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FIGURINHA DIFICIL PORNOGRAFANDO E SUBVERTENDO PLINIO MARCOS - ‘Administraio Regional Jo SENAC no Estado de Sao Paulo ‘Presidente do Conselho Regional: Nbram Szajman Dinetnn do Departamento Regional: Luiz Francisco de Assis Salgado “Béitra SENAC Sio Paulo Geréncia: A. P. Quatim de Moraes Coordenagie Editorial: Marizilda Lourene® “Assisifncia Editorial: Wilda de O. Pereira (Capa Maina M. Watanabe Fotor: Vera Attaxo Projto Gro e Fltoragho Btetrénica: Bseitsio Braslro de Anes SENAC Sto Paulo 208 - 4 andar - CEP 0122-903 "CEP 0160-970 - Sio Paalo - SP SUMARIO é, se Ihe parece. rinha dificil... ygrafando e subvertendo ... ASSIM E, SE LHE PARECE (A titulo de prefacio) ‘Topei com o Plinio Marcos em meados de 1988. Eu era coordenador- geral de Comunicagao ¢ Marketing da Nossa Caixa-Nosso Banco e esti vamos desenvolvendo um projeto cultural na rea de Teatro, o “Arte em Cena”. Tratava-se do patrocfnio snual de uma montagem teatral que era mostrada durante um més na Capital e depois percorria cerca de 35 cida- des do Interior do Estado, em mais trés meses Eu dividia com Paulo Drummond, atore diretor, a supervisto do pro- Jeto e haviamos chegado a conclusiio de que deverfamos, pata consolida- lo, partir do principio de que ele teria que ser respeitado amado, para comesar, peta propria gente do Teatro, Para atingir esse objetivo especifico, adotamos uma estratégia de envolvimento da gente de Teatro no projeto, por meio da multiplicagao de iniciativas de apoio financeiro © material a uma série de atividades relacionadas com o fazer teatral, especialmente a divulgacio dos es- ppeticulos em cartaz. Patrocinévamos “tijotinhos”, imprimiamos programas ‘ecarlazes na grifica do banco, recebfamos sem formalidades e conversi- ‘vamos franca © demoradamente com qualquer pessoa de Teatro que ti- ‘vest um projcto a nos oferecer. E Sbvio que nfo tinhamos condigdes de ‘ender a todos os pedidos. Mas tentavamos passar a todos que nos pro~ curavam, pelo menos, uma certeza: a Nossa Caixa era amiga do Teatro, Naquela altura do ano de 1988 nossa avaliacZo erade que o projeto ia muito bem. Excursiondvamos pelo Interior paulistacom Aré onde a vista alcanca, produgio do grupo Lux in Tenebris com texto e diregio de Reinaldo Santiago. Mas no estévamos completamente satisfeitos. A Diretoria do banco havia mudado no primeiro scmesire, quando a edigio 88 do projeto j4 estava em execugio. O presidente Flavio Chaves, que hhavia dado total apoio & idéia, demitira-se. O empresétio Nildo Masini, novo presidente do banco, cra aparentemente simpatico ao projeto, Mas ‘sso talvez. nao fosse suficiente - como se verificou menos de dois anos epois - para garantir a continuidade do “Arte em Cena’, 9 Nossa preocupagao, portanto, era encontrar um meio de garantir 0 apoio da nova Diretoria 20 “Arte em Cena/89”, que jé estava todo plane- {ado e prometia ser um sucesso ainda maior. Para fazer a cabeca dos novos diretores do banco, acabou pesando decisivamente uma anilise de clipping que nos era fornecida por uma empresa especializada e que demonstrava, com a frieza dos niimeros que (9s banqueiros apreciam, que 0 noticidrio positive gerado pelo “Arte em Cena’ havia conseguido praticamente neutralizar os efeitos negativos para ‘a imagem do banco que o entdio recentfssimo “escindato da raspedinha havia provocado. Bra praticamente um milagre! Decidimos, entdo, fazer a