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OLIVEIRA
TODOS OS DIREITOS RESERVADOS
Copyright© ANDREIA OLIVEIRA
Este e-book é uma obra de ficção. Embora possa ser feita referência a eventos históricos reais ou locais
existentes, os nomes, personagens, lugares e incidentes são o produto da imaginação da autora ou são
usados de forma fictícia, e qualquer semelhança com pessoas reais, vivas ou mortas, estabelecimentos
comerciais, eventos, ou localidades é mera coincidência.
Não saberia dizer em que momento uma tradição se formou, mas era de
praxe eu e Fernando terminarmos em algum bar aleatório todas as sextas-
feiras, depois do trabalho. Naquela, em especial, estávamos em um na Barra,
mais perto de casa, porque tivemos uma reunião cansativa, onde precisamos
substituir nosso tio, que estava afastado por alguns dias, depois de um
princípio de infarto que muito nos assustara.
Tio Geraldo sempre foi uma rocha. Um homem que veio do nada e
construiu um império. Para nós, um exemplo. Para mim, mais do que meu pai
tinha sido. Aliás, fora exatamente a imagem do meu pai bêbado, traindo e
agredindo minha mãe, que me tornou o homem que eu era – focado e
workaholic. Vê-lo sucumbir de alguma forma foi mais desconcertante para
mim do que imaginei que poderia ser.
— Diazinho puxado, né? — Fernando comentou assim que nos
sentamos no bar e pedimos, cada um, uma dose de uísque, pura. — Como tio
Geraldo aguenta? Ele já tem o quê? Setenta anos?
— Mais do que isso, acho. Ele era o mais velho dos três irmãos. — E o
único que durou também. Tanto meu pai quanto a mãe de Fernando já
haviam partido. Aliás, nós dois éramos órfãos, e nosso tio fez um ótimo papel
praticamente nos criando. Éramos como filhos para ele, já que não tivera
nenhum com sua esposa de longa data, nossa doce tia.
— Nós dois, com trinta e sete, somos uns reclamões. Garanto que se
fosse ele, estaria lá, feliz da vida, comandando aquela gente toda para que
comesse na sua mão. O cara é um mestre.
Não pude deixar de sorrir, enquanto levava o copo à boca, pensando no
quanto meu primo estava certo. Tio Geraldo era mesmo um mestre. Um
comandante perfeito para o navio que a Antunes Viana se tornara.
Um de nós dois teria que assumir seu lugar quando ele se aposentasse, e
de acordo com o que tia Adelaide dissera, ela estava muito empenhada em
conseguir que isso acontecesse mais cedo ou mais tarde.
Aparentemente, esse era o mesmo pensamento de Fernando.
— Já pensou em um de nós no lugar dele? — comentou, de forma quase
sorrateira, como se não fosse importante.
Mas era. Quem quer que fosse assumir o posto, teria que fazê-lo com
honra, porque devíamos isso ao homem que nos deu tudo.
— Penso, mas não gosto tanto da ideia — respondi com convicção.
— Como não? Não é para isso que trabalhamos tanto?
— É e não é. Eu trabalho para a empresa continuar sendo o que é. Gosto
do que faço e largar o setor jurídico para cair na parte administrativa da
empresa seria algo que não me agradaria. Mas faria isso, se fosse desejo do
nosso tio.
Fernando assentiu, dando mais um gole em sua bebida. Sempre que
conversávamos sobre a aposentadoria de tio Geraldo, ele se mostrava tão
relutante quanto eu. Naquela noite, em contrapartida, eu tinha a impressão de
que isso mudara. Ele parecia mais interessado em ser o sucessor do que antes.
— A gente não sabe o que se passa pela cabeça dele, né? Nunca mostrou
distinção entre nós, e sempre trabalhamos igual. Nunca fomos negligentes,
então eu realmente não sei qual de nós dois ele vai escolher.
Fiquei em silêncio por algum tempo, ponderando. Fosse quem fosse que
ele escolhesse, só teria mais atribuições e responsabilidades. Mais poder
também, é claro, e mais dinheiro, mas isso não era tudo.
Um dia pensei que fosse, mas depois que perdi minha esposa meus
conceitos mudaram um pouco.
— Não sabemos, mas seja quem for o escolhido, vai dar conta. Ele não
entregaria sua preciosa cadeira de CEO para alguém que não fosse
extremamente capaz.
Fernando novamente assentiu, pensativo. Havia algo de diferente em seu
comportamento naquela noite, mas quem seria eu para compreendê-lo? Não
que não tivesse um relacionamento próximo com o meu primo. Porra, nós
éramos como irmãos, e àquela altura da vida praticamente deveríamos ser
capazes de ler o pensamento um do outro, mas há algum tempo ele vinha
fazendo coisas com as quais eu não concordava, por isso era um pouco difícil
compreendê-lo.
Como, por exemplo, o que aconteceu logo em seguida.
Uma belíssima loira parou ao nosso lado, no balcão, com um vestido
vermelho e um decote que não deixava muito para a imaginação. Fernando
deu uma olhada para ela de cima a baixo e lambeu os lábios.
— Pelo amor de Deus, Mau, me diz que você vai chegar naquela deusa
— ele comentou, ainda sem tirar os olhos da moça, que jogava os cabelos
para trás. Ela não estava nem olhando na nossa direção, apenas se sentou e
pegou sua bebida.
— Ela pode estar esperando alguém — foi o que eu respondi, e ele
concordou, assentindo.
Minutos depois, de fato, eu acertei no meu palpite. Mas a loira logo se
levantou com um sorriso, pronta para receber outra garota. Tão bonita quanto
ela, de cabelos cacheados castanhos.
— Olha só... é Deus mandando presentes para nós depois de um dia tão
cheio. Vou até deixar você escolher qual quer, porque aquilo ali é a perfeita
definição do “tanto faz”.
Eu sabia que Fernando não era fiel à esposa. Isso me deixava muito
constrangido quando os visitava, porque Luana era uma mulher incrível.
Doce, dedicada, tinha uma carreira no ramo da moda, era ex-modelo, linda e
era louca pelo marido. Não havia motivos para que meu primo reclamasse de
seu casamento, mas ele sempre fora o pegador de nós dois. Não que eu não
tivesse um passado, algumas mulheres passaram pela minha cama,
principalmente na época da faculdade, mas depois de Ísis, nunca mais toquei
em outra. Tanto durante nosso namoro quanto no casamento e nos cinco anos
de viuvez.
Claro que eu sentia falta de sexo, mas tinha me acostumado demais a
fazê-lo com algum sentimento envolvido para sair distribuindo assim, de
qualquer jeito, com alguém de quem eu sequer me lembraria o nome depois
de alguns dias.
— Nando, eu não tenho o menor interesse em sexo casual, e você sabe
disso — respondi, enfático, e meu primo revirou os olhos.
— Então deveria, pelo menos, estar tentando conhecer alguém. É muito
tempo enferrujado, Mau. Eu não aguentaria.
— Você não aguentaria nem um dia sem sexo — respondi, tentando
manter o tom de brincadeira, embora não aprovasse seu comportamento. Não
quando havia uma mulher incrível esperando-o em casa.
Até onde eu sabia, Luana tinha conhecimento dos casos extraconjugais
de Fernando. Ou talvez apenas suspeitasse, mas era discreta o suficiente para
não deixar transparecer se isso a magoava.
Com o meu comentário, meu primo abriu um sorriso safado, de canto,
que ele deveria achar muito charmoso. Era um cara bonito, estava sempre
bem vestido, tinha um carro chamativo e muito dinheiro, as mulheres caíam
aos seus pés, e ele não conseguia resistir.
— Nunca. Você vai mesmo rejeitar as gatas ali? — Fernando apontou
para as duas mulheres, e eu dei de ombros, bebendo mais um pouco do meu
uísque. Eram garotas muito bonitas, e eu poderia passar alguns momentos
divertidos com uma dela nos braços, mas seria só isso. No dia seguinte o
vazio reapareceria.
Naqueles últimos meses, desde que começamos a sair juntos, eu tinha
tentado conversar com mulheres, cheguei a beijar uma delas, mas não
consegui sentir nada além de uma atração física. Provavelmente quando a
gente se acostuma a algo especial não quer nada menos do que isso.
Claro que eu não poderia esperar sentir por outra mulher o que senti por
Ísis, ao menos não tão rápido, mas eu só queria algum tipo de conexão.
— Posso tentar a sorte? Dou conta das duas.
— Vá em frente. Só acho que você deveria parar com isso. Luana não
merece — aquela era a milésima vez que eu lhe dizia aquilo. E diria mil
vezes mais, embora soubesse que entraria por um ouvido e sairia pelo outro.
— Ela não merece, mas o que eu posso fazer? Sou um homem de sorte.
Ele nem fazia ideia do quanto...
— Bem, faça o que quiser. Não quero testemunhar. Vou passar no
banheiro e ir para casa.
Ele ficou falando alguma coisa, mas nem lhe dei atenção, fui direto, sem
lhe dar ouvidos. Algum dia eu contaria para Luana.
Entrei no banheiro, fechei a porta e continuei com esse pensamento.
CAPÍTULO QUATRO
Se tinha uma coisa que me deixava fora de mim eram valentões que se
aproveitavam da fragilidade de outras pessoas. Eu não era nenhum herói, é
claro, mas não costumava fechar os olhos para esse tipo de injustiça.
Especialmente quando havia várias pessoas ao redor e nenhuma delas
levantava um dedo para defender uma mulher indefesa que estava
visivelmente sendo molestada por um idiota qualquer.
Pelo que entendi, o sujeito era ex-namorado dela. Um covarde.
Acompanhei-a até o bar e pedi uma água. A garota tremia, mas vi
quando respirou fundo, esforçando-se para se recompor enquanto levava o
copo à boca.
— Você está sozinha? — perguntei, um pouco preocupado. O que lhe
disse era verdade. A forma como minha esposa morreu me fazia lamentar não
ter estado por perto para protegê-la. Gostaria que alguém tivesse feito isso na
época, e eu odiava pensar em uma garota sem companhia, acuada por um
cara agressivo, em meio a um bar lotado.
— Estou com duas amigas, mas acho que elas não vão durar aqui por
muito tempo. — Ela pousou o copo sobre o balcão e apontou para uma mesa,
onde duas mulheres estavam aos beijos com dois rapazes.
Quando me voltei para ela novamente, eu a vi dar de ombros e sorrir
pela primeira vez.
E também pela primeira vez reparei no quanto era bonita.
Jovem. Bem jovem. Uns vinte e dois, vinte e três anos. Alta, bem
magrinha, cabelos lisos e escuros, uma aparência suavemente exótica. Mas os
olhos... eram fascinantes. Eram quase dourados, e estavam maquiados de uma
forma que os destacavam, deixando-os ainda mais expressivos.
Eu a estava observando por tempo demais, tanto que a moça voltou sua
atenção para o copo. Não queria parecer mais um dos babacas que deveria
cobiçá-la, porque não era o caso. Por mais atraente que fosse... Não estava
procurando por aquele tipo de coisa. E ela, provavelmente, também não.
Ficamos em silêncio, e eu aproveitei a proximidade do barman para
pedir algo para beber também, mas optei por algo não alcoólico. Um
refrigerante daquela vez. Aparentemente Fernando tinha mesmo saído com as
duas mulheres, e eu não estava mais a fim de beber. Não estava de carro,
pegaria um táxi, mas tinha um limite do quanto me permitia embriagar. Não
que fosse fraco para bebidas, mas odiava a sensação do dia seguinte.
Dei o primeiro gole e ouvi Carolina – este era o nome dela, não? –
suspirar.
— Olha, sei que você não me conhece, mas eu não sou esse tipo de
garota — ela falou do nada. Voltei minha atenção para ela, com o cenho
franzido.
— Que tipo de garota? — indaguei, erguendo uma sobrancelha no
momento em que olhou para mim.
— Que fica com aquele tipo de cara.
Um dos cantos da minha boca se curvou em um sorriso.
