnicos, sociais, entre outros. Segundo Maria Rita Khel, (1999,p.97) Eles apelam
para a consciência de cada um, para mudanças de atitude que só podem partir de escolhas
individuais; mas a autovalorização e a dignidade de cada negro, de cada ouvinte do rap,

3
Constitui a principal fonte de referência para o conhecimento das condições de vida da população em todos
os municípios do País e em seus recortes territoriais internos, tendo como unidade de coleta a pessoa
residente, na data de referência, em domicílio do Território Nacional. Coincidentemente citados em forma de
protesto contra o descaso do governo com a população carente na música Homem na estrada dos Racionais
mc´s em 1993 do disco Raio X do Brasil.
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depende da produção de um discurso onde o lugar do negro seja diferente do que a tradição
brasileira indica.
Portanto estudar e compreender a obra dos Racionais MC’s não é uma iniciativa
inédita, existe uma variada bibliografia publicada na virada dos anos 90 para 2000 sobre o rap
feito no Brasil. Nas universidades dentre as principais áreas nas Ciências Humanas que têm
escrito sobre rap, é possível destacar a Sociologia, a Antropologia e os estudos de canção
dentro do campo dos Estudos Literários como principais fontes de publicações. Em razão ao
caráter associativo de sua organização social, o rap brasileiro recebeu imediata valorização do
olhar socioantropológico. Foram feitos estudos de campo sobre comunidades em grandes
cidades brasileiras onde a cultura hip-hop tem presença a partir de uma perspectiva local.

FONTES PRIMARIAS:

RACIONAIS MC's. ―Capítulo 4, versículo 3‖. In: Sobrevivendo no inferno. São Paulo: Cosa
Nostra, 1997. 1 CD. (disponível no acervo pessoal do autor e em todas as plataformas
digitais)

REVISTA Rolling Stones Brasil. Edição 86, novembro de 2013. Entrevista com Racionais
MC‟s (―Os quatro pretos mais perigosos do Brasil‖). Disponível em:
˂http://rollingstone.uol.com.br/edicao/edicao-86/racionais-mcs-quatro-pretos-
maisperigososdo- brasil?page=6#imagem0˃. Acesso em: 02 fev. 2021.

Entrevista concedida ao programa Roda Viva, da TV Cultura, em agosto de 2007.


Disponível em:

<http://www.rodaviva.fapesp.br/materia_busca/470/mano%20brown/entrevistados/mano_bro
wn_2007.html > Acesso em 02 fev. 2021

BROWN, Mano. Entrevista concedida à revista Showbizz, n. 155, jun. 1998.

ARTIGOS:

KHEL, Maria Rita. Radicais, Raciais, Racionais: a grande fatria do rap na periferia de
São Paulo. Revista São Paulo em Perspectiva 13(3), 1999.

7
D’ANDREA, T. Contexto histórico e artístico de produção do fenômeno Racionais MC’s:
uma ruptura musical. Música Popular em Revista, Campinas, ano 5, v. 1, p. 95-112, jul.-dez.
2017.

CRONOGRAMA DE TRABALHO

ANO 2021
MÊS/ JAN FEV MAR ABR MAI JUN JUL AGO SET OUT NOV
ETAPAS
Pesquisa X X X
bibliográfica
Coleta de X X
dados
Análise dos X
dados
Redação da X
pesquisa
Revisão e X X X
redação
final
Entrega X
final

BIBLIOGRAFIA

Sobrevivendo no inferno / Racionais MC’s. — 1ª- ed. — São Paulo : Companhia das Letras,
2018.

SILVA, José Carlos Gomes da ―Do Hip-Hop ao Sarau Vila Fundão: jovens, música e poesia
na cidade de São Paulo‖,Cadernos de Arte e Antropologia, Vol. 1, No 2 | -1, 39-54.

GARCIA, Walter. ―Ouvindo Racionais MC’s‖. Teresa, revista de Literatura Brasileira. No


4/5. São Paulo, 2004. p. 166-180.

KEHL, Maria Rita. ―O lamento de Mano Brown‖. Reportagem. Ano IV. No 38. Belo
Horizonte, nov., 2002. p. 31-32.

LUCA, Tania Regina de. Práticas de pesquisa em história. São Paulo: Contexto, 2020

8
GRECCO, Anderson. Racionais MC’s: música, mídia e crítica social em São Paulo.
Dissertação em História Social, PUC-SP, 2007.

RÉMOND, R. Uma história presente. In. RÉMOND, 2003, p. 13-36.

RACIONAIS MC's. In: ENCICLOPÉDIA Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileiras. São
Paulo: Itaú Cultural, 2021. Disponível em:
<http://enciclopedia.itaucultural.org.br/grupo636012/racionais-mcs>. Acesso em: 01 de Mar.
2021. Verbete da Enciclopédia

MUNANGA, Kabengele. Rediscutindo a mestiçagem no Brasil: identidade nacional versus


identidade negra. Belo Horizonte: Autêntica, 2004.

FANON, Franz. Pele negra, máscaras brancas. Salvador: EDUFBA, 2008.

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