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Coleção

LEIS ESPECIAIS COMENTADAS

Coodenação
CAIO PAIVA

ANDRÉ RIBEIRO GIAMBERARDINO

COMENTÁRIOS À LEI DE
EXECUÇÃO PENAL
3ª edição
Revista, ampliada e com jurisprudência atualizada
até abril de 2021

1
VOLUME

2021
• Direitos exclusivos para o Brasil na língua portuguesa
Copyright © 2021 by EDITORA CEI.
www.editoracei.com
• Diagramação: Walter Santos
• Data de fechamento:

GIAMBERARDINO, André Ribeiro. Comentários a Lei de Execução Penal. 3ª edição.


Belo Horizonte: CEI, 2021.
ISBN.


À Iza. Ao Francisco. À Maria.
NOTA DO COORDENADOR

A coleção Leis Especiais Comentadas tem como objetivo oferecer ao leitor


uma oportunidade de consolidar o seu conhecimento a respeito das principais
leis especiais, servindo tanto a quem presta concursos públicos para carreiras
jurídicas quanto a quem, já integrando estas carreiras, pretende se aprimorar ou
se atualizar profissionalmente.
A metodologia da coleção envolve não apenas os comentários doutrinários
e a sistematização da jurisprudência dos tribunais superiores – e de tribunais
internacionais de direitos humanos, quando oportuno –, mas também aplicações
práticas do conhecimento apresentado.
Com o conhecimento obtido a partir da leitura dos volumes que compõem
a coleção Leis Especiais Comentadas, o leitor certamente estará mais capacitado e
crítico para enfrentar seus desafios profissionais.

Caio Paiva
Defensor Público Federal
Especialista em Ciências Criminais
Autor de obras jurídicas
Nota do Autor à 1ª Edição

Agradeço imensamente o convite da Editora CEI para escrever o singelo


trabalho agora publicado, que reúne comentários à Lei de Execução Penal
(Lei 7.210/84).
Importante dizer que se trata de abordagem completamente distinta do Curso
de Penologia e Execução Penal, em coautoria com Massimo Pavarini, publicado, em
nova edição, no ano de 2018.
Buscou-se aqui a conjugação de comentários objetivos dos dispositivos da lei
com a sistematização de jurisprudência atualizada, abrangendo atos normativos
infralegais e jurisprudência internacional de direitos humanos, sobre questões
que perpassam o cotidiano da atuação junto ao sistema penitenciário e o direito
de execução penal, profundamente marcado por um dinamismo jurisprudencial
que, muitas vezes aliado à discricionariedade administrativa, acaba por se descolar
da legalidade em detrimento de direitos fundamentais.
Por outro lado, o descompasso entre os marcos legais e a caótica realidade
prisional também faz com que decisões do Supremo Tribunal Federal e de cortes
internacionais de direitos humanos definam parâmetros imprescindíveis para
uma postura de redução de danos e limites à política penal do Estado, tratada
como política pública sujeita à reserva do possível.
Espera-se que os Comentários à Lei de Execução Penal sejam úteis aos
profissionais que atuam na área e a todos aqueles que se preparam para a
aprovação em concursos públicos para as carreiras jurídicas pertinentes.

André Ribeiro Giamberardino


Santa Felicidade, julho de 2018
Nota do Autor à 2ª Edição

Essa segunda edição dos Comentários à Lei de Execução Penal foi atualizada
com as modificações das Leis 13.679/2018 (progressão especial de regime) e
13.964/2019 (Lei “Anticrime”), sistematizando, em tabelas, os novos parâmetros
estabele­cidos – incluindo alterações no Código Penal e outras leis que repercutem
na exe­cução da pena – e se posicionando sobre as lacunas abertas.
O texto foi também revisado e ampliado, com a inserção de novos tópicos
sobre a aplicação da Súmula Vinculante 56-STF, sobre sistema disciplinar, direitos
das pessoas presas, entre outros temas, e atualizado com as novas súmulas e
posicionamentos jurisprudenciais.
Diante da baixa densidade e compreensão confusa que se tem do princípio
da legalidade na execução penal, a orientação político-criminal dos comentários
continua sendo a de reconhecimento crítico do aspecto constitutivo dos espaços
de discricionariedade judicial e administrativa-disciplinar, mas com a defesa de
sua disputa e limitação constante pela linguagem dos direitos.
Registro o agradecimento à Editora CEI e aos colegas defensoras e defensores
públicos de todo o país que atuam na execução penal e que viabilizam a atualização
desse texto trazendo a público comentários, críticas, decisões, debates e casos
concretos, fazendo-o na pessoa do amigo Júlio Cesar Duailibe Salem Filho, com
quem coordeno, nessa data, o Núcleo de Política Criminal e Execução Penal da
Defensoria Pública do Estado do Paraná. Agradeço também a Luis Renan Coletti
pelo auxílio imprescindível na pesquisa e acompanhamento dos tópicos mais
relevantes da matéria.

André Ribeiro Giamberardino


Nova York, abril de 2020
Nota do Autor à 3ª Edição

Esta terceira edição dos Comentários à Lei de Execução Penal traz ao menos
59 itens atualizados ou incluídos. As atualizações abrangem jurisprudência
atualizada até o mês de abril de 2021, em diversos temas, novas súmulas, novas
resoluções do Conselho Nacional de Justiça e a atualização do texto da LEP por
conta da derrubada dos vetos à Lei 13.964/19 (incluindo análise conjunta com
Rodrigo Duque Estrada Roig sobre o requisito subjetivo da progressão de regime).
Dentre as novidades, o texto analisa debates e consequências jurídicas
da pandemia do novo Coronavírus na execução penal, tais como a progressão
antecipada de regime, a remição ficta e os efeitos da suspensão da fiscalização de
penas em regime aberto e penas restritivas de direito.
Entre os comentários recém incluídos destaca-se os temas do direito
à literatura no cárcere, direito de frequência a culto religioso no regime se­
miaberto harmonizado, distinção entre regalias e direitos, controle judicial
nos pro­cedimentos administrativo-disciplinares, importante posicionamento
contrário à atribuição de natureza administrativa às decisões correcionais das
Varas de Corregedoria dos Presídios, numerus clausus e sistema socioeducativo, a
“cifra oculta” da superlotação carcerária e a ilegalidade da submissão do paciente
com medida de segurança de internação ao sistema disciplinar.

André Ribeiro Giamberardino


Curitiba, Maio de 2021
SUMÁRIO

COMENTÁRIOS À LEI DE EXECUÇÃO PENAL


TÍTULO I – Do Objeto e da Aplicação da Lei de Execução Penal....................................... 37
Art. 1º........................................................................................................................................................................ 37
1.1 Objetivo da execução penal............................................................................................................. 37
1.2 Crítica à prática judicial sobre o objetivo da execução penal.............................................. 38
1.3 Repercussão da vedação à revisão criminal pro societate na execução penal............. 39
1.4 Duplicidade de condenações pelo mesmo fato....................................................................... 40
Art. 2º........................................................................................................................................................................ 40
2.1 Natureza jurídica da execução penal............................................................................................ 40
2.2 Jurisdicionalidade da execução vs. flexibilidade do
“projeto penitenciário”........................................................................................................................41
2.3. Aplicação da LEP aos presos provisórios..................................................................................... 42
Art. 3º........................................................................................................................................................................ 43
3.1 Direitos limitados pela execução penal....................................................................................... 43
3.2 Estado de coisas inconstitucional e violação de direitos....................................................... 43
3.3 Vedação de tratamento discriminatório...................................................................................... 44
3.4 Suspensão dos direitos políticos..................................................................................................... 44
3.5 Suspensão dos direitos políticos e pendência de pagamento
da pena de multa.................................................................................................................................. 44
3.6 Tratamento penitenciário no Pacto Internacional de Direitos Civis
e Políticos................................................................................................................................................. 46
Art. 4º........................................................................................................................................................................ 46
4.1 Cooperação da comunidade na execução penal..................................................................... 46
4.2 Princípio da interatividade: cooperação entre Poder Executivo e Sistema de
Justiça Criminal...................................................................................................................................... 47
4.3 Cooperação da comunidade e medidas de segurança.......................................................... 47
4.4 APACs........................................................................................................................................................ 47
4.5 Cooperação da comunidade e terceirização.............................................................................. 48

TÍTULO II – Do Condenado e do Internado


CAPÍTULO I – Da Classificação.................................................................................................................. 49
Art. 5.......................................................................................................................................................................... 49
5.1 Classificação dos condenados e individualização.................................................................... 49
Art. 6º........................................................................................................................................................................ 50
6.1 Órgão responsável pela classificação do condenado............................................................. 50
Art. 7º........................................................................................................................................................................ 50
7.1 Composição da Comissão Técnica de Classificação................................................................ 50
7.2 O que pode mudar............................................................................................................................... 51
Art. 8º........................................................................................................................................................................ 51
8.1 Exame criminológico para fins de classificação........................................................................ 51
Art. 9º........................................................................................................................................................................ 52
9.1 Atribuições da Comissão Técnica de Classificação................................................................... 52
9.2 Atuação do profissional de psicologia na execução penal................................................... 52
Art. 9º-A................................................................................................................................................................... 53
9-A.1 Identificação do perfil genético de condenado........................................................................ 54
9-A.2 Criação do Banco Nacional de Perfis Genéticos........................................................................ 55
9-A.3 Tema com repercussão geral reconhecida no Supremo Tribunal Federal...................... 55
9-A.4 Garantia de acesso aos dados e direito ao contraditório....................................................... 56

CAPÍTULO II – Da Assistência
SEÇÃO I – Disposições Gerais.................................................................................................................... 56
Art. 10........................................................................................................................................................................ 56
10.1 Obrigação do Estado de prestar assistência ao preso, ao internado e ao egresso...... 56
10.2 Judicialização e inaplicabilidade do princípio da reserva do possível............................. 57
Art. 11........................................................................................................................................................................ 58
11.1 Modalidades de assistência.............................................................................................................. 58
11.2 Violação dos deveres de assistência e danos morais.............................................................. 58

SEÇÃO II – Da Assistência Material........................................................................................................ 59


Art. 12........................................................................................................................................................................ 59
12.1 Conteúdo da assistência material e direito à água potável.................................................. 59
12.2 Número mínimo de refeições diárias............................................................................................ 59
12.3 Assistência material e população carcerária feminina........................................................... 59
12.4 Instalações higiênicas e direito a banho quente...................................................................... 60
Art. 13.........................................................................................................................................................................61
13.1 Direito à “sacola” e à comercialização de produtos e objetos permitidos.......................61
13.2 Impossibilidade de recebimento direto da “sacola” por conta de medidas
sanitárias e a alternativa por correio..............................................................................................61

SEÇÃO III – Da Assistência à Saúde....................................................................................................... 62


Art. 14........................................................................................................................................................................ 62
14.1 Conteúdo da assistência à saúde.................................................................................................... 62
14.2 Integração com Sistema Único de Saúde.................................................................................... 63
14.3 HIV, tuberculose e outras doenças contagiosas na prisão.................................................... 63
14.4 Doença grave e direito à prisão domiciliar................................................................................. 63
14.5 Direito a acompanhamento médico da mulher no pré-natal e pós-parto..................... 64
14.6 Suicídio nas prisões.............................................................................................................................. 64
14.7 Direito à saúde na jurisprudência internacional de direitos humanos ........................... 65
14.8 Pandemia do Novo Coronavírus (COVID19)................................................................................ 66

SEÇÃO IV – Da Assistência Jurídica....................................................................................................... 68


Art. 15........................................................................................................................................................................ 68
15.1 Conteúdo da assistência jurídica.................................................................................................... 68
15.2 Modelo de prestação da assistência jurídica na execução penal....................................... 69
Art. 16........................................................................................................................................................................ 70
16.1 A Defensoria Pública como órgão da execução penal e a exigência de local
apropriado para atendimento......................................................................................................... 70
16.2 Priorização da questão prisional por parte da Defensoria Pública.................................... 71

SEÇÃO V – Da Assistência Educacional.............................................................................................. 72


Art. 17........................................................................................................................................................................ 72
17.1 Conteúdo da assistência educacional........................................................................................... 72
Art. 18........................................................................................................................................................................ 72
18.1 Obrigatoriedade do ensino fundamental................................................................................... 72
Art. 18-A.................................................................................................................................................................. 73
18-A.1 Obrigatoriedade do ensino médio regular ou supletivo....................................................... 73
Art. 19.........................................................................................................................................................................74
19.1 Previsão de ensino profissional........................................................................................................74
Art. 20........................................................................................................................................................................74
20.1 Convênio para oferta de atividades educacionais....................................................................74
Art. 21.........................................................................................................................................................................74
21.1 Obrigatoriedade da instalação de biblioteca nos estabelecimentos penais................. 75
21.2 Impossibilidade de restrição à leitura por razões disciplinares........................................... 75
21.3 Direito à literatura no cárcere.......................................................................................................... 75
Art. 21-A.................................................................................................................................................................. 76
21-A.1 Censo penitenciário e a necessidade de sistemas dinâmicos e com
interoperabilidade de dados ........................................................................................................... 77

SEÇÃO VI – Da Assistência Social............................................................................................................ 77


Art. 22....................................................................................................................................................................... 77
22.1 Conteúdo da assistência social........................................................................................................ 77
Art. 23....................................................................................................................................................................... 78
23.1 Atribuições do serviço de assistência social .............................................................................. 78
23.2 Assistência social à família do preso e às mulheres privadas de liberdade.................... 79

SEÇÃO VII – Da Assistência Religiosa................................................................................................... 79


Art. 24....................................................................................................................................................................... 79
24.1 Conteúdo da assistência religiosa.................................................................................................. 79
24.2 Prisão domiciliar, regime semiaberto harmonizado e o direito de frequência
a culto religioso..................................................................................................................................... 80

SEÇÃO VIII – Da Assistência ao Egresso.............................................................................................. 80


Art. 25....................................................................................................................................................................... 80
25.1 Conteúdo de assistência ao egresso............................................................................................. 80
Art. 26....................................................................................................................................................................... 81
26.1 Conceito e classificação de egresso............................................................................................... 81
Art. 27....................................................................................................................................................................... 81
27.1 Auxílio ao egresso para obtenção de trabalho......................................................................... 81

CAPÍTULO III – Do Trabalho


SEÇÃO I – Disposições Gerais.................................................................................................................... 82
Art. 28....................................................................................................................................................................... 82
28.1 Considerações gerais sobre o trabalho do preso..................................................................... 82
28.2 Princípio da não aflitividade e inaplicabilidade do regime da CLT.................................... 82
28.3 Política Nacional de Trabalho no Sistema Prisional................................................................. 83
Art. 29....................................................................................................................................................................... 83
29.1 Remuneração do trabalho do preso.............................................................................................. 84
29.2 Controvérsia sobre a constitucionalidade do piso mínimo remuneratório................... 84
29.3 Despesas com a manutenção do preso....................................................................................... 85
Art. 30....................................................................................................................................................................... 85
30.1 Ausência de remuneração da prestação de serviço à comunidade.................................. 85
30.2 Posição da Organização Internacional do Trabalho................................................................ 86

SEÇÃO II – Do Trabalho Interno............................................................................................................... 86


Art. 31........................................................................................................................................................................ 86
31.1 Considerações gerais sobre o trabalho interno........................................................................ 86
Art. 32....................................................................................................................................................................... 87
32.1 Individualização da pena na atribuição do trabalho............................................................... 87
32.2 Remição nas atividades de artesanato......................................................................................... 87
Art. 33....................................................................................................................................................................... 88
33.1 Jornada de trabalho do preso: regra geral e exceções........................................................... 88
Art. 34....................................................................................................................................................................... 88
34.1 Exploração do trabalho do preso por fundação, empresa pública ou iniciativa
privada...................................................................................................................................................... 89
34.2 Sentido de remuneração adequada e contrato de trabalho................................................ 89
Art. 35....................................................................................................................................................................... 90
35.1 Compra de bens ou produtos do trabalho prisional............................................................... 90

SEÇÃO III – Do Trabalho Externo............................................................................................................. 90


Art. 36....................................................................................................................................................................... 90
36.1 Considerações gerais sobre o trabalho externo do preso.................................................... 91
36.2 Sobre as cautelas contra a fuga e em favor da disciplina...................................................... 91
36.3 Admissibilidade para condenados por crime hediondo....................................................... 91
36.4 Encargo pela remuneração do trabalho externo e direitos trabalhistas......................... 92
Art. 37....................................................................................................................................................................... 92
37.1 Requisitos para o trabalho externo............................................................................................... 92
37.2 Peculiaridades do regime semiaberto.......................................................................................... 93
37.3 Trabalho externo em empresa de familiar e em área de difícil fiscalização................... 93
37.4 Trabalho externo em regime semiaberto harmonizado com monitoração
eletrônica................................................................................................................................................. 94
37.5 Revogação do trabalho externo..................................................................................................... 94

CAPÍTULO IV – Dos Deveres, dos Direitos e da Disciplina


SEÇÃO I – Dos Deveres................................................................................................................................... 95
Art. 38....................................................................................................................................................................... 95
38.1 Desnecessidade do dispositivo....................................................................................................... 95
Art. 39....................................................................................................................................................................... 95
39.1 Deveres do condenado...................................................................................................................... 96
39.1.1 Dever do inciso I: comportamento disciplinado e cumprimento fiel da sentença...... 96
39.1.2 Dever do inciso II: obediência ao servidor e respeito a qualquer pessoa com
quem deva relacionar-se .................................................................................................................. 96
39.1.3 Dever do inciso III: urbanidade e respeito no trato com os demais condenados ....... 96
39.1.4 Dever do inciso IV: conduta oposta aos movimentos individuais ou coletivos
de fuga ou de subversão à ordem ou à disciplina.................................................................... 97
39.1.5 Dever do inciso V: execução do trabalho, das tarefas e das ordens recebidas.............. 97
39.1.6 Dever do inciso VI: submissão à sanção disciplinar imposta ............................................... 97
39.1.7 Dever do inciso VII: indenização à vitima ou aos seus sucessores .................................... 97
39.1.8 Dever do inciso VIII: indenização ao Estado, quando possível, das despesas
realizadas com a sua manutenção, mediante desconto proporcional da
remuneração do trabalho................................................................................................................. 98
39.1.9 Dever do inciso IX: higiene pessoal e asseio da cela ou alojamento................................. 98
39.1.10 Dever do inciso X: conservação dos objetos de uso pessoal .............................................. 98
SEÇÃO II – Dos Direitos.................................................................................................................................. 98
Art. 40....................................................................................................................................................................... 98
40.1 Direito do preso à integridade física e moral: base constitucional e
convencional.......................................................................................................................................... 98
40.2 Jurisprudência internacional de direitos humanos e as violações praticadas
pelo Brasil................................................................................................................................................ 99
40.3 Uso da força para controle de motins.........................................................................................100
40.4 Inaplicabilidade da reserva do possível.....................................................................................100
40.5 Revista vexatória em visitantes..................................................................................................... 101
40.6 Respeito à integridade física e moral conforme a identidade de gênero..................... 102
40.7 A questão de gênero na jurisprudência internacional de direitos humanos
em matéria penitenciária.................................................................................................................104
Art. 41......................................................................................................................................................................104
41.1 Natureza do rol de direitos atingidos pela sentença condenatória................................105
41.2 Possibilidade de suspensão de direitos do preso...................................................................105
41.3 Direito do inciso I - alimentação suficiente e vestuário........................................................106
41.4 Direito do inciso II - atribuição de trabalho e sua remuneração....................................... 107
41.5 Direito do inciso III - Previdência Social...................................................................................... 107
41.6 Direito do inciso IV - constituição de pecúlio........................................................................... 107
41.7 Direito do inciso V - proporcionalidade na distribuição do tempo para
o trabalho, o descanso e a recreação..........................................................................................108
41.8 Direito do inciso VI - exercício das atividades profissionais, intelectuais,
artísticas e desportivas anteriores, desde que compatíveis com a execução
da pena...................................................................................................................................................109
41.9 Direito do inciso VII - assistência material, à saúde, jurídica, educacional, social
e religiosa...............................................................................................................................................109
41.10 Direito do inciso VIII - proteção contra qualquer forma de sensacionalismo..............109
41.11 Direito do inciso IX - entrevista pessoal e reservada com o advogado.......................... 110
41.12 Direito do inciso X - visita do cônjuge, da companheira, de parentes e amigos
em dias determinados...................................................................................................................... 110
41.13 Visita íntima ou conjugal..................................................................................................................112
41.14 Restrições de visita no sistema penitenciário federal e no Regime Disciplinar
Diferenciado..........................................................................................................................................114
41.15 Direito do inciso XI - chamamento nominal..............................................................................114
41.16 Direito do inciso XII - igualdade de tratamento salvo quanto às exigências da
individualização da pena..................................................................................................................115
41.17 Direitos dos inciso XIII - audiência especial com o diretor do estabelecimento –
e XIV - representação e petição a qualquer autoridade, em defesa de direito............115
41.18 Direito do inciso XV - contato com o mundo exterior por meio de
correspondência escrita, da leitura e de outros meios de informação que não
comprometam a moral e os bons costumes.............................................................................115
41.19 Restrição à interceptação e análise da correspondência da pessoa presa................... 116
41.20 A pessoa presa pode ser entrevistada?.......................................................................................117
41.21 Direito do inciso XVI – atestado de pena a cumprir, emitido anualmente,
sob pena da responsabilidade da autoridade judiciária competente............................ 118
Art. 42..................................................................................................................................................................... 118
42.1 Deveres e direitos do preso provisório....................................................................................... 118
Art. 43..................................................................................................................................................................... 118
43.1 Contratação de médico de confiança pessoal do internado ou do submetido a
tratamento ambulatorial..................................................................................................................119

SEÇÃO III – Da Disciplina


SUBSEÇÃO I – Disposições Gerais.........................................................................................................119
Art. 44......................................................................................................................................................................119
44.1 Conceito de disciplina....................................................................................................................... 120
Art. 45..................................................................................................................................................................... 120
45.1 Princípios fundamentais relativos ao sistema disciplinar.................................................... 120
45.2 Princípio da legalidade com duas dimensões......................................................................... 120
45.3 Princípio da humanidade................................................................................................................ 121
45.4 Princípio da individualização......................................................................................................... 121
45.5 Cumulação de sanção disciplinar e regressão de regime................................................... 123
Art. 46..................................................................................................................................................................... 123
46.1 Consciência do ilícito no sistema disciplinar e forma escrita dos atos
administrativos.................................................................................................................................... 123
Art. 47..................................................................................................................................................................... 124
47.1 Natureza jurídico-administrativa dos atos da autoridade penitenciária ...................... 124
Art. 48..................................................................................................................................................................... 124
48.1 Poder disciplinar nas penas restritivas de direito................................................................... 124

SUBSEÇÃO II – Das Faltas Disciplinares............................................................................................ 125


Art. 49..................................................................................................................................................................... 125
49.1 Classificação das faltas disciplinares............................................................................................ 125
49.2 Faltas leves e médias e princípio da legalidade...................................................................... 125
49.3 Crítica à equiparação entre faltas consumadas e tentadas................................................ 125
Art. 50..................................................................................................................................................................... 126
50.1 Considerações gerais sobre as faltas graves............................................................................. 126
50.2 Falta grave do inciso I – incitar ou participar de movimento para subverter
a ordem ou a disciplina.................................................................................................................... 127
50.3 Falta grave do inciso II – fugir......................................................................................................... 127
50.4 Falta grave do inciso III – possuir, indevidamente, instrumento capaz de ofender
a integridade física de outrem....................................................................................................... 128
50.5 Falta grave do inciso IV – provocar acidente de trabalho.................................................... 129
50.6 Falta grave do inciso V – descumprir, no regime aberto, as condições impostas...... 129
50.7 Falta grave do inciso VI – inobservar os deveres de obediência e respeito
ao servidor com quem o apenado deva se relacionar e o dever de execução
do trabalho e tarefas recebidas (remetendo aos deveres constantes do
art. 39, II e V, da LEP)........................................................................................................................... 129
50.8 Falta grave do inciso VII – tiver em sua posse, utilizar ou fornecer aparelho
telefônico, de rádio ou similar, que permita a comunicação com outros presos
ou com o ambiente externo........................................................................................................... 130
50.9 Falta grave do inciso VIII – recusar submeter-se ao procedimento de identificação
do perfil genético............................................................................................................................... 132
50.10 Falta grave e preso provisório........................................................................................................ 132
Art. 51...................................................................................................................................................................... 132
51.1 Falta grave na pena restritiva de direitos................................................................................... 132
51.2 Possibilidade de substituição por outra PRD ao invés de efetuar a conversão em
pena privativa de liberdade ........................................................................................................... 133
51.3 Data-base para progressão de regime....................................................................................... 133
Art. 52..................................................................................................................................................................... 133
52.1 A prática de crime doloso como falta grave............................................................................. 135
52.2 Posse de droga ilícita para uso pessoal e infrações de menor potencial ofensivo
como falta grave................................................................................................................................. 136
52.3 Regime Disciplinar Diferenciado (RDD)...................................................................................... 136

SUBSEÇÃO III – Das Sanções e das Recompensas...................................................................... 139


Art. 53..................................................................................................................................................................... 139
53.1 Sanções disciplinares........................................................................................................................ 139
53.2 Isolamento e jurisprudência internacional de direitos humanos.....................................140
53.3 Inexistência de concurso de faltas disciplinares para fins sancionatórios.................... 141
Art. 54..................................................................................................................................................................... 141
54.1 Competência para aplicar as sanções disciplinares............................................................... 141
54.2 Legitimidade para postular a inclusão de preso no RDD e procedimento................... 141
Art. 55..................................................................................................................................................................... 142
55.1 Considerações gerais sobre as recompensas........................................................................... 142
Art. 56..................................................................................................................................................................... 142
56.1 Recompensas em espécie............................................................................................................... 143
56.2 Distinção entre regalias e direitos................................................................................................ 143

SUBSEÇÃO IV – Da Aplicação das Sanções.....................................................................................144


Art. 57.....................................................................................................................................................................144
57.1 Parâmetros para a aplicação da sanção disciplinar...............................................................144
57.2 Obrigatoriedade da comunicação da falta grave ao juízo de execução........................144
57.3 Individualização e sofisticação da análise da conduta.........................................................144
Art. 58..................................................................................................................................................................... 145
58.1 Limite temporal das sanções de isolamento, suspensão e restrição de direitos........ 145
58.2 Inexistência de concurso de faltas disciplinares para fins sancionatórios.................... 145
58.3 Aplicação analógica do prazo limite a sanções administrativas aplicadas aos
visitantes dos presos.........................................................................................................................146
58.4 Obrigatoriedade de comunicação do isolamento do preso ao juízo de execução ....146
SUBSEÇÃO V – Do Procedimento Disciplinar...............................................................................146
Art. 59.....................................................................................................................................................................146
59.1 Procedimento para apuração de falta disciplinar..................................................................146
59.2 Direito ao recurso administrativo independente de previsão expressa........................148
59.3 Procedimento, prescrição disciplinar e preclusão administrativa................................... 149
59.4 Impossibilidade de soma dos prazos de reabilitação .......................................................... 149
59.5 Controle judicial das faltas de natureza média e leve........................................................... 150
Art. 60..................................................................................................................................................................... 150
60.1 Possibilidade de isolamento preventivo e detração............................................................. 151

TÍTULO III – Dos Órgãos da Execução Penal


CAPÍTULO I – Disposições Gerais.......................................................................................................... 152
Art. 61...................................................................................................................................................................... 152
61.1 Órgãos da execução penal.............................................................................................................. 152

CAPÍTULO II – Do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária............. 152


Art. 62..................................................................................................................................................................... 152
62.1 Natureza do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária............................. 153
Art. 63..................................................................................................................................................................... 153
63.1 Composição do CNPCP e mandato dos membros................................................................. 153
Art. 64..................................................................................................................................................................... 153
64.1 Atribuições do CNPCP....................................................................................................................... 154

CAPÍTULO III – Do Juízo da Execução................................................................................................. 155


Art. 65..................................................................................................................................................................... 155
65.1 Competência e jurisdição em matéria de execução penal................................................. 155
65.2 Constitucionalidade e legalidade dos mutirões carcerários.............................................. 156
Art. 66..................................................................................................................................................................... 157
66.1 Atribuições do juízo de execução e jurisdicionalização da execução penal................ 158
66.2 Decisão proferida em PAD passível de controle judicial...................................................... 159
66.3 Da confusão sobre a natureza da competência das Varas de Corregedoria dos
Presídios e da necessidade de meios de execução das próprias decisões................... 159

CAPÍTULO IV – Do Ministério Público.................................................................................................160


Art. 67.....................................................................................................................................................................160
67.1 Participação do Ministério Público na execução penal........................................................ 161
Art. 68..................................................................................................................................................................... 161
68.1 Atribuições do Ministério Público na execução penal.......................................................... 161
CAPÍTULO V – Do Conselho Penitenciário...................................................................................... 162
Art. 69..................................................................................................................................................................... 162
69.1 Considerações gerais sobre o Conselho Penitenciário......................................................... 162
Art. 70..................................................................................................................................................................... 162
70.1 Atribuições do Conselho Penitenciário...................................................................................... 162

CAPÍTULO VI – Dos Departamentos Penitenciários


SEÇÃO I – Do Departamento Penitenciário Nacional............................................................ 163
Art. 71..................................................................................................................................................................... 163
71.1 Considerações gerais sobre o Departamento Penitenciário Nacional........................... 163
Art. 72..................................................................................................................................................................... 163
72.1 Atribuições do Departamento Penitenciário Nacional........................................................164
72.2 Sistema penitenciário federal........................................................................................................ 165
72.3 Progressão de regime no sistema federal.................................................................................166
72.4 Sistema disciplinar e direitos dos presos no sistema federal.............................................166
72.5 Proibição de contingenciamento do Fundo Penitenciário................................................. 167
72.6 Acompanhamento das mulheres com progressão especial de regime......................... 167

SEÇÃO II – Do Departamento Penitenciário Local................................................................... 167


Art. 73..................................................................................................................................................................... 167
73.1 Departamento Penitenciário ou órgão similar local............................................................. 167
73.2 Polícias penais – Emenda Constitucional 104/2019...............................................................168
Art. 74......................................................................................................................................................................168
74.1 Finalidade do Departamento Penitenciário ou órgão similar local.................................168

SEÇÃO III – Da Direção e do Pessoal dos Estabelecimentos Penais............................. 169


Art. 75..................................................................................................................................................................... 169
75.1 Requisitos para ocupar o cargo de diretor de estabelecimento penal.......................... 169
Art. 76...................................................................................................................................................................... 169
76.1 Quadro do Pessoal Penitenciário.................................................................................................. 169
Art. 77..................................................................................................................................................................... 170
77.1 Pessoal administrativo...................................................................................................................... 170
77.2 Agentes penitenciários e população carcerária feminina................................................... 170

CAPÍTULO VII – Do Patronato................................................................................................................... 171


Art. 78..................................................................................................................................................................... 171
78.1 Considerações gerais sobre o patronato................................................................................... 171
Art. 79..................................................................................................................................................................... 171
79.1 Atribuições dos patronatos............................................................................................................. 171
CAPÍTULO VIII – Do Conselho da Comunidade............................................................................ 172
Art. 80..................................................................................................................................................................... 172
80.1 Considerações gerais sobre os Conselhos da Comunidade............................................... 172
Art. 81..................................................................................................................................................................... 172
81.1 Atribuições do Conselho da Comunidade................................................................................ 173

CAPÍTULO IX – DA DEFENSORIA PÚBLICA....................................................................................... 173


Art. 81-A................................................................................................................................................................ 173
81-A.1 A Defensoria Pública como órgão da execução penal ........................................................ 174
Art. 81-B................................................................................................................................................................. 174
81-B.1 Atribuições da Defensoria Pública como órgão da execução penal .............................. 175
81-B.2 Modalidades de visita e abrangência da atribuição de inspeção ................................... 176

TÍTULO IV – Dos Estabelecimentos Penais


CAPÍTULO I – Disposições Gerais.......................................................................................................... 177
Art. 82..................................................................................................................................................................... 177
82.1 Considerações gerais sobre os estabelecimentos penais................................................... 177
82.2 Judicialização da obrigação de construir e reformar estabelecimentos penais......... 177
82.3 Limite ao sentido de “estabelecimento de destinação diversa”....................................... 178
Art. 83..................................................................................................................................................................... 178
83.1 Parâmetros mínimos para a construção de estabelecimento penal............................... 179
Art. 83-A................................................................................................................................................................ 179
83-A.1 Execução indireta de atividades desenvolvidas em estabelecimentos penais .........180
Art. 83-B................................................................................................................................................................180
83-B.1 Funções indelegáveis no âmbito do sistema penal ..............................................................180
Art. 84.....................................................................................................................................................................180
84.1 Separação de presos.......................................................................................................................... 181
Art. 85..................................................................................................................................................................... 182
85.1 Princípios do numerus clausus ou da capacidade taxativa dos presídios ................... 182
85.2 Numerus clausus nos regimes semiaberto e aberto: Súmula Vinculante
nº. 56/STF e Recurso Extraordinário 641.320/RS .................................................................... 182
85.3 Numerus clausus no regime fechado ........................................................................................ 183
85.4 Execução de penas como política pública passível de controle judicial....................... 183
85.5 Ilegalidade da prisão decorrente das condições de custódia e necessidade de
relaxamento.......................................................................................................................................... 183
85.6 Súmula Vinculante 56 e a jurisprudência dos Tribunais Superiores................................184
85.7 Numerus Clausus e sistema socioeducativo............................................................................186
85.8 Numerus Clausus e a criação de central de vagas no sistema socioeducativo
(Resolução 367/2021-CNJ)...............................................................................................................186
85.9 A “cifra oculta” da superlotação (art. 85, parágrafo único, LEP)........................................ 187
Art. 86.....................................................................................................................................................................188
86.1 Flexibilização da competência na execução da pena...........................................................188

CAPÍTULO II – Da Penitenciária............................................................................................................... 189


Art. 87..................................................................................................................................................................... 189
87.1 Considerações gerais sobre as penitenciárias......................................................................... 189
Art. 88..................................................................................................................................................................... 189
88.1 Características da cela individual para alojamento do preso............................................ 189
88.2 Celas modulares de concreto.........................................................................................................190
Art. 89.....................................................................................................................................................................190
89.1 Creche em penitenciária feminina...............................................................................................190
Art. 90..................................................................................................................................................................... 191
90.1 Localização da penitenciária masculina..................................................................................... 191

CAPÍTULO III – Da Colônia Agrícola, Industrial ou Similar.................................................. 191


Art. 91..................................................................................................................................................................... 191
91.1 Considerações gerais sobre os estabelecimentos penais destinados ao regime
semiaberto............................................................................................................................................ 191
91.2 Inexistência de estabelecimento de regime semiaberto e prisão domiciliar.............. 192
Art. 92..................................................................................................................................................................... 192
92.1 Alojamentos coletivos...................................................................................................................... 192

CAPÍTULO IV – Da Casa do Albergado............................................................................................... 192


Art. 93..................................................................................................................................................................... 192

Art. 94..................................................................................................................................................................... 192

Art. 95 .................................................................................................................................................................... 193


93.1 Considerações sobre as casas de albergado............................................................................ 193

CAPÍTULO V – Do Centro de Observação......................................................................................... 193


Art. 96 .................................................................................................................................................................... 193

Art. 97 .................................................................................................................................................................... 193

Art. 98 .................................................................................................................................................................... 193


96.1 Considerações sobre os Centros de Observação e Triagem............................................... 193
CAPÍTULO VI – Do Hospital de Custódia e Tratamento Psiquiátrico............................194
Art. 99.....................................................................................................................................................................194
99.1 Considerações sobre os Hospitais de Custódia e Tratamento Psiquiátrico..................194
Art. 100 .................................................................................................................................................................194
100.1 Obrigatoriedade do exame psiquiátrico....................................................................................194
Art. 101................................................................................................................................................................... 195
101.1 Tratamento ambulatorial................................................................................................................. 195

CAPÍTULO VII – Da Cadeia Pública........................................................................................................ 195


Art. 102................................................................................................................................................................... 195
102.1 Considerações gerais sobre a cadeia pública.......................................................................... 195
Art. 103................................................................................................................................................................... 195
103.1 Distinção entre cadeias públicas e carceragens em delegacias de polícia................... 195
Art. 104..................................................................................................................................................................196
104.1 Localização das cadeias públicas.................................................................................................196

TÍTULO V – Da Execução das Penas em Espécie


CAPÍTULO I – Das Penas Privativas de Liberdade
SEÇÃO I – Disposições Gerais.................................................................................................................. 197
Art. 105................................................................................................................................................................... 197
105.1 Início da execução da pena............................................................................................................. 197
105.2 Execução provisória da pena em favor do condenado com prisão preventiva.......... 197
105.3 Execução provisória da pena contra condenado que está solto......................................199
105.4 Audiência de custódia por ocasião do cumprimento de mandado de prisão
definitiva ...............................................................................................................................................200
105.5 Progressão provisória de regime em crimes contra a administração pública ............200
Art. 106..................................................................................................................................................................201
106.1 Elementos da guia de recolhimento definitiva e provisória...............................................202
Art. 107...................................................................................................................................................................202
107.1 Condicionamento do cumprimento da pena à expedição da guia.................................202
Art. 108 .................................................................................................................................................................202
108.1 Superveniência de doença mental e conversão da pena em medida de
segurança..............................................................................................................................................203
Art. 109...................................................................................................................................................................203
109.1 Extinção da pena e soltura .............................................................................................................203
109.2 Necessidade de integração de dados entre as unidades federativas ............................203
SEÇÃO II – Dos Regimes...............................................................................................................................203
Art. 110...................................................................................................................................................................203
110.1 Considerações gerais sobre a fixação do regime inicial de cumprimento
da pena...................................................................................................................................................204
110.2 Súmulas de STF e STJ sobre a fixação do regime inicial de cumprimento
de pena...................................................................................................................................................204
110.3 Distinção entre os regimes..............................................................................................................205
110.4 Violações ao princípio da individualização...............................................................................206
110.5 Adequação do regime inicial pelo juízo da execução..........................................................206
Art. 111...................................................................................................................................................................206
111.1 Detração e remição na unificação das penas ..........................................................................207
111.2 Unificação provisória e prisão preventiva.................................................................................208
111.3 Fixação do regime de cumprimento de pena diante de pluralidade de títulos
a serem executados: cenários possíveis.....................................................................................208
111.4 Unificação de pena restritiva de direitos e pena privativa de liberdade.......................209
111.5 Ilegalidade da alteração da data-base para direitos da execução penal por
causa da unificação de penas........................................................................................................ 210
111.6 Unificação e limite máximo de 40 anos como tempo de cumprimento de pena...... 211
111.7 Impossibilidade de alteração da data-base nos casos de trânsito em julgado
de condenação única........................................................................................................................ 211
111.8 Unificação e crime continuado...................................................................................................... 212
111.9 Unificação, reincidência e coisa julgada.................................................................................... 212
Art. 112................................................................................................................................................................... 213
112.1. Considerações gerais sobre a progressão de regime.................................................................. 215
112.2 Requisito objetivo ou temporal: sistematização após alterações das Leis
13.769/2018 e 13.964/2019............................................................................................................... 216
112.3 Requisito objetivo ou temporal: lacuna em relação à reincidência genérica
(incisos II, IV, VII e VIII)........................................................................................................................ 219
112.4 Requisito objetivo ou temporal: progressão especial de regime para mulheres
(Lei 13.769/2018)..................................................................................................................................220
112.5 Requisito objetivo misto e cálculo discriminado....................................................................224
112.6 Requisito objetivo misto no concurso de crimes...................................................................224
112.7 Ilegalidade da aplicação retroativa de fração mais gravosa...............................................225
112.8 Desconto do tempo de pena remido como pena cumprida.............................................226
112.9 Requisito objetivo na segunda progressão e data-base.....................................................227
112.10 Falta grave e data-base da progressão.......................................................................................228
112.11 Data base da progressão em caso de prisão cautelar com soltura durante o
processo.................................................................................................................................................229
112.12 Requisito temporal da progressão de regime e do livramento condicional
no caso de condenações a penas privativas de liberdade cuja soma seja
superior a quarenta anos.................................................................................................................230
112.13 Colaboração premiada na execução penal e dispensa do requisito objetivo
para progressão .................................................................................................................................231
112.14 Requisito subjetivo ou disciplinar e exame criminológico.................................................231
112.15 Requisito subjetivo ou disciplinar e a objetivação da aferição e das
consequências do requisito ...........................................................................................................232
112.16 Progressão de regime e apenado submetido ao RDD.........................................................235
112.17 Progressão de regime e decretação de prisão cautelar.......................................................235
112.18 Progressão de regime em crimes contra a administração pública..................................236
112.19 O inadimplemento da pena de multa pode impedir a progressão de regime? ........236
112.20 Progressão de regime e preso estrangeiro com pedido de extradição deferido......237
112.21 Progressão de regime e preso estrangeiro em situação irregular...................................237
112.22 Progressão de regime e presos incluídos em penitenciária federal................................237
112.23 Vedação à progressão de regime e organizações criminosas ..........................................238
112.24 Progressão de regime e falta de vagas ......................................................................................239
Art. 113...................................................................................................................................................................239
113.1 Aceitação do condenado como requisito para progredir para o regime aberto.......239
Art. 114...................................................................................................................................................................240
114.1 Requisitos para ingressar no regime aberto............................................................................240

Art. 115................................................................................................................................................................... 241


115.1 Condições para concessão de regime aberto.......................................................................... 241
115.2 Impossibilidade de fixar pena restritiva de direitos como condição do regime
aberto...................................................................................................................................................... 241
115.3 Início de cumprimento da pena em regime inicial aberto.................................................. 241
115.4 Natureza declaratória da decisão de progressão ao regime aberto e audiência
admonitória como mera formalidade........................................................................................ 242
115.5 Compatibilidade entre regime aberto e trabalho noturno................................................243
Art. 116...................................................................................................................................................................243
116.1 Possibilidade de modificação das condições do regime aberto......................................243
116.2 Regime aberto e pandemia da COVID19...................................................................................243

Art. 117...................................................................................................................................................................244
117.1 Possibilidade de custódia em residência domiciliar para beneficiário de regime
aberto......................................................................................................................................................244
117.2 Posição jurisprudencial consolidada pela ampliação das hipóteses de prisão
domiciliar...............................................................................................................................................244
117.3 Prisão domiciliar e prisão especial...............................................................................................244
117.4 Substituição da prisão preventiva pela prisão domiciliar...................................................245
117.5 Descumprimento das condições da prisão domiciliar não configura crime de
desobediência.....................................................................................................................................245
Art. 118...................................................................................................................................................................246
118.1 Considerações gerais sobre a regressão de regime..............................................................246
118.2 Regressão de regime por causa da prática de fato definido como crime doloso
ou falta grave........................................................................................................................................246
118.3 Regressão de regime por conta de condenação por crime anterior e
incompatibilidade da pena unificada......................................................................................... 247
118.4 Regressão de regime por frustração dos fins da execução, no caso de condenado
em regime aberto............................................................................................................................... 247
118.5 Inadimplemento da pena de multa.............................................................................................248
118.6 Regressão e regime inicial...............................................................................................................248
118.7 Regressão cautelar.............................................................................................................................248
118.8 Regressão não é efeito automático ou necessário da falta grave....................................249
Art. 119...................................................................................................................................................................249
119.1 Possibilidade de normas locais complementares sobre o regime aberto....................250

SEÇÃO III – Das Autorizações de Saída


SUBSEÇÃO I – Da Permissão de Saída................................................................................................250
Art. 120...................................................................................................................................................................250
120.1 Objetivo das autorizações de saída.............................................................................................250
120.2 Considerações gerais sobre a permissão de saída.................................................................251
Art. 121...................................................................................................................................................................251
121.1 Indeterminação do prazo da permissão de saída..................................................................251

SUBSEÇÃO II – Da Saída Temporária...................................................................................................252


Art. 122...................................................................................................................................................................252
122.1 Considerações gerais sobre a saída temporária......................................................................252
122.2 Hipótese de vedação da saída temporária ..............................................................................253
122.3 Saída temporária no regime semiaberto harmonizado (cumprido em prisão
domiciliar e/ou monitoramento eletrônico).............................................................................253
122.4 Saída temporária para visita a amigo e agente religioso.....................................................254
Art. 123...................................................................................................................................................................255
123.1 Requisitos para a saída temporária..............................................................................................255
123.2 Interrupção do prazo e falta grave...............................................................................................255
123.3 Sobre a compatibilidade com os objetivos da pena.............................................................256
123.4 Decisão sobre o pedido de saída temporária..........................................................................256

Art. 124...................................................................................................................................................................257
124.1 Prazo da saída temporária...............................................................................................................258
124.2 Condições da saída temporária.....................................................................................................258
124.3 Ausência de previsão de interrupção ou suspensão da pena...........................................258
Art. 125...................................................................................................................................................................259
125.1 Revogação da saída temporária....................................................................................................259

SEÇÃO IV – Da Remição...............................................................................................................................260
Art. 126...................................................................................................................................................................260
126.1 Considerações gerais sobre a remição....................................................................................... 261
126.2 Remição pelo trabalho..................................................................................................................... 261
126.3 Remição pelo estudo e pela leitura ............................................................................................262
126.4 Remição e preso provisório ...........................................................................................................266
126.5 Remição por trabalho executado antes do início da execução da pena.......................266
126.6 Novas modalidades de remição e as práticas sociais educativas.....................................266
126.7 Remição ficta e a pandemia do novo Coronavírus................................................................267
126.8 Penas ilícitas: remição ficta ou compensação penal decorrente de condições
degradantes de prisão......................................................................................................................268
126.9 Remição por trabalho no regime semiaberto harmonizado cumprido em prisão
domiciliar e/ou monitoração eletrônica....................................................................................270
126.10 Possibilidade de arredondamento para cima dos dias remidos.......................................270
Art. 127 .................................................................................................................................................................. 271
127.1 Perda de dias remidos como sanção........................................................................................... 271
127.2 Debate sobre a constitucionalidade da perda dos dias remidos.....................................272
127.3 Necessidade de fundamentação da decisão............................................................................272
127.4 Limite temporal da possibilidade de perda de dias remidos.............................................273
127.5 Inaplicabilidade para o liberado condicional que comete novo delito.........................273
Art. 128...................................................................................................................................................................273
128.1 Cômputo do tempo remido como pena cumprida............................................................... 274
128.2 Período de trabalho ou estudo anterior à data-base para direitos da execução....... 274

Art. 129................................................................................................................................................................... 275


129.1 Encaminhamento ao juízo de informações sobre atividades que implicam em
remição de pena................................................................................................................................. 275

Art. 130................................................................................................................................................................... 275


130.1 Crime de falsidade ideológica....................................................................................................... 276

SEÇÃO V – Do Livramento Condicional............................................................................................ 276


Art. 131................................................................................................................................................................... 276
131.1 Considerações gerais sobre o livramento condicional......................................................... 276
131.2 Requisitos ou pressupostos para o livramento condicional...............................................277
131.3 Requisito objetivo ou temporal ...................................................................................................277
131.4 Requisito da reparação do dano e cumprimento das obrigações civis
decorrentes do crime .......................................................................................................................278
131.5 Requisito subjetivo ou da valoração clínico-criminológica do autor.............................279
131.6 Hipóteses de vedação do livramento condicional.................................................................280
Art. 132...................................................................................................................................................................282
132.1  Condições do livramento condicional.............................................................................................282
132.2 Período de prova do livramento condicional..........................................................................283
Art. 133...................................................................................................................................................................284
133.1  Competência territorial para fiscalização do livramento condicional..................................284
Art. 134...................................................................................................................................................................284
134.1 Advertência ao liberado...................................................................................................................284
Art. 135...................................................................................................................................................................284
135.1 Reforma da sentença denegatória do livramento condicional.........................................284
Art. 136...................................................................................................................................................................285
136.1 Formalização do livramento condicional..................................................................................285
Art. 137...................................................................................................................................................................285
137.1 Cerimônia de livramento condicional........................................................................................286
Art. 138...................................................................................................................................................................286
138.1 Prestação de informações ao sentenciado beneficiado pelo livramento
condicional............................................................................................................................................287
Art. 139...................................................................................................................................................................287
139.1 Observação cautelar..........................................................................................................................287
Art. 140...................................................................................................................................................................287
140.1 Revogação do livramento condicional.......................................................................................288
140.2 Reversão da concessão do livramento em recurso de agravo..........................................288
140.3 Impossibilidade jurídica da prática de falta grave por liberado condicional...............289

Art. 141...................................................................................................................................................................289
141.1 Consequências da revogação do livramento condicional motivada por infração
penal cometida antes do período de prova.............................................................................290
Art. 142...................................................................................................................................................................290
142.1 Consequência da revogação do livramento condicional motivada por infração
penal cometida durante o período de prova...........................................................................290
142.2 Cassação do livramento em segunda instância é equivalente a “revogação
por outro motivo”?.............................................................................................................................291
Art. 143...................................................................................................................................................................291
143.1 Requerimento de revogação do livramento condicional...................................................291
Art. 144...................................................................................................................................................................292
144.1 Modificação das condições do livramento condicional.......................................................292
Art. 145...................................................................................................................................................................292
145.1 Suspensão do livramento condicional e prorrogação do período de prova...............292
Art. 146...................................................................................................................................................................293
146.1 Extinção da punibilidade pela expiração do prazo do livramento condicional.........293

Seção VI – Da Monitoração Eletrônica..............................................................................................294


Art. 146-A.............................................................................................................................................................294

Art. 146-B.............................................................................................................................................................294
146-B.1 Considerações gerais sobre a monitoração eletrônica .......................................................294
Art. 146-C.............................................................................................................................................................295
146-C.1 Cuidados e deveres do condenado com o equipamento eletrônico ............................296
146-C.2 Monitoração eletrônica e sistema disciplinar..........................................................................296
146-C.3 Consequências previstas para o descumprimento dos deveres relativos
à monitoração eletrônica ...............................................................................................................296
Art. 146-D.............................................................................................................................................................297
146-D.1 Revogação da monitoração eletrônica .....................................................................................297

CAPÍTULO II – Das Penas Restritivas de Direitos


SEÇÃO I – Disposições Gerais..................................................................................................................298
Art. 147...................................................................................................................................................................298
147.1 Considerações gerais sobre as penas restritivas de direitos..............................................298
147.2 Impossibilidade de execução provisória de penas restritivas de direitos.....................299
147.3 Natureza das penas restritivas de direitos................................................................................299
147.4 Obrigatoriedade da substituição da pena privativa de liberdade pela pena
restritiva de direitos...........................................................................................................................299
147.5 Inconstitucionalidade da vedação da pena restritiva de direitos....................................300
147.6 Possibilidades de substituição.......................................................................................................300
Art. 148...................................................................................................................................................................301
148.1 Alteração da forma de cumprimento da pena restritiva de direitos...............................301
148.2 Consequências da pandemia do novo Coronavírus na execução das penas
restritivas de direito...........................................................................................................................301

SEÇÃO II – Da Prestação de Serviços à Comunidade..............................................................302


Art. 149...................................................................................................................................................................302
149.1 Considerações gerais sobre a prestação de serviços à comunidade..............................302
Art. 150...................................................................................................................................................................303
150.1 Fiscalização da prestação de serviços à comunidade...........................................................303

SEÇÃO III – Da Limitação de Fim de Semana................................................................................303


Art. 151...................................................................................................................................................................303
151.1 Considerações gerais sobre a limitação de fim de semana................................................303
Art. 152...................................................................................................................................................................304
152.1 Limitação de fim de semana e violência doméstica..............................................................304
Art. 153...................................................................................................................................................................304
153.1 Fiscalização da limitação de fim de semana.............................................................................304

SEÇÃO IV – Da Interdição Temporária de Direitos...................................................................304


Art. 154...................................................................................................................................................................304
154.1 Considerações gerais sobre a interdição temporária de direitos.....................................305
Art. 155...................................................................................................................................................................305
155.1 Descumprimento das medidas.....................................................................................................305

CAPÍTULO III – Da Suspensão Condicional.....................................................................................306


Art. 156...................................................................................................................................................................306
156.1 Considerações gerais sobre a suspensão condicional da pena........................................306
156.2 Requisitos para concessão do sursis previstos no Código Penal .....................................306
156.3 Vedação da suspensão condicional da pena...........................................................................308
Art. 157...................................................................................................................................................................308
157.1 Fundamentação da concessão ou denegação do sursis ....................................................308

Art. 158...................................................................................................................................................................309
158.1 Condições da suspensão..................................................................................................................309
Art. 159................................................................................................................................................................... 310
159.1 Suspensão condicional da pena concedida por Tribunal.................................................... 310

Art. 160....................................................................................................................................................................311
160.1 Advertência ao condenado.............................................................................................................311
Art. 161....................................................................................................................................................................311
161.1 Não comparecimento na audiência admonitória...................................................................311
Art. 162....................................................................................................................................................................311
162.1 Revogação da suspensão condicional da pena.......................................................................311
162.2 Prorrogação do período de prova ............................................................................................... 312
162.3 Sursis e prescrição da pretensão executória ........................................................................... 313
162.4 Expiração do período de prova e extinção da punibilidade.............................................. 313
Art. 163................................................................................................................................................................... 313
163.1 Registro da suspensão condicional da pena............................................................................ 314

CAPÍTULO IV – Da Pena de Multa.......................................................................................................... 314


Art. 164.................................................................................................................................................................. 314
164.1 Considerações gerais sobre a pena de multa.......................................................................... 314
164.2 Natureza fiscal da multa e legitimidade para execução...................................................... 314
164.3 Ausência de efeitos penais em caso de inadimplência........................................................ 315
164.4 Suspensão dos direitos políticos e pendência de pagamento da pena de multa..... 315
Art. 165................................................................................................................................................................... 316
165.1 Possibilidade de penhora em bem imóvel................................................................................ 316
Art. 166................................................................................................................................................................... 316
166.1 Possibilidade de penhora em outros bens................................................................................ 316
Art. 167................................................................................................................................................................... 316
167.1 Suspensão da execução da pena de multa na superveniência de doença
mental .................................................................................................................................................... 316
Art. 168................................................................................................................................................................... 317
168.1 Pagamento da multa mediante desconto no vencimento ou salário do
condenado............................................................................................................................................ 317
Art. 169................................................................................................................................................................... 317
169.1 Parcelamento da pena de multa................................................................................................... 318
Art. 170 .................................................................................................................................................................. 318
170.1 Complemento ao art. 168 ............................................................................................................... 318

TÍTULO VI – Da Execução das Medidas de Segurança


CAPÍTULO I – Disposições Gerais.......................................................................................................... 319
Art. 171................................................................................................................................................................... 319
171.1 Execução das medidas de segurança......................................................................................... 319
171.2 Superação da visão tutelar e Lei 10.216/2001 ......................................................................... 319
171.3 Jurisprudência de direitos humanos e questão manicomial.............................................320
Art. 172...................................................................................................................................................................320
172.1 Exigência de expedição de guia pela autoridade judiciária...............................................320
172.2 Ilegalidade da manutenção de paciente internado em penitenciária........................... 321
172.3 Ilegalidade da submissão de paciente judiciário ao sistema disciplinar e a
medida de isolamento...................................................................................................................... 321
Art. 173 ..................................................................................................................................................................322
173.1 Elementos da guia de internamento ou tratamento ambulatorial..................................322
Art. 174 ..................................................................................................................................................................323
174.1 Classificação e exame criminológico nas medidas de segurança....................................323

CAPÍTULO II – Da Cessação da Periculosidade............................................................................323


Art. 175...................................................................................................................................................................323
175.1 Cessação da periculosidade e prazo máximo da medida de segurança....................... 324
175.2 Ilegalidade de laudos genéricos e sem fundamentação..................................................... 324
Art. 176...................................................................................................................................................................325
176.1 Determinação de exame para verificação da cessação da periculosidade..................325
Art. 177...................................................................................................................................................................325

Art. 178 ..................................................................................................................................................................325


178.1 Desinternação ou liberação............................................................................................................325
Art. 179...................................................................................................................................................................326
179.1 Condicionamento da desinternação ou liberação.................................................................326
TÍTULO VII – Dos Incidentes de Execução
CAPÍTULO I – Das Conversões..................................................................................................................327
Art. 180...................................................................................................................................................................327
180.1 Conversão da pena privativa de liberdade em restritiva de direitos..............................327
Art. 181...................................................................................................................................................................327
181.1 Conversão da pena restritiva de direitos em pena privativa de liberdade...................328
181.2 Conversão da prestação de serviços à comunidade ............................................................328
181.3 Conversão da limitação de fim de semana...............................................................................329
181.4 Conversão da interdição temporária de direitos....................................................................329
181.5 Observância do regime inicial fixado na sentença condenatória ...................................329
Art. 182...................................................................................................................................................................329

Art. 183 ..................................................................................................................................................................329


183.1 Substituição/conversão da pena privativa de liberdade por medida de
segurança..............................................................................................................................................330
183.2 Convivência entre execuções de pena privativa de liberdade e de medida de
segurança..............................................................................................................................................330
Art. 184.................................................................................................................................................................. 331
184.1 Conversão do tratamento ambulatorial em internação...................................................... 331

CAPÍTULO II – Do Excesso ou Desvio.................................................................................................. 331


Art. 185................................................................................................................................................................... 331
185.1 Excesso ou desvio de execução.................................................................................................... 331
Art. 186...................................................................................................................................................................332
1.6 Legitimidade para suscitar o incidente de excesso ou desvio de execução................332

CAPÍTULO III – Da Anistia e do Indulto..............................................................................................332


Art. 187...................................................................................................................................................................332
187.1 Considerações gerais sobre a anistia..........................................................................................332
Art. 188...................................................................................................................................................................333
188.1 Considerações gerais sobre o indulto.........................................................................................333
Art. 189...................................................................................................................................................................333
189.1 Indulto individual...............................................................................................................................333
Art. 190...................................................................................................................................................................334
190.1 Necessidade de parecer do Conselho Penitenciário.............................................................334
Art. 191 ..................................................................................................................................................................334
191.1 Procedimento do indulto individual...........................................................................................334
Art. 192...................................................................................................................................................................335
192.1 Indulto coletivo, comutação de penas e repercussão judicial...........................................335
192.2 Natureza declaratória da decisão concessiva de indulto ou comutação .....................336
192.3 Indulto e efeitos secundários da condenação......................................................................... 337
192.4 Discussão sobre a necessidade de homologação da falta grave ocorrer no
período de doze meses anterior ao decreto de indulto coletivo..................................... 337
192.5 Possibilidade de indulto em concurso de crimes...................................................................338
192.6 Discussão sobre o alcance do indulto em casos de parcelamento da pena
de multa.................................................................................................................................................338
192.7 Controle judicial do decreto presidencial de indulto coletivo..........................................339

Art. 193 ..................................................................................................................................................................340


193.1 Reconhecimento judicial dos requisitos para indulto..........................................................340
193.2 Indulto e execução provisória da pena......................................................................................340
193.3 Indulto e detração penal pelo período entre o decreto presidencial e a decisão
que extingue a punibilidade ......................................................................................................... 341

TÍTULO VIII – Do Procedimento Judicial...........................................................................................342


Art. 194...................................................................................................................................................................342
194.1 Procedimento judicial.......................................................................................................................342
Art. 195...................................................................................................................................................................342
195.1 Início do procedimento judicial....................................................................................................342
Art. 196...................................................................................................................................................................343
196.1 Procedimento na execução penal................................................................................................343
196.2 Princípio da oralidade e audiências de justificação ..............................................................344
Art. 197...................................................................................................................................................................344
197.1 Agravo em execução ........................................................................................................................344
197.2 Outras opções de defesa na execução penal ..........................................................................346
197.3 Descabimento de medidas coletivas visando cassar decisões favoráveis
às pessoas presas................................................................................................................................346

TÍTULO IX – Das Disposições Finais e Transitórias....................................................................348


Art. 198...................................................................................................................................................................348
198.1 Proibição de divulgação de fatos ocorridos dentro do cárcere .......................................348
199.1 Proibição de divulgação de fatos que exponham o preso a inconveniente
notoriedade .........................................................................................................................................348
Art. 199 .................................................................................................................................................................348
199.1 Regulação do emprego de algemas por Súmula Vinculante ............................................348
199.2 Regulação do emprego de algemas pelo Decreto 8.858, de 26 de setembro
de 2016 ...................................................................................................................................................349
199.3 Excepcionalidade absoluta do uso algemas nos pés (“marca-passo”) ..........................349
199.4 Vedação do uso de algemas em mulheres grávidas ............................................................349
Art. 200..................................................................................................................................................................349
200.1 Não obrigatoriedade ao trabalho do condenado por crime político.............................349
Art. 201...................................................................................................................................................................350
201.1 Sobre a prisão civil do devedor de alimentos .........................................................................350
Art. 202..................................................................................................................................................................350
202.1 Direito de silêncio nas certidões ..................................................................................................350
Art. 203..................................................................................................................................................................350

Art. 204.................................................................................................................................................................. 351


Comentários à
LEI DE EXECUÇÃO PENAL

TÍTULO I
Do Objeto e da Aplicação da
Lei de Execução Penal

Art. 1º  A execução penal tem por objetivo efetivar as disposições de


sentença ou decisão criminal e proporcionar condições para a harmônica
integração social do condenado e do internado.