— Você não precisa se explicar — respondi, dando mais um gole na
coca-cola. E era verdade, ela não precisava dizer nada. Eu era apenas um
estranho, um cara em quem ela esbarrara e que decidira ajudá-la. Só que não
poderia negar que não passara pela minha cabeça o motivo de uma garota que
parecia tão tímida e doce dar uma chance para um babaca como aquele. —
As pessoas escondem quem verdadeiramente são, não é? É muito fácil fingir.
— Sim, é bem isso. Mas nem todo mundo sabe fazer esse tipo de coisa.
— Ela também sorriu. — Às vezes eu acho que sou muito boba ou ingênua.
Sempre acredito no melhor das pessoas, e isso só me faz quebrar a cara.
— Nem sempre isso tem a ver com ingenuidade. Pode ser algo da sua
personalidade.
— Deve ser genético. — Seu sorriso se ampliou, e ela ganhou um ar
sonhador, enquanto seu dedo brincava com a borda do copo. Era uma coisa
um pouco aleatória, mas reparei que o esmalte que usava nas unhas era bem
clarinho. Além disso, elas não eram muito longas, bem naturais. — Minha
mãe era coração mole também.
— Era?
Carolina ergueu os olhos encantadores novamente para mim, quase
constrangida.
— Desculpa, não é o tipo de conversa para se ter em um bar, ainda mais
com o seu herói da noite. — O sorriso largo se repetiu. Era doce, adorável e,
novamente, natural. Talvez fosse uma característica dela. — Aliás, obrigada.
Se não fosse você...
— Eu só estava no lugar certo, na hora certa.
— Outras pessoas também estavam. E não fizeram nada.
Nossos olhares se encontraram por alguns minutos, em silêncio, ambos
muito sérios. Mas era isso, não era? O mundo constantemente fechava os
olhos para esse tipo de coisa. Para a dor do outro, para as opressões. Eu não
queria ser esse tipo de pessoa, embora nem sempre fosse possível fazer
alguma coisa.
— Aceite. Eu te devo um enorme obrigada — ela acrescentou, ainda
mantendo um sorriso. — E só para não te deixar sem resposta... minha mãe
faleceu há três anos. Mas não quero conversar sobre isso. — Fez uma pausa e
prosseguiu, pouco tempo depois: — Na verdade, você nem precisa conversar
comigo, se não quiser. Não quero ficar te atrapalhando.
— Por que eu não iria querer? — indaguei, intrigado.
— Ué, porque você é um cara bonito, está sozinho em um bar,
provavelmente tem planos.
— Eu não estava sozinho. Minha companhia fez o mesmo que as suas.
Para ser sincero, só queria ir embora.
Carolina ficou boquiaberta, apressando-se em terminar de beber sua
água.
— Poxa vida, desculpa. — Ela foi colocando a mão na bolsa, apressada
e um pouco afobada. — Vai lá, eu posso pagar a minha água e seu
refrigerante. É o mínimo que posso fazer para... — Em um gesto impensado,
coloquei minha mão sobre a dela, para impedi-la de continuar.
— Ei... calma. Não está sendo um fardo ficar aqui com você. Talvez a
perspectiva de conversar seja muito mais interessante do que ir para casa tão
cedo. — Novamente aqueles olhos fascinantes me olharam com curiosidade,
sérios e surpresos. — A não ser que você queira ou precise ir.
— Não, também não estou muito animada para ir para casa agora. Pelo
visto, minha colega de quarto não vai voltar esta noite. — Ela apontou com a
cabeça para a mesa, e eu assenti. — Eu não sou muito de baladas, mas hoje
queria comemorar.
— Comemorar? Posso perguntar o quê?
Novamente o sorriso se engrandeceu.
— Vou começar em um emprego novo. Estou animada.
— Ah, parabéns! Vamos brindar, então, se você não se importar que
estejamos bebendo água e coca-cola... — Ergui meu copo, e ela o tocou com
o dela.
— O melhor tipo de brinde. Não sou muito de álcool.
Tomamos um gole, cada um de seu copo, e os pousamos sobre o balcão.
— O que você vai fazer nesse novo emprego?
Carolina começou a rir.
— Você vai me achar muito louca se eu disser que não sei exatamente?
É que fiz muitas entrevistas e não tenho muita certeza de qual é o cargo. Mas
estou feliz. Estava precisando de um emprego. Gosto de trabalhar.
— Então temos isso em comum. Sou um pouco workaholic.
— Hum, o que você faz?
— Sou advogado. — Achei que a informação era suficiente. Por mais
adorável e gentil que a moça fosse, eu não a conhecia. Percebi que tomava
alguns cuidados para não me passar dados muito precisos, e ela estava certa.
— Ah, por isso a roupa social. Entendi.
Carolina deu a última golada em sua água, e, por algum motivo bobo,
comecei a lamentar que pudesse, de repente, decidir ir embora. Fazia tempo
que não conversava com alguém daquela forma, sem pretensões, sem que a
pessoa soubesse quem eu era e decidisse puxar o meu saco por eu ter um alto
cargo na empresa ou por ser o sobrinho do CEO. E como tinha dito para ela,
não queria mesmo voltar para uma casa vazia e escura. Não naquela noite.
Sendo assim, decidi perguntar:
— Vou pedir mais uma coca para mim, quer mais uma água? Ou alguma
coisa diferente? — Foi quase uma deixa para saber se Carolina pretendia ficar
mais algum tempo ali.
Vi quando olhou de soslaio para suas amigas, e eu fiz o mesmo, vendo-
as rindo e ainda animadas com os caras que beijavam minutos antes.
Então Carolina novamente sorriu para mim.
— Acho que vou optar por algo mais forte. — Ergueu uma sobrancelha,
divertida e doce. Bastante adorável. — Um guaraná dessa vez! — brincou,
como se fosse dizer uma tequila ou uma vodca.
Não pude deixar de sorrir e fiz um sinal para o garçom, súbita e
estranhamente animado pela minha companhia daquela noite.
CAPÍTULO SEIS
Eu sabia muito bem o que ela queria dizer com “agir”. Minhas amigas,
com certeza, iriam esticar a noite com os rapazes em outro lugar. Um motel,
provavelmente. Ou seja, eu teria que voltar para casa de Uber. Por mim tudo
bem, mas não queria, de forma alguma, estragar a noite delas.
Por isso, respondi:
Maurício era mais do que legal, mas achei melhor não dar detalhes, ou
minha amiga me encheria de incentivos para eu sair agarrando o homem. Na
mensagem seguinte recebi alguns, aliás, mas encerrei a conversa rápido,
guardando o celular de volta na bolsa.
— Está tudo bem? — ele perguntou, logo depois de beber um pouco de
seu refrigerante. Nenhum de nós optara por algo alcoólico, de fato.
— Ah, sim. Era a minha amiga avisando que estava indo para outro
lugar com o carinha. Perdi minha carona — eu falei brincando. De verdade.
Mas Maurício rapidamente franziu o cenho.
— E como vai voltar para casa? — Fofo. Ele parecia realmente
preocupado. Era esse tipo de homem.
O tipo de homem que poderia mexer facilmente com uma mulher
desavisada, principalmente uma inexperiente como eu.
— De Uber.
Maurício checou seu caro relógio de pulso.
— São quase três da manhã. É perigoso uma mulher bonita voltar
sozinha, em um Uber, a essa hora.
Uma mulher bonita.
Isso não deveria me deixar tão envaidecida, porque era um elogio
simples; um que eu já havia recebido muitas vezes. Mas, de alguma forma,
soava diferente vindo de um cara como ele. Não o conhecia há mais do que
algumas horas, mas tinha a pequena impressão de que Maurício não
distribuía elogios facilmente.
Dei de ombros para o seu comentário.
— É o que tenho. Não posso ficar aqui no bar até amanhã — respondi
em tom de zombaria, dando leveza à conversa, porque não queria que ele
pensasse que eu estava com medo.
Não é que não estivesse, mas eu poderia me cuidar sozinha.
— Eu posso te levar. Não estou de carro, mas pegamos um táxi ou uber
juntos, eu te deixo em casa e depois vou para a minha.
— E onde você mora?
— Aqui na Barra mesmo. — Nós estávamos em um barzinho no bairro
onde ele morava. Ele só podia ser doido.
— Maurício, eu moro na Taquara. — Era um bairro até próximo, mas
ele teria que dar uma volta desnecessária. — Por que raios você iria me levar
em casa, podendo chegar na sua em poucos minutos?
Ele ficou muito sério.
— Porque eu não ficaria com a consciência tranquila imaginando você
indo sozinha. Já te disse... é o que eu gostaria que fizessem pela minha
esposa, se fosse o caso.
A tal esposa. Ele não a mencionara de novo até aquele momento. Não
havia aliança na sua mão esquerda, e daquela vez ele usara de um verbo no
passado para falar dela. Só que não a tratava como ex.
Sentindo-me um pouco mais ousada, decidi perguntar:
— Sua esposa deve ser muito especial — joguei com cautela, mas
imediatamente me arrependi. O semblante de Maurício simplesmente se
transformou. Não que ele parecesse divertido ou leve em algum momento,
porque a amargura era mais do que evidente, porém seu rosto bonito
imediatamente transfigurou-se em uma máscara de seriedade. Quase sombrio.
— Sou viúvo.
Ele não precisou dizer mais nada. Rapidamente soltei um suspiro,
compreendendo o quão sem noção tinha sido a minha pergunta. Por que não
imaginei desde o princípio que havia algo de muito enfático na forma como
ele se referia a ela? Como se houvesse um tom solene, quase nostálgico.
Claro que ele era viúvo. Fazia todo o sentido.
— Desculpa — pedi, abaixando a cabeça, e o ouvi respirar fundo.
— Não, por favor. Não se desculpe. Você não tinha como saber.
Mas poderia ter imaginado, né? Sonsa!
Ficamos alguns instantes em silêncio, mas eu ergui meus olhos para ele
e o vi tão triste, como se precisasse de um alento. Eu, talvez, não fosse a
pessoa certa para oferecer conforto a alguém daquela forma, porque não era
tão boa com as palavras, mas decidi tentar:
— Olha, se quiser falar sobre ela... Posso ser boa ouvinte.
Ele continuou olhando para mim, e seus olhos finalmente se tornaram
mais cálidos. Ternos. Até um sorriso surgiu, e eu me senti quase especial por
merecer um em meio àquela conversa melancólica.
— Obrigado. Mas, não. Você não me falou da sua mãe, não vou falar da
minha esposa. Certo? — Ele ergueu seu copo, como em um brinde. Toquei-o
com o meu.
— Muito justo.
A conversa logo voltou a algo menos pesado, até eu começar a me sentir
um pouco cansada e perceber que o bar estava praticamente vazio. Quando
um dos funcionários começou a arrumar as mesas, eu e Maurício olhamos um
para o outro, rindo.
— Acho que passamos um pouco da hora. — Mais uma vez ele checou
seu relógio e o apontou para mim, o que me deixou boquiaberta. Passava das
cinco.
Daqui a pouco amanheceria.
— Acho que nunca fiquei até tão tarde na rua.
— Talvez seja hora de te levar em casa... — Ele disse isso, e eu assenti,
mas nenhum dos dois se levantou. Nenhum dos dois se mexeu. Apenas
continuamos trocando olhares, como se tivéssemos mais a dizer.
Só que não dissemos.
Maurício pagou a conta, depois de alguma insistência, e chamou um táxi
de um aplicativo de seu celular. Como estava próximo, não demoramos a
entrar nele. Exatamente como prometido, fui levada em casa, e ele saltou em
frente ao meu prédio, pedindo para o motorista esperar um pouco.
Esperou que eu abrisse o portão com a minha chave, com as mãos para
trás, nas costas, cabeça baixa. Quando me virei para me despedir, abri um
sorriso, sentindo-me constrangida.
O que aconteceria? Será que ele iria me beijar?
Por um momento jurei que sim, porque olhou para a minha boca, e um
lampejo de desejo surgiu em seus olhos. Mas foi rápido. Logo os ergueu,
encarando-me.
— Olha, faz muito tempo que eu não converso assim com alguém. Que
não sinto tanto prazer em uma companhia.
Suspirei. Ele realmente era adorável.
— Posso dizer o mesmo. E mais uma vez, obrigada pelo que fez.
Maurício colocou as mãos nos bolsos.