festa completa. Programamos para o encer ramento da temporada de 88, em setembro, um grande evento no Teatro Sérgio Cardoso, no qual farfamos a Gltima apresentagio de Aré onde a vista alcanca sob 0 patrocfnio da Nossa Caixa, mas que teria como ponto alto uma homenagem do “Arte em Cent” ao Teatro, personalizado em alguém unanimemente reconhecicio como uma grande expressio do meio teatral. (0 escathido acabou sendo Plinio Marcos, que # essa altura ja estava envolvido conosco, Procurando atraf-lo - trata-se de um grande rul- tiplicador de opinio! - eu havia me apresentado a ele numa mauirugada de julho, no restaurante Gigetto, e convidara-o a nos fazer uma visita pata discutirmos uma maneira de ele colaborar com o “Arte em Cena” Dias depois, o Pinio apareceu em meu gabinete na sede do banco © entrou no assunto de sola, como ¢ de seu feitio: =o seguinte: se voed est mesmo a fim de trabalharmes juntos, a me thor maneira é descolar uma gran. Afinal, sto aqui é um banco, nilo €? ‘Tenho tr8s propostas e vocé pode escolher qualquer uma, ou tedas que eu ri ‘you ficar triste. Primeira: vocés imprimem de graga af na sua grifica alguns esses meus livtinbos que eu vendo por ai, Segunda: voces patrocinam um ‘show meu, uma pega, qualquer coisa. Patroctnio completo. Tereeire: tii {ois que eu possuo, 0 dnico bem que eu tenho, io 0s meus textos; ent, et ‘um texto meu aqui, por uma grana gue a gente combina, Pode tet “gerteva de que vai ter a maior repercussao legal na Imprensa. 0 ver aquela figura singular saindo da sala, eu ndo sabia se per- 1a perplexo ott continuava fascinado, Penhorar, colocar "no prego” jpoca de Teatro! Que idéia genialmente maluca! A assessoria jurfdica 1ico teria espasmos de édio e certamente gastaria resmas de papel provar o aparentemente dbvio: era uma idéia absurda. Mas deveria ‘uma maneira de se viabilizar aquela irresistivel doidice, Que fan~ {co lance promocional para o banco! Havia sé um pequeno problema: Caixa nfo tinha carteira de penhor... Quem tem é a Federal. Por aanto, nada feito. nar um show ou uma peca também no dava. Afinal, patrocfnio prio negocio do “Arte em Cena’ ¢ af a coisa esbarrava em con- jeia, regulamento, etc. mprimir uns “livrinhos” também nao me pareceu uma bos idéia. S6 fensar, por exemplo, numa edigao de Mancha raxa com a logomarca, anco impressa na capa... Melhor ni fas, entre os “livrinhos” que o Plinio havia me dado, encontrei, na Sintitulado Cangdes ¢ reflexdes de um palhaco, 0 pequeno texto “O ‘tas 70 linhas de uma vigorosa © ao mesmo tempo singela e xa declaracio de amor ao ator, que termina assim: “Amo os por eles amo o teatro e sei que & por eles que o teatro € etemoe ais sera superado por qualquer arte que tenha que se valer da ali! Bra exatamente o que procurévamos. Num estalo, toda a lu pronta, clara, em nossas cabegus: fazemos um belo poster sxto de “O ator” mais a foto ea assinatura do Plinio; distribuimos sier entre a gente de Teatro, como um presente do banco; por direitos autorais, “descolamos” a grana. E mais: 0 Plinio sera 0 homenageado na festa do “Arte em Cena”, na qual “O ator” ser sthor ainda, interpretado por um grande nome do palo. ni o Plinio para Ihe expor a idia. Como estava na ears que ele dar, eu jé encomendara a crisgiio do cartaz com o texto, a foto e 45 duas ltimas gentilmente fornecidas pelo Emilio Fontana. ! Providencici uma prova.e antes de o Plinio chegar deixei-a mente semi-enrolada sobre a mesa da sala de reunides. Quando miciado, pedi & secretéria que 0 introduzisse na tal salae dei um 1 {tempo antes de entrar, Abr silenciosamente a porta por detris dele ¢ obser: ‘yei-o por alum tempo. Curvado sobre a mesa, tendo nas miios © paster de- senrolado, ele estava visivelmente surpreso. E, tenho certeza, emocionalo, ‘Quando afinal entre, cle imediatamente reassumin seu papel predileto, FE declarou ~ numa alusdo a0 fato de a Nossa Caixa ser um banco oficial =» afetando um tom de deboche que mal disfargava sua satisfagio: 0 governo jé me fez de tudo, principalmente me censurar € manditt prendet. Mas é a primeira vez.que ele me presta uma homenagem! Entao ele se deve ter dado conta de que estava traindo a emogaig @ calou-se. Igualmente emocionado, também fiquei sem saber 0 que dizer Permanecemos algum tempo ali: no meio da sala, parados, meio seit jeito, olhando em silencio para o poster. Nao me lerabro de quem ‘omen ‘a iniciativa de retomar a conversa, Provavelmente foi ele. Mas sinto que aqueles segundos de clogilente mudez inauguraram uma relagao met de respeito e afeto. Comegou entio a “negocingo”. Propus adquirir os direitos auroral do texto para o fim espeetfico de reproduzi-to num cartaz promocional ddo qual parte da tiragem seria cedida ao autor, o senhor Plinio Marcos Barros, que desse material poderia dispor da mancira que melhor | aprouvesse, provavelmente vendendo-o no varejo junto com seus fumo s08 “livrinhos”, que foi 0 que evidentemente aconteceu. E a outra p ‘maior, da tiragem de ndio me lembro mais quantos posters, a Nossa Cal usaria para distribuir como brinde, a seu exclusive critério. Pela cess esses direitos a Nossa Caixa pagaria ao autor, em moeda corrente @ vista, a quantia de - Plinio, quanto & que voce quer pelo texto? - Sei la... Diz af quanto tu quer pagar. Bu também no sei, Plinio. & uma coisa muito relativa. Acho que melhor maneira de a gente se entender é vocé dar seu prego c eu avall se posse pagar ou ndo, Se vor8... ~ Ta bom, té bom! E 0 seguinte: 0 meu filho Kiko esté aprendentl 2 nete, cle é bom paca, ¢o professor falou que o clarinete que ele esta ndo é uma merda, precisa outro melhor. Quero dar um elarinete novo - E quanto custa? = Acho que uns trezentos paus. Esti. bem, Fechamos entdo por trezentos? + Falou. je nfo sei dizer exatamente quanto valiam trezentos mil crazeiros cruizeiro mesmo) em meados de 1988. S6 sei que nao era muito, Era fos quc o meu saldrio. Nao sei se daria para comprar um clarinete . Mas o fato é que cheguei conclusio de que, afinal, estivamos indo poueo, mesmo considerando que cle teria algumas centenas de para vender. E acabei concluindo também que, definitivamente, 4 do senhor Plinio Marcos ndo era mesmo dinheiro. as semanas depois, na Bienal do Livro, no Ibirapuera, encontro jovo amigo postado num daqueles corredores apinhados de gente, do seus “livrinhos”... e os cartazes. Achei que era uma boa oca~ The contar a grande novidade: durante a festa no Teatro Sérgio dali a alguns dias, o texto sobre o ator seria interpretado pela ache. Dois dias antes ela aceitafa pronta e alegremente partici- aqui. Eu acho a Irene uma puta atriz. Seria uma honra ela ler 0 ‘Mas niio esti certo, porra! Quem tem que ler esse texto é a ‘sangue gelou. E agora? Sem considerar que em termos de prestigio syento o nome da Irene era muito mais significativo, eu no via a

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