1.1 Objetivo da execução penal

A Constituição de 1988 não estabelece explicitamente um escopo ou objetivo


para a execução penal. Porém, o intuito de fazer do cumprimento da pena privativa
de liberdade um momento de reforma do indivíduo – através de sua reeducação,
ressocialização, ou termo análogo – é finalidade declarada da legislação e que vem
se manifestar claramente na previsão de um tratamento penitenciário composto
por atividades assistenciais e pela constrição ao trabalho.
O debate de natureza político-criminal travado neste ponto diz respeito à
possibilidade de não recepção desse escopo – o artigo tem redação de 1984 – pela
Constituição de 1988 ou sua inconstitucionalidade, no caso de nova redação, em
face do princípio da secularização expresso pela dignidade da pessoa humana.
Nas poucas vezes em que o STF se manifestou sobre o tema, venceu a
admissibilidade do escopo de reintegração social: “A progressão no regime de
cumprimento da pena, nas espécies fechado, semi-aberto e aberto, tem como razão
maior a ressocialização do preso que, mais dia ou menos dia, voltará ao convívio social”

37
Art. 1º ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

(STF, HC 82959/SP, Rel. Min. Marco Aurélio, j. 23/02/2006). O tema em regra


retorna quando se trata de remição de pena: “Os princípios da segurança jurídica
e da proteção da confiança tornam indeclinável o dever estatal de honrar o compromisso
de remir a pena do sentenciado, legítima contraprestação ao trabalho prestado por ele na
forma estipulada pela administração penitenciária, sob pena de desestímulo ao trabalho e
à ressocialização” (STF, RHC 136509/MG, Rel. Min. Dias Toffoli, 2º T., j. 04/04/2017).
O escopo de reintegração é expresso, ainda, no Pacto Internacional de Direitos
Civis e Políticos (art. 10, §5º) e na Convenção Americana de Direitos Humanos
ou Pacto de São José da Costa Rica (art. 5, §6º).
Dentro de um escopo geral de redução de danos, a finalidade de viabilização
da harmônica integração social do condenado cumpre papel importante, como se
poderá constatar em diversos momentos no estudo do Direito de Execução Penal.
Aceitando-o sob tal ótica, pode-se dizer que ainda que se adote uma concepção
“ingênua” sobre o Direito Penal, confiando, assim, nos discursos de legitimação
da pena, este artigo vem sendo até o momento relegado por grande parte dos
operadores do direito.

1.2 Crítica à prática judicial sobre o objetivo da execução penal

É corriqueira a transposição equivocada das finalidades da pena no momento


da fixação judicial para o momento da execução. Não raro, por exemplo, verifica-
se que benefícios como a progressão de regime e o livramento condicional
são negados com base na gravidade do crime cometido. Assim também as
interpretações comumente dadas às Súmulas 439/STJ e Súmula Vinculante
26/STF, analisadas adiante, as quais permitem a exigência de exame criminológico
mediante decisão fundamentada e de acordo com as peculiaridades do caso
concreto. Ora, tais peculiaridades e fundamentação jamais poderiam se voltar,
como lamentavelmente se voltam cotidianamente, para o momento da prática do
ato delituoso, de modo que a gravidade do crime cometido, ainda que analisada
in concreto – no mais das vezes com sofríveis e rasas argumentações –, jamais
poderia servir de fundamento para a denegação de qualquer benefício durante
a execução da pena.
Ocorre que os crimes mais graves são punidos com penas mais altas.
E é justamente no momento da cominação em abstrato e da fixação judicial em
con­creto da pena que a lei permite a sua exasperação por valorações sobre, por
exem­plo, a culpabilidade ou os motivos, circunstâncias e consequências do crime.
No momento da execução de tais penas, o único foco deve ser a trajetória do
próprio apenado dentro do sistema prisional e a projeção das condições em
38
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 1º

que se dará seu reingresso em liberdade. Tal nada mais é do que decorrência da
própria divergência de finalidades da pena no momento da persecução criminal
e no momento da execução. Não é despiciendo lembrar que a Lei de Execução
Penal foi estatuída inicialmente pela Lei nº 7.210/84, uma lei, portanto, elaborada
conjuntamente à Lei nº. 7.209/84, a qual realizou a reforma da Parte Geral do
Código Penal. Ora, o mesmo legislador e comissão científica contribuíram em
conjunto para ambas as leis, as quais, entretanto, possuem disposições díspares
para as finalidades da pena: a parte geral do Código Penal, em seu artigo 59,
permite a adoção das finalidades retributivas e preventivas e, em decorrência das
circunstâncias em tal artigo elencadas, bem como da observação de diversos outros
artigos do diploma, tem-se claro que a prevenção não se esgota na modalidade
especial positiva. Por sua vez, como fixa o art. 1º da LEP, a única finalidade
possível no momento da execução é a prevenção especial positiva, de modo que
a reprovação do fato já foi dada pela maior pena fixada em concreto. Admitir que
as mesmas circunstâncias já utilizadas para exasperar a pena imposta voltem a
assombrar o indivíduo que possui comportamento exemplar durante a execução,
além de negar e confundir a finalidade da pena na execução penal com a finalidade
da pena no momento da fixação judicial, constitui inegável bis in idem.

1.3 Repercussão da vedação à revisão criminal pro societate na execução


penal

Se não há execução sem título, também não há execução para além do


título. Mesmo erros graves da sentença, em benefício do condenado, devem
prevalecer em homenagem à coisa julgada soberana que não pode ser alterada,
especificamente por inexistir revisão criminal pro societate. Também sentenças
dúbias ou que contenham disposições contraditórias ou obscuras devem ser
sempre interpretadas da forma mais favorável. Cabe à acusação, no âmbito do
processo de conhecimento, zelar tempestivamente pela correta aplicação da lei.
A ausência de declaração expressa e clara do prejuízo na sentença penal con­de­
natória somente favorece o réu, jamais o prejudica. Apenas a título de exemplo,
pode-se mencionar a questão do reconhecimento da reincidência. É bastante claro
que o momento para o seu reconhecimento é o da condenação, sendo circunstância
agravante genérica, que deve, assim, ser expressamente reco­nhecida na segunda
fase da dosimetria da pena. Ora, uma vez que tal circunstância não tenha constado
em sentença, e ainda nos casos em que era de rigor o seu reconhecimento, não
pode o juízo da execução querer reconhecê-la no momento da execução (contra
esse entendimento, porém: STF, RHC 176.216/MG, j. 05/02/2021).

39
Art. 2º ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

1.4 Duplicidade de condenações pelo mesmo fato

Na absurda – mas possível – hipótese de duplicidade de sentenças


condenatórias por um mesmo fato, deve ser executada uma única sentença,
havendo divergência, porém, sobre qual deve prevalecer: a mais favorável ao
réu, com base no princípio do favor-rei, ou a primeira a ter sido proferida, com
base no critério temporal e de precedência?
Embora houvesse posição na 6ª Turma do STJ pela primeira corrente, ou
seja, pela prevalência da sentença mais favorável, independentemente de qual
decisão foi publicada primeiro (HC 281.101/SP, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior,
6ª T., j. 03/10/2017), a tendência atual é de formação de maioria pelo critério da
precedência. Nesse sentido, há decisões no STF (por exemplo, HC 101.131, Rel.
P. acórdão Min. Marco Aurélio, 1ª T., j. 25/10/2011) e no STJ (RHC 69.586/PA, Rel.
Min. Sebastião Reis Júnior, Rel. Acd. Min. Rogerio Schietti Cruz, por maioria,
j. 27/11/2018, DJe 04/02/2019).

Art. 2º  A jurisdição penal dos Juízes ou Tribunais da Justiça ordinária,


em todo o Território Nacional, será exercida, no processo de execução,
na conformidade desta Lei e do Código de Processo Penal.
Parágrafo único. Esta Lei aplicar-se-á igualmente ao preso provisório
e ao condenado pela Justiça Eleitoral ou Militar, quando recolhido a
estabelecimento sujeito à jurisdição ordinária.

2.1 Natureza jurídica da execução penal

O art. 2º deve ser lido em conjunto com o art. 65 da LEP, na medida em que
tratam, respectivamente, da jurisdição e da competência em matéria execucional.
Prevalece na doutrina e jurisprudência a posição em prol da natureza mista,
híbrida ou complexa (jurisdicional e administrativa) da execução penal, desde
a entrada em vigor da LEP em 19841. A posição que visualiza o exercício da
função jurisdicional somente no início ou no encerramento da execução da

Vide o teor das Súmulas 39 e ss. do encontro “Mesas de Processo Penal” realizado no primeiro
1

semestre de 1985; cfr. GRINOVER, Ada Pellegrini; BUSANA, Dante (Coord.). Execução Penal:
mesas de processo penal, doutrina, jurisprudência e súmulas. São Paulo: Max Limonad, 1987.

40
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 2º

pena, ou em “incidentes”, parece na verdade dar preferência à dimensão


administrativa. A concepção híbrida, em outras palavras, pressupõe um processo
administrativo de execução “dentro” do qual haveriam procedimentos incidentais
jurisdicionalizados.
Todavia, no mundo do “dever ser”, o processo não pode ser senão visto
como plenamente jurisdicionalizado: executar a pena é atuar o poder-dever de
punir do Estado que decorre do acertamento do caso penal realizado pelo juiz,
na sentença ou acórdão. Tal atuação não consiste, porém, em uma “carta em
branco” às autoridades penitenciárias, mas – e este é o ponto – deve/deveria ser
inteiramente balizada e limitada pelo conteúdo da condenação.

2.2 Jurisdicionalidade da execução vs. flexibilidade do


“projeto penitenciário”

De outro lado, a tensão historicamente verificada entre a afirmação da


jurisdicionalidade da execução e a flexibilidade e tendência à indeterminação
inerente ao “projeto penitenciário” implica e recomenda uma reflexão mais
aprofundada em face da noção de coisa julgada, tanto em relação à sentença
condenatória como em face das decisões proferidas no curso da execução.
As modificações qualitativas e quantitativas que ocorrem no curso da
execução da pena são tradicionalmente relacionadas à cláusula rebus sic stantibus,
a qual permitiria a alteração do pacto em face de modificações nas circunstâncias
de fato2. A impropriedade de tal explicação é manifesta pelo fato de que a
pena aplicada não é um contrato entre partes a ser “ajustado” ou “reajustado”.
Evidentemente, a relação entre condenado e Estado não guarda qualquer paralelo
com o que se define como relação contratual. Trata-se de inadequada aplicação
de uma figura típica do direito privado à execução penal e que denuncia, assim,
grave lacuna teórica.
No art. 2º, fica claro que a LEP é o ato normativo que baliza o exercício
do poder jurisdicional em matéria de execução penal, sendo fixado como fonte
imediatamente subsidiária o Código de Processo Penal. Há consequências
importantes na prevalência do CPP sobre o CPC, por exemplo, no preenchimento
de lacunas como a inexistência de prazo e rito para o recurso de agravo em

2
No Brasil, nesse sentido: GRINOVER, Ada Pellegrini; BUSANA, Dante (Coord.). Execução Penal,
op.cit., p. 91 e ss. E também: GRINOVER, Ada Pellegrini. Eficácia e autoridade da sentença penal. São
Paulo: Revista dos Tribunais, 1978.

41
Art. 2º ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

execução previsto no art. 197 da LEP e na abertura de possibilidade de aplicação


de dispositivos do CPP que sejam pertinentes, sobretudo quanto à prova, na
apuração de faltas disciplinares, e quanto a eventual necessidade de retificação
da identidade da pessoa que se encontra presa (“Art. 259: A impossibilidade de
identificação do acusado com o seu verdadeiro nome ou outros qualificativos não retardará
a ação penal, quando certa a identidade física. A qualquer tempo, no curso do processo,
do julgamento ou da execução da sentença, se for descoberta a sua qualificação, far-se-á a
retificação, por termo, nos autos, sem prejuízo da validade dos atos precedentes”).
Interessante notar a ausência de menção ao Código Penal, embora tenham
sido inseridos nele, na Reforma da Parte Geral de 1984, diversas regras concer­
nentes à execução penal, especialmente quanto ao livramento condicional. Seria
benéfico que apenas a LEP tratasse desses assuntos, sendo tais artigos retirados
do Código Penal.

2.3. Aplicação da LEP aos presos provisórios

No que tange aos presos provisórios, a LEP é aplicável no que for cabível.
Não havendo nenhuma condenação, ainda assim a pessoa presa deve respeitar
os deveres e ter respeitados os direitos previstos na lei, podendo trabalhar e
estudar. Ela pode inclusive vir a sofrer sanções administrativas caso pratique falta
disciplinar. Contudo, é inadmissível projetar consequências para o futuro processo
judicial de execução (por exemplo, a perda de dias remidos ou a interrupção da
data-base), esgotando-se eventuais sanções no aspecto meramente administrativo.
Entende-se por preso provisório a pessoa mantida em custódia por força de
prisão cautelar (preventiva ou temporária), não se podendo confundir tal situação
com aquela referente à execução provisória da pena do réu preso preventivamente
que vem a ser condenado em primeiro grau e recorre da sentença. Havendo a
expedição de guia de recolhimento provisória, não há lógica alguma em subsistir
a prisão cautelar, sendo o próprio mandado de prisão transferido ao juízo de
execução penal. Por isso mesmo, será possível a progressão de regime e eventual
acesso a outros direitos da execução. Sobre o tema da execução provisória da pena
pro reo, v. comentários ao art. 105 e seguintes.

42
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 3º

Art. 3º  Ao condenado e ao internado serão assegurados todos os direitos


não atingidos pela sentença ou pela lei.
Parágrafo único. Não haverá qualquer distinção de natureza racial, social,
religiosa ou política.

3.1 Direitos limitados pela execução penal

A função jurisdicional na execução penal tem – ou deveria ter – caráter


marcantemente limitador e garantista, no sentido de redução de danos, especial­
mente em face da garantia legal de todos os direitos não atingidos pela condenação.
Nesse sentido, a execução penal jurisdicionalizada implica, no mínimo, (a)
a limitação e a vinculação da discricionariedade das autoridades penitenciárias
com base no conteúdo da condenação e na própria lei e Constituição; (b) a garantia
do direito constitucional à ampla defesa e contraditório em todas as situações,
inclusive quando se trata de redução de direitos praticada pela autoridade
penitenciária como forma de manutenção da ordem; e (c) a obrigatoriedade de
motivação de todas as decisões – judiciais ou administrativas – que impliquem
modificação qualitativa e/ ou quantitativa no cumprimento da pena.
Assim, o jurista crítico deve reconhecer – descritivamente – a execução penal
como um espaço de não-direito e, portanto, de exercício do arbítrio, sem que isso
o leve à resignação e ao afastamento. Para tanto, porém, é preciso sempre afirmar
– normativamente – a importância da contenção, pela via jurisdicional, do arbítrio
consubstanciado no cotidiano que dá conteúdo à execução da pena, mesmo se de
forma sabidamente limitada.
Trata-se da única posição legítima, do ponto de vista normativo, em face do
teor da LEP e da Constituição da República, que configuram uma execução penal
dinâmica e voltada à inclusão – muito além, portanto, da concepção estática ou
meramente formalizadora/realizadora dos resultados do processo de cognição.

3.2 Estado de coisas inconstitucional e violação de direitos

O Supremo Tribunal Federal reconheceu quadro de crônica violação de


direitos fundamentais no sistema prisional brasileiro, no bojo da ADPF 347,
em medida cautelar (aguarda, ainda, julgamento de mérito): “CUSTODIADO –
INTEGRIDADE FÍSICA E MORAL – SISTEMA PENITENCIÁRIO – ARGUIÇÃO

43
Art. 3º ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL – ADEQUAÇÃO.


Cabível é a arguição de descumprimento de preceito fundamental considerada a situação
degradante das penitenciárias no Brasil. SISTEMA PENITENCIÁRIO NACIONAL –
SUPERLOTAÇÃO CARCERÁRIA – CONDIÇÕES DESUMANAS DE CUSTÓDIA –
VIOLAÇÃO MASSIVA DE DIREITOS FUNDAMENTAIS – FALHAS ESTRUTURAIS
– ESTADO DE COISAS INCONSTITUCIONAL – CONFIGURAÇÃO. Presente quadro
de violação massiva e persistente de direitos fundamentais, decorrente de falhas estruturais
e falência de políticas públicas e cuja modificação depende de medidas abrangentes de
natureza normativa, administrativa e orçamentária, deve o sistema penitenciário nacional
ser caraterizado como “estado de coisas inconstitucional”. (...)” (STF, ADPF 347 MC/
DF, Rel. Min. Marco Aurélio, j. 09/09/2015).

3.3 Vedação de tratamento discriminatório

O parágrafo único veda qualquer tratamento discriminatório fundado


em critérios raciais, sociais, religiosos ou políticos, abrangendo a vedação de
tratamento discriminatório fundado na identidade de gênero.

3.4 Suspensão dos direitos políticos

A própria Constituição determina, em seu art. 15, III, a suspensão dos direitos
políticos no caso de “condenação criminal transitada em julgado, enquanto durarem
seus efeitos”. Há movimentos políticos pela alteração da regra (uma tentativa, por
exemplo, foi a PEC nº. 65/2003, arquivada).
Sobre a aplicação da suspensão dos direitos políticos para condenações a
pena restritiva de direitos, o STF apreciou o tema no RE 601.182/MG (Tema 370),
decidindo, por maioria, pela fixação da tese: “A suspensão de direitos políticos
prevista no art. 15, inc. III, da Constituição Federal aplica-se no caso de substituição
da pena privativa de liberdade pela restritiva de direitos”.

3.5 Suspensão dos direitos políticos e pendência de pagamento


da pena de multa

Controvérsia de grande relevância prática diz respeito à manutenção da


suspensão dos direitos políticos na pendência de pagamento da pena de multa,
quando já declarada extinta a punibilidade por integral cumprimento da pena
privativa de liberdade. Ou seja: após o cumprimento da pena de prisão, a pessoa
44
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 3º

muitas vezes segue sem conseguir regularizar título de eleitor e demais docu­
mentos, inclusive o Cadastro de Pessoa Física (CPF), por causa do não pagamento
da pena de multa.
Em 19 de fevereiro de 2018, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) manteve
entendimento definido no PA nº. 936-31/MS, no sentido de que “a pendência de
pagamento de pena de multa, ou sua cominação isolada, tem o condão de manter ou ensejar
a suspensão dos direitos políticos prevista no art. 15, inciso III, da Constituição Federal”
(TSE, Processo Administrativo nº. 0604343-88.2017.6.00.0000-Brasília/DF, Rel. Min.
Gilmar Mendes), indeferindo pedido do Colégio de Corregedores Eleitorais pela
revisão da posição.
Atenção, porém: da leitura atenta do acórdão mencionado, vê-se que o
TSE apenas não quis permitir interpretação de que poderia ele se sobrepor à
competência do juízo penal para declaração da extinção da punibilidade. Mas
havendo declaração de extinção da punibilidade, ela deve sim alcançar a pena
de multa pendente, para todos os fins. Destaca-se o seguinte trecho da mesma
decisão: “não é o caso de alterar o entendimento esposado por esta Corte, mas de orientar
os Tribunais Regionais Eleitorais, por meio da Corregedoria-Geral Eleitoral, para que
exijam, tão somente, a comunicação da extinção da punibilidade (mesmo nos casos em
que a pena de multa é a única aplicada), sem juízo acerca da decisão”. A conclusão do
TSE, portanto, é que “a comunicação de extinção da punibilidade encaminhada pela
Justiça Comum é suficiente para o cumprimento do disposto na decisão prolatada no PA
nº. 936-31/ MS, não cabendo à Justiça Eleitoral analisar o acerto ou o desacerto da decisão
do órgão de origem”.
Em suma, tendo havido a declaração da extinção de punibilidade pelo juízo
penal, o respectivo Tribunal Regional Eleitoral deve imediatamente proceder à
regularização dos direitos políticos suspensos.
Ocorre que, após o julgamento da ADI 3.150/DF pelo STF, o STJ reviu enten­
dimento anterior e afirmou que “o inadimplemento da pena de multa obsta a
extinção da punibilidade do apenado” (STJ, AgRg no REsp 1.850.903/SP, 5ª T.,
j. 28/04/2020).
Caso o juízo penal não declare a punibilidade extinta por conta da pendência
do pagamento da pena pecuniária, uma das opções é pedir o indulto da pena
de multa, se devidamente preenchidos os requisitos. Até dezembro de 2015, os
decretos presidenciais de indulto coletivo vinham contemplando a hipótese:
por exemplo, indultando pessoas “condenadas a pena de multa, ainda que não
quitada, independentemente da fase executória ou do juízo em que se encontre, aplicada
cumulativamente com pena privativa de liberdade cumprida até 25 de dezembro de
2015, desde que não supere o valor mínimo para inscrição de débitos na Dívida Ativa da
45
Art. 4º ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

União, estabelecido em ato do Ministro de Estado da Fazenda, e que não tenha capacidade
econômica de quitá-la” (art. 1º, XI, Decreto 8.615/2015).
Independentemente do cabimento de indulto, é muito frequente que ocorra
a prescrição em cinco anos, considerando que as causas de interrupção são
exclusivamente aquelas previstas no Código Tributário Nacional (art. 174, caput
e parágrafo único, CTN), não havendo interrupção por conta do cumprimento
da pena (art. 117, V, CP). O pedido de reconhecimento da prescrição deve ser
endereçado ao juízo criminal.

3.6 Tratamento penitenciário no Pacto Internacional de Direitos Civis


e Políticos

O art. 10 do PIDCP, promulgado pelo Decreto nº. 592, de 6 de julho de 1992,


afirma que “toda pessoa privada de sua liberdade deverá ser tratada com humanidade e
respeito à dignidade inerente à pessoa humana” e que o objetivo principal do regime
penitenciário seria “a reforma e a reabilitação normal dos prisioneiros”.
A Observação Geral nº. 21, do Comitê de Direitos Humanos das Nações
Unidas, que comenta o dispositivo, aborda o tratamento das pessoas privadas
de liber­dade, afirma que ele abrange todas as pessoas privadas de liberdade pelo
Estado, inclusive em hospitais psiquiátricos ou instituições similares.

Art. 4º O Estado deverá recorrer à cooperação da comunidade nas


atividades de execução da pena e da medida de segurança.

4.1 Cooperação da comunidade na execução penal

O escopo de “proporcionar condições para a harmônica integração social” previsto


no art. 1º da LEP necessita da cooperação da comunidade para se tornar factível,
sobretudo para viabilização das alternativas penais em sentido amplo. Alternativas
como penas restritivas de direito, políticas de assistência por meio dos Patronatos e
o potencial dos Conselhos da Comunidade são exemplos de espaços saudáveis de
participação popular, assim como outras iniciativas não expressamente previstas
na LEP como os “escritórios sociais” e as APAC’s (Associações de Proteção e
Assistência aos Condenados).

46
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 4º

4.2 Princípio da interatividade: cooperação entre Poder Executivo e


Sistema de Justiça Criminal

Foi criado pelo Governo Federal o Sistema Nacional de Alternativas Penais


(SINAPE) e firmado termo de cooperação técnica entre Ministério da Justiça
e Conselho Nacional de Justiça (TCT nº. 006/2015), em todos os momentos
enfatizando a articulação necessária com o sistema de justiça e as “redes
parceiras” para acolhimento de condenados e acompanhamento das penas
restritivas de direito. É o chamado princípio da interatividade. No mesmo sentido,
estabeleceu-se como diretriz a descentralização e o estímulo à criação de Centrais
de Apoio e Acompanhamento às Penas e Medidas Alternativas (CEAPA’s) ou
Centrais Integradas de Alternativas Penais. Vide, sobre o tema, a Resolução nº.
06/2009-CNPCP e a Resolução nº. 101/2009-CNJ.

4.3 Cooperação da comunidade e medidas de segurança

No tema da saúde mental, com a necessidade de urgente superação do


paradigma da “periculosidade” sobre o qual são fundadas as medidas de
segurança, a Lei 10.216/2001 prevê expressamente o direito da pessoa portadora
de transtorno mental a ser tratada preferencialmente em serviços comunitários
de saúde mental (art. 2º, IX) e ser “responsabilidade do Estado o desenvolvimento da
política de saúde mental, a assistência e a promoção de ações de saúde aos portadores de
transtornos mentais, com a devida participação da sociedade e da família, a qual será
prestada em estabelecimento de saúde mental, assim entendidas as instituições ou unidades
que ofereçam assistência em saúde aos portadores de transtornos mentais” (art. 3º).

4.4 APACs

Movimento que tem ganho espaço no debate sobre a assistência na execução


penal para além da exclusividade estatal, recorrendo-se à “cooperação da
comunidade”, é aquele conhecido como Associações de Proteção e Assistência aos
Condenados, ou simplesmente APAC’s. Originadas de movimentos marcadamente
religiosos, as APACs têm despertado grande interesse, inclusive da comunidade
científica internacional, pelas experiências em Minas Gerais, São Paulo e início de
sua implantação em outros Estados, como Paraná, defendendo a abertura do sistema
prisional ao protagonismo altruísta de membros e organizações da sociedade
civil, sem quaisquer fins lucrativos, como forma de redução da reincidência.

47
Art. 4º ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

A experiência, por um lado, indica um caminho altamente recomendável para


qualquer perspectiva progressista que é a abertura e oxigenação do fechadíssimo
ambiente carcerário – destaca-se que se trata sempre de regime fechado – a
iniciativas comunitárias e mesmo informais; por outro, porém, levanta indagações
sobre a constitucionalidade do reconhecimento incondicional, pelo Estado, de um
método substancialmente pautado pela religião como forma de ressocialização e,
por fim, que não se apresenta como alternativa – bem ao contrário – ao conteúdo
disciplinar da pena privativa de liberdade.
O Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária reconheceu a
APAC como método de gestão prisional e propôs seu fortalecimento como diretriz
de política penitenciária (Resolução 3/2019, publicada em janeiro de 2021). A
resolução recomenda, ao Departamento Penitenciário Nacional, a destinação de
recursos do Fundo Penitenciário Nacional a projetos de APAC’s e recomenda
a não aplicação das mesmas regras de arquitetura prisional utilizadas para os
demais estabelecimentos de regime fechado.

4.5 Cooperação da comunidade e terceirização

Não parece conveniente que por “cooperação da comunidade” se entenda


também as propostas de terceirização de serviços ou mesmo da administração
das unidades prisionais. Polêmico, o tema é importante, mas deve ser tratado com
transparência, sendo inconveniente a sobreposição entre esse debate com as outras
iniciativas identificadas como efetiva participação e cooperação da comunidade.

48
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 5º

TÍTULO II
Do Condenado e do Internado

CAPÍTULO I
Da Classificação

Art. 5º  Os condenados serão classificados, segundo os seus antecedentes


e personalidade, para orientar a individualização da execução penal.

5.1 Classificação dos condenados e individualização

Conceito tão antigo quanto a pena de prisão, mas sempre apresentado como
proposta inovadora, a proposta é de viabilizar o projeto de “reforma moral” do
condenado através da elaboração de um programa individualizado (art. 5º, XLVI,
CF), para o qual é fundamental a classificação por “perfil”, ou, nos termos da lei,
“segundo os seus antecedentes e personalidade”.
Os artigos seguintes descrevem os lineamentos da análise da personalidade
por meio de equipe técnica e do “exame criminológico” previsto no art. 8º.
Na prática, todavia, sabe-se bem que se trata de “letra morta”: a preocupação
da autoridade penitenciária é com a manutenção da ordem e, portanto, com a
preservação da segurança dos detentos e funcionários. A única classificação
efetivamente existente é aquela segundo os riscos eventualmente produzidos pela
colocação do preso nessa ou naquela galeria, cubículo, unidade, etc. Presos com
acusações por crimes sexuais, por exemplo, costumam ser isolados dos demais
por conta do risco real de serem agredidos ou feitos reféns no primeiro motim.
Presos que participam de facções criminosas organizadas, de outro lado, são em
regra agrupados conforme o grupo a que pertencem.

49
Art. 6º  ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

Art. 6º  A classificação será feita por Comissão Técnica de Classificação


que elaborará o programa individualizador da pena privativa de liberdade
adequada ao condenado ou preso provisório. (Redação dada pela Lei nº
10.792, de 2003)

6.1 Órgão responsável pela classificação do condenado

Com as ressalvas já apresentadas, o que dispõe a Lei é que a classificação


seja feita por Comissão Técnica de Classificação. Com base nos resultados da
observação, são formuladas indicações para cada condenado ou internado e assim
preenchido o respectivo “programa individualizador”, o qual será integrado
ou modificado segundo as exigências colocadas no curso da execução. Previsão
similar, embora pertencente a outro contexto, é a obrigatoriedade de elaboração
de Plano Individual de Atendimento (PIA) ao adolescente no bojo das medidas
socioeducativas (art. 52 e ss. da Lei 12.594/2012).

Art. 7º  A Comissão Técnica de Classificação, existente em cada estabe­


leci­mento, será presidida pelo diretor e composta, no mínimo, por 2 (dois)
chefes de serviço, 1 (um) psiquiatra, 1 (um) psicólogo e 1 (um) assistente
social, quando se tratar de condenado à pena privativa de liberdade.
Parágrafo único. Nos demais casos a Comissão atuará junto ao Juízo da
Exe­cução e será integrada por fiscais do serviço social.

7.1 Composição da Comissão Técnica de Classificação

Trata-se de equipe de técnicos, presidida pelo diretor do estabelecimento


prisional e composta por educadores e experts (psiquiatras, psicólogos e assistentes
sociais) com o encargo de desenvolver a atividade de “observação científica
da personalidade”, componente explícito de exercício do poder disciplinar e
bastante distante de qualquer viés efetivamente clínico ou terapêutico. Mais uma
vez, a previsão legal esbarra na realidade de carência de profissionais e recursos
humanos, sobretudo nos sistemas prisionais estaduais.

50
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 8º

7.2 O que pode mudar

O Projeto de Lei nº. 9.054/2017, em tramitação na Câmara dos Deputados


(já aprovado no Senado Federal), propõe diretriz de “despatologização” da
individualização executória da pena, com a modificação da composição da CTC
em uma linha de maior flexibilidade e desnecessidade da figura do psiquiatra e
mesmo do psicólogo, este último apenas “quando houver”.

Art. 8º  O condenado ao cumprimento de pena privativa de liberdade, em


regime fechado, será submetido a exame criminológico para a obtenção
dos elementos necessários a uma adequada classificação e com vistas à
individualização da execução.
Parágrafo único. Ao exame de que trata este artigo poderá ser submetido
o condenado ao cumprimento da pena privativa de liberdade em regime
semi-aberto.

8.1 Exame criminológico para fins de classificação

O exame criminológico foi concebido, dentro do discurso tratamental,


como oportunidade de um diagnóstico clínico supostamente mais aprofundado,
orientado por parâmetros etiológicos e tendo em vista a elaboração de
prognósticos sobre o comportamento do indivíduo. O exame criminológico para
fins de classificação – diferente daquele realizado para verificação de mérito do
condenado, quando requer um direito da execução penal – não foi extinto ou
tocado pela Lei 10.792/2003, cingindo-se a controvérsia existente à possibilidade
de sua realização por ocasião da análise do requisito disciplinar para progressão
de regime e livramento condicional (sobre, v. comentários ao art. 112). São dois
contextos que não devem ser confundidos e que chegam a ser contraditórios do
ponto de vista ético-profissional, na medida em que não se concebe que um mesmo
profissional (psiquiatra ou psicólogo, por exemplo) emita opinião técnica no
sentido clínico-terapêutico e, em um momento posterior, emita parecer contrário
aos interesses do próprio paciente.

51
Art. 9º ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

Art. 9º  A Comissão, no exame para a obtenção de dados reveladores da


personalidade, observando a ética profissional e tendo sempre presentes
peças ou informações do processo, poderá:
- entrevistar pessoas;
- requisitar, de repartições ou estabelecimentos privados, dados e
informações a respeito do condenado;
- realizar outras diligências e exames necessários.

9.1 Atribuições da Comissão Técnica de Classificação

A CTC deverá observar as regras e balizas ético-profissionais de cada área


técnica, conforme aponta o caput, podendo entrevistar pessoas, requisitar dados
e informações e realizar outras diligências e exames necessários, tudo para obter
“dados reveladores da personalidade” da pessoa que cumpre pena privativa de
liberdade. A questão de fundo sempre presente é qual compreensão ética tem
cada área técnica sobre o escopo de obter “dados reveladores da personalidade”,
sempre a partir de seus princípios fundantes, e não da perspectiva ideologicamente
carregada e distorcida do ambiente prisional.

9.2 Atuação do profissional de psicologia na execução penal

Apenas para exemplificar, vide a grande polêmica em torno à Resolução


nº. 012/2011-CFP (antes Res. 09/2010-CFP), do Conselho Federal de Psicologia,
que regulamentava a atuação da(o) psicóloga(o) no ambiente prisional tendo
por diretriz, entre outras, a “desconstrução do conceito de que o crime está relacionado
unicamente à patologia ou à história individual, enfatizando os dispositivos sociais que
promovem o processo de criminalização” (art. 1º, c), vedando a participação “em
procedimentos que envolvam as práticas de caráter punitivo e disciplinar, notadamente
os de apuração de faltas disciplinares” (art. 2º, parágrafo único).
A resolução foi suspensa por decisão judicial em 2015, a pedido do Ministério
Público Federal na ação civil pública nº. 5028507-88.2011.404.7100/ RS. Em nota
posterior3, o Conselho Federal de Psicologia indica a interferência ideológica

https://site.cfp.org.br/wp-content/uploads/2016/04/
3

52
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 9º-A

do sistema de justiça na profissão de psicólogo e volta a afirmar que o exame


criminológico “não pode ser considerada uma prática da Psicologia, já que este termo
está muito mais afeito às ciências criminológicas, mais especificamente a uma determinada
criminologia clínico-etiológica e não pertence ao universo da ciência Psicologia e nem
da profissão de Psicólogo(a)”; e também que “no pouquíssimo tempo de entrevista,
geralmente uma hora ou duas horas (as vezes as condições externas de avaliação permitem
muito menos que isso) não é possível conhecer a personalidade do condenado e não existem
condições técnicas ou estruturais para fazer uma “prognose criminal” sobre possíveis
reincidências”.
Como se vê, a LEP exige a observância da ética profissional, mas muitas
vezes há enorme choque principiológico e político-criminal entre a perspectiva
do órgão de classe que regulamenta justamente a ética profissional e os objetivos,
nada éticos, da execução penal.
Como servidores públicos, os integrantes da equipe técnica também deverão
observar e respeitar os atos normativos editados pelo superior hierárquico, no
âmbito do Poder Executivo.

Art. 9º-A  O condenado por crime doloso praticado com violência


grave contra a pessoa, bem como por crime contra a vida, contra a
liberdade sexual ou por crime sexual contra vulnerável, será submetido,
obrigatoriamente, à identificação do perfil genético, mediante extração
de DNA (ácido desoxirribonucleico), por técnica adequada e indolor, por
ocasião do ingresso no estabelecimento prisional. (Incluído pela Lei nº
13.964, de 2019)
§ 1º A identificação do perfil genético será armazenada em banco
de dados sigiloso, conforme regulamento a ser expedido pelo Poder
Executivo. (Incluído pela Lei nº 12.654, de 2012)
§ 1º-A. A regulamentação deverá fazer constar garantias mínimas de
proteção de dados genéticos, observando as melhores práticas da
genética forense. (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
§ 2º A autoridade policial, federal ou estadual, poderá requerer ao juiz
compe­tente, no caso de inquérito instaurado, o acesso ao banco de dados
de identificação de perfil genético. (Incluído pela Lei nº 12.654, de 2012)
§ 3º Deve ser viabilizado ao titular de dados genéticos o acesso aos seus
dados constantes nos bancos de perfis genéticos, bem como a todos os
documentos da cadeia de custódia que gerou esse dado, de maneira que

53
Art. 9º-A ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

possa ser contraditado pela defesa. (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
§ 4º O condenado pelos crimes previstos no caput deste artigo que
não tiver sido submetido à identificação do perfil genético por ocasião
do ingresso no estabelecimento prisional deverá ser submetido ao
procedimento durante o cumprimento da pena. (Incluído pela Lei nº
13.964, de 2019)
§ 5º A amostra biológica coletada só poderá ser utilizada para o único e
exclusivo fim de permitir a identificação pelo perfil genético, não estando
autorizadas as práticas de fenotipagem genética ou de busca familiar.
(Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
§ 6º Uma vez identificado o perfil genético, a amostra biológica recolhida
nos termos do caput deste artigo deverá ser correta e imediatamente
descartada, de maneira a impedir a sua utilização para qualquer outro
fim. (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
§ 7º A coleta da amostra biológica e a elaboração do respectivo laudo
serão realizadas por perito oficial. (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
§ 8º Constitui falta grave a recusa do condenado em submeter-se ao
procedi­mento de identificação do perfil genético. (Incluído pela Lei nº
13.964, de 2019)

9-A.1 Identificação do perfil genético de condenado

Trata-se de artigo de constitucionalidade questionável, introduzido pela Lei


12.654, de 28 de maio de 2012, a qual também dispôs sobre a identificação criminal
do civilmente identificado. Ocorre que o art. 9º-A, caput, teve a redação alterada
pela Lei nº 13.964, de 2019, após a derrubada do veto parcial que incidira sobre
o caput, em abril de 2021.
Na nova redação, reduziu-se o rol de crimes para os quais foi prevista a
submissão obrigatória à identificação do perfil genético por meio de extração
de DNA: crimes dolosos praticados com violência grave contra a pessoa, crime
contra a vida, contra a liberdade sexual ou por crime sexual contra vulnerável.
Portanto, foi excluído da redação do dispositivo a menção a qualquer crime
hediondo constante do rol do art. 1º da Lei 8.072/90.
O objetivo da criação do mecanismo, a princípio, seria facilitar a investigação
das autoridades policiais, como se depreende do art. 9º-A, § 2º, que dispõe que
essas poderão requerer acesso ao banco de dados quando instaurado inquérito.
Como premissa da proposta, institucionaliza-se a pressuposição da existência de

54
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 9º-A

uma classe criminosa composta por indivíduos determinados e identificáveis,


lombrosianamente fadados a reincidir. A obrigatoriedade da coleta desses dados,
com base em critério abstrato – o tipo penal da condenação – parece violar, e não
incrementar ou sofisticar, a individualização executória da pena. Mais isonômico
seria a coleta de dados de todos os cidadãos, se o objetivo é constituir um banco
de dados para incrementar a segurança.
De acordo com os §§ 4º e 8º inseridos no dispositivo legal pela Lei 13.964/
2019, se não houver ocorrido a identificação do perfil genético no ingresso no
estabelecimento penal, o procedimento deve ocorrer durante o cumprimento da
pena, passando a ser considerada falta grave a recusa da pessoa presa na submissão
ao procedimento de identificação (v. comentários ao art. 50).
Os §§ 5º, 6º e 7º também foram inicialmente vetados pelo Presidente da
República e depois promulgados por conta da derrubada dos vetos pelo Congresso
Nacional. De acordo com as novas regras, o único e exclusivo fim da coleta de
material genético, a qual deve ser feita por perito oficial (§ 7º), será a identificação
do perfil genético, não sendo permitida as práticas de fenotipagem genética ou de
busca familiar (§ 5º). Por isso, a amostra deverá ser descartada após identificação
do perfil genético (§ 6º).

9-A.2 Criação do Banco Nacional de Perfis Genéticos

O Decreto 7.950, de 12 de março de 2013, criou o Banco Nacional de Perfis


Genéticos e a Rede Integrada de Bancos de Perfis Genéricos com o escopo de
viabilizar e organizar a coleta dos dados, prevendo a adesão dos Estados por meio
de termos de cooperação técnica. A Lei 13.964/2019 incluiu o § 1º-A, segundo o
qual “a regulamentação deverá fazer constar garantias mínimas de proteção de
dados genéticos, observando as melhores práticas da genética forense”.

9-A.3 Tema com repercussão geral reconhecida no Supremo Tribunal Federal

O tema envolve questões como inviolabilidade da vida privada e o direito de


não produzir prova contra si mesmo, estando em debate no STF, com repercussão
geral reconhecida (STF, RExt 973.837/MG, Rel. Min. Gilmar Mendes): “Repercussão
geral. Recurso Extraordinário. Direitos fundamentais. Penal. Processo Penal. 2. A Lei
12.654/12 introduziu a coleta de material biológico para a obtenção do perfil genético,
na execução penal por crimes violentos ou por crimes hediondos (Lei 7.210/84, art. 9-A).
Os limites dos poderes do Estado de colher material biológico de suspeitos ou condenados

55
Art. 10 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

por crimes, de traçar o respectivo perfil genético, de armazenar os perfis em bancos de dados
e de fazer uso dessas informações são objeto de discussão nos diversos sistemas jurídicos.
Possível violação a direitos da personalidade e da prerrogativa de não se autoincriminar
– art. 1º, III, art. 5º, X, LIV e LXIII, da CF. 3. Tem repercussão geral a alegação de
inconstitucionalidade do art. 9-A da Lei 7.210/84, introduzido pela Lei 12.654/12, que prevê
a identificação e o armazenamento de perfis genéticos de condenados por crimes violentos
ou por crimes hediondos. 4. Repercussão geral em recurso extraordinário reconhecida”.

9-A.4 Garantia de acesso aos dados e direito ao contraditório

A Lei 13.964/2019 estabeleceu garantia de acesso dos dados constantes no


banco de dados ao respectivo titular, visando preservar o direito ao contraditório
(§ 3º).

CAPÍTULO II

Da Assistência

SEÇÃO I
Disposições Gerais

Art. 10  A assistência ao preso e ao internado é dever do Estado,


objetivando prevenir o crime e orientar o retorno à convivência em
sociedade.
Parágrafo único. A assistência estende-se ao egresso.

10.1 Obrigação do Estado de prestar assistência ao preso, ao internado e ao


egresso

A LEP define obrigações de fazer do Estado para com pessoas que estão sob
sua custódia, e também para o egresso, com objetivo de “prevenir o crime e orientar
o retorno à convivência em sociedade”.

56
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 10

10.2 Judicialização e inaplicabilidade do princípio da reserva do possível

O inadimplemento das prestações positivas definidas pelas políticas de


assistência pode ser objeto de termos de ajuste de conduta ou judicializado por
meio de ações civis públicas, sem que se possa opor aos pedidos deduzidos os
princípios da reserva do possível e separação dos poderes: “(...) 3. “Princípio da
reserva do possível”. Inaplicabilidade. O Estado é responsável pela guarda e segurança
das pessoas submetidas a encarceramento, enquanto permanecerem detidas. É seu dever
mantê-las em condições carcerárias com mínimos padrões de humanidade estabelecidos
em lei, bem como, se for o caso, ressarcir danos que daí decorrerem. 4. A violação a direitos
fundamentais causadora de danos pessoais a detentos em estabelecimentos carcerários não
pode ser simplesmente relevada ao argumento de que a indenização não tem alcance para
eliminar o grave problema prisional globalmente considerado, que depende da definição e
da implantação de políticas públicas específicas, providências de atribuição legislativa e
administrativa, não de provimentos judiciais. Esse argumento, se admitido, acabaria por
justificar a perpetuação da desumana situação que se constata em presídios como o de que
trata a presente demanda. 5. A garantia mínima de segurança pessoal, física e psíquica,
dos detentos, constitui dever estatal que possui amplo lastro não apenas no ordenamento
nacional (Constituição Federal, art. 5º, XLVII, “e”; XLVIII; XLIX; Lei 7.210/84 (LEP),
arts. 10; 11; 12; 40; 85; 87; 88; Lei 9.455/97 - crime de tortura; Lei 12.874/13 – Sistema
Nacional de Prevenção e Combate à Tortura), como, também, em fontes normativas
internacionais adotadas pelo Brasil (Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos das
Nações Unidas, de 1966, arts. 2; 7; 10; e 14; Convenção Americana de Direitos Humanos,
de 1969, arts. 5º; 11; 25; Princípios e Boas Práticas para a Proteção de Pessoas Privadas
de Liberdade nas Américas – Resolução 01/08, aprovada em 13 de março de 2008, pela
Comissão Interamericana de Direitos Humanos; Convenção da ONU contra Tortura e
Outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos ou Degradantes, de 1984; e Regras
Mínimas para o Tratamento de Prisioneiros – adotadas no 1º Congresso das Nações
Unidas para a Prevenção ao Crime e Tratamento de Delinquentes, de 1955)” (STF, REXT
580.252/MS, Rel. p/ acórdão: Min. Gilmar Mendes, j. 16/02/2017).

57
Art. 11 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

Art. 11  A assistência será:


I - material;
II - à saúde;
III - jurídica;
IV - educacional;
V - social;
VI - religiosa.

11.1 Modalidades de assistência

A lei prevê seis modalidades de assistência, havendo interseção clara


entre este tema e aquele dos direitos dos presos. Além da LEP, há fundamento
constitucional para se obrigar o Estado a cumprir com tais obrigações na vedação
de penas crueis (art. 5º, XLVII, “e”, CF) e na garantia aos presos do respeito à
integridade física e moral (art. 5º, XLIX, CF).
Outras fontes importantes de obrigações materiais de assistência do Estado
são as Regras de Mandela (atual denominação para as Regras Mínimas das Nações
Unidas para o Tratamento de Presos, originalmente aprovada em 1955) e as
Regras de Bangkok (Regras das Nações Unidas para o Tratamento de Mulheres
Presas e Medidas não privativas de liberdade para mulheres infratoras), além da
jurisprudência internacional de direitos humanos pertinente, com respaldo no
Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos e na Convenção Americana de
Direitos Humanos.

11.2 Violação dos deveres de assistência e danos morais

Já decidiu o STF, com repercussão geral reconhecida, que a violação a direitos


fundamentais causadora de danos pessoais a detentos em estabelecimentos
carcerários implica no dever de indenizar por danos morais (STF, RE 580.252/
MS, Rel. para acórdão Min. Gilmar Mendes, Pleno, j. 16/02/2017). Entendeu-se,
na ocasião, que se os danos são causados por agentes estatais ou por inadequação
dos serviços públicos, o dever de indenizar decorre diretamente do art. 37, § 6º,
da Constituição, como disposição normativa autoaplicável.

58
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 12

SEÇÃO II
Da Assistência Material

Art. 12  A assistência material ao preso e ao internado consistirá no


forneci­mento de alimentação, vestuário e instalações higiênicas.

12.1 Conteúdo da assistência material e direito à água potável

Alimentação, vestuário e instalações higiênicas compõem o núcleo mínimo


exigido pela LEP como assistência material, sendo também direito do preso
(vide comentários ao art. 41, I, LEP).
O direito à água potável é componente do direito à alimentação adequada,
assim previsto nas Regras de Mandela (Regra 22.2) e na Observação Geral
nº. 15 do Comitê de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (CDESC) das Nações
Unidas, com expressa menção à população carcerária4. Segundo decisão da Corte
Interamericana de Direitos Humanos (Caso Vélez Loor vs. Panamá, Sentença de
23.11.2010), a ausência de disponibilidade de água potável é uma falta grave do
Estado em relação a seus deveres para com a população carcerária.

12.2 Número mínimo de refeições diárias

A Resolução n. 3/2017 do Conselho Nacional de Política Criminal e Peniten­


ciária fala em 5 (cinco) refeições diárias, a partir de parâmetros da Política Nacional
de Alimentação e Nutrição (PNAN) e da Política Nacional de Segurança Alimentar
e Nutricional (PNSAN). A regra alcança o direito à alimentação dos agentes
penitenciários e demais trabalhadores do sistema prisional. Na prática, porém, é
muito comum que o número de refeições diárias seja inferior.

12.3 Assistência material e população carcerária feminina

A Regra 5 das Regras de Bangkok estabelece que “a acomodação de mulheres


presas deverá conter instalações e materiais exigidos para satisfazer as necessidades

4
ONU/Alto Comisionado de las Naciones Unidas para los Derechos Humanos. Personas privadas de
libertad: jurisprudencia e doctrina. Bogotà: 2006, p. 165-170.

59
Art. 12 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

de higiene específicas das mulheres, incluindo absorventes higiênicos gratuitos e um


suprimento regular de água disponível para cuidados pessoais das mulheres e crianças,
em particular mulheres que realizam tarefas na cozinha e mulheres gestantes, lactantes
ou durante o período da menstruação”.

12.4 Instalações higiênicas e direito a banho quente

É componente da assistência material e à saúde o direito a água aquecida


para o banho, sobretudo em dias frios. O banho quente está compreendido no
conceito de “instalações higiênicas”.
Nesse sentido a Regra 16 das Regras de Mandela: “As instalações de banho e
duche devem ser suficientes para que todos os reclusos possam, quando desejem
ou lhes seja exigido, tomar banho ou duche a uma temperatura adequada ao
clima, tão frequentemente quanto necessário à higiene geral, de acordo com a
estação do ano e a região geográfica, mas pelo menos uma vez por semana num
clima temperado”.
Em importante decisão, assim entendeu o STJ ao garantir a tutela anteci­pada
em ação promovida pela Defensoria Pública de São Paulo: “O caso concreto, no
entanto, é peculiar, por ferir triplamente aspectos existenciais da textura íntima
de direitos humanos substantivos. Primeiro, porque se refere à dignidade da
pessoa humana, naquilo que concerne à integridade física e mental a todos
garantida. Segundo, porque versa sobre obrigação inafastável e imprescritível
do Estado de tratar prisioneiros como pessoas, e não como animais. Por mais
grave que seja o ilícito praticado, não perde o infrator sua integral condição
humana. Ao contrário, negá-la a um, mesmo que autor de crime hediondo, basta
para retirar de todos nós a humanidade de que entendemos ser portadores como
parte do mundo civilizado. Terceiro, porque o encarceramento configura pena de
restrição do direito de liberdade, e não salvo-conduto para a aplicação de sanções
extralegais e extrajudiciais, diretas ou indiretas. Quarto, porque, em presídios e
lugares similares de confinamento, ampliam-se os deveres estatais de proteção
da saúde pública e de exercício de medidas de assepsia pessoal e do ambiente,
em razão do risco agravado de enfermidades, consequência da natureza fechada
dos estabelecimentos, propícia à disseminação de patologias (...). a legislação
impõe ao Estado o dever de garantir assistência material ao preso e ao internado,
nela incluída ‘instalações higiênicas’ (Lei 7.210/1984, art. 12), expressão que
significa disponibilidade física casada com efetiva possibilidade de uso. Assim,
não basta oferecer banho com água em temperatura polar, o que transformaria
higiene pessoal em sofrimento ou, contra legem, por ir além da pena de privação
60
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 13

de liberdade, caracterizaria castigo extralegal e extrajudicial, consubstanciando


tratamento carcerário cruel, desumano e degradante” (STJ, RE 1.537.530/SP, Rel.
Min. Herman Benjamin, DJ 27/02/2020).

Art. 13  O estabelecimento disporá de instalações e serviços que


atendam aos presos nas suas necessidades pessoais, além de locais
destinados à venda de produtos e objetos permitidos e não fornecidos
pela Administração.

13.1 Direito à “sacola” e à comercialização de produtos e objetos permitidos

A autorização legal traz consigo a permissão para que familiares ou


pessoas autorizadas complementem, com recursos privados, itens pertinentes
à assistência material, como alimentos, roupas e itens de higiene pessoal.
Trata-se do que costuma ser denominado como “sacola”, “cobal”, etc., direito
garantido por lei e regulamentado por atos administrativos dos respectivos
Departamentos Penitenciários. Em algumas unidades prisionais, pode haver
cantinas administradas pelos próprios detentos, conforme dispõe o artigo 13. Tais
itens são, muitas vezes, vendidos ou trocados pelos presos, sendo de interesse
sobretudo das pessoas que se encontram custodiadas longe de seus familiares,
tendo acesso somente à alimentação, roupas e itens de higiene fornecidas pelo
Estado.

13.2 Impossibilidade de recebimento direto da “sacola” por conta de


medidas sanitárias e a alternativa por correio

Uma das principais medidas sanitárias de prevenção ao novo Corona­


vírus foi a suspensão do recebimento direto das “sacolas” nos estabelecimentos
penais. Em alguns locais, passou a se receber os itens complementares de alimen­
tação, saúde e vestuário pelo correio, com custo alto para as famílias. A prática
invoca diversas questões de direito administrativo que precisam ser levadas
em conta: por exemplo, as ordens de serviço ou portarias regulamentando itens
permitidos e proibidos devem ser publicadas, na forma escrita, sem discriminação
ou diferenciação entre estabelecimentos penais, salvo se houver justificativa
razoável e fundamentada. Caso haja itens lícitos, mas em desacordo ao estabelecido
61
Art. 14 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

(em quantidade maior, por exemplo), o procedimento correto é a entrega dos


demais itens à pessoa presa ou a devolução à família. É ilegal o confisco de itens
apreendidos sem o exercício do contraditório, salvo se houver previsão legal
expressa (como no caso de drogas ilícitas). Vale lembrar que os itens são adquiridos
com recursos privados e a entrega à administração penitenciária não caracteriza
doação.

SEÇÃO III
Da Assistência à Saúde

Art. 14  A assistência à saúde do preso e do internado de caráter


preventivo e curativo, compreenderá atendimento médico, farmacêutico
e odontológico.
§ 1º (Vetado).
§ 2º Quando o estabelecimento penal não estiver aparelhado para
prover a assistência médica necessária, esta será prestada em outro local,
mediante autorização da direção do estabelecimento.
§ 3º Será assegurado acompanhamento médico à mulher, principalmente
no pré-natal e no pós-parto, extensivo ao recémnascido. (Incluído pela Lei
nº 11.942, de 2009)

14.1 Conteúdo da assistência à saúde

A assistência à saúde deve ser tanto profilática como curativa, abarcando


atendimento “médico, farmacêutico e odontológico”. Importante notar que a
direção do estabelecimento deverá autorizar a prestação de assistência médica
em outro local no caso de carência, na própria prisão, das condições adequadas
(art. 14, § 2º, LEP).
Trata-se de uma das mais graves dimensões da vida no cárcere. Considerando
a precariedade material na efetivação das políticas de assistência à saúde na prisão,
é quando a prisão mata, no caso, literalmente. O próprio INFOPEN, relatório de
dados oficiais do Governo Federal, indica número muito mais elevado de mortes
por doenças que mortes violentas. Isso ocorre tanto em situações de doenças
graves cujo tratamento dentro do cárcere se torna mero paliativo, como também
em situações que se agravam diretamente por conta das condições carcerárias.

62
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 14

Doenças de pele como escabiose, por exemplo, que geram forte coceira, em
ambientes pouco higiênicos podem ser prenúncio de infecções graves.

14.2 Integração com Sistema Único de Saúde

A Portaria MJ/MS nº. 1/2014 instituiu a Política Nacional de Atenção Integral


à Saúde das Pessoas Privadas de Liberdade no Sistema Prisional, no âmbito do
SUS (Sistema Único de Saúde), devendo os Estados e Municípios integrarem a
política pública mediante termo de adesão.
De acordo com a Resolução nº. 4/2014-CNPCP – Diretrizes Básicas para
Atenção Integral à Saúde das Pessoas Privadas de Liberdade no Sistema Prisional –,
“no momento do ingresso em qualquer unidade prisional, toda pessoa privada de liberdade
deverá receber adequado atendimento para avaliação da sua condição geral de saúde,
quando deverá ser aberto um prontuário clínico onde serão registrados os resultados do
exame físico completo, dos exames básicos, o estabelecimento de possíveis diagnósticos e
seu tratamento, o registro de doenças e agravos de notificação compulsória e de ocorrência
de violência cometida por agente do estado ou outros, assim como ações de imunização,
conforme o calendário de vacinação de adultos, de acordo com as normas e recomendações
do SUS” (item 2.8).

14.3 HIV, tuberculose e outras doenças contagiosas na prisão

Particularmente importante é a existência de políticas de prevenção de


doenças transmissíveis como HIV e tuberculose, bem como protocolos rigo­
rosos de controle de infecção. A Resolução nº. 3, de 7 de junho de 2018, do
Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária (CNPCP), traz diversas
recomendações aos Estados nesse sentido, prevendo tratamento integral,
sincronização com as diretrizes do SUS, realização de busca ativa sistemática
com os presos que tiveram contato com infectados por tuberculose e HIV, e que
“em todas as unidades prisionais devem ser fornecidos e distribuídos gratuitamente kits
básicos de higiene que contenham preservativos, lubrificantes à base de água e orientação
para seu uso correto”, independentemente de solicitação ou de visita íntima (art. 4º).

14.4 Doença grave e direito à prisão domiciliar

Quando acometido de doença grave, o detento tem direito à prisão domiciliar,


com base no art. 117 da LEP e jurisprudência consolidada, independentemente
63
Art. 14 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

do regime em que se encontre. Aplicável nesse caso, por analogia, o art. 374, I,
do Código de Processo Civil, no sentido de se considerar a precariedade da
assistência à saúde no sistema prisional brasileiro como fato notório e que não
depende de prova. Não há sentido em se diligenciar à própria unidade prisional
questionando se ela tem condições de oferecer tratamentos caros e complexos a
doenças graves e que requerem atenção permanente às condições da pessoa presa.
Não há sentido em ignorar diagnósticos graves em prol de opiniões lacônicas e
em tom defensivo no sentido de que “é possível” realizar o tratamento dentro do
cárcere, quando se sabe que não é.

14.5 Direito a acompanhamento médico da mulher no pré-natal e pós-parto

É assegurado acompanhamento médico ao recém-nascido e à mulher no pré-


natal e no pós-parto. Se a criança nascer na unidade prisional, este fato não deve
constar de sua certidão de nascimento (Regra 28 das Regras de Mandela). Deve
prevalecer, porém, entendimento pela interpretação extensiva do art. 117 da LEP e
do art. 318, IV e V, do CPP, a todas as mulheres grávidas ou com filhos pequenos,
colocando-a em prisão domiciliar. Nesse sentido, tratando especificamente das
presas provisórias, a ordem concedida pelo STF no HC 143.641/SP, Rel. Min.
Ricardo Lewandowski, 2ª T., j. 20/02/2018.

14.6 Suicídio nas prisões

Diversos países contam com programas específicos de prevenção a suicídios


no ambiente do cárcere, pois as taxas são superiores àquelas da população em
geral. Segundo a Organização Mundial de Saúde, morrem mais pessoas por
suicídio que em conflitos armados, indicando média de uma tentativa a cada
3 segundos e 1 suicídio completo por minuto, no mundo. A OMS publicou estudo
específico sobre o suicídio nas prisões, classificando a população carcerária como
“grupo de alto risco” e propondo uma metodologia de programa de prevenção
que deveria ser, com urgência, observada também no Brasil5.

5
World Health Organization e International Association for Suicide Prevention. Preventing suicide
in jails and prisons. Genebra: WHO Document Production Services, 2007. Disponível em: http://
www.who.int/mental_health/prevention/suicide/resource_jails_prisons.pdf.

64
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 14

14.7 Direito à saúde na jurisprudência internacional de direitos humanos

A Observação Geral nº. 14 do Comitê de Direitos Econômicos, Sociais e


Culturais (CDESC) das Nações Unidas, com base no Pacto Internacional de
Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, afirma que “os Estados têm a obrigação
de respeitar o direito à saúde, entre outros, abstendo-se da negação ou da limitação do
acesso igual a todas as pessoas, incluindo os presos ou detidos”6. O Comitê de Direitos
Humanos das Nações Unidas também já afirmou a obrigação positiva do Estado
em garantir a prestação de cuidados médicos adequados, no Caso Lantsova vs.
Rússia (julgado em 2002).
O Caso Chinchilla Sandoval vs. Guatemala, julgado pela Corte Interamericana de
Direitos Humanos em 2016, é emblemático da violação do direito à saúde na prisão.
A pessoa condenada adquiriu diversas doenças enquanto presa, tendo inclusive
uma das pernas sido amputada. Todos os pedidos de liberdade antecipada foram
negados pelo Judiciário local. A Corte foi assertiva em afirmar que pessoas com
enfermidades graves, crônicas ou terminais não devem permanecer na prisão,
salvo quando os Estados possam “assegurar” que têm unidades adequadas de
atenção médica7. Tal prova não se faz, evidentemente, com a consulta a servidor
do próprio sistema prisional questionado, e sim com a demonstração técnica e
material da possibilidade de cuidado adequado à saúde.
Em novembro de 2019, a Corte Interamericana de Direitos Humanos
proferiu sentença no também importante Caso Hernández vs. Argentina, sobre
situação em que o demandante adquirira tuberculose enquanto preso, não
tratada devidamente, resultando em sequelas neurológicas, na perda da visão de
um olho, incapacidade parcial e permanente de um braço e perda da memória.
A CIDH reconheceu a responsabilidade do Estado da Argentina pela violação do
direito à integridade física da vítima (art. 5 da Convenção Americana de Direitos
Humanos) e determinou, entre outras providências, a reparação material e moral
dos danos. Sobre o conteúdo do direito à saúde prisional, recomenda-se a leitura
dos parágrafos 54 ao 96 da Sentença.

Disponível em: http://acnudh.org/wp-content/uploads/2011/06/Compilation-of-HR-instruments-


6

and-general-comments-2009-PDHJTimor-Leste-portugues.pdf, p. 159.
Sobre, v. PAIVA, Caio; HEEMANN, Thimotie. Jurisprudência Internacional de Direitos Humanos. 2.
7

ed. Belo Horizonte: Editora CEI, 2017, p. 615-616.

65
Art. 14 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

14.8 Pandemia do Novo Coronavírus (COVID19)

Na data de fechamento da edição anterior, o mundo encontrava-se no


início da pandemia pelo Novo Coronavírus (COVID19), conforme declaração da
Organização Mundial de Saúde em 11 de março de 2020.
Seguiu-se um conjunto significativo de atos normativos e decisões judiciais
no plano nacional e internacional, buscando prevenir a propagação do vírus no
sistema carcerário e minimizar danos decorrentes das medidas sanitárias que
foram adotadas, implicando em suspensão e restrição e direitos fundamentais.
A Corte Interamericana de Direitos Humanos publicou a Resolução 1/20,
de 10 de abril de 2020, recomendando, entre outras providências, “medidas
para enfrentar a aglomeração nas unidades de privação da liberdade, inclusive
a reavaliação dos casos de prisão preventiva para identificar os que podem ser
convertidos em medidas alternativas à privação da liberdade, dando prioridade
às populações com maior risco de saúde frente a um eventual contágio pela
COVID-19, principalmente os idosos e mulheres grávidas ou com filhos lactantes”
(v. itens 45-48). Em 27 de julho de 2020, a Comissão Interamericana de Direitos
Humanos publicou a Resolução 4/20, reconhecendo a população carcerária como
de “especial vulnerabilidade” no contexto pandêmico.
O Conselho Nacional de Justiça publicou primeiramente a Recomendação n.
62, de 17 de março de 2020, posteriormente alterada pelas Recomendação 68/2020
e 78/2020. O documento recomenda aos Tribunais e magistrados que adotem
medidas preventivas à propagação da infecção nos estabelecimentos do sistema
prisional e do sistema socioeducativo, com reavaliação de prisões provisórias,
concessão de saída antecipada dos regimes fechado e semiaberto, colocação
em prisão domiciliar e suspensão temporária do dever de apresentação regular
em juízo para pessoas em regime aberto, prisão domiciliar, penas restritivas de
direitos, sursis e livramento condicional, sempre olhando para as pessoas presas
pertencentes a grupos de risco.
Em 26 de março de 2020, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos
declarou apoio à Recomendação 62/2020-CNJ, seguindo o posicionamento público
favorável à soltura de presos vulneráveis pelo Alto Comissariado para Direitos
Humanos da Organização das Nações Unidas.
A inserção do art. 5º-A pela Recomendação 78/2020 excluiu a aplicação das
medidas acima arroladas a “pessoas condenadas por crimes previstos na Lei
nº 12.850/2013 (organização criminosa), na Lei nº 9.613/1998 (lavagem ou ocultação
de bens, direitos e valores), contra a administração pública (corrupção, concussão,
prevaricação etc.), por crimes hediondos ou por crimes de violência doméstica
66
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 14

contra a mulher”. A restrição contraria a lógica da universalidade do direito de


acesso à saúde e parâmetros convencionais sobre o tema.
A Recomendação 91, de 15 de março de 2021, também do CNJ, estabeleceu
novas diretrizes para o sistema penal e socioeducativo. Entre outras providências,
reforçou o controle judicial das prisões por meio de audiências de custódia,
nos termos da decisão liminar proferida pelo Supremo Tribunal Federal nos
autos da Reclamação nº 29.303/RJ; a substituição da privação de liberdade de
gestantes, mães, pais e responsáveis por crianças e pessoas com deficiência por
prisão domiciliar sempre que possível, nos termos das ordens de habeas corpus
concedidas pelo STF nos HCs nºs. 143.641/SP e 165.704 e na forma da Resolução
CNJ nº 369/2021; e a substituição da privação de liberdade de pessoas indígenas
por regime domiciliar ou de semiliberdade.
A Defensoria Pública da União e a Defensoria Pública do Rio de Janeiro
impetraram o Habeas Corpus Coletivo 188.820 no STF, em favor de todas as
pessoas presas em locais acima da sua capacidade que sejam integrantes de
grupos de risco para a Covid-19 e não tenham praticado crimes com violência
ou grave ameaça. O STF concedeu parcialmente a liminar em dezembro de
2020, autorizando a antecipação da progressão de regime para condenados que
cumpram o requisito subjetivo e “cumulativamente, atendam aos seguintes
requisitos : i) estejam em presídios com ocupação acima da capacidade física;
ii) comprovem, mediante documentação médica, pertencer a um grupo de risco
para a Covid-19 conforme contido no art. 2º, § 3º, da Portaria Interministerial n.º 7,
de 18 de março de 2020; iii) cumpram penas por crimes praticados sem violência
ou grave ameaça à pessoa, exceto os delitos citados no art. 5º-A da Recomendação
n. 62/2020 do CNJ (incluído pela Recomendação n. 78/2020 do CNJ); iv) faltem
120 (cento e vinte) dias para completar o requisito objetivo para a progressão
do regime semiaberto para o aberto (art. 112 e parágrafos da LEP)”. Na data de
fechamento desta edição, acabara de iniciar o julgamento pelo plenário virtual.
Mas o efeito direto mais grave da pandemia, em termos de violação de
direitos fundamentais, parece estar no cotidiano carcerário, ou seja, na deterio­
ração da relação administrativa entre pessoas presas e a administração prisio-
nal. A adoção de medidas sanitárias que implicam em suspensão ou restrição de
direitos produziu o agravamento qualitativo das condições materiais de custó-
dia (vide comentários ao art. 13). Sem visitas, com restrições ao recebimento de
“sacolas” (complemento da alimentação e roupas pelos familiares), ao envio e re-
cebimento de correspondência, à assistência jurídica, tudo isso vem condu­zindo
a população carcerária a uma percepção de insegurança, isolamento e quase
incomunicabilidade.

67
Art. 15 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

De outro lado, a pandemia vem expondo dramaticamente as deficiências


estruturais do sistema penitenciário brasileiro, sobretudo em termos de acesso à
saúde e à assistência social. Deve ser objeto de apuração urgente a inexistência de
profissionais da saúde para o primeiro atendimento e diagnóstico preliminar, em
regra realizado por policiais penais. O serviço social no ambiente penitenciário
também necessita ser ressignificado no pós-pandemia, visto que não vem
cumprindo suas funções básicas de acolhimento e facilitação da comunicação entre
familiares e seus parentes presos. As tentativas de organização de visitas virtuais
e recebimento de itens alimentícios por correio são bem vindas, mas esbarram na
falta de pessoal e dificuldades com acesso à tecnologia.
Do ponto de vista jurídico, a pandemia ocasionou a fragilização ainda maior
da fronteira conceitual entre regalias e direitos, com a tendência das autoridades
penitenciárias a manter determinadas restrições mesmo com o avanço da
vacinação, como se direitos fundamentais estivessem sujeitos à discricionariedade
administrativa. A repercussão em juízo passa, ainda, pelo aumento significativo
de atendimento jurídico e atos processuais por videoconferência, inclusive
procedimentos administrativos disciplinares e pelos importantes debates sobre
progressão antecipada de regime, remição ficta, desnecessidade de retorno da
saída temporária para o regime semiaberto, sobre como cumprir penas restritivas
de direito e penas em regime aberto cuja fiscalização foi suspensa, todos itens
tratados ao longo desta edição.
Muitas informações, dados e publicações podem ser acessados no sítio
virtual do projeto Covid nas Prisões e Infovírus (http://www.covidnasprisoes.com).

SEÇÃO IV
Da Assistência Jurídica

Art. 15  A assistência jurídica é destinada aos presos e aos internados


sem recursos financeiros para constituir advogado.

15.1 Conteúdo da assistência jurídica

A redação do dispositivo abre margem a uma confusão conceitual. Caso


assistência jurídica seja lida como direito à defesa técnica, consoante o princípio
constitucional da ampla defesa e do contraditório (art. 5º, LV, CF), que todo preso

68
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 15

e internado detém, é evidente que é destinada a todos, e não apenas àqueles “sem
recursos financeiros para constituir advogado”. A existência de processos de
execução penal sem defesa técnica habilitada é uma violação inadmissível deste
princípio, sendo obrigação do juízo de execução intimar a Defensoria Pública,
especialmente se não houver advogado constituído, tão logo receba a guia de
recolhimento.
Caso se diferencie assistência jurídica do direito geral à ampla defesa, ela
será compreendida como a prestação de assistência jurídica integral e gratuita
aos hipossuficientes e vulneráveis, em consonância com o art. 5º, LXXIV, da CF:
“o Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem
insuficiência de recursos”.

15.2 Modelo de prestação da assistência jurídica na execução penal

A opção da Constituição brasileira é clara e não é por um modelo misto, e sim


público, de acesso à justiça: cabe à Defensoria Pública articular, organizar e prestar
a assistência jurídica gratuita à população carcerária, sendo a eventual necessidade
de cooperação de advogados dativos nomeados uma situação passageira e de
inconstitucionalidade progressiva, como se extrai do art. 134 da CF e do art. 98,
§ 1º, dos ADCT da CF, inserido pela Emenda Constitucional nº. 80, de 2014.
A participação de advogados voluntários ou dativos e núcleos universitários
de prática jurídica deve sempre se dar, nesse sentido, nos limites estabelecidos
em parcerias com a Defensoria Pública do respectivo local, nunca à sua revelia,
posto que são modelos frágeis e sujeitos às vicissitudes passageiras da política e ao
calendário regular das atividades de ensino. Não se trata de disputa institucional,
e sim de fazer cumprir a vontade constitucional em se estabelecer um modelo
de assistência jurídica capaz de garantir direitos com competência e efetividade.
A nomeação de advogado dativo em ofício judicial que conta com a atuação
da Defensoria Pública é nula por violação ao princípio do defensor natural
(art. 4º-A, IV, Lei Complementar 80/94), como já reconheceu o STJ (HC 332.895/
SC, Rel. Min. Felix Fischer, 5ª T., DJE 03/11/2016) e pode até configurar, em tese,
ato de improbidade administrativa de prejuízo ao erário.
Embora o dispositivo legal aparente limitar a assistência jurídica a ser
prestada pela Defensoria Pública apenas aos presos “sem recursos financei­ros para
constituir advogado”, a assistência jurídica é um direito de todos os presos, sem
exceção (art. 41, VII, LEP). A condição de preso, por si só, pressupõe sua hipos­
suficiência e vulnerabilidade organizacional, não necessariamente financeira. Pode
inclusive a Defensoria Pública peticionar e atuar em prol de pessoas presas com

69
Art. 16 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

advogado constituído, sendo no interesse e de vontade do preso, na qualidade de


órgão da execução penal (art. 81-A e art. 81-B da LEP, v. adiante) e na condição
não de representante da parte, mas sim como custos vulnerabilis8 ou custos libertatis,
em nome próprio, como já vem reconhecendo o Judiciário, com base no art. 81-A
da LEP, similarmente à hipótese prevista no art. 554, §1º, do CPC.

Art. 16  As Unidades da Federação deverão ter serviços de assistência


jurídica, integral e gratuita, pela Defensoria Pública, dentro e fora dos
estabelecimentos penais. (Redação dada pela Lei nº 12.313, de 2010).
§ 1º As Unidades da Federação deverão prestar auxílio estrutural, pessoal
e material à Defensoria Pública, no exercício de suas funções, dentro e
fora dos estabelecimentos penais. (Incluído pela Lei nº 12.313, de 2010).
§ 2º Em todos os estabelecimentos penais, haverá local apropriado
destinado ao atendimento pelo Defensor Público. (Incluído pela Lei nº
12.313, de 2010).
§ 3º Fora dos estabelecimentos penais, serão implementados Núcleos
Especia­lizados da Defensoria Pública para a prestação de assistência
jurídica integral e gratuita aos réus, sentenciados em liberdade, egressos
e seus familiares, sem recursos financeiros para constituir advogado.
(Incluído pela Lei nº 12.313, de 2010).

16.1 A Defensoria Pública como órgão da execução penal e a exigência de


local apropriado para atendimento

A inclusão da Defensoria Pública como órgão da execução penal pela


Lei 12.313/2010 abrangeu também diversas obrigações ao Estado, no sentido
de viabilizar a atividade de assistência jurídica, dentro e fora, mas sobretudo
dentro, dos estabelecimentos prisionais. A lei garante “local apropriado” para
atendimento pelos defensores públicos, o que significa espaço que possibilite o

8
Sobre a expressão, v. MAIA, Maurílio Casas. “Custos Vulnerabilis Constitucional: O Estado
Defensor entre o REsp 1.192.577-RS e a PEC 4/14”. Revista Jurídica Consulex, Brasília, p. 55-
57, 1º jun. 2014; ROCHA, Jorge Bheron, GONÇALVES FILHO, Edilson Santana. “STF admite
legitimidade da Defensoria para intervir como custos vulnerabilis”. Consultor Jurídico, 4 abr. 2018,
disponível em: https://www.conjur.com.br/2018-abr-04/legitimidade-defensoria-intervir-custos-
vulnerabilis.

70
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 16

atendimento aos presos, a pesquisa e o acesso aos autos9, em processo eletrônico,


e impressão do atestado de pena, o que não contempla os “parlatórios”10, sem
qualquer contato direto entre o defensor público e o assistido. Há dispositivos
similares na lei orgânica da Defensoria Pública (Lei Complementar nº. 80/94), como
o art. 4º, §11, o qual prevê que os estabelecimentos penais “reservarão instalações
adequadas ao atendimento jurídico dos presos e internos por parte dos Defensores Públicos,
bem como a esses fornecerão apoio administrativo, prestarão as informações solicitadas e
assegurarão acesso à documentação dos presos e internos, aos quais é assegurado o direito
de entrevista com os Defensores Públicos”; o art. 18, X, prevendo atribuição dos
defensores públicos federais para atendimento jurídico permanente dos presos
e sentenciados; os art. 64, X e art. 108, IV, prevendo atribuição dos defensores
públicos estaduais e do Distrito Federal no mesmo sentido. Em todos os casos,
a lei é clara na possibilidade de “acesso a todas as dependências do estabelecimento
independentemente de prévio agendamento”.

16.2 Priorização da questão prisional por parte da Defensoria Pública

O importante encargo conferido pela Constituição à Defensoria Pública


implica, em contrapartida, na priorização da questão prisional no momento
de alocar seus profissionais, inclusive com a criação de núcleos especializados,
conforme o art. 16, § 3º, da LEP, e na criação de mecanismos administrativos
internos que assegurem a presença frequente dos defensores públicos no interior
das unidades prisionais. Não se trata de determinação absoluta, e nem poderia,
por não se tratar de lei complementar destinada à organização da instituição e
considerando que ela conta com autonomia administrativa para se organizar
conforme o número de profissionais à disposição, sofrendo, em vários Estados,
com a carência de orçamento e pessoal. Por outro lado, certamente a autonomia
não constitui fundamento jurídico para mitigação da obrigação de assumir o
papel fundamental que lhe cabe, com base constitucional e legal. A presença
frequente de defensores públicos no interior das unidades prisionais constitui
controle externo decisivo e imprescindível para escuta dos presos e detecção de
situações de excepcional ilegalidade, para fiscalização das condições de custódia
e da atuação dos servidores do sistema penitenciário, bem como para fiscalização
da aplicação de sanções disciplinares que não vão a controle judicial, como nos

PAIVA, Caio. Prática Penal para Defensoria Pública. São Paulo: Gen Forense, 2016, p. 323-325.
9

10
PAIVA, Caio. Prática Penal para Defensoria Pública. São Paulo: Gen Forense, 2016, p. 327.

71
Art. 17 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

casos de faltas leves e médias.

SEÇÃO V
Da Assistência Educacional

Art. 17  A assistência educacional compreenderá a instrução escolar e a


formação profissional do preso e do internado.

17.1 Conteúdo da assistência educacional

A assistência educacional é central na perspectiva da redução de danos na


medida em que se pressupõe, como característica própria do perfil da população
carcerária, o déficit na formação escolar e profissional. De fato, a proporção
de analfabetos e/ou analfabetos funcionais na população carcerária nacional
permanece muito alta.
A Resolução nº. 03/2009, do Conselho Nacional de Política Criminal e
Penitenciária (CNPCP), estabeleceu as Diretrizes Nacionais para a Oferta de
Educação nos estabelecimentos penais. O Decreto Presidencial 7.626/2011 instituiu
o Plano Estratégico de Educação no Sistema Prisional, buscando articular ações
conjuntas dos Ministério da Justiça e da Educação.
O tema do estudo na execução penal voltará em diversas ocasiões a ser
abordado adiante, sobretudo no que toca à remição de pena.

Art. 18  O ensino de 1º grau será obrigatório, integrando-se no sistema


escolar da Unidade Federativa.

18.1 Obrigatoriedade do ensino fundamental

Desde a redação original da LEP o ensino de 1º grau, ou agora “ensino


fundamental”, é obrigatório nas unidades prisionais. A previsão de integração no
sistema escolar da unidade federativa visa evitar que o Departamento Penitenciário
ou a respectiva secretaria necessitem contar com docentes próprios para ministrar
72
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 18-A

as aulas e atividades. Porém, em regra é necessário pactuar gratificações específicas


pelo exercício do encargo, sob pena de se inviabilizar tal articulação.

Art. 18-A  O ensino médio, regular ou supletivo, com formação geral ou


educação profissional de nível médio, será implantado nos presídios, em
obediência ao preceito constitucional de sua universalização. (Incluído
pela Lei nº 13.163, de 2015)
§ 1º O ensino ministrado aos presos e presas integrar-se-á ao sistema
estadual e municipal de ensino e será mantido, administrativa e
financeiramente, com o apoio da União, não só com os recursos
destinados à educação, mas pelo sistema estadual de justiça ou
administração penitenciária. (Incluído pela Lei nº 13.163, de 2015)
§ 2º Os sistemas de ensino oferecerão aos presos e às presas cursos
supletivos de educação de jovens e adultos. (Incluído pela Lei nº 13.163,
de 2015)
§ 3º A União, os Estados, os Municípios e o Distrito Federal incluirão
em seus programas de educação à distância e de utilização de novas
tecnologias de ensino, o atendimento aos presos e às presas. (Incluído
pela Lei nº 13.163, de 2015)

18-A.1 Obrigatoriedade do ensino médio regular ou supletivo

A lei estabelecia apenas a obrigatoriedade do ensino de 1º grau/ ensino


fundamental, a possibilidade da realização de cursos especializados à distância
e a instalação de bibliotecas nas unidades penitenciárias. Com a modificação pela
Lei 13.163/2015, passou a exigir também ensino médio, regular ou supletivo, com
formação geral ou educação profissional.
A integração aos sistemas estaduais e municipais de ensino tem o mesmo
objetivo indicado nos comentários ao artigo anterior, sendo necessária a integração
com os órgãos e secretarias responsáveis pela educação, que segue o princípio
da universalização e não admite distinções por conta de condenações criminais
e situações de custódia.
A modificação previu ainda cursos supletivos para que haja a conclusão do
ensino médio ou correspondente e admitiu o uso de tecnologias de programas
de educação à distância.

73
Art. 19 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

Art. 19  O ensino profissional será ministrado em nível de iniciação ou


de aperfeiçoamento técnico.
Parágrafo único. A mulher condenada terá ensino profissional adequado
à sua condição.

19.1 Previsão de ensino profissional

A LEP também exige que as unidades penais contem com ensino profissional,
em nível de iniciação ou de aperfeiçoamento técnico.
O parágrafo único é desnecessário e pode dar ensejo a interpretações
discriminatórias, sendo recomendável sua revogação.

Art. 20  As atividades educacionais podem ser objeto de convênio com


entidades públicas ou particulares, que instalem escolas ou ofereçam
cursos especializados.

20.1 Convênio para oferta de atividades educacionais

É possível e adequada a celebração de convênios com instituições de ensino,


públicas ou particulares, a fim de incrementar a oferta de atividades educacionais.
Todos os esforços devem ser feitos no sentido de se reduzir os obstáculos práticos
para tanto, especialmente a adequada organização do número de agentes
penitenciários em serviço, possibilitando a movimentação de presos no interior
da unidade e consequentemente o acesso ao maior número possível de atividades
educacionais.

Art. 21  Em atendimento às condições locais, dotar-se-á cada estabe­


lecimento de uma biblioteca, para uso de todas as categorias de reclusos,
provida de livros instrutivos, recreativos e didáticos.

74
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 21

21.1 Obrigatoriedade da instalação de biblioteca nos estabelecimentos


penais

A importância de haver bibliotecas em todos os estabelecimentos prisionais


cresce sobremaneira com a regulamentação da remição pela leitura.
Embora seja inegável a prevalência dos processos seletivos de criminalização
por sobre população de baixa escolaridade, ainda assim há pesquisas que apontam
hábito de leitura mais consolidado na população carcerária que na população
brasileira em geral11.
A diretriz deve ser de admissibilidade de todas as formas de leitura, salvo
aquelas que esbarrem em obstáculos expressamente definidos em lei. Muitas
vezes, há restrições locais por conta da ausência de profissionais aptos a corrigir
a respectiva resenha, como forma de avaliação, o que atinge principalmente
leituras de natureza jurídica. Trata-se de problema facilmente sanável por meio de
parcerias com universidades e outras instituições. A lei fala em livros instrutivos,
recreativos e didáticos, com grande abrangência.

21.2 Impossibilidade de restrição à leitura por razões disciplinares

É ilegal restringir o acesso à leitura por conta de razões disciplinares, ainda


que a pessoa esteja cumprindo sanção administrativa. O direito à leitura não tem
a natureza de regalia, sendo simplesmente direito vinculado à educação. Não há
previsão legal para medida semelhante e não há prejuízo a outros presos com
bom comportamento, visto que, diferentemente das vagas alocadas para trabalho e
estudo, a inclusão em projetos de leitura não implica necessariamente na exclusão
de outro participante.

21.3 Direito à literatura no cárcere

O art. 21 deixa claro que o direito à leitura, ou direito à literatura, é mais


amplo que o direito de acesso à formação escolar e profissional. É também mais
amplo e abrangente que a inclusão em programas de remição pela leitura, os quais
tem seus limites operacionais e a exigência de acompanhamento pedagógico.

11
Por exemplo, pesquisa realizada no âmbito do Mestrado em Letras da Universidade de Brasília:
“70% dos presos do DF leem mais de dois livros por mês”. Disponível em: https:// www.conjur.com.
br/2013-abr-07/70-presos-distrito-federal-leem-dois-livros-mes.

75
Art. 21-A ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

O direito de acesso a livros – instrutivos, recreativos e didáticos, como aponta o


dispositivo legal – deve ser garantido ainda que a pessoa presa não esteja incluída
em programa de remição pela leitura e inclusive – talvez principalmente! – em
situações de isolamento por sanção disciplinar.
Segundo Antônio Candido12, o direito à literatura é uma necessidade humana
e um direito incompressível. Sem ela, diz o autor, não há equilíbrio social, tratando-
se de “poderoso instrumento de instrução e educação, (...), proposta a cada um
como equipamento intelectual e afetivo”.
Seguindo com Antonio Candido, a literatura dá forma aos sentimentos, às
visões de mundo, e assim ela “nos organiza, nos liberta do caos e portanto nos
humaniza. Negar a fruição da literatura é mutilar a nossa humanidade”. Suas três
faces – como construção de estrutura e significado, como forma de expressão e
como forma de conhecimento – são fármacos em meio ao veneno dos processos
de dessocialização induzidos pela experiência carcerária e pela centralidade da
violência nas relações sociais.
A determinação do art. 21, portanto, vai muito além de uma demanda admi­
nistrativa pela instalação de um acervo ou biblioteca em toda unidade prisional.
O direito a ter livros na cela deve ser incancelável, independentemente, como já
afirmado, de questões disciplinares ou de existência de vagas em programas de
remição.
Aplica-se ao sistema penitenciário a Política Nacional de Leitura e Escrita
instituída pela Lei 13.696, de 2018, cuja primeira diretriz é a universalização do
direito ao acesso ao livro, à leitura, à escrita, à literatura e às bibliotecas.

Art. 21-A  O censo penitenciário deverá apurar: (Incluído pela Lei nº


13.163, de 2015)
- o nível de escolaridade dos presos e das presas; (Incluído pela Lei nº
13.163, de 2015)
- a existência de cursos nos níveis fundamental e médio e o número de
presos e presas atendidos; (Incluído pela Lei nº 13.163, de 2015)

12
CANDIDO, Antônio. “O direito à literatura”. In: Vários Escritos. 5ª ed. Rio de Janeiro: Ouro sobre
Azul, 2011, p. 171-193.

76
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 22

- a implementação de cursos profissionais em nível de iniciação ou


aperfei­çoamento técnico e o número de presos e presas atendidos;
(Incluído pela Lei nº 13.163, de 2015)
- a existência de bibliotecas e as condições de seu acervo; (Incluído pela Lei
nº 13.163, de 2015)
- outros dados relevantes para o aprimoramento educacional de presos
e presas. (Incluído pela Lei nº 13.163, de 2015)

21-A.1 Censo penitenciário e a necessidade de sistemas dinâmicos e com


interoperabilidade de dados

A Lei 13.163/2015 também criou a exigência de que Censos Penitenciários


apurem o nível de escolaridade das pessoas presas e o grau de implementação
das políticas de assistência educacional no sistema penitenciário.
Muito melhor e mais eficaz que a realização de censos, os quais exigem tempo
e se limitam a fornecer dados estáticos, é a efetiva implementação de sistemas
integrados, dinâmicos, atualizados automaticamente e com interoperabilidade
de dados entre Poder Executivo e Judiciário, nos termos da Lei 12.714/2012 e da
Lei 13.675/2018, que criou o Sistema Único de Segurança Pública.

SEÇÃO VI
Da Assistência Social

Art. 22  A assistência social tem por finalidade amparar o preso e o


internado e prepará-los para o retorno à liberdade.

22.1 Conteúdo da assistência social

Os setores de assistência social nos estabelecimentos penais têm grande


potencial de combate ao que se chama criticamente de “vulnerabilidade socio­
cultural do egresso”, e papel decisivo na preservação de laços com a família, com
o mercado de trabalho e consequentemente com o futuro retorno à liberdade.
No caso dos presos que estão custodiados longe de suas famílias e não contam
sequer com as visitas, é o setor de assistência social que deverá buscar elaborar,
77
Art. 22 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

com criatividade, projetos que visem minimizar os danos dessa situação. Destaca-
se, por exemplo, projetos como o de “visitas virtuais” através da Internet, entre
tantos outros.
Lamentável quando a assistência social se reduz a um papel burocrático
de administração das credenciais de visitantes ou das visitas suspensas a título
de sanção disciplinar; ou ainda à mera elaboração de laudos e pareceres, muitas
vezes contrários aos interesses do assistido.
Além dos setores de assistência social dentro das unidades prisionais,
também prestam o serviço, aos egressos, os patronatos (art. 78, LEP) e, embora não
seja exatamente sua atribuição, os Conselhos da Comunidade (art. 80 e 81, LEP).

Art. 23  Incumbe ao serviço de assistência social:


- conhecer os resultados dos diagnósticos ou exames;
- relatar, por escrito, ao Diretor do estabelecimento, os problemas e as
dificuldades enfrentadas pelo assistido;
- acompanhar o resultado das permissões de saídas e das saídas
temporárias;
- promover, no estabelecimento, pelos meios disponíveis, a recreação;
- promover a orientação do assistido, na fase final do cumprimento da
pena, e do liberando, de modo a facilitar o seu retorno à liberdade;
- providenciar a obtenção de documentos, dos benefícios da Previdência
Social e do seguro por acidente no trabalho;
- orientar e amparar, quando necessário, a família do preso, do internado
e da vítima.

23.1 Atribuições do serviço de assistência social

Rol aberto e meramente exemplificativo de atribuições dos profissionais


de assistência social que atuam junto a egressos e à população carcerária, sendo
inteiramente aplicável, para todos os fins, a Lei Orgânica de organização de
Assistência Social no País (Lei 8.742/1993). Prevalece no artigo 23 a função
efetivamente assistencial, e não disciplinar, do profissional de assistência social,
diversamente do que se verifica na prática.

78
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 24

23.2 Assistência social à família do preso e às mulheres privadas de liberdade

Documento importante denominado “Atenção às famílias das mulheres grávidas,


lactantes e com filhas/os até 12 anos incompletos ou com deficiência privadas de liberdade”
foi publicado, em 2018, pela Secretaria Nacional de Assistência Social.
Trata-se de conjunto de orientações para execução da Resolução nº 02/2017,
do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária, recomendando
que no momento da prisão em flagrante de mulheres com filhos seja feito o
encaminhamento de uma cópia do auto de prisão ou boletim de ocorrência ao
CRAS mais próximo da residência da pessoa custodiada, com a indicação do
responsável pelo cuidado de seus filhos, para análise de vulnerabilidade e oferta
de serviços pela Proteção Social Básica.
A articulação dos programas e equipamentos do SUAS com os setores
de assistência social das unidades prisionais e departamentos penitenciários é
fundamental na consecução de políticas de acolhimento e assistência social de
familiares de pessoas presas.

SEÇÃO VII
Da Assistência Religiosa

Art. 24  A assistência religiosa, com liberdade de culto, será prestada aos
presos e aos internados, permitindo-se-lhes a participação nos serviços
organizados no estabelecimento penal, bem como a posse de livros de
instrução religiosa.
§ 1º No estabelecimento haverá local apropriado para os cultos religiosos.
§ 2º Nenhum preso ou internado poderá ser obrigado a participar de
atividade religiosa.

24.1 Conteúdo da assistência religiosa

A previsão de assistência religiosa na LEP apenas confirma o que já seria


evidente em consonância com o art. 5º, VI, da CR, que garante a liberdade de culto
e de crença e seu livre exercício. A Resolução nº. 8/2011, do Conselho Nacional de
Política Criminal e Penitenciária (CNPCP), estabeleceu diretrizes para a assistência
religiosa nos estabelecimentos prisionais e garante “o direito de profecia de todas as
religiões, e o de consciência aos agnósticos e adeptos de filosofias não religiosas”.
79
Art. 25 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

Atos administrativos de suspensão das visitas religiosas sem justificativa e


sem aviso prévio devem, sob tais parâmetros, ser objeto de controle judicial. Da
mesma forma, a regulamentação da distribuição do tempo e da autorização de
entrada de equipamentos utilizados com finalidade religiosa deve obedecer aos
princípios da isonomia entre as religiões, razoabilidade e fundamentação.

24.2 Prisão domiciliar, regime semiaberto harmonizado e o direito de


frequência a culto religioso

Entendeu o STJ que o cumprimento de prisão domiciliar não impede a


liberdade de culto, inclusive no período noturno. Segundo o Tribunal, “consi­
derada a possibilidade de controle do horário e de delimitação da área percorrida
por meio do monitoramento eletrônico, o comparecimento a culto religioso
não representa risco ao cumprimento da pena” (STJ, REsp 1788562/TO, 6ª T.,
j. 17/09/2019).

SEÇÃO VIII
Da Assistência ao Egresso

Art. 25  A assistência ao egresso consiste:


- na orientação e apoio para reintegrá-lo à vida em liberdade;
- na concessão, se necessário, de alojamento e alimentação, em
estabelecimento adequado, pelo prazo de 2 (dois) meses.
Parágrafo único. O prazo estabelecido no inciso II poderá ser prorrogado
uma única vez, comprovado, por declaração do assistente social, o
empenho na obtenção de emprego.

25.1 Conteúdo de assistência ao egresso

Artigo a ser lido em conjunto com o artigo 27, abaixo transcrito. O egresso
tem direito a obter orientação e apoio para minimizar os danos decorrentes da
experiência de privação de liberdade, principalmente as prováveis dificuldades
para obtenção de ocupação lícita. Há previsão de assistência moral e material,
esta última concretizada na oferta de alojamento e alimentação, se necessário.

80
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 26

O Conselho Nacional de Justiça desenvolve o projeto “Começar de Novo”,


com a produção de cartilhas e de um “portal de oportunidades” nos quais são
divulgadas vagas de trabalho e cursos de capacitação oferecidos por instituições
públicas e privadas para presos em liberdade e egressos.

Art. 26  Considera-se egresso para os efeitos desta Lei:


- o liberado definitivo, pelo prazo de 1 (um) ano a contar da saída do
estabe­lecimento;
- o liberado condicional, durante o período de prova.

26.1 Conceito e classificação de egresso

A condição de egresso significa em liberdade, não estando mais a pessoa


submetida ao poder disciplinar da autoridade administrativa. Isso significa
que, ainda que hajam regras e condições a serem respeitadas, eventual violação
ou a prática de novo delito não pode ser interpretada como falta disciplinar,
nos termos da LEP. Há duas hipóteses legais de egresso: o liberado definitivo
por cumprimento da pena, pela desinternação ou outra causa de extinção da
punibilidade, pelo prazo de um ano; e o liberado condicional, durante o período
de prova, que corresponde, a princípio, à pena remanescente.

Art. 27  O serviço de assistência social colaborará com o egresso para a


obtenção de trabalho.

27.1 Auxílio ao egresso para obtenção de trabalho

Ver comentários ao artigo 25.

81
Art. 28 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

CAPÍTULO III
Do Trabalho

SEÇÃO I
Disposições Gerais

Art. 28  O trabalho do condenado, como dever social e condição de


dignidade humana, terá finalidade educativa e produtiva.
§ 1º Aplicam-se à organização e aos métodos de trabalho as precauções
relativas à segurança e à higiene.
§ 2º O trabalho do preso não está sujeito ao regime da Consolidação das
Leis do Trabalho.

28.1 Considerações gerais sobre o trabalho do preso

Ao lado da assistência, o trabalho é o segundo eixo do tratamento


penitenciário e se desdobra entre trabalho interno e externo. Em ambos, vale o
princípio da individualização do tratamento, o que significa que o trabalho deve
sempre corresponder às condições, habilidades e futuras necessidades do preso.
Trata-se do trabalho como “dever social e condição de dignidade humana”,
teleologicamente orientado ao cumprimento de uma dupla finalidade de educação
e produção. Na perspectiva que o define como elemento do tratamento e assim
decisivo para a reeducação, será atividade não aflitiva, obrigatória e remunerada.

28.2 Princípio da não aflitividade e inaplicabilidade do regime da CLT

O princípio da não aflitividade está presente no art. 56, I, da Res. no 14 do


CNPCP, que acolhe as orientações da ONU e define as regras mínimas para o
tratamento do preso no Brasil (hoje, as Regras de Mandela). Seu sentido precípuo
é o de diferenciar o trabalho como elemento do tratamento e o trabalho como
forma de pena, este aflitivo por definição e vedado pela Constituição (art. 5º,
XLVII, “c”, CF).
A natureza tratamental atribuída ao trabalho do preso é o que justifica,
ao menos retoricamente, a não sujeição ao regime da Consolidação das Leis do
Trabalho (CLT). Ou seja: a LEP determina a ausência de contrato de trabalho e

82
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 29

da aplicação do regular regime trabalhista, em norma que pode ter a recepção


questionada à luz do art. 7º da Constituição de 1988, o qual não legitima nenhum
tipo de distinção entre formas de trabalho, sobretudo se evidente o escopo
produtivo.

28.3 Política Nacional de Trabalho no Sistema Prisional

O Decreto 9.450/2018, da Presidência da República, em julho de 2018,


instituiu a Política Nacional de Trabalho no âmbito do Sistema Prisional, voltada
à ampliação e qualificação da oferta de vagas de trabalho, ao empreendedorismo
e à formação profissional das pessoas presas e egressas do sistema prisional.
O principal ponto é a regulamentação do § 5º do art. 40 da Lei nº 8.666, de
21 de junho de 1993, em seu art. 5º: “Na contratação de serviços, inclusive os
de engenharia, com valor anual acima de R$ 330.000,00 (trezentos e trinta mil
reais), os órgãos e entidades da administração pública federal direta, autárquica
e fundacional deverão exigir da contratada o emprego de mão de obra formada
por pessoas presas ou egressos do sistema prisional”.
Há, inclusive, reserva de percentual de vagas conforme o número total de
funcionários. A não observância das regras durante o período de execução con­
tratual pode acarretar quebra de cláusula contratual e a rescisão por iniciativa da
administração pública federal, além das sanções previstas na Lei nº 8.666, de 1993.

Art. 29  O trabalho do preso será remunerado, mediante prévia tabela,


não podendo ser inferior a 3/4 (três quartos) do salário mínimo.
§ 1° O produto da remuneração pelo trabalho deverá atender:
a) à indenização dos danos causados pelo crime, desde que determinados
judicialmente e não reparados por outros meios; b) à assistência à família;
a pequenas despesas pessoais;
ao ressarcimento ao Estado das despesas realizadas com a manutenção
do condenado, em proporção a ser fixada e sem prejuízo da destinação
prevista nas letras anteriores.
§ 2º Ressalvadas outras aplicações legais, será depositada a parte restante
para constituição do pecúlio, em Caderneta de Poupança, que será
entregue ao condenado quando posto em liberdade.

83
Art. 29 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

29.1 Remuneração do trabalho do preso

A garantia de remuneração do trabalho realizado pelo preso foi introduzida


pela Lei n. 6.416 em 1977, pouco antes da edição da atual Lei de Execução Penal.
Há dois pontos delicados: o valor da remuneração e a destinação de parte dela
como indenização ao Estado das despesas realizadas com a sua manutenção.
Primeiramente, o patamar da remuneração fixado pela LEP é mínimo, e não
máximo. Sendo assim, a impossibilidade de a remuneração do preso “ser inferior
a três quartos do salário mínimo” significa a fixação de um piso mínimo do qual
se deve partir, e não um teto, como muitas vezes interpretado e justificado tendo
em vista suas dificuldades de efetivação.

29.2 Controvérsia sobre a constitucionalidade do piso mínimo remuneratório

Questionável a constitucionalidade de tal piso mínimo, mormente se carac­


terizada a relação de emprego. A lei ordinária deve ser sempre interpretada à luz
da Constituição, o que pode implicar no entendimento pela não recepção, por
parte da Carta Magna de 1988, do art. 29, caput, da LEP, especificamente no que
tange ao art. 7º, IV e VII, da Constituição13, que garante um salário mínimo a todo
trabalhador, sem distinção.
Sobre o tema, foi ajuizada a ADPF 336 pela Procuradoria Geral da República,
em 2015, sustentando que a “fixação do piso remuneratório do trabalho de cidadãos presos
em 3/4 do salário mínimo viola os princípios da dignidade humana e da isonomia, a garantia
de salário mínimo (art. 7o , IV, da Constituição da República) e o valor social do trabalho
(arts. 1o , IV; 6o , e 170, caput, da CR)”. A ADPF foi julgada em fevereiro de 2021,
decidindo-se, por maioria, pela improcedência da arguição, considerando o art. 29
recepcionado pela Constituição. Entre os principais argumentos, estabeleceu-se a
premissa de que a fixação de patamar remuneratório inferior ao salário mínimo foi
opção política visando estimular a contratação da pessoa presa, não cabendo ao
Poder Judiciário “impedir a implementação de política pública com esse objetivo”
(Voto do Min. Relator Luis Fux, p. 8).
Discordamos da decisão da Corte, tendo a posição defendida pelas edições
anteriores sido honrosamente mencionada no voto condutor da posição vencida,

13
Na doutrina trabalhista, v. COUTINHO, Aldacy Rachid. “Trabalho e Pena”. Revista da Faculdade
de Direito da UFPR, 32, p. 16; ainda, pela inconstitucionalidade, v. SANTOS, Juarez Cirino dos.
Direito Penal: Parte Geral. 3. ed. Curitiba: ICPC/Lumen Juris, 2008, p. 531;

84
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 30

lavrado pelo Min. Edson Fachin. O preso não pode deixar de ser considerado
trabalhador, na medida em que exerce atividade produtiva, inexistindo autori­
zação constitucional para a diferenciação, seja esta considerada política pública ou
não. Seria equivocado dizer, por fim, que com a derrubada do art. 29 não haveria
fundamento legal para a remuneração do preso, porque ele estaria no art. 41, II,
da LEP, com a garantia de isonomia pela própria Constituição.

29.3 Despesas com a manutenção do preso

Em relação à possibilidade de as despesas com a manutenção do preso lhes


serem descontadas de sua remuneração, trata-se de hipótese permitida em lei,
porém restringida à ausência de prejuízo de outras destinações. São prioritárias,
portanto, (a) a indenização dos danos causados pelo crime se determinados
judicialmente e não reparados por outros meios, (b) a assistência à família e
(c) as pequenas despesas pessoais, inclusive apenas estas últimas são contempla­
das pelas Regras Mínimas para o Tratamento do Preso no Brasil (art. 56, VIII, Res.
n.14 do CNPCP).
A indenização ao Estado das despesas de manutenção aparecerá também
como dever do preso, mas quando possível (art. 39, VIII, LEP).
A parte restante da remuneração, se houver, deve ser depositada em Cader­
neta de Poupança a fim de constituir o pecúlio que será entregue ao condenado
quando novamente em liberdade.

Art. 30  As tarefas executadas como prestação de serviço à comunidade


não serão remuneradas.

30.1 Ausência de remuneração da prestação de serviço à comunidade

Em situação bem distinta, a prestação de serviço à comunidade é uma


modalidade de pena restritiva de direitos ou condição da suspensão condicional
da pena (art. 78, §1º, CP). Guarda, assim, diretamente, a natureza jurídica de pena,
não sendo, por este motivo, remunerada.

85
Art. 31 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

30.2 Posição da Organização Internacional do Trabalho

De acordo com a Convenção nº. 29, da Organização Internacional de Trabalho,


promulgada pelo Decreto nº. 41.721, de 25 de junho de 1957, a expressão “trabalho
forçado ou obrigatório” não compreende “qualquer trabalho ou serviço exigido de um
indivíduo como consequência de condenação pronunciada por decisão judiciária, contanto
que êsse trabalho ou serviço seja executado sob a fiscalização e o contrôle das autoridades
públicas e que o dito indivíduo não seja pôsto à disposição de particulares, companhias
ou pessoas morais privadas” (art. 2º, 2, “c”).

SEÇÃO II
Do Trabalho Interno

Art. 31  O condenado à pena privativa de liberdade está obrigado ao


trabalho na medida de suas aptidões e capacidade.
Parágrafo único. Para o preso provisório, o trabalho não é obrigatório e
só poderá ser executado no interior do estabelecimento.

31.1 Considerações gerais sobre o trabalho interno

O trabalho interno é aquele realizado no interior do estabelecimento e


subordinado à própria administração penitenciária ou a terceiros, sob gerência
de fundação ou empresa pública ou mediante convênio com empresa privada.
É neste âmbito em que incide a obrigatoriedade para o condenado, sendo
facultativo apenas para o preso provisório. No paradoxo existente na imposição
legal de uma mesma atividade simultaneamente como dever (art. 39, V, LEP) e
como direito (art. 41, II, LEP), é evidente que a balança pende para o primeiro
lado: a não execução do trabalho indicado é considerada como falta grave
(art. 50, VI, LEP).
Na prática, porém, a obrigatoriedade não faz sentido, diante da escassez da
oferta de trabalho das unidades prisionais e do desejo manifesto da população
carcerária em trabalhar, mesmo por conta do direito à remição de pena.
Formalmente, decorre da obrigatoriedade a ausência de elemento essencial
do contrato de trabalho que é a liberdade do ato volitivo em sua formação.
É comum que o trabalho interno não seja produtivo e com valor de troca, fazendo

86
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 32

mais sentido, neste caso, a não aplicação do regime da CLT (Consolidação das
Leis do Trabalho), e sim as regras da própria LEP. É o que ocorre quando a
subordinação se dá à própria administração penitenciária. A competência para
julgar demanda referente à remuneração ou a conflito trabalhista entre preso e
Estado será, aqui, do próprio juízo de execução penal (STJ, CC 92.851/MS, Rel.
Min. Jorge Mussi, j. 13/08/2008).

Art. 32  Na atribuição do trabalho deverão ser levadas em conta a


habilitação, a condição pessoal e as necessidades futuras do preso, bem
como as oportunidades oferecidas pelo mercado.
§ 1º Deverá ser limitado, tanto quanto possível, o artesanato sem
expressão econômica, salvo nas regiões de turismo.
§ 2º Os maiores de 60 (sessenta) anos poderão solicitar ocupação
adequada à sua idade.
§ 3º Os doentes ou deficientes físicos somente exercerão atividades
apropriadas ao seu estado.

32.1 Individualização da pena na atribuição do trabalho

O princípio da individualização da pena alcança a atribuição do trabalho ao


preso, o qual deve corresponder às suas condições pessoais e oportunidades do
mercado, valorizando as peculiaridades locais e regionais. No mesmo sentido,
idosos, doentes ou deficientes físicos deverão receber tarefas apropriadas à sua
condição.

32.2 Remição nas atividades de artesanato

Embora limitada pela lei (art. 32, §1°), a atividade de artesanato deve ser
expandida e incentivada, inclusive se admitindo a remição da pena, mormente
considerando a escassez da oferta de oportunidades de trabalho penitenciário em
relação à demanda. Foi esse, inclusive, o entendimento do STJ no REsp 1.720.785/
RO, Rel. Min. Ribeiro Dantas, 5ª T., j. 12/03/2018.

87
Art. 33 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

Art. 33  A jornada normal de trabalho não será inferior a 6 (seis) nem
superior a 8 (oito) horas, com descanso nos domingos e feriados.
Parágrafo único. Poderá ser atribuído horário especial de trabalho aos
presos designados para os serviços de conservação e manutenção do
estabelecimento penal.

33.1 Jornada de trabalho do preso: regra geral e exceções

A jornada de trabalho não pode ser inferior a seis horas nem superior a
oito horas, com descanso nos domingos e feriados. Se o serviço é de conserva­
ção e manutenção do estabelecimento, podem ser atribuídos horários especiais.
Se extrapolado o limite, será considerado um dia de trabalho a cada seis horas
extras14 (STJ, REsp 106.493-4/RS, Rel. Min. Og Fernandes, j. 11/12/2009). Se a
jornada inferior a seis horas foi determinação da direção do presídio, sem qualquer
indisciplina, subsiste o direito à remição, com base nos princípios da segurança
jurídica e da proteção da confiança (STF, RHC 136.509, Rel. Min. Dias Toffoli, 2ª T.,
j. 04/04/2017; STJ, REsp 1.721.257/MG, 5ª T., Rel. Min. Jorge Mussi, j. 05/06/2018).
Por inteligência do próprio art. 33, parágrafo único, da LEP, é possível que
também haja trabalho aos domingos e feriados, em seus termos. De todo modo, se
a direção do estabelecimento atestar o trabalho em domingos e feriados, subsiste
o direito à remição (STJ, HC 346.948/RS, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca,
5ª T., j. 21/06/2016).

Art. 34  O trabalho poderá ser gerenciado por fundação, ou empresa


pública, com autonomia administrativa, e terá por objetivo a formação
profissional do condenado.
§ 1º Nessa hipótese, incumbirá à entidade gerenciadora promover
e supervi­sionar a produção, com critérios e métodos empresariais,
encarregar-se de sua comercialização, bem como suportar despesas,
inclusive pagamento de remuneração adequada. (Renumerado pela Lei
nº 10.792, de 2003)

14
Errata: retificamos equívoco das edições anteriores que afirmava haver remição de um dia de
pena para cada seis horas extras trabalhadas.

88
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 34

§ 2º Os governos federal, estadual e municipal poderão celebrar convênio


com a iniciativa privada, para implantação de oficinas de trabalho
referentes a setores de apoio dos presídios. (Incluído pela Lei nº 10.792,
de 2003)

34.1 Exploração do trabalho do preso por fundação, empresa pública ou


iniciativa privada

É possível que haja exploração da mão de obra do preso por parte de empresa
pública ou fundação, bem como por parte da iniciativa privada, mediante convênio
com a administração pública. Caso a organização e gerência do trabalho interno
seja realizada por fundação ou empresa pública, ou por empresa conveniada,
caberá à entidade respectiva a remuneração adequada do preso.

34.2 Sentido de remuneração adequada e contrato de trabalho

É de se questionar se a referência à expressão “remuneração adequada” não


excluiria a possibilidade de remuneração em valor aquém do salário mínimo,
acrescentando novo ingrediente ao debate mencionado nos comentários ao art. 29
da LEP. Através dessa interpretação intermediária, ficaria assentado que a própria
LEP já vedaria remuneração abaixo do salário mínimo nas hipóteses deste artigo,
restando o debate sobre a recepção pela Constituição Federal do art. 29 somente
quanto à remuneração do trabalho interno realizado em benefício da própria
administração penitenciária.
É preciso verificar, em casos como esses, se estão presentes os requisitos
próprios de qualquer relação de emprego: onerosidade, subordinação, conti­
nuidade e pessoalidade. Em caso de resposta positiva, a posição mais democrática
é indubitavelmente pelo reconhecimento de um contrato de trabalho e conse­
quentemente de todos os devidos encargos sociais; podendo-se, inclusive,
reconhecer o trabalho interno do preso que presta serviço a uma empresa privada
como modalidade de “trabalho a domicílio”, nos termos da Consolidação das
Leis do Trabalho15 e em coerência com a regra do art. 76, caput e parágrafo único,
do Código Civil brasileiro.

15
Sobre o tema, v. COUTINHO, Aldacy Rachid. “Trabalho e Pena”. Revista da Faculdade de Direito
da UFPR, 32, 1999, p. 7-23.

89
Art. 35 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

Outras formas de incentivo, que não a desvalorização da mão de obra, podem


e devem ser buscados para estimular empresas a instalarem canteiros de trabalho
em unidades prisionais.

Art. 35  Os órgãos da Administração Direta ou Indireta da União, Estados,


Territórios, Distrito Federal e dos Municípios adquirirão, com dispensa de
concorrência pública, os bens ou produtos do trabalho prisional, sempre
que não for possível ou recomendável realizar-se a venda a particulares.
Parágrafo único. Todas as importâncias arrecadadas com as vendas
reverterão em favor da fundação ou empresa pública a que alude o artigo
anterior ou, na sua falta, do estabelecimento penal.

35.1 Compra de bens ou produtos do trabalho prisional

Trata-se de regra que visa estimular atividades produtivas da população


carcerária, facilitando a compra (com dispensa de concorrência), por parte da
Administração Pública, de bens e produtos do trabalho prisional os quais se estime
não terem potencial de comercialização a particulares. Os valores arrecadados,
porém, serão destinados à própria fundação ou empresa pública referidas no
artigo anterior. Não havendo, os recursos ficam com o estabelecimento penal.
Não há previsão ou clareza sobre a aplicabilidade da possibilidade ora
prevista em benefício de empresas privadas conveniadas que instalam canteiros
de trabalho em unidades prisionais.

SEÇÃO III
Do Trabalho Externo

Art. 36  O trabalho externo será admissível para os presos em regime


fechado somente em serviço ou obras públicas realizadas por órgãos
da Administração Direta ou Indireta, ou entidades privadas, desde que
tomadas as cautelas contra a fuga e em favor da disciplina.
§ 1º O limite máximo do número de presos será de 10% (dez por cento)
do total de empregados na obra.

90
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 36

§ 2º Caberá ao órgão da administração, à entidade ou à empresa


empreiteira a remuneração desse trabalho.
§ 3º A prestação de trabalho à entidade privada depende do
consentimento expresso do preso.

36.1 Considerações gerais sobre o trabalho externo do preso

O trabalho externo é realizado fora das dependências do estabelecimento


penal, sendo em muitos aspectos similar à concessão de outros direitos da exe­
cução. Pode ser considerado um direito do preso em regime fechado e semiaberto,
concretizando-se quando obtida a autorização para sua realização. No caso da
prestação de trabalho à entidade privada, é necessário o “consentimento expresso
do preso” (art. 36, § 3º, LEP).

36.2 Sobre as cautelas contra a fuga e em favor da disciplina

Para presos em regime fechado, a lei restringe a modalidade do trabalho a


“serviço ou obras públicas realizadas por órgãos da Administração Direta ou Indireta, ou
entidades privadas, desde que tomadas as cautelas contra a fuga e em favor da disciplina”,
entendendo-se, este último trecho, como a necessidade de escolta policial, o que
muitas vezes inviabiliza a concretização do pedido, ainda que autorizado pelo
diretor da unidade prisional (que não tem autoridade sobre a polícia militar, se
for essa a realizar a escolta).
Não há restrição legal, porém, para a autorização ao trabalho externo me­
diante colocação de tornozeleira eletrônica, na medida em que também se trata
de dispositivo destinado à evitação de fuga, nos termos do dispositivo legal.

36.3 Admissibilidade para condenados por crime hediondo

É admissível o trabalho externo para condenados por crime hediondo,


restando superadas controvérsias anteriores (STJ, HC 35.004/DF, 6ª T., Rel. Min.
Paulo Medina, j. 24.02.2005; STJ, HC 65.356/AC, 5ª T., Rel.
Min. Arnaldo Esteves Lima, j. 09.08.2007).

91
Art. 37 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

36.4 Encargo pela remuneração do trabalho externo e direitos trabalhistas

A remuneração é encargo do respectivo gerenciador do trabalho, seja


órgão da administração, entidade ou empresa empreiteira (art. 36, § 2º, LEP). A
tendência é de equiparação ao trabalho livre. Nessa perspectiva, é problemático
se admitir que o trabalhador preso receba menos do que o trabalhador livre,
exercendo atividade idêntica ou análoga. O tema remete mais uma vez à questão
da prevalência do art. 7º, IV, da Constituição.
Assunto também polêmico diz respeito à observância dos direitos traba­
lhistas, incluindo direito a férias, adicional por hora extra, recolhimento de
FGTS, direito de greve e à associação sindical, e assim por diante, do preso que
trabalha sob a presença de todos os requisitos próprios da relação de trabalho.
Sua não observância é compreensível criticamente como a utilização do trabalho
encarcerado como mera mão-de-obra barata; e inadmissível do ponto de vista
constitucional que, mais uma vez, deve prevalecer sobre qualquer discriminação
entre trabalhador livre e não-livre realizada por lei infraconstitucional.

Art. 37  A prestação de trabalho externo, a ser autorizada pela direção do


estabelecimento, dependerá de aptidão, disciplina e responsabilidade,
além do cumprimento mínimo de 1/6 (um sexto) da pena.
Parágrafo único. Revogar-se-á a autorização de trabalho externo ao preso
que vier a praticar fato definido como crime, for punido por falta grave, ou
tiver comportamento contrário aos requisitos estabelecidos neste artigo.

37.1 Requisitos para o trabalho externo

A autorização para o trabalho externo é encargo da direção do estabeleci­


mento, sendo, portanto, ato administrativo vinculado e condicionado à verificação
de um requisito objetivo – cumprimento mínimo de 1/6 da pena – e outro subje­
tivo – “aptidão, disciplina e responsabilidade” (art. 37, LEP). Sendo assim, se
presentes os requisitos legais a autorização é um direito do preso requerente.
Evidentemente, o requisito subjetivo – “aptidão, disciplina e responsabilidade”
– invoca grande margem de discricionariedade para o diretor do estabelecimento,
recomendando-se por isso sua interpretação segundo critérios minimamente
objetivos, tais como a ausência de punição por faltas disciplinares ou um atestado
simples de boa conduta carcerária.

92
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 37

Como anotado acima, é comum que o pedido seja deferido pelo diretor do
estabelecimento, mas inviabilizado pela ausência de escolta policial. É o caso de se
buscar outras formas de monitoramento e evitação de fuga, como as tornozeleiras
eletrônicas, e não simplesmente de se cancelar, a priori, a própria possibilidade
do trabalho externo por conta de um fator externo e alheio ao comportamento
do preso.

37.2 Peculiaridades do regime semiaberto

Quando em regime semiaberto, é importante não confundir trabalho externo


e saída temporária, tendo em vista que os objetivos são distintos e não há, para o
trabalho externo, a limitação temporal aplicável à saída temporária.
Quando em regime semiaberto, não se exige nenhum lapso temporal para a
obtenção de trabalho externo. É que “Considera-se o tempo de cumprimento da pena no
regime fechado” (Súmula 40, STJ). Portanto, o mesmo quantum de tempo cumprido
pode valer tanto para a obtenção da progressão de regime (fechado ao semiaberto)
como para a obtenção da autorização para o trabalho externo. O montante de 1/6
da pena se refere apenas ao trabalho externo quando em regime fechado (art. 37,
LEP), sendo regra estritamente dirigida ao diretor do estabelecimento. Na mesma
linha, o entendimento predominante é pela não exigibilidade do requisito objetivo
para o preso que inicia o cumprimento da pena em regime semiaberto (STJ, RHC
17693/RS, 6ª T., Rel. Min. Paulo Gallotti, j. 18/08/2005; STF, EP 2 TrabExt-AgR, Rel.
Min. Roberto Barroso, Pleno, j. 25/06/2014).

37.3 Trabalho externo em empresa de familiar e em área de difícil


fiscalização

É absolutamente possível que, no regime semiaberto, o preso realize trabalho


externo em empresa pertencente a familiar, sendo equivocado o entendimento
corriqueiro pela inadmissibilidade da hipótese por suposta impossibilidade de
fiscalização. Nesse sentido: “(...) A execução criminal visa o retorno do condenado ao
convício social, com o escopo de reeducá-lo e ressocializá-lo, sendo o trabalho essencial
para esse processo. IV - In casu, o fato do irmão do apenado ser um dos sócios da empresa
empregadora não constitui óbice à concessão do trabalho externo, sob o argumento
de fragilidade na fiscalização, até porque inexiste vedação na Lei de Execução Penal.
(Precedente do STF)” (STJ, HC 310.515/RS, Rel. Min. Felix Fischer, 5ª T., j. 17/09/2015).

93
Art. 37 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

Por outro lado, já entendeu o STJ pela impossibilidade de trabalho externo


com base no argumento de que ele se daria em “região tomada pelo crime
organizado”, o que impediria a fiscalização do Estado (STJ, HC 175.298/RJ, 5ª T.,
Rel. Min. Gilson Dipp, j. 31.05.2011). Decisiva foi, no caso, a manifestação de um
fiscal que não conseguiu entrar no bairro onde se localizava o estabelecimento
comercial em que trabalhava o condenado. Ocorre que o Estado não pode chancelar
situação como essa, naturalizando-a, e muito menos tomá-la como fundamento
jurídico para cancelar direito que tem todos os seus requisitos preenchidos. Afinal,
o fato de uma comunidade ser territorialmente dominada por um grupo armado
não significa – bem ao contrário – que todos os seus moradores façam parte ou
sejam coniventes com esse tipo de ação. Vincular tal contexto à suposição de que
a medida, no caso, não cumpre com a finalidade de “reintegração social”, parece
estabelecer tal vínculo, com o que não se pode concordar.

37.4 Trabalho externo em regime semiaberto harmonizado com


monitoração eletrônica

Admite-se a ampliação do perímetro e das condições de horário estabelecidos


para a monitoração eletrônica se for para viabilizar obtenção de ocupação lícita
pela pessoa que cumpre pena em regime semiaberto harmonizado, ou seja, sob
regime de monitoração eletrônica. Por exemplo, em caso envolvendo motorista
de caminhão (STJ, liminar no HC 580.060/PR, Rel. Min. Leopoldo de Arruda
Raposo, j. 05/02/2020).

37.5 Revogação do trabalho externo

A autorização para o trabalho externo pode ser revogada pela mesma


autoridade administrativa que a emitiu – a administração do estabelecimento
prisional –, tendo em vista a competência revocatória implícita da Administração
Pública. O ato de revogação é também vinculado, na medida em que possível
apenas se contemplada hipótese do rol do art. 37, parágrafo único, da LEP, ou
seja: se o beneficiado praticar fato definido como crime, for punido por falta grave
ou apresentar comportamento contrário às exigências de “aptidão, disciplina e
responsabilidade”.

94
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 38

CAPÍTULO IV
Dos Deveres, dos Direitos e da Disciplina

SEÇÃO I
Dos Deveres

Art. 38  Cumpre ao condenado, além das obrigações legais inerentes ao


seu estado, submeter-se às normas de execução da pena.

38.1 Desnecessidade do dispositivo

Trata-se de dispositivo com redação vaga e desnecessária, na medida em


que submeter-se às normas de execução da pena é também uma obrigação
legal inerente à condenação. Sua relevância está em abrir novo capítulo da LEP
destinado ao sistema disciplinar, erigido por deveres e tensionado por direitos,
como se vê a seguir.

Art. 39  Constituem deveres do condenado:


- comportamento disciplinado e cumprimento fiel da sentença;
- obediência ao servidor e respeito a qualquer pessoa com quem deva
relacionar-se;
- urbanidade e respeito no trato com os demais condenados;
- conduta oposta aos movimentos individuais ou coletivos de fuga ou de
subversão à ordem ou à disciplina;
- execução do trabalho, das tarefas e das ordens recebidas;
- submissão à sanção disciplinar imposta;
- indenização à vitima ou aos seus sucessores;
- indenização ao Estado, quando possível, das despesas realizadas com
a sua manutenção, mediante desconto proporcional da remuneração
do trabalho;
- higiene pessoal e asseio da cela ou alojamento;X - conservação dos
objetos de uso pessoal.

95
Art. 39 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

Parágrafo único. Aplica-se ao preso provisório, no que couber, o disposto


neste artigo.

39.1 Deveres do condenado

O rol taxativo de deveres do preso indica um desdobramento de hipóteses a


partir do dever geral de obediência à autoridade administrativa. A relação jurídica
entre o detento e a autoridade administrativa é o que se pode denominar relação
jurídico-penitenciária ou estatuto jurídico do recluso. Não cabe mais invocar a
superada teoria das relações especiais de sujeição ou da supremacia especial como
base teórica para sustentar tal relação de subordinação. Ela é inerente à condição de
custodiado pelo Estado, por um lado, mas permanentemente limitada e tensionada
pela necessidade de respeito aos direitos das pessoas presas, por outro.

39.1.1 Dever do inciso I: comportamento disciplinado e cumprimento fiel da


sentença

Todo o sistema disciplinar é construído para regular a conduta das pessoas


presas, podendo, em caso de infração de natureza leve, média ou grave, sofrer
graves consequências tanto administrativas como judiciais.

39.1.2 Dever do inciso II: obediência ao servidor e respeito a qualquer pessoa


com quem deva relacionar-se

Hipótese particularmente importante porque seu descumprimento pode


configurar falta grave (vide comentários ao art. 50, VI, LEP).

39.1.3 Dever do inciso III: urbanidade e respeito no trato com os demais


condenados

Trata-se de obrigação mais específica que o inciso anterior, pois aquele


trata do respeito “a qualquer pessoa” e este trata do respeito “com os demais
condenados”. Eventual desavença e desrespeito entre presos, portanto, deve
receber o enquadramento da conduta neste inciso, o qual se amolda à situação
de forma mais precisa e direta.

96
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 39

39.1.4 Dever do inciso IV: conduta oposta aos movimentos individuais ou


coletivos de fuga ou de subversão à ordem ou à disciplina

A obrigação descrita exige interpretação restritiva e a aplicação analógica do


conceito de exigibilidade de conduta diversa que compõe o conceito normativo
de culpabilidade, na teoria do delito. Não há como exigir, de qualquer pessoa, o
sacrifício da própria vida e integridade física. Rebeliões e motins violentos não
abrem espaço para uma postura de oposição, no momento em que estão ocorrendo.

39.1.5 Dever do inciso V: execução do trabalho, das tarefas e das ordens


recebidas

Em conjunto ao inciso II, compartilhando dos mesmos problemas, trata-


se de hipótese particularmente importante porque seu descumprimento pode
configurar falta grave (vide comentários ao art. 50, VI, LEP).

39.1.6 Dever do inciso VI: submissão à sanção disciplinar imposta

Caso seja sancionado pela autoridade administrativa, o preso tem o dever de


cumprir a sanção administrativa que foi imposta. Também aqui se tem hipótese
mais específica que aquelas dos incisos II e V e que deve, necessariamente,
prevalecer sobre elas no enquadramento da conduta, no caso concreto.

39.1.7 Dever do inciso VII: indenização à vitima ou aos seus sucessores

Decorre da obrigação civil de reparar o dano, a qual é tornada “certa” por


efeito da condenação previsto no art. 91, I, do Código Penal. Trata-se de base
legal importante para a elaboração de projetos e práticas de justiça restaurativa
no âmbito da execução da pena, criando espaços de comunicação com a vítima.
Para tanto, porém, é necessário inovar e investir na equipe técnica responsável
pelos contatos, não banalizar o conceito de justiça restaurativa – o qual só tem
sentido com a presença da vítima, não se aplicando, por exemplo, a questões
disciplinares dentro da unidade – e ir além da natureza meramente pecuniária
da ideia de reparação, a qual deve ser ampla, simbólica e construída de forma
dialógica.

97
Art. 40 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

39.1.8 Dever do inciso VIII: indenização ao Estado, quando possível, das


despesas realizadas com a sua manutenção, mediante desconto
proporcional da remuneração do trabalho

Ainda que propostas similares sejam apresentadas como “novidade” na


arena dos discursos políticos, a lei já prevê desde sua origem que o preso tem o
dever de indenizar o Estado, quando possível, pelas despesas realizadas com sua
manutenção, por meio do seu trabalho.

39.1.9 Dever do inciso IX: higiene pessoal e asseio da cela ou alojamento

A pessoa presa tem o dever de manter a higiene pessoal e de seu alojamento,


mas a ela não pode ser imputada a ausência de higiene crônica e decorrente de
quadros de superlotação e inadimplemento das políticas de assistência pelo
Estado.

39.1.10 Dever do inciso X: conservação dos objetos de uso pessoal

Por fim, a pessoa presa tem o dever de conservação de seus objetos de uso
pessoal, responsabilizando-se por danos ou por sua perda, salvo quando causados
por terceiros.

SEÇÃO II
Dos Direitos

Art. 40  Impõe-se a todas as autoridades o respeito à integridade física


e moral dos condenados e dos presos provisórios.

40.1 Direito do preso à integridade física e moral: base constitucional e


convencional

A necessidade de respeito à integridade e à dignidade física e moral das


pessoas presas e de seus visitantes é corolário do princípio constitucional da
humanidade das penas e assim expressamente previsto pelo art. 5º, XLIX, da

98
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 40

Constituição. No mesmo sentido, o art. 10.1 do Pacto Internacional de Direitos


Civis e Políticos e o art. 5.2 da Convenção Americana de Direitos Humanos; além
da ratificação da Convenção contra a Tortura e outros tratamentos ou Penas
Cruéis, Desumanas ou Degradantes (Decreto nº. 40, de 15 de fevereiro de 1991).
Os deveres impostos ao Estado abarcam tanto a evitação de violações e abusos
por parte de seus próprios agentes, como também a evitação da violência por parte
de outros presos e o dever de agir quanto ao atendimento das necessidades básicas
e de saúde. Inserem-se nesse âmbito as questões concernentes à responsabilidade
civil do Estado em casos de morte de presos e à regulamentação do uso
proporcional da força e de armas, inclusive na contenção de conflitos carcerários.

40.2 Jurisprudência internacional de direitos humanos e as violações


praticadas pelo Brasil

Como apontam PAIVA e HEEMANN, o Brasil é um “colecionador de


medidas provisórias” emitidas pela Corte Interamericana de Direitos Humanos,
destacando-se os seguintes casos15: a) Penitenciária Urso Branco (2002-2011), em
Porto Velho/RO, reconhecendo que a custódia de presos indica posição especial de
garante do Estado, ainda que se trate de situação de violência entre particulares,
respondendo pela omissão; b) Complexo Tatuapé da FEBEM (2005-2008), em São
Paulo, resultando na desativação da unidade de internação de adolescentes;
c) Complexo Penitenciário do Curado (2014), em Pernambuco, quando a Corte fez
diversas determinações estruturais; d) Complexo Penitenciário de Pedrinhas (2014), no
Maranhão, também com medidas provisórias para que o Estado brasileiro adote
todas as medidas necessárias para proteção da vida e integridade das pessoas
privadas de liberdade no local.
Em 2017 e 2018, ainda, foram expedidas resoluções com medidas provisórias
sobre o e) Instituto Penal Plácido de Sá Carvalho, no Complexo Penitenciário de
Gericinó, no Rio de Janeiro, determinando, entre outras medidas, a apresentação
de um “plano de redução da superlotação do sistema prisional fluminense”, a
garantia de acesso amplo e irrestrito da Defensoria Pública do Estado do Rio de
Janeiro às dependências da unidade, a proibição de novas entradas e o cômputo
em dobro da pena cumprida para as pessoas lá custodiadas que não sejam
acusadas ou condenadas por crimes contra a vida ou a integridade física, ou por
crimes sexuais.

99
Art. 40 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

40.3 Uso da força para controle de motins

O uso de armas não letais, como sprays de pimenta e uso de gás lacrimogêneo,
carece de regulamentação sobre as hipóteses de seu cabimento. A sua utilização
abusiva – por exemplo, em detentos algemados ou que estão dentro de suas
celas – produz instabilidade e pode configurar ilícito penal. A Lei 13.060, de
22 de dezembro de 2014, determina a priorização do uso de “instrumentos de
menor potencial ofensivo pelos agentes de segurança pública”, desde que não
haja risco à integridade dos policiais, exigindo respeito à legalidade, necessidade,
razoabilidade e proporcionalidade. A lei carece ainda de regulamentação que
classifique e discipline a utilização dos instrumentos ditos não letais.
Há diversos precedentes na Comissão e na Corte Interamericana de Direitos
Humanos sobre o tema dos limites ao uso da força para controle de motins: o
Estado do Peru, por exemplo, foi condenado pela Corte nos casos Neira Alegría et al
vs. Peru (1985), Presídio Miguel Castro (1992) e Durand y Ugarte vs. Peru (2000) pelo
uso excessivo e desproporcional da força para o controle de motins e rebeliões16.
O tema apareceu, no Brasil, no Caso Carandiru, quando cento e onze presos, que
não portavam arma de fogo, foram mortos na ação de contenção de rebelião
na unidade prisional. O caso tramita na Comissão Interamericana de Direitos
Humano, tendo sido expedidas recomendações ao Estado brasileiro.

40.4 Inaplicabilidade da reserva do possível

Já decidiu o STF pela inaplicabilidade do princípio da reserva do possível


no tema: “(...) 3. “Princípio da reserva do possível”. Inaplicabilidade. O Estado é
responsável pela guarda e segurança das pessoas submetidas a encarceramento, enquanto
permanecerem detidas. É seu dever mantê-las em condições carcerárias com mínimos
padrões de humanidade estabelecidos em lei, bem como, se for o caso, ressarcir danos que daí
decorrerem. 4. A violação a direitos fundamentais causadora de danos pessoais a detentos
em estabelecimentos carcerários não pode ser simplesmente relevada ao argumento de
que a indenização não tem alcance para eliminar o grave problema prisional globalmente
considerado, que depende da definição e da implantação de políticas públicas específicas,
providências de atribuição legislativa e administrativa, não de provimentos judiciais. Esse
argumento, se admitido, acabaria por justificar a perpetuação da desumana situação que
se constata em presídios como o de que trata a presente demanda. 5. A garantia mínima de
segurança pessoal, física e psíquica, dos detentos, constitui dever estatal que possui amplo
lastro não apenas no ordenamento nacional (Constituição Federal, art. 5º, XLVII, “e”;
XLVIII; XLIX; Lei 7.210/84 (LEP), arts. 10; 11; 12; 40; 85; 87; 88; Lei 9.455/97 - crime

100
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 40

de tortura; Lei 12.874/13 – Sistema Nacional de Prevenção e Combate à Tortura), como,


também, em fontes normativas internacionais adotadas pelo Brasil (Pacto Internacional
de Direitos Civis e Políticos das Nações Unidas, de 1966, arts. 2; 7; 10; e 14; Convenção
Americana de Direitos Humanos, de 1969, arts. 5º; 11; 25; Princípios e Boas Práticas para
a Proteção de Pessoas Privadas de Liberdade nas Américas – Resolução 01/08, aprovada em
13 de março de 2008, pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos; Convenção da
ONU contra Tortura e Outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos ou Degradantes,
de 1984; e Regras Mínimas para o Tratamento de Prisioneiros – adotadas no 1º Congresso
das Nações Unidas para a Prevenção ao Crime e Tratamento de Delinquentes, de 1955)”
(STF, REXT 580.252/MS, Rel. p/ acórdão: Min. Gilmar Mendes, j. 16/02/2017).

40.5 Revista vexatória em visitantes

As práticas de revista vexatória em visitantes e familiares (muitas vezes


crianças pequenas), quando visitam seus parentes reclusos, atentam de forma
inadmissível à sua dignidade, chegando-se a violar por via oblíqua o princípio
da intranscendência da pena (art. 5º, XLV, CF).
Por revista vexatória, referimo-nos a práticas de desnudamento, introdução
de objetos em cavidades íntimas, agachamento e/ou uso de cães. Não há base legal
para a prática, apenas regulamentos administrativos. Na verdade, a Lei 13.271, de
15 de abril de 2016, proibiu a adoção de “qualquer prática de revista íntima” nas
funcionários e clientes do sexo feminino em empresas públicas e privadas, bem
como nos ambientes prisionais. Embora ambígua a redação e inadequado o termo
“clientes”, a única interpretação legítima é que a revista íntima foi efetivamente
vedada. Algumas leis estaduais e decisões em ações civis públicas, bem como a
Resolução nº. 5/2014, do CNPCP, também já reconheceram sua natureza ilegal.
O tema teve repercussão geral reconhecida pelo STF (ARE 959.620 RG, Rel.
Min. Edson Fachin). A questão colocada é a se prova obtida por meio de revista
vexatória pode ser invalidada por violação dos princípios da dignidade da pessoa
humana, da intimidade, da honra e da imagem. O julgamento foi iniciado em
junho de 2020, quando o Ministro Relator fixou a seguinte tese, negando o recurso
extraordinário: “É inadmissível a prática vexatória da revista íntima em visitas
sociais nos estabelecimentos de segregação compulsória, vedados sob qualquer
forma ou modo o desnudamento de visitantes e a abominável inspeção de suas
cavidades corporais, e a prova a partir dela obtida é ilícita, não cabendo como
escusa a ausência de equipamentos eletrônicos e radioscópicos”.
Abrindo divergência, o Ministro Alexandre de Moraes propôs outra tese:
“A revista íntima para ingresso em estabelecimentos prisionais será excepcional,
101
Art. 40 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

devidamente motivada para cada caso específico e dependerá da concordância


do visitante, somente podendo ser realizada de acordo com protocolos
preestabelecidos e por pessoas do mesmo gênero, obrigatoriamente médicos na
hipótese de exames invasivos. O excesso ou abuso da realização da revista íntima
acarretarão responsabilidade do agente público ou médico e ilicitude de eventual
prova obtida. Caso não haja concordância do visitante, a autoridade administrativa
poderá impedir a realização da visita”.
Sabe-se que a exigência de motivação para cada caso específico é facilmente
contornada no contexto penitenciário, de dificilíssimo controle judicial dos atos
administrativos. Assiste inteira razão, a nosso ver, ao Ministro Fachin, Relator do
recurso extraordinário. O julgamento foi interrompido por pedido de vista, em
outubro de 2020, e não retomado até o fechamento desta edição.
O STJ vem decidindo de forma ambígua, admitindo a revista íntima
“desde que não invasiva”. Por exemplo: “havendo fundada suspeita de que o
visi­tante do presídio esteja portando drogas, armas, telefones ou outros objetos
proibidos, é possível a revista íntima que, por si só, não ofende a dignidade da
pessoa humana, notadamente quando realizada dentro dos ditames legais, sem
qualquer procedimento invasivo” (STJ, HC 460.234/SC, Rel. Min. Reynaldo Soares
da Fonseca, j. 11/09/2018); “(...) As pessoas que se dirigem ao presídio sabem,
previamente, que podem ser submetidas à revista pessoal e minuciosa. Trata-se.
tal procedimento (quando realizado com estrita observância a procedimento legal
e com respeito aos princípios e às garantias constitucionais), de legítimo exercício
do poder de polícia do Estado, de cunho preventivo, o qual objetiva garantir a
segurança social e os interesses públicos. (...)” (STJ, REsp 1523735/RS, Rel. Min.
Rogério Schietti Cruz, j. 20/02/2018).
É possível e necessária a adoção de tecnologia mais sofisticada, métodos
não invasivos de verificação ou mesmo a revista somente do preso, após a visita,
considerando que o escopo é justamente evitar a entrada na unidade prisional
de drogas e objetos não permitidos.

40.6 Respeito à integridade física e moral conforme a identidade de gênero

O respeito à integridade física e moral da pessoa presa necessita levar em


conta sua identidade de gênero. A Resolução Conjunta nº. 1/2014, do Conselho
Nacional de Política Criminal e Penitenciária (CNPCP) e do Conselho Nacional
de Combate à Discriminação (CNCD), estabelece “parâmetros de acolhimento
de LGBT em privação de liberdade no Brasil”, podendo-se destacar, entre outras
normas importantes: a) direito da pessoa travesti ou transexual em privação
102
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 40

de liberdade a ser chamada pelo seu nome social, de acordo com o seu gênero
(art. 2º); b) o registro de admissão no estabelecimento prisional deverá conter o
nome social da pessoa presa (art. 2º, parágrafo único); c) “às travestis e aos gays
privados de liberdade em unidades prisionais masculinas, considerando a sua
segurança e especial vulnerabilidade, deverão ser oferecidos espaços de vivência
específicos”, sem que isso caracterize aplicação de medida disciplinar (art. 3º);
d) garantia do direito à visita íntima (art. 6º); e) garantia da manutenção de
tratamento hormonal e acompanhamento de saúde específico, se for o caso (art. 7º);
f) mais complexa, previsão de que “as pessoas transexuais masculinas e femininas
devem ser encaminhadas para as unidades prisionais femininas” (art. 4º).
Sobre esse ponto, em 16 de fevereiro de 2018, o Supremo Tribunal Federal, por
decisão monocrática, concedeu habeas corpus de ofício para que o juízo colocasse
os pacientes, ambos transexuais, “em estabelecimento prisional compatível com as
respectivas orientações sexuais” (STF, HC 152.491/ SP, Rel. Min. Roberto Barroso,
j. 16.02.2018), adotando por fundamento a Resolução Conjunta nº. 1/2014, do
Conselho Nacional de Combate à Discriminação, e a Resolução SAP nº. 11/2014,
do Estado de São Paulo.
Na mesma linha, em 19 de março de 2021, concedeu liminar na ADPF 527
“para outorgar às transexuais e travestis com identidade de gênero feminina o direito de
opção por cumprir pena: (i) em estabecimento prisional feminino; ou (ii) em estabelecimento
prisional masculino, porém em área reservada, que garanta a sua segurança”.
Similarmente, e citando os Princípios da Yogyakarta, o STJ concedeu liminar
em habeas corpus determinando a transferência de pessoa travesti para espaço
próprio ou, não havendo, para a ala feminina de unidade prisional de regime
semiaberto (STJ, HC 497.226/RS, Rel. Min. Rogério Schietti Cruz, liminar de
13.03.2019). Nesse caso, porém, a pessoa manifestou posteriormente interesse
em permanecer em cela masculina, levando a Defensoria Pública a desistir do
habeas corpus.
A questão é complexa e é sempre importante averiguar, de fato, qual é
a vontade das pessoas diretamente envolvidas e as condições de recepção na
unidade feminina. Nessa linha, a Resolução nº. 3, de 7 de junho de 2018, do
Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária (CNPCP), prevê que
“pessoas privadas de liberdade em situação de maior vulnerabilidade, como LGBT, devem
ter sua orientação sexual ou identidade de gênero respeitadas, sendo encaminhadas a
presídios e celas de acordo com estas ou serem separadas de todos os que possam representar
ameaça a fim de garantir sua integridade” (art. 5º, §1º).
A importante Resolução 348/2020, do Conselho Nacional de Justiça, esta­
beleceu diretrizes e procedimentos a serem observados pelo Poder Judiciário “com
103
Art. 41 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

relação ao tratamento da população lésbica, gay, bissexual, transexual, travesti


ou intersexo que seja custodiada, acusada, ré, condenada, privada de liberdade,
em cumprimento de alternativas penais ou monitorada eletronicamente” (art. 1º).
A Resolução reconhece o direito à autodeterminação de gênero e sexualidade da
população LGBTI e veda qualquer forma de discriminação, inclusive prevendo
a inserção da informação quanto à autodeclaração da pessoa nos sistemas
informativos do Poder Judiciário. Há, ainda, garantia do direito ao uso do nome
social (art. 6º), mesmo que distinto do nome constante do registro civil. Prevê
também a garantia de direitos relacionados à saúde, trabalho, educação, ao
vestuário, à assistência religiosa e às visitas (art. 11).
Com relação ao local de prisão, a Resolução 348 prevê que será determinado
por decisão judicial fundamentada após ouvir a pessoa presa (art. 7º e 8º).

40.7 A questão de gênero na jurisprudência internacional de direitos


humanos em matéria penitenciária

No Caso do Presídio Miguel Castro (1992), em que 41 internos faleceram, sendo


três mulheres grávidas, a Corte Interamericana de Direitos Humanos aplicou,
pela primeira vez, a Convenção de Belém do Pará (Convenção Interamericana
para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher), reconhecendo a
imprescindibilidade de uma análise de gênero porque a violência estatal afeta de
maneira diferente as mulheres16.

Art. 41  Constituem direitos do preso:


I - alimentação suficiente e vestuário;
II - atribuição de trabalho e sua remuneração;
III - Previdência Social;
IV - constituição de pecúlio;
V - proporcionalidade na distribuição do tempo para o trabalho, o des­
canso e a recreação;
VI - exercício das atividades profissionais, intelectuais, artísticas e des­
portivas anteriores, desde que compatíveis com a execução da pena;

16
PAIVA, Caio; HEEMANN, Thimotie. Jurisprudência Internacional de Direitos Humanos. 2. ed. Belo
Horizonte: Editora CEI, 2017, p. 348-349.

104
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 41

VII - assistência material, à saúde, jurídica, educacional, social e religiosa;


VIII - proteção contra qualquer forma de sensacionalismo;
IX - entrevista pessoal e reservada com o advogado;
X - visita do cônjuge, da companheira, de parentes e amigos em dias
determinados;
I - chamamento nominal;
II - igualdade de tratamento salvo quanto às exigências da individualização
da pena;
III - audiência especial com o diretor do estabelecimento;
IV - representação e petição a qualquer autoridade, em defesa de direito;
V - contato com o mundo exterior por meio de correspondência escrita,
da leitura e de outros meios de informação que não comprometam a
moral e os bons costumes.
VI – atestado de pena a cumprir, emitido anualmente, sob pena da
responsabilidade da autoridade judiciária competente. (Incluído pela
Lei nº 10.713, de 2003)
Parágrafo único. Os direitos previstos nos incisos V, X e XV poderão
ser suspensos ou restringidos mediante ato motivado do diretor do
estabelecimento.

41.1 Natureza do rol de direitos atingidos pela sentença condenatória

Não se pode falar do art. 41 da LEP como um “rol taxativo”, e isso por
conta do próprio art. 3º da LEP e art. 38 do CP que garantem todos os direitos não
atingidos pela sentença condenatória e a tutela de sua integridade física e moral.
Os referidos dispositivos constituem o parâmetro para a interpretação, no caso
concreto, da possibilidade de suspensão ou restrição de direitos por parte do
diretor, permitida pelo art. 41, parágrafo único, LEP.

41.2 Possibilidade de suspensão de direitos do preso

A possibilidade de suspensão de direitos prevista pelo art. 41, parágrafo


único, da LEP, é ato administrativo que implica consequências graves e deve,
portanto, ser reduzida a termo, não podendo se aceitar a forma meramente oral
sob pena de subtrair o ato administrativo a qualquer possibilidade de controle,
seja pela via administrativa ou judicial.

105
Art. 41 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

O referido dispositivo trata especificamente da “proporcionalidade na


distribuição do tempo para o trabalho, o descanso e a recreação”, da “visita do
cônjuge, da companheira, de parentes e amigos em dias determinados” e do
“contato com o mundo exterior por meio de correspondência escrita, da leitura
e de outros meios de informação que não comprometam a moral e os bons
costumes”. A contrario sensu, portanto, apenas os incisos citados podem ser objeto
de restrição ou suspensão, e não os demais. E mesmo a restrição destes deve
atentar a parâmetros de proporcionalidade e às reflexões e decisões oriundas dos
sistemas de proteção dos direitos humanos, notadamente no âmbito da Comissão
e da Corte Interamericana.
Após alteração promovida pela Lei 13.964/2019, também a lei que
regulamenta o Sistema Penitenciário Federal passou a prever que “os diretores dos
estabelecimentos penais federais de segurança máxima ou o Diretor do Sistema
Penitenciário Federal poderão suspender e restringir o direito de visitas previsto
no inciso II do § 1º deste artigo por meio de ato fundamentado” (art. 3º, § 4º, II,
Lei 11.671/2008).

41.3 Direito do inciso I - alimentação suficiente e vestuário

Pode haver discussão sobre o alcance de “suficiente”, ou seja, qual seria


o número mínimo de refeições diárias que devem ser servidas ao preso, ou ao
menos parâmetros nutricionais mínimos que devem ser atendidos. A Resolução n.
3/2017 do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária fala em 5 (cinco)
refeições diárias, a partir de parâmetros da Política Nacional de Alimentação e
Nutrição (PNAN) e da Política Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional
(PNSAN). Não se trata, porém, de prática comum em todo o país. Importante
observar que é objeto da referida Resolução e da discussão também a alimentação
fornecida aos trabalhadores do sistema prisional, tendo em vista que em regra
são as mesmas empresas e contratos a fornecerem comida tanto à população
carcerária como ao corpo de funcionários do presídio.
São recorrentes as reclamações, por parte da população carcerária e dos
próprios funcionários, quanto à baixa qualidade da alimentação. É fundamental
que se faça prova e o registro escrito da ocorrência. Quando há contratação de
empresa para fornecimento da alimentação, deve-se observar rigorosamente as
regras legais e as disposições contratuais que regulam as infrações e casos de
inexecução total ou parcial. A entrega de “marmitas” estragadas, por exemplo,
deve ser objeto de registro pelo fiscal do contrato – que muitas vezes é o diretor da
106
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 41

unidade – e notificação do fornecedor, o que pode gerar consequências jurídicas


graves, conforme o art. 87 da Lei 8.666/1993.
Quanto ao vestuário, deve ser permitida a entrega de roupas por familiares
ou quem os represente, além das vestimentas produzidas e entregues pelo Estado.
A Resolução Conjunta nº. 1/2014, do Conselho Nacional de Política Criminal e
Penitenciária (CNPCP) e do Conselho Nacional de Combate à Discriminação
(CNCD), já citada acima, também traz disposições que facultam o uso de roupas
femininas ou masculinas à pessoa travesti ou transexual em situação de privação
de liberdade.

41.4 Direito do inciso II - atribuição de trabalho e sua remuneração

Além de dever, a atribuição de trabalho e também direito, sobretudo porque


fato gerador do direito à remição de pena.

41.5 Direito do inciso III - Previdência Social

O exercício de atividade remunerada implica na contribuição obrigatória


com a Previdência Social. Caso o preso não trabalhe, é considerado segurado
facultativo, devendo voluntariamente se inscrever e recolher as contribuições
respectivas.
Quanto ao auxílio-reclusão, trata-se de possível benefício destinado
exclusivamente aos dependentes do preso em regime fechado ou semiaberto,
desde que ele seja segurado no momento da prisão e não esteja mais recebendo
salário ou outro benefício do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). Exige-
se, ainda, que o valor do último salário recebido esteja dentro do limite previsto
pela legislação e fixado em ato normativo do INSS. Se a pessoa não estava
trabalhando nem contribuindo voluntariamente no momento da prisão, não fará
jus ao auxílio-reclusão.

41.6 Direito do inciso IV - constituição de pecúlio

No âmbito previdenciário, o pecúlio era um benefício, extinto pela Lei


8.870/94, definido como devolução em cota única das contribuições efetuadas
para o INSS pelo cidadão que permaneceu em atividade após ter se aposentado.
Na execução penal, o termo nomina os recursos recebidos pelo preso a título
de remuneração, os quais devem ser depositados em caderneta de poupança e
107
Art. 41 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

liberados após a colocação em liberdade, seguindo o art. 29, §2º, da LEP. O preso
em livramento condicional faz jus à liberação do pecúlio.
Admite-se, excepcionalmente, a liberação antecipada do pecúlio, se
demonstrada a urgência e a necessidade, o que abrange, por exemplo, despesas
com saúde e alimentação de dependentes.

41.7 Direito do inciso V - proporcionalidade na distribuição do tempo para o


trabalho, o descanso e a recreação

Previsão aberta que permite ao diretor do estabelecimento organizar a forma


mais conveniente de liberação de galerias para atividades de trabalho, descanso
e lazer, incluindo o chamado “banho de sol”. A falta de portas automatizadas e o
baixo número de agentes penitenciários, muitas vezes, prejudicam diretamente o
adimplemento desses direitos, pois não há como proceder à movimentação de um
setor para outro. De todo modo, mesmo não havendo previsão legal de um mínimo
de horas diárias para o “pátio de sol”, a LEP traz sim alguns parâmetros mínimos.
Por exemplo, prevê que mesmo o preso em Regime Disciplinar Diferenciado tem
direito a duas horas diárias de banho de sol (art. 52, IV, LEP). Por coerência e
proporcionalidade, esse parece ser um piso mínimo de garantia diário de “pátio
de sol” a toda a população carcerária que não se encontra submetida a um regime
disciplinar severo como o RDD.
O cumprimento de sanção disciplinar de isolamento e a inclusão em galeria
destinada à segurança pessoal não constituem fundamento idôneo para a ausência
de “banho de sol”. É pena cruel e desproporcional a manutenção da pessoa presa
“na tranca”, em sua cela, sem contato com a luz solar, por períodos de isolamento
que podem durar até 30 (trinta) dias. Nesse sentido, o STF concedeu ordem de
habeas corpus no HC 172.136/SP, com extensão dos efeitos a todo o território
nacional. nos seguintes termos: “(...) defiro o pedido de medida liminar, para
determinar à Administração da Penitenciária “Tacyan Menezes de Lucena”, em
Martinópolis/SP, que adote providências que permitam assegurar, de modo
efetivo, aos presos (tanto os condenados quanto os provisórios) recolhidos nos
pavilhões de medida preventiva de segurança pessoal (“Pavilhão de Seguro”)
e disciplinar (“Pavilhão Disciplinar”) o direito à saída da cela pelo período
mínimo de 02 (duas) horas diárias para banho de sol. Estendeu, finalmente, de
ofício, nos mesmos termos e observados os mesmos limites ora delineados neste
acórdão, o benefício do banho de sol, por pelo menos 2 (duas) horas diárias, ora
concedido nesta sede processual, a todos os internos que, independentemente
do estabelecimento penitenciário a que se achem recolhidos, estejam expostos,
108
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 41

objetivamente, a situação idêntica ou assemelhada à que motivou a concessão do


presente “writ” constitucional, nos termos do voto do Relator.” (STF, HC 172.136/
SP, Rel. Min. Celso de Mello, j. 10.10.2020).

41.8 Direito do inciso VI - exercício das atividades profissionais, intelectuais,


artísticas e desportivas anteriores, desde que compatíveis com a
execução da pena

Atividades até então praticadas pelo preso, se compatíveis com a situação


de privação de liberdade, devem ser viabilizadas e estimuladas, o que se adequa
ao anseio de individualização da execução.

41.9 Direito do inciso VII - assistência material, à saúde, jurídica, educacional,


social e religiosa

Vide comentários aos artigos 10 a 24 da LEP.

41.10 Direito do inciso VIII - proteção contra qualquer forma de


sensacionalismo

O direito à honra tem base constitucional (art. 5º, X, CF) e não é diretamente
atingido pela privação de liberdade, tanto no caso de condenados como de presos
provisórios. É ilegal e causa de danos morais, nesse sentido, a prática recorrente
de exploração midiática e abusiva, não autorizada, da imagem de pessoas sob
custódia do Estado em programas de televisão, jornais ou redes sociais.
Situação distinta, ressalva-se, é aquela referente à divulgação de imagens de
pessoas foragidas e procuradas pelos órgãos de segurança.
Em ação civil pública movida pela Defensoria Pública do Estado de Minas
Gerais (numeração única: 1088188-85.2018.8.13.0000/TJMG), o Tribunal de Jus­
tiça estadual concedeu liminar, em 2018, exigindo fundamentação por escrito
e individual para cada preso provisório que fosse apresentado, pela Polícia
Civil, a meio de comunicação. A decisão visou, em seus termos, “assegurar que
a divulgação da imagem e voz dos presos seja realizada de forma excepcional,
cautelosa e motivada quando o caso concreto demandar a divulgação para
melhor administração da justiça, a potencialização dos recursos da investigação, a
obtenção de novas denúncias, a participação da sociedade na apuração do delito,

109
Art. 41 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

a manutenção da ordem pública ou outro ganho objetivo e concreto”. O Tribunal


fixou multa diária no valor de R$ 10 mil por preso apresentado à mídia fora dos
termos da decisão.

41.11 Direito do inciso IX - entrevista pessoal e reservada com o advogado

É direito de qualquer pessoa sob custódia do Estado ter contato, de forma


reservada, com seu advogado. Trata-se também de direito do advogado insculpido
no art. 7º, III, da Lei 8.906/94: “comunicar-se com seus clientes, pessoal e reservadamente,
mesmo sem procuração, quando estes se acharem presos, detidos ou recolhidos em
estabelecimentos civis ou militares, ainda que considerados incomunicáveis”. É ilegal
proibir o contato entre a pessoa sob custódia e seu advogado quando sob guarda
da polícia militar ou guarda municipal, sob o argumento de que o contato só seria
possível após a sua “entrega” à polícia judiciária.

41.12 Direito do inciso X - visita do cônjuge, da companheira, de parentes e


amigos em dias determinados

A possibilidade de manutenção do contato, no mínimo, com os familiares,


é imprescindível a qualquer projeto de suposta reintegração social, sob pena
de estímulo ao rompimento dos vínculos e consolidação do processo de desso­
cialização inerente ao cárcere, o que logicamente inviabiliza o retorno ao convívio
social e a assistência ao egresso.
Segundo a Comissão Interamericana de Direitos Humanos, o direito de
visita é requisito fundamental para assegurar o respeito à integridade (Informe
de fondo 38/96, Caso 10.506). A jurisprudência da Corte Interamericana de Direitos
Humanos, na mesma linha, afirma que restrições indevidas ao direito de visitas
tornam a pena incompatível com a exigência de tratamento digno (por exemplo:
Caso López y otros vs. Argentina, Sentença de 25.11.2019; Caso García Asto y Ramírez
Rojas vs. Peru, Sentença de 25.11.2005; Caso Lori Berenson Mejía vs. Peru, Sentença
de 25.11.2004; Caso Tibi vs. Equador, Sentença de 7.11.2004).
Segundo a Corte Interamericana de Direitos Humanos, no Caso López y
otros vs. Argentina, em decisão de 2019, os artigos da Convenção Americana de
Direitos Humanos violados em casos de restrições indevidas ao direito de visita
são o art. 5º (direito à integridade pessoal), especialmente os itens 5.3 e 5.6; o
art. 11.2 (proteção da honra e da dignidade) e art. 17.1 (proteção da família).
110
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 41

A Corte já havia afirmado, no Caso Norín Catrimán y otros vs Chile, com Sentença
em 29.05.2014, que a separação injustificada de pessoas privadas de liberdade e
suas famílias viola o art. 17.1 da Convenção.
A jurisprudência da Corte Europeia de Direitos Humanos vai no mesmo
sentido: no Caso Laduna vs. Eslovaquia, Sentença de 13.12.2011, restrições ao direito
de visita na prisão foram consideradas violação do direito ao respeito pela vida
privada e familiar e à proibição de discriminação (art. 8º e 14º da Convenção
Europeia de Direitos Humanos).
Não há vedação para que a visita seja realizada na modalidade virtual, por
meio de computadores preparados para esse fim (web-visitas), ou convertida em
ligação telefônica, modalidade que foi impulsionada, de modo dramático, pela
pandemia do novo Coronavírus nos anos de 2020 e 2021. Deve ser garantida,
porém, a privacidade da pessoa presa no contato com seu familiar, sendo ilegal
a permanência de funcionário no transcorrer da web-visita.
A lei autoriza a hipótese expressamente somente para o RDD e quando o
preso não recebeu visita social por 6 (seis) meses (art. 52, § 7º, LEP), mas violaria
o princípio da proporcionalidade abrir tal possibilidade ao RDD, onde o rigor é
maior, e negá-la a todos os demais que não se encontram sob regime disciplinar
diferenciado. Há especial relevância na viabilização de visitas virtuais onde a
frequência de visitantes é mais baixa, por exemplo nas unidades femininas ou
estabelecimentos prisionais em localidades de difícil acesso.
As visitas de crianças são permitidas, com o escopo de proteção e manutenção
do vínculo afetivo com o pai, mãe ou irmãos presos. Nesse sentido, inclusive, o art.
19, §4º do Estatuto da Criança e do Adolescente, alterado pela Lei 12.962, de 8 de
abril de 2014, dispondo que: “será garantida a convivência da criança e do adolescente
com a mãe ou o pai privado de liberdade, por meio de visitas periódicas promovidas pelo
responsável ou, nas hipóteses de acolhimento institucional, pela entidade responsável,
independentemente de autorização judicial”. Vale observar, ainda, que “a condenação
criminal do pai ou da mãe não implicará a destituição do poder familiar, exceto na hipótese
de condenação por crime doloso, sujeito à pena de reclusão, contra o próprio filho ou filha”
(art. 23, §2º, ECA).
De acordo com a posição majoritária, o meio correto para garantia do direito
de visita é o mandado de segurança, alegando-se que “o habeas corpus não é o meio
adequado para buscar-se o reconhecimento do direito a visitas íntimas” (STF, HC 138.286,
Rel. Min. Marco Aurélio, j. 05/12/2017), e sim o mandado de segurança.
Em importante decisão, porém, reconheceu o STF o cabimento de Habeas
Corpus para garantir o direito de visita dos filhos e enteados de preso, não sendo

111
Art. 41 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

fundamento válido para sua denegação a alegação de falta de estrutura e condições


do local (STF, HC 107.701/RS, Rel. Min. Gilmar Mendes, j. 13/09/2011).
O fato de a pessoa visitante cumprir pena em regime aberto não constitui
fundamento idôneo para negar o direito de visita: “É certo que o direito do preso à
visitação não é absoluto, podendo ser negado em virtude de peculiaridades do caso
concreto. Não é menos certo, por outro lado, que o direito de visita tem objetivo
de ressocialização do condenado, não podendo ser negado sob o fundamento
de a visitante estar também cumprindo pena em regime aberto já que os efeitos
da sentença penal condenatória não podem restringir o gozo de outros direitos
individuais” (STJ, AgRG no AREsp 1.227.471/DF, Rel. Min. Maria Thereza Rocha
Assis Moura, j. 15.03.2018). Há diversos outros precedentes no mesmo sentido
(STJ, AgRg no REsp 1.487.212/DF, Rel. Min. Reynaldo Fonseca, j. 15.03.2015; AgRg
no REsp 1.475.961/DF; AgRg no REsp 1.556.908/DF). Logo, visitante que responde
processo também não pode ser impedido, por este motivo, de visitar pessoa presa.
O artigo 41, parágrafo único, que permite a suspensão das visitas por
razões de segurança, não é aplicável como fundamento legal para suspensão
das credenciais de visitantes. Isso porque a regra abrange somente a conduta
dos presos, e não de seus visitantes. A suspensão da “carteirinha” de visitante
é juridicamente possível, mas se trata de exercício do poder sancionatório da
Administração Pública que deve ser regulamentado dentro dos limites legais e
constitucionais, com a observância do direito ao contraditório.
A Resolução 348/2020, do Conselho Nacional de Justiça, garante a observância
do direito de visita à população LGBTI em espaço apropriado, com respeito à
integridade e à privacidade, sendo vedada qualquer forma de discriminação
(art. 11, V).

41.13 Visita íntima ou conjugal

Embora sem previsão legal expressa, a visita íntima ou conjugal é prática


amplamente admitida e encontra respaldo normativo, no Brasil, na definição legal
do direito de visita e na regulamentação estabelecida pela Resolução nº. 4, de
29 de junho de 2011, do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária.
Recomenda-se que ela ocorra ao menos uma vez por mês e, a rigor, não se deve
exigir, como por vezes ocorre, que haja vínculo matrimonial ou comprovação
formal de união estável. Afinal, permite-se a visita de “cônjuge ou outro parceiro
ou parceira” desde que haja o devido cadastramento, não cabendo à autoridade
administrativa esse tipo de intromissão nas relações privadas de qualquer pessoa.

112
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 41

A restrição estabelecida pelo art. 8º da Resolução do CNPCP diz respeito ao


número de pessoas simultaneamente cadastradas, e não ao tipo de vínculo entre
elas: “A pessoa presa não pode fazer duas indicações concomitantes e só pode nominar
o cônjuge ou novo parceiro ou parceira de sua visita íntima após o cancelamento formal
da indicação anterior”.
De acordo com o item 58.2 das Regras de Mandela, da Organização das
Nações Unidas: “Onde forem permitidas as visitais conjugais, este direito deve ser
garantido sem discriminação, e as mulheres presas exercerão este direito nas mesmas bases
que os homens. Devem ser instaurados procedimentos, e locais devem ser disponibilizados,
de forma a garantir o justo e igualitário acesso, respeitando‑se a segurança e a dignidade”.
Eventual situação em que ambos estejam presos não impede o exercício do
direito de visita, havendo apenas que se proceder à organização administrativa
das respectivas unidades prisionais para a sua viabilização, o que pode se dar
fora dos horários regulares de visitação por razões de segurança.
Destaca-se ainda a regra de que a proibição ou suspensão da visita íntima,
como sanção disciplinar, só pode ocorrer quando a falta estiver diretamente
relacionada a seu exercício (art. 4º, Res. 4/11-CNPCP).
A Resolução 348/2020, do Conselho Nacional de Justiça, garante a
observância do direito de visita íntima à população LGBTI em igualdade de
condições ao restante da população carcerária, inclusive em relação aos cônjuges
ou companheiros que estejam custodiados no mesmo estabelecimento prisional
(art. 11, V, “c”). Sobre o tema, muito importante a leitura do Informe 122/18 da
Corte Interamericana de Direitos Humanos sobre o Caso no Caso Marta Lucía
Álvarez Giraldo vs Colômbia, e desdobramentos. A Corte entendeu, de modo mais
amplo, que o direito à visita íntima de pessoas presas é uma maneira de garantia
do direito ao exercício da sexualidade, o qual não pode ser suprimido de forma
absoluta pela privação de liberdade.
Recentemente, o Departamento Penitenciário Nacional estabeleceu diversas
restrições a visitas íntimas nos presídios federais, por meio da Portaria nº. 718/2017.
Fixou, por exemplo, que o preso que se divorciasse, separasse ou dissolvesse
união estável teria que aguardar 12 (doze) meses para indicar novo cônjuge ou
companheiro, o que foi derrubado, em sede de ação civil pública movida pela
Defensoria Pública da União, por violar o princípio da individualização da
pena, mas posteriormente restabelecido em segunda instância. O alcance das
possibilidades de restrição do direito à visita íntima acabou se tornando objeto
da ADPF nº. 518/DF, a qual teve seu julgamento virtual iniciado com voto do
Relator pela procedência parcial do pedido. O julgamento foi interrompido por
pedido de vista, em março de 2021.
113
Art. 41 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

41.14 Restrições de visita no sistema penitenciário federal e no Regime


Disciplinar Diferenciado

Com as alterações promovidas pela Lei 13.964/2019 no art. 52 da LEP e no


art. 3º da Lei 11.671/2008, foram inseridas restrições legais ao contato físico direto
entre a pessoa presa e os visitantes, alterando a dinâmica da chamada “visita
social” e restringindo a possibilidade de visita íntima no sistema penitenciário
federal e no Regime Disciplinar Diferenciado.
No art. 52, III, da LEP, tratando do regime disciplinar diferenciado (RDD),
estabelece-se periodicidade quinzenal e “instalações equipadas para impedir o
contato físico e a passagem de objetos”, além da gravação por sistema de áudio ou
de áudio e vídeo e a fiscalização por agente penitenciário, se houver autorização
judicial (art. 52, § 6º, LEP). No sistema penitenciário federal, a visita ocorre somente
“por meio virtual ou no parlatório, com o máximo de 2 (duas) pessoas por vez,
além de eventuais crianças, separados por vidro e comunicação por meio de
interfone, com filmagem e gravações” (art. 3º, § 1º, II, Lei 11.671/2008).
Já tramitam no Supremo Tribunal Federal ações de controle de constitu­
cionalidade questionando o RDD (ADI 4.162/DF) e a restrição às visitas íntimas
no sistema penitenciário federal por meio de portaria (ADPF 518/DF). É preciso
avaliar também, com olhar atento às convenções das quais o Brasil é signatário
e às melhores práticas em direito comparado, a patente violação da vedação
constitucional a penas cruéis decorrente da proibição de contato físico direto entre
a pessoa presa e seus familiares.

41.15 Direito do inciso XI - chamamento nominal

O direito a ser chamado pelo nome é desdobramento do dever de respeito


à integridade moral das pessoas presas, abarcando o direito ao nome social nos
casos de pessoas transgênero. Como já colocado, a Resolução Conjunta nº. 1/2014,
do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária (CNPCP) e do Conselho
Nacional de Combate à Discriminação (CNCD) garante o direito da pessoa travesti
ou transexual em privação de liberdade a ser chamada pelo seu nome social, de
acordo com o seu gênero, bem como estabelece que o registro de admissão no
estabelecimento prisional deverá conter o nome social da pessoa presa (art. 2º,
caput e parágrafo único). Na mesma esteira, a Resolução 348/2020, do Conselho
Nacional de Justiça, garante o uso do nome social ainda que distinto daquele
constante do registro civil (art. 6º).

114
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 41

41.16 Direito do inciso XII - igualdade de tratamento salvo quanto às


exigências da individualização da pena

É vedado o tratamento discriminatório, sendo este o sentido do direito à


igualdade de tratamento. O princípio da individualização e da premialidade
produzem alterações significativas na execução, mas a isonomia material deve
ser buscada a partir de parâmetros de proporcionalidade e razoabilidade.

41.17 Direitos dos inciso XIII - audiência especial com o diretor do


estabelecimento – e XIV - representação e petição a qualquer
autoridade, em defesa de direito

O direito de audiência com o diretor do estabelecimento e o direito de petição


podem ser utilizados como forma de estímulo a lideranças positivas, na medida do
possível, sendo mecanismo de controle do próprio diretor em relação a eventuais
problemas nas relações entre os funcionários e a população carcerária.
De outro lado, é uma forma de incrementar o direito à participação, abrindo
canais de diálogo saudáveis, enfraquecendo o ambiente hostil e belicoso em regra
colocado nas prisões. Há experiências significativas, nesse sentido, em países latino
americanos, por meio de projetos, com apoio da Organização das Nações Unidas,
de criação de mesas de representação, mecanismos de eleição de representantes
de galeria ou por meio da criação de Comités de Internos, como na Colômbia, país
com problemas de segurança graves e similares aos do Brasil. Síntese de algumas
das iniciativas possíveis a serem construídas está na Opinião Técnica Consultiva
nº. 05/2013, da UNODC (Escritório das Nações Unidas contra a Droga e o Crime),
dirigida ao Governo do Panamá e disponível na internet17.

41.18 Direito do inciso XV - contato com o mundo exterior por meio de


correspondência escrita, da leitura e de outros meios de informação
que não comprometam a moral e os bons costumes

A lei não veda o contato da pessoa presa com o mundo exterior, mas a
restringe dentro de determinados parâmetros. Trata-se de dispositivo que, com

17
https://www.unodc.org/documents/ropan/TechnicalConsultativeOpinions2013/Opinion_5/
Opinion_Consultiva_005-2013.pdf

115
Art. 41 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

boa vontade e criatividade, guarda grande potencial para embasar iniciativas


inteligentes de redução do sofrimento e do isolamento no regime fechado;
combatendo, inclusive, a grande margem de lucro ligada à venda clandestina de
celulares nos presídios. Afinal, não comprometendo “a moral e os bons costumes”,
podem ser empregados formas de comunicação monitoradas por meio de telefones
públicos em unidades de regime fechado, por meio de acesso à internet de modo
devidamente regulamentado e organizado, etc. Não parece haver cabimento, salvo
em situações excepcionais, a restrição do acesso a jornais ou à televisão.
O problema principal reside na ampla possibilidade de restrição ou sus­
pensão deste direito no parágrafo único do art. 41. A disposição genérica da LEP
necessita de regulamentação, mediante lei ou resolução que estabeleça, ao menos,
critérios gerais consistentes. Afinal, está-se tratando de uma restrição a direitos
fundamentais com guarida constitucional (art. 5º, XI e XII, CF). O que já se tem são
as Regras Mínimas para Tratamento de Presos editadas pela ONU (atualmente
Regras de Mandela) e reproduzidas pela Resolução nº. 14, de 1994, do Conselho
Nacional de Política Criminal e Penitenciária, e que permitem a comunicação
telefônica, sob vigilância e se autorizada pelo diretor do estabelecimento.

41.19 Restrição à interceptação e análise da correspondência da pessoa presa

Quanto às cartas, o ponto controverso é que o texto legal faculta a suspensão


ou restrição do direito de correspondência, mas não se refere à possibilidade da
interceptação e verificação de seu conteúdo, às vezes até com o carimbo “censura”.
A Lei 13.964/2019 inseriu autorização legal expressa, mas somente para
a “fiscalização do conteúdo da correspondência” das pessoas presas em RDD
(regime disciplinar diferenciado), no art. 52, VI, da LEP. Ganha força, portanto,
o argumento de que não há autorização para os demais casos. Outro, porém, é o
entendimento que tem prevalecido na prática cotidiana, já corroborado pelo STF
em 1994 (STF, HC 70814/SP, Rel. Min. Celso de Mello, j. 01/03/1994), o qual, de
todo modo, ressaltou seu caráter “excepcional”.
Em novembro de 2019, ocorreu situação curiosa e de duvidosa legalidade e
constitucionalidade, a qual não deve ser deixada ao esquecimento. O Congresso
Nacional aprovou Projeto de Lei 6.588/2006 (Câmara dos Deputados) inserindo os
parágrafos §§2º e 3º no art. 41 da LEP, os quais trouxeram restrições à interceptação
e análise de correspondência de presos e exigindo os mesmos requisitos das
interceptações telefônicas.

116
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 41

Assim dispõe o texto aprovado:

“§ 2º A correspondência de presos condenados ou provisórios, a ser reme­


tida ou recebida, poderá ser interceptada e analisada para fins de investi­­
gação criminal ou de instrução processual penal, e seu conteúdo será
mantido sob sigilo, sob pena de responsabilização penal nos termos do
art. 10, parte final, da Lei nº 9.296, de 24 de julho de 1996.
§ 3º A interceptação e análise da correspondência deverá ser fundada nos
requisitos previstos pelo art. 2º da Lei nº 9.296, de 24 de julho de 1996, e
comunicada imediatamente ao órgão competente do Poder Judiciário, com
as respectivas justificativas”.

O projeto de lei foi sancionado e convertido na Lei 13.913, de 25 de novembro


de 2019, conforme publicação na Edição 228, Seção 11, p. 2, de 26 de novembro,
do Diário Oficial da União. No mesmo dia, porém, foi publicada edição extra do
Diário Oficial da União com a Mensagem n. 616, contendo veto integral ao Projeto
por ofensa ao interesse público.
Trata-se de retratação do ato de sanção, ainda que tenha ocorrido no mesmo
dia. Ocorre que o ato de sanção é irretratável, como é incontroverso. Entendemos
que o veto, no caso, é ato inconstitucional e nulo, devendo as regras acima trans­cri­
tas passarem a valer com força de lei, embora tenha sido mantido pelo Congresso.

41.20 A pessoa presa pode ser entrevistada?

Havendo interesse de terceiro ou meio de comunicação em entrevistar


pessoa presa, não há vedação legal à prática, prevalecendo a garantia constitucional
da liberdade de imprensa. Cabe à autoridade administrativa, portanto, apenas as
providências de organização da atividade. A prática é relativamente comum, com
diversos exemplos em televisão, jornais e revistas, tendo assento no julgamento
da ADPF 130/DF pelo Supremo Tribunal Federal, em 30/04/2009, a qual declarou
“não recepcionado pela Constituição de 1988 todo o conjunto de dispositivos da
Lei federal nº 5.250, de 9 de fevereiro de 1967”.
A questão acabou politicamente contaminada e se tornou polêmica no
bojo da Reclamação 32.025/PR e da Suspensão de Liminar 1.178/DF, ambas de
2018, nos quais se discutiu a possibilidade de o ex-Presidente Luiz Inácio Lula da
Silva, então sob custódia, conceder entrevista a meios de comunicação. Ressalta-
se que a decisão liminar negando o direito à entrevista proferida nos autos da
117
Art. 42 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

SL 1.178 trouxe fundamentos peculiares e relativos às eleições presidenciais de


2018, e não ao direito de execução penal. O caso, portanto, serve como parâmetro
para outras situações similares somente para assentar em definitivo que a ADPF
130/DF vale como paradigma para a possibilidade de realização de entrevistas
com pessoas presas.

41.21 Direito do inciso XVI – atestado de pena a cumprir, emitido anualmente,


sob pena da responsabilidade da autoridade judiciária competente

O direito à informação sobre a própria situação processual é corolário do


direito a receber o atestado de pena, com todas as informações sobre a execução
de sua pena. Inobstante o previsto em lei, a periodicidade não deve ser anual,
mas ao menos mensal.

Art. 42  Aplica-se ao preso provisório e ao submetido à medida de


segurança, no que couber, o disposto nesta Seção.

42.1 Deveres e direitos do preso provisório

O preso provisório também tem deveres e direitos, aplicando-se todos os


comentários anteriores, no que couber. Caso infrinja os deveres e cometa falta
disciplinar, receberá somente as sanções administrativas, não podendo incidir
qualquer dos efeitos judiciais ligados ao cometimento de falta grave. Quanto aos
pacientes internados em medida de segurança, deve-se atentar aos direitos das
pessoas portadoras de transtorno mental previstos no art. 2º, parágrafo único,
da Lei 10.216/2001.

Art. 43  É garantida a liberdade de contratar médico de confiança pessoal


do internado ou do submetido a tratamento ambulatorial, por seus
familiares ou dependentes, a fim de orientar e acompanhar o tratamento.
Parágrafo único. As divergências entre o médico oficial e o particular
serão resolvidas pelo Juiz da execução.

118
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 44

43.1 Contratação de médico de confiança pessoal do internado ou do


submetido a tratamento ambulatorial

Embora “receber o maior número de informações a respeito de sua doença e


de seu tratamento” (art. 2º, VII, Lei 10.216/2001) seja direito da pessoa portadora
de transtorno mental, no âmbito da execução de medidas de segurança é comum
que sequer haja diagnóstico, quiçá um efetivo tratamento, com o acompanhamento
médico reduzido à evitação de estados de surto e aos exames de cessação de
periculosidade.
A lei garante, porém, a contratação de médico particular que pode fazer
contraponto ao tratamento oferecido, tanto na internação como no caso de
tratamento ambulatorial. Caso haja divergência, ela será resolvida pelo Juízo da
execução. Seria fantástico, não fossem os internados em medidas de segurança
população quase sempre miserável e abandonada, inclusive por seus familiares,
absolutamente distantes da possibilidade financeira de contratação de um médico
particular de confiança pessoal.
Por isso mesmo, deve haver interpretação extensiva do dispositivo possi­
bilitando sua aplicação a situações de convênio ou cooperação entre a Defensoria
Pública e universidades, com o escopo de acompanhar e prestar auxílio técnico
aos pacientes.

SEÇÃO III
Da Disciplina

SUBSEÇÃO I
Disposições Gerais

Art. 44  A disciplina consiste na colaboração com a ordem, na obediência


às determinações das autoridades e seus agentes e no desempenho do
trabalho.
Parágrafo único. Estão sujeitos à disciplina o condenado à pena privativa
de liberdade ou restritiva de direitos e o preso provisório.

119
Art. 45 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

44.1 Conceito de disciplina

O conceito adotado de disciplina é o de colaboração com a ordem e


obediência. Componente do processo de prisionização, é estritamente relacionado
à obediência e subordinação da pessoa presa às normas regulamentares, as quais
devem ser disponibilizadas – preferencialmente por escrito – e formalmente
comunicadas, nos termos do art. 46 da LEP.
O parágrafo único insere na relação jurídico-penitenciária o preso condenado
à pena privativa de liberdade ou restritiva de direitos e o preso provisório. Estar
sujeito à disciplina significa a possibilidade jurídica de cometimento de faltas,
respondendo administrativamente por elas.
Fica claro da redação do artigo, portanto, que o poder disciplinar não é apli­
cável aos inimputáveis, ou seja, pacientes em medidas de segurança de internação.

Art. 45  Não haverá falta nem sanção disciplinar sem expressa e anterior
previsão legal ou regulamentar.
§ 1º As sanções não poderão colocar em perigo a integridade física e
moral do condenado.
§ 2º É vedado o emprego de cela escura.
§ 3º São vedadas as sanções coletivas.

45.1 Princípios fundamentais relativos ao sistema disciplinar

A Constituição veda penas cruéis (art. 5º, XLVII, e, CR) e garante aos presos
“respeito à integridade física e moral” (art. 5º, XLIX, CR). Tais parâmetros, somados
ao princípio do non bis in idem, constituem o ponto de partida para o tema das
sanções disciplinares. Ao menos três princípios fundamentais relativos ao sistema
disciplinar podem ser diretamente extraídos deste dispositivo.

45.2 Princípio da legalidade com duas dimensões

Primeiro, do caput, o princípio da legalidade, em duas dimensões: a taxativi­


dade exige a expressa previsão legal ou regulamentar para a tipificação de condutas
como falta disciplinar, o que tem por consequência a exclusão de previsões vagas

120
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 45

ou genéricas e a prevalência da previsão mais específica por sobre a mais genérica,


quando uma mesma conduta puder ser enquadrada simultaneamente como
falta leve, média e grave. É que, em muitos casos, uma mesma conduta pode ser
tranquilamente enquadrada como falta leve, média ou grave. “Desrespeito ao
servidor” é, em geral, falta leve, mas se inserido no amplo conteúdo do art. 50,
VI, da LEP, será falta grave. Segundo a regra hermenêutica proposta, prevaleceria
a tipificação mais específica em detrimento da mais genérica.
Outra consequência importante relacionada ao princípio da taxatividade é a
impossibilidade de interpretações extensivas in malam partem, como por exemplo
a interpretação de que a violação das condições do monitoramento eletrônico
configuraria falta grave sem que haja expressa previsão legal nesse sentido.
Deve-se ainda observar a anterioridade da previsão legal ou regulamentar
quanto à prática da conduta, com a irretroatividade de qualquer modificação que
seja mais severa à pessoa presa.
Considerando que as infrações disciplinares repercutem diretamente na
execução de pena, é problemático, à luz do princípio da reserva legal absoluta,
admitir que disposições regulamentares tipifiquem faltas leves e médias, sendo
recomendável fazê-lo por lei, ainda que estadual, sendo concorrente a competência
para legislar sobre direito penitenciário (art. 24, I, CF).

45.3 Princípio da humanidade

Segundo, dos §§ 1º e 2º, o princípio de humanidade na execução das sanções,


em respeito à vedação constitucional às penas cruéis (art. 5º, XLVII, “e”, CF). Trata-
se da disposição genérica de respeito à integridade física e moral e a vedação
específica da utilização de cela escura.

45.4 Princípio da individualização

Terceiro, do § 3º, a vedação de sanções coletivas tem base no princípio da


individualização executória das sanções disciplinares, sendo incabível abrir
mão da devida instrução e produção de provas em prol da aplicação da sanção
a “todos os presos do cubículo”, da galeria, etc. Não havendo o colacionamento
de provas suficientes, prevalece o favor-rei e a necessidade de absolvição. Assim,
por exemplo: “É ilegal a aplicação de sanção de caráter coletivo, no âmbito da execução
penal, diante de depredação de bem público quando, havendo vários detentos num ambiente,
não for possível precisar de quem seria a responsabilidade pelo ilícito. O princípio da
121
Art. 45 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

culpabilidade irradia-se pela execução penal, quando do reconhecimento da prática de falta


grave, que, à evidência, culmina por impactar o status libertatis do condenado” (STJ, HC
177.293/ SP, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, 6ª T., j. 24/04/2012).
Tese do STJ dispõe que “é necessária a individualização da conduta para
reconhecimento de falta grave praticada pelo apenado em autoria coletiva, não se
admitindo a sanção coletiva a todos os participantes indistintamente” (STJ, AgRg
no HC 557417/SP, 5ª T., j. 10/03/2020).
Na mesma linha, “a imposição da falta grave ao executado em razão de
conduta praticada por terceiro, quando não comprovada a autoria do reeducando,
viola o princípio constitucional da intranscendência (art. 5º, XLV, da Constituição
Federal)” (STJ, AgRg no HC 510838/MG, 6ª T., j. 20/08/2019).
Também viola o princípio da individualização e constitui sanção coletiva
eventual aplicação de falta leve ou média a todos os “outros” presos em uma
cela ou galeria por “participação” ou “contribuição” no ocultamento de objeto
proibido que foi apreendido.
Coerente e necessário seria maior esforço teórico para a construção de cate­
gorias consistentes no âmbito da delimitação das infrações disciplinares e suas
respectivas sanções. Nessa esteira propõe ROIG uma “teoria do tipo disciplinar”18,
a qual enfrentaria questões como: (a) a exigência de lesividade da conduta e
a impossibilidade de se caracterizar a “ordem disciplinar” como bem jurídico
genericamente aplicado; (b) a restrição das faltas àquelas dolosas, inexistindo
imprudência neste âmbito – salvo no caso de crime culposo; (c) a busca de um
conteúdo material para a suposta “conflitividade penitenciária” (reconhecendo as
funções sistemática e conglobante), não sendo suficiente, para caracterização da
falta, a adequação meramente formal da conduta; (d) a aplicação de determinados
dispositivos do Código Penal e outras categorias fundamentais da teoria do
delito ao âmbito penitenciário, tais como a participação de menor importância e
a cooperação dolosamente distinta (atual art. 29, §§ 1º e 2º do CP) – destacando
ROIG que no Rio de Janeiro já existe tal previsão: “Se a participação for de menor
importância ou se o coautor quis participar de falta menos grave, pode sofrer o partícipe
sanção de falta média para participação em falta grave ou de falta leve para participação em
falta média” (art. 58, parágrafo único, Decreto Estadual 8897/96- RJ, Regulamento
do Sistema Penal do Estado do Rio de Janeiro); (e) e por fim, a consideração
dos casos de erro de direito – ignorância ou equivocada compreensão da norma
disciplinar – por parte do preso.

18
ROIG, Rodrigo Duque Estrada. “Ensaio sobre uma execução penal mais racional e redutora de danos”.
Revista da Faculdade de Direito da UERJ, v. 1, n. 18, Rio de Janeiro: 2010.

122
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 46

45.5 Cumulação de sanção disciplinar e regressão de regime

Permanece em aberto a questão se a cumulação de sanção disciplinar e


regressão de regime configura bis in idem. Prevalece o entendimento de que a
cumulação decorre da própria lei e que as consequências são autônomas, não
havendo bis in idem (STJ, AgRg no REsp 939.682/RS, Rel. Min. Jane Silva, j.
29.11.2007). Mas a posição contrária é mais acertada, devendo a sanção disciplinar
ser absorvida pela regressão cautelar e posterior decisão definitiva de regressão
ou então, quando já aplicada sanção disciplinar pela autoridade penitenciária,
ficar impedida a regressão sob pena de induvidosa e injusta duplicidade.

Art. 46  O condenado ou denunciado, no início da execução da pena ou


da prisão, será cientificado das normas disciplinares.

46.1 Consciência do ilícito no sistema disciplinar e forma escrita dos atos


administrativos

A obrigatoriedade de comunicação das normas disciplinares já no início da


execução da pena ou prisão é regra raramente cumprida, mas que chama a atenção
para a relevância de os atos administrativos que restringem direitos serem na
forma escrita, possibilitando esse tipo de controle, entre outros.
É fundamental que os objetos cuja posse na cela é proibida sejam listados
em ato específico, havendo enormes variações, pelo País afora, quanto a tabaco,
baralho e outros jogos, aparelhos eletrônicos, etc.
São frequentes as diferenças de interpretação e tolerância em relação a
determinados comportamentos entre unidades prisionais de um mesmo Estado,
quiçá entre Estados diversos. Havendo transferência da pessoa presa de um local
a outro, é fundamental a sua cientificação formal, sob pena de se poder alegar,
com razão, em eventual imputação de falta disciplinar, o desconhecimento do
ilícito, em analogia à previsão legal do erro de proibição (art. 21, CP). Destaca-se
decisão do TJMG que considerou em erro de proibição o recluso que detinha celular,
encontrando-se, porém, em uma APAC na qual se havia permitido o uso de celular
por parte dos condenados (TJMG, RA 1.0000.09.505735-2/000 Três Corações, Rel.
Des. Ediwal José de Morais, j. 9/3/2010).

123
Art. 47 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

Trata-se das Regras 54 e 55 das Regras de Mandela, abrangendo inclusive a


necessidade de tradução, no caso de preso estrangeiro, a adaptação às necessidades
de presos com deficiências sensoriais e a informação verbal aos presos que forem
analfabetos.

Art. 47  O poder disciplinar, na execução da pena privativa de liberdade,


será exercido pela autoridade administrativa conforme as disposições
regulamentares.

47.1 Natureza jurídico-administrativa dos atos da autoridade penitenciária

O poder disciplinar é exercido pela autoridade administrativo, sendo, no


caso, forma de exercício do poder sancionatório e obedecendo à teoria do ato
administrativo. Isso significa, de um lado, que todos os seus elementos devem
estar devidamente presentes e verificados, sob pena de nulidade; e de outro,
que é sempre possível seu controle judicial. Negar tal natureza jurídica ao poder
disciplinar penitenciário é assumi-lo como puro arbítrio e destituído de qualquer
amarra na legalidade.

Art. 48  Na execução das penas restritivas de direitos, o poder disciplinar


será exercido pela autoridade administrativa a que estiver sujeito o
condenado.
Parágrafo único. Nas faltas graves, a autoridade representará ao Juiz da
execução para os fins dos artigos 118, inciso I, 125, 127, 181, 1º, letra d,
e 2º desta Lei.

48.1 Poder disciplinar nas penas restritivas de direito

Vide comentários ao artigo anterior. Cada modalidade de pena restritiva de


direitos comporta uma forma de fiscalização e uma autoridade administrativa
competente. Diferentemente da abrangência e complexidade do exercício do poder
disciplinar nas penas privativas de liberdade, aqui se trata de mera fiscalização.

124
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 49

SUBSEÇÃO II
Das Faltas Disciplinares

Art. 49  As faltas disciplinares classificam-se em leves, médias e graves.


A legislação local especificará as leves e médias, bem assim as respectivas
sanções.
Parágrafo único. Pune-se a tentativa com a sanção correspondente à
falta consumada.

49.1 Classificação das faltas disciplinares

Apenas as faltas graves têm repercussão direta na dimensão judicial da


execução da pena, mas também existem as faltas leves e médias, de importância
muito grande para manutenção da ordem interna, do ponto de vista da autoridade
administrativa, pois também dão ensejo à aplicação de sanções disciplinares.

49.2 Faltas leves e médias e princípio da legalidade

Como já afirmado, é problemático, à luz do princípio da reserva legal


absoluta, admitir que disposições regulamentares tipifiquem faltas leves e médias,
sendo recomendável fazê-lo por lei, ainda que estadual, sendo concorrente a
competência para legislar sobre direito penitenciário (art. 24, I, CF). O art. 49
fala expressamente, ainda, em “legislação local”, excluindo atos normativos
infralegais. No âmbito do Sistema Penitenciário Federal, as faltas leves e médias
estão elencadas no Decreto nº. 6.049, de 27 de fevereiro de 2007. Em nenhum caso
se poderá inovar, observando-se os limites legais e constitucionais ao definirem
condutas faltosas e ao estabelecerem as respectivas sanções. Os conteúdos dos
incisos do art. 39 da LEP (deveres do condenado), com exceção do II e do V, são
com frequência previstos em legislação local como falta leve ou média.

49.3 Crítica à equiparação entre faltas consumadas e tentadas

É sintomática a previsão legal de indistinção, no que tange à aplicação


da sanção, entre falta tentada e consumada, o que se deve à recepção da teoria
subjetiva da tentativa apenas no tocante à execução penal, pressupondo-se as faltas

125
Art. 50 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

disciplinares como infrações “de mera conduta”. O que se pune é a desobediência.


Porém, observa ROIG19, também aqui de forma correta e pertinente, que há violação
aos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade diante do disposto no
art. 4º da Lei das Contravenções Penais (Dec. Lei 3.688/41), segundo o qual “não
é punível a tentativa de contravenção”. É, de fato, contrário à proporcionalidade que
o trato de uma infração administrativa seja significativamente mais gravoso que
o de uma contravenção penal.

Art. 50  Comete falta grave o condenado à pena privativa de liberdade


que:
- incitar ou participar de movimento para subverter a ordem ou a
disciplina;
- fugir;
- possuir, indevidamente, instrumento capaz de ofender a integridade
física de outrem;
- provocar acidente de trabalho;
- descumprir, no regime aberto, as condições impostas;
- inobservar os deveres previstos nos incisos II e V, do artigo 39, desta Lei.
– tiver em sua posse, utilizar ou fornecer aparelho telefônico, de rádio ou
similar, que permita a comunicação com outros presos ou com o ambiente
externo. (Incluído pela Lei nº 11.466, de 2007)
VIII - recusar submeter-se ao procedimento de identificação do perfil
genético. (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
Parágrafo único. O disposto neste artigo aplica-se, no que couber, ao
preso provisório.

50.1 Considerações gerais sobre as faltas graves

As faltas graves em espécie somam nove hipóteses, oito nesse dispositivo


legal, somadas à nona que é a prática de fato previsto como crime doloso (art. 52,
caput, LEP). Embora taxativo o rol, as hipóteses são caracterizadas pela utilização

19
ROIG, Rodrigo Duque Estrada. “Ensaio sobre uma execução penal mais racional e redutora de danos”.
Revista da Faculdade de Direito da UERJ, v. 1, n. 18, Rio de Janeiro: 2010.

126
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 50

de conceitos indeterminados, sem precisão semântica e que, por isso mesmo,


abrem grande espaço tanto à discricionariedade da autoridade penitenciária como
à jurisprudência, ao analisar a primeira.

50.2 Falta grave do inciso I – incitar ou participar de movimento para


subverter a ordem ou a disciplina

Viola o princípio da proporcionalidade equiparar situações de gravidade


evidentemente desigual. Se o inciso I é aplicável para tipificação da conduta de
liderança, incitação ou participação em motim ou rebelião, é desproporcional e
irrazoável estendê-lo a uma gama enorme de outras situações, tais como gritarias,
algazarras, “bate grade”, cantos, etc., que podem até envolver a contestação da
ordem e da autoridade, mas não significa concretamente uma ameaça ou dano
a ela. Fundamental observar o imperativo de individualização das condutas,
evitando a aplicação de sanções coletivas.

50.3 Falta grave do inciso II – fugir

É recomendável a diferenciação entre fuga – como o ato de sair sem


autorização e clandestinamente do estabelecimento de regime fechado ou
semiaberto – e evasão – como o não retorno após saída autorizada para trabalho
externo, saída temporária ou similar. A lei não faz esta distinção, mas é possível
e adequado guardar maior severidade para o primeiro caso, bem como tratar
com razoabilidade situações análogas ao arrependimento eficaz (art. 15, CP),
como no caso da evasão com retorno espontâneo após o horário designado para
reentrada na unidade.
Nesse sentido, não se pode equiparar, como em regra se faz, a fuga pro­
priamente dita com os casos de tentativa de fuga em estágio inicial (por exemplo,
descobre-se o início de um túnel dentro de uma cela), os quais devem ser conju­
gados à exigência de lesividade da conduta, podendo se afastar, na análise do
caso concreto, a falta grave.
Nos casos em que não há dolo de fuga, mas sim evasão e atraso no retorno
ao regime semiaberto, havendo o retorno espontâneo do apenado, há tanto en­
tendimento que entende caracterizada a falta grave (STJ, HC 37.236/SP, Rel. Min.
José Arnaldo da Fonseca, j. 16/12/2004) como também precedentes em sentido
diverso (STJ, REsp 837977/RS, 5ª T., Rel. Min. Gilson Dipp, DJ 30/10/2006; TJPR,
HC 517468-3, Rel. Des. Marcos Vinicius de Lacerca Costa, j. 28/11/2008; TJSC, AgEx

127
Art. 50 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

132.370, Rel. Torres Marques, j. 17/05/2011), com fulcro na desproporcionalidade


da sanção em relação à falta cometida, posição que muito melhor se coaduna com
a finalidade da execução penal.
O descumprimento das condições da monitoração eletrônica não configura
falta grave por ausência de previsão legal expressa. Porém, há posições divergentes
no STJ quanto à inobservância do perímetro de inclusão rastreado. Há decisões
no sentido de que não configura falta grave (STJ, RESP 1519802/SP, Rel. Min.
Maria Thereza de Assis Moura, 6ª T., j. 10/11/2016) e outras em sentido oposto,
entendendo que há falta grave com enquadramento no inciso VI em conjunto ao
art. 39, V, da LEP (STJ, AgRg no HC 537620/SP, 5ª T., j. 05/12/2019).
O mesmo Tribunal admite que o rompimento do equipamento ou ausência
de bateria pode configurar falta de fuga (STJ, AgRg no REsp 1766006/TO, 6ª T.,
06/12/2018). Uma interpretação minimamente lógica e proporcional desta
assertiva, porém, exigirá que a ausência de bateria se dê por um período longo
e tendencialmente definitivo, não se enquadrando como tal a soma de vários
períodos curtos de tempo sem bateria, o que indica ausência de dolo de fuga.
Caso se considere a violação das condições da monitoração eletrônica como
falta grave, já decidiu o Superior Tribunal de Justiça pela necessidade de proce­
dimento administrativo disciplinar também nesses casos, não suprindo sua falta
a realização de audiência de justificação (STJ, HC 459.330/PR, Rel. Min. Nefi
Cordeiro, j. 17.07.2018).
Em diversas comarcas, constata-se a correta postura de juízos de execução
no sentido de, em casos de fuga e recaptura sem cometimento de novo delito, não
regredir o apenado ao regime fechado, restabelecendo-se o regime semiaberto,
sem prejuízo da homologação da falta grave.

50.4 Falta grave do inciso III – possuir, indevidamente, instrumento capaz de


ofender a integridade física de outrem

Há uma grande variedade de objetos proibidos que podem ser encontrados


com o detento ou em seus pertences. A diferenciação entre os que caracterizarão
falta leve ou média e os que ensejarão falta grave está no potencial lesivo do
instrumento, ou seja, na capacidade de ofensa à integridade física de outrem.
Faz-se necessária, portanto, a mínima produção de provas nesse sentido,
preferencialmente com análise pericial. Não é essa, porém, a posição do STJ, que
afirma ser prescindível a perícia “por falta de previsão legal” (por exemplo, v.
STJ, AgRg no HC 475.585/DF, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, 6ª T., j. 07/11/2019;

128
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 50

HC 476.948/DF, Rel. Min. Felix Fischer, 5ª T., j. 07/02/2019). É realmente difícil


compreender quando a previsão legal é um critério válido e quando não é, na
jurisprudência de execução penal.
O inciso se refere expressamente à ação de possuir, não bastando, portanto,
que o objeto seja encontrado em área comum ou mesmo escondido em uma
cela sem que seja possível identificar o proprietário. Deve sempre haver a
individualização da conduta, vedadas as sanções coletivas.

50.5 Falta grave do inciso IV – provocar acidente de trabalho

A hipótese de falta disciplinar abrange trabalho interno e externo e se refere


exclusivamente ao acidente dolosamente provocado pelo preso.

50.6 Falta grave do inciso V – descumprir, no regime aberto, as condições


impostas

A fiscalização do regime aberto e das condições fixadas (vide artigos 115 e


116 da LEP) continua dentro do sistema disciplinar e pode ensejar a caracterização
de falta grave.

50.7 Falta grave do inciso VI – inobservar os deveres de obediência e


respeito ao servidor com quem o apenado deva se relacionar e o dever
de execução do trabalho e tarefas recebidas (remetendo aos deveres
constantes do art. 39, II e V, da LEP)

Em gravíssima violação ao princípio da legalidade e taxatividade, a LEP


estabelece como falta grave uma espécie de “coringa”, consistente em definir
como falta grave uma violação qualquer ao dever genérico de obediência e de
cumprimento das ordens recebidas. Basta perceber que o inciso é potencialmente
aplicável a qualquer situação para se posicionar pela sua incompatibilidade com
um ordenamento constitucional democrático.
É comum que o inciso seja aplicado a situações de desobediência a agentes
penitenciários ou policiais penais (STJ, AgRg no HC 550207/SP, 5ª T., j. 28/02/2020)
e cresce a tendência de enquadramento aqui da hipótese de inobservância do
perímetro estabelecido na monitoração eletrônica (STJ, AgRg no HC 537620/SP,
5ª T., j. 13/12/2019).

129
Art. 50 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

No caso de desrespeito entre companheiros de cela, a hipótese aplicável é a


do art. 39, III, o qual define como dever do condenado a “urbanidade e respeito no
trato com os demais condenados”, regulando a matéria de forma específica. Ocorre
que o descumprimento do art. 39, III, não está previsto dentre as hipóteses de
falta grave, o que muitas vezes se faz através da interpretação da conduta como
referente ao inciso II do art. 39, e não ao inciso III. Tal postura viola gravemente o
princípio da legalidade, ignorando a exigência de taxatividade, quando toma uma
hipótese mais genérica de dever do condenado, no lugar de outra mais específica,
apenas para o fim de prejudicar o apenado.

50.8 Falta grave do inciso VII – tiver em sua posse, utilizar ou fornecer
aparelho telefônico, de rádio ou similar, que permita a comunicação
com outros presos ou com o ambiente externo

Hipótese incluída pela Lei 11.466, de 28 de março de 2007, com o objetivo de


prevenir comando de ações ilícitas de dentro das unidades prisionais. O primeiro
ponto polêmico diz respeito à incidência do princípio da legalidade e taxatividade.
Contrariamente ao que está escrito na lei, a jurisprudência majoritária equipara
a posse de “componentes essenciais” do celular à posse do próprio aparelho
telefônico, entendendo-se como tais carregadores e chips (STJ, REsp 1.457.292/
RS, Rel. Min. Jorge Mussi, 5ª T., j. 04/11/2014).
Mas atenção: não se inclui nessa interpretação fones de ouvido, microfones
e mesmo cabos USB. Há polêmica nesse ponto. Não se pode concordar senão
com a corrente que aplica o princípio da legalidade estrita: “A conduta praticada
por visitante, ao tentar entrar em estabelecimento prisional com um cabo USB, um fone
de ouvido e um microfone, não pode alcançar a pessoa do preso e configurar falta grave,
porque não são acessórios essenciais ao funcionamento de aparelho de telefonia celular ou
rádio de comunicação e, portanto, não se amoldam à finalidade da norma prevista no art.
50, VII, da Lei 7.210/1984” (STJ, HC 255.569/SP, Rel. Min. Marco Aurélio Belizze,
5ª T., j. 21/03/2013).
Porém, precedentes mais recentes do STJ tem tratado a posse de fones de
ouvido como “conduta formal e materialmente típica, configurando falta de
natureza grave, uma vez que viabiliza a comunicação intra e extramuros” (STJ,
AgRg no HC 419.902/SP, Rel. Min. Felix Fischer, 5ª T., Dje 16/02/2018; AgRg no
HC 522.245/SP, Rel. Min. Laurita Vaz, 6ª T., j. 10/09/2019). Do ponto de vista da
tipicidade, a pergunta é se fones de ouvido, por si só, viabilizam a comunicação,
e é evidente que não. Trata-se de item meramente acessório.
130
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 50

Diversas controvérsias atingem também o princípio da lesividade na


interpretação da falta grave. Parece evidente que a efetiva capacidade de
comunicação é elemento do tipo disciplinar, o que tem por desdobramento lógico
a atipicidade da posse de carregadores ou “chips”, os quais sozinhos não guardam
potencial lesivo, bem como a necessidade de perícia para se comprovar a referida
possibilidade de se comunicar. A práxis, porém, corroborada pela jurisprudência,
é a de não exigir exame pericial (por exemplo, v. STJ, AgRg no HC 506.102/SP,
Rel. Min. Laurita Vaz, 6ª T., j. 05/12/2019) e, mais grave, a menosprezar qualquer
tipo de rigor probatório para individualização da imputação. Com efeito, basta
que um preso “assuma a posse” do objeto proibido para que tudo seja dado como
resolvido, quando todos sabem quão frequente é que se trate de uma afirmação
falsa e ressignificada como mercadoria ou moeda de troca nas interações do
ambiente carcerário20.
Há que se ponderar, ainda a partir do princípio da lesividade, que o obje­
tivo da proibição legal da posse de celular ou rádio é inteiramente voltado à
segurança pública, ou seja, visa evitar que ações ilícitas fora dos estabelecimentos
penais possam ser “comandadas” de dentro deles. Entretanto, a imensa maioria
da população carcerária recorre a aparelhos celulares ou similares apenas e tão-
somente para manter contato com familiares, até porque muitas vezes o direito
de visita é obstaculizado pela distância e por regras administrativas abusivas
para emissão de autorizações de visita. É urgente, nesse sentido, que se dê maior
atenção à análise do caso concreto, tendo em vista a lesividade da conduta.
Em regime semiaberto, no qual muitas vezes há telefone público disponível
e há ampla possibilidade de contato com o exterior da unidade, não há qualquer
sentido em se sancionar da mesma forma a pessoa presa que fizer uso de aparelho
celular. Com efeito, é razoável e proporcional argumentar que o art. 50, VII, da
LEP, aplica-se somente aos presos em regime fechado.
Entendeu o STJ que “a conduta de ingressar em estabelecimento prisional
com chip de celular não se subsume ao tipo penal previsto no art. 349-A do Código
Penal” (STJ, HC 619.776, 5ª T., j. 20/04/2021).

20
Sobre o tema, v. GIAMBERARDINO, André. “Gestão de ilegalismos e o teatro da disciplina:
os casos de falta grave por posse, utilização ou fornecimento de celular em uma unidade
prisional de Curitiba/PR no ano de 2017”. Revista de Estudos Empíricos em Direito, vol. 6, n. 2, 2019,
pp. 58-77).

131
Art. 51 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

50.9 Falta grave do inciso VIII – recusar submeter-se ao procedimento de


identificação do perfil genético.

A Lei 13.964/2019 criou nova hipótese de falta grave, consistente na recusa da


pessoa presa em se submeter ao procedimento de identificação do perfil genético
previsto no art. 9º-A da LEP.
A previsão é inconstitucional porque viola o direito ao silêncio e de não auto
incriminar-se. A questão já estava posta no STF antes da alteração legislativa, com o
reconhecimento de repercussão geral no REXT 973.837/MG e tendo por parâmetros
de controle os art. 1º, III, art. 5º, X, LIV e LXIII, da CF. O tema aguarda julgamento.

50.10 Falta grave e preso provisório

O preso provisório, sem processo executório, pode cometer falta disciplinar,


mas sofrerá somente os efeitos administrativos da sanção (isolamento, suspensão
de visitas, etc). Não pode haver qualquer efeito sobre a futura execução de eventual
condenação, nem mesmo a título de análise do requisito subjetivo.

Art. 51  Comete falta grave o condenado à pena restritiva de direitos que:
- descumprir, injustificadamente, a restrição imposta;
- retardar, injustificadamente, o cumprimento da obrigação imposta;
- inobservar os deveres previstos nos incisos II e V, do artigo 39, desta Lei

51.1 Falta grave na pena restritiva de direitos

O cometimento de falta grave pelo condenado a pena restritiva de direitos


não significa, necessariamente, que ela será convertida em pena privativa de
liberdade. Deve ser analisado o caso concreto. Como se vê da lei, o descumprimento
e o retardo do cumprimento da restrição imposta pela pena restritiva de direitos
devem ser “não justificados”. Logo, é necessária a abertura de contraditório para
apresentação de justificativa.

132
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 52

51.2 Possibilidade de substituição por outra PRD ao invés de efetuar a


conversão em pena privativa de liberdade

Conforme o caso concreto, o juízo pode compreender o descumprimento


como decorrência de um desajuste entre a PRD e as condições pessoais do
condenado, alterando a forma de cumprimento das penas de prestação de serviços
à comunidade e limitação de fim de semana, como prevê o art. 148 da LEP.

51.3 Data-base para progressão de regime

É inaplicável a S. 534/STJ ao caso, pois é a eventual conversão da pena


restritiva de direitos em pena privativa de liberdade que determinará nova data-
base, e não a data da falta. Enquanto se está a cumprir a pena restritiva de direitos,
em liberdade, não está correndo o tempo para progressão de regime.

Art. 52  A prática de fato previsto como crime doloso constitui falta grave
e, quando ocasionar subversão da ordem ou disciplina internas, sujeitará
o preso provisório, ou condenado, nacional ou estrangeiro, sem prejuízo
da sanção penal, ao regime disciplinar diferenciado, com as seguintes
características: (Redação dada pela Lei nº 13.964, de 2019)
I - duração máxima de até 2 (dois) anos, sem prejuízo de repetição da
sanção por nova falta grave de mesma espécie; (Redação dada pela Lei
nº 13.964, de 2019)
II - recolhimento em cela individual; (Redação dada pela Lei nº 13.964,
de 2019)
III - visitas quinzenais, de 2 (duas) pessoas por vez, a serem realizadas
em instalações equipadas para impedir o contato físico e a passagem
de objetos, por pessoa da família ou, no caso de terceiro, autorizado
judicialmente, com duração de 2 (duas) horas; (Redação dada pela Lei
nº 13.964, de 2019)
IV - direito do preso à saída da cela por 2 (duas) horas diárias para
banho de sol, em grupos de até 4 (quatro) presos, desde que não haja
contato com presos do mesmo grupo criminoso; (Redação dada pela Lei
nº 13.964, de 2019)
V - entrevistas sempre monitoradas, exceto aquelas com seu defensor,
em instalações equipadas para impedir o contato físico e a passagem de

133
Art. 52 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

objetos, salvo expressa autorização judicial em contrário; (Incluído pela


Lei nº 13.964, de 2019)
VI - fiscalização do conteúdo da correspondência; (Incluído pela Lei
nº 13.964, de 2019)
VII - participação em audiências judiciais preferencialmente por videocon­
ferência, garantindo-se a participação do defensor no mesmo ambiente
do preso. (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
§ 1º O regime disciplinar diferenciado também será aplicado aos presos
provisórios ou condenados, nacionais ou estrangeiros: (Redação dada
pela Lei nº 13.964, de 2019)
I - que apresentem alto risco para a ordem e a segurança do estabele­
cimento penal ou da sociedade; (Redação dada pela Lei nº 13.964, de
2019)
II - sob os quais recaiam fundadas suspeitas de envolvimento ou
participação, a qualquer título, em organização criminosa, associação
criminosa ou milícia privada, independentemente da prática de falta
grave. (Redação dada pela Lei nº 13.964, de 2019)
§ 2º (Revogado).
§ 3º Existindo indícios de que o preso exerce liderança em organização
criminosa, associação criminosa ou milícia privada, ou que tenha atuação
criminosa em 2 (dois) ou mais Estados da Federação, o regime disciplinar
diferenciado será obrigatoriamente cumprido em estabelecimento
prisional federal. (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
§ 4º Na hipótese dos parágrafos anteriores, o regime disciplinar dife­
renciado poderá ser prorrogado sucessivamente, por períodos de 1
(um) ano, existindo indícios de que o preso: (Incluído pela Lei nº 13.964,
de 2019)
I - continua apresentando alto risco para a ordem e a segurança do
estabelecimento penal de origem ou da sociedade; (Incluído pela Lei nº
13.964, de 2019)
II - mantém os vínculos com organização criminosa, associação crimi­no­
sa ou milícia privada, considerados também o perfil criminal e a função
desempenhada por ele no grupo criminoso, a operação duradoura do
grupo, a superveniência de novos processos criminais e os resultados do
tratamento penitenciário. (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
§ 5º Na hipótese prevista no § 3º deste artigo, o regime disciplinar dife­ren­
ciado deverá contar com alta segurança interna e externa, principalmente
no que diz respeito à necessidade de se evitar contato do preso com
membros de sua organização criminosa, associação criminosa ou milícia
privada, ou de grupos rivais. (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
134
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 52

§ 6º A visita de que trata o inciso III do caput deste artigo será gravada
em sistema de áudio ou de áudio e vídeo e, com autorização judicial,
fiscalizada por agente penitenciário. (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
§ 7º Após os primeiros 6 (seis) meses de regime disciplinar diferenciado,
o preso que não receber a visita de que trata o inciso III do caput deste
artigo poderá, após prévio agendamento, ter contato telefônico, que
será gravado, com uma pessoa da família, 2 (duas) vezes por mês e por
10 (dez) minutos. (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)

52.1 A prática de crime doloso como falta grave

O dispositivo legal tipifica uma nova falta grave – prática de fato previsto
como crime doloso – sem qualquer relação necessária com o Regime Disciplinar
Diferenciado (RDD) e, em seguida, prevê três hipóteses de cabimento do RDD.
Quanto à previsão da prática de crime doloso como falta grave (art. 52,
LEP), há entendimento sumulado do STJ no sentido de não se exigir o trânsito
em julgado “no processo penal instaurado para apuração do fato” (Súmula 526/STJ).
Uma interpretação lógica a contrario sensu da própria Súmula permite se aferir
que, então, ao menos o processo criminal instaurado, ou seja, com recebimento da
denúncia ou queixa, é imprescindível para imputação da falta. O Tribunal firmou
tese segundo a qual a decisão de imposição da falta grave será desconstituída
“diante das hipóteses de arquivamento de inquérito policial ou de posterior
absolvição na esfera penal, por inexistência do fato ou negativa de autoria, tendo
em vista a atipicidade da conduta” (por exemplo, v. STJ, HC 524.396/SP, Rel. Min.
Reynaldo Soares da Fonseca, 5ª T., j. 15/10/2019); HC 462.463RS, Rel. Min. Felix
Fischer, 5ª T., j. 13/12/2018).
Trata-se de hipótese de falta grave que viola o princípio da taxatividade – uma
espécie de “norma disciplinar em branco” – e causa inúmeros problemas de ordem
prática em sua aplicação, sobretudo porque inexiste dispositivo na lei penal ou
processual penal determinando que eventual absolvição ou anulação do processo
de conhecimento (pelo novo delito) sejam comunicados ao juízo de execução,
para a correspondente anulação da falta grave já aplicada. É recomendável que
o juízo de execução, ao analisar a falta, ao menos determine a juntada de certidão
atualizada sobre o estado do respectivo processo de conhecimento.
A questão nunca foi pacífica no Supremo Tribunal Federal. Por algumas
ocasiões, ficou vencido o Ministro Marco Aurélio, sustentando a necessidade de
trânsito em julgado (STF, HC 110.881/MT, 1ª T., Rel. acórdão Min. Rosa Weber,
j. 20.11.2012; STF, EP 16/DF AgReg-Terceiro, Pleno, Rel. Min. Roberto Barroso,
135
Art. 52 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

j. 1.07.2016). O tema teve repercussão geral reconhecida pelo STF no RE nº. 776.823/
RS, julgado em dezembro de 2020, fixando a seguinte tese: “o reconhecimento de
falta grave consistente na prática de fato definido como crime doloso no curso da execução
penal dispensa o trânsito em julgado da condenação criminal no juízo do conhecimento,
desde que a apuração do ilícito disciplinar ocorra com observância do devido processo
legal, do contraditório e da ampla defesa, podendo a instrução em sede executiva ser
suprida por sentença criminal condenatória que verse sobre a materialidade, a autoria e
as circunstâncias do crime correspondente à falta grave”.

52.2 Posse de droga ilícita para uso pessoal e infrações de menor potencial
ofensivo como falta grave

Considerar a posse de droga ilícita para uso pessoal tipificada pelo art. 28
da Lei 11.343/06 (Lei de Drogas) como falta grave viola os princípios da
razoabilidade e da proporcionalidade, de acordo com tese defendida pela De­
fensoria Pública. Embora se trate, tecnicamente, de crime doloso, não se pode
ignorar a peculiaridade de se tratar de um tipo penal ontologicamente menos
grave que qualquer contravenção penal, na medida em que não comina pena
privativa de liberdade. Ocorre que a prática de contravenções penais não configura
falta grave. Como justificar, assim, que a prática de conduta menos grave seja
administrativamente sancionada de modo mais rigoroso?
Embora não seja a posição do STJ (por exemplo: AgRg no HC 547.354/DF, 5ª
T. j. 06/02/2020), o próprio Tribunal, com precisamente o mesmo raciocínio, afastou
a possibilidade de o art. 28 da Lei 11.343/2006 gerar reincidência (por exemplo:
STJ, HC 550.775/SP, Rel. Min. Ribeiro Dantas, j. 06/02/2020) e entendeu como
imprescindível a confecção de laudo toxicológico para comprovar a materialidade
da infração disciplinar e a natureza da substância (STJ, AgRg no HC 547354/DF,
5ª T. j. 06/02/2020; HC 546.287/SP,, 5ª T., j. 17/12/2019).
No mesmo sentido, é descabido e desproporcional servir como falta grave
uma conduta que é tipificada como infração de menor potencial ofensivo e acaba
arquivada em sede de transação penal (art. 76, Lei 9.099/95), sem a produção de
qualquer efeito penal salvo a impossibilidade de nova transação penal no prazo
de cinco anos.

52.3 Regime Disciplinar Diferenciado (RDD)

O Regime Disciplinar Diferenciado (RDD) é modalidade de organização


disciplinar instituída no sistema penitenciário brasileiro pela Lei 10.792, de
136
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 52

1º de dezembro de 2003, a título de sanção ou não, que veio a acolher, em meio à


comoção social causada por grandes rebeliões carcerárias e o recrudescimento da
violência entre algumas organizações criminosas e agências do Estado, medida
já prevista no âmbito do Estado de São Paulo, por meio da Resolução nº. 26/2001.
Com a Lei 10.792/2003 e as alterações significativas promovidas pela Lei
13.964/2019, a Lei de Execução Penal conta com três hipóteses que ensejam a
inclusão do sujeito no RDD: (a) quando a falta grave ocasionar “subversão da
ordem ou disciplina internas” (art. 52, caput, LEP), bastando a prática do ato e
sem que seja preciso aguardar o trânsito em julgado de eventual novo processo
criminal (segundo interpretação da S. 526/STJ); (b) quando o preso, nacional ou
estrangeiro, apresentar “alto risco para a ordem e a segurança do estabelecimento
penal ou da sociedade” (art. 52, § 1º, I, LEP); e (c) quando sobre o preso, nacional
ou estrangeiro, recaírem “fundadas suspeitas de envolvimento ou participação,
a qualquer título, em organização criminosa, associação criminosa ou milícia
privada, independentemente da prática de falta grave” (art. 52, § 1º, II, LEP). Nessa
última hipótese, a menção a preso estrangeiro decorre de alteração promovida
pela Lei 13.964/2019.
As duas últimas situações prescindem até mesmo do cometimento
de falta grave, possibilitando a aplicação do RDD por conta da mera aferição
realizada pela autoridade administrativa sobre a periculosidade criminal e
penitenciária do preso definitivo ou provisório.
As regras de cumprimento do Regime Disciplinar Diferenciado tiveram o
rigor significativamente elevado com as alterações da Lei 13.964/2019. A duração
máxima passou de 360 (trezentos e sessenta) dias para 2 (dois) anos, “sem prejuízo
da repetição de sanção por nova falta grave da mesma espécie”. Por mesma
espécie, deve-se compreender o mesmo enquadramento típico da conduta faltosa.
Não há mais menção ao limite legal de um sexto da pena aplicada. Porém,
como regra, não há autorização para prorrogação. A possibilidade de prorrogação
sucessiva do RDD, por períodos de um ano, foi claramente restrita à hipótese do
art. 52, § 4º, da LEP. Ou seja, quando o preso “exerce liderança em organização
criminosa, associação criminosa ou milícia privada, ou que tenha atuação
criminosa em 2 (dois) ou mais Estados da Federação”, caso este em que o RDD
será cumprido em estabelecimento prisional federal (art. 52, § 3º, da LEP).
A prorrogação sucessiva, por períodos de um ano, exige ainda a existência
de indícios de que o preso “continua apresentando alto risco para a ordem e a
segurança do estabelecimento penal de origem ou da sociedade” e de que “mantém
os vínculos com organização criminosa, associação criminosa ou milícia privada,
considerados também o perfil criminal e a função desempenhada por ele no grupo

137
Art. 52 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

criminoso, a operação duradoura do grupo, a superveniência de novos processos


criminais e os resultados do tratamento penitenciário” (redação dos incisos I e II
do art. 52, § 4º, da LEP).
O recolhimento é em cela individual e a pessoa presa em RDD terá visitas
quinzenais – não mais semanais – de duas pessoas por vez, “a serem realizadas em
instalações equipadas para impedir o contato físico e a passagem de objetos, por
pessoa da família ou, no caso de terceiro, autorizado judicialmente, com duração
de 2 (duas) horas” (art. 52, III, LEP). A visita no RDD, portanto, assim como no
sistema penitenciário federal, passa a ser por parlatório ou instalação similar. Não
se tratando de pessoa da família, a lei exige autorização judicial.
Dispõe o art. 52, ainda, que essa visita será “gravada em sistema de áudio ou
de áudio e vídeo e, com autorização judicial, fiscalizada por agente penitenciário”
(§ 6º). E por fim, que se não houver visita nos primeiros 6 (seis) meses de RDD
poderá ser agendado contato telefônico, gravado, com uma pessoa da família,
“2 (duas) vezes por mês e por 10 (dez) minutos” (§ 7º). Mas não há vedação ao
contato telefônico monitorado em regime fechado, seja dentro ou fora do RDD,
razão pela qual a autorização é desnecessária e acaba trazendo limitações que
flertam com a crueldade.
Permanece a garantia de saída da cela “por 2 (duas) horas diárias para
banho de sol, em grupos de até 4 (quatro) presos, desde que não haja contatos
com presos do mesmo grupo criminoso” (art. 52, IV, LEP). Impõe-se tarefa difícil
à administração penitenciária, pois essa não pode, obviamente, organizar o banho
de sol com pessoas presas de grupos criminosos diferentes.
A lei 13.964/2019 acresceu mais algumas regras para o Regime Disciplinar
Diferenciado.
No art. 52, V: “entrevistas sempre monitoradas, exceto aquelas com seu
defensor, em instalações equipadas para impedir o contato físico e a passagem
de objetos, salvo expressa autorização judicial em contrário”.
No art. 52, VI, “fiscalização do conteúdo da correspondência”. Trata-se
de conduta corriqueira por parte da administração penitenciária em relação a
toda a população carcerária. A questão é se a superveniência de previsão legal
específica para o RDD significa, a contrario sensu, a impossibilidade de fiscalização
do conteúdo da correspondência das demais pessoas presas.
No art. 52, VII, “participação em audiências judiciais preferencialmente por
videoconferência, garantindo-se a participação do defensor no mesmo ambiente
do preso”. Os objetivos são a redução de custos e a minimização de riscos de fuga
no deslocamento. Porém, não se pode menosprezar a necessidade de viabilizar
o aumento do número de defensores públicos, sob pena de nulidade dos atos
processuais praticados em desconformidade à previsão legal.
138
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 53

O Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária se posicionou


contrariamente ao RDD por meio da Resolução nº. 8, de 10 de agosto de 2004,
considerando-o modalidade de pena cruel vedada pelo art. 5º, XLVII, “e”, da
Constituição. Pode-se apontar, ainda, a violação da orientação teleológica da
execução penal acolhida pela Constituição, além da dignidade da pessoa humana
como fundamento da República (art. 1º, III, CR), o princípio da prevalência
dos direitos humanos (art. 4º, II, CR) e a obrigação de respeito à integridade
física e moral do preso (art. 5º, XLIX, CR). Tramita no STF a Ação Direta de
Inconstitucionalidade nº. 4.162/DF, a qual tem por pedido a declaração de
inconstitucionalidade do Regime Disciplinar Diferenciado.
Não há qualquer norma proibitiva do livramento condicional ou da
progressão de regime para aqueles que se encontram submetidos ao RDD. É pre­
ciso confrontá-la com os requisitos exigidos para a progressão, no caso concreto,
não se podendo pressupor que o fato de o indivíduo estar no RDD signifique,
por si só, mau comportamento.

SUBSEÇÃO III
Das Sanções e das Recompensas

Art. 53  Constituem sanções disciplinares:


- advertência verbal;
- repreensão;
- suspensão ou restrição de direitos (artigo 41, parágrafo único);
- isolamento na própria cela, ou em local adequado, nos estabelecimentos
que possuam alojamento coletivo, observado o disposto no artigo 88
desta Lei.
- inclusão no regime disciplinar diferenciado. (Incluído pela Lei nº 10.792,
de 2003)

53.1 Sanções disciplinares

São cinco as sanções disciplinares, conforme rol taxativo do artigo 53. As


quatro primeiras são aplicadas por ato administrativo do diretor do estabe­
lecimento, enquanto a inclusão no RDD depende de decisão judicial. As sanções
deveriam ser tidas como alternativas, mas no dia-a-dia o que se verifica como

139
Art. 53 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

prática é a sua aplicação cumulativa. O critério para seleção da sanção é a gravidade


da falta cometida e os parâmetros de individualização estabelecidos pelo art. 57
da LEP.

53.2 Isolamento e jurisprudência internacional de direitos humanos

Quanto ao isolamento, entendeu a Corte Europeia de Direitos Humanos,


no caso Kröcher e Möller vs. Suíça (1981), que o isolamento, por si só, não constitui
tratamento cruel e desumano, devendo, porém, haver a ponderação segundo os
critérios do rigor da medida, sua duração, o objetivo perseguido e os efeitos ao
preso, considerando o caso concreto. Com base em tais parâmetros, o isolamento
como forma de sanção disciplinar tem sido tratado, mais recentemente, de forma
cada vez mais restritiva.
No Caso Freemantle vs. Jamaica (2000), entendeu o Comitê de Direitos
Humanos da ONU que a dignidade do acusado foi ferida, tratando-se de trata­
mento cruel a sua manutenção em cela de dois metros quadrados, na qual
passava vinte e duas horas por dia, boa parte delas no escuro e sem qualquer
tipo de ocupação. O mesmo órgão afirmou, no Caso Mukong vs. Camarões (1994),
que os patamares mínimos estabelecidos para as condições materiais das prisões
devem ser observados independentemente do desenvolvimento socioeco­nômico
do Estado.
No Caso Suárez Rosero vs. Equador (1997), o Estado do Equador foi condenado
pela Corte Interamericana por ter mantido isolado e incomunicável um recluso
por trinta e seis dias – nessa ocasião, foi afirmado que a incomunicabilidade é
medida excepcional e com propósito exclusivamente cautelar, não punitivo.
Pode-se dizer que o RDD, o qual permite até 360 dias de isolamento, renovável
por igual período, é incompatível com a jurisprudência da Corte Interamericana
de Direitos Humanos, a qual, no Caso Bámaca Velásquez vs. Guatemala, equiparou
o isolamento prolongado e a incomunicabilidade a “formas de tratamento cruel e
desumano, lesivas da integridade psíquica e moral da pessoa e do direito de todo detido ao
respeito devido à dignidade inerente ao ser humano”21.
Em divergência com a LEP, as Regras de Mandela definem qualquer período
de isolamento superior a 15 dias como “confinamento solitário prolongado”,
hipótese vedada por se tratar de tratamento cruel (Regra 43).
A aplicação da sanção de isolamento não autoriza a suspensão automática do
“banho de sol” durante todo o período, tratando-se de pena cruel e desproporcional
(STF, HC 172.136/SP, Rel. Min. Celso de Mello, j. 10..10.2020).

140
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 54

53.3 Inexistência de concurso de faltas disciplinares para fins sancionatórios

Não existe concurso de faltas disciplinares. Isso significa que é vedada a


cumulação material ou a exasperação de sanções, as quais devem sempre obedecer
ao limite máximo de 30 (trinta) dias previsto no art. 58 da LEP. Portanto, se
houverem duas ou três faltas cometidas em uma mesma semana, por exemplo, a
sanção referente à primeira ou mais grave acabará por absorver as demais, sem
prejuízo de todos os fatos serem registrados no prontuário disciplinar do preso.

Art. 54  As sanções dos incisos I a IV do art. 53 serão aplicadas por ato
motivado do diretor do estabelecimento e a do inciso V, por prévio e
fundamentado despacho do juiz competente. (Redação dada pela Lei
nº 10.792, de 2003)
§ 1º A autorização para a inclusão do preso em regime disciplinar
dependerá de requerimento circunstanciado elaborado pelo diretor do
estabelecimento ou outra autoridade administrativa. (Incluído pela Lei
nº 10.792, de 2003)
§ 2º A decisão judicial sobre inclusão de preso em regime disciplinar será
precedida de manifestação do Ministério Público e da defesa e prolatada
no prazo máximo de quinze dias. (Incluído pela Lei nº 10.792, de 2003)

54.1 Competência para aplicar as sanções disciplinares

A maior parte das sanções disciplinares são aplicadas por ato administrativo
do diretor; apenas a inclusão no RDD exige decisão judicial.
Tal regra dificulta o controle da legalidade de eventuais abusos cometidos
na aplicação das faltas, pois até o juiz de execução vir a afastar a falta, as sanções
admi­nistrativas (isolamento, suspensão de visitas, etc.) já terão sido integral­
mente cumpridas. Faltas leves e médias aplicadas arbitrariamente têm um con­
trole judicial ainda mais difícil, mas cabe a impetração de mandado de segurança
ou mesmo habeas corpus no juízo de execução.

54.2 Legitimidade para postular a inclusão de preso no RDD e procedimento

O Ministério Público não tem legitimidade para postular a inclusão no


RDD, sendo essa uma atribuição do diretor do estabelecimento prisional ou
141
Art. 55 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

seus superiores, incluindo os Secretários de Estado responsáveis. Não fosse


essa a vontade do legislador, outra seria a redação do parágrafo primeiro.
O procedimento é judicial; todavia, antes da decisão judicial o diretor do
estabelecimento pode determinar o isolamento preventivo do sujeito por até
10 dias. E ainda, o próprio magistrado poderá decretar a inclusão preventiva
no RDD sem a oitiva do Ministério Público e da Defesa, sempre atendendo às
“finalidades emergenciais” do cotidiano carcerário e com evidente prejuízo do
princípio constitucional da ampla defesa (art. 5º, LV, CR). Seja como for, a decisão
definitiva sobre a inclusão no RDD, no prazo de 15 dias (art. 54, §§ 1º e 2º, LEP)
deve sempre ser precedida por manifestação do Ministério Público e da Defesa,
não podendo ocorrer de ofício.

Art. 55  As recompensas têm em vista o bom comportamento reconhe­


cido em favor do condenado, de sua colaboração com a disciplina e de
sua dedicação ao trabalho.

55.1 Considerações gerais sobre as recompensas

Dentro da lógica premial e disciplinar típica da execução penal, presos com


bom comportamento podem ter acesso a recompensas. Essas, porém, não devem
ser confundidas com o acesso às oportunidades de trabalho e estudo (as quais não
podem ser condicionadas ao bom comportamento), devendo ser algo efetivamente
excepcional e complementar.

Art. 56  São recompensas:


I - o elogio;
II - a concessão de regalias.
Parágrafo único. A legislação local e os regulamentos estabelecerão a
natureza e a forma de concessão de regalias.

142
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 56

56.1 Recompensas em espécie

O dispositivo diferencia as recompensas conforme estas sejam dadas na


forma verbal – “elogios” – ou material – “regalias”, as quais devem ser previstas
com clareza nos regramentos locais, em conjunto às proibições e outras regras de
convivência. Assim como quaisquer faltas disciplinares, a concessão de elogios
ou recompensas deve constar no prontuário do preso e no respectivo sistema
eletrônico de acompanhamento.

56.2 Distinção entre regalias e direitos

Se a prestação positiva tem previsão constitucional ou legal como direito, não


se trata de regalia. A principal consequência jurídica da distinção é que regalias
são tratadas como concessões sujeitas à discricionariedade administrativa da
autoridade penitenciária. Direitos, por sua vez, são de observância obrigatória e
atos administrativos comissivos ou omissivos de violação serão objeto de controle
judicial.
Os direitos arrolados no artigo 41, por exemplo, não podem ser interpretados
como regalias. Porém, há previsões mais abertas e o contexto deve ser levado
em conta na interpretação. O uso de televisão na própria cela ou na galeria, por
exemplo, é regalia ou expressão do direito insculpido no artigo 41, XV (“contato
com o mundo exterior por meio de correspondência escrita, da leitura e de outros
meios de informação que não comprometam a moral e os bons costumes”)? Ainda
que possa ser considerada uma regalia em contexto de normalidade, a suspensão
de outras formas de contato com o mundo exterior por conta da pandemia do
novo Coronavírus recomenda sua ressignificação como direito.
Também pode ocorrer de uma regalia se tornar direito pelos costumes,
ou seja, pela adesão a longo termo e internalização nos padrões normativos de
comportamento e interação em determinada unidade prisional. Teríamos, no
caso, uma adaptação do instituto da surrectio do direito civil, ou seja, com base no
princípio da boa fé objetiva, o “surgimento” de um direito a partir da reiterada
prática de atos que geram, nas partes, essa expectativa e compreensão.

143
Art. 57 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

SUBSEÇÃO IV
Da Aplicação das Sanções

Art. 57  Na aplicação das sanções disciplinares, levar-se-ão em conta a


natureza, os motivos, as circunstâncias e as consequências do fato, bem
como a pessoa do faltoso e seu tempo de prisão. (Redação dada pela Lei
nº 10.792, de 2003)
Parágrafo único. Nas faltas graves, aplicam-se as sanções previstas nos
incisos III a V do art. 53 desta Lei. (Redação dada pela Lei nº 10.792, de
2003)

57.1 Parâmetros para a aplicação da sanção disciplinar

O dispositivo traz parâmetros de análise para a individualização da sanção


disciplinar, a qual deve se escorar nos deveres de fundamentação e motivação.
Faz-se referência à natureza, aos motivos, circunstâncias, consequências do fato,
além da “pessoa do faltoso” e seu tempo de prisão.
A suspensão de direitos, o isolamento e o inclusão no regime disciplinar
diferenciado são sanções previstas para as faltas graves, de acordo com o parágrafo
único; na prática, porém, regramentos locais estabelecem sanções de isolamento e
suspensão de direitos, por períodos inferiores, também para faltas leves e médias.

57.2 Obrigatoriedade da comunicação da falta grave ao juízo de execução

A notícia e o registro de falta grave, após o devido processo administrativo


disciplinar, obriga a comunicação da autoridade penitenciária ao juiz de execução,
pois há diversas consequências que podem modificar o cumprimento da pena
restante tanto qualitativamente como quantitativamente, com a perda dos dias
remidos, a regressão de regime e a polêmica interrupção do lapso temporal para
a progressão de regime.

57.3 Individualização e sofisticação da análise da conduta

Há abertura legal, aqui, para se diferenciar situações cuja equiparação


configuraria evidente injustiça, inclusive absorvendo, por analogia, conceitos

144
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 58

próprios da teoria do delito e da pena como a desistência voluntária e o


arrependimento eficaz (art. 15, CP), o arrependimento posterior (art. 16, CP), a
participação de menor importância e a cooperação dolosamente distinta (art. 29, §§
1º e 2º, CP). Por exemplo, como já colocado, a fuga ou evasão do regime semiaberto
na qual a pessoa é recapturada sem novo delito, não deve, em hipótese alguma,
implicar na regressão ao regime fechado, podendo, mesmo se reconhecida a falta
grave, ser mantido o regime semiaberto. Ainda, e muito importante, o dispositivo
impõe a devida fundamentação como requisito de validade do ato administrativo
que aplica a sanção disciplinar, sob pena de nulidade (em conjunto ao art. 59,
parágrafo único, da LEP).

Art. 58  O isolamento, a suspensão e a restrição de direitos não poderão


exceder a trinta dias, ressalvada a hipótese do regime disciplinar
diferenciado. (Redação dada pela Lei nº 10.792, de 2003)
Parágrafo único. O isolamento será sempre comunicado ao Juiz da
execução.

58.1 Limite temporal das sanções de isolamento, suspensão e restrição de


direitos

Não podem ultrapassar trinta dias as sanções de suspensão ou restrição de


direitos e isolamento, “ressalvada a hipótese do Regime Disciplinar Diferenciado”
(art. 58, LEP). No que tange ao isolamento, mais recomendável é aplicar as Regras
de Mandela e não a LEP, segundo as quais período superior a 15 dias configura
“confinamento solitário prolongado”, hipótese vedada por se tratar de tratamento
cruel (Regra 43).

58.2 Inexistência de concurso de faltas disciplinares para fins sancionatórios

Não existe concurso de faltas disciplinares. Isso significa que é vedada a


cumulação material ou a exasperação de sanções, as quais devem sempre obedecer
ao limite máximo de 30 (trinta) dias. Portanto, se houverem duas ou três faltas
cometidas em uma mesma semana, por exemplo, a sanção referente à primeira
ou mais grave acabará por absorver as demais, sem prejuízo de todos os fatos
serem registrados no prontuário disciplinar do preso.
145
Art. 59 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

58.3 Aplicação analógica do prazo limite a sanções administrativas aplicadas


aos visitantes dos presos

Em respeito ao princípio da proporcionalidade, o limite máximo de 30 dias


deve ser aplicado analogicamente a eventuais sanções aplicadas pelo Estado-
Administração às pessoas cadastradas como visitantes dos presos e que, por algum
motivo, têm suspenso seu direito de visita e sua “carteirinha”.

58.4 Obrigatoriedade de comunicação do isolamento do preso ao juízo de


execução

A comunicação do isolamento ao juízo de execução é uma obrigação que a


lei impõe para as autoridades administrativas, independentemente da natureza
da falta.

SUBSEÇÃO V
Do Procedimento Disciplinar

Art. 59  Praticada a falta disciplinar, deverá ser instaurado o procedimento


para sua apuração, conforme regulamento, assegurado o direito de
defesa.
Parágrafo único. A decisão será motivada.

59.1 Procedimento para apuração de falta disciplinar

É obrigatória a instauração de procedimento administrativo disciplinar para


apuração da falta disciplinar. Não há razão para não aplicação dos princípios e
diretrizes da Lei 9.874/99 (Lei do Processo Administrativo Disciplinar), tratando-
se da norma geral que regulamenta o tema. A Súmula Vinculante nº 5 do STF,
que indica a constitucionalidade da ausência de defesa técnica no processo
administrativo disciplinar, não se aplica à execução penal, na qual se deve
resguardar por inteiro o direito de defesa, conforme posição do STF (STF, RE
398269, Rel. Min. Gilmar Mendes, j. 15/12/2009) e, mais recentemente, da Súmula
nº 533 do STJ: “Para o reconhecimento da prática de falta disciplinar no âmbito da
execução penal, é imprescindível a instauração de procedimento administrativo pelo diretor
146
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 59

do estabelecimento prisional, assegurado o direito de defesa, a ser realizado por advogado


constituído ou defensor público nomeado”.
Não há nenhuma ressalva quanto à aplicação do enunciado aos casos de falta
grave por fuga e pela prática de novo crime doloso, sendo também necessário, em
tais casos, a instauração de procedimento administrativo disciplinar.
É de se destacar, ainda, que o STJ firmou tese asseverando que a presença
de defesa técnica é imprescindível inclusive na oitiva das testemunhas no âmbito
do PAD, sob pena de nulidade (STJ, HC 484.825/RS, Rel. Min. Felix Fischer, 5ª T.,
j. 11/04/2019). Por outro lado, o mesmo Tribunal entende que não há obrigatoriedade
de que o interrogatório do sentenciado seja o último ato da instrução (STJ, HC
483.451/SP, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, 5ª T., j. 26/02/2019).
Porém, no complicado aspecto da valoração probatória no âmbito do PAD,
a qual muitas vezes inexiste, o Tribunal afirma que a “palavra dos agentes
penitenciários na apuração de falta grave é prova idônea para o convencimento
do magistrado, haja vista tratar-se de agentes públicos, cujos atos e declarações
gozam de presunção de legitimidade e de veracidade” (STJ, AgRg no HC 553.388/
SP, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, 5ª T., j. 05/03/2020). A posição é
problemática e preocupante, tendo potencial de agravamento do baixíssimo grau
de jurisdicionalização do sistema disciplinar. A possibilidade de verificação é
pressuposto da ideia de prova, sob pena de tornar a defesa técnica juridicamente
impossível. Havendo outras opções, como um sistema de câmeras e imagens,
por exemplo, é imperativo que haja possibilidade de acesso pela defesa técnica e
controle sobre a sua disponibilização.
Já decidiu o Superior Tribunal de Justiça pela necessidade de procedimento
administrativo disciplinar também nos casos de violação das condições da
monitoração eletrônica, não suprindo sua falta a realização de audiência
de justificação (STJ, HC 459.330/PR, Rel. Min. Nefi Cordeiro, j. 17.07.2018);
resguardada a crítica do enquadramento de tal conduta como falta grave, sem
previsão legal.
Porém, alguma confusão decorre do julgamento, pelo STF, do RE nº. 972.598,
firmando tese com repercussão geral: “A oitiva do condenado em audiência de
justificação realizada na presença do defensor e do Ministério Público afasta a necessidade
de prévio procedimento administrativo disciplinar (PAD), assim como supre eventual
ausência ou deficiência de defesa técnica no PAD”.
A autorização dada pelo STF é perigosamente aberta e pode estimular um
isolamento e fechamento ainda maior das unidades prisionais e seus sistemas
disciplinares, além de fulminar o contraditório no âmbito dos processos adminis­
trativos disciplinares. Vale enfatizar que o entendimento aprovado aplica-se

147
Art. 59 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

exclusivamente a faltas graves, visto que não há audiência de justificação para


faltas médias e leves. Para estas, portanto, segue sendo exigido o PAD com defesa
técnica, sob pena de nulidade.
O STJ, por sua vez, firmou tese no sentido de que “é dispensável nova
oitiva do apenado antes da homologação judicial da falta grave, se previamente
ouvido em procedimento administrativo disciplinar, em que foram assegurados
o contraditório e a ampla defesa” (STJ, AgInt no HC 532.846/SC, Rel. Min. Nefi
Cordeiro, 6ª T., j. 03/12/2019; AgRg no HC 533.904/SP, Rel. Min. Joel Paciornik,
5ª T., j. 22/10/2019). A tese protege o contraditório no processo administrativo
disciplinar, mas dispensa a oitiva do condenado em juízo. O risco, aqui, é de
se repetir a tendência já verificada em anos passados de rebaixamento do rigor
da análise judicial e a “automatização” da validação judicial das faltas graves
imputadas pela autoridade administrativa.
O STJ também firmou tese pela dispensabilidade da audiência de justificação
quando o preso já está em regime fechado, não havendo regressão de regime (STJ,
AgInt no HC 532.846/SC, Rel. Min. Nefi Cordeiro, 6ª T., j. 09/12/2019; AgRg no
Resp 1.827.686/MS, Rel. Min. Ribeiro Dantas, 5ª T., j. 17/09/2019). Porém, o direito
à audiência de justificação tem assento no direito ao contraditório em juízo, e não
faz sentido condicionar o exercício do direito ao contraditório, nesse sentido, à
existência de determinado efeito decorrente da sanção disciplinar.

59.2 Direito ao recurso administrativo independente de previsão expressa

Mesmo com a ausência de previsão legal, qualquer decisão da administração


penitenciária ou do Conselho Disciplinar da unidade prisional é impugnável
por recurso administrativo dirigido à instância hierarquicamente superior. Tal
possibilidade é fundada, primeiramente, em garantia constitucional (art. 5º, LV,
CR) e prescinde, por isso, de previsão na legislação local ou no regulamento do
presídio. Em segundo lugar, encontra respaldo em analogia in bonam partem
com o regulamento do sistema penitenciário federal (Decreto nº 6.049, de 27 de
fevereiro de 2007), que garante o direito de defesa na apuração de quaisquer
faltas disciplinares e prevê recurso administrativo, no prazo de cinco dias, contra
“decisão de aplicação de sanção disciplinar consistente em isolamento celular,
suspensão ou restrição de direitos, ou de repreensão”, a ser julgado, também em
cinco dias, pela diretoria do Sistema Penitenciário Federal (art. 73, Dec. 6.049/07).

148
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 59

59.3 Procedimento, prescrição disciplinar e preclusão administrativa

O detalhamento do procedimento administrativo disciplinar deve ser


realizado, respeitando-se os princípios constitucionais, por lei ou regulamento
estadual. Recomenda-se o estabelecimento de prazos para a instauração do
procedimento – no caso de fuga, por exemplo, o procedimento deve ser instaurado
no momento da recaptura – sob pena de preclusão e inviabilização da apuração
da responsabilidade disciplinar. Muitos Estados estabelecem, ainda, como
atribuição da vara de corregedoria dos presídios, julgar habeas corpus e mandados
de segurança impetrados contra atos das autoridades penitenciárias.
Sobre a “prescrição” da falta disciplinar, embora a lei se omita, há algumas
possibilidades desenvolvidas por doutrina e jurisprudência, sendo as principais:
(a) entendimento majoritário aplica o menor prazo prescricional previsto no Có-
digo Penal, qual seja, de três anos (art. 109, VI, CP) (STF, HC 92.000/SP, Rel. Min.
Ricardo Lewandowski, 1ª T., DJe 30/11/2007; STF, HC 114.422, Rel. Min. Gilmar
Mendes, 2ª T., j. 06/05/2014); (b) porém, mais correto seria aplicar o menor prazo
prescricional previsto na legislação penal, que é de dois anos (art. 30, Lei 11.343/06);
e (c) ainda, pode-se aplicar por analogia o prazo de um ano previsto nos decretos
de indulto natalino e estabelecido, assim, como critério razoável e proporcional
consolidado para se interpretar a duração dos efeitos impeditivos da falta grave.
O STJ tem decidido, porém, pela rejeição de prazos de prescrição disciplinar
inferiores a 3 (três) anos previstos em regulamentos locais, com base no
fundamento de que os Estados não têm competência para regular a matéria. Por
exemplo: “Normas penitenciárias não têm o condão de regular a perda
do direito disciplinar, pois compete privativamente à União legislar sobre
o assunto” (STJ, AgRg no HC 610.073/SP, 6ª T., j. 15/12/2020).
É viável a regulamentação de preclusão administrativa se ultrapassado prazo
razoável para instauração do PAD, com o consequente arquivamento, ainda que
sem a extinção da punibilidade disciplinar.

59.4 Impossibilidade de soma dos prazos de reabilitação

No caso de pluralidade de faltas disciplinares, cada qual dando origem a


um procedimento administrativo disciplinar distinto, com a respectiva sanção,
o prazo de reabilitação da falta deve ser contado a partir da última falta, sendo
ilegal a soma simples dos prazos. Assim como ocorre com a prescrição disciplinar,
pode-se aplicar, por analogia, o art. 119 do Código Penal: “No caso de concurso
de crimes, a extinção da punibilidade incidirá sobre a pena de cada um, isoladamente”.
149
Art. 60 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

59.5 Controle judicial das faltas de natureza média e leve

Ainda que não produzam efeitos diretos no processo de execução, as faltas


leves e médias acarretam sanções disciplinares. Devem e podem, portanto, ser
objeto de controle judicial, no estrito sentido de controle, não de revisão necessária
da instância administrativa disciplinar. Entende-se, assim, que a possibilidade de
controle judicial ocorre exclusivamente como mecanismo de limite e fiscalização
da legalidade, ou seja, para o fim de anular falta aplicada abusivamente. Se a
autoridade administrativa, que é quem detém o poder disciplinar, entender pela
absolvição da imputação de falta, não há base legal autorizando o Poder Judiciário
a reverter a decisão para aplicar a falta ou mesmo para converter falta média/
leve em falta grave.
Porém, o STJ entende a questão de outra maneira e tem admitido que o juízo
de execução aplique falta grave ainda que contrariamente à decisão administrativa:
“É possível o controle judicial pelo juízo da execução penal sobre decisão de
Conselho Disciplinar que, no uso de suas atribuições, concluiu pela absolvição da
acusação de eventual falta disciplinar de natureza grave imputada a reeducando
do sistema prisional (HC n. 365.431/MG, Ministra Maria Thereza de Assis Moura,
Sexta Turma, DJe 8/11/2016). 2. Havendo elementos para autorizar o controle
judicial sobre decisão administrativa, cabe ao Juízo da execução fiscalizar/rever
as decisões aplicadas em sede administrativa pelo Conselho Disciplinar” (STJ,
AgRg no HC 389.545/MG, Rel. Min. Sebastião Reis Jr., j. 13/12/2018).

Art. 60  A autoridade administrativa poderá decretar o isolamento


pre­ventivo do faltoso pelo prazo de até dez dias. A inclusão do preso
no regime disciplinar diferenciado, no interesse da disciplina e da
averiguação do fato, dependerá de despacho do juiz competente.
(Redação dada pela Lei nº 10.792, de 2003)
Parágrafo único. O tempo de isolamento ou inclusão preventiva no regime
disciplinar diferenciado será computado no período de cumprimento da
sanção disciplinar. (Redação dada pela Lei nº 10.792, de 2003)

150
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 60

60.1 Possibilidade de isolamento preventivo e detração

O isolamento preventivo deveria ser restringido às faltas de natureza grave,


mas não é, na prática, mesmo porque a tipificação definitiva da conduta é feita
apenas no momento do próprio julgamento. A lei permite também a inclusão
cautelar no Regime Disciplinar Diferenciado, mas somente por meio de decisão
judicial. O prazo máximo é de 10 (dez) dias e há detração, sendo o tempo
computado no período de cumprimento da sanção disciplinar.
Importante: caso transcorra o período máximo de isolamento preventivo
sem que tenha havido a sessão de julgamento da falta, o preso deve ser retirado
do isolamento e, caso venha a ser sancionado, passará a cumprir o restante. A
regra é aplicável às suspensões de direitos.
Aplica-se ao isolamento preventivo o disposto no art. 58, parágrafo único,
da LEP, referente à obrigatoriedade de comunicação ao juízo da execução.

151
Art. 61 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

TÍTULO III
Dos Órgãos da Execução Penal

CAPÍTULO I
Disposições Gerais

Art. 61  São órgãos da execução penal:


- o Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária;
- o Juízo da Execução;
- o Ministério Público;
- o Conselho Penitenciário;
- os Departamentos Penitenciários;
- o Patronato;
- o Conselho da Comunidade.
- a Defensoria Pública. (Incluído pela Lei nº 12.313, de 2010).

61.1 Órgãos da execução penal

Os órgãos da execução penal são os principais atores de condução e execução


das políticas públicas no setor, abrangendo tanto órgãos propriamente executivos
como instituições do sistema de justiça. Os órgãos de execução penal, com exceção
do Juízo de Execução, têm legitimidade ativa para postular em juízo e contribuir
para a fiscalização e adimplemento dos direitos da execução.

CAPÍTULO II
Do Conselho Nacional de Política Criminal
e Penitenciária

Art. 62  O Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária, com


sede na Capital da República, é subordinado ao Ministério da Justiça.

152
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 63

62.1 Natureza do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária

O Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária é órgão colegiado


com funções consultiva e deliberativa, fundamental no desenho de diretrizes e
políticas públicas para o sistema penitenciário. O órgão faz parte da estrutura do
Ministério da Justiça e da Segurança Pública.

Art. 63  O Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária será


integrado por 13 (treze) membros designados através de ato do Ministério
da Justiça, dentre professores e profissionais da área do Direito Penal,
Processual Penal, Penitenciário e ciências correlatas, bem como por
representantes da comunidade e dos Ministérios da área social.
Parágrafo único. O mandato dos membros do Conselho terá duração de
2 (dois) anos, renovado 1/3 (um terço) em cada ano.

63.1 Composição do CNPCP e mandato dos membros

A nomeação dos membros se dá por ato do Ministério da Justiça e da


Segurança Pública. São 13 (treze) membros, com os respectivos suplentes, em
definição bastante aberta e discricionária: “professores e profissionais da área do
Direito Penal, Processual Penal, Penitenciário e ciências correlatas, bem como por
representantes da comunidade e dos Ministérios da área social”. O mandado é
de 2 (dois) anos, sendo 1/3 (um terço) da composição do Conselho renovada a
cada ano.

Art. 64  Ao Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária, no


exercício de suas atividades, em âmbito federal ou estadual, incumbe:
I - propor diretrizes da política criminal quanto à prevenção do delito,
administração da Justiça Criminal e execução das penas e das medidas
de segurança;
II - contribuir na elaboração de planos nacionais de desenvolvimento,
sugerindo as metas e prioridades da política criminal e penitenciária;
III - promover a avaliação periódica do sistema criminal para a sua ade­
quação às necessidades do País;
153
Art. 64 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

IV - estimular e promover a pesquisa criminológica;


V - elaborar programa nacional penitenciário de formação e aperfei­
çoamento do servidor;
VI - estabelecer regras sobre a arquitetura e construção de estabele­ci­
mentos penais e casas de albergados;
VII - estabelecer os critérios para a elaboração da estatística criminal;
VIII - inspecionar e fiscalizar os estabelecimentos penais, bem assim
informar-se, mediante relatórios do Conselho Penitenciário, requisições,
visitas ou outros meios, acerca do desenvolvimento da execução penal
nos Estados, Territórios e Distrito Federal, propondo às autoridades dela
incumbida as medidas necessárias ao seu aprimoramento;
IX - representar ao Juiz da execução ou à autoridade administrativa para
instauração de sindicância ou procedimento administrativo, em caso de
violação das normas referentes à execução penal;
X - representar à autoridade competente para a interdição, no todo ou
em parte, de estabelecimento penal.

64.1 Atribuições do CNPCP

As atribuições legais do CNPCP têm caráter consultivo e programático, como


na proposição de “diretrizes da política criminal” ou no incentivo à pesquisa em
criminologia, destacando-se a possibilidade de uma função fiscalizadora mais
contundente quando, por exemplo, representa pela interdição de estabelecimento
penal superlotado ou sem condições adequadas. Muito importante é a atribuição
do inciso VI – “estabelecer regras sobre a arquitetura e construção de estabelecimentos
penais e casas de albergados” –, pois apenas os projetos dos Estados que estejam
adequados a tais regras poderão receber suporte do Fundo Penitenciário Nacional
para a construção. A atual Resolução que trata do assunto é a nº. 9, de 18 de
novembro de 2011, modificada pelas Resoluções 06/2017 e 02/2018.
A Resolução 5/2020 estabeleceu diretrizes extraordinárias e específicas para
o contexto da pandemia do novo Coronavírus. Entre outros pontos, a resolução
autorizou a utilização excepcional de estruturas destinadas à triagem dos presos
que ingressam no estabelecimento penal e estruturas destinadas ao isolamento
de presos pertencentes a grupos de risco.
Há inúmeras outras resoluções que estabelecem diretrizes importantes para
o sistema penitenciário, em diversos temas, todas acessíveis no sítio virtual do
Conselho.
154
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 65

CAPÍTULO III

Do Juízo da Execução

Art. 65  A execução penal competirá ao Juiz indicado na lei local de


organização judiciária e, na sua ausência, ao da sentença.

65.1 Competência e jurisdição em matéria de execução penal

O art. 65 deve ser lido em conjunto com o art. 2º da LEP, na medida em que
tratam, respectivamente, da competência e da jurisdição em matéria execucional.
Também tratando do assunto, o art. 668 do Código de Processo Penal: “Art. 668.
A execução, onde não houver juiz especial, incumbirá ao juiz da sentença, ou, se a decisão
for do Tribunal do Júri, ao seu presidente. Parágrafo único. Se a decisão for de tribunal
superior, nos casos de sua competência originária, caberá ao respectivo presidente prover-
lhe a execução”.
O princípio do juiz natural (art. 5º, LIII e XXXVII, CR), segundo o qual
ninguém é processado ou sentenciado senão pela autoridade competente, tem
aplicação controversa na execução penal. A própria regra constante do art. 65 dá
margem a interpretações diversas, inclusive quanto à constitucionalidade formal
da delegação da matéria a lei estadual.
Ao lado de vertente minoritária que preconiza o local da condenação como
critério de determinação do juízo de execução competente, o entendimento
dominante afirma ser competente o juízo de execução da comarca da sede do
estabelecimento carcerário no qual está recolhido o condenado. Se este for
transferido, modifica-se também o juízo de execução competente (salvo no caso
de transferência de preso provisório sem sentença condenatória, pois neste caso
continua competente o juiz do processo de conhecimento).
Foi esse, inclusive, o critério adotado pela legislação acerca da transferência
e inclusão de presos em estabelecimentos de segurança máxima, segundo a qual a
competência do juízo de execução será “do juízo federal da seção ou subseção judiciária
em que estiver localizado o estabelecimento penal federal de segurança máxima ao qual
for recolhido o preso” (art. 2º, Lei 11.671/08), mesmo se este tiver sido condenado
pela justiça estadual.
A Lei 13.964/2019 acrescentou, ainda, parágrafo único ao mesmo art. 2º,
dispondo que: “O juízo federal de execução penal será competente para as ações de
155
Art. 65 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

natureza penal que tenham por objeto fatos ou incidentes relacionados à execução da pena
ou infrações penais ocorridas no estabelecimento penal federal”.
De acordo com a Súmula 192/STJ, “Compete ao Juízo das Execuções Penais do
Estado a execução das penas impostas a sentenciados pela Justiça Federal, Militar ou
Eleitoral, quando recolhidos a estabelecimentos sujeitos à administração estadual”. Como
se vê, os critérios material, com base em quem administra o estabelecimento, e
territorial, com base no local de execução da pena, determinam a competência
também em relação aos condenados pela Justiça Federal ou pelas Justiças Militar
e Eleitoral.
Para condenados com prerrogativa de foro, é competente o Tribunal
correspondente ao foro privilegiado (art. 668, parágrafo único, CPP), havendo
possibilidade de delegação da fiscalização.

65.2 Constitucionalidade e legalidade dos mutirões carcerários

Não parece haver qualquer problema de ordem constitucional na realização


de mutirões e designações ad hoc de juízes para analisar e decidir sobre incidentes
da execução. O princípio do juiz natural tem toda sua densidade histórica voltada
à limitação do arbítrio e em favor do condenado, não podendo ser interpretado
em seu desfavor quando se tem um contexto de atraso na prestação jurisdicional
e no respeito a direitos da execução penal. A excepcionalidade tem guarida no
princípio da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, CF) e no reconhecimento do
“estado de coisas inconstitucional” (ADPF 347/DF) pelo Supremo Tribunal Federal.
Nesse sentido entendeu o STJ: “(...) 2. Consolidou-se nesta Corte Superior de
Justiça entendimento no sentido de que não ofende o princípio do juiz natural a
designação de magistrados em regime de mutirão (penal, cível ou carcerário), no
interesse objetivo da jurisdição, para atuar em feitos genericamente atribuídos e no
objetivo da mais célere prestação jurisdicional. Precedentes. 3. No caso concreto,
não houve escolha de magistrados para julgamento deste ou daquele processo.
Pelo contrário, a designação se deu de maneira ampla e indiscriminada para a
atuação em período certo de tempo, de modo a conferir eficiência à prestação
jurisdicional e efetividade ao princípio da duração razoável dos processos, (...)”
(STJ, HC 449.361/PR, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, j. 12/03/2019).

156
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 66

Art. 66  Compete ao Juiz da execução:


I - aplicar aos casos julgados lei posterior que de qualquer modo favo­
recer o condenado;
II - declarar extinta a punibilidade;
III - decidir sobre:
a) soma ou unificação de penas;
b) progressão ou regressão nos regimes;
c) detração e remição da pena;
d) suspensão condicional da pena;
e) livramento condicional;
f) incidentes da execução.
IV - autorizar saídas temporárias;
V - determinar:
a) a forma de cumprimento da pena restritiva de direitos e fiscalizar sua
execução;
b) a conversão da pena restritiva de direitos e de multa em privativa de
liberdade;
c) a conversão da pena privativa de liberdade em restritiva de direitos;
d) a aplicação da medida de segurança, bem como a substituição da
pena por medida de segurança; e) a revogação da medida de segurança;
f) a desinternação e o restabelecimento da situação anterior;
g) o cumprimento de pena ou medida de segurança em outra comarca;
h) a remoção do condenado na hipótese prevista no § 1º, do artigo 86,
desta Lei.
i) (VETADO); (Incluído pela Lei nº 12.258, de 2010)
VI - zelar pelo correto cumprimento da pena e da medida de segurança;
VII - inspecionar, mensalmente, os estabelecimentos penais, tomando
providências para o adequado funcionamento e promovendo, quando
for o caso, a apuração de responsabilidade;
VIII - interditar, no todo ou em parte, estabelecimento penal que
estiver funcionando em condições inadequadas ou com infringência
aos dispositivos desta Lei;
IX - compor e instalar o Conselho da Comunidade.
X – emitir anualmente atestado de pena a cumprir. (Incluído pela Lei
nº 10.713, de 2003)

157
Art. 66 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

66.1 Atribuições do juízo de execução e jurisdicionalização da execução penal

Trata-se de dispositivo legal importantíssimo e que constitui a base legal


para a efetiva jurisdicionalização da execução penal, em variados aspectos.
No inciso I, a atribuição de “aplicar aos casos julgados lei posterior que de qualquer
modo favorecer o condenado” indica ser do juízo de execução a competência para
dar efetividade a eventual abolitio criminis (art. 2º, caput, CP) ou novatio legis in
mellius (art. 2º, parágrafo único, CP), ou seja, para aplicar lei penal mais favorável
dotada de retroatividade. Nesse sentido, a Súmula 611/STF: “Transitada em julgado
a sentença condenatória, compete ao juízo das execuções a aplicação de lei mais benigna”.
Pelo inciso II, cabe ao juízo de execução “declarar extinta a punibilidade” em
quaisquer dos casos previstos no art. 107 do Código Penal (morte do agente,
anistia, graça ou indulto, abolitio criminis, prescrição etc).
No inciso III constam diversas hipóteses de atuação do juízo de execução.
A alínea “a” fundamenta, por exemplo, o reconhecimento de continuidade
delitiva entre fatos processados e julgados em processos distintos, se preenchidos
os requisitos do art. 71 do CP, e eventual adequação de regime em favor do
condenado. A alínea “c” permite a aplicação da detração de pena, quando o juízo
do processo de conhecimento não o fez, devendo prevalecer o método mais favo­
rável ao condenado (ver comentários ao art. 111).
Outra atribuição relevante é aquela prevista no inciso VI de “zelar pelo correto
cumprimento da pena e da medida de segurança”, sustentando um verdadeiro poder
geral de cautela em prol da legalidade na execução e permitindo que a constatação
ou notícia de abusos fundamente as correspondentes e necessárias intervenções.
Nessa linha, os incisos VII e VIII exigem a inspeção mensal nos estabele­
cimentos prisionais e a prerrogativa de sua interdição, no todo ou em parte.
Com base no inciso VIII, o STJ reafirmou a competência do juízo de execução
para interditar unidade prisional: “(...) VII - O acórdão recorrido considerou não
competir ao Poder Judiciário decidir sobre questões relativas à administração do
sistema penitenciário, entendendo, pois, ilegal o ato atacado, mas no voto vencido,
cuidou-se da temática à luz da legislação federal aqui invocada, exatamente para
concluir pela denegação da ordem impetrada. VIII - O Superior Tribunal de
Justiça possui jurisprudência absolutamente pacífica no sentido da competência
do respectivo juízo para a prática de ato de interdição de presídios. Confiram-se
os seguintes precedentes: RMS 46.701/MG, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN,
SEGUNDA TURMA, julgado em 05/05/2016, DJe 25/05/2016; AgRg no RMS 27.858/
RS, Rel. Ministro NEFI CORDEIRO, SEXTA TURMA, julgado em 19/11/2015, DJe
03/12/2015; AgRg no RMS 48.673/MG, Rel. Ministro LEOPOLDO DE ARRUDA
158
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 66

RAPOSO (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/PE), QUINTA TURMA,


julgado em 01/10/2015, DJe 08/10/2015 (...)” (STJ, RE 1.618.316/MG, Rel. Min.
Francisco Falcão, j. 02/10/2018).
Alteração no art. 51 do Código Penal promovida pela Lei 13.964/2019
estabelece o juízo de execução penal como competente para a execução da pena
de multa.
Compete também ao juízo de execução penal “a verificação da hipossuficiência
do acusado para fins de suspensão da exigibilidade das custas processuais,
visto que pode haver alteração da situação financeira entre a data da sentença
condenatória e o início da execução penal” (STJ, HC 432.633/RS, Rel. Min. Ribeiro
Dantas, j. 19/06/2018; AgRg no AREsp 1.226.606/AM, Rel. Min. Maria Thereza de
Assis Moura, j. 13/3/2018; AgInt no REsp 1569916/PE, Rel. Min. Nefi Cordeiro,
j. 22/03/2018).

66.2 Decisão proferida em PAD passível de controle judicial

Entende o STJ que “a decisão proferida pela autoridade administrativa


prisional em processo administrativo disciplinar - PAD que apura o cometimento
de falta grave disciplinar no âmbito da execução penal é ato administrativo,
portanto, passível de controle de legalidade pelo Poder Judiciário” (por exemplo:
STJ, AgRg no AREsp 1439580/SP, 5ª T., j. 15/10/2019).

66.3 Da confusão sobre a natureza da competência das Varas de


Corregedoria dos Presídios e da necessidade de meios de execução das
próprias decisões

O fato de o Poder Judiciário ser órgão da execução penal ou conviver com


atividades atípicas regidas pelo direito administrativo não transforma a natureza
de suas atribuições de jurisdicional em administrativa. Ao contrário do que se
alega, de forma majoritária21, as atribuições constantes dos incisos VI, VII e VIII
do art. 66, componentes da função de fiscalização da legalidade das condições de
cumprimento da pena de prisão, não podem ser esvaziadas através da atribuição
de natureza meramente administrativa aos atos que delas decorrem.

21
Sobre o tema e sua crítica, na linha aqui defendida, v. CACICEDO, Patrick. “O controle judicial
da execução penal no Brasil: ambiguidades e contradições de uma relação perversa”. Revista
Brasileira de Direito Processual Penal, vol. 4, n. 1, Porto Alegre: 2018, p. 427-429.

159
Art. 67 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

Entendemos, em posição minoritária, que os incisos VI, VII e VIII do art. 66


estabelecem ser também competência jurisdicional do Juízo de Execução Penal a
determinação de obrigações de fazer ao Poder Público encarregado da admi­nis­
tração penitenciária, podendo inclusive julgar ações civis públicas com este objeto
específico ou, ainda que se trate de decisão tomada em Pedidos de Providências,
estabelecer multa diária pelo descumprimento e medidas coercitivas como o
afastamento cautelar de servidores públicos ou diretor de estabelecimento penal.
Das decisões proferidas cabe recurso de agravo, como determina o art. 197 da LEP.
Porém, tal competência fiscalizatória, em regra direcionada às Varas
deno­minadas “Corregedoria dos Presídios”, vem sendo esvaziada através de
interpretação sem sustentação lógica ou teórica que atribui a ela natureza mera­
mente administrativa. Entre as consequências da prevalência desta interpretação,
está a exigência de consolidação de seus atos por órgão administrativo superior
do respectivo Tribunal e a fragilização da executividade das próprias decisões.
Sem meios para garantir o respeito e a execução das próprias decisões, Juízos de
Corregedoria dos Presídios limitam si mesmos ao envio de ofícios com status de
“recomendações” ao Poder Executivo. Respeitosamente, isso não faz o menor
sentido.
Quem exerce atividade de fiscalização do Poder Executivo com natureza
administrativa são os mecanismos de controle interno do próprio, tais como a
Corregedoria do Departamento Penitenciário ou a Corregedoria Geral do Estado,
ou de controle externo, como os Tribunais de Contas. O Poder Judiciário faz,
por definição, o controle judicial da legalidade de atos administrativos e garante
direitos, tendo à sua disposição todos os meios necessários para a execução de
suas decisões. Em suma, todo o denso debate sobre o controle judicial de políticas
públicas necessita ser trazido, urgentemente, ao contexto da administração
prisional.

CAPÍTULO IV

Do Ministério Público

Art. 67  O Ministério Público fiscalizará a execução da pena e da medida


de segurança, oficiando no processo executivo e nos incidentes da
execução.

160
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 68

67.1 Participação do Ministério Público na execução penal

O Ministério Público (art. 127, CF) intervém na execução como fiscal do


devido cumprimento da pena ou medida de segurança, atuando e sendo ouvido
em todos os momentos e incidentes processuais.

Art. 68  Incumbe, ainda, ao Ministério Público:


I - fiscalizar a regularidade formal das guias de recolhimento e de interna­
mento; II - requerer:
a) todas as providências necessárias ao desenvolvimento do processo
executivo;
b) a instauração dos incidentes de excesso ou desvio de execução;
c) a aplicação de medida de segurança, bem como a substituição da pena
por medida de segurança;
d) a revogação da medida de segurança;
e) a conversão de penas, a progressão ou regressão nos regimes e a revo­
gação da suspensão condicional da pena e do livramento condicional;
f) a internação, a desinternação e o restabelecimento da situação anterior.
III - interpor recursos de decisões proferidas pela autoridade judiciária,
durante a execução.
Parágrafo único. O órgão do Ministério Público visitará mensalmente os
estabelecimentos penais, registrando a sua presença em livro próprio.

68.1 Atribuições do Ministério Público na execução penal

Em rol aberto e meramente exemplificativo, as atribuições específicas do


Ministério Público na execução penal abrangem a possibilidade de requerer, entre
outras hipóteses, a progressão de regime, e inclusive interpor recursos du­rante
a execução. O que vale relevar – pois merece maior atenção no cotidiano – é a
possibilidade de atuação em prol do condenado, o qual muitas vezes não conta
com defensores públicos em número suficiente nem tampouco advogado cons­
tituído. Tal intervenção é uma forma adequada de fiscalização da regularidade
do próprio processo executivo. Destaca-se a obrigação instituída pelo parágrafo
único de visita mensal aos estabelecimentos penais, o que pode ser compreendido
como abrangendo a atribuição de fiscalização de suas condições, com livre acesso
a todos os espaços das unidades prisionais.
161
Art. 69 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

CAPÍTULO V
Do Conselho Penitenciário

Art. 69  O Conselho Penitenciário é órgão consultivo e fiscalizador da


execução da pena.
§ 1º O Conselho será integrado por membros nomeados pelo Governador
do Estado, do Distrito Federal e dos Territórios, dentre professores e
profissionais da área do Direito Penal, Processual Penal, Penitenciário
e ciências correlatas, bem como por representantes da comunidade. A
legislação federal e estadual regulará o seu funcionamento.
§ 2º O mandato dos membros do Conselho Penitenciário terá a duração
de 4 (quatro) anos.

69.1 Considerações gerais sobre o Conselho Penitenciário

Os Conselhos Penitenciários são vinculados ao Poder Executivo do respectivo


Estado, tendo seus membros indicados pelo Governador do Estado ou Distrito
Federal. Seu caráter é “consultivo e fiscalizador” da execução da pena, com perfil
semelhante àquele do CNPCP.

Art. 70  Incumbe ao Conselho Penitenciário:


I - emitir parecer sobre indulto e comutação de pena, excetuada a hipótese
de pedido de indulto com base no estado de saúde do preso; (Redação
dada pela Lei nº 10.792, de 2003) II - inspecionar os estabelecimentos e
serviços penais;
- apresentar, no 1º (primeiro) trimestre de cada ano, ao Conselho Nacional
de Política Criminal e Penitenciária, relatório dos trabalhos efetuados no
exercício anterior;
- supervisionar os patronatos, bem como a assistência aos egressos.

70.1 Atribuições do Conselho Penitenciário

A atribuição de emissão de parecer em pedidos de indulto e comutação


de pena não é obrigatória, mas depende de sua expressa previsão no respectivo
162
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 71

decreto presidencial, o que já não vem ocorrendo nas últimas edições. O rol
de atribuições é exemplificativo e abrange a prerrogativa de inspeção nos
estabelecimentos e serviços penais, bem como a supervisão dos patronatos.
Muitas vezes há também o acompanhamento e supervisão do funcionamento
dos Conselhos da Comunidade.

CAPÍTULO VI

Dos Departamentos Penitenciários

SEÇÃO I
Do Departamento Penitenciário Nacional

Art. 71  O Departamento Penitenciário Nacional, subordinado ao Minis­


tério da Justiça, é órgão executivo da Política Penitenciária Nacional e
de apoio administrativo e financeiro do Conselho Nacional de Política
Criminal e Penitenciária.

71.1 Considerações gerais sobre o Departamento Penitenciário Nacional

O Departamento Penitenciário Nacional é órgão executivo vinculado, na


atual configuração, ao Ministério da Justiça e da Segurança Pública; nos Estados,
são subordinados à secretaria encarregada da respectiva Unidade da Federação.
O DEPEN Nacional acompanha a política penitenciária em todo o País, prestando
suporte aos Estados e executando as deliberações do CNPCP; é gestor do Fundo
Penitenciário Nacional (FUNPEN), nos termos da Lei Complementar nº. 790/1994;
e além disso é responsável direto pelas penitenciárias do Sistema Penitenciário
Federal.

Art. 72  São atribuições do Departamento Penitenciário Nacional:


I - acompanhar a fiel aplicação das normas de execução penal em todo
o Território Nacional;
II - inspecionar e fiscalizar periodicamente os estabelecimentos e serviços
penais;

163
Art. 72 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

III - assistir tecnicamente as Unidades Federativas na implementação


dos princípios e regras estabelecidos nesta Lei;
IV - colaborar com as Unidades Federativas mediante convênios, na im­
plantação de estabelecimentos e serviços penais;
V - colaborar com as Unidades Federativas para a realização de cursos
de formação de pessoal penitenciário e de ensino profissionalizante do
condenado e do internado.
VI – estabelecer, mediante convênios com as unidades federativas, o
cadastro nacional das vagas existentes em estabelecimentos locais desti­
nadas ao cumprimento de penas privativas de liberdade aplicadas pela
justiça de outra unidade federativa, em especial para presos sujeitos a
regime disciplinar. (Incluído pela Lei nº 10.792, de 2003)
VII - acompanhar a execução da pena das mulheres beneficiadas pela
progressão especial de que trata o § 3º do art. 112 desta Lei, monitorando
sua integração social e a ocorrência de reincidência, específica ou não,
mediante a realização de avaliações periódicas e de estatísticas criminais.
(Incluído pela Lei nº 13.769, de 2018)
§ 1º Incumbem também ao Departamento a coordenação e supervisão
dos estabelecimentos penais e de internamento federais. (Redação dada
pela Lei nº 13.769, de 2018)
§ 2º Os resultados obtidos por meio do monitoramento e das avalia­
ções periódicas previstas no inciso VII do caput deste artigo serão
utili­zados para, em função da efetividade da progressão especial para
a ressocialização das mulheres de que trata o § 3º do art. 112 desta Lei,
avaliar eventual desnecessidade do regime fechado de cumprimento de
pena para essas mulheres nos casos de crimes cometidos sem violência
ou grave ameaça. (Incluído pela Lei nº 13.769, de 2018)
Parágrafo único. Incumbem também ao Departamento a coordenação
e supervisão dos estabelecimentos penais e de internamento federais.

72.1 Atribuições do Departamento Penitenciário Nacional

O rol exemplificativo de atribuições específicas do Departamento Peniten­


ciário Nacional indica importante papel técnico e gerencial, mas também político,
na articulação e coordenação junto aos departamentos penitenciários locais.
O prin­cipal ponto está na viabilização do repasse de recursos, mediante convênio
com as unidades federativas (inciso IV).

164
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 72

De acordo com o parágrafo único do dispositivo, incumbe também ao


Departamento Penitenciário Nacional a coordenação e supervisão dos estabeleci­
mentos penais e de internamento federais, ou seja, do chamado sistema
penitenciário federal.

72.2 Sistema penitenciário federal

O sistema penitenciário federal consiste atualmente em cinco estabelecimentos


(Porto Velho/RO, Mossoró/RN, Campo Grande/MS, Brasília/DF e Catanduvas/PR),
todos projetados sob alta tecnologia de segurança, totalizando uma capacidade de
pouco mais de mil presos. É organizado pelo Regulamento Penitenciário Federal,
estabelecido pelo Decreto nº. 6.049, de 27 de fevereiro de 2007, apresentando
tanto componentes de um “tratamento ressocializante”, tais como as políticas de
assistência, como uma estrutura voltada à neutralização de presos considerados
de “altíssima periculosidade”. A propósito, lê-se no site oficial do sistema
peni­tenciário federal que tal sistema “foi concebido para ser um instrumento
contributivo no contexto nacional da segurança pública, a partir do momento que
isola os presos considerados mais perigosos do País. Isto significa que tal institu­
cionalização veio ao encontro sociopolítico da intenção de combater a violência
e o crime organizado por meio de uma execução penal diferenciada”.
A Lei 11.671, de 8 de maio de 2008, dispõe sobre a transferência e inclusão de
presos em tais estabelecimentos. Deve-se levar em conta as alterações promo­vi­das
pela Lei 13.964/2019. O prazo de permanência, que era de 360 dias e renovável
apenas excepcionalmente, passa a ser de 3 (três) anos, renovável por iguais pe­
ríodos quando solicitado motivadamente pelo juízo de origem e se persistirem
os motivos que a determinaram. A inclusão depende da concordância tanto do
juízo de origem como do juízo federal competente, o que enseja inúmeros inci­
dentes de conflito de jurisdição no âmbito do STJ. O critério é sempre o interesse
“da segurança pública ou do próprio preso, provisório ou condenado”. No
Sistema Penitenciário Federal, a lotação máxima não será ultrapassada (art. 11,
Lei 11.671/08). Não deveria ser em lugar algum.
A evidente incompatibilidade entre objetivos de incapacitação e ressocia­
lização resulta na artificial redução dos componentes ressocializantes a uma
espécie de atitude de “redução dos próprios danos”, podendo-se mencionar, como
exemplo, a previsão de assistência psiquiátrica e psicológica acompanhando os
“eventuais efeitos psíquicos de uma reclusão severa” (art. 24, II, Dec. 6.049/07)
advinda do Regime Disciplinar Diferenciado.

165
Art. 72 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

72.3 Progressão de regime no sistema federal

Já decidiu STF e STJ que fica “suspensa” a possibilidade de progressão de


regime enquanto perdurarem as razões para inclusão do detento no sistema
penitenciário federal (STF, HC 129.509/RJ, Rel. do acórdão Min. Roberto. Barroso, j.
24/11/2015; STJ, CC 137.110/RJ, Rel. Min. Ericson Maranho, 3ª Seção, j. 22/04/2015).
Ora, todas as unidades federais são definidas como estabelecimentos de regime
fechado, como fica bem claro do art. 6º do Decreto 6.049/2007. Não se trata de um
regime disciplinar abstratamente aplicável a todos os regimes (fechado, semiaberto
ou aberto). Logo, se a pessoa presa tem deferido o direito de progressão ao regime
semiaberto, parece evidente que está cessado seu período de permanência no
sistema federal, devendo retornar ao sistema penitenciário de origem, não sendo
possível ao juízo de origem sequer rejeitar seu retorno.

72.4 Sistema disciplinar e direitos dos presos no sistema federal

A Lei 13.964/2019 introduziu mudanças significativas na regulação do


sistema penitenciário federal com a inclusão de diversos parágrafos no art. 3º
da Lei 11.671/2008. Eles trazem hipóteses de restrições de direitos das pessoas
presas, muitas já previstas para os casos de aplicação de Regime Disciplinar
Diferenciado, a saber (art. 3º, § 1º): recolhimento em cela individual (já previsto
pelo Regulamento – Decreto 6.049/2007); visita por meio virtual ou parlatório, com
filmagem e gravações; banho de sol de até 2 (duas) horas diárias ; monitoramento
de todos os meios de comunicação e a suspensão ou restrição do direito de visitas
por meio de ato fundamentado (§ 4º).
No art. 3º, § 2º, determina-se o monitoramento de áudio e vídeo no parlatório
e nas áreas comuns, “vedado seu uso nas celas e no atendimento advocatício,
salvo expressa autorização judicial em contrário”.
As restrições são graves, destacando-se a limitação de qualquer contato físico
de cônjuge, companheiro, parentes e amigos ao meio virtual ou parlatório, com
a vedação implícita da visita íntima, e a previsão de sua filmagem e gravação.
Filmar e gravar interações sociais e familiares, de natureza íntima, atingindo
terceiros que não praticaram qualquer crime, é previsão que se coloca em rota
de colisão e tensão para com os parâmetros constitucionais relativos à proteção
da intimidade (art. 5º, X, CF).

166
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 73

72.5 Proibição de contingenciamento do Fundo Penitenciário

Em importante medida cautelar, o Supremo Tribunal Federal proibiu o


contingenciamento do Fundo Penitenciário ao reconhecer o “estado de coisas
inconstitucional”: “(...) FUNDO PENITENCIÁRIO NACIONAL – VERBAS – CON­
TIN­GENCIAMENTO. Ante a situação precária das penitenciárias, o interesse público
direciona à liberação das verbas do Fundo Penitenciário Nacional. (...)” (STF, ADPF 347
MC/DF, Rel. Min. Marco Aurélio, j. 09/09/2015).

72.6 Acompanhamento das mulheres com progressão especial de regime

A Lei 13.964/2019 introduziu o inciso VII e parágrafo segundo do art. 72,


ambos relacionados à progressão especial de regime prevista no art. 112, § 3º, da
LEP. A alteração especifica ser atribuição do DEPEN nacional acompanhar a exe-
cução da pena das mulheres contempladas pela progressão, através de “avaliações
periódicas e de estatísticas criminais”, e autoriza a utilização dessas informações
para “avaliar eventual desnecessidade do regime fechado de cum­primento de
pena” nos casos de crimes cometidos sem violência ou grave ameaça. O art. 74,
parágrafo único, por fim, determina que os Departamentos Estaduais deverão
realizar tal acompanhamento e encaminhar os resultados ao Governo Federal.

SEÇÃO II
Do Departamento Penitenciário Local

Art. 73  A legislação local poderá criar Departamento Penitenciário ou


órgão similar, com as atribuições que estabelecer.

73.1 Departamento Penitenciário ou órgão similar local

A imensa maioria da população carcerária nacional está sob custódia dos


Estados e Distrito Federal, bastando notar que a capacidade de vagas do Sistema
Penitenciário Federal gira em torno a somente mil postos. É imprescindível,
portanto, que cada unidade federativa se organize e crie um DEPEN próprio ou
órgão similar, podendo inclusive haver a criação de Secretaria de Estado específica
para tratar da matéria penitenciária.

167
Art. 74 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

73.2 Polícias penais – Emenda Constitucional 104/2019

A Emenda Constitucional 104/2019 alterou o art. 144 da Constituição e inseriu


as polícias penais (VI) federal, estaduais e distrital como órgãos de segurança
pública. Segundo o texto constitucional, serão “vinculadas ao órgão administrador
do sistema penal da unidade federativa a que pertencem “, cabendo a elas “a
segu­rança dos estabelecimentos penais” (§ 5º-A).
Atendendo a antiga reivindicação da categoria dos agentes penitenciários,
a tendência é que os Estados também alterem suas Constituições e criem leis
regulamentando departamentos de polícia penal. Infelizmente, a atribuição consti­
tucional foi bastante restritiva e só tratou da segurança dos estabelecimentos
penais, não atendendo à complexidade da função idealmente exercida pelos ser­
vidores no cotidiano prisional.

Art. 74  O Departamento Penitenciário local, ou órgão similar, tem por


finalidade supervisionar e coordenar os estabelecimentos penais da
Unidade da Federação a que pertencer.
Parágrafo único. Os órgãos referidos no caput deste artigo realizarão o
acompanhamento de que trata o inciso VII do caput do art. 72 desta Lei
e encaminharão ao Departamento Penitenciário Nacional os resultados
obtidos. (Incluído pela Lei nº 13.769, de 2018)

74.1 Finalidade do Departamento Penitenciário ou órgão similar local

É do respectivo Departamento Penitenciário e Secretaria de Estado


responsável pela matéria a supervisão e coordenação dos estabelecimentos pe­
nais, bem como da construção e abertura de eventuais novas unidades prisionais.
A complexa repartição de responsabilidades entre União e Estados e DF não pode
significar, porém, a ausência de assunção de responsabilidade pelo respeito aos
direitos humanos e combate à superlotação carcerária.
A Lei 13.964/2019 incluiu parágrafo único determinando que os Depar­
tamentos Penitenciários dos Estados e DF realizem o acompanhamento das
mulheres presas que obtiverem progressão especial de regime, para os fins do
art. 72, § 2º, da LEP.

168
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 75

SEÇÃO III
Da Direção e do Pessoal dos Estabelecimentos Penais

Art. 75  O ocupante do cargo de diretor de estabelecimento deverá


satisfazer os seguintes requisitos:
- ser portador de diploma de nível superior de Direito, ou Psicologia, ou
Ciências Sociais, ou Pedagogia, ou Serviços Sociais;
- possuir experiência administrativa na área;
- ter idoneidade moral e reconhecida aptidão para o desempenho da
função.
Parágrafo único. O diretor deverá residir no estabelecimento, ou nas
proximidades, e dedicará tempo integral à sua função.

75.1 Requisitos para ocupar o cargo de diretor de estabelecimento penal

Em regra bastante criticada, a LEP não privilegia servidores do sistema


penitenciário na assunção do cargo em confiança de diretor de estabelecimento
penal, exigindo outros requisitos para o cargo: ensino superior completo em
direito, psicologia, ciências sociais, pedagogia ou serviços sociais; experiência
administrativa na área e “idoneidade moral e reconhecida aptidão para o
desempenho da função”.

Art. 76  O Quadro do Pessoal Penitenciário será organizado em dife­


rentes categorias funcionais, segundo as necessidades do serviço, com
especificação de atribuições relativas às funções de direção, chefia e
assessoramento do estabelecimento e às demais funções.

76.1 Quadro do Pessoal Penitenciário

A era do “correcionalismo penal” e sua aposta teórica na prevenção especial


positiva produziram novas funções e demandas administrativas, inserindo-
se nelas o corpo de profissionais que compõem o sistema penitenciário. Cada
unidade federativa define quais são as “divisões” e coordenações existentes
169
Art. 77 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

dentro da cada unidade penal, conforme os serviços disponíveis. O problema é


que funções originariamente voltadas à inclusão social e educacional do detento
acabam sendo ressignificadas segundo demandas meramente burocráticas e as
razões da disciplina, perdendo totalmente seu sentido inicial.

Art. 77  A escolha do pessoal administrativo, especializado, de instrução


técnica e de vigilância atenderá a vocação, preparação profissional e
antecedentes pessoais do candidato.
§ 1º O ingresso do pessoal penitenciário, bem como a progressão ou
a ascensão funcional dependerão de cursos específicos de formação,
procedendo-se à reciclagem periódica dos servidores em exercício.
§ 2º No estabelecimento para mulheres somente se permitirá o trabalho
de pessoal do sexo feminino, salvo quando se tratar de pessoal técnico
especializado.

77.1 Pessoal administrativo

A contratação de pessoal para trabalhar no sistema penitenciário demanda


requisitos que deverão ser observados nos concursos públicos e processos seletivos.
O dispositivo vai de acordo, nesse sentido, aos princípios da administração pública
e determinações insculpidos no art. 37, caput, I e II, da Constituição Federal.

77.2 Agentes penitenciários e população carcerária feminina

A previsão do parágrafo segundo, segundo a qual apenas mulheres podem


trabalhar em unidades prisionais femininas, salvo em casos de pessoal técnico
especializado, aplica-se a quaisquer situações. Logo, inclusive locais improvisados
de custódia de mulheres presas, como em delegacias de polícia, não podem ter
homens como servidores responsáveis pela sua custódia.

170
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 78

CAPÍTULO VII

Do Patronato

Art. 78  O Patronato público ou particular destina-se a prestar assistência


aos albergados e aos egressos (artigo 26).

78.1 Considerações gerais sobre o patronato

Os patronatos – que podem ser públicos ou particulares – são as instituições


criadas para atender aos egressos ou condenados em regime aberto, com funções
de orientação para a vida em liberdade e apoio estrutural, com a possibilidade
de concessão de alojamento e alimentação por até dois meses e o auxílio para
obtenção de trabalho (vide art. 25 a 27, LEP). Infelizmente, quase não há patronatos
no Brasil. A sua municipalização e vinculação a universidades é uma diretriz
importante na tentativa de construção de um sistema mais forte de promoção da
inclusão social e de fiscalização das alternativas penais.

Art. 79  Incumbe também ao Patronato:


- orientar os condenados à pena restritiva de direitos;
- fiscalizar o cumprimento das penas de prestação de serviço à
comunidade e de limitação de fim de semana;
- colaborar na fiscalização do cumprimento das condições da suspensão
e do livramento condicional.

79.1 Atribuições dos patronatos

Em rol exemplificativo, o art. 79 indica a amplitude do escopo de atuação


dos patronatos em relação às alternativas penais, em sentido amplo, podendo
abranger também alternativas penais pré-processuais, tais como medidas
cautelares alternativas à prisão (art. 319, CPP) e condições de transações penais
ou suspensão condicional do processo (Lei. 9.099/95). Como se vê, trata-se de
instituição de grande potencial, porém pouquíssimo aproveitada.

171
Art. 80 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

CAPÍTULO VIII
Do Conselho da Comunidade

Art. 80  Haverá, em cada comarca, um Conselho da Comunidade


composto, no mínimo, por 1 (um) representante de associação comercial
ou industrial, 1 (um) advogado indicado pela Seção da Ordem dos
Advogados do Brasil, 1 (um) Defensor Público indicado pelo Defensor
Público Geral e 1 (um) assistente social escolhido pela Delegacia Seccional
do Conselho Nacional de Assistentes Sociais. (Redação dada pela Lei nº
12.313, de 2010).
Parágrafo único. Na falta da representação prevista neste artigo, ficará
a critério do Juiz da execução a escolha dos integrantes do Conselho.

80.1 Considerações gerais sobre os Conselhos da Comunidade

Os Conselhos da Comunidade têm respaldo no art. 4º da própria LEP e a


finalidade de integrar a comunidade na fiscalização da execução das penas e
medidas de segurança e na obtenção de recursos para a assistência ao preso ou
internado. Na prática, há muito mais Conselhos da Comunidade do que Patronatos,
fazendo com que eles absorvam boa parte das atribuições originariamente
previstas para estes últimos. Recomenda-se também a organização de associações
ou federações de Conselhos da Comunidade que possam discutir problemas
comuns em conjunto.
O juízo de execução pode escolher os integrantes do Conselho se não houver
a indicação prevista no caput do dispositivo.

Art. 81  Incumbe ao Conselho da Comunidade:


- visitar, pelo menos mensalmente, os estabelecimentos penais existentes
na comarca;
- entrevistar presos;
- apresentar relatórios mensais ao Juiz da execução e ao Conselho
Penitenciário;

172
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 81-A

- diligenciar a obtenção de recursos materiais e humanos para melhor


assistência ao preso ou internado, em harmonia com a direção do
estabelecimento.

81.1 Atribuições do Conselho da Comunidade

Os Conselhos da Comunidade exercem importante função de controle


externo e fiscalizatório do sistema penitenciário, sendo este o sentido de “visitar”,
devendo atuar em conjunto à Defensoria Pública e ao Ministério Público na busca
por garantir a assistência ao preso ou internado e o adimplemento dos direitos
da execução penal.
Os relatórios mensais podem e devem ser remetidos também à Defensoria
Pública e ao Ministério Público, para ciência e providências cabíveis.
A Resolução nº. 10, de 8 de novembro de 2004, do Conselho Nacional de
Política Criminal e Penitenciária (CNPCP), amplia as atribuições dos Conselhos
da Comunidade. A Resolução nº. 09, de 26 de novembro de 2010, também do
CNPCP, recomenda à administração de unidades prisionais e delegacias que os
Conselhos da Comunidade “tenham acesso livre a todas as dependências”, “bem
como a todas as pessoas presas e funcionários”, sob pena de representação ao
juízo de execução penal.

CAPÍTULO IX

DA DEFENSORIA PÚBLICA
INCLUÍDO PELA LEI Nº 12.313, DE 2010

Art. 81-A  A Defensoria Pública velará pela regular execução da pena


e da medida de segurança, oficiando, no processo executivo e nos
incidentes da execução, para a defesa dos necessitados em todos os
graus e instâncias, de forma individual e coletiva. (Incluído pela Lei nº
12.313, de 2010).

173
Art. 81-B ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

81-A.1 A Defensoria Pública como órgão da execução penal

A inserção da Defensoria Pública como oitavo órgão da execução penal


representa avanço importantíssimo, atuando a instituição como verdadeira
“guardiã dos vulneráveis”, ou seja, independentemente da atuação de advogado
constituído e de forma que transcende a defesa individual.
Fundamental ressaltar que a hipossuficiência é presumida, no caso da popu­
lação carcerária, não havendo sequer a necessidade de comprovação de renda
para justificar o atendimento da Defensoria Pública.
De outro lado, a atuação coletiva permite um novo protagonismo perante
condições carcerárias precárias e casos de grave violações de direitos humanos,
inclusive por meio da impetração de habeas corpus coletivo – pela primeira vez
conhecido pelo Supremo Tribunal Federal no HC 143.641/SP, em prol de mulheres
presas provisórias gestantes ou com filhos de até 12 anos de idade –, por meio de
ações civis públicas, por atuações extrajudiciais, etc.

Art. 81-B  Incumbe, ainda, à Defensoria Pública: (Incluído pela Lei


nº 12.313, de 2010).
I – requerer: (Incluído pela Lei nº 12.313, de 2010).
a) todas as providências necessárias ao desenvolvimento do processo
executivo; (Incluído pela Lei nº 12.313, de 2010).
b) a aplicação aos casos julgados de lei posterior que de qualquer modo
favorecer o condenado; (Incluído pela Lei nº 12.313, de 2010).
c) a declaração de extinção da punibilidade; (Incluído pela Lei nº 12.313,
de 2010).
d) a unificação de penas; (Incluído pela Lei nº 12.313, de 2010).
e) a detração e remição da pena; (Incluído pela Lei nº 12.313, de 2010).
f) a instauração dos incidentes de excesso ou desvio de execução;
(Incluído pela Lei nº 12.313, de 2010).
g) a aplicação de medida de segurança e sua revogação, bem como a
substituição da pena por medida de segurança; (Incluído pela Lei nº
12.313, de 2010).
h) a conversão de penas, a progressão nos regimes, a suspensão
condicional da pena, o livramento condicional, a comutação de pena e
o indulto; (Incluído pela Lei nº 12.313, de 2010).
i) a autorização de saídas temporárias; (Incluído pela Lei nº 12.313, de
2010).
174
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 81-B

j) a internação, a desinternação e o restabelecimento da situação anterior;


(Incluído pela Lei nº 12.313, de 2010).
k) o cumprimento de pena ou medida de segurança em outra comarca;
(Incluído pela Lei nº 12.313, de 2010).
l) a remoção do condenado na hipótese prevista no § 1o do art. 86 desta
Lei; (Incluído pela Lei nº 12.313, de 2010).
II - requerer a emissão anual do atestado de pena a cumprir; (Incluído
pela Lei nº 12.313, de 2010).
III - interpor recursos de decisões proferidas pela autoridade judiciária ou
administrativa durante a execução; (Incluído pela Lei nº 12.313, de 2010).
IV - representar ao Juiz da execução ou à autoridade administrativa para
instauração de sindicância ou procedimento administrativo em caso de
violação das normas referentes à execução penal; (Incluído pela Lei nº
12.313, de 2010).
V - visitar os estabelecimentos penais, tomando providências para o
adequado funcionamento, e requerer, quando for o caso, a apuração de
responsabilidade; (Incluído pela Lei nº 12.313, de 2010).
VI - requerer à autoridade competente a interdição, no todo ou em parte,
de estabelecimento penal. (Incluído pela Lei nº 12.313, de 2010).
Parágrafo único. O órgão da Defensoria Pública visitará periodicamente
os estabelecimentos penais, registrando a sua presença em livro próprio.
(Incluído pela Lei nº 12.313, de 2010).

81-B.1 Atribuições da Defensoria Pública como órgão da execução penal

Em rol exemplificativo, o art. 81-B lista várias atribuições típicas da


Defensoria Pública como órgão da execução penal, podendo requerer todo tipo
de providências em favor da pessoa presa, incluindo recursos (incisos I e III), a
emissão não apenas anual, mas a qualquer tempo, do atestado de pena a cumprir
(inciso II), a atuação administrativa de fiscalização da legalidade (inciso IV) e a
atividade fiscalizatória em relação aos estabelecimentos penais (incisos V e VII,
e parágrafo único).

175
Art. 81-B ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

81-B.2 Modalidades de visita e abrangência da atribuição de inspeção

A utilização do verbo “visitar” (inciso V), ao invés de “inspecionar”, tem


pouca relevância prática, sendo este o único sentido possível que pode ser extraído
de uma interpretação lógica e coerente. Afinal, se o objetivo é tomar providências,
requerer apuração de responsabilidade, requerer a interdição do estabelecimento,
não faz sentido em se limitar a forma de atuação da Defensoria Pública a uma
mera visita protocolar. Pode-se dizer que há duas modalidades de visita: a visita
para inspecionar e a visita para atender o preso22. A visita independe de prévio
agendamento e pode alcançar todos os espaços da unidade (art. 18, X; art. 44, VII;
art. 64, X; art. 89, VII; art. 108, IV e art. 128, VI, todos da Lei Complementar 80/94).

22
Sobre, v. PAIVA, Caio. Prática Penal para Defensoria Pública, p. 332-338.

176
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 82

TÍTULO IV
Dos Estabelecimentos Penais

CAPÍTULO I

Disposições Gerais

Art. 82  Os estabelecimentos penais destinam-se ao condenado, ao


submetido à medida de segurança, ao preso provisório e ao egresso.
§ 1° A mulher e o maior de sessenta anos, separadamente, serão
recolhidos a estabelecimento próprio e adequado à sua condição pessoal.
(Redação dada pela Lei nº 9.460, de 1997)
§ 2º O mesmo conjunto arquitetônico poderá abrigar estabeleci­mentos
de destinação diversa desde que devidamente isolados.

82.1 Considerações gerais sobre os estabelecimentos penais

A LEP passa a estabelecer quais são os estabelecimentos penais legítimos


para a custódia de pessoas presas, tratando-se, em suma, das penitenciárias, das
colônias agrícolas, industriais ou similares, das casas de albergado, dos centros
de observação, dos hospitais de custódia e tratamento psiquiátrico e das cadeias
públicas. Não estão incluídos, no rol, carceragens em delegacias de polícia, as
quais não devem, em hipótese alguma, serem ativadas ou mesmo denominadas
de “cadeias públicas”.

82.2 Judicialização da obrigação de construir e reformar estabelecimentos


penais

Em importante decisão, entendeu o STF que: “É lícito ao Poder Judiciário


impor à Administração Pública obrigação de fazer, consistente na promoção de medidas
ou na execução de obras emergenciais em estabelecimentos prisionais para dar efetividade
ao postulado da dignidade da pessoa humana e assegurar aos detentos o respeito à sua
integridade física e moral, nos termos do que preceitua o art. 5º, XLIX, da CF, não sendo
oponível à decisão o argumento da reserva do possível nem o princípio da separação dos
poderes” (STF, RE 592581/RS, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, j. 13.08.2015).

177
Art. 83 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

82.3 Limite ao sentido de “estabelecimento de destinação diversa”

O parágrafo segundo permite que um mesmo conjunto arquitetônico abrigue


estabelecimentos de destinações diversas, desde que devidamente isolados. A au­
to­rização deve ser interpretada nos limites do art. 5º, XLVIII, da CF, e serve apenas
para complexos penitenciários com vários presídios, e não para que, dentro de
um mesmo estabelecimento, coloque-se junto públicos que não podem conviver.
Nesse sentido, inclusive, a jurisprudência dos Tribunais Superiores: “O inimputável
submetido à medida de segurança de internação em hospital de custódia e tratamento
psiquiátrico não pode permanecer em estabelecimento prisional comum, ainda que sob a
justificativa de ausência de vagas ou falta de recursos estatais” (STJ, HC 231.124/SP,
Rel. Min. Laurita Vaz, 5ª T., j. 23/04/2013).
É ilegal, da mesma forma, manter presos em regime semiaberto em
penitenciárias ou cadeias públicas, ainda que adequadas as regras e condições,
tratando-se de violação da Súmula Vinculante nº. 56/STF e dos termos do RE
641.320, que garantem direito à prisão domiciliar ou a adoção de outras medidas
de abertura de vagas no caso de ausência de vagas no regime semiaberto.

Art. 83  O estabelecimento penal, conforme a sua natureza, deverá contar


em suas dependências com áreas e serviços destinados a dar assistência,
educação, trabalho, recreação e prática esportiva.
§ 1º Haverá instalação destinada a estágio de estudantes universitários.
(Renumerado pela Lei nº 9.046, de 1995)
§ 2º Os estabelecimentos penais destinados a mulheres serão dotados
de berçário, onde as condenadas possam cuidar de seus filhos, inclusive
amamentá-los, no mínimo, até 6 (seis) meses de idade. (Redação dada
pela Lei nº 11.942, de 2009)
§ 3º Os estabelecimentos de que trata o 2º deste artigo deverão possuir,
exclusivamente, agentes do sexo feminino na segurança de suas
dependências internas. (Incluído pela Lei nº 12.121, de 2009).
§ 4º Serão instaladas salas de aulas destinadas a cursos do ensino básico
e profissionalizante. (Incluído pela Lei nº 12.245, de 2010)
§ 5º Haverá instalação destinada à Defensoria Pública. (Incluído pela Lei
nº 12.313, de 2010).

178
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 83-A

83.1 Parâmetros mínimos para a construção de estabelecimento penal

O art. 83 traz parâmetros mínimos que devem ser necessariamente


observados na construção de qualquer estabelecimento penal: espaço para
assistência, educação, trabalho, recreação, prática esportiva, estágio de estudantes
universitários, berçário em unidades femininas, salas de aula e instalação destinada
à Defensoria Pública.
A previsão de berçários que possibilitem a amamentação de bebês até que
completem, no mínimo, seis meses de idade, cumpre disposição constitucional (art.
5º, L, CF). De todo modo, a tendência é o desencarceramento das mulheres presas
nessa situação, através da ampliação do uso da prisão domiciliar e mecanismos
de monitoração eletrônica.
É atribuição do CNPCP estabelecer regras sobre a arquitetura e construção
de estabelecimentos penais e casas de albergados, contemplando as diretrizes
mínimas deste dispositivo. Trata-se de matéria controversa e que costuma suscitar
polêmicas, entre o anseio de um modelo arquitetônico ideal e a dificuldade de
adaptação dos Estados na elaboração dos respectivos projetos. A atual Resolução
que trata do assunto é a nº. 9, de 18 de novembro de 2011, modificada pelas
Resoluções 06/2017 e 02/2018.

Art. 83-A  Poderão ser objeto de execução indireta as atividades


materiais acessórias, instrumentais ou complementares desenvolvidas
em estabelecimentos penais, e notadamente: (Incluído pela Lei nº 13.190,
de 2015).
- serviços de conservação, limpeza, informática, copeiragem, portaria,
recepção, reprografia, telecomunicações, lavanderia e manutenção de
prédios, instalações e equipamentos internos e externos; (Incluído pela
Lei nº 13.190, de 2015).
- serviços relacionados à execução de trabalho pelo preso. (Incluído pela
Lei nº 13.190, de 2015).
§ 1º A execução indireta será realizada sob supervisão e fiscalização do
poder público. (Incluído pela Lei nº 13.190, de 2015).
§ 2º Os serviços relacionados neste artigo poderão compreender o
fornecimento de materiais, equipamentos, máquinas e profissionais.
(Incluído pela Lei nº 13.190, de 2015).

179
Art. 83-B ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

83-A.1 Execução indireta de atividades desenvolvidas em estabelecimentos


penais

A regra é oriunda de conversão em lei da Medida Provisória nº. 678/2015,


visando agilizar e conferir celeridade às licitações e contratos envolvendo
“atividades materiais, acessórias, instrumentais ou complementares” em
estabelecimentos penais, por meio da contratação de terceiros sob algum dos
regimes indicados no art. 6º, VIII, “a” a “e”, da Lei 8.666/1993. Em qualquer hipó­
tese, a execução indireta terá a supervisão e fiscalização do poder público.

Art. 83-B  São indelegáveis as funções de direção, chefia e coordenação


no âmbito do sistema penal, bem como todas as atividades que exijam
o exercício do poder de polícia, e notadamente: (Incluído pela Lei nº
13.190, de 2015).
I - classificação de condenados; (Incluído pela Lei nº 13.190, de 2015).
II - aplicação de sanções disciplinares; (Incluído pela Lei nº 13.190, de
2015).
III - controle de rebeliões; (Incluído pela Lei nº 13.190, de 2015).
IV - transporte de presos para órgãos do Poder Judiciário, hospitais e
outros locais externos aos estabelecimentos penais. (Incluído pela Lei
nº 13.190, de 2015).

83-B.1 Funções indelegáveis no âmbito do sistema penal

Estabelecendo limites à possibilidade aberta pelo artigo anterior, aqui se


define como indelegáveis as funções de direção, chefia, coordenação e quaisquer
atividades envolvendo poder de polícia, sobretudo a classificação de condenados, a
aplicação de sanções disciplinares, o controle de rebeliões e o transporte de presos.

Art. 84  O preso provisório ficará separado do condenado por sentença


transitada em julgado.
§ 1º Os presos provisórios ficarão separados de acordo com os seguintes
critérios: (Redação dada pela Lei nº 13.167, de 2015)

180
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 84

I - acusados pela prática de crimes hediondos ou equiparados; (Incluído


pela Lei nº 13.167, de 2015)
II - acusados pela prática de crimes cometidos com violência ou grave
ameaça à pessoa; (Incluído pela Lei nº 13.167, de 2015)
III - acusados pela prática de outros crimes ou contravenções diversos
dos apontados nos incisos I e II. (Incluído pela Lei nº
13.167, de 2015)
§ 2° O preso que, ao tempo do fato, era funcionário da Administração da
Justiça Criminal ficará em dependência separada.
§ 3º Os presos condenados ficarão separados de acordo com os seguintes
critérios: (Incluído pela Lei nº 13.167, de 2015)
I - condenados pela prática de crimes hediondos ou equiparados;
(Incluído pela Lei nº 13.167, de 2015)
II - reincidentes condenados pela prática de crimes cometidos com
violência ou grave ameaça à pessoa; (Incluído pela Lei nº 13.167, de 2015)
III - primários condenados pela prática de crimes cometidos com
violência ou grave ameaça à pessoa; (Incluído pela Lei nº
13.167, de 2015)
IV - demais condenados pela prática de outros crimes ou contravenções
em situação diversa das previstas nos incisos I, II e III. (Incluído pela Lei
nº 13.167, de 2015)
§ 4º O preso que tiver sua integridade física, moral ou psicológica
ameaçada pela convivência com os demais presos ficará segregado em
local próprio. (Incluído pela Lei nº 13.167, de 2015)

84.1 Separação de presos

Como todas as disposições legais e constitucionais referentes à individua­


lização executória da pena e à separação de presos conforme classificação
pretensamente científica e objetiva, o dispositivo carece de factibilidade em sua
aplicação. O que se vê na prática são presos condenados e provisórios misturados
em muitos estabelecimentos penais, por conta da superlotação carcerária e da
prevalência de um critério de segurança – da unidade e dos próprios presos – na
alocação nas celas e galerias, desvinculando-se, portanto, do tipo penal objeto
da condenação. Ou seja, somente o parágrafo quarto é efetivamente aplicado,
prevalecendo sobre todos os demais. Com a forte presença de grupos organizados
no interior do sistema penitenciário e o risco adicional que correm condenados por
crimes sexuais, na prática este é o único verdadeiro critério de alocação de presos.
181
Art. 85 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

Art. 85  O estabelecimento penal deverá ter lotação compatível com a


sua estrutura e finalidade.
Parágrafo único. O Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária
determinará o limite máximo de capacidade do estabelecimento,
atendendo a sua natureza e peculiaridades.

85.1 Princípios do numerus clausus ou da capacidade taxativa dos presídios

O artigo 85 é de enorme relevância, em face do crescente debate sobre o


princípio do numerus clausus ou capacidade taxativa dos presídios23. Trata-se,
afinal, do marco legal que define a impossibilidade de se ultrapassar a capacidade
de vagas do estabelecimento penal, limite este a ser definido pelo Conselho
Nacional de Política Criminal e Penitenciária, e não pela própria autoridade
penitenciária ou pela Administração local.

85.2 Numerus clausus nos regimes semiaberto e aberto: Súmula Vinculante


nº. 56/STF e Recurso Extraordinário 641.320/RS

Em relação aos regimes semiaberto e aberto, posição minoritária considera


a ausência de vagas “motivo de força maior”, justificando o suporte do ônus pelo
indivíduo através de sua manutenção em regime mais severo. Mas o entendimento
jurisprudencial prevalente resolve o conflito a favor do condenado, considerando
que a inadimplência do Estado não pode ser suportada pelo indivíduo. Essa
já é a posição da Súmula Vinculante nº. 56, do STF, segundo a qual “a falta de
estabelecimento penal adequado não autoriza a manutenção do condenado em regime
prisional mais gravoso, devendo-se observar, nessa hipótese, os parâmetros fixados no
RE 641.320/RS”.
A ementa do acórdão ali mencionado trouxe, nessa esteira, algumas possi­
bilidades: “Havendo déficit de vagas, deverão ser determinados: (i) a saída antecipada de
sentenciado no regime com falta de vagas; (ii) a liberdade eletronicamente monitorada ao
sentenciado que sai antecipadamente ou é posto em prisão domiciliar por falta de vagas;

23
V. texto que abre o debate no Brasil sobre o assunto: ROIG, Rodrigo Duque Estrada. “Um princípio
para a execução penal: numerus clausus”. Revista Liberdades, n. 15, São Paulo: IBCCRIM, 2014,
p. 104-120.

182
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 85

(iii) o cumprimento de penas restritivas de direito e/ou estudo ao sentenciado que progride
ao regime aberto. Até que sejam estruturadas as medidas alternativas propostas, poderá
ser deferida a prisão domiciliar ao sentenciado”. (STF, RE 641320, Rel. Min. Gilmar
Mendes, Tribunal Pleno, julgamento em 11.5.2016, DJe de 8.8.2016).

85.3 Numerus clausus no regime fechado

Até aqui, a jurisprudência sobre a aplicação do princípio numerus clausus


em regime fechado tem sido tímida e se restringido às situações nas quais razões
de caráter humanitário podem prevalecer na repartição do ônus pelo Estado,
permitindo a prisão domiciliar com fundamento no princípio da dignidade da
pessoa humana.

85.4 Execução de penas como política pública passível de controle judicial

É possível cogitar a intervenção por meio de ação civil pública ou habeas


corpus coletivo em situações de violação extrema e flagrante de direitos humanos,
ampliando-se enfim a compreensão injustificavelmente restritiva dos conceitos
de “constrangimento ilegal” e “ato coator” como noções apenas ligadas a casos
individuais. Nesse sentido, justamente, é exemplar o caso do jornalista argentino
Horacio Verbitsky, que em 2005 ajuizou ação coletiva em prol de todos os presos
em carceragens superlotadas de delegacias de polícia de Buenos Aires. A Suprema
Corte Argentina, na ocasião, entre outras medidas, determinou prazo de sessenta
dias para que os tribunais e juízos competentes fizessem cessar as situações de
tratamento desumano e degradante, e que o Poder Executivo da Província de
Buenos Aires informasse os juízes sobre as condições concretas das celas e prisões
referidas. Em 2018, o STF conheceu, pela primeira vez, de um habeas corpus coletivo
em matéria penitenciária, determinando a substituição da prisão preventiva pela
domiciliar “de todas as mulheres presas gestantes, puérperas, ou mães de crianças
e deficientes sob sua guarda” (STF, HC 143.641, Rel. Min. Ricardo Lewandovski,
2ª T., j. 20.02.2018).

85.5 Ilegalidade da prisão decorrente das condições de custódia e


necessidade de relaxamento

Os mesmos fundamentos já acolhidos pelos Tribunais Superiores para a


concessão de prisão domiciliar como forma de tutela da dignidade humana,
183
Art. 85 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

somados à vedação constitucional de penas cruéis (art. 5º, XVII, e, CF), são
inteiramente aplicáveis às condições estruturais do sistema penitenciário
brasileiro. A rigor, no Brasil sequer está claro qual seria o juízo competente para
esse tipo de decisão, ou seja, para concretização do necessário controle judicial
da política pública prisional. Aparentemente, ainda se entende que apenas o juiz
que decretou a prisão é que poderia decidir pela soltura, reduzindo a análise da
legalidade da prisão às condições em abstrato de sua decretação. Fica excluído
do conceito de legalidade, por consequência, a análise das condições materiais de
custódia, tratadas como matéria meramente administrativa e não sujeita a controle
judicial. Uma posição insustentável, mas o que explica que estabelecimentos
interditados por decisão judicial (em ações civis públicas, por exemplo) continuem
custodiando pessoas presas sem que isso seja uma violação ao art. 5º, LXV, da
Constituição (“a prisão ilegal será imediatamente relaxada pela autoridade judiciária”)?

85.6 Súmula Vinculante 56 e a jurisprudência dos Tribunais Superiores

A jurisprudência do STF tem se mostrado reticente quanto ao uso da


Reclamação como instrumento nos casos de violação a Súmula Vinculante: “(…) o
Plenário já assentou que a cassação ou revisão das decisões dos juízes contrárias à
orientação firmada em sede de repercussão geral há de ser feita pelo tribunal a que
estiverem vinculados, pela via recursal ordinária. […] Nada autoriza ou aconselha
que se substituam as vias recursais ordinária e extraordinária pela reclamação
(Rcl 10.793/SP, Rel. Min. Ellen Gracie). No mesmo sentido: Rcl 9.302 AgR/PE, Rel.
Min. Dias Toffoli; Rcl 12.600 AgR/SP, Rel. Min. Ricardo Lewandowski. (…)” (STF,
MC na Recl 26.449/MG, Rel. Min. Barroso, j. 01/03/2017).
No caso da SV nº. 56, a jurisprudência é majoritariamente contrária à
concessão automática de prisão domiciliar ou antecipação do regime aberto (STF,
HC 141.648, Rel. Min. Marco Aurélio, red. p/ o ac. Roberto Barroso, j. 16/10/2018;
Rcl 31.685, Rel. Min. Luiz Fux, j. 15/10/2018; Rcl 29.410, Rel. Min. Marco Aurélio,
j. 15/05/2018). Nesse último caso, a decisão afirmou “cumprir aos juízes da
execução penal – considerada, inclusive, a instância recursal – a avaliação quanto
à conformação do estabelecimento ao regime imposto, descabendo ao Supremo
adentrar a problemática. No caso, havendo o Tribunal de Justiça reconhecido a
existência de local apropriado, nas instalações da Penitenciária, para a custódia
do reclamante, no que garantido inclusive o trabalho externo, tendo em vista o
regime semiaberto, surge ausente contrariedade ao paradigma”.
O posicionamento enfraquece significativamente a autoridade do próprio STF
e sua súmula vinculante, se o juízo decisivo sobre o sentido de estabelecimento
184
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 85

“adequado” fica a cargo da autoridade jurisdicional estadual. Vale notar que essa
o conteúdo dessa súmula é destinado precipuamente a orientar o Judiciário local,
não apenas o Poder Executivo.
E se o Juízo ou Tribunal estadual “delegar” mais uma vez tal análise para
a autoridade administrativa? Em importante decisão, o STF deferiu liminar em
decisão monocrática e determinou a prisão domiciliar em situação de ausência
de vagas em estabelecimento adequado para o regime semiaberto: “(...) Em cog­
nição sumária, há indícios de violação ao enunciado da súmula vinculante 56
quando o Juízo deixa de analisar pedido de condenado ao cumprimento da pena
em regime semiaberto para que seja colocado em prisão domiciliar, em razão
da ausência de vagas no regime adequado. (...) a meu ver, caberia à autoridade
reclamada apreciar o pedido de colocação em prisão domiciliar enquanto não
houvesse vaga no estabelecimento adequado ao cumprimento da pena em regime
semiaberto. Não pode o magistrado se negar a decidir questão cuja não apreciação
implica constrangimento ilegal, ao fundamento de que tal análise caberia a
órgão administrativo. Ao quedar-se inerte, a autoridade reclamada permite que
o reclamante cumpra pena em regime mais gravoso do que o determinado na
sentença, o que é vedado pela súmula vinculante n. 56” (STF, Recl. 32.055/SP, Rel.
Min. Roberto Barroso, j. 02/10/2018).
Também julgando procedente a Reclamação e determinando a colocação
imediata em estabelecimento adequado diverso do regime fechado, há outras
decisões do STF. Por exemplo: “(...) julgo procedente a reclamação, para determinar
que o juízo reclamado encaminhe a reclamante para o regime de cumprimento de
pena adequado, diverso do regime fechado, ou aplique medidas alternativas, nos
termos do que foi decidido no RE 641.320/RS por esse Supremo Tribunal Federal”
(STF, Rcl. 27.463, Rel. Min. Roberto Barroso, j. 03/04/2019).
O Superior Tribunal de Justiça, por sua vez, firmou tese em sede de recurso
repetitivo no seguinte sentido: “A inexistência de estabelecimento penal adequado
ao regime prisional determinado para o cumprimento da pena não autoriza a
concessão imediata do benefício da prisão domiciliar, porquanto, nos termos
da Súmula Vinculante n° 56, é imprescindível que a adoção de tal medida seja
precedida das providências estabelecidas no julgamento do RE n° 641.320/RS, quais
sejam: (i) saída antecipada de outro sentenciado no regime com falta de vagas,
abrindo-se, assim, vagas para os reeducandos que acabaram de progredir; (ii) a
liberdade eletronicamente monitorada ao sentenciado que sai antecipadamente
ou é posto em prisão domiciliar por falta de vagas; e (iii) cumprimento de penas
restritivas de direitos e/ou estudo aos sentenciados em regime aberto” (STJ, REsp
1.710.674/MG, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, j. 22/08/2018).

185
Art. 85 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

85.7 Numerus Clausus e sistema socioeducativo

Em decisão paradigmática importantíssima, o STF concedeu liminar em


Habeas Corpus Coletivo relativo à Unidade de Internação Regional Norte em
Linhares/ES, determinando taxa de ocupação máxima em 119%, devendo os
adolescentes sobressalentes ser transferidos para outras unidades. Não sendo
possível, determinou a inclusão dos adolescentes em programas de meio aberto,
nos termos da Lei 12.594/2012, ou a conversão das medidas de internação em
internações domiciliares. O percentual de 119% foi extraído da taxa média de
ocupação dos internos de 16 estados, aferido pelo Conselho Nacional do Ministério
Público em 2013. Em 2019, os efeitos da decisão foram ampliados para abarcar as
unidades de internação de adolescentes dos Estados do Ceará, Bahia, Pernambuco
e Rio de Janeiro (STF, Ag no HC 143.988/ES, j 16/08/2018, com efeitos ampliados
em 23/05/2019).
Embora a decisão diga respeito aos adolescentes em conflito com a lei, o que
invoca a prioridade absoluta com base constitucional no art. 227 da CF, a decisão
é uma demonstração da viabilidade de aplicação do princípio do numerus clausus
também no sistema penitenciário. Afinal, a proteção máxima garantida pelo art.
227 da CF não guarda uma relação de prejudicialidade com a vedação às penas
cruéis (art. 5º, XLVII, e, CF), também garantida pela Constituição, e fragilizada
pela superlotação.

85.8 Numerus Clausus e a criação de central de vagas no sistema


socioeducativo (Resolução 367/2021-CNJ)

A Resolução 367, de 2021, do Conselho Nacional de Justiça, é um passo


importante na consolidação da legalidade quanto às condições de custódia no
sistema socioeducativo. Dispõe ela: “A Central de Vagas, de competência do Poder
Executivo, será responsável por receber e processar as solicitações de vagas formuladas
pelo Poder Judiciário, cabendo-lhe indicar a disponibilidade de alocação de adolescente em
unidade de atendimento ou, em caso de indisponibilidade, sua inclusão em lista de espera
até a liberação de vaga adequada à medida aplicada” (art. 2º, parágrafo único).
Cabe ao Poder Judiciário, portanto, após proferir decisão que implica inter­
nação em unidade socioeducativa ou semiliberdade, solicitar vaga ao Poder Execu­
tivo levando em conta “os critérios de disponibilidade de vaga, proximidade
familiar, local do ato infracional, idade, gravidade e reiteração do ato infracional”
(art. 7º, § 1º). Caso não haja vaga disponível, o adolescente será colocado em
lista de espera. O mandado de busca e apreensão será expedido somente após
recebimento da informação da disponibilidade de vaga (art. 10).

186
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 85

85.9 A “cifra oculta” da superlotação (art. 85, parágrafo único, LEP)

É comum a crítica quanto à credibilidade da estatística penitenciária no


Brasil, mas é estranhamente raro o questionamento do dado mais obscuro quando
o assunto é superlotação carcerária: quais critérios são utiizados para definição
da capacidade máxima de vagas de cada unidade prisional.
O art. 85, parágrafo único, da LEP, dispõe que o limite máximo de capacidade
de cada estabelecimento prisional será determinado por ato do Conselho Nacional
de Política Criminal e Penitenciária. Esta atribuição não se confunde com aquela
para estabelecimento de diretrizes para a arquitetura prisional.
A Resolução 5/2016, do CNPCP, trouxe diretrizes importantes, mas não
suficientes. Seu artigo 3º delega “ao dirigente máximo do órgão responsável
pelo sistema prisional para determinar, por Resolução conjunta com o Presidente
do Conselho Penitenciário do Estado, o limite máximo da capacidade de cada
estabelecimento penal”, com posterior encaminhamento ao CNPCP para
consolidação dos dados. Tudo indica, porém, que esta norma legal é ignorada,
não havendo notícia de atos similares estabelecendo a capacidade máxima dos
estabelecimentos.
Na prática, a informação sobre a capacidade de vagas é produzida unilate­
ralmente pelos Departamentos Penitenciários dos Estados, sem controle externo.
Afinal, o que faz uma vaga? O que autoriza a ampliação unilateral da
capacidade de vagas apenas pela inclusão de mais pessoas presas em uma mesma
cela? A Resolução 367/2021-CNJ mencionada no tópico anterior, voltada ao sistema
socioeducativo, define “vaga” como “fração correspondente à capacidade de acomodação
de um adolescente dentro de uma unidade socioeducativa a partir dos parâmetros da norma
do Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo” (art. 4º, I).
De acordo com o art. 4º, § 2º, da Resolução 5/2016-CNPCP, é vedado
estabelecer limite máximo que exceda o número de camas individuais disponíveis
no estabelecimento penal, sendo proibido incluir no cômputo do limite máximo
o número de colchões improvisados no chão do estabelecimento penal. A
Resolução também determina que, se a superlotação ultrapassar o índice de
137,5% da capacidade, o Poder Executivo deve oficiar o Grupo de Monitoramento
e Fiscalização (GMF) do respectivo Tribunal para que sejam tomadas providências
e apresentação de um plano de redução da superlotação, inclusive com antecipação
de direitos da execução (art. 5º). Nas unidades masculinas com excesso de 10%
da capacidade já deve haver comunicação formal do diretor ao Juízo de Execução
Penal, ao GMF e ao Conselho Penitenciário local. Nas unidades femininas, a
Resolução veda qualquer ultrapassagem da capacidade (art. 6º).
187
Art. 86 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

Estas diretrizes, porém, dizem respeito à análise global do número de pessoas


presas e capacidade de vagas. Permanece em aberto, além da importante regra do
art. 4º, § 2º, quais seriam os parâmetros mínimos de dignidade para definição do
que pode ser aceito como uma vaga e qual seria o fluxo de controle externo por
Poder Judiciário, Defensoria Pública e Ministério Público, além do próprio CNPCP,
quanto às informações sobre a capacidade máxima de cada estabelecimento.

Art. 86  As penas privativas de liberdade aplicadas pela Justiça de


uma Unidade Federativa podem ser executadas em outra unidade, em
estabelecimento local ou da União.
§ 1º A União Federal poderá construir estabelecimento penal em local
distante da condenação para recolher os condenados, quando a medida
se justifique no interesse da segurança pública ou do próprio condenado.
(Redação dada pela Lei nº
10.792, de 2003)
§ 2° Conforme a natureza do estabelecimento, nele poderão trabalhar
os liberados ou egressos que se dediquem a obras públicas ou ao apro­
veitamento de terras ociosas.
§ 3º Caberá ao juiz competente, a requerimento da autoridade
administrativa definir o estabelecimento prisional adequado para abrigar
o preso provisório ou condenado, em atenção ao regime e aos requisitos
estabelecidos. (Incluído pela Lei nº 10.792, de 2003)

86.1 Flexibilização da competência na execução da pena

Não há vinculação necessária entre o juízo material e territorialmente


competente no processo de conhecimento, responsável pela condenação, e o local
de execução da pena privativa de liberdade. O parágrafo primeiro traz fundamento
legal para a criação do Sistema Penitenciário Federal (vide comentários ao artigo
72). O parágrafo terceiro deixa claro se tratar de competência jurisdicional, e
não meramente administrativa, a definição do estabelecimento prisional mais
adequado. Eventuais requerimentos de transferência, por exemplo, devem ser
analisados pelo juízo de execução, não se tratando de matéria afeita apenas ao
DEPEN local.

188
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 87

CAPÍTULO II

Da Penitenciária

Art. 87  A penitenciária destina-se ao condenado à pena de reclusão,


em regime fechado.
Parágrafo único. A União Federal, os Estados, o Distrito Federal e os
Territórios poderão construir Penitenciárias destinadas, exclusivamente,
aos presos provisórios e condenados que estejam em regime fechado,
sujeitos ao regime disciplinar diferenciado, nos termos do art. 52 desta
Lei. (Incluído pela Lei nº 10.792, de 2003)

87.1 Considerações gerais sobre as penitenciárias

A penitenciária é o estabelecimento adequado para cumprimento de penas


privativas de liberdade em regime fechado, ou seja, para condenados. A exceção
prevista no parágrafo único se dá por conta da ideia de construção de uma
penitenciária específica para presos em regime disciplinar diferenciado, podendo,
nesse caso, ser provisórios ou condenados.

Art. 88  O condenado será alojado em cela individual que conterá


dormitório, aparelho sanitário e lavatório. Parágrafo único. São requisitos
básicos da unidade celular:
a) salubridade do ambiente pela concorrência dos fatores de aeração,
insolação e condicionamento térmico adequado à existência humana;
b) área mínima de 6,00m2 (seis metros quadrados).

88.1 Características da cela individual para alojamento do preso

Em mais um dispositivo inaplicado e inaplicável em um quadro de


superlotação carcerária, prevê-se cela individual com área mínima de 6 metros
quadrados. Não se conhece unidade prisional no País em que as celas, salvo
aquelas destinadas para a sanção disciplinar de isolamento, sejam individuais.

189
Art. 89 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

88.2 Celas modulares de concreto

Já rejeitou o STJ a utilização de celas modulares de concreto (“contêineres”)


para custódia de pessoas presas: “1. Se se usa contêiner como cela, trata-se de uso
inadequado, inadequado e ilegítimo, inadequado e ilegal. Caso de manifesta ilegalidade.
2. Não se admitem, entre outras penas, penas cruéis – a prisão cautelar mais não é do que
a execução antecipada de pena (Cód. Penal, art. 42). 3. Entre as normas e os princípios do
ordenamento jurídico brasileiro, estão: dignidade da pessoa humana, prisão somente com
previsão legal, respeito à integridade física e moral dos presos, presunção de inocência,
relaxamento de prisão ilegal, execução visando à harmônica integração social do condenado
e do internado. 4. Caso, pois, de prisão inadequada e desonrante; desumana também.
5. Não se combate a violência do crime com a violência da prisão. 6. Habeas corpus deferido,
substituindo-se a prisão em contêiner por prisão domiciliar, com extensão a tantos quantos
– homens e mulheres – estejam presos nas mesmas condições” (STJ, HC 142.513/ES,
6ª T., Rel. Min. Nilson Naves, j. 23.03.2010)

Art. 89  Além dos requisitos referidos no art. 88, a penitenciária de


mulheres será dotada de seção para gestante e parturiente e de creche
para abrigar crianças maiores de 6 (seis) meses e menores de 7 (sete)
anos, com a finalidade de assistir a criança desamparada cuja responsável
estiver presa. (Redação dada pela Lei nº 11.942, de 2009)
Parágrafo único. São requisitos básicos da seção e da creche referidas
neste artigo: (Incluído pela Lei nº 11.942, de 2009)
I – atendimento por pessoal qualificado, de acordo com as diretrizes
adotadas pela legislação educacional e em unidades autônomas; e
(Incluído pela Lei nº 11.942, de 2009)
II – horário de funcionamento que garanta a melhor assistência à criança
e à sua responsável. (Incluído pela Lei nº 11.942, de 2009)

89.1 Creche em penitenciária feminina

A previsão de creche para abrigar crianças de até 7 anos de idade também


é coerente à disposição constitucional (art. 5º, L, CF), mas a tendência é o desen­
carceramento das mulheres presas nessa situação, através da ampliação do uso
da prisão domiciliar e mecanismos de monitoração eletrônica; ou mesmo da
colocação da criança com membros da família extensa.
190
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 90

A decisão deve ser orientada pelo melhor interesse da criança, nos termos
do Estatuto da Criança e do Adolescente e da Lei 13.257/2016, a qual dispõe sobre
políticas públicas para a primeira infância. É importante sempre lembrar que
a condição de presa da genitora não justifica, por si só, a destituição do poder
familiar e o encaminhamento da criança para adoção, mormente se entre elas
houver vínculo afetivo.

Art. 90  A penitenciária de homens será construída, em local afastado


do centro urbano, à distância que não restrinja a visitação.

90.1 Localização da penitenciária masculina

Ao contrário das penitenciárias oitocentistas, em regra construídas no centro


das cidades, o declínio das prisões é simbolicamente representado pela regra que
determina sua construção fora dos olhos do público e dos centros urbanos. Acaba-
se por prejudicar e atingir, diretamente, os familiares das pessoas presas, embora
o próprio dispositivo peça distância que não restringe a visitação.

CAPÍTULO III
Da Colônia Agrícola, Industrial ou Similar

Art. 91  A Colônia Agrícola, Industrial ou Similar destina-se ao cumpri­


mento da pena em regime semi-aberto.

91.1 Considerações gerais sobre os estabelecimentos penais destinados ao


regime semiaberto

Os estabelecimentos penais de regime semiaberto são de segurança mínima,


permitindo a circulação moderada dos presos em seu interior, sem algemas, e com
maior flexibilidade para comunicação com o mundo exterior, inclusive por meio
de trabalho externo e saídas temporárias. Permite-se ainda o cumprimento do
regime semiaberto em regime de monitoração eletrônica, sobretudo em Estados
que não contam com os estabelecimentos descritos ou quando eles se encontrarem
superlotados.
191
Art. 92 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

91.2 Inexistência de estabelecimento de regime semiaberto e prisão


domiciliar

É ilegal e contraria posição consolidada pela Súmula Vinculante nº. 56/STF a


manutenção de presos que têm direito ao regime semiaberto em estabelecimento
de regime fechado, ainda que se alegue proceder a adaptações. Permite-se, nesses
casos, a prisão domiciliar. A SV estabelece que “a falta de estabelecimento penal
adequado não autoriza a manutenção do condenado em regime prisional mais gravoso,
devendo-se observar, nessa hipótese, os parâmetros fixados no RE 641.320/RS”.

Art. 92  O condenado poderá ser alojado em compartimento coletivo,


observados os requisitos da letra a, do parágrafo único, do artigo 88,
desta Lei.
Parágrafo único. São também requisitos básicos das dependências
coletivas:
a) a seleção adequada dos presos;
b) o limite de capacidade máxima que atenda os objetivos de indivi­
dualização da pena.

92.1 Alojamentos coletivos

Permite-se a utilização de alojamentos coletivos nos estabelecimentos de


regime semiaberto, ao invés de celas, devendo-se sempre atentar à salubridade
do ambiente e ao limite de capacidade de vagas.

CAPÍTULO IV
Da Casa do Albergado

Art. 93  A Casa do Albergado destina-se ao cumprimento de pena


privativa de liberdade, em regime aberto, e da pena de limitação de fim
de semana.
Art. 94  O prédio deverá situar-se em centro urbano, separado dos demais
estabelecimentos, e caracterizar-se pela ausência de obstáculos físicos
contra a fuga.

192
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 95

Art. 95  Em cada região haverá, pelo menos, uma Casa do Albergado, a
qual deverá conter, além dos aposentos para acomodar os presos, local
adequado para cursos e palestras.
Parágrafo único. O estabelecimento terá instalações para os serviços de
fiscalização e orientação dos condenados.

93.1 Considerações sobre as casas de albergado

As casas de albergado destinar-se-iam aos condenados em regime aberto


e à pena restritiva de direitos de limitação de fim de semana. Na prática, tais
estabelecimentos não foram construídos desde a edição da LEP, sendo substituídos
pela imposição de outras condições pelo juízo ou por custódia domiciliar.

CAPÍTULO V
Do Centro de Observação

Art. 96  No Centro de Observação realizar-se-ão os exames gerais e o


criminológico, cujos resultados serão encaminhados à Comissão Técnica
de Classificação.
Parágrafo único. No Centro poderão ser realizadas pesquisas
criminológicas.
Art. 97  O Centro de Observação será instalado em unidade autônoma
ou em anexo a estabelecimento penal.
Art. 98  Os exames poderão ser realizados pela Comissão Técnica de
Classificação, na falta do Centro de Observação.

96.1 Considerações sobre os Centros de Observação e Triagem

Os Centros de Observação, também chamados “de triagem”, não têm a


natureza de pesquisa criminológica indicada na lei, mas são as portas de entrada
em que se mantém a pessoa presa antes do encaminhamento a uma penitenciária,
cadeia pública (se preso provisório) ou estabelecimento adequado.
O período de permanência no centro de triagem, porém, deve ser curto, por se
tratar, a rigor, de estabelecimento de regime fechado. Configura constrangimento
193
Art. 99 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

ilegal a manutenção de pessoa em regime semiaberto, por exemplo, em um centro


de observação e triagem, sob a alegação de que está aguardando vaga.

CAPÍTULO VI
Do Hospital de Custódia e Tratamento Psiquiátrico

Art. 99  O Hospital de Custódia e Tratamento Psiquiátrico destina-se aos


inimputáveis e semi-imputáveis referidos no artigo 26 e seu parágrafo
único do Código Penal.
Parágrafo único. Aplica-se ao hospital, no que couber, o disposto no
parágrafo único, do artigo 88, desta Lei.

99.1 Considerações sobre os Hospitais de Custódia e Tratamento Psiquiátrico

No caso de internação, o internado tem direito à submissão a tratamento


e que o estabelecimento tenha características hospitalares (art. 99, CP), vedada
a internação em instituição asilar (art. 4º, §3º, Lei 10.216/01). Ora, sendo assim,
parece evidente a necessidade de que se trate de estabelecimento reconhecido
como hospitalar não pelo Poder Executivo, mas pelo respectivo Conselho Regional
ou Conselho Federal de Medicina, com o devido registro, responsável técnico e
fiscalização. Uma prisão com serviços hospitalares é uma prisão, não um hospital,
não restando preenchida, nesse caso, a exigência legal.
Obrigatório, portanto, como exigências mínimas, o registro no respectivo
Conselho Regional de Medicina e a existência de corpo e direção clínicas.

Art. 100  O exame psiquiátrico e os demais exames necessários ao


tratamento são obrigatórios para todos os internados.

100.1 Obrigatoriedade do exame psiquiátrico

Previsão da obrigatoriedade do exame psiquiátrico para os internados em


medidas de segurança, tema tratado no Código Penal sob a rubrica do “exame
de cessação de periculosidade”.
194
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 101

Art. 101  O tratamento ambulatorial, previsto no artigo 97, segunda parte,


do Código Penal, será realizado no Hospital de Custódia e Tratamento
Psiquiátrico ou em outro local com dependência médica adequada.

101.1 Tratamento ambulatorial

Ao contrário do que dispõe o dispositivo legal, o tratamento ambulatorial


deve ser construído em comunidade e por meio da rede local de assistência
psicossocial.

CAPÍTULO VII
Da Cadeia Pública

Art. 102  A cadeia pública destina-se ao recolhimento de presos


provisórios.

102.1 Considerações gerais sobre a cadeia pública

O estabelecimento correto para custódia de presos provisórios é a cadeia


pública, muitas vezes denominada “casa de custódia”.

Art. 103  Cada comarca terá, pelo menos 1 (uma) cadeia pública a
fim de resguardar o interesse da Administração da Justiça Criminal e a
permanência do preso em local próximo ao seu meio social e familiar.

103.1 Distinção entre cadeias públicas e carceragens em delegacias de polícia

As cadeias públicas também devem obedecer às diretrizes arquitetônicas


fixadas pelo CNPCP e demais parâmetros legais. Carceragens em delegacias de
polícia são improvisadas e ilegais, não podendo ser enquadradas como espécie
de cadeia pública, nem assim nominadas.

195
Art. 104 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

Art. 104  O estabelecimento de que trata este Capítulo será instalado


próximo de centro urbano, observando-se na construção as exigências
mínimas referidas no artigo 88 e seu parágrafo único desta Lei.

104.1 Localização das cadeias públicas

Diferentemente da previsão legal existente para as penitenciárias, as cadeias


públicas devem ser construídas próximas dos centros urbanos.

196
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 105

TÍTULO V
Da Execução das Penas em Espécie
CAPÍTULO I
Das Penas Privativas de Liberdade

SEÇÃO I
Disposições Gerais

Art. 105  Transitando em julgado a sentença que aplicar pena privativa de


liberdade, se o réu estiver ou vier a ser preso, o Juiz ordenará a expedição
de guia de recolhimento para a execução.

105.1 Início da execução da pena

Ressalvado o caso de suspensão condicional da pena, quando há audiência


de advertência após o registro da sentença, seguido do período de prova, o início
da execução se dá mediante a expedição de guia de recolhimento pelo juízo da
condenação (art. 105 e 106, LEP) ou guia de internação sendo o caso de medida de
segurança. Pressuposto, para tanto, é a existência do respectivo título executivo
com trânsito em julgado. Caso o condenado já cumpra outras penas, proceder-se-á
à sua unificação no próprio juízo de execução (art. 111, LEP) após o recebimento
da nova guia de recolhimento.
É ilegal exigir a prisão do sentenciado como condição para se expedir
a guia de recolhimento: “o STJ entende ser cabível a expedição da guia de
recolhimento a fim de que o juízo da execução competente analise imediatamente
possível detração e/ou progressão de regime, procedimento que não pode ficar
condicionado à prévia prisão do condenado” (STJ, HC 660.652/SP, j 30/04/2021;
STJ, HC 599.475/SP, 6ª T., 29/9/2020).

105.2 Execução provisória da pena em favor do condenado com prisão


preventiva

Há possibilidade de execução provisória da pena privativa de liberdade –


jamais da medida de segurança – quando em benefício do réu preso preventi­
vamente, ou seja, tendo por escopo a garantia de direitos do recém-condenado

197
Art. 105 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

que já se encontra preso cautelarmente. É este o entendimento do STF manifesto


em duas súmulas, quais sejam: “Admite-se a progressão de regime de cumprimento de
pena ou a aplicação imediata de regime menos severo nela determinada, antes do trânsito
em julgado da sentença condenatória” (Súmula 716) e “Não impede a progressão de
regime de execução da pena, fixada em sentença não transitada em julgado, o fato de o
réu se encontrar em prisão especial” (Súmula 717).
Nesse caso, de acordo com a Resolução nº. 113, de 20 de abril de 2010, editada
pelo Conselho Nacional de Justiça, deverá ser expedida guia de recolhimento
provisório pelo próprio juízo de conhecimento, “ainda que pendente recurso sem
efeito suspensivo”, que o enviará à Vara de Execução competente.
Não é correto dizer que não há possibilidade de execução provisória
pro reo quando pendente recurso da acusação. Não há fundamento jurídico-
constitucional que permita, em face do princípio da legalidade e da inexistência
de previsão expressa de tal requisito, o agravamento da condição material do
preso apenas porque sua situação jurídica pode se tornar mais desfavorável, no
caso de provimento do recurso de acusação. Nesse caso, tendo o preso provisório
progredido de regime ou obtido livramento condicional, bastará se expedir o
devido mandado de prisão. Não se pode admitir, em suma, tratamento mais
gravoso ao preso provisório que ao preso condenado, sendo este o entendimento
subsumido da redação da Súmula 716, do STF, a qual não faz qualquer restrição.
É ilegal e contrária à regulamentação em vigor a expedição da guia de
recolhimento provisório se o recém condenado não tiver a prisão cautelar
decretada nos autos da nova condenação, ainda que ele já cumpra pena por outras
condenações, em qualquer regime que seja. Afinal, a unificação provisória de
pena nesses casos o prejudicará, pois pode ensejar regressão de regime e alterar
os cálculos das frações para os direitos de execução penal. Em suma, somente se
houver prisão cautelar decretada nos autos da nova condenação é que deve ser
expedida a guia de recolhimento provisório.
Nesse caso, inclusive, a guia de recolhimento provisório se sobrepõe e torna
sem efeito a prisão cautelar, pois caso seja possível a manutenção de regime aberto
ou semiaberto, mesmo com a nova unificação, esta não poderá ser obstada por
prisão cautelar em processo que já se encontra em fase de execução. Decisões que
afirmam prevalecer a prisão cautelar, com guia expedida, não fazem nenhum
sentido, tecnicamente e juridicamente, pois a expedição da guia transfere o título
que embasa a custódia para o juízo de execução. Nesse sentido o STF reafirmou
que o regime semiaberto prevalece sobre a prisão preventiva (STF, HC 180.131/
MS, Rel. Min. Alexandre de Moraes, j. 12/02/2020).

198
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 105

105.3 Execução provisória da pena contra condenado que está solto

Não confundir a execução provisória pro reo com o debate totalmente distinto
referente à antecipação da execução da pena do condenado (que está solto) após
condenação por colegiado em segunda instância. Embora o próprio STF utilize
o termo “execução provisória” para se referir a essa segunda possibilidade, é
preciso cuidado para que não haja confusão entre duas discussões diferentes e
com objetivos distintos.
A antecipação do início da execução da pena de réu solto havia sido possi­
bilitada por entendimento do Supremo Tribunal Federal (STF, HC 126.292/SP e
152.752/PR; STF, ADC’s nº. 43 e 44, com indeferimento da medida cautelar em
05/10/2016), o qual fixou a seguinte tese: “A execução provisória de acórdão penal
condenatório proferido em grau de apelação, ainda que sujeito a recurso especial
ou extraordinário, não compromete o princípio constitucional da presunção de
inocência afirmado pelo artigo 5º, inciso LVII da Constituição Federal”.
O mesmo entendimento embasou a execução provisória de pena restritiva
de direito após condenação em segunda instância (STF, RE 1.161.548, Rel. Min.
Edson Fachin, j. 14/02/2019).
Importante observar que se entendia necessário o esgotamento de todos
os recursos cabíveis à decisão colegiada do Tribunal regional ou estadual,
como embargos de declaração ou infringentes, para que possa, se for o caso, ser
expedido mandado de prisão: “Na espécie, todavia, embora eventuais recursos especial e
extraordinário não sejam dotados de efeito suspensivo, a jurisdição das instâncias ordinárias
ainda não se encerrou. Contra o julgamento do recurso de apelação foi oposto, no caso,
embargos declaratórios com efeitos infringentes que, segundo andamento processual obtido
no endereço eletrônico do Tribunal de origem, pende de julgamento. Desse modo, diante da
ausência de exaurimento no julgamento nas instâncias ordinárias, revela-se prematuro o
início da execução provisória da pena” (STJ, HC 406.015/SP, 5ª T., Rel. Min. Reynaldo
Soares da Fonseca, j. 22.08.2017).
Porém, em novembro de 2019, o STF julgou procedente a Ação Declaratória
de Constitucionalidade nº. 43/44 “para assentar a constitucionalidade do art. 283
do Código de Processo Penal”, voltando a entender inconstitucional a execução
provisória antes do trânsito em julgado, salvo se com prisão cautelar em vigor e
com a finalidade de possibilitar o adimplemento de direitos da execução penal.
Desde então, cresce o debate sobre propostas de alteração legislativa e até de
emenda constitucional com o objetivo de novamente autorizar o início da execução
da pena após julgamento do recurso de apelação. É indubitável que o tema do início
da execução de pena privativa de liberdade constitui matéria de direito material,
199
Art. 105 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

e não processual. O direito material, na seara penal, compreende tanto atos de


criminalização ou descriminalização como também quaisquer alterações referentes
à criação, aumento ou diminuição de penas, regras de interpretação e execução,
e assim por diante. Portanto, eventual alteração obedecerá necessariamente ao
princípio da legalidade.

105.4 Audiência de custódia por ocasião do cumprimento de mandado de


prisão definitiva

Segundo o art. 13 da Resolução nº. 213, de 15 de dezembro de 2015, do


Conselho Nacional de Justiça, deve ser realizada audiência de custódia não apenas
na prisão em flagrante, mas também quando a prisão decorre de cumprimento de
mandado de prisão definitiva: “Art. 13. A apresentação à autoridade judicial no prazo
de 24 horas também será assegurada às pessoas presas em decorrência de cumprimento de
mandados de prisão cautelar ou definitiva, aplicando-se, no que couber, os procedimentos
previstos nesta Resolução. Parágrafo único. Todos os mandados de prisão deverão conter,
expressamente, a determinação para que, no momento de seu cumprimento, a pessoa presa
seja imediatamente apresentada à autoridade judicial que determinou a expedição da ordem
de custódia ou, nos casos em que forem cumpridos fora da jurisdição do juiz processante,
à autoridade judicial competente, conforme lei de organização judiciária local”.

105.5 Progressão provisória de regime em crimes contra a administração


pública

Há requisito específico para progressão em crimes contra a Administração


Pública: a reparação do dano ou devolução do produto do crime (art. 33, § 4º,
CP), conforme item 112.17, adiante. O STJ vem exigindo o adimplemento deste
requisito também nos casos de progressão provisória de regime: “constata-se que
a fundamentação do acórdão objurgado se encontra de acordo com o entendi­
mento da c. Suprema Corte, no ponto em que reconheceu como constitucional
o art. 33, § 4º, do CP, que condiciona a progressão de regime, no caso de crime
contra a Admi­nistração Pública, à reparação do dano ou à devolução do produto
do ilícito. (...). É por esse motivo que a progressão provisória de regime, em especial
na pendência de impugnações de caráter excepcional, impõe o cumprimento de
todas as condições legalmente estabelecidas no édito condenatório, visto que
a execução antecipada da pena deve seguir os moldes da execução definitiva,
produzindo todos os seus efeitos, sob pena de indevido fatiamento do decisum.”
(STJ, AgRg no Edcl no Resp 1.770.212, 5ª T., j. 08/09/2020).
200
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 106

Porém, o tema carece de maior reflexão. O fato de o STF ter julgado consti­
tucional o art. 33, § 4º, do CP não guarda qualquer relação com o debate em
questão: se o requisito pode ou não ser exigido por ocasião da execução provisória
pro reo da pena, a qual não deve ser confundida com a execução antecipada contra
o réu (vide acima itens 105.2 e 105.3).
A execução provisória da pena privativa de liberdade é um instituto criado
para garantir os direitos da execução, nos casos de prisão preventiva vigente.
Partindo desta constatação, uma interpretação lógica e sistemática da impossi­
bilidade pacífica de execução provisória das penas restritivas de direito (Súmula
643/STJ) recomenda a exigência do requisito da reparação do dano ou devolução
do produto do crime somente por ocasião do trânsito em julgado. Ele pode ser
cobrado, sem maiores dificuldades operacionais, enquanto o condenado cumpre
pena em regime semiaberto, não sendo necessário aguardar a próxima progressão.

Art. 106  A guia de recolhimento, extraída pelo escrivão, que a rubricará


em todas as folhas e a assinará com o Juiz, será remetida à autoridade
administrativa incumbida da execução e conterá:
I - o nome do condenado;
II - a sua qualificação civil e o número do registro geral no órgão oficial
de identificação;
III - o inteiro teor da denúncia e da sentença condenatória, bem como
certidão do trânsito em julgado;
IV - a informação sobre os antecedentes e o grau de instrução;
V - a data da terminação da pena;
VI - outras peças do processo reputadas indispensáveis ao adequado
tratamento penitenciário.
§ 1º Ao Ministério Público se dará ciência da guia de recolhimento.
§ 2º A guia de recolhimento será retificada sempre que sobrevier
modificação quanto ao início da execução ou ao tempo de duração da
pena.
§ 3° Se o condenado, ao tempo do fato, era funcionário da Administração
da Justiça Criminal, far-se-á, na guia, menção dessa circunstância, para
fins do disposto no 2°, do artigo 84, desta Lei.

201
Art. 107 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

106.1 Elementos da guia de recolhimento definitiva e provisória

O artigo 106 contém os elementos que devem constar da guia de recolhimento


definitiva, bem como dos anexos necessários: denúncia, sentença, acórdãos e
certidão do trânsito em julgado. A Resolução nº. 113, de 20 de abril de 2010, do
Conselho Nacional de Justiça, traz outras disposições e modelos em anexo.
A guia de recolhimento provisória tem seu marco normativo, atualmente,
nos art. 8º a 11 da Resolução nº. 113, de 20 de abril de 2010, do Conselho Nacional
de Justiça. O Código de Processo Penal também trata do tema entre os art. 674 e
679. De acordo com o art. 677, cópia da guia de recolhimento deve ser enviada
ao Conselho Penitenciário.

Art. 107  Ninguém será recolhido, para cumprimento de pena privativa


de liberdade, sem a guia expedida pela autoridade judiciária.
§ 1° A autoridade administrativa incumbida da execução passará recibo da
guia de recolhimento para juntá-la aos autos do processo, e dará ciência
dos seus termos ao condenado.
§ 2º As guias de recolhimento serão registradas em livro especial, segundo
a ordem cronológica do recebimento, e anexadas ao prontuário do
condenado, aditando-se, no curso da execução, o cálculo das remições
e de outras retificações posteriores.

107.1 Condicionamento do cumprimento da pena à expedição da guia

Embora deva ser adaptada à nova realidade do processo eletrônico, a regra


que condiciona a prisão de alguém, para cumprimento de pena privativa de
liberdade, à expedição da guia, é correta e tem por objetivo manter o controle do
Estado e evitar custódias ilegais.

Art. 108  O condenado a quem sobrevier doença mental será internado


em Hospital de Custódia e Tratamento Psiquiátrico.

202
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 109

108.1 Superveniência de doença mental e conversão da pena em medida de


segurança

Se a pessoa cumpre pena e passa a ser diagnosticada com doença mental,


há previsão de que ela seja internada em Hospital de Custódia e Tratamento
Psiquiátrico, sendo a pena privativa de liberdade convertida em medida de
segurança. Nesse caso, a medida de internação não pode superar o período corres­
pondente à pena remanescente.

Art. 109  Cumprida ou extinta a pena, o condenado será posto em


liberdade, mediante alvará do Juiz, se por outro motivo não estiver preso.

109.1 Extinção da pena e soltura

O condenado deve ser solto imediatamente, mediante alvará de soltura, nos


casos de cumprimento ou extinção da pena. O ponto é a verificação da existência
de outros títulos prisionais em outros processos.

109.2 Necessidade de integração de dados entre as unidades federativas

É urgente e imprescindível que todos os Estados e Distrito Federal contem


com sistemas integrados e dinâmicos para uma rápida averiguação sobre
a existência de “outro motivo” para continuar preso, o qual pode impedir
cumprimento de alvará de soltura. São diversos os casos de pessoas que poderiam
estar soltas, mas não o são por conta da existência de mandados de prisão em
vigor, em outros Estados, em outras regiões do País, mas que já assim constam
por falta de comunicação entre os respectivos juízos.

SEÇÃO II
Dos Regimes

Art. 110  O Juiz, na sentença, estabelecerá o regime no qual o condenado


iniciará o cumprimento da pena privativa de liberdade, observado o
disposto no artigo 33 e seus parágrafos do Código Penal.

203
Art. 110 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

110.1 Considerações gerais sobre a fixação do regime inicial de cumprimento


da pena

Com o trânsito em julgado da sentença condenatória e a expedição de guia de


recolhimento (art. 105-107, LEP) ou guia de execução, o sujeito recém-condenado pela
primeira vez é registrado no juízo de execução penal, abre-se um novo processo
(executório) e passa a ser submetido ao regime inicial de cumprimento de pena
definido na sentença condenatória. Caso não seja a primeira condenação, v. soma
e unificação de penas no item seguinte.
A pena privativa de liberdade pode ser imposta na forma de reclusão ou
detenção, organizando-se na forma do sistema progressivo de cumprimento
de pena. Atualmente, há três regimes previstos em lei: fechado, semiaberto e
aberto, devendo ser conjugadas as regras da LEP com vários artigos constantes
do Código Penal.
Em suma, o que vem disposto no artigo 33 e parágrafos do Código Penal
define a pena aplicada como primeiro critério para fixação do regime inicial.
O que prevê a lei é que (a) todo condenado a pena maior de 8 anos sempre iniciará
a execução em regime fechado; (b) o não reincidente condenado a uma pena entre
4 e 8 anos poderá iniciar a execução em regime semiaberto, logo, o reincidente
condenado à pena de reclusão iniciará seu cumprimento em regime fechado; e
que (c) o não reincidente condenado a uma pena igual ou inferior a 4 anos poderá
iniciar a execução em regime aberto.
Considerando que o verbo utilizado é “poderá”, a fixação do regime inicial
guarda, aparentemente, espaços significativos de discricionariedade para o juiz
da condenação. Porém, trata-se de discricionariedade vinculada, que deve atender
ao dever de motivação (art. 93, IX, CR) e que vem sendo limitada pelos Tribunais
Superiores: devem ser respeitados os critérios previstos no art. 59 do CP (art. 33,
§ 3º e art. 59, III, CP), que remetem à culpabilidade, antecedentes, conduta social
e personalidade do agente, além dos motivos, circunstâncias e consequências do
crime.

110.2 Súmulas de STF e STJ sobre a fixação do regime inicial de cumprimento


de pena

No mesmo sentido, exige-se relação de coerência entre a pena-base (primeira


etapa da dosimetria da pena) e a fixação do regime inicial, de modo que o
juiz só poderá aplicar regime inicial mais grave do que o permitido se houver
efetivamente “motivação idônea” (Súmula 719/STF: “A imposição do regime de
204
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 110

cumprimento mais severo do que a pena aplicada permitir exige motivação idônea”), não
servindo para tanto a opinião sobre a gravidade em abstrato do crime em questão
(Súmula 718/STF: “A opinião do julgador sobre a gravidade em abstrato do crime não
constitui motivação idônea para a imposição de regime mais severo do que o permitido
segundo a pena aplicada”). O mais importante é que, se foi fixada a pena-base no
mínimo legal, é incabível a fixação de regime inicial mais gravoso que o previsto
(Súmula 440/STJ: “Fixada a pena-base no mínimo legal, é vedado o estabelecimento de
regime prisional mais gravoso do que o cabível em razão da sanção imposta, com base
apenas na gravidade abstrata do delito”).
Nota-se que a lei não esclarece a situação do reincidente condenado a uma
pena igual ou menor que 4 anos: neste caso, entendimento sumulado do STJ
permite a adoção do regime semiaberto, quando favoráveis as circunstâncias
judiciais, assumindo a mesma lógica de coerência para com a pena-base (Súmula
269/STJ: “É admissível a adoção do regime prisional semiaberto aos reincidentes condenados
a pena igual ou inferior a 4 (quatro) anos se favoráveis as circunstâncias judiciais”).
No mesmo sentido, é desproporcional colocar no regime fechado sentenciado
reincidente, condenado a duas penas inferiores a 4 (quatro) anos, mas que
somam menos de 8 (oito) anos, ambas em regime inicial semiaberto. Correto
seria, no momento de soma/unificação, a manutenção do regime semiaberto, pois
compatível com as disposições do Código Penal.

110.3 Distinção entre os regimes

Os regimes fechado, semiaberto e aberto (art. 33, § 1º, CP) se diferenciam,


em primeiro lugar, pelo local de cumprimento da pena: estabelecimento de
segurança máxima ou média, para o regime fechado; colônia agrícola, industrial
ou estabelecimento similar, para o regime semiaberto; casa de albergado ou
estabelecimento adequado, para o regime aberto. A escassez de estabelecimentos
de regime semiaberto e a ausência quase total de casas de albergado faz com que, na
prática, seu cumprimento se dê de forma bastante diversa. Por exemplo, cada vez
mais se admite o cumprimento do regime semiaberto por meio do monitoramento
eletrônico, por vezes denominado “regime semiaberto harmonizado”.
A detenção não permite o cumprimento em regime inicial fechado por
ausência de previsão legal, em nenhuma hipótese. No caso de condenação de
reincidente à pena de detenção, com quantum entre 4 e 8 anos, considera-se que
a vedação do regime inicial semiaberto, no caso, só pode valer para os crimes
apenados com reclusão. Logo, no caso, a pessoa deverá iniciar o cumprimento
da pena de detenção em regime semiaberto, e não fechado.
205
Art. 111 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

110.4 Violações ao princípio da individualização

Podem haver limitações legais, sempre, porém, de constitucionalidade


questionável em face do princípio da individualização da pena. Por exemplo, o art.
2º, § 1º, da Lei 8.072/90, estabelece a obrigatoriedade do regime inicial fechado, nos
casos de condenação por crimes hediondos, tortura, tráfico ilícito de entorpecentes
e terrorismo (art. 2º, § 1º, Lei 8.072/90), mas a posição consolidada do STF é pela
inconstitucionalidade do dispositivo (STF, ARE 1052700/MG, Rel. Min. Edson
Fachin, j. 03.11.2017, com repercussão geral reconhecida). Previsão similar consta
para o crime de tortura (art. 1º, § 7º, Lei 9.455/97), mas sem a mesma interpretação
pela inconstitucionalidade.

110.5 Adequação do regime inicial pelo juízo da execução

Ainda que a fixação do regime inicial seja matéria própria do juízo de


conhecimento, e não do juízo de execução, entendemos que não se trata de
questão acobertada pela coisa julgada se houver excesso em desfavor do condenado.
Nesse sentido, considerando que o juiz da execução tem competência tanto para
decidir sobre soma ou unificação de penas (art. 66, I, LEP) como para zelar pelo
correto cumprimento da pena (art. 66, VI, LEP), admite-se que, caso se constate
excesso ou desvio na execução oriundo de situação de ilegalidade na definição
do regime inicial, ele o modifique. É possível e adequado, do ponto de vista
constitucional, que se preenchidos os demais critérios do Código Penal o regime
inicial seja readequado pelo juízo da execução.

Art. 111  Quando houver condenação por mais de um crime, no mesmo


processo ou em processos distintos, a determinação do regime de
cumprimento será feita pelo resultado da soma ou unificação das penas,
observada, quando for o caso, a detração ou remição.
Parágrafo único. Sobrevindo condenação no curso da execução, somar-
se-á a pena ao restante da que está sendo cumprida, para determinação
do regime.

206
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 111

111.1 Detração e remição na unificação das penas

A detração e a remição, quando houver, devem ser computadas da forma


mais benéfica ao condenado. Ou seja: como pena cumprida, integrando assim
a fração referente ao requisito objetivo dos direitos da execução após a soma/
unificação das penas, e não como resultado da subtração do tempo de prisão da
pena total aplicada na nova sentença. Em relação à remição, esta é a regra expressa
do art. 128 da LEP.
A regra acima não é aplicável, porém, se for o caso de primeira e única
condenação, pois nesse caso é mais favorável ao condenado que o tempo de
detração e remição seja deduzido do montante total de pena, podendo alterar a
fixação do regime inicial. Em tese, tal análise já deve ter sido feita pelo juízo de
conhecimento, nos termos do art. 387, § 2º, do CPP, mas também pode ser feita
posteriormente pelo juízo de execução. Vide entendimento do STJ no sentido
narrado: “Ocorre que o art. 387, § 2º, do CPP, refere-se ao regime inicial de cumprimento
de pena e não possui relação com o instituto da progressão de regime, própria da execução
penal, devendo o juiz sentenciante verificar, no momento oportuno da prolação da sentença,
a possibilidade de se fixar um regime mais brando em razão da detração, não havendo falar
em análise dos requisitos objetivos e subjetivos” (STJ, REsp 1.716.526/MG, Rel. Min
Ribeiro Dantas, j. 26.04.2018).
Por outro lado, se o juízo sentenciante não tiver procedido à detração, o juízo
de execução deverá fazê-lo: “Noticiado o trânsito em julgado da condenação, cabe ao
Juízo das execuções verificar a possibilidade de fixação de regime de cumprimento da pena
em regime mais brando, consoante os termos do art. 387, § 2º, do CPP. Precedentes” (STJ,
HC 395.325/SP, 5ª T., Rel. Min. Ribeiro Dantas, j. 18.05.2017).
O Superior Tribunal de Justiça admite a detração por prisão domiciliar:
“Embora inexista previsão legal, o recolhimento domiciliar noturno, por
comprometer o status libertatis da pessoa humana, deve ser reconhecido como
pena efetivamente cumprida para fins de detração da pena, em homenagem ao
princípio da proporcionalidade e em apreço ao princípio do non bis in idem.
Precedentes” (STJ, HC 496.049/MG, Rel. Min. Felix Fischer, j. 14/05/2019).
Eventual período de prisão cautelar cumprida durante o processo, com
posterior soltura, deve ser detraído como parte integrante do requisito objetivo
para os direitos da execução penal, e não apenas descontado da pena total. Sobre
o tema, ver comentários ao item 112.11.

207
Art. 111 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

111.2 Unificação provisória e prisão preventiva

Admite-se a unificação provisória quando houver superveniência de decisão


condenatória sem trânsito em julgado, mas com guia de recolhimento provisória
expedida em face da existência de prisão preventiva em vigor. Nesse caso, a
prisão preventiva deixa de existir como tal, sendo substituída pela execução
provisória, sob a jurisdição do juízo de execução. O sentido da expedição da guia
de recolhimento provisória é justamente o de deslocar a competência do juízo da
condenação para o juízo da execução, o que necessariamente abrange decisões
sobre as medidas cautelares que foram decretadas até esse momento. Passa a ser
possível, por exemplo, a progressão de regime, ainda que haja recurso pendente
da acusação, nos termos da Súmula 716/STF e da Resolução n º. 113/2010-CNJ.
Nesse sentido, o STF reafirmou que o regime semiaberto prevalece sobre a prisão
preventiva (STF, HC 180.131/MS, Rel. Min. Alexandre de Moraes, j. 12/02/2020).

111.3 Fixação do regime de cumprimento de pena diante de pluralidade de


títulos a serem executados: cenários possíveis

A lei estabelece regra, no caput e no parágrafo único, voltada para nortear a


fixação de regime quando houver pluralidade de títulos a serem executados em
conjunto. Podemos considerar diversos cenários possíveis.
a) Sendo as condenações concomitantes e da mesma natureza (por ex. priva­
tivas de liberdade na forma da reclusão), basta realizar a soma das penas,
consideradas a detração e a remição;
b) sendo concomitantes e de natureza distinta (por ex. privativas de liberdade
e restritivas de direito), há três opções, conforme o caso: b1) a unificação das
penas, com a conversão da PRD em PPL; b2) o cumpri­mento simultâneo;
ou b3) o cumprimento sucessivo;
c) não sendo concomitantes e tratando-se de penas privativas de liberdade,
havendo condenação superveniente, segundo a regra do parágrafo único,
soma-se a nova pena ao montante de pena remanescente da que já estava
sendo cumprida, isso especificamente para fins de determinação do regime
e sem repercussão sobre a data-base dos direitos da execução;
d) não sendo concomitantes e com natureza distinta, pode-se ter ao menos
duas situações: d1) a pessoa está cumprindo pena restritiva de direitos e é
condenada a pena privativa de liberdade, ou d2) a pessoa está cumprindo
pena privativa de liberdade e é condenada a pena restritiva de direitos.

208
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 111

Nesses casos, haverá que se enfrentar a questão da unificação, ou não,


entre penas privativas de liberdade e penas restritivas de direito, como
se trata a seguir.

111.4 Unificação de pena restritiva de direitos e pena privativa de liberdade

No que toca à unificação de pena restritiva de direitos e pena privativa de


liberdade, há diversas soluções possíveis aventadas pelos tribunais. Por causa
da garantia constitucional da coisa julgada, a melhor posição é aquela segundo
a qual o juízo da execução não pode converter a pena restritiva de direitos em
pena privativa de liberdade (situação indicada como “d2” no item anterior), até
porque o art. 111 da LEP não seria aplicável às PRD24.
A própria lei permite a convivência entre ambas no art. 44, § 5º, do
CP, tratando da situação na qual a pessoa está cumprindo PRD e vem a ser
condenada por uma pena privativa de liberdade. Por certo, a superveniência de
pena privativa de liberdade não é “descumprimento injustificado” da PRD (art.
44, § 4º, CP). A única questão a se verificar é a possibilidade de cumprimento
simultâneo ou concomitante. Por exemplo, uma PRD como prestação pecuniária
pode ser tranquilamente cumprida simultaneamente a qualquer pena privativa
de liberdade, ainda que em regime fechado. A própria prestação de serviços à
comunidade é também compatível com o regime semiaberto, bastando readequar
os horários.
Porém, pelo entendimento jurisprudencial majoritário em regra se entende
como incompatíveis as penas restritivas de direito com penas privativas de
liberdade em regime fechado, admitindo-se sua convivência somente se aplicado o
regime aberto e, por vezes, o semiaberto. A melhor posição é aquela que preserva
a natureza de cada pena, evitando-se a centralidade absoluta da privação da
liberdade: ainda que a PRD aplicada não possa ser cumprida simultaneamente,
seria adequado ser cumprida sucessivamente, ou seja, após o cumprimento da
pena privativa de liberdade.
O caso inverso, de condenação superveniente a pena restritiva de direitos,
havendo já uma execução de pena privativa de liberdade em curso, é mais grave
porque não há previsão legal para a conversão da primeira em privação de
liberdade, embora seja este o equivocado entendimento por vezes adotado pelos
Tribunais.

24
Nesse sentido, ROIG, Rodrigo Duque Estrada. Execução Penal, p. 317.

209
Art. 111 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

111.5 Ilegalidade da alteração da data-base para direitos da execução penal


por causa da unificação de penas

Equivocado e inadmissível o entendimento segundo o qual a superveniência


de nova condenação, em sede de unificação provisória ou definitiva, enseja a
redefinição da data-base da progressão de regime para a data do trânsito em
julgado, ainda que somente do trânsito em julgado para a acusação. Trata-se de
grave violação do sistema progressivo e da própria lógica disciplinar e premial
da execução, sendo inexplicável ao preso que ele tenha seu direito à progressão
postergado em decorrência de um fato novo (trânsito em julgado) sobre o qual
ele não tem qualquer controle. Viola, ainda, o princípio da detração penal (art. 42,
CP) e a disciplina estabelecida pelo Conselho Nacional de Justiça para a execução
provisória da pena privativa de liberdade (Resolução nº. 113/2010-CNJ, Súmula
716/STF).
A regra do art. 111, parágrafo único, visa apenas garantir a interpretação mais
favorável ao apenado para fins de determinação do regime de cumprimento. Soma-
se a nova pena ao que resta da pena anterior, a fim de verificar a possibilidade
de sua manutenção em regime mais benéfico, ao invés de se somar a nova pena
à integralidade da pena anterior.
Em relação à progressão de regime, apenas a alteração efetiva de regime
(seja por uma nova prisão, pela regressão ou pelo adimplemento do direito à
progressão) e a prática de falta grave é que têm o condão de reiniciar a contagem
do requisito objetivo.
No caso de regressão de regime decorrente da decisão de soma ou unifi­
cação, por força da nova pena remanescente, a nova data-base da progressão é a
data na qual o sentenciado foi efetivamente colocado em regime mais gravoso –
por exemplo, com a regressão cautelar – e não a data da decisão nem tampouco
a data do trânsito em julgado da nova condenação.
Nesse sentido, o STJ unificou entendimento e fixou a tese: “A alteração da
data-base para concessão de novos benefícios executórios, em razão da unificação
das penas, não encontra respaldo legal. Portanto, a desconsideração do período
de cumprimento de pena desde a última prisão ou desde a última infração
disciplinar, seja por delito ocorrido antes do início da execução da pena, seja
por crime praticado depois e já apontado como falta disciplinar grave, configura
excesso de execução” (STJ, Terceira Seção, ProAfR no REsp 1753512/PR, Rel.
Min. Rogerio Schietti Cruz, j. 18/12/2018; STJ, RE 1.557.461/SC, Rel. Min. Rogério
Schietti Cruz, j. 22/02/2018).

210
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 111

111.6 Unificação e limite máximo de 40 anos como tempo de cumprimento de


pena

Há, ainda, outro procedimento de unificação previsto pelo Código Penal no


art. 75. Ele é especificamente voltado às situações de pena aplicada superior ao
limite máximo de 40 anos de cumprimento da pena privativa de liberdade (novo
limite estabelecido pela Lei 13.964/2019), e deve, por óbvio, ser interpretado dentro
do contexto e da lógica do caput do mesmo artigo. De acordo com a regra do
art. 75, § 2º, “sobrevindo condenação por fato posterior ao início do cumprimento da pena,
far-se-á nova unificação, desprezando-se, para esse fim, o período de pena já cumprido”.
Logo, não há salvo-conduto para ninguém praticar novos crimes apenas porque já
cumpriu período correspondente a quarenta ou trinta anos de prisão, pois a nova
unificação indica que a contagem deste tempo-limite é reiniciada, desprezando-
se o período de pena já cumprido.
Trata-se, portanto, de uma regra de interpretação especificamente voltada ao
limite máximo dos anos de cumprimento, e não de uma regra universal capaz de
produzir outras consequências, como justificar a fixação de novos termos iniciais
ou data-base para os direitos da execução penal, notadamente a progressão de
regime e o livramento condicional.
Como já afirmado, o entendimento segundo o qual o trânsito em julgado
de condenação superveniente – ainda que apenas o trânsito em julgado para
a acusação – constitui nova data-base para a progressão de regime configura
grave violação do sistema progressivo e da própria lógica disciplinar/premial
da execução, sendo inexplicável ao preso que ele tenha seu direito à progressão
postergado em decorrência de um fato novo (trânsito em julgado) sobre o qual
ele não tem qualquer controle. Viola, ainda, o princípio da detração penal (art. 42,
CP) e a disciplina estabelecida pelo Conselho Nacional de Justiça para a execução
provisória da pena privativa de liberdade (Resolução nº. 113/2010-CNJ, Súmula
716/STF).

111.7 Impossibilidade de alteração da data-base nos casos de trânsito em


julgado de condenação única

Afinal, na situação do preso que, com apenas uma sentença condenatória,


pode iniciar a sua execução de forma provisória para que tenha acesso aos direitos
da execução, é evidente que o trânsito em julgado daquela mesma sentença não
irá interromper a data-base para a progressão de regime, sendo a data-base aquela
da prisão preventiva (STF, RHC 142.463, Rel. Min. Luiz Fux, 1ª T., j. 12/09/2017).
211
Art. 111 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

Não há fundamento jurídico razoável que justifique o tratamento jurídico distinto


da decisão de unificação.

111.8 Unificação e crime continuado

Outro ponto importante e frequente por ocasião da soma ou unificação de


penas é a verificação de continuidade delitiva entre fatos imputados em processos
criminais distintos, cada qual resultando em uma condenação. É possível e
necessário que o juízo de execução, ao invés de apenas somar as penas, aplique
o art. 71 do Código Penal, considerando somente a pena mais grave e aplicando
a fração de majoração prevista pela lei penal.

111.9 Unificação, reincidência e coisa julgada

Por fim, entendemos, em posição minoritária, ser um equívoco entender


que o juízo da execução pode reconhecer a reincidência do sentenciado por
conta própria, sem que tal status tenha sido afirmado em quaisquer das sentenças
condenatórias. O argumento recorrente é que se trata de uma condição pessoal
do sujeito (STF, RHC 176.216/MG, j. 05/02/2021): ora, ainda que o seja, como
qualquer outra condição pessoal, mormente sendo circunstância agravante na
dosimetria, ela deve necessariamente ser reconhecida no título executivo para que
produza efeitos jurídicos na fase executória. O status de reincidente não decorre
automaticamente da lei, necessitando de declaração judicial o reconhecendo no
momento oportuno.
Como referido, porém, a posição majoritária é distinta. Entendeu o STJ, em
uniformização de entendimento, o que segue: “(...) 2. A intangibilidade da sentença
penal condenatória transitada em julgado não retira do Juízo das Execuções Penais
o dever de adequar o cumprimento da sanção penal às condições pessoais do
réu. 3. ‘Tratando-se de sentença penal condenatória, o juízo da execução deve
se ater ao teor do referido decisum, no tocante ao quantum de pena, ao regime
inicial, bem como ao fato de ter sido a pena privativa de liberdade substituída
ou não por restritivas de direitos. Todavia, as condições pessoais do paciente,
da qual é exemplo a reincidência, devem ser observadas pelo juízo da execução
para concessão de benefícios (progressão de regime, livramento condicional
etc)’ (AgRg no REsp 1.642.746/ES, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS
MOURA, SEXTA TURMA, julgado em 03/08/2017, DJe 14/08/2017). 4. Embargos
de divergência acolhidos para, cassando o acórdão embargado, dar provimento

212
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 112

ao agravo regimental, para dar provimento ao recurso especial e, assim, também


cassar o acórdão recorrido e a decisão de primeiro grau, devendo o Juízo das
Execuções promover a retificação do atestado de pena para constar a reincidência,
com todos os consectários daí decorrentes” (STJ, EResp 1.738.968/MG, Rel. Min.
Laurita Vaz, j. 27/11/2019).

Art. 112  A pena privativa de liberdade será executada em forma


progressiva com a transferência para regime menos rigoroso, a ser
determinada pelo juiz, quando o preso tiver cumprido ao menos:
(Redação dada pela Lei nº 13.964, de 2019)
I - 16% (dezesseis por cento) da pena, se o apenado for primário e o crime
tiver sido cometido sem violência à pessoa ou grave ameaça; (Incluído
pela Lei nº 13.964, de 2019)
II - 20% (vinte por cento) da pena, se o apenado for reincidente em crime
cometido sem violência à pessoa ou grave ameaça; (Incluído pela Lei nº
13.964, de 2019)
III - 25% (vinte e cinco por cento) da pena, se o apenado for primário e
o crime tiver sido cometido com violência à pessoa ou grave ameaça;
(Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
IV - 30% (trinta por cento) da pena, se o apenado for reincidente em
crime cometido com violência à pessoa ou grave ameaça; (Incluído pela
Lei nº 13.964, de 2019)
V - 40% (quarenta por cento) da pena, se o apenado for condenado pela
prática de crime hediondo ou equiparado, se for primário; (Incluído pela
Lei nº 13.964, de 2019)
VI - 50% (cinquenta por cento) da pena, se o apenado for:
a) condenado pela prática de crime hediondo ou equiparado, com
resultado morte, se for primário, vedado o livramento condicional;
(Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
b) condenado por exercer o comando, individual ou coletivo, de
organização criminosa estruturada para a prática de crime hediondo ou
equiparado; ou (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
c) condenado pela prática do crime de constituição de milícia privada;
(Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
VII - 60% (sessenta por cento) da pena, se o apenado for reincidente na
prática de crime hediondo ou equiparado; (Incluído pela Lei nº 13.964,
de 2019)
213
Art. 112 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

VIII - 70% (setenta por cento) da pena, se o apenado for reincidente


em crime hediondo ou equiparado com resultado morte, vedado o
livramento condicional. (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
§ 1º Em todos os casos, o apenado só terá direito à progressão de
regime se ostentar boa conduta carcerária, comprovada pelo diretor
do estabelecimento, respeitadas as normas que vedam a progressão.
(Redação dada pela Lei nº 13.964, de 2019)
§ 2º A decisão do juiz que determinar a progressão de regime será
sempre motivada e precedida de manifestação do Ministério Público e
do defensor, procedimento que também será adotado na concessão de
livramento condicional, indulto e comutação de penas, respeitados os
prazos previstos nas normas vigentes. (Redação dada pela Lei nº 13.964,
de 2019)
§ 3º No caso de mulher gestante ou que for mãe ou responsável por
crianças ou pessoas com deficiência, os requisitos para progressão de
regime são, cumulativamente: (Incluído pela Lei nº 13.769, de 2018)
I - não ter cometido crime com violência ou grave ameaça a pessoa;
(Incluído pela Lei nº 13.769, de 2018)
II - não ter cometido o crime contra seu filho ou dependente; (Incluído
pela Lei nº 13.769, de 2018)
III - ter cumprido ao menos 1/8 (um oitavo) da pena no regime anterior;
(Incluído pela Lei nº 13.769, de 2018)
IV - ser primária e ter bom comportamento carcerário, comprovado pelo
diretor do estabelecimento; (Incluído pela Lei nº 13.769, de 2018)
V - não ter integrado organização criminosa. (Incluído pela Lei nº 13.769,
de 2018)
§ 4º O cometimento de novo crime doloso ou falta grave implicará a
revogação do benefício previsto no § 3º deste artigo. (Incluído pela Lei
nº 13.769, de 2018)
§ 5º Não se considera hediondo ou equiparado, para os fins deste artigo,
o crime de tráfico de drogas previsto no § 4º do art. 33 da Lei nº 11.343,
de 23 de agosto de 2006. (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
§ 6º O cometimento de falta grave durante a execução da pena priva­
tiva de liberdade interrompe o prazo para a obtenção da progressão no
regime de cumprimento da pena, caso em que o reinício da contagem
do requisito objetivo terá como base a pena remanescente. (Incluído
pela Lei nº 13.964, de 2019)
§ 7º O bom comportamento é readquirido após 1 (um) ano da ocorrência
do fato, ou antes, após o cumprimento do requisito temporal exigível para
a obtenção do direito. (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)

214
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 112

112.1. Considerações gerais sobre a progressão de regime

A progressão de regime é a transferência para regime menos rigoroso


segundo o “mérito” do apenado. Trata-se de direito, e não regalia ou simplesmente
benefício, o que dá ensejo à possibilidade de recusa à progressão por parte do
condenado, caso queira permanecer em regime mais gravoso, o que é possível, por
mais paradoxal que seja, podendo ocorrer para proteção da própria integridade
física, para permanecer mais próximo da família ou por não aceitar as condições
do novo regime. A recusa pode ocorrer também quando há projetos-piloto de
“penitenciárias modelo”, em que todos os presos trabalham e estudam, não
havendo condições similares no estabelecimento de regime semiaberto do local.
A necessidade de aceite das condições impostas, pela pessoa presa, é regra expressa
para o regime aberto (art. 113, LEP) e para o livramento condicional (art. 137, III,
LEP), podendo ser também aplicada ao regime semiaberto.
A progressão é fundada no mérito (art. 33, § 2º, CP) e na ideia de, por um
lado, tornar a execução da pena flexível – ou seja, mais dura ou mais branda –
conforme o comportamento do condenado; e por outro, estabelecer um processo
gradual de readaptação do apenado através de sua paulatina reinserção na
convivência em comunidade.
Cumpridos os requisitos (a) temporal e (b) disciplinar, transfere-se, em decisão
motivada, com oitiva da Defesa e do Ministério Público, o apenado do regime
fechado para o regime semiaberto, ou do regime semiaberto para o regime aberto.
É possível a concessão de ofício pelo juiz de execução, bem como a criação, pela
via dos sistemas informatizados, de mecanismos de instauração automática de
incidentes e até de reconhecimento imediato do direito à progressão quando
o comportamento for regular ou bom. Há, ainda, requisitos específicos para o
caso da progressão de regime semiaberto ao aberto e requisitos específicos para
condenados por crime contra a Administração Pública.

215
Art. 112 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

112.2 Requisito objetivo ou temporal: sistematização após alterações das Leis


13.769/2018 e 13.964/2019

112, Fato anterior a Fato cometido a partir de


Inciso 23/01/2020 23/01/2020 (novo art. 112, LEP)
I Crime comum sem violência ou grave 16% (retroage) 16%
ameaça à pessoa – Primário
II Crime comum sem violência ou 16,66% ou 1/6 20% ou 1/5
grave ameaça à pessoa – Reincidente
específico
III Crime comum com violência ou grave 16,66% ou 1/6 25% ou 1/4
ameaça à pessoa – Primário
IV Crime comum com violência ou 16,66% ou 1/6 30%
grave ameaça à pessoa – Reincidente
específico
V Crime Hediondo ou Equiparado sem 40% ou 2/5 40% ou 2/5
resultado morte – Primário
VI Crime Hediondo ou Equiparado com 40% ou 2/5 50% ou ½
resultado morte – Primário
VII Crime Hediondo ou Equiparado sem 60% ou 3/5 60% ou 3/5
resultado morte – Reincidente específico
VII Crime Hediondo ou Equiparado com 60% ou 3/5 70%
resultado morte – Reincidente específico
VI Comando de organização criminosa 50% ou ½
estruturada para a prática de crime
hediondo ou equiparado
VI Crime de constituição de milícia privada 50% ou ½
§ 3º Mulher gestante ou mãe/responsável 1/8 1/8
por criança ou pessoa com deficiência –
v. requisitos abaixo

As frações constitutivas do requisito temporal para a progressão de regime


foram substancialmente alteradas pela Lei 13.964/2019, além da importante
inclusão, em 2018, da progressão especial para mulheres mães ou gestantes.
No quadro acima, consta a indicação do “antes e depois” em cada situação
porque, por um bom tempo, será fundamental verificar a data do fato objeto da
condenação para identificar qual é a fração correta em cada caso. Afinal, com
exceção do inciso I, todas as demais modificações são desfavoráveis ao réu e não
retroagem, considerando que as normas de execução da pena têm natureza de
direito material. Esse é o entendimento pacífico já expresso em relação às frações
majoradas para crimes hediondos ou equiparados, as quais somente se aplicavam
a crimes praticados após a data de início de vigência da Lei 11.464, que é de 28
de março de 2007 (Súmula 471/STJ).
Em relação especificamente a crimes hediondos ou equiparados, portanto,
a seguinte sistematização é possível:
216
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 112

Fato anterior a A partir de 28/03/2007 Fato cometido a partir de


28/03/2007 (S. 471-STJ) e anterior a 23/01/2020 23/01/2020 (novo art. 112, LEP)

Crime Hediondo ou
Equiparado – Primário – 1/6 40% ou 2/5 40% ou 2/5
Sem resultado morte

Crime Hediondo ou
Equiparado – Primário – 1/6 40% ou 2/5 50% ou ½
Com resultado morte

Crime Hediondo ou
Equiparado – Reincidente
1/6 60% ou 3/5 60% ou 3/5
específico – Sem resultado
morte

Crime Hediondo ou
Equiparado – Reincidente
1/6 60% ou 3/5 70%
específico – Com resultado
morte

Em qualquer caso, se o crime hediondo ou equiparado tiver sido cometido por


mulher gestante ou mãe ou responsável por crianças ou pessoas com deficiência,
preenchidos os demais requisitos do art. 112, § 3º, a fração para progressão será
de 1/8 (um oitavo) da pena no regime anterior. Trata-se de aplicação lógica do
princípio da especialidade e da literalidade da vontade legislativa expressa na
alteração concomitante do art. 2º, § 2º, da Lei de Crimes Hediondos pela Lei
13.769/2018. A revogação do dispositivo legal pela Lei 13.964/2019 não altera
quaisquer desses fundamentos. De todo modo, se for este o entendimento, tratar-
se-á de alteração mais gravosa que só poderá incidir para crimes praticados a
partir de 23/01/2020.
Já se discutia a redação do art. 2º, § 2º, da Lei de Crimes Hediondos –
parágrafo revogado pela Lei 13.964/2019 – sobre a melhor interpretação para
o conceito de reincidência e a aplicação da fração de 60% ou 3/5 (três quintos)
da pena para progressão. A primeira edição destes Comentários defendeu a tese
minoritária, segundo a qual o requisito de 3/5 (três quintos) seria exigido somente
para o reincidente em crime hediondo, não se aplicando, por exemplo, no caso de
reincidência advinda da prática de um crime comum e um crime hediondo, com
ao menos três argumentos: a) interpretação literal do disposto no art. 2º, § 2º, da
Lei 8.072/90, segundo o qual a progressão de regime ali seria tratada para “crimes
previstos neste artigo”. Assim, embora seja efetivamente genérico o conceito de
reincidência do art. 63 do CP, não o seria aquele do art. 2º, § 2º, da Lei 8.072/90, pois
a expressão “neste artigo” indica que todo o ali disposto só se aplica àqueles crimes,
ou seja, aqueles previstos no rol taxativo do art. 2º da Lei de Crimes Hediondos.

217
Art. 112 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

Trata-se de argumento que preza pela preservação da natureza sistemática


das regras da execução penal, juridicamente viável porque a legislação brasileira
ora trabalha com um conceito genérico de reincidência, ora com um conceito
específico, não havendo uma opção exclusiva em favor de um ou outro, sendo
caso ainda de aplicação do princípio do favor-rei25; b) respeito ao princípio da
proporcionalidade, compreendido como parâmetro de escolha e ponderação entre
soluções/interpretações possíveis e que vem sendo utilizado como fundamento
para controle de constitucionalidade. A interpretação segundo a qual o conceito
de reincidência do art. 2º, § 2º, da LCH, se referia à reincidência genérica seria,
nesse sentido, inconstitucional porque trata de forma igual situações definidas
como desiguais pelo ordenamento jurídico-constitucional, quando estabelece
mandamento de tratamento distinto aos crimes definidos como hediondos (art.
5º, XLIII, CR). Nessa esteira, um condenado reincidente específico em crime
hediondo deve receber tratamento mais rigoroso, em abstrato, do que o condenado
reincidente genérico em um crime comum e outro hediondo; E c) violação do
direito à segunda progressão (do semiaberto ao aberto), a qual pode ser, na prática,
inviabilizada pela incidência da fração.
Vale o registro, inclusive, da posição sustentada por ROIG, segundo a qual as
frações até então exigidas pela Lei de Crimes Hediondos (2/5 ou 3/5) aplicar-se-iam
apenas à primeira progressão (do fechado para o semiaberto), por interpretação
do art. 2º, § 1º, da Lei 8.072/90, devendo ser aplicada a fração de 1/6 (um sexto)
no pedido de progressão do regime semiaberto ao aberto26.
Com a revogação do art. 2º, § 2º, da Lei 8.072/90 e a reestruturação do art. 112
da LEP, embora as frações não tenham sido alteradas – foram elevadas somente
para os casos com resultado morte – a redação sobre esse debate se apresenta,
propositadamente ou não, mais clara e elucidativa. O art. 112, VII, estabelece a
fração de 60% ou 3/5 (três quintos) “se o apenado for reincidente na prática de crime
hediondo ou equiparado”, explicitando a opção por um conceito de reincidência
específica. O mesmo raciocínio vale para o inciso VIII (com resultado morte),
aplicável “se o apenado for reincidente em crime hediondo ou equiparado”.
Portanto, milhares de processos executórios que aplicam a fração de 3/5
(três quintos) para condenações por crime hediondo, sendo reincidência genérica,
devem retificar o cálculo para os percentuais de 40% (sem resultado morte) ou
50% (com resultado morte). Para os Juízos de Execução Penal que adotavam a

25
ROIG, Rodrigo Duque Estrada. Execução Penal, p. 317.
26
ROIG, Rodrigo Duque Estrada. Execução Penal, p. 331.

218
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 112

posição majoritária até a promulgação da Lei 13.964/2019 se trata de norma mais


benéfica e que deve retroagir, devendo se determinar a retificação dos respectivos
relatórios de situação processual executória e atestados de pena, procedendo-se
ao cálculo discriminado ou diferenciado.
Vai nesse sentido a posição consolidada na jurisprudência (v. leading cases em
ambas Turmas: STJ, HC 581.315/PR, 6ª T., j. 06.10.2020; STJ, AgRg no HC 616.267/SP,
5ª T., j. 09/12/2020), após alguma divergência nos Tribunais estaduais. O argumento
minoritário pela inexistência de diferenciação entre reincidência genérica e
específica na nova redação é insustentável: chegou-se a apelar até mesmo para “o
espírito rigoroso da Lei 13.964/19” para defender outra interpretação, segundo a
qual haveria “mera atecnia”. O texto legal, porém, é muito claro.
Por fim, alteração promovida pela 13.964/2019 dispõe que o tráfico
privilegiado não tem natureza de crime equiparado a hediondo “para os fins
deste artigo”. Descabido seria afirmar que a regra vale apenas para a progressão
de regime. A exclusão da natureza de crime equiparado a hediondo havia sido,
antes da alteração legislativa, afirmado pelo STF no HC 118.533/MS, julgado em
23/06/2016 e que tratava de um pedido de livramento condicional.

112.3 Requisito objetivo ou temporal: lacuna em relação à reincidência


genérica (incisos II, IV, VII e VIII)

Nas quatro vezes em que o art. 112 se refere à reincidência, ele utiliza
claramente noções de reincidência específica, ou seja, a reiteração da mesma
categoria de crime ali referida. No inciso II, estabelece a fração de 20% para o
reincidente “em crime cometido sem violência à pessoa ou grave ameaça”. No
inciso IV, estabelece a fração de 30% para o reincidente “em crime cometido com
vio­lência à pessoa ou grave ameaça”. No inciso VII, estabelece a fração de 60%
para o reincidente “na prática de crime hediondo ou equiparado”, sem resultado
morte. No inciso VIII, por fim, estabelece a fração de 70% para o reincidente “em
crime hediondo ou equiparado com resultado morte”.
O problema está nas situações em que a pessoa seja reincidente genérica,
e não específica. Naturalmente, a incidência de diferentes frações demanda o
cálculo discriminado e um requisito misto. Porém, não há frações previstas para
tais casos. Por exemplo: se a pessoa tem duas condenações, a primeira por furto,
como réu primário, e a segunda por qualquer uma das situações acima referidas
(um roubo simples, um tráfico de drogas, um homicídio, etc), como reincidente,
é incontroverso que a primeira pena terá a fração de 16% (inciso I), mas não há
fração prevista no art. 112 para a segunda condenação.
219
Art. 112 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

Diante da lacuna, a combinação do art. 2º da LEP – que autoriza a incidência


do CPP – e do art. 3º do CPP – que admite “interpretação extensiva e aplicação
analógica, bem como o suplemento dos princípios gerais de direito” – conduz
à conclusão de que a única saída é aplicar, em casos assim, a fração de patamar
imediatamente abaixo, nos seguintes termos:
a) Condenação por crime comum sem violência ou grave ameaça à pessoa
e reincidência genérica: fração de 16% (inciso I).
b) Condenação por crime comum com violência ou grave ameaça à pessoa
e reincidência genérica: fração de 25% (inciso III).
c) Condenação por crime hediondo ou equiparado sem resultado morte e
reincidência genérica: fração de 40% (inciso V).
d) Condenação por crime hediondo ou equiparado com resultado morte e
reincidência genérica: fração de 50% (inciso VI, “a”).
A proposta é que nas quatro hipóteses seja aplicada a fração correspondente
à situação de primariedade, já que equiparar a reincidência genérica ao requisito
legal da reincidência específica consistiria em violação do princípio da reserva
legal.
Já é esta, acertadamente, a posição prevalente na 5ª e 6ª Turmas do STJ,
conforme precedentes citados no item anterior (STJ, HC 581.315/PR, 6ª T., j.
06.10.2020; STJ, AgRg no HC 616.267/SP, 5ª T., j. 09/12/2020) e também em casos
envolvendo crime comum (STJ, HC 661.976/SP, liminar de 29/04/2021).
Vale observar, por fim, que a aferição quanto à natureza favorável ou
desfavorável ao réu das alterações dos requisitos objetivos deve ser feita por
condenação, seguindo a mesma lógica da aplicação de cálculo discriminado ou
diferenciado quando há pluralidade de condenações. Percentual mais gravoso não
pode, em nenhuma hipótese, retroagir, ainda que, no mesmo processo executório,
seja aplicável percentual mais benéfico em retroação para outra condenação.
Cuida evitar interpretações que só admitam aplicar a nova redação do artigo 112
“na íntegra”, o que conduz a violação do princípio da legalidade, posto que a lei
posterior que de qualquer modo favorecer o agente aplica-se aos fatos anteriores
(art. 2º, parágrafo único, CP).

112.4 Requisito objetivo ou temporal: progressão especial de regime para


mulheres (Lei 13.769/2018)

A Lei 13.769, de 2018, na esteira da decisão do Supremo Tribunal Federal no


Habeas Corpus coletivo 143.641/SP, o qual abrangeu somente medidas cautelares
de privação da liberdade, inseriu hipótese de progressão especial, exigindo fração
220
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 112

de cumprimento de pena de apenas 1/8 (um oitavo) para mulheres gestantes,


mães ou responsáveis por crianças ou pessoas com deficiência. Entende-se criança
a pessoa com até doze anos de idade incompletos, nos termos do art. 2º da Lei
8.069/1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente).
A flexibilização de direitos da execução penal para mulheres gestantes e
mães tem o amparo das Regras de Bangkok (Regras das Nações Unidas para o
Tratamento de Mulheres Presas e Medidas Não Privativas de Liberdade para
Mulheres Infratores, 2010) – vide, nesse sentido, a Regra 64: “Penas não privativas de
liberdade para as mulheres gestantes e mulheres com filhos/as dependentes serão preferidas
sempre que for possível e apropriado, sendo a pena de prisão considerada apenas quando
o crime for grave ou violento ou a mulher representar ameaça contínua, sempre velando
pelo melhor interesse do/a filho/a ou filhos/as e assegurando as diligências adequadas para
seu cuidado”.
Os demais requisitos legais são: a) crime sem violência ou grave ameaça a
pessoa (art. 112, § 3º, I); b) que o filho ou dependente não seja a vítima do crime
(art. 112, § 3º, II); c) trate-se de ré primária e com bom comportamento carcerário,
comprovado pelo diretor do estabelecimento (art. 112, § 3º, IV) e d) não tenha
integrado organização criminosa (art. 112, § 3º, V).
A lei de 2018 também alterou a redação do art. 2º, § 2º, da Lei 8.072/90,
deixando explícito e muito claro que a nova regra prevaleceria sobre as frações
majoradas para crimes hediondos ou equiparados. Como já registrado acima,
portanto, a regra especial é aplicável às condenações por crime hediondo ou
equiparado. Trata-se de aplicação lógica do princípio da especialidade e da
literalidade da vontade legislativa expressa na alteração concomitante do art. 2º, §
2º, da Lei de Crimes Hediondos pela Lei 13.769/2018. A revogação do dispositivo
legal pela Lei 13.964/2019 não altera quaisquer desses fundamentos. De todo modo,
se for este o entendimento, trata-se de alteração mais gravosa que só pode recair
sobre crimes praticados a partir de 23/01/2020.
Trata-se de questão decisiva para a efetividade da alteração legislativa,
considerando que dados do Infopen Mulheres 201727 apontam que cerca de 60%
(sessenta por cento) das mulheres presas cumprem pena pelo crime de tráfico de
drogas (art. 33, Lei 11.343/6), o qual, quando não for “privilegiado”, é considerado
equiparado a hediondo.

27
Relatório Temático sobre Mulheres Privadas de Liberdade - Junho de 2017, Infopen Mulheres,
divulgado em 27 de novembro de 2019, referente a dados de junho de 2017. MINISTÉRIO DA
JUSTIÇA E SEGURANÇA PÚBLICA. RELATÓRIO TEMÁTICO SOBRE MULHERES PRIVADAS
DE LIBERDADE – JUNHO DE 2017. Disponível em: < http://depen.gov.br/DEPEN/depen/
sisdepen/infopen-mulheres/copy_of_Infopenmulheresjunho2017.pdf >.

221
Art. 112 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

A exigência cumulativa dos requisitos listados para a progressão especial


abriu espaço, desde a promulgação da alteração legislativa, para a exigência de
provas documentais que acabam por constituir entraves burocráticos de difícil
transposição – uma das razões da dificuldade de alcance de efetividade da regra.
A comprovação da condição de gestante é mais simples e pode ser levada
a juízo pela mulher, pela defesa ou pelo próprio estabelecimento penal, após a
adequada certificação ou “teste de farmácia”. Do mesmo modo, tratando-se de
lactante, a própria direção do estabelecimento deve certificar a existência de recém-
nascido ou criança pequena vivendo dentro do cárcere sob cuidados da genitora.
Os entraves aumentam na necessidade de comprovação de maternidade de
criança ou pessoa com deficiência que se encontra fora do cárcere e, sobretudo, na
comprovação da “responsabilidade” mencionada na lei, ou seja, da necessidade da
presença da mãe para proceder aos cuidados da criança ou pessoa com deficiência.
Em muitos casos, não há certidão de nascimento disponível e até a localização da
criança ou pessoa com deficiência é de difícil obtenção.
A jurisprudência, como regra, colocou-se em posição de resistência explícita
à aplicação tanto da ordem concedida pelo STF no HC coletivo 143.641/SP (prisões
preventivas) como da nova progressão especial de regime (execução penal). Os
argumentos são similares: a mera condição de mãe não seria “suficiente” para fazer
jus à progressão especial, devendo a defesa demonstrar a “imprescindibilidade”
da genitora para os cuidados e o crescimento adequado dos infantes, o que acaba
passando pela exigência – não prevista em lei – de inexistência de qualquer
outro familiar que possa se responsabilizar pela criança. Todavia, a redação do
art. 112, § 3º, da LEP, fala em mãe ou responsável, indicando claramente que a
responsabilidade é presumida no caso da condição de mãe. Eventual instrução
complementar para apuração da imprescindibilidade da presença da mulher só é
compatível com o princípio da legalidade quando tratar de situação em que não
seja a própria genitora a fazer o requerimento.
A Resolução 369/2021, do Conselho Nacional de Justiça, reforça esta
posição. Embora se dirija ao cumprimento das ordens coletivas de habeas corpus
concedidas pela 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal nos HCs nº 143.641/SP e
nº 165.704/DF, os requisitos são juridicamente os mesmos. A Resolução dispõe que
a autoridade judicial deve “conferir credibilidade à palavra da pessoa custodiada
em caso de indisponibilidade do sistema e em relação à guarda do filho, criança
ou pessoa com deficiência que esteja sob sua responsabilidade” (art. 4º, II) e,
principalmente, considerar a “presunção legal de indispensabilidade dos cuidados
maternos”, a “presunção de que a separação de mães, pais ou responsáveis, de
seus filhos ou dependentes afronta o melhor interesse dessas pessoas, titulares
222
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 112

de direito à especial proteção” e a “desnecessidade de comprovação de que o


ambiente carcerário é inadequado para gestantes, lactantes e seus filhos“ (art. 4º,
§ 6º, “b”, “c”e “d”).
Exige-se que o crime não tenha, em seus elementos, violência ou grave
ameaça a pessoa, e que a vítima não seja o próprio filho ou dependente.
O requisito disciplinar é o mesmo das demais hipóteses de progressão:
bom comportamento, comprovado pelo diretor do estabelecimento por meio
de certidão. Exige também a primariedade da mulher presa. Não há previsão
legal de um status intermediário entre o reincidente e réu primário. O conceito
de reincidente, a seu turno, é delimitado pelo art. 64 do Código Penal e não
comporta interpretações ampliativas em sede executória. Ou seja: para aferir a
primariedade da requerente, o parâmetro a ser observado é o que consta na(s)
guia(s) de recolhimento que constitui(em) o(s) título(s) a ser(em) executado(s).
Eventual pluralidade de processos criminais não significa, necessariamente,
ausência de primariedade. A lei não exige bons antecedentes, e sim primariedade,
o que equivale, tecnicamente, à não-reincidência.
A derradeira exigência legal que, desde 2018, constitui entrave de difícil
transposição à efetivação da progressão especial é o requisito de “não ter integrado
organização criminosa” (art. 112, § 3º, V ,LEP). Novamente, tem-se utilizado
interpretações extensivas ou mesmo analogias in malam partem em violação ao
princípio da legalidade. A referência aqui é ao entendimento segundo o qual o
termo “organização criminosa” se refere não ao conceito específico dado pela
Lei 12.850/2013 (art. 1º, § 1º), mas a qualquer delito praticado em concurso de
pessoas com vínculo associativo, como o art. 35 da Lei 11.343/2006 (associação
para o tráfico).
Ocorre que os elementos típicos do art. 35 da Lei de Drogas são distintos do
conceito específico da lei de organização criminosa. Enquanto o primeiro demanda
a associação de 2 (duas) ou mais pessoas reunidas reiteradamente para a prática do
delito de tráfico ilícito de substâncias entorpecentes, o segundo exige a participação
de 4 (quatro) ou mais pessoas, estruturalmente organizadas, com divisão de tarefas
bem definidas entre seus membros e voltada a prática de infrações penais com
pena máxima superior a 4 (quatro) anos ou de caráter transnacional.
Sobre o tema, o Superior Tribunal de Justiça entendeu, em 2019, nesse mesmo
sentido, rejeitando a equiparação de condenação pelo art. 35 da Lei de Drogas
ao conceito de “organização criminosa” referido na LEP: “Nota-se que os conceitos
dos tipos penais acima descritos não se confundem, de forma que o acórdão impugnado
incorreu em constrangimento ilegal ao equiparar as duas condutas, notadamente porque
na seara do Direito Penal impõe-se observância ao princípio da taxatividade, não podendo
223
Art. 112 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

haver interpretação extensiva em prejuízo do réu. (...). “(STJ, HC 539.119/SP, Rel. Min.
Jorge Mussi, j. 05/12/2019).
Por fim, dispõe o art. 112, § 4º que “o cometimento de novo crime doloso
ou falta grave implicará a revogação do benefício previsto no § 3º deste artigo”.
Não há impedimento legal à reiteração do pedido de progressão especial após
a reabilitação da falta grave e recuperação do bom comportamento, desde que
preenchidos os demais requisitos.

112.5 Requisito objetivo misto e cálculo discriminado

Quando houver cumulação de crime comum e hediondo, ou quando


houver qualquer cumulação entre situações executórias com frações distintas (v.
tabela no item 112.1) tem-se o chamado requisito temporal misto. Nesses casos,
deve-se realizar o cálculo diferenciado ou discriminado, tomando-se as penas
separadamente apenas para o cálculo do requisito. Por exemplo: imagine-se uma
condenação a 21 anos de reclusão, sendo 15 anos referente a um crime hediondo
(com fração de 40%) e 6 anos referente a um crime comum (com fração de 16%).
Para se calcular o requisito misto, deve-se calcular 2/5 (dois quintos) de 15 anos,
igual a 6 anos, somado a 1/6 (um sexto) de 6 anos, igual a pouco menos 1 ano,
resultando na fração real de aproximadamente 7 anos.
Com o aumento significativo do número possível de frações para a pro­
gressão, aumenta também a complexidade e o número de situações em que se
faz necessário o cálculo discriminado ou diferenciado. O fundamental é que a
execução de um título executivo (condenação certificada pela guia de recolhimento
definitiva ou provisória) respeite o título que será executado. Parece óbvio, mas
é preciso sempre reafirmar essa obviedade muitas vezes esquecida no cotidiano
forense. A fração aplicável é aquela adequada ao status do condenado quando
emitida a respectiva guia de recolhimento (v. item 112.6).

112.6 Requisito objetivo misto no concurso de crimes

É ainda possível, em tese, que haja concurso formal próprio entre crime
comum e crime hediondo. De acordo com a regra do art. 70, do CP, aplica-se
apenas a pena mais grave, aumentada de um sexto até a metade.
Embora somente o resultado final seja informado no processo de execução,
será necessário olhar cuidadosamente a sentença condenatória e proceder ao
cálculo discriminado, pois não é correto que a fração maior (2/5 ou 3/5) incida
224
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 112

também sobre a fração de aumento do concurso formal que decorre de crime


comum. Nesse ponto, o quantum de pena correspondente à fração de aumento
deverá servir como base de cálculo para fração de 1/6 (um sexto) da pena, para
fins de progressão de regime. O mesmo raciocínio deverá servir ao livramento
condicional.
Ainda sobre concurso de crimes, pode-se tratar de uma questão bastante
peculiar, mas possível, sobretudo nos crimes sexuais alterados pela Lei 12.015/2009:
um crime continuado que inicia em período no qual ele receberia a fração de
1/6 (um sexto), mas quando cessa a continuidade delitiva a lei prevê a aplicação
da fração de hediondo (2/5 ou 3/5). Por exemplo, um estupro de vulnerável
continuado praticado entre 2004 e 2009, considerando que apenas fatos praticados
a partir de 29 de março de 2007 é que receberão a fração referente ao crime
hediondo. Ora, o procedimento mais correto e coerente é também fazer o cálculo
discriminado, devendo se separar pena e fração de aumento pela continuidade
delitiva, sob pena de violação do princípio da irretroatividade da lei penal mais
severa. O entendimento sumulado do Supremo Tribunal Federal segundo o qual
“A lei penal mais grave aplica-se ao crime continuado ou ao crime permanente, se a vigência
é anterior à cessão da continuidade ou da permanência” (Súmula 711/STF) não se aplica
nem pode ser aplicado à execução penal porque os precedentes que o embasam
tratam de processos de conhecimento, em situações juridicamente muito distintas.

112.7 Ilegalidade da aplicação retroativa de fração mais gravosa

Inadmissível ignorar a garantia constitucional da coisa julgada e aplicar as


quatro frações mais gravosas relativas à reincidência específica (art. 112, II, IV,
VII e VIII) de forma retroativa, ou seja, à execução de uma pena originalmente
aplicada ao apenado como réu primário.
Imagine-se a situação de condenado, primário, por crime hediondo sem
morte, e que é condenado por outro crime hediondo, sem morte, agora como
reinci­dente, fazendo-se a unificação das penas. A primeira condenação deverá
receber a fração de 40% e a somente a segunda condenação deverá ser tratada
com a fração de 60%.
Da mesma forma: se a pessoa for condenada duas vezes, por exemplo, por
roubo simples, não hediondo, sendo primária, na primeira vez, e reincidente,
na segunda, as frações aplicáveis, no cálculo misto, serão respectivamente 25%
(art. 112, III) e 30% (art. 112, IV), constituindo grave equívoco e um atentado à
coisa julgada a eventual aplicação do percentual de 30% à soma das duas penas.

225
Art. 112 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

O raciocínio vale para todas as situações que combinem a aplicação de


percentuais distintos como requisito objetivo para a progressão.
No entanto, parte da jurisprudência ainda entende que a reincidência é
uma circunstância pessoal subjetiva e por isso se estenderia a todas as penas em
execução, fazendo incidir a fração mais gravosa sobre a integralidade da pena
(por exemplo, STJ, HC 307.180/RS, Rel. Min. Felix Fischer, 5ª T., j. 16/04/2015).
O entendimento está profundamente equivocado e configura excesso de execução.
A reincidência é sim circunstância agravante de natureza subjetiva, mas de
forma estritamente vinculada ao fato punível que é objeto de formação do título
executivo. Nesse caso, estar-se-ia a aplicar tal circunstância sobre a execução de
uma pena que sequer recebeu tal agravante, pois à época o apenado era primário.
Não há qualquer autorização legal para tal procedimento. Trata-se, com efeito,
de uma espécie de revisão da pena pro societate que não encontra resguardo em
nenhum fundamento legal.
O leading case no qual o STF afirmou a constitucionalidade da reincidência
(STF, RE 453.000/RS, Rel. Min. Marco Aurélio, j. 04/04/2013) teve por principal
fundamento o princípio da individualização da pena. Em vários votos, ficou
assentado que o conceito de reincidência não seria inconstitucional exatamente
por não repercutir no delito anterior, mas apenas no posterior, “porque voltou a
delinquir apesar da condenação havida”. Em seu voto acompanhando o Relator, a
Min. Rosa Weber foi bastante clara ao registrar: “Entendo que não há bis in idem,
que se trata apenas de valorar negativamente a escolha do agente em voltar a
delinquir, do que resulta maior o juízo de censura em relação a essa nova conduta
praticada, e não uma nova punição em relação ao crime pretérito”.
O que se faz quando o status de reincidente retroage e alcança a fração da
condenação pelo crime pretérito é exatamente o oposto do que a Suprema Corte
coloca em sua argumentação, com repercussão geral. Pode-se dizer, portanto, que
a aplicação retroativa do status de reincidente viola o princípio da individualização
e atenta contra a decisão do STF.

112.8 Desconto do tempo de pena remido como pena cumprida

Ao se descontar o tempo de pena remido, adota-se, nos termos do art. 128


da LEP, a regra segundo a qual tempo remido é considerado pena cumprida,
quantum que será somado ao montante de pena já cumprida a fim de verificar se
já foi alcançada a fração exigida para a progressão. Todavia, é possível que seja
verificada remição de pena por trabalho ou estudo realizados antes da atual data-
base, ou seja, antes de marco interruptivo do requisito temporal para a progressão
226
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 112

(por exemplo, o preso já progrediu ao semiaberto, mas pede a remição por período
trabalhado na unidade de regime fechado, antes da progressão). Nesse caso, não
havendo previsão legal expressa, deve prevalecer o entendimento mais benéfico
à pessoa presa, qual seja, a aplicação do art. 128 e o cômputo do tempo remido
como pena cumprida, como se o período de trabalho ou estudo tivesse ocorrido
já em regime semiaberto. Alternativamente, pode-se ainda contabilizar o tempo
remido deduzindo da pena total, para que a remição efetivamente contribua para
a aproximação do alcance do direito a nova progressão.

112.9 Requisito objetivo na segunda progressão e data-base

Em relação à contagem do requisito temporal nos casos da segunda


progressão, ou seja, quando já houve a progressão do fechado ao semiaberto e se
está a analisar a progressão do semiaberto ao aberto, algumas questões práticas
vêm à tona, como aquela sobre a incidência da fração, na segunda progressão,
sobre a pena restante, e não sobre a pena total.
Ponto muito importante diz respeito à natureza jurídica da decisão conces­
siva da progressão de regime e qual seria a data-base da segunda progressão.
O Supremo Tribunal Federal entendeu, acertadamente, ser declaratória a decisão
de progressão, e não constitutiva (STF, HC 115.254-SP, 2ª T., DJ 26.02.2016)28.
Portanto, começa a contagem do tempo para a segunda progressão na data em
que o apenado conquista o direito à primeira progressão, independentemente do
atraso na realização e no julgamento do pedido. Dessa forma, parece superado o
entendimento do Superior Tribunal de Justiça pela impossibilidade de progressão
diretamente do regime fechado ao aberto (“progressão por salto”), inadmitida
pela Súmula 491/STJ.
A Defensoria Pública da União apresentou proposta de Súmula Vinculante
com este teor: “Na execução da pena, o marco para a segunda progressão de
regime é a data em que o apenado preencher o requisito objetivo (fração de
pena) da primeira progressão, e não a data da decisão judicial ou do início do
cum­primento da reprimenda no regime anterior, sendo de natureza declaratória
a decisão judicial que reconhece o direito a progressão” (STF, PSV 137). Até o
fecha­mento desta edição, a proposta não fora decidida pelo STF.

28
Sobre, v. CACICEDO, Patrick. “A natureza declaratória da decisão de progressão de regime: notas sobre
o julgamento do HC 115.254 no Supremo Tribunal Federal”. Revista Brasileira de Ciências Criminais,
v. 124, São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016, p. 357-368.

227
Art. 112 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

Incabível fixar a data-base da segunda progressão na data de conclusão do


exame criminológico, quando houver. Seguindo o entendimento do STF referido
acima, a data-base é aquela do alcance do requisito objetivo da primeira progressão
(STJ, HC 638.702/SP, 6ª T., j. 09/03/2021).

112.10 Falta grave e data-base da progressão

Segundo entendimento jurisprudencial prevalente nos Tribunais Superiores


(Súmula 534/STJ: “A prática de falta grave interrompe a contagem do prazo para a
progressão de regime de cumprimento de pena, o qual se reinicia a partir do cometimento
dessa infração”), a confirmação judicial de falta grave implica em interrupção da
contagem da fração de pena cumprida para que se pleiteie a progressão de regime.
A Lei 13.964/2019 enfim inseriu a autorização legal para este procedimento,
com a inclusão do art. 112, § 6º: “O cometimento de falta grave durante a execução da
pena privativa de liberdade interrompe o prazo para a obtenção da progressão no regime
de cumprimento da pena, caso em que o reinício da contagem do requisito objetivo terá
como base a pena remanescente”.
O argumento prevalente no STF, antes de haver previsão legal, era que, não
fosse esta regra, a hipótese de cometimento de falta grave por preso em regime
fechado configuraria uma situação despida de sanção (STF, HC 85.141/SP, Rel.
Min. Carlos Britto, j. 05/04/2005), pois não seria cabível a regressão de regime por
já estar o apenado em regime fechado.
Ora, se o argumento era ou não razoável, ele serviria somente como
motivação para projeto de lei e debate no Congresso Nacional. A questão sempre
foi formal e relativa à inadmissibilidade de criação jurisprudencial de uma nova
espécie de sanção, sem previsão legal. Não há argumento que justifique semelhante
violação dos limites da interpretação – que deve ser sempre restritiva. Ademais,
o cometimento de falta grave implica diversas consequências gravosas, não só
pode acarretar a regressão de regime (art. 118, I, LEP) como também a perda dos
dias remidos (art. 127, LEP), mas, principalmente, um registro que fatalmente será
levado em conta na aferição do requisito disciplinar exigido para a progressão de
regime e que poderá, por isto, acarretar em sua não-concessão. Logo, não apenas
é gravíssimo que se cogite a criação de uma sanção na execução penal à revelia
da legalidade, como fazê-lo parece inócuo e desnecessário se o objetivo último
é evitar a progressão de regime ao condenado que tenha cometido falta grave.
Com base justamente no princípio da legalidade, outras súmulas do próprio
STJ vão em sentido oposto, negando que a falta grave possa constituir marco
interruptivo da contagem do requisito temporal do livramento condicional

228
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 112

(Súmula 441/STJ) e da comutação ou indulto (Súmula 535/ STJ). Na sua


jurisprudência, ainda, firmou tese de que a falta grave não interrompe a data-
base para saída temporária e trabalho externo (STJ, AgRg nos EDv nos EREsp n.
1.755.701/RS, Min. Nefi Cordeiro, Terceira Seção, DJe 19/6/2019; HC 557.783/RS,
Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, 5ª T., j. 18/02/2020).
Todos esses argumentos, que até a inserção do art. 112, § 6º serviam de base
para a crítica da interrupção da contagem sem previsão legal, tornam-se agora
fundamentos para a defesa da tese de sua irretroatividade. Como negar que se
trata de alteração de direito material? O mais correto é, enfim, que o dispositivo
incida somente sobre execuções relativas a fatos praticados a partir de 23 de janeiro
de 2020, data de início de vigência da Lei 13.964/2019.
A nova data-base será sempre a data da falta, e não a data da sanção
disciplinar ou qualquer outra possível, tendo como base de cálculo a pena
remanescente.

112.11 Data base da progressão em caso de prisão cautelar com soltura


durante o processo

Considere a hipótese de pessoa que respondia solta a processo criminal e


acaba de ser presa para que se dê início à execução de sua pena em regime fechado.
Se essa pessoa foi presa preventivamente, sendo posteriormente solta, como deve
ser computado o período de prisão preventiva?
Não basta deduzir o tempo transcorrido do montante da pena total. Mais
justo parece é considerar esse período como parte do requisito objetivo para a
progressão de regime. Para tanto, a data base deve ser fixada na data da primeira
prisão (preventiva). Embora a contagem do tempo pare no dia da soltura, não
há aqui causa de interrupção do requisito objetivo com reinício da contagem.
Mais uma vez, é importante buscar coerência e proporcionalidade em relação à
disciplina da execução provisória pro reo (Súmula 716/STF).
Nesse sentido: “Para fins do cálculo do requisito objetivo estabelecido no
artigo 112 da Lei de Execução Penal, computa-se a totalidade do prazo de prisão
cumprido, seja provisória ou por força de decisão condenatória definitiva, sendo
irrelevante o fato de ter o paciente sido solto provisoriamente entre tais marcos. O
período de pena detraído deve integrar o cálculo para a concessão dos benefícios
pleiteados em sede de execução penal” (STJ, HC 65.496/RJ, Rel. Min. Jane Silva,
DJ 24/09/2007).

229
Art. 112 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

Portanto, havendo somente uma condenação e sem o cometimento de falta


grave, a data-base será aquela do início da prisão cautelar (STJ, HC 645.920/MG,
j. 30/04/2021), ainda que a prisão preventiva tenha sido interrompida.

112.12 Requisito temporal da progressão de regime e do livramento


condicional no caso de condenações a penas privativas de liberdade
cuja soma seja superior a quarenta anos

Coerentemente ao mandado constitucional que veda a prisão perpétua


(art. 153, XI, CR), o Código Penal estabeleceu o limite de trinta anos para a
cumprimento de pena privativa de liberdade, limite este elevado para quarenta
anos pela Lei 13.964, de 2019, sendo o novo limite aplicável para atos praticados
a partir da vigência da nova lei (art. 75, caput e § 1º, CP). O texto legal afirma
que, no caso da soma das penas aplicadas ultrapassar tal limite, ocorrerá a sua
unificação a fim de que se o atenda: “Quando o agente for condenado a penas privativas
de liberdade cuja soma seja superior a 40 (quarenta) anos, devem elas ser unificadas para
atender ao limite máximo deste artigo” (art. 75, § 1º, CP).
O tema, porém, suscita grande divergência em relação à consideração da
pena unificada – e não da pena aplicada – na contagem do requisito temporal da
progressão de regime e do livramento condicional. Argumenta-se que o limite de
40 ou 30 anos se refere ao tempo de cumprimento e não constitui parâmetro para
a concessão de benefícios da execução. O raciocínio opera como se houvesse duas
penas, uma virtual que serviria de base para o cálculo dos requisitos temporais
concernentes à progressão de regime e ao livramento condicional e outra,
“unificada”, a ser realmente cumprida. A pena “unificada”, segundo a corrente
interpretação, diferencia-se da pena “aplicada”, que viria tão-somente a se exaurir
quando atingido o limite legal.
O STF tem, hoje, posição consolidada, a qual culminou na edição da Súmula
715 em 24 de setembro de 2003, segundo a qual “A pena unificada para atender ao
limite de trinta anos de cumprimento, determinado pelo art. 75 do Código Penal, não é
considerada para a concessão de outros benefícios, como o livramento condicional ou regime
mais favorável de execução”. A origem da posição do STF reside no julgamento do
RHC 63.673-0, em 29 de abril de 1986, quando se alterou entendimento anterior
e se articulou o posicionamento reiterado até a edição da Súmula 715. Mesmo
assim, o tema encontra tratamento bastante heterogêneo nos tribunais estaduais
e não é questão pacificada.

230
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 112

112.13 Colaboração premiada na execução penal e dispensa do requisito


objetivo para progressão

Dispõe o art. 4º, §5º, da Lei 12.850/2013: “Se a colaboração for posterior à sentença,
a pena poderá ser reduzida até a metade ou será admitida a progressão de regime ainda
que ausentes os requisitos objetivos”. Portanto, admite-se a redução de metade de
pena ou a progressão de regime imediata, independentemente do cumprimento
de frações da pena, para o condenado que, após a sentença, realiza acordos de
colaboração premiada. Para colaborações premiadas anteriores à sentença, o
art. 4º, caput, da mesma Lei, prevê a redução da pena em até 2/3 (dois terços)
e a substituição da pena privativa de liberdade por pena restritiva de direitos.
O perdão judicial também pode ser concedido, a qualquer tempo, conforme
“a relevância da colaboração prestada” (art. 4º, §2º, Lei 12.850/2013).

112.14 Requisito subjetivo ou disciplinar e exame criminológico

Bom comportamento carcerário, comprovado pelo Diretor do estabeleci­


mento, eis os termos da lei. A redação atual é a da Lei 13.964/2019 e o fundamento
legal se encontra no art. 112, § 1º, da LEP. Não há alteração em relação à redação
anterior, dada pela Lei 10.792/03, de 1º de dezembro de 2003, que retirou a menção
ao parecer da Comissão Técnica de Classificação e ao exame criminológico, até
então necessário à aferição do requisito. Desta forma, além do requisito temporal
é necessária apenas a comprovação de comportamento satisfatório, através de
certidão ou declaração emitida pelo diretor do estabelecimento.
O exame criminológico contém grande carga ideológica no sentido de que,
elaborado por um expert, apresenta-se como argumento de autoridade ao juiz.
Ademais, seu conteúdo é elaborado segundo as categorias da criminologia clínica
e suas conclusões voltadas à previsão de um comportamento futuro do sujeito
não são, em absoluto, “científicas”. Tramitam propostas de nova modificação,
no sentido de se resgatar o exame criminológico para alguns casos específicos.
Enquanto isso, segundo a posição predominante nos Tribunais Superiores,
a realização do exame criminológico não teria sido extinta, mas simplesmente
passado a ser facultativa, ou seja, possível quando o juiz entender adequado
para formação de seu convencimento. Vide assim a Súmula Vinculante nº 26/STF
(“Para efeito de progressão de regime no cumprimento de pena por crime hediondo, ou
equiparado, (...), podendo determinar, para tal fim, de modo fundamentado, a realização
de exame criminológico”), aplicável apenas para os casos de crime hediondo
ou equiparado; e a Súmula 439 do STJ (“Admite-se o exame criminológico pelas
peculiaridades do caso, desde que em decisão motivada), de incidência genérica. Ambas
231
Art. 112 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

súmulas exigem individualização, fundamentação e motivação da decisão que


determina a realização do exame.
Sob uma interpretação restritiva da lei, porém, é equivocada tal posição: se
o rol de requisitos exigidos para a progressão é taxativo e a alteração legislativa
retirou exatamente a menção à necessidade do exame, em 2003, entender que ele
teria passado a ser simplesmente facultativo parece ser uma indevida interpretação
extensiva in malam partem. O objetivo precípuo é a redução da margem de discri­
cionariedade na formação da convicção do juízo, que deve se pautar por critérios
mais objetivos, como por exemplo a existência/inexistência de falta grave. De todo
modo, ainda que se admita a realização do exame criminológico, a fundamentação
de sua requisição não pode se basear em juízo pessoal sobre a gravidade do crime
cometido ou apenas no quantum de pena aplicada. Trata-se de fundamentação
inidônea e estranha aos objetivos da execução penal, mormente considerando que
são circunstâncias já levadas em conta no momento de aplicação da pena. Para
que não haja bis in idem, deve-se levar em conta somente fatos ligados ao curso
do processo de execução penal.

112.15 Requisito subjetivo ou disciplinar e a objetivação da aferição e das


consequências do requisito

Muito se discutiu sobre o efeito de faltas graves cometidas no passado sobre


a aferição do requisito subjetivo ou disciplinar. Segundo o Superior Tribunal de
Justiça, seria possível invocar o direito ao esquecimento, não sendo fundamento
idôneo para indeferir o pedido de progressão de regime (STJ, HC 544.368/SP, Rel.
Min. Reynaldo Soares da Fonseca, j. 05/12/2019; AgRg no HC 504.294/SP, Rel. Min.
Nefi Cordeiro, 6ª T., j. 03/09/2019).
O debate ganhou um novo capítulo com a derrubada, em abril de 2021,
pelo Congresso Nacional, do veto ao §7º do art. 112 da LEP, incluído pela Lei
13.964/2019. O novo dispositivo, agora promulgado, dispõe que: “O bom compor­
tamento é readquirido após um ano da ocorrência do fato, ou antes, após o cumprimento
do requisito temporal exigível para a obtenção do direito”.
Passo a transcrever, abaixo, trecho de análise realizada em conjunto com
Rodri­go Duque Estrada Roig sobre o significado e as consequências desta nova
regra29.

29
ROIG, Rodrigo Duque Estrada; GIAMBERARDINO, André. “Análise e consequências da derru­
bada do veto ao artigo 112, §7º, da LEP”. Revista Consultor Jurídico, 30 de abril de 2021. Disponível
em: https://www.conjur.com.br/2021-abr-30/opiniao-analise-derrubada-veto-artigo-112-lep.

232
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 112

O texto do veto indicava contrariedade à “objetivação do requisito” para


progressão de regime. Uma vez derrubado o veto, é possível sustentar que tal
objetivação ocorreu, mas nos seguintes termos: a classificação disciplinar do
comportamento como bom ou mau segue relevante para outros fins (exemplo:
concessão de regalias), mas não para análise judicial dos direitos de execução
penal, nos quais prevalece, agora, um requisito subjetivo com parâmetros objetivos
de aferição. É que embora o sistema progressivo tenha, de fato, um componente
disciplinar inseparável de sua construção histórica — vale lembrar que o Código
Penal segue falando em “mérito do condenado” no artigo 33, §2º, —, a leitura
conjunta ao parágrafo anterior (artigo 112, §6º) esclarece que mudou a forma de
impacto do mau comportamento.
O cometimento de falta grave segue repercutindo direta e significativamente
sobre a progressão de regime, na medida em que interrompe o prazo e reinicia a
contagem do requisito objetivo. Mas apenas isso. Não é correto dizer, portanto,
que a mudança esvazia o requisito subjetivo disciplinar. Ela certamente traz
maior objetividade e impessoalidade à atribuição de consequências jurídicas ao
requisito, algo sempre saudável em uma democracia.
Se o veto presidencial expressamente combatia a suposta objetivação do
requisito e se este foi derrubado pelo Congresso Nacional, outra solução não
resta senão reconhecer que o requisito subjetivo para progressão é atendido após
um ano da ocorrência da falta grave, ou antes, se o cumprimento do requisito
temporal exigível para a obtenção do direito ocorrer durante esse período
depurador. Esse entendimento se alinha perfeitamente à sistemática do livramento
condicional, estabelecida no artigo 83, III, “b”, do CP, ao exigir para o livramento
o não cometimento de falta grave nos últimos 12 meses. A partir da rejeição do
veto presidencial ao §7º do artigo 112, passou a existir mais sistematicidade,
proporcionalidade e linearidade no tratamento legal entre progressão de regime
e livramento condicional, alinhamento este também realizado com os institutos
da comutação de pena e indulto, cujo histórico requisito subjetivo é o não
cometimento de infração disciplinar de natureza grave, nos 12 meses anteriores
à data de publicação do decreto.
Vejamos alguns pontos de ordem prática sobre a alteração legislativa do
artigo 112, §7º, da LEP:
1) O termo “fato” deve ser entendido de maneira restrita: a redação abarca apenas
as faltas disciplinares de natureza grave, jamais as médias ou leves. Isso se deve
tanto à relação existente com o §6º do artigo 112, como pela violação dos princípios
da legalidade e proporcionalidade nos casos de faltas médias ou leves produzirem
consequências de direito material sem base legal expressa nesse sentido.
233
Art. 112 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

2) Quanto à forma de cálculo: se houver o cumprimento do requisito temporal


antes de um ano da falta grave, a pessoa também readquirirá o bom compor­
tamento, como está agora expresso, e poderá obter a progressão. Este requisito
temporal é calculado com base na pena remanescente e a partir de nova data-base
correspondente à data da última falta, considerando que, segundo disposto no
§6º, o cometimento de falta grave interrompe a contagem.
3) Quanto à aplicação da lei no tempo: entendemos, a propósito, que a alteração
promovida pela Lei 13.964/2019 no §6º não deve retroagir, posto que se trata
de alteração de direito material mais gravosa (Roig, Rodrigo Duque Estrada.
“Execução Penal: Teoria Crítica”. 5ª ed. São Paulo: Thomson Reuters - Revista dos
Tribunais, 2021, p. 33; e vide acima item 112.10), carecendo de fundamento legal
o entendimento anterior, embora majoritário (expresso, por exemplo, na Súmula
534/STJ). De qualquer forma, independentemente da interpretação que se dê à
aplicação do §6º, sem dúvida o §7º retroage, sendo mais benéfico.
4) A segunda metade do §7º alcança os demais direitos da execução penal: sustentamos
que a recuperação do bom comportamento após o cumprimento do requisito
temporal exigível para a obtenção do respectivo direito contempla os demais
direitos que têm, entre seus requisitos, a aferição de bom comportamento, tais
como o livramento condicional e a saída temporária. Atendendo à sistematicidade
e à proporcionalidade que devem reger o Direito de execução penal, não faria
sentido ser diferente, até porque a mesma conduta — uma única falta grave —
não pode ter tratamento jurídico distinto em relação a requisito idêntico, previsto
para um e para outro direito. Desse modo, por exemplo, não é possível que a
pessoa presa recupere o bom comportamento para fins de progressão de regime
e, por conta da mesma falta, tenha mau comportamento para fins de livramento
condicional.
5) Interpretação lógica para limitar os efeitos temporais da interrupção da contagem
do requisito objetivo prevista no artigo 112, §6º, da LEP: se o cumprimento do requisito
temporal de progressão antes de um ano da falta grave faz com que a pessoa
presa readquira o bom comportamento, como está legalmente expresso no §7º, é
de se concluir que a lógica inversa também deva ocorrer. Nesse sentido, se o bom
comportamento é readquirido após um ano da ocorrência da falta grave (primeira
parte do §7º), a postergação do alcance do requisito objetivo para progressão em
decorrência da falta grave (§6º) não pode ser superior a um ano. Se o requisito
objetivo da progressão pode legalