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CARACTERIZAÇÃO EXPERIMENTAL DO COMPORTAMENTO DINÂMICO

DE BARRAGENS DE BETÃO COM BASE NA SUA MONITORIZAÇÃO EM


CONTÍNUO

Paulo Mendes C. Oliveira Costa J. Almeida Garrett


Assistente Inv. Principal Inv. Coordenador
ISEL LNEC LNEC
Lisboa Lisboa Lisboa

Sérgio Oliveira
Investigador Auxiliar
LNEC
Lisboa

SUMÁRIO

Actualmente muitos dos sistemas de observação das grandes barragens portuguesas estão em
fase de revisão e modernização, numa perspectiva de adaptação às crescentes exigências de
segurança e de optimização de recursos. Neste sentido a tendência actual é para a instalação
de sistemas de Recolha Automática de Dados (RAD) com vista à automatização de alguns
procedimentos de observação, envolvendo não só a automatização da leitura das principais
grandezas tradicionalmente observadas em cada obra, como também a medição em contínuo
de grandezas dinâmicas (nomeadamente acelerações, ver Figura 1) que permitam caracterizar,
em tempo real, o comportamento dinâmico das obras sob acções sísmicas, sob acções devidas
ao funcionamento dos órgãos de descarga e de exploração ou sob acções associadas ao
denominado ruído ambiente (trânsito local, condições meteorológicas, trabalhos na zona
envolvente, etc.). O Departamento de Barragens de Betão e o Centro de Instrumentação
Científica do LNEC, com o apoio da FCT, estão actualmente a desenvolver um sistema de
monitorização em contínuo do comportamento dinâmico de barragens, estando prevista a
instalação de um primeiro protótipo na barragem do Cabril, durante o próximo ano. Neste
trabalho apresentam-se alguns resultados de ensaios de vibração ambiente efectuados na
barragem do Cabril com vista à obtenção de elementos experimentais para fundamentar as
decisões de projecto do futuro sistema de monitorização dinâmica, discutem-se sumariamente
as vantagens deste novo tipo de sistemas, e apresentam-se as principais características do
sistema que se pretende instalar pioneiramente na barragem do Cabril.
5,0

4,5 Modo 3

4,0
Frequência (Hz)

Modo 2
3,5

3,0

2,5
Modo 1
2,0

166 180 200 220 240 260 280 297


Cota da água (m)

Figura 1: Observação e análise do comportamento dinâmico de sistemas barragem-fundação-


albufeira.

Palavras-chave: Barragens; monitorização dinâmica em contínuo; aquisição e transmissão de


dados; frequências próprias; modelos numéricos.

1. INTRODUÇÃO

A caracterização experimental do comportamento dinâmico de barragens de betão tem vindo a


ser efectuada através de dois tipos distintos de ensaios: i) ensaios de vibração forçada, que se
baseiam na medição da resposta da estrutura quando sujeita a uma excitação artificial
controlada; ii) ensaios de vibração ambiental, em que é medida a resposta da estrutura a
acções ambientais, ou seja, as acções a que está submetida em condições normais de
funcionamento.
A crescente preocupação em avaliar continuamente as condições de segurança estrutural de
barragens em idade avançada associada aos recentes desenvolvimentos tecnológicos ao nível
dos equipamentos de medição e aquisição de vibrações abriu caminho ao desenvolvimento e
implementação de sistemas para a monitorização da resposta de grandes barragens de betão
aos diversos tipos acções dinâmicas que podem ocorrer durante a sua vida útil.

A grande importância económica e social destas obras justifica o desenvolvimento de