— Não foi nada. — Sua cabeça novamente se abaixou, e eu esperei,
quase desejando que tomasse a decisão de me dar um beijo. Um só. Um
selinho, que fosse, antes da despedida. Mas o que ele fez, de certa forma, foi
melhor. — Vou aparecer no mesmo bar amanhã. Se você quiser mais
algumas horas de conversa...
Eu nem precisava pensar muito.
— Tudo bem. Nos vemos amanhã, então.
Ele sorriu. Novamente um daqueles sorrisos tristes e desanimados, mas
lindos. Ele era lindo.
Levando dois dedos à cabeça, quase batendo continência, ele fez um
sinal de despedida, ainda com a outra mão no bolso, e foi recuando. Entrei no
prédio, para não ficar sozinha do lado de fora àquela hora, e Maurício pegou
o táxi.
Só quando já estava no meu apartamento foi que me lembrei que não
trocamos telefone.
Mas tínhamos um encontro, não tínhamos? Era só esperar que ele
realmente fosse aparecer...
CAPÍTULO SETE
Respirei fundo assim que dei o primeiro passo para dentro daquele bar.
Por um acaso do destino, com o pé direito. Alessandra logo encontrou sua
companhia daquela noite, e eu vi Maurício ao balcão.
Ele estava um pouco diferente naquela noite. Ao invés do paletó
elegante, usava uma jaqueta de couro e jeans, com uma blusa preta. Não que
eu não gostasse da versão advogado, mas os ares de homem perigoso e sexy
combinavam muito.
Tentando parece confiante, agarrei a alça da minha bolsa enquanto
caminhava e fui em sua direção, passo a passo, colocando-me ao seu lado e
pedindo um guaraná para que ouvisse. Esperei que reconhecesse a minha voz,
e foi exatamente o que aconteceu.
Não pude deixar de sorrir quando se voltou na minha direção com
aqueles olhos incríveis cheios de expectativa. Mas eu poderia estar
interpretando completamente errado, não é? Só que não me parecia ser o
caso. Até porque... ele estava ali. Sozinho. Se não estava me esperando, eu
realmente estava completamente equivocada.
— Já vai se embebedar desde cedo? — ele perguntou, e eu ri.
— Uau, você fez uma piada! — comentei, enquanto me acomodava no
banco alto ao lado dele e me ajeitava. — Posso me considerar uma sortuda
por ter o prazer de ver esse seu lado bem-humorado?
Maurício abriu um sorriso de canto e pegou o copo, levando-o à boca e
falando com os lábios próximos ao vidro:
— Lamento te decepcionar, mas não existe um lado bem-humorado. Sou
ranzinza e sem graça na maior parte do tempo.
Dificilmente alguém poderia atribuir o conceito de “sem graça” para ele.
Em nenhum sentido. Talvez fosse realmente um pouco mais sério do que eu
costumava apreciar em um homem, mas eu quase podia jurar que havia um
lado mais leve dentro dele; um que só precisava vir à tona.
Quem sabe algum dia, alguma mulher sortuda teria a chance de ser a
responsável por esse feito?
— Mas me diga, como foi seu dia? — ele perguntou depois de beber de
seu copo, finalmente. A minha bebida também foi servida, e eu agradeci ao
barman.
— Nada de emocionante. Acordei mais tarde do que o normal e separei
algumas coisas para segunda-feira.
— Ah, o grande dia, não é? O início em um novo emprego. Gostaria de
ter a chance de viver essa experiência um dia.
— Como assim? Você nunca passou por isso?
— Não. Trabalho na empresa do meu tio desde que estava na faculdade.
Comecei como estagiário, e hoje sou diretor.
— Ah, então você é uma pessoa de sorte. Não sabe o quanto é
angustiante precisar de um emprego e não conseguir. Ou o quanto é
desesperador participar de um processo seletivo em meio a várias pessoas —
falei com sinceridade, e vi Maurício assentindo. Talvez eu tivesse pegado um
pouco pesado, mas meu tom não era de repreensão, era apenas um
comentário.
— Você está certa. Acho que estou reclamando de barriga cheia.
— Você gosta do que faz?
Seus olhos se voltaram para mim, daquele jeito expressivo, como se ele
não soubesse a resposta. Mas era uma pergunta simples, não era? Não deveria
haver indecisão.
Até que ele deu de ombros.
— Não posso dizer que não gosto, mas nunca foi o meu sonho. Eu
queria trabalhar com defensoria pública — disse em um tom um pouco
nostálgico e assim que terminou de falar, voltou seus olhos para o próprio
copo, brincando com ele, pensativo.
— Não é tarde demais. Você é jovem...
Ele riu.
— Vindo de uma garota quatorze anos mais nova do que eu... isso é um
elogio.
— Não seja bobo. Você é muito jovem. Ainda dá tempo de tentar viver
os seus sonhos.
Só que Maurício novamente ficou muito sério, como se o assunto não
lhe agradasse. Eu poderia parar, é claro, mas jurei que tinha sido ele que o
puxara.
— Não é um sonho que eu tenha mais. Foi assim que Ísis morreu. — Ele
olhou para mim e percebeu minha confusão. Eu não sabia quem era a mulher
que ele mencionou, embora tivesse minhas suspeitas. — Minha esposa. Ela
era defensora pública e foi morta por causa de um caso.
Meus olhos se arregalaram de forma completamente involuntária.
— Meu Deus, eu sinto muito — falei com real pesar, levando a mão
sobre a dele, em cima do balcão, sem nem perceber o que estava fazendo. Os
olhos de Maurício recaíram sobre nossas mãos, e eu tentei recuar, mas ele foi
rápido em me segurar, como se não quisesse que eu pensasse que havia
algum problema em tocá-lo.
Mais do que isso, ele girou sua mão, segurando a minha e entrelaçando
nossos dedos, garantindo-nos uma intimidade que não tínhamos. Olhares se
encontraram por um instante, e foi como se o mundo tivesse parado para nós.
Uma conexão estranha se estabeleceu. Provavelmente era algo da minha
cabeça de mulher inexperiente e deslumbrada, mas foi como se nós dois
estivéssemos sentindo as mesmas coisas.
Os olhos de Maurício se voltaram para a minha boca por um milésimo
de segundo, e eu jurei que seria beijada, mas ele rapidamente desistiu e soltou
a minha mão, remexendo-se em seu banco, como se estivesse incomodado
com algo. Ou livrando-se de algum tipo de pensamento, porque chegou a
balançar a cabeça.
Será que ele pensava que se envolver comigo era um erro? Por que algo
muito similar se passava pela minha cabeça. Sendo viúvo e tão ligado à sua
esposa, Maurício não me parecia o tipo de homem que saía flertando de graça
ou levando mulheres aleatórias para a cama. Mas eu poderia estar enganada,
como já acontecera tantas vezes, inclusive com Álvaro.
— Está tudo bem. É doloroso pensar, mas estou bem. Cinco anos se
passaram, eu já deveria ter superado, não? — Ele abriu um sorriso amargo,
ainda brincando com o copo e olhando para ele como se fosse algo muito
interessante.
— É o que as pessoas ficam te dizendo? — Novamente ele se voltou
para mim, aparentemente surpreso com o meu comentário. — É o que dizem
para mim até hoje sobre a minha mãe. Só que eu nem ligo. Não tem tempo
certo para isso. A gente perde uma pessoa a quem ama, que fazia parte da
nossa vida, e é um vazio que nunca vai ser preenchido. Pessoas são
insubstituíveis. Você pode ser apoiar em outras, encontrar um amor novo,
fazer novas amizades, mas ninguém nunca vai ser igual. Serão amores
diferentes, experiências distintas. — Maurício me olhava com muita atenção,
ouvindo o que eu dizia. Então eu dei de ombros. — A vida segue, é claro. E a
gente precisa continuar funcionando, mas o coração sente.
Maurício respirou fundo e demorou a me responder. Fez tudo o que
podia fazer: novamente mexer em seu corpo, beber um gole, remexer-se no
banco, coçar a cabeça, jogar seu cabelo liso e escuro para trás. Era como se
não soubesse o que fazer com as mãos, mas não quisesse, de forma alguma,
deixá-las paradas.
— Obrigado — falou sem me encarar. Sua voz soava embargada, e eu
precisava admitir que era bastante surpreendente ver um homem como ele,
que tinha uma aura de poder muito evidente, se emocionar daquela forma.
Havia algo de diferente em Maurício, ao menos aos meus olhos. Algo
que poderia mexer comigo, se eu permitisse.
— Como foi que você ficou assim tão sabida? Tem só vinte e três anos.
Abri um sorriso conciliador, tentando não demonstrar o quanto o elogio
tinha me envaidecido.
— Nem sempre a idade determina o quanto uma pessoa sabe da vida.
Não que eu saiba muito, mas sei algumas coisas — falei em um tom
brincalhão, erguendo uma sobrancelha, o que o fez rir. Uma risada discreta,
masculina e transigente.
Por um momento, jurei que ele deveria me ver como uma criança. Uma
menina boba e totalmente inexperiente. O que eu realmente era. Nunca me
importei com a forma como as pessoas me viam, mas naquele momento
queria que Maurício me visse como uma mulher. Alguém a quem ele
poderia... desejar.
Porque poderia ser precipitado, louco e completamente diferente de
como eu me comportava normalmente, mas eu o desejava. E isso me
assustava ao mesmo tempo que fascinava. Era um misto de emoções muito
caótico.
Só que eu não queria a calmaria. Pela primeira vez, eu queria o caos.
CAPÍTULO NOVE
Conversar era algo raro no meu dia a dia. Eu não era um cara muito
falador e um péssimo ouvinte. Então não havia muito sentido em tentar
bancar o sociável e tentar diálogos inúteis, com pessoas que não me
acrescentavam em nada.
Com Carolina, eu poderia passar horas e horas apenas falando e
ouvindo-a.
Era natural, simples, como se compreendêssemos perfeitamente um ao
outro, mesmo que fôssemos quase desconhecidos. Ou talvez esse fosse o
segredo. A falta de intimidade ou o fato de sabermos tão pouco um do outro
tornava mais aceitável a ideia de que eu podia me abrir, mesmo que não fosse
muito bom nisso.
Há quanto tempo eu não falava de Ísis daquela forma? E há quanto
tempo uma pessoa não respeitava que eu ainda sentisse falta dela? Era como
Carolina havia dito, em nossos corações, pessoas são insubstituíveis. Mesmo
que algum dia eu conhecesse outra pessoa, ela fora uma parte da minha vida e
não seria esquecida.
E tudo bem por isso.
Nos últimos tempos eu andava me martirizando por meus sentimentos, e
com apenas algumas palavras uma menina – porque ela era uma menina –
dissera tudo o que eu queria ouvir. E por mais que suas palavras fossem
contra isso, nunca senti tanta vontade de beijar alguém naqueles cinco anos.
Nunca senti tanta vontade de dar uma chance ao destino e recomeçar.
Claro que eu não estava pensando em recomeçar com uma mulher que
eu pouco conhecia, mas... com alguém.
E por que não poderia ser ela? A gente poderia começar devagar, não?
Poderíamos nos conhecer melhor, nos encontrarmos mais vezes até estarmos
prontos. Até eu estar pronto. Até...
Porra, no que eu estava pensando?
Ou melhor... eu nem conseguia mais pensar. Carolina estava falando
sobre um acontecimento engraçado entre ela e a amiga com quem morava, e
eu queria muito prestar atenção, mas era impossível. Aquela boca... Por que
eu estava tão vidrado em sua boca? E também na forma como a movimentava
conforme falava, em suas reações, na delicadeza de seus gestos e no quão
meigo era o seu sorriso.
Ela era linda. Suavemente linda. A vontade de tocá-la se tornava cada
vez mais insuportável.
— Ei, ta tudo bem? — Carolina perguntou subitamente, interrompendo
meus pensamentos. Será que eu tinha ficado calado por tanto tempo? Será
que percebeu que fiquei olhando como um bobo para ela?
Pelo amor de Deus, eu tinha trinta e sete anos. Não estava mais em uma
fase da minha vida onde uma mulher poderia me deixar daquele jeito depois
de passar apenas algumas horas à minha frente, depois de alguns conselhos e
por causa de um sorriso. Eu era mais forte do que isso.
— Sim, tudo. Só fiquei um pouco aéreo de repente.
— Ah... — Carolina se mostrou um pouco constrangida. — Também, eu
estou falando sem parar. — Droga! Eu não queria que ela pensasse isso. Não
tinha nada a ver com seu comportamento, com as coisas que dizia. Carolina
era uma perfeita companhia, em todos os sentidos.
— Não, eu gosto de te ouvir — confessei, mesmo que não fosse
exatamente tudo o que eu queria dizer.
— Bem, seja como for, vou te dar um pouco de sossego — ela disse em
tom brincalhão, mas no fundo, parecia um pouco decepcionada. — Preciso ir
ao banheiro — acrescentou, enquanto se levantava.
Em um impulso, segurei seu braço, tentando ser ao máximo delicado,
mas Carolina se voltou para mim, surpresa.
— Não é melhor eu te acompanhar? Depois do que aconteceu ontem…
acho que vou ficar mais tranquilo.
A expressão de surpresa se transfigurou em um sorriso.
— Acho que não precisa, mas se você quiser ir…
Eu iria, de um jeito ou de outro. Não era apenas o fato de me lembrar de
forma muito amarga do momento em que ela foi agredida pelo ex-namorado
idiota, mas porque tinha adquirido algum senso de proteção para com aquela
garota.
Só que durante o caminho, enquanto passávamos por todas aquelas
pessoas, com a mão pequena dela dentro da minha, mil pensamentos
desconexos começaram a se formar na minha cabeça. Pensamentos que eu
deveria evitar, se quisesse me manter prudente.
Mas o que era a prudência? Quem de nós sabia o que realmente era certo
ou errado na vida? Quem de nós poderia prever o que aconteceria no futuro e
os arrependimentos que teríamos?
Enquanto aguardava Carolina sair do banheiro, essas reflexões foram
causando um caos dentro da minha mente.
Quando ela saiu, com os cabelos novamente penteados e caindo como
uma cortina escura sobre o rosto encantadoramente perfeito, entendi que era
uma questão de escolha: viver ou deixar o arrependimento me consumir.
Peguei-a pela mão e a puxei de volta para dentro do banheiro, fechando
a porta e encurralando-a na parede.
O que me diferenciava do idiota que a agarrou naquele dia? Era um tipo
de assédio, não era? Mas se ela me pedisse para parar, eu o faria, na mesma
hora.
Porra, se Carolina não demonstrasse um mínimo de desejo, eu recuaria.
Se ela apenas sussurrasse a palavra “não”, eu recuaria e pediria desculpas.
Talvez me oferecesse para levá-la em casa e a deixasse em paz.
Só que ela suspirou. E não foi um suspiro negativo.
— Não estava mais aguentando, Carolina. Não sou assim. Não saio
beijando mulheres em bares. Mulheres que pouco conheço — falei em um
sussurro, com o rosto muito próximo do dela.
— Você vai me beijar? — Porra, ela soou tão inocente… Seu olhar se
fixou na minha boca, enquanto eu a sentia arfante. Apesar de alta, era quase
uma cabeça mais baixa do que eu, especialmente porque usava um salto
baixo, e eu tive que me abaixar, embora não quisesse que se sentisse acuada
ou em desvantagens físicas. Devia haver mais de quinze centímetros de
diferença entre nós.
— Se você me permitir... — foi tudo o que eu disse. Apesar do corpo de
Carolina estar respondendo de todas as formas à proximidade do meu, eu
ainda queria ouvi-la dizer que me dava seu consentimento.
— Sim. Eu quero — respondeu convicta, então, tudo o que fiz foi esticar
a mão para trancar o banheiro e avançar sobre ela, colando nossos peitos e
tomando seu rosto, além de roubar seus lábios para mim.
Eles eram macios como pensei que fossem, mas muito mais doces do
que sequer ousei imaginar. Havia um quê de timidez em seu beijo, ao menos
no início, quando invadi suavemente sua boca com minha língua, deixando
que as duas se conhecessem e se encontrassem devagar, explorando nossos
limites.
Só que quando Carolina começou a corresponder... eu apenas não perdi
a cabeça de imediato, porque estava muito focado em manter o controle. E eu
era bom em controle. Costumava gostar de manter tudo em ordem, desde a
minha cabeça – mesmo depois do luto – até meus negócios e minha vida.
Era difícil pensar que uma menina, doce e inocente, pudesse destruir
tudo isso com um único beijo.
Por algum tempo eu consegui manter meu equilíbrio e permitir que
nosso contato se resumisse àquele beijo, embora fosse muito mais do que eu
poderia esperar. Mas foi só deixar as emoções me dominarem por um
segundo – tudo o que foi necessário – para que eu a agarrasse com mais
força, a tirasse do chão e a colocasse sentada sobre a pia do banheiro, onde
nossas alturas ficavam um pouco mais equiparadas, e eu pudesse senti-la se
render muito mais.
Não que eu não estivesse me rendendo.
Como era possível? Jurei que nenhuma mulher mexeria comigo daquela
forma depois que fiquei viúvo, mas lá estava aquela menina inexperiente
transformando cada pedaço de mim em fagulhas de desejo.
O beijo foi longo. E teria sido mais se uma batida na porta não tivesse
nos interrompido.
Era o único banheiro feminino do bar, e nós o estávamos interditando.
Éramos dois loucos. Nunca fiz algo daquela natureza, nunca nem quis, mas,
aparentemente, Carolina estava sendo um ponto de virada na minha vida.
Mesmo que nunca mais nos víssemos – o que me causava um incômodo
imenso só de pensar –, de alguma forma, ela acionara um botão, ligando uma
luz que estava apagada há muito tempo. Minha vontade de viver, de
recomeçar.
— Acho que precisamos sair daqui — ela falou, e eu assenti, ajudando-a
a descer da pia. Abrimos a porta, e eu quase corei de vergonha, mas Carolina
foi mais rápida. — Desculpa, eu estava passando mal, e meu namorado veio
me ajudar.
A mulher do lado de fora não pareceu acreditar muito, provavelmente
porque deveria haver batom na minha boca, e nós dois rimos com sua
expressão contrariada. Deixamos apenas que entrasse no banheiro e saímos
com os dedos entrelaçados, como um casal.
Enquanto nos afastávamos do banheiro, de volta ao balcão, desci meus
olhos para nossas mãos unidas, surpreendendo-me com como parecia natural.
Carolina, aparentemente, estava pensando o mesmo.
— O que você acha de a gente sair daqui? Você quer me levar em casa?
— ela falou subitamente. Aliás, tão de repente que pareceu ser algo de
impulso. Só que não retirou o que disse. Respirou fundo, como se faltasse ar
em seus pulmões, mas logo se recompôs e se mostrou mais segura.
— Quero. Acho uma ótima ideia.
E realmente era. A melhor ideia possível, mesmo que eu soubesse que
isso poderia nos levar ainda mais em direção a um ponto sem volta.
Só não sabia se era uma coisa boa ou ruim.
CAPÍTULO DEZ
Nenhum de nós disse quase nada no caminho até o meu prédio. O clima
estava pesado, mas não de uma forma ruim. Eu sentia Maurício tenso. Seu
rosto de maxilares pronunciados se contraía, e as mãos grandes no volante
pareciam apertá-lo como se estivesse com raiva, só que eu sabia que não era
o caso.
Era desejo. Pela forma como me beijara...
Porque eu nunca fui beijada daquela maneira. Nunca nem sonhei.
Também nunca tinha imaginado que meu corpo poderia reagir quase
descontrolado. Por muito pouco não pedi que fizesse tudo o que podia e o que
não podia comigo sentada naquela pia de um banheiro público – limpo, ainda
bem.
O convite para que fôssemos ao meu apartamento foi completamente
inusitado até para mim mesma. As palavras saíram da minha boca sem que eu
nem me desse conta, e quando percebi Maurício estava olhando para mim,
surpreso.
Mas lá estávamos, seguindo no carro dele, passando pelas ruas na
direção do meu prédio. Quando chegamos, pedi ao porteiro para liberar a
vaga de visitante para ele, e nós entramos.
Maurício estacionou na vaga indicada, e nós saltamos. Pegamos o
elevador, e eu poderia jurar que se olhares fossem capazes de fuzilar alguém,
os nossos causariam a terceira guerra mundial naquele pequeno espaço
confinado.
Caminhamos lado a lado em meu corredor, e o silêncio era quase
sufocante, principalmente porque ele dizia mil coisas. Cada leve som que nos
rondava – nossas respirações, nossos passos, as chaves tilintando na minha
mão, a fechadura sendo aberta, o ranger da porta – era quase como um grito
do universo alertando-nos de que estávamos prestes a causar um abalo
sísmico.
Nenhum dos dois queria ouvir. Eu sabia que ia me entregar a ele naquela
noite. Sabia que acabaria chegando mais longe do que fui com qualquer outra
pessoa.
Porque não era uma questão do que eu tinha guardado por tanto tempo.
Minha mãe sempre me disse que precisava ser com alguém especial, não era?
Maurício, de alguma forma, parecia ser esse alguém. Não um homem com
quem eu esperava ter um relacionamento, porque muito provavelmente nunca
mais nos veríamos, ou teríamos alguns encontros casuais, sem muito
compromisso, mas com alguém que me provocava emoções das quais eu me
lembraria para o resto da vida.
— Espero que não repare a bagunça — pedi, um pouco constrangida,
não apenas pelo que disse, porque o apartamento não estava assim tão mal-
arrumado, mas por toda a situação.
A porta ainda estava aberta quando Maurício levou a mão espalmada a
ela, fechando-a com um baque e me deixando no meio. Seu corpo veio se
aproximando do meu, e ele deixou um beijo suave nos meus lábios. Um
pedido de permissão novamente.
— Não é porque estamos aqui que vou interpretar errado, ok? Mas quero
mais beijos como aquele. Vamos até onde você quiser — ele falou baixinho,
e eu quase suspirei com o tom de sua voz e as palavras gentis.
Eu tinha levado um cara para a minha casa. Um cara que eu pouco
conhecia. Qualquer um sabia que era uma atitude perigosa. E eu era virgem!
Deus... onde eu estava com a cabeça?
Mas novamente isso deixou de ser um problema quando assenti, e
Maurício me beijou.
Nosso segundo beijo não começou doce nem suave como o primeiro
para só depois se tornar um furacão. Poderia ser pelo fato de estarmos entre
quatro paredes e completamente sozinhos, em um apartamento escuro, apenas
iluminado pela luz que vinha da janela aberta da sala, mas Maurício parecia
pronto para me pegar com força.
As mãos foram parar na minha cintura, apertando-me, e eu arfei contra a
sua boca, gostando de toda aquela selvageria. Sua língua não acariciou a
minha, ela a tomou para si, em um movimento intenso e feroz, e continuamos
neste frenesi por minutos infinitos. Meu lábio inferior foi sugado com gana, e
Maurício desceu um pouco, mordendo meu queixo conforme pegava meu
cabelo em seus dedos, arqueando minha cabeça um pouco para trás, enquanto
seu outro braço em minha cintura me puxava para frente, para o espaço de
que ele precisava.
Aquela boca experiente foi descendo pela minha garganta, provocando
arrepios por toda a minha pele, chegando ao meu colo. Jurei que iria afastar o
decote da minha blusa, e ele chegou a agarrar a gola com a mão que estivera
no meu cabelo, mas desistiu pouco antes de realmente fazê-lo, acreditando
que eu não iria permitir.
Mas eu queria... Nossa, como eu queria.
— Maurício... — chamei, mal reconhecendo minha voz de tão rouca e
pesada de luxúria que estava.
— Eu sei, eu sei. Desculpa, estou passando dos limites, mas... porra,
Carolina, há muito tempo eu não quero algo tanto assim. — E eu nunca tinha
ouvido nada soando tão sexy. Era quase um rosnado, o que me dizia que ele
também estava desesperado por mim, como eu estava por ele.
— Não... eu quero. Também quero muito. Não pare.
Ele não precisou de mais incentivo. Com a mão que ainda estava na gola
da minha blusa, ele abaixou o decote, junto ao sutiã, expondo meu seio.
Inclinando-se, tomou o bico na boca, sugando-o e chupando de uma forma
que me deixou rapidamente de pernas bambas.
Imitando o gesto com o outro, Maurício arrancou as duas peças por cima
da minha cabeça, e foi depositando beijos por toda a minha pele exposta,
chegando a se ajoelhar no chão quando chegou à minha barriga, usando
ambas as mãos na minha cintura para me manter no lugar.
Ele usava a língua nos beijos, como se realmente me devorasse. A bolsa
que eu ainda mantinha no ombro caiu no chão, mas nem mesmo o barulho
que ela fez pareceu intimidá-lo.
Suas mãos ávidas começaram a abrir o botão da minha calça e a baixar o
zíper, deslizando o jeans em seguida. Eu tirei as pernas de dentro dele, e
Maurício o lançou longe. Ainda ajoelhado à minha frente, ele simplesmente
rasgou minha calcinha de renda, o que me fez arfar ainda mais.
Não era possível que as primeiras vezes de todas as garotas fossem
assim tão intensas. Ou eu tinha dado muita sorte com o meu escolhido,
porque eu já me sentia completamente excitada. Mais ainda quando seu dedo
buscou meu clitóris, acariciando-o lentamente.
— Vamos mesmo em frente? Tem certeza? — ele perguntou para mim,
erguendo a cabeça para me olhar.
Eu deveria contar a ele que era virgem, não? Maurício provavelmente
precisava saber, porque talvez nem quisesse aquela responsabilidade; só que
no momento em que sussurrei um “sim”, completamente arfante, ele mal me
deu espaço, porque colocou minhas pernas em seus ombros, uma de cada vez,
tirando-me do chão, levando a boca entre elas, fazendo-me experimentar o
primeiro sexo oral da minha vida.
Ok, eu não tinha nada para comparar, mas... pelo amor de Deus, se
aquilo não era a melhor coisa que eu já provei, eu não saberia mais o que era.
Um grito escapou da minha garganta, e eu entendi que estava perdida.
Eram sensações que nunca havia conhecido. Era como me embriagar, estando
completamente consciente de cada segundo.
— Maurício, eu... — Não consegui terminar a frase, porque ele
continuou me chupando com vontade, sem parar, sem me dar trégua, e eu
explodi.
Eu já tinha conseguido chegar a orgasmos sozinha, mas nunca daquela
forma. Nem perto.
Fiquei completamente aérea, mas senti as mãos de Maurício na minha
cintura, tirando-me cuidadosamente de seus ombros, e eu fui erguida no colo,
com uma gentileza absurda.
— Qual é o seu quarto? — ele perguntou, enquanto eu encostava a
cabeça em seu ombro, sentindo-me lânguida e saciada, mesmo querendo
mais.
— O primeiro. Porta à direita.
Maurício me levou e abriu a porta que estava semi-aberta com o pé. Fui
deitada na cama com delicadeza e ergui os olhos para ele, que me analisava
de cima a baixo. Havia uma luz, vinda de algum apartamento próximo, que
tornava o meu quarto bem mais iluminado do que a sala, permitindo-lhe que
olhasse meu corpo com mais clareza. Só que mesmo assim ele não se
contentou e buscou o interruptor.
Seus olhos pareceram escurecer, adquirindo um tom de azul- cobalto, e
ele respirou fundo.
— Você é tão linda.
Era estranho estar tão exposta daquela forma, mas aquiesci com o
elogio, e vi Maurício tirar sua jaqueta e a blusa.
Ok...
Ok...
Uau.
Não havia uma única dúvida de que Maurício era um dos homens mais
bonitos que conheci nos últimos anos, talvez até na vida. Não só pela beleza
física, que era muito evidente, mas por toda a sensualidade que ele emanava.
O charme, os olhares, a voz, o que dizia, seu jeito um melancólico... tudo era
um conjunto. Tudo era um somatório para que ele se tornasse o típico sonho
de consumo de qualquer mulher. O cara perfeito que minhas amigas
descreveram no dia anterior, quando chegamos naquele fatídico bar onde nos
conhecemos.
E lá estava eu, pronta para entregar a minha virgindade ao homem mais
sexy que conheci.
Mordi o lábio inferior enquanto ele tirava o resto da roupa, ficando
completamente nu. Deitou-se ao meu lado na cama, puxando-me para seus
braços, voltando a me beijar, começando lento mais uma vez, doce, terno, até
que rapidamente o furacão emergiu.
Tornamo-nos uma confusão de mãos, e ele colocou a mão entre as
minhas pernas, penetrando-me com um dedo. Arfei, gemendo mais alto do
que gostaria, e ele começou a investir deliciosamente.
Quando me dei conta, já estávamos em outra posição, com ele por cima
de mim, e seu pau na minha entrada. Eu estava bem molhada, desejosa, mas
sabia que iria doer. Então quando ele investiu, por sorte com cuidado, eu
tentei esconder minha dor.
Era errado, é claro, e Maurício percebeu, tentando se afastar
imediatamente.
Olhei em seus olhos e os vi arregalados, mas eu prendi meus tornozelos
ao seu redor, impedindo-o de sair de dentro de mim.
— Por favor, eu quero — afirmei baixinho.
— Você é virgem, Carolina! Isso não é certo. Deveria ser com alguém
especial e...
Levei um dedo aos seus lábios.
— Deve ser com alguém que eu queira. E eu quero você.
Maurício ficou muito sério. Olhando em meus olhos, parecia avaliar se
eu estava mesmo sendo sincera, porque provavelmente deveria ser uma
lógica muito absurda.
Estaria eu ficando maluca? Mas não importava. Eu queria...
— Eu tenho certeza, Maurício — novamente afirmei com convicção e
arqueei os quadris, tentando fazê-lo ir mais fundo. A dor novamente foi
aguda, mas continuei disfarçando-a, e finalmente o senti se movimentar.
— Deveria ter me avisado. Eu teria sido mais gentil — ele parecia
arrependido.
— Tudo bem. Está tudo bem.
Devagar, Maurício foi investindo, e eu queria gemer de dor, mas me
contive. Ele, em contrapartida, grunhiu de prazer quando estava totalmente
dentro de mim.
— Porra! — foi seu comentário, o que me fez sorrir.
Então recomeçou a se mexer, cadenciadamente, estocando com cuidado
até que senti um calafrio gostoso. Este foi se intensificando mais e mais, até
que consegui soltar um gemido de prazer.
Não demorou para que nós dois estivéssemos na mesma sintonia, um
ligado ao outro, e para que eu conseguisse gozar mais uma vez.
Uau... gozar na primeira vez? Era possível?
Logo ele me seguiu, encontrando também seu clímax, e de alguma
forma eu entendi que nunca o esqueceria. Mesmo que tomássemos caminhos
diferentes, Maurício sempre seria especial. Sempre estaria no meu coração.
CAPÍTULO ONZE
Aquela porra só podia ser uma brincadeira. Não era possível que uma
das melhores coisas que acontecera na minha vida nos últimos tempos
escorreria por entre os meus dedos daquela forma.
Não era possível chegar no meu trabalho e descobrir que a linda e
inocente garota que me enlouquecera e que me escolhera para ser seu
primeiro homem era a minha nova secretária.
Pior ainda: a maneira como ela me olhou fora... dolorosa. Era visível
que se sentira tão surpreendida quanto eu, mas não quisera sequer conversar.
Isso me surpreendera. Carolina me dera um ultimato, acabando com todas as
possíveis chances de tentarmos chegar a um consenso e...
Mas que consenso? Que tipo de solução poderíamos encontrar para o
problema além de ela pedir demissão? E por que faria isso, sendo que, de
fato, precisava do emprego e eu era apenas o cara que conhecera dias antes?
Se estivesse no lugar dela também não trocaria o certo pelo duvidoso.
Ainda assim...
Porra, não tinha jeito. Ela era minha secretária. Minha funcionária. O
que eu esperava? Transar com ela em meio à minha sala? Jogá-la sobre
aquela mesa e fodê-la como um animal? Não... Carolina nunca aceitaria, e
nem eu. Não queria desrespeitá-la em seu ambiente de trabalho. Em
contrapartida, o que fazíamos fora da empresa não era da conta de ninguém,
mas ela preferira deixar as coisas no âmbito profissional, e eu precisava
acatar sua decisão.
Fiquei observando-a sair da sala por um tempo e permaneci parado no
mesmo lugar, como se tivesse criado raízes no chão. Quando consegui me
mover foi ao ouvir alguém bater na porta.
Por um momento tive esperanças de que fosse Carolina, querendo
finalmente conversar, mas era Fernando.
Por mais que amasse meu primo e que ele fosse como um irmão para
mim, desde a conversa com nosso tio, ele parecia uma pessoa diferente aos
meus olhos. Ambicioso ele sempre foi, mas algo pareceu explodir dentro de
sua mente. A possibilidade muito palpável de ser o CEO da Antunes Viana
remexeu com seus instintos, e eu podia jurar que sua ambição iria nos
prejudicar como família. Isso sem contar o que seria de Luana, que
provavelmente teria que ceder aos caprichos do marido, como já tinha feito
tantas vezes antes.
Ela merecia mais.
— Ocupado, primo? — perguntou enquanto entrava, embora não tivesse
nem pedido permissão.
— Não, pode entrar.
Fernando fechou a porta e se jogou na cadeira em frente à minha,
enquanto eu fazia o mesmo na minha, afrouxando um pouco a minha gravata,
que parecia me sufocar.
— Já deu uma olhada na sua nova secretária? A menina é linda.
Filho da puta! Não era possível que já estivesse de olho em Carolina.
— Mais respeito com ela — falei em uma voz cortante, sentindo a raiva
se avolumar.
— Ih, olha só! Fica calmo. Já entendi o recado da outra vez, com a
Carla... — Carla era a minha secretária anterior, a que pedira demissão
porque estava grávida e que fora substituída por Carolina. — Não posso
mexer com as suas preciosas secretárias.
Claro que não podia. De alguma forma elas eram minha
responsabilidade, e eu não queria que Fernando as magoasse.
Fosse como fosse, senti meus maxilares se contraírem e fechei minha
mão em punho. Por mais que lhe tivesse alertado sobre não querer que se
envolvesse com minhas secretárias, eu sabia que Carla tinha sido assediada
por ele mais de uma vez.
Se ele fizesse o mesmo com Carolina...
— O que foi, Mau? Você está com um olhar assassino. O que está
acontecendo?
Eu não queria que ele percebesse nada. Então precisei me acalmar, antes
que começasse a fazer perguntas indesejadas, porque eu era um péssimo
mentiroso.
— Está tudo bem. Só tive um telefonema estressante quase agora com
um cliente. Mas vou me acalmar.
— Por que não vamos tomar um café na copa? Talvez te faça bem.
Ponderei. Não sabia se era uma boa ideia, mas aquela sala estava me
fazendo sentir claustrofóbico.
— Vamos. — Ajeitei a gravata e peguei o paletó no encosto da cadeira,
levantando-me.
Saímos os dois da sala, e a primeira coisa para a qual olhei foi para a
mesa de Carolina, só que ela não estava lá.
Fui caminhando em direção ao elevador, para descer para a copa, e lá
estava ela, saindo do banheiro, parecendo um pouco descomposta, mas linda.
Era difícil não me lembrar dela sorrindo, olhando para mim com ternura,
gemendo sob o meu corpo e de seu beijo. Eu queria experimentar um pouco
mais de tudo isso, mas tivemos um ponto final. Fora uma chance que surgiu,
mas que se tornou poeira em um espaço muito curto de tempo.
Na minha cabeça, eu teria apenas a dúvida de como poderia ter sido.
O dia foi interminável.
Por mais que houvesse paredes a nos separar, era como se eu sentisse a
presença dele o tempo todo. Perto demais. Maurício era esse tipo de homem,
que parecia tomar tudo ao redor para si – o ar, meu discernimento, meus
pensamentos – quando estava em um recinto. E o problema era que naquele
primeiro dia já tive um vislumbre de como seriam os próximos. Nós nos
veríamos o tempo todo.
Quando cheguei em casa, joguei-me no sofá, exausta, lançando bolsa,
chaves e celular ao meu lado, tudo espalhado.
— Gente, eu jurei que você ia chegar aqui pulando de felicidade, pela
mensagem que me mandou no almoço. O que houve? Aconteceu alguma
coisa? — Alessandra apareceu na minha frente, de toalha na cabeça, batendo
um bolo.
— Aconteceu. Aconteceu que eu sou a pessoa mais azarada do mundo!
— respondi, com a cabeça apoiada no encosto do sofá, erguida para o teto,
mas de olhos fechados.
— Conta logo o que foi, estou preocupada.
Respirei fundo, sabendo que o que eu estava prestes a contar era tão
absurdo que não poderia ser feito a seco.
— O que você tem de alcoólico aqui em casa?
— Ai, porra! É grave. — Demorou alguns instantes, mas logo a vi ao
meu lado, já sem a bacia do bolo na mão, assim que abri os olhos. — Tem
cerveja na geladeira.
— Não. Mais forte.
— Puta merda, Carol! — Apressada, Alessandra saiu abrindo o pequeno
armário onde guardávamos algumas bebidas. Não tinha muita coisa, porque
éramos mais da vibe cerveja ou baldes de sorvete quando estávamos na fossa,
mas guardávamos uma ou outra garrafa para visitas. Com isso em mente, ela
ergueu uma delas. — Tem uísque. Acho que foi meu pai que deixou aqui
quando veio da última vez.
— Perfeito.
Ela nos serviu uma dose para cada uma, e eu virei a minha de uma vez.
— Vai com calma, mulher. Até onde eu sei você tem que voltar ao
trabalho amanhã. Ou o problema é que deu treta?
— Deu treta. Não sei, realmente, se posso continuar trabalhando lá. —
Alessandra tomou um gole generoso de sua bebida e voltou sua total atenção
para mim. — O Maurício, o cara com quem perdi minha virgindade no
sábado... Lembra?
— Como eu poderia esquecer se eu peguei os dois na cama?
— Pois é. — Virei-me no sofá, completamente para ela, focada. — Alê,
ele é o meu chefe!
Joguei a bomba, e Alessandra ficou olhando para mim como se eu fosse
louca. Não disse nada, apenas peguei o uísque e derramei um pouco mais no
meu copo, querendo beber da garrafa mesmo, mas achando que não seria
prudente.
Quando minha amiga arregalou os olhos, entendi que tinha finalmente
entendido o que eu acabara de dizer.
— Ah, não. Você está brincando! — ela gritou mais alto do que deveria.
— É sério. Quando entrei na sala do diretor jurídico da empresa, quem
estava lá? Ele mesmo. — Lindo, imponente, todo poderoso, mas isso,
obviamente, não lhe falei.
— Puta merda, Carol! Não é possível. Que coincidência de merda!
— Você está sendo sutil, né? É um azar do caralho isso.
— Olha, para você falar um palavrão, não posso nem imaginar como
está se sentindo.
— Estou péssima, Alê, de verdade. — Afundei-me um pouco mais no
sofá, largando o copo antes que partisse para uma terceira dose que realmente
iria me atrapalhar, caso eu decidisse voltar ao trabalho no dia seguinte. —
Não sei o que fazer.
Alessandra imitou minha posição, e nós duas nos vimos largadas no
sofá, como duas derrotadas. Mas minha amiga não demorou muito tempo
naquela posição, porque se sentou de um pulo, com um dedo erguido, como
se tivesse acabado de ter uma ideia.
— Você sabe sim o que fazer amanhã. Você vai colocar sua roupa mais
bonita, vamos deixar esse cabelo lustroso que nem veludo, arrasar na make e
você vai aparecer naquela empresa tão bonita que aquele babaca vai se
arrepender de não ter lambido o chão que você pisa.
— Aparentemente ele teve motivos para não ligar. Além disso, fui eu
que decidi cortar qualquer ligação que não fosse profissional.
Alessandra revirou os olhos.
— Eles sempre têm motivos, amiga. Mas você vai dar um para ele se
arrepender de ter nascido com um pau entre as pernas e não poder usar mais
essa sua bocetinha agora quase virgem.
Não era exatamente um plano que me agradasse, mas era um começo,
né? Talvez pudesse transformar aquela história em algo divertido para rirmos
no futuro, quando eu já tivesse superado Maurício e pronta para seguir em
frente, sem mágoas, sem arrependimentos.
CAPÍTULO QUINZE
Não foi assim tão simples quanto eu e Alessandra pensamos que seria.
Mas fui superando aos poucos. Apesar de eu ser sua secretária, Maurício
evitava ao máximo que ficássemos sozinhos, principalmente com a desculpa
de que Débora ainda estava me treinando, e ela precisava estar presente para
me ajudar com as tarefas.
Quando precisava falar comigo, ele vinha à minha mesa ao invés de me
chamar em sua sala, e esses eram momentos difíceis. Não era apenas um
comportamento meu, mas Maurício também parecia mexido. Mais ainda
porque Alessandra continuava com sua ideia de me embelezar todos os dias
para eu chegar à empresa parecendo pronta para uma sessão de fotos de uma
propaganda de xampu ou de uma marca de cosméticos.
A forma como ele me olhava era de deixar qualquer uma de pernas
bambas. E isso se tornou mais evidente em um dia em que apareci usando um
vestido em um tom de vermelho-escuro, quase bordô. Nem era meu, mas da
minha colega de quarto, só que ele realmente se moldava ao corpo, tinha um
decote discreto, e era elegante, mas sensual. Eu poderia jurar que meu
querido chefe ficou sem fala ao me ver.
Só que não foi só ele.
Fazia mais ou menos dois meses que eu estava trabalhando na Antunes
Viana. Apesar do climão que se formava sempre que eu e Maurício
ficávamos cara a cara, estávamos conseguindo lidar bem com as coisas e
tocarmos nosso trabalho sem problemas. Eu tinha muitas tarefas, e Débora já
tinha voltado para seu posto, deixando-me por sua conta, porque já estava me
virando bem sozinha.
Aquele era o dia do vestido vermelho. Não eram muito mais de dez da
manhã quando consegui finalmente me levantar da minha mesa, depois de
adiantar algumas coisas urgentes da agenda de Maurício – confirmação de
reuniões, conferência de e-mails e organização de correspondência, que eram
minhas tarefas matinais –, parti para a copa, para tomar café da manhã.
Era uma empresa muito boa de se trabalhar. Todos os dias havia pão e
frios para os funcionários comerem, além de bebidas à vontade na geladeira.
Eu tinha conhecido o Sr. Geraldo no terceiro dia de trabalho, e ele era um
senhorzinho fofo, acolhedor e muito gentil. As pessoas, no geral, eram
simpáticas, e eu tinha me dado bem com todo mundo.
Ou quase. Por algum motivo havia algo que não me agradava em nada
em Fernando Antunes. Sentia uma malícia muito desagradável na maneira
como se dirigia a mim, e me incomodavam seus olhares. Por mais que
Maurício também me dirigisse alguns cheios de desejo, ele ainda tentava
esconder e se sentia mal com isso – ao menos pelo que eu podia perceber –,
além de me tratar com o máximo de respeito. Já Fernando... ele parecia gostar
de ser o galanteador. Seu comportamento com Débora era muito sem noção,
e eu o via tocar nela mais do que o necessário.
Só que ela permitia e parecia gostar. Às vezes eu suspeitava que os dois
tinham um caso, mas não era da minha conta.
Estava preparando meu café, naquela manhã, sozinha na copa, o que era
quase um milagre, mas sabia que estava acontecendo uma reunião grande,
com a presença de vários setores, então o movimento estava calmo.
Infelizmente minha solidão e calmaria não duraram por muito tempo.
— Bom dia, Carol. — Virei-me na direção da voz e vi Fernando
entrando, com aquele sorriso que ele achava que era extremamente sedutor,
mas que gritava que se tratava de um baita de um canalha. — Você está
muito bonita hoje.
— Obrigada, Seu Fernando.
Aproximando-se para pegar uma caneca no armário do qual eu estava
muito próxima, ele se colocou perto demais, a uma distância muito
incômoda.
— Ah, para com essa formalidade, amor. Não sou assim com as meninas
da empresa.
Aquilo me deu raiva. Odiava aquele tipo de homem, principalmente
sabendo que era casado. Sua esposa fora na empresa uma vez, e ela era
extremamente doce, bonita e simpática.
— Não gosto de intimidade. E, me desculpa se for uma ofensa, mas não
te dei liberdade para me chamar de amor — falei sem filtro, mesmo sabendo
que isso poderia me custar alguma coisa. Suspeitava que Maurício não me
repreenderia, muito menos me demitiria por isso, mas Fernando era seu
primo, seria a palavra dele contra a minha.
O homem ficou bastante chocado com minha afirmativa tão veemente.
Pensei que isso pudesse pará-lo, mas aparentemente ele não se intimidava ou
desistia tão fácil.
— Calma, princesa. Não mordo. — Então ele abriu um sorriso de canto,
malicioso, que me pareceu ridículo. — A não ser que você peça.
Como alguém poderia ser tão previsível?
Decidi não responder, porque poderia acabar falando algo que iria me
prejudicar na empresa. Então, apenas peguei minha caneca e a levei para o
outro lado da copa, onde ficavam o açúcar e o adoçante, felizmente bem
longe dele.
Não tive nem dois minutos de sossego e o senti atrás de mim, como uma
sombra. Tão perto que quando falou, senti sua respiração no meu pescoço, já
que eu estava com o cabelo preso em um coque.
— Fala que você não veio toda linda assim, de vermelho, para chamar a
atenção de alguém. Se não sou eu, é o Maurício? Ele não vai te dar bola,
lindinha. É o homem de gelo. Pode até te querer para uma trepadinha, mas
ainda está preso à esposinha morta.
Que horror. Que coisa feia de se falar de um primo e desrespeitar a
memória de alguém. Por mais magoada que eu pudesse estar por Maurício
não ter se importado mais conosco, não queria que ele fosse tratado daquela
maneira. Mas mais do que isso, não queria aquele homem invadindo o meu
espaço.
— Se o senhor não sair de perto de mim, vou gritar e processá-lo por
assédio — falei bem firme, mas ele pareceu não se importar. Fechou a mão
no meu braço, girando-me. Apoiando-se no balcão, ele fechou meus espaços
de saída, encurralando-me e aproximando o rosto demais do meu.
— Vai nada. Depois que eu te der um trato, você vai gostar. Vai até
pedir mais.
O filho da puta ia me beijar. No meio da empresa. No meio da copa.
Sem a minha autorização. O que diabos ele estava querendo?
Sem nem pensar no que fazia, peguei a caneca de café e joguei na sua
blusa. Provavelmente o tecido fino não iria protegê-lo de se queimar, e o
impacto fez com que se afastasse de mim de um pulo.
— Piranha! — ele falou baixo. Apesar do descontrole, sabia que estava
errado e que eu poderia contar uma história bem convincente. Com certeza
outras mulheres tinham sofrido o mesmo tipo de assédio e iriam me entender.
— Olha só o que você fez! Que merda! Que merda! Vai me pagar por isso,
Carolina. Não vai durar aqui mais nem uma semana!
Resmungando baixinho, ele tomou o caminho para fora da copa, e eu
levei minha mão ao balcão no qual tinha sido encurralada minutos antes, para
me firmar, sentindo uma vertigem de tão nervosa que estava.
Precisei de alguns instantes, até que Débora surgiu na copa, colocando-
se ao meu lado e pousando a mão no meu ombro, delicadamente,
— Carol, o que foi? Você está pálida! — ela comentou, com seu jeitinho
atencioso, mas eu tentei me recompor ao máximo, empertigando-me e
ajeitando meu vestido. Ao fazer isso, percebi a mancha de café no chão.
— Derramei café, sem querer, no Seu Fernando. Acho que ele ficou
irritado — menti. Não sabia o quão leal ela era ao chefe, especialmente por
achar que os dois tinham algo mais do que uma relação somente profissional.
— Ah, fica tranquila, ele é super bonzinho. Vai entender. Provavelmente
nem vai contar para o Maurício.
Assenti, sentindo-me ainda um pouco aérea. Sem nem dizer mais nada a
Débora, saí da copa, andando como um zumbi, enquanto minha cabeça
girava.
Talvez uma melhor ideia fosse ir ao banheiro, desabafar olhando no
espelho e tentar me recompor, antes de voltar para a minha mesa, mas tudo o
que eu queria era me sentar. De alguma forma aquela conversa e a forma
como fui assediada me abalou mais do que eu imaginei.
Mal me dei conta de como cheguei à minha mesa e apenas me joguei na
minha cadeira, ouvindo-a ranger. Algumas lágrimas escaparam dos meus
olhos, e eu me senti extremamente sensível, mais do que nunca, ao menos por
um motivo razoavelmente banal.
Ou não, né? Que mulher gostava de ser molestada em seu próprio
ambiente de trabalho? Mais do que isso, que sabia que, sendo o sobrinho do
dono da empresa, seu abusador teria poder suficiente para colocá-la no olho
da rua. E eu realmente estava gostando do trabalho, apesar dos pesares.
Queria continuar na empresa e tentar crescer. Era a minha sobrevivência.
Levei ambas as mãos ao rosto, tentando escondê-lo, aproveitando que a
empresa estava calma por causa da tal reunião e que nem mesmo Débora
tinha voltado da copa.
Chorar não deveria ser a opção, mas foi o que aconteceu. Não pude
evitar...
— Carolina? O que houve? — a voz aveludada e gentil me tirou do
transe, fazendo-me erguer os olhos.
Lá estava Maurício, mais bonito do que meus olhos poderiam suportar, e
eu nem sabia o que iria explicar. O que aconteceria se eu contasse a verdade?
Eu só iria saber se decidisse por ela.
CAPÍTULO DEZESSEIS
Minha raiva ainda não estava cem por cento controlada quando retornei
à minha sala, mas foi só ver Carolina sentada em uma das cadeiras, com a
cabeça mergulhada nos braços, que estavam apoiados sobre a mesa, para que
eu perdesse o foco. Entrei em silêncio, fiquei observando-a por algum tempo,
parado, meio que sem saber o que fazer.
Talvez todo o tempo que passei escondendo-me de outras pessoas e
usando minha viuvez como desculpa para não tentar viver minha vida como
ela deveria e poderia ser vivida tivesse arrancado de mim as noções de como
agir em situações como aquela, mas… porra! Uma garota tinha sido
molestada debaixo do meu nariz. Na verdade, pela segunda vez, já que nos
conhecemos mais ou menos da mesma forma. Isso me fazia pensar quantas
vezes uma mulher, especialmente sendo bonita como Carolina, não deveria
vivenciar situações como aquela.
Mesmo sem saber muito bem como agir, aproximei-me e coloquei a
mão em seu ombro, o que a fez sobressaltar-se e olhar nos meus olhos. Não
estava mais chorando, mas havia sinais que inegavelmente diriam que passou
algum tempo vertendo lágrimas. Era doloroso de se olhar.
— Como você está? — perguntei, mesmo sabendo que era estúpido. Ela
claramente não estava bem, mas queria que percebesse que eu me importava.
— Bem. — Ela não conseguiria convencer ninguém com aquela
resposta, mas ergueu os ombros, esforçando-se visivelmente para tentar. Era
algo admirável. — Já posso voltar ao trabalho. — Levantou-se da cadeira e
ajeitou a saia de seu vestido vermelho.
Dizer que eu não tinha reparado no quanto ela estava ainda mais bonita
naquele dia seria hipócrita da minha parte. Provavelmente deveria ser o
comentário da empresa inteira, porque a cor lhe favorecera de uma forma
impressionante. Além disso, o vestido marcava os contornos delicados de seu
corpo, agarrando-se a ele como uma segunda pele. Não havia decote
profundo, o comprimento era discreto, mas sem dúvidas acendia a
imaginação.
Eu não era imune a ela. Se fosse qualquer outra mulher, apenas pensaria
que se tratava de uma jovem atraente e simplesmente seguiria em frente. Mas
ela, não. Embora lutássemos ao máximo para fingir que nada nunca tinha
acontecido, Carolina fora minha, ao menos por uma noite. Ela me entregara
sua virgindade, e isso não era algo que se esquecia facilmente.
— Eu vou te levar em casa — falei com autoridade. Não queria soar
controlador, mas queria que acatasse minha ideia, porque precisava
descansar. A situação com Fernando a abalara demais, tanto que por mais que
parecesse melhor ainda havia um resquício de palidez em seu rosto.
— Não é nem meio-dia ainda — ela informou, como se eu não soubesse.
— Tenho muitas coisas para fazer.
Não era exatamente verdade. Por mais que mantivesse uma secretária,
eu gostava de checar também a minha agenda, de ter uma autonomia no meu
trabalho, por isso sabia que não havia nada muito urgente para fazer, além do
contrato que eu precisava enviar e que poderia fazer de home-office. Ela
então, menos ainda.
— Pegue suas coisas. Vou te levar. Também vou para casa, dar o dia
como encerrado. Não estou a fim de encarar Fernando mais hoje.
Carolina ficou parada, confusa, mas continuei firme, com minha decisão
tomada.
— Tudo bem, você é o chefe, não é? — falou com um pequeno desdém,
e eu quase revirei os olhos. Ela podia ser muito charmosa e meiga quando
queria, mas também sabia ser teimosa.
Eu não sabia até que ponto isso me incomodava e o quanto me seduzia.
Saindo da sala, ela fechou a porta e me deixou lá dentro, voltando alguns
minutos depois com sua bolsa e um casaco, colocando-se diante de mim,
completamente pronta.
Respirei fundo, fazendo um movimento para que ela passasse em
direção à porta, na minha frente, e nós dois saímos da sala, que eu tranquei,
sabendo que não voltaria mais ao escritório naquele dia. Era completamente
raro que deixasse o trabalho mais cedo, mas meu clima para continuar na
Antunes tinha sido arruinado.
Todos os olhos se voltaram para nós no momento em que passamos.
Fernando, por exemplo, parou diante da porta de sua sala. Decidi não me
voltar para ele, para não me estressar ainda mais, e apenas conduzi Carolina
até o elevador, onde descemos e partimos para o estacionamento. Ao passar
pela recepção, foi a mesma comoção. Eu sabia que ela estava um pouco
constrangida, mas não disse absolutamente nada.
Aliás, Carolina não abriu a boca durante todo o caminho para seu
prédio. Volta e meia eu a olhava de soslaio, checando-a, mas seu rosto estava
completamente voltado para a janela do carro, observando a paisagem, como
se houvesse algo de muito importante lá fora.
Chegando à sua rua, ela já começou a tirar o cinto de segurança,
parecendo muito ansiosa para sair de dentro do meu carro.
— Obrigada pela carona — ela falou exatamente no instante em que eu
embiquei diante da garagem de seu prédio.
Carolina tentou abrir a porta para sair, mas eu não a destravei. Então ela
olhou para mim, surpresa.
— Vai me deixar trancada aqui?
— Claro que não. Só quero subir, te levar lá em cima. Te entregar à sua
amiga sã e salva.
Ela suspirou, e eu não conseguia entender suas reações, mas decidi
esperar para que me dissesse o que estava se passando por sua cabeça, que se
abrisse comigo. Talvez eu estivesse pedindo demais, porque éramos chefe e
funcionária, e ela provavelmente não se sentia tão íntima para conversar.
— Alessandra não está em casa. Ela viajou ontem para ver o pai. Ele
mora em outra cidade — foi mais explicação do que julguei que ela daria.
— Mais um sinal de que preciso te levar lá em cima. Pode liberar a
entrada do carro? — Carolina suspirou mais uma vez, assentindo.
Abri a janela do meu lado e deixei que ela falasse com o segurança. Ele
parecia conhecê-la, porque rapidamente liberou a entrada.
Estacionei, deixando o carro na mesma vaga de visitante da outra vez, e
a segui até o elevador.
Diferente de meses atrás, quando fui à sua casa, havia um clima
completamente pesado. Carolina se colocou em um canto, distante de mim,
mas sem a aura de sedução da primeira vez. Naquele momento era apenas
animosidade e constrangimento.
Quando saltamos, chegamos em seu corredor e logo à sua porta.
Carolina vasculhou a bolsa atrás das chaves, encontrando-as e colocando a
correta na fechadura.
— Você não precisa entrar comigo. Já estou aqui, segura. Obrigada —
enquanto falava, ela ia abrindo a porta, sem olhar para mim. Deu alguns
passos, e eu realmente cogitei deixá-la em paz, já que não parecia nem um
pouco interessada em minha companhia, mas ela se segurou na parede,
próxima à entrada do apartamento, soltando um gemido.
— O que foi? — perguntei, colocando-me ao seu lado. Ela estava
novamente pálida, e eu decidi que havia algo de errado. — Eu deveria ter te
levado ao hospital.
— Não! — exclamou com veemência, enquanto deixava a bolsa sobre
um aparador. — É o estresse. Eu estou bem. Só preciso descansar...
Sim, poderia ser o estresse. Depois do que ela passou com Fernando,
principalmente, mas, além disso, há dois meses, até onde eu conseguia
perceber, vivia em constante alerta, tentando gerenciar nosso relacionamento
de chefe e secretária sem que nossa única noite juntos o prejudicasse.
Vinha fazendo um trabalho melhor do que o meu, aliás, porque eu mal
conseguia olhar para ela sem ter vontade de carregá-la no colo para a minha
sala e convencê-la de que poderia haver mais para nós dois. Provar que eu
ainda a desejava de uma forma quase dolorosa.
E por falar em pegar no colo...
Apesar do som de protesto que saiu de sua boca, ergui Carolina nos
meus braços, levando-a para o quarto e para a mesma cama onde eu a tive na
primeira e única vez. No momento em que me inclinei para deitá-la
cuidadosamente, nossos rostos ficaram muito próximos, e foi inevitável
pensar nos beijos que trocamos naquele mesmo lugar. Em tudo o que
fizemos. Em tudo o que eu ainda queria ter feito, se tivesse tido oportunidade.
Antes que cometesse uma imprudência, tirei seus sapatos, colocando-os
ao lado da cama, cobrindo-a. Fazia muito tempo que eu não cuidava de outra
pessoa e tinha me esquecido do quanto era gratificante fazer isso.
— Por que não descansa? Vou fazer algo para comermos. Não sou um
bom cozinheiro, mas um macarrão eu consigo preparar — disse e comecei a
me dirigir à sua porta, pronto para deixá-la dormir um pouco.
— Maurício, calma! — Ela se sentou na cama, fazendo-me parar. —
Isso não está certo. Você é meu chefe!
Abri um sorriso desanimado. Ela não estava errada, é claro, mas queria
que pelo menos se esquecesse daquele detalhe por um instante.
— Só dentro da empresa. Aqui fora podemos ser amigos, não podemos?
Ela ficou em silêncio. Considerei sua resposta como um sim e saí do
quarto, fechando a porta e deixando-a sozinha.
Quando acordasse, nós teríamos muito a conversar. Talvez estivesse na
hora de estabelecer nossas regras e limites, e entender o que ainda estava
acontecendo conosco, porque eu sabia que nenhum dos dois era imune ao
outro. E não seria de um dia para o outro que conseguiríamos nos livrarmos
das lembranças.
Ao menos eu não estava pronto para desistir.
CAPÍTULO DEZOITO
Sorri com o elogio, como uma garota boba. Eu não queria ficar assim.
Ainda não sabia exatamente o que iria acontecer conosco, e sabia que se
houvesse uma desilusão, eu sofreria.
Coloquei o telefone de lado, corroendo-me de vontade de responder algo
mais fofo, mas sem coragem. Só que o aparelho vibrou em seguida com outra
mensagem.
UM ANO DEPOIS
A cena era muito familiar para mim, embora por motivos muito
diferentes. Seis anos atrás eu me vi andando de um lado para o outro, pelos
corredores de um hospital, com a notícia de que minha esposa tinha sido
baleada. Pareceu tão irreal na época que eu me lembrava de cada passo que
dei até chegar a alguém que me informasse qualquer coisa.
Era o mesmo hospital. O motivo, diferente, mas nem por isso mais feliz.
Luana estava perdendo seu segundo bebê em um ano. Era pouco mais de
meia-noite, e ela não encontrara Fernando em lugar nenhum. Celular fora de
área, ela não fazia ideia de onde ele estava, então ligou para mim. Nem
hesitei.
Ao chegar em sua casa, ela me atendeu, e eu vi o sangue. Cheguei com
ela nos braços no hospital, enquanto a sentia chorar contra o meu peito. Não
precisávamos de confirmação para o que já sabíamos.
Fiquei com ela durante todo o tempo e a levei para casa, conduzindo-a
pelas escadas com cuidado e colocando-a na cama. Sentei-me ao seu lado,
cobrindo-a e sentindo meu coração se despedaçar com seu choro. Já estava
quase amanhecendo, e nada de Fernando aparecer em casa.
— Ele tem feito isso constantemente? — perguntei, vendo Luana
desmoronar do meu lado, escondendo o rosto nas mãos, respirando
profundamente para tentar se acalmar.
— Quase todas as noites. Eu não sei mais o que fazer... Não sei. E agora,
então... — Na primeira vez em que perdera o bebê, Luana se culpara. Ou
melhor, meu primo ficara tão decepcionado com ela que não restava muitas
dúvidas a respeito de qual era seu posicionamento naquela situação.
Peguei a mão dela, apertando-a.
— Ei, Lu... olha para mim. — Ela o fez, parecendo cansada e muito
triste. — Não é culpa sua.
— Como não, Mau? É o segundo. E se eu não puder conceber?
— A pergunta mais importante não é essa... Você quer esse filho?
Não era a primeira vez que a questionava sobre aquilo, mas eu sabia que
Fernando enchia sua cabeça de ideias absurdas sobre eu estar tentando
convencê-la a não ser mãe, porque eu queria ganhar a posição de CEO. Como
se eu estivesse tentando muito ser pai... A última mulher que levei para cama
foi Carolina.
Luana hesitou em responder. Para mim era o suficiente, mas esperei que
dissesse alguma coisa. Soltou minha mão, baixou os olhos para seu colo e
respirou fundo.
— No início eu não queria. Jurei que não estava pronto. Mas desde que
tive o primeiro aqui — ela levou a mão à barriga, em um gesto maternal e
muito doloroso —, algo mudou. — Seus olhos enormes e vermelhos do choro
se voltaram para mim. — Eu não queria perder os bebês, Mau. Fernando deu
a entender isso no primeiro, que foi a minha má vontade em ser mãe que
causou o aborto, mas eu juro. Já amava aquele bebezinho. E este aqui... —
Luana balançou a cabeça em negativa, corrigindo-se: — Aquele lá... eu
também amava.
— Eu sei, querida. Você vai ser uma ótima mãe. Mas sabe o que eu
penso sobre essa situação toda.
Ela sabia porque lhe contei. Depois que Carolina foi embora, eu e
Fernando tivemos uma briga ao ponto de que não nos falávamos mais.
Novamente o deixei com algumas marcas dos meus socos no rosto e abri o
jogo com Luana sobre todas as traições e todas as merdas que o marido fazia.
Infelizmente ele dissera a verdade, e a mulher sabia de tudo. Estava mais do
que claro que vivia um relacionamento abusivo, que não conseguia perceber
o quanto Fernando era tóxico.
Eu ainda tentava descobrir o que ele dissera para Carolina que a fizera
partir daquela forma. A mulher sumira do mapa, e nem sua amiga – a colega
do quarto – queria me dizer o que tinha acontecido com ela. Provavelmente o
que me impedia de esquecê-la e de seguir em frente era, não apenas o fato de
que a garota mexera comigo, como também eu sabia que havia algo de muito
errado. Um segredo, uma artimanha que nos separara.
— Eu sei, mas...
Naquele momento, ouvi um barulho de porta batendo. Era muito cedo,
mas mesmo assim Fernando não tinha a decência de chegar silenciosamente
para não acordar sua esposa – que ele achava que ainda estava grávida.
Quando entrou no quarto, totalmente desalinhado, e me viu ali, sua
expressão demonstrou exatamente o que ele deveria estar pensando.
— O que está fazendo aqui, na minha cama, com a minha mulher? — Só
que ele nem me deixou responder. Partiu para cima de mim, tentando chutes
e socos aleatórios, que não acertavam seu alvo de maneira alguma, porque
estava mais bêbado do que um gambá.
Sem muito esforço, consegui imobilizá-lo e explicar, enquanto a pobre
da Luana parecia assustada e pálida como um fantasma.
— Escuta aqui, seu idiota... sua esposa acabou de perder o bebê. Você
não atendia ao telefone, então eu vim acudi-la. Chegamos do hospital há
alguns minutos. Tenha algum respeito por ela — minha voz soou como um
rosnado, e eu soltei Fernando de forma nada delicada, jogando-o no chão.
Completamente atordoado, ele olhava de mim para Luana, que já tinha
recomeçado a chorar. Subitamente seu olhar se voltou para o chão, e eu não
sabia se um lapso de consciência entrara no meio de sua embriaguez,
proporcionando-lhe um pouco de sobriedade ou se era exatamente a bebida
que o deixava ainda mais confuso. Ficou parado por alguns instantes, até que
se levantou e se sentou ao lado de Luana, abraçando-a.
Aquilo me surpreendeu. Mais ainda quando começou a chorar. De
alguma forma, não me convencia de que estivesse tão triste pela perda do
bebê em si. Chegava a ser ridículo que a mulher que merecia ser confortada
depois de passar horas em um hospital, depois de ter seu corpo invadido por
uma curetagem – sem contar todos os traumas que isso não deveria gerar –, e
que o homem precisasse de colo como um bebê, muito provavelmente porque
se foi sua chance concreta de agarrar seu maior objetivo.
Eu esperava estar enganado e que Fernando realmente quisesse ser pai,
que fosse bom para qualquer criança que viesse a nascer.
Com a cabeça do marido em seu peito, acariciando seus cabelos, Luana
fez um sinal para mim, como se quisesse que eu fosse embora para lhes
deixar sozinhos. Não sabia se era prudente, porque temia que quando a
realidade viesse à tona, ele novamente a culpasse e fizesse algo pior. Só que
não poderia ir contra a sua vontade.
Sendo assim, deixei o quarto e, consequentemente, a casa, esperando
que os funcionários não demorassem a chegar, porque não confiava naqueles
dois sozinhos.
Peguei meu carro e achei que seria prudente dar uma volta. Não queria
voltar para o meu apartamento, para a minha solidão. Para a certeza de que eu
não tinha o que meu primo possuía e que tratava com tanto desdém.
Parei diante da praia, decidindo caminhar um pouco no calçadão,
mesmo estando de jeans, tênis e uma camiseta preta, em um dia que tinha
potencial para ser ensolarado, no Rio de Janeiro, embora estivéssemos no
inverno. Coloquei meus óculos escuros e me atrevi a parecer um turista na
minha própria cidade.
O mar parecia revolto, terminando na imensidão do horizonte, nunca se
cansando de ir e vir. Diferente dele, eu estava exausto. Não apenas
fisicamente pela noite mal dormida, mas por muitas coisas. Da vida que eu
estava vivendo. Do que eu poderia ter vivido.
Fernando vinha fazendo da minha vida um inferno há muito tempo.
Desde que Carolina fora embora, além desse desespero de ter um filho, ele
tentara minar meu relacionamento com meu tio de todas as formas. Era uma
guerra velada, e eu não tinha a menor vontade de lutar. Esse não era o meu
maior objetivo.
Na verdade, eu nem sabia mais qual era, a não ser descobrir algumas
verdades que ainda estavam pendentes.
Foi pensando nisso que continuei caminhando. Afastei-me um pouco do
meu carro e retornei sentindo o sol começar a esquentar.
Voltei para o meu prédio quando já passava das nove, e estava louco
para ir para casa e tomar um banho, aproveitando que era sábado, mas no
momento em que embiquei na guarita, o porteiro fez um sinal para que eu
parasse, tanto que demorou a abrir o portão.
— Seu Maurício, tem uma pessoa te esperando no hall.
Uma pessoa? Eu não fazia ideia de quem poderia ser.
— Qual o nome?
— Carolina, senhor.
Carolina?
Não era possível.
Seria a minha Carolina?
O pensamento passou e desapareceu da minha cabeça no mesmo
instante. Ela não era minha, mas eu ainda queria saber se era aquela Carolina.
A que não saía da minha cabeça, mesmo que nosso relacionamento tivesse
sido curto demais e que estivéssemos sem nos vermos há um ano.
— Ok. Avise a ela que já cheguei. Vou estacionar o carro e já volto. —
Nem esperei que o porteiro falasse qualquer coisa, apenas aproveitei o portão
sendo aberto para entrar, estacionar e saltar com pressa, pegando as escadas
para voltar ao andar térreo, já que eu estava no subterrâneo.
No momento em que a vi, de costas, com o cabelo um pouco mais curto,
na altura dos ombros, mas ainda com a mesma cor de ébano familiar, meu
coração deu um salto no peito, e eu precisei parar. Toda a pressa que tive
antes desapareceu, e eu decidi congelar aquele momento.
Não fazia ideia do que ela estava fazendo ali, mas foi naquele exato
segundo que decidi que faria qualquer coisa para que ficasse, que
permanecesse e para que não fugisse de novo. Faria tudo para descobrir o que
a fizera ir embora.
— Carolina? — chamei, e eu poderia jurar que tudo começou a
acontecer em câmera lenta.
Ela se virou para mim com uma lentidão quase dolorosa.
E foi então que eu percebi duas coisas: uma que havia um enorme
hematoma em seu rosto.
A segunda? Ela trazia um bebê nos braços. Um menininho, que era
quase uma cópia exata de mim mesmo.
CAPÍTULO VINTE E DOIS
No exato momento em que fui deitada na cama, eu soube que não queria
que Maurício apenas me colocasse para dormir.
Aproveitando que se inclinou para me deitar, com todo o cuidado,
agarrei o tecido de sua blusa e o puxei para perto, arqueando as costas para
lhe roubar um beijo.
Deus, como eu o queria...
Aparentemente o sentimento era recíproco, pois a forma como tomou
minha boca para si foi quase como se quisesse fazer amor com ela, enquanto
não fazia com o meu corpo.
Eu amava os beijos de Maurício. Adorava a forma como ele sabia
conduzi-los, demonstrando seus desejos aos poucos. Desde o dia anterior,
quando nos reencontramos, ele foi terno, cuidadoso e delicado. Ali, na cama,
depois de receber praticamente uma intimação, senti que estava sendo
devorada.
Agarrando-me com firmeza, ele nos girou, deixando-me por cima,
segurando minhas coxas para que ficasse montada em seus quadris. Eu não
sabia nada sobre o que deveria fazer, caso as coisas fossem mais longe, mas
confiaria que Maurício saberia me conduzir.
Suas mãos se esgueiraram até a minha bunda, que estava empinada, para
que eu pudesse continuar beijando-o, e ele a apertou com vontade, enquanto
mordia o meu lábio inferior, chupando-o deliciosamente. Ergueu o tecido do
meu vestido, para que pudesse tocar minha pele sem empecilhos, e eu senti
uma de suas mãos na frente do meu corpo, afastando o tecido da minha
calcinha.
— É o que você quer? Ou estou interpretando errado? — perguntou
antes de fazer qualquer coisa, o que, por si só, já me conquistava mais do que
seus beijos e toques.
— É o que eu quero.
Foi tudo o que eu precisei dizer para que seu dedo experiente
encontrasse a fenda entre minhas pernas, penetrando-me e se remexendo
dentro de mim, como se buscasse algo. No entanto não demorei a entender o
que ele desejava encontrar.
Quando aconteceu, eu gemi tão alto que foi difícil acreditar que o som
tinha saído da minha própria boca.
Não houvera mais nenhum homem na minha vida. Maurício fora o
único, aquele a quem me entreguei pela primeira vez. Só que por mais que eu
tivesse muito a agradecer por ter sido carinho