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O que tem sido chamado de lei, axioma ou principio de Kerckhoffs é, na verdade, uma
combinação da segunda e terceira condições de uma lista de seis que August
Kerckhoffs, engenheiro holandes que trabalhou na França, formulou como desejáveis à
criptografia militar, no século XIX. Ou, alternativamente, o que tais condições fazem
presumir.
O artigo original, publicado em duas partes nas edições de janeiro e fevereiro de 1883
da revista Journal des sciences militaires, tem um exemplar arquivado na Biblioteca
Britânica, e uma versão digitalizada deste exemplar talvez ainda disponível em
http://www.petitcolas.net/fabien/kerckhoffs/la_cryptographie_militaire_i.htm. Pelo
menos enquanto o responsável pelo site, Fabien Petitcolas, não sofrer perseguição
medieval similar à que ora sofre o professor argentino Horacio Potel por difundir
conhecimento.
...; dans le second (une méthode de cryptographie destinée à régler pour un temps
illimité la correspondance des différents chefs d’armée entre eux), il faut un système
remplissant certaines conditions exceptionnelles, conditions que je résumerai sous les
six chefs suivants:
Todos parecem de acordo com a razão de ser das três últimas condições, mas nem todos
parecem concordar que as tres primeiras sejam desejáveis. É assim que pessoas
autorizadas admitem que a absoluta indecifrabilidade da cifra não seja considerada
condição necessária para seu uso em aplicações militares; ...
Kerckhoffs diz, com a 2ª condição: para aplicações militares é desejável que o sistema
criptográfico possa cair em mãos inimigas sem desvantagem para sua utilidade ("sans
inconvénient", no segundo critério desta condição), conforme esclarece a leitura
completa do capítulo II. Ou seja, o projeto e a implementação do método ou sistema não
devem requerer sigilo (conforme o primeiro critério), e portanto, o sigilo que lastreia a
1ª condição deve estar (considerando a 3ª condição) concentrado apenas em chaves
intercambiáveis. Isto não equivale a dizer, como extrapolam alguns, que para tais
aplicações é desejável que o sistema criptográfico esteja em conhecimento público;
apenas que possa estar, sem desvantagem para sua utilidade (o que seria uma vantagem
em relação a sistemas que não podem).
Portanto, o que tem sido chamado de lei ou princípio de Kerckhoffs pode referir-se a
duas acepções distintas: ou àquilo que Kerckhoff enumerou, no capítulo II, como
conjunto de condições desejáveis a qualquer método ou sistema criptográfico
militarmente aplicável; ou à existência de métodos e sistemas satisfazendo tais
condições, que ele presumiu possível no último capítulo (IV), ao referir-se a tal
conjunto como requisito para projetos militares, e pela forma com que encerra o artigo,
ao afirmar que acredita ter encontrado um método satisfazível mas cujos detalhes não
deveria ainda revelar.
Ou seja, não haverá sistema capaz de proteger, em eleição processada e apurada apenas
eletronicamente, o sigilo do voto e a corretude da apuração ao mesmo tempo (na mesma
eleição). Nesta tese algumas condições definidoras, tais como a de propiciar
convencimento pessoal sobre a integridade de um processo de contagem de votos, ou
sobre a verificabilidade de sua correção, se compõem com critérios cuja validação
remete a processos de significação. A começar pelo sentido de "saber contar" ou de
saber "acompanhar somas". Avaliar tais critérios por denominador comum, buscando a
objetividade, leva a esta interpretação da tese de Mercuri.