sofisticados sistemas para a monitorização do seu comportamento dinâmico, em contínuo.
Com estes sistemas pretende-se:
i) complementar os actuais sistemas de observação de barragens com aparelhagem que
permita a caracterização em tempo real da resposta dinâmica das obras ao logo da sua vida
(a caracterização em contínuo da resposta às acções estáticas tem sido, na generalidade
dos casos, o único objectivo dos sistemas de observação instalados em obra);
ii) obter elementos experimentais que possibilitem uma adequada identificação das
características dinâmicas do sistema barragem-fundação-albufeira sob acções dinâmicas de
serviço caracterizadas geralmente por uma baixa intensidade, o que é fundamental para o
desenvolvimento e calibração de modelos numéricos de elementos finitos 3D para estudos
dinâmicos em regime linear (note-se que as características dinâmicas deste tipo de sistemas
apresentam variações significativas associadas às variações da cota de água da albufeira);
iii) observar a resposta dinâmica de grandes barragens sob acções sísmicas de intensidade
significativa com vista à obtenção de elementos que permitam a calibração de modelos de
elementos finitos 3D para simulação do comportamento das obras sob este tipo de acções,
envolvendo fenómenos não lineares como sejam a abertura e fecho de juntas e a ocorrência
de roturas por tracção (e, eventualmente por compressão) ;
iv) obter elementos experimentais que permitam contribuir para uma melhor caracterização de
eventuais fenómenos de deterioração com base no pressuposto de que estes fenómenos
podem induzir alterações estruturais que influenciam os parâmetros modais (frequências
próprias, configurações e amortecimentos modais); é de referir, neste ponto, que devido à
conhecida relação de proporcionalidade entre as frequências próprias e a raiz quadrada do
módulo de elasticidade, apenas importantes alterações de rigidez poderão influenciar de
forma significativa as frequências próprias das estruturas (este tipo de alterações pode
ocorrer de forma gradual, em grandes períodos de tempo, ou, pontualmente, devido a
acções de acidente; a ocorrência de alterações ao nível das configurações modais também
pode ser detectada neste tipo de estruturas quando ocorrem alterações estruturais
significativas, como o aparecimento de fendas profundas [1].

Neste trabalho referem-se as principais características de um sistema de monitorização


dinâmica em contínuo que está actualmente a ser desenvolvido no LNEC, com apoio financeiro
da Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT), o qual será pioneiramente instalado na
barragem do Cabril (a maior barragem portuguesa - 132 m de altura máxima acima da
fundação – que entrou em serviço há mais de 50 anos) [2]. Salienta-se o interesse destes
sistemas na perspectiva do controlo da segurança de barragens ao longo do tempo,
nomeadamente porque tornam possível identificar as variações progressivas dos parâmetros
dinâmicos do sistema barragem-fundação-albufeira. Estas variações dos parâmetros dinâmicos
estão associadas não só às variações cíclicas da cota da água (e possivelmente, às variações
térmicas anuais) como também podem ser correlacionadas com alterações estruturais (estas
associadas a acções de acidente, como é o caso de sismos intensos, ou a processos de
deterioração ao longo do tempo - p.ex. deterioração provocada pelo desenvolvimento de
reacções expansivas do betão) o que poderá ser de grande interesse do ponto de vista do
controlo da segurança estrutural. A informação obtida com este tipo de sistemas de
monitorização do comportamento dinâmico de barragens será utilizada para desenvolver e
calibrar, continuamente, modelos numéricos adequados que permitam a simulação do
comportamento estrutural das obras.

2. COMPORTAMENTO DINÂMICO DE BARRAGENS ABÓBADA

As barragens são unanimemente consideradas como estruturas que apresentam um grande


risco potencial. A análise e interpretação do seu comportamento estrutural é, geralmente
complexa pois depende do estudo integrado do sistema “barragem-fundação-albufeira”. Nesta
secção serão descritas as principais particularidades das três componentes do sistema
“barragem-fundação-albufeira”, na perspectiva de melhor compreender o comportamento
dinâmico de grandes barragens abóbada [3, 4].

Figura 2: Sistema barragem-fundação-albufeira.

Em termos estruturais, o “corpo” das grandes barragens abóbada é bastante rígido, sendo
constituído por um conjunto de grandes consolas separadas por juntas de contracção verticais.
Devido às juntas a rigidez global destas obras aumenta para situações de albufeira cheia,
como consequência dos movimentos de fecho destas, verificando-se o oposto para a albufeira
vazia, uma vez que nessa situação a rigidez global diminui, como resultado dos movimentos de
abertura das referidas juntas.
Em termos de comportamento dinâmico, devido à sua elevada rigidez, as grandes barragens
abóbada têm normalmente frequências naturais de vibração “altas”, quando comparadas com
outras estruturas de engenharia civil,. Por outro lado, como consequência da existência das
juntas e da variação do nível da albufeira, o aumento da rigidez da abóbada reduz os períodos
de vibração (as frequências naturais aumentam), em oposição, a redução da rigidez da
abóbada origina aumentos dos períodos de vibração (as frequências naturais diminuem).

No entanto, a influência da albufeira no comportamento dinâmico do sistema barragem-


fundação-albufeira, não se restringe só ao facto de se encontrar associada às variações de
rigidez. Interfere essencialmente em mais dois aspectos extremamente importantes, ou seja,
contribui com massa e amortecimento para o sistema. Para situações de albufeira cheia a
massa do sistema aumenta originando diminuições das frequências naturais do conjunto; para
as situações de albufeira vazia a massa do sistema diminui e consequentemente as
frequências naturais tendem a aumentar. Quanto ao amortecimento, um fenómeno menos
estudado, admite-se geralmente que este aumenta com a subida do nível de água.

A sobreposição de todos estes efeitos manifesta-se no comportamento não linear destas obras,
essencialmente devido ao facto de o nível da albufeira se encontrar constantemente a variar
em função dos níveis de exploração pretendidos pelas entidades que gerem o seu
funcionamento e claro das condições climatéricas (chuvas). Como consequência o
comportamento dinâmico das barragens está continuamente em mutação, pelo que a sua
monitorização em contínuo é de todo o interesse para o controlo da segurança

3. MONITORIZAÇÃO DE BARRAGENS EM CONTÍNUO

Desde sempre existiu a necessidade de observar a evolução das principais grandezas físicas
fundamentais para analisar e interpretar o comportamento estrutural de barragens. Tem sido
usual recorrer a campanhas de observação periódicas (dependendo a periodicidade, da
grandeza física a observar), verificando-se actualmente uma tendência no sentido da
instalação de sistemas de Recolha Automática de Dados.

Este novo conceito de monitorização em contínuo reduz, o risco sério de incidentes (ou
acidentes) e diminui os custos de manutenção dispensando actividades de inspecção
desnecessárias. No entanto, a Recolha Automática de Dados, por si só, não chega: é
indispensável desenvolver modelos numéricos que permitam interpretar esses dados e assim
acompanhar, de facto, a evolução do comportamento observado.

A observação do comportamento dinâmico destas obras tem-se processado recorrendo a


observações periódicas utilizando: ensaios de vibração forçada e ensaios de vibração
ambiental. No entanto, devido ao facto destes ensaios serem efectuados episodicamente, a
informação obtida é escassa não permitindo caracterizar adequadamente o seu
comportamento dinâmico. Então, só se poderá obviar esta situação recorrendo aos mais
recentes desenvolvimentos tecnológicos e procedendo à monitorização do seu comportamento
dinâmico de forma contínua.

A medição contínua de grandezas dinâmicas (p. ex. acelerações) implica a instalação de um


sistema de monitorização constituído essencialmente por sensores, unidades de aquisição,
concentradores de dados, cabos, computador, ligação à internet e um conjunto de outros
acessórios que poderão depender de caso para caso.

No entanto, a concepção global de um sistema de monitorização dinâmica em contínuo, para


barragens, depende em muito das especificidades deste tipo de estruturas, nomeadamente no
estabelecimento dos designados critérios de projecto (do sistema de monitorização). Tratam-se
de estruturas muito rígidas em que as amplitudes das vibrações medidas são normalmente
muito pequenas. Existe a necessidade de adquirir registos longos para obter melhor resolução
em frequência, este aspecto é particularmente importante quando existem modos de vibração
com frequências muito próximas. É ainda útil recorrer a frequências de amostragem elevadas
para melhorar a relação sinal/ruído, verificando-se nestas circunstâncias uma melhor
separação (clarificação) entre o conteúdo energético que se concentra nos picos
correspondentes aos modos de vibração e o restante conteúdo energético que corresponde ao
designado ruído.

4. BARRAGEM DO CABRIL

4.1 Descrição da obra

A barragem do Cabril é constituída por uma grande abóbada de dupla curvatura fundada num
maciço granítico. Apresenta uma geometria em planta aproximadamente simétrica e tem a
particularidade de apresentar uma zona de maior espessura ao nível do coroamento entre
encontros (Figura 3). O perfil central tem uma espessura na base de 20,2 m, junto ao soco e
uma espessura mínima de 4,5 m à cota 290 m na concordância com a zona do coroamento,
elevação a partir da qual a largura aumenta linearmente até 8,3 m na cota máxima (297 m)
como se pode ver na Figura 3.

(m)
IID ID A B C D E F G H I J K L M N O P Q R S T U V IE IIE 297
290

270

250

230

210

190

170

Figura 3: Alçado e corte pela consola central.

Foi construída no rio Zêzere entre Setembro de 1952 e Dezembro de 1953. O primeiro
enchimento iniciou-se no princípio de 1954, e decorreu durante cerca de dois anos.
Logo na fase inicial de exploração foi detectada nesta obra uma significativa fissuração
horizontal no paramento de jusante (essencialmente segundo as juntas de betonagem), numa
faixa situada entre os 10 m e os 20 m abaixo do coroamento [5]. Em 1981, depois de analisado
o comportamento estrutural, de investigações complementares na fundação, de ensaios de
materiais e de simulação por modelos físicos e numéricos para determinar as causas da
fissuração, foi decidido levar a efeito trabalhos de reparação. Os referidos trabalhos consistiram
no tratamento da fundação, na injecção das juntas de contracção e no tratamento das fendas
com injecções de resina após a caracterização das respectivas aberturas e profundidades.
Com o reenchimento da albufeira verificou-se que a obra tornou a fissurar na mesma zona.
4.2 Ensaios dinâmicos “in-situ”

Recentemente foram efectuados três ensaios de vibração ambiental na barragem do Cabril (ver
Quadro 1), os quais permitiram obter resultados experimentais úteis para a compreensão do
seu comportamento dinâmico. Verificou-se no entanto, a necessidade de recorrer a diferentes
técnicas de identificação modal [6, 7, 8], para interpretar adequadamente o comportamento
dinâmico observado [5].

Quadro 1: Ensaios de vibrações efectuados na barragem do Cabril.


Ensaio Data Cota da albufeira (m)
Vibração forçada 1981 (obras) 196.0
Vibração forçada Nov. 1996 263.5
Vibração ambiental Fev. 2002 267.0
Vibração ambiental Mai. 2003 290.0
Vibração ambiental Out. 2003 269.0

A informação experimental obtida foi extremamente útil para calibrar os modelos numéricos
utilizados no estudo do comportamento dinâmico da barragem, no entanto é ainda insuficiente
para esclarecer algumas questões, nomeadamente a influência real da albufeira no sistema
“barragem-fundação-albufeira”. Essas questões pendentes, já referidas anteriormente, só
poderão ser esclarecidas com a ajuda de um sistema de monitorização em contínuo, baseado
na tecnologia utilizada nos ensaios de vibração ambiental.
0.004

0.003

0.002

0.001
ç
raa ]
o[g

0.000
c
Ale
e

-0.001

-0.002

-0.003

-0.004
0 250 500 750 1000 1250 1500 1750 2000 2250 2500
t [s]

Figura 4: Registo de acelerações, ensaio de Fevereiro de 2002, com grupos em funcionamento


(fase inicial) sucedida da fase em que estes são desligados.
A realização destes ensaios também teve como finalidade, ajudar a estabelecer os critérios de
projecto para o sistema de monitorização em contínuo, que se encontra ainda em fase de
desenvolvimento e que se apresenta numa das secções seguintes. Na figura seguinte
apresenta-se um espectro normalizado de valores singulares das densidades espectrais.
Figura 5: Aspecto geral de um espectro normalizado de valores singulares das densidades
espectrais, ensaio de Fevereiro de 2002 com grupos em funcionamento.

Em face da análise e interpretação dos resultados experimentais obtidos concluiu-se ser


necessário manter a aquisição de registos longos para obter uma boa resolução em frequência,
principalmente devido ao facto de o 1º e o 2º modos de vibração terem frequências muito
próximas (como se pode verificar na figura anterior).

Face às baixas amplitudes das vibrações medidas para as situações em que os grupos de
produção de energia se encontravam desligados, é aconselhável utilizar frequências de
amostragem elevadas de maneira a melhorar a relação sinal/ruído.

4.3 Interpretação do comportamento. Modelo de E.F.3D

A interpretação do comportamento dinâmico observado deve ser efectuada recorrendo à


utilização conjunta de metodologias de identificação modal e de modelos numéricos de
elementos finitos. Neste sentido foi já desenvolvido um modelo de elementos finitos
tridimensionais (tipo cubo, isoparamétricos de 20 pontos nodais) do conjunto barragem-
fundação–albufeira (Figura 6) no qual o efeito hidrodinâmico da água é considerado através de
massas de água associadas de Westergaard e em que se admite que não existem juntas de
contracção, e que o betão (massa específica γ=24 kNm-3) é um material homogéneo e
isotrópico de comportamento elástico linear com módulo de elasticidade E = 33 GPa e
coeficiente de Poisson ν=0,2. Para a fundação rochosa consideraram-se, por simplificação,
idênticas características mecânicas e massa nula por forma a simular um apoio elástico.

Hipótese de material homogéneo,


isotrópico e com comportamento
elástico-linear :

E0 = 33 GPa (~1,3 Eest)

ν= 0,2

174 elementos
1296 pontos nodais

Figura 6: Modelo de elementos finitos do conjunto barragem-fundação-albufeira.

A comparação entre os resultados observados nos diversos ensaios anteriormente referidos e


os resultados numéricos obtidos com o modelo de EF é apresentada na figura seguinte em
termos da variação das frequências próprias dos três primeiros modos de vibração em função
da cota de água na albufeira.

1981 (obras) Nov. 96 Fev.02 Out.03 Maio 03


5,0
Modo 3
4,5

4,0
Frequência (Hz)

Modo 2
3,5

3,0

2,5 Modo 1

2,0

166 180 200 220 240 260 280 297


Cota da água (m)

Modelo Numérico EF3D Vibração forçada Vibração ambiente

Figura 7: Linhas de influência de frequências próprias. Comparação de resultados observados


e calculados numericamente.
Como se pode verificar é notório o bom acordo entre os resultados dos ensaios de vibração
ambiente e os resultados da modelação numérica sendo de assinalar que o modelo adoptado
(sem juntas) permite simular o significativo decréscimo das frequências próprias que ocorre
com o aumento da cota de água para níveis de água relativamente elevados (note-se que no
ensaio de vibração forçada realizado na situação de albufeira vazia foram identificadas
frequências próprias relativamente baixas o que poderá ser explicado por uma eventual
redução de rigidez do sistema associada à abertura das juntas de contracção que se verifica
em situações de albufeira vazia) [4, 8].

5. SISTEMA DE MONITORIZAÇÃO EM CONTÍNUO

O desenho do sistema de aquisição a instalar teve em consideração o facto de se pretender


adquirir dados associados às vibrações sofridas pela barragem com frequências de
amostragem que, como atrás referido, convém serem razoavelmente elevadas face à largura
de banda dos sinais a escrutinar. Apontou-se, por essa razão, para frequências de amostragem
dos canais dinâmicos da ordem dos 1000 Hz/canal.

Esta aquisição será realizada de forma contínua, num total de 31 canais. Os dados obtidos
serão transferidos por rede para um computador que, em função dos objectivos e parâmetros
definidos, irá observando a evolução dos parâmetros essenciais e determinará quando é que
será feito o arquivo em hardisk de um determinado evento. Na generalidade dos casos os
dados serão abandonados com excepção daqueles que pela sua natureza forem
seleccionados para análise posterior e de um ou mais registos periódicos (p.ex. diariamente)
para efeitos de constituição de um arquivo com a história dinâmica do sistema.

A configuração da aquisição de dados privilegiou soluções que tendam a reduzir ao mínimo a


interferência de ruído electromagnético exterior. Para o efeito optou-se por proceder à
aquisição dos canais acelerométricos (sinais analógicos) nas proximidades dos respectivos
sensores. Depois, os dados já digitalizados são transferidos por RS-485 para uma unidade
centralizadora (e.Gate) que os memoriza localmente e coordena acções com o computador
com vista a enviar-lhe os dados pré-processados, via rede ethernet.

A transferência de dados dos diferentes canais associados a cada e.Gate tem de processar-se
a ritmo tal que, em termos médios, a informação capturada é transferida para o computador
sem nunca exceder os limites de armazenamento local do e.Gate. Os dados dos diferentes
canais que convergem para o e.Gate (via redes RS-485) são “empacotados” pelo concentrador
de forma a que todos os dados adquiridos num certo instante seguem para o computador em
conjunto com um cabeçalho que identifica o instante da respectiva aquisição.

Cada e.Gate assegura o sincronismo local dos dispositivos de aquisição que com ele estão
interligados através das redes RS-485 de que dispõe. A garantia de sincronismo entre
diferentes e.Gates tem de ser assegurada por um sinal de sincronismo geral que é distribuído
pelo computador e que implica a existência de uma via independente especificamente
vocacionada para esse fim.
Os dados que vão chegando ao computador via ethernet, oriundos dos diferentes e.Gates, são
recebidos de forma assíncrona e, pela natureza do processo de comunicação, não há qualquer
garantia de os pacotes recebidos dos vários e.Gates respeitarem a ordem temporal com que os
dados foram adquiridos. Este problema é solucionado pelo facto dos dados enviados pelos
e.Gates estarem horodatados o que permite ao computador agregá-los e criar séries coerentes
do ponto de vista temporal para todos os dados recebidos dos diferentes locais.
Assegurar rimos de aquisição permanentes da ordem dos 1000 Hz por canal exige cuidados
especiais do lado dos e.Gates. Assim, estes concentradores dispõem de 4 redes RS-485
independentes por quem são distribuídas as cargas de transporte local de informação: unidade
de aquisição → e.Gate. Esta distribuição de carga é condição base para que o e.Gate consiga
manter o fluxo de informação proveniente da aquisição aquele ritmo.

Os problemas que derivam de perturbações electromagnéticas na rede de alimentação, muitas


vezes associadas com actividade atmosférica, são fonte habitual de anomalias nos sinais
adquiridos e, nalguns casos, de avarias nos equipamentos de medição. Estes problemas foram
considerados e os inconvenientes que provocam foram limitados através de duas vertentes:
cada e.Gate e dispositivos de aquisição associados, localizados numa zona geograficamente
pouco dispersa, são alimentados por unidades protegidas contra sobretensões e transitórios
espúrios e capazes de manter a alimentação do equipamento, por algumas horas, em caso de
interrupção de fornecimento de energia por parte da rede pública; por sua vez, os e.Gates
estão galvanicamente isolados uns dos outros e do computador com que comunicam dado que
a interligação (rede ethernet) é efectuada por fibra óptica.

Figura 8: Equipamento a utilizar no sistema de monitorização em contínuo.


Fibra óptica

I II
e.Gate e.Gate

e.bloxx e.bloxx e.bloxx e.bloxx e.bloxx e.bloxx e.bloxx e.bloxx e.bloxx e.bloxx e.bloxx e.bloxx e.bloxx

ES-U2 ES-U2 ES-U2 ES-U2 LVDT ES-U2 ES-T ES-U2 ES-U2 ES-U2 ES-U2
1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11

ethernet (TCP/IP)

III IV
e.Gate e.Gate
RS485

e.bloxx e.bloxx e.bloxx e.bloxx e.bloxx e.bloxx e.bloxx e.bloxx e.bloxx e.bloxx e.bloxx e.bloxx e.bloxx e.bloxx e.bloxx

ES-T ES-U2 ES-U2 ES-U2 LVDT ES-U2 EXT. ES-U2 ES-U2 ES-U2 ES-T
12 13 14 15 16 17 18 19 20 21 22

LNEC
Centro de controlo
(barragem)

Centros
de
EDP
análise Internet e.Gate
e.bloxx
Concentrador de dados e portal de comunicação
Aquisição e digitalização de dados
ES-U2 Acelerómetro uniaxial (Episensor - force balance)
ES-T Acelerómetro triaxial (Episensor - force balance)
LVDT Medidor de deslocamentos
EXT. Extensómetro

Conversor de sinal óptico-eléctrico-óptico

Figura 9: Diagrama do sistema de monitorização em contínuo para a barragem do Cabril.


(m)
IID ID A B C D E F G H I J K L M N O P Q R S T U V IE IIE 297
1 2 3 4 6 8 9 10 11 290
5 7
I II
12 13 14 15 17
18
19 20 21 22 270
16
III IV
250

230

210

190

170

Figura 10: Esquema da disposição dos equipamentos na barragem do Cabril.

6. CONCLUSÕES

Neste trabalho salienta-se o interesse da monitorização em contínuo do comportamento


dinâmico de barragens abóbada, na perspectiva de complementar os modernos sistemas de
observação de barragens. Salienta-se que só recentemente existe tecnologia adequada ao
desenvolvimento dos equipamentos de medição, aquisição e transmissão necessários para
este tipo de sistemas.

Apresentam-se as principais características de um sistema pioneiro que o LNEC está a


desenvolver com vista à monitorização em contínuo do comportamento dinâmico da barragem
do Cabril. Referem-se as principais condicionantes de projecto deste tipo de sistemas,
nomeadamente a necessidade de efectuar aquisições com elevadas frequências de
amostragem num elevado número de canais (pontos de medida), durante períodos
relativamente longos com vista à obtenção de uma boa resolução em frequência.

Com este sistema pretende-se observar o comportamento da obra sob excitação ambiente, sob
acções associadas à operação dos órgãos de descarga e exploração e ainda sob acções
sísmicas quando elas ocorram. Os resultados observados, após serem analisados com base
em metodologias de identificação modal, devem ser comparados com resultados numéricos de
modelos de elementos finitos com vista a uma adequada interpretação do comportamento da
obra.

5. AGRADECIMENTOS

Agradece-se à FCT o financiamento concedido no âmbito do projecto de reequipamento


científico proposto pelo LNEC em parceria com a FEUP [2].
7. REFERÊNCIAS

[1] Oliveira S., Rodrigues J., Mendes P., Campos Costa A. – Damage Characterization in
Concrete Dams Using Output Only Modal Analysis. Proceedings of XXII IMAC, 2004.
[2] PNRC (LNEC-FEUP) – Estudo de processos de deterioração evolutiva em barragens de
betão. Controlo da segurança ao longo do tempo. Programa de Candidatura ao
Programa Nacional de Reequipamento Científico da FCT, 2002.
[3] Oliveira S., Mendes P. – Development of dam finite element models for dynamic analysis
using ambient vibration test results. Proceedings of III European Conference on
Computational Mechanics, 2006.
[4] Toyoda Y., Ueda M., Shiojiri H., – Study of Joint Opening Effects on the Dynamic
Response o fan Existing Arch Dam. 15th ASCE Engineering Mechanics Conference,
New York, USA, 2002.
[5] Mendes P. – Observação e Análise do Comportamento Dinâmico de Barragens de
Betão sob Excitação Ambiente. Tese de Mestrado, Instituto Superior Técnico,
Universidade Técnica de Lisboa, Lisboa, Portugal, 2005.
[6] Brincker, R.; Zhang, L.; Andersen, P. (2000) – Ouput-Only Modal Analysis by Frequency
Domain Decomposition, Proceedings of The ISMA25 Noise And Vibration Engineering
Volume 11. Leuven, Belgium, pp. 717-723, September 13-15.
[7] Peeters B. – System Identification an Damage Detection in Civil Engineering. PhD
Thesis
[8] J. Rodrigues – Identificação Modal Estocástica. Métodos de Análise e Aplicações em
Estruturas de Engenharia Civil. Tese de Doutoramento, Faculdade de Engenharia da
Universidade do Porto, Porto, Portugal, 2004.
[9] J. Proulx, P. Paultre, J. Rheault, Y. Robert An Experimental investigation of water level
effects on the dynamic behaviour of a large dam. Earthquake Engineering and Structural
Dynamics, pp 1147-1166, 2001.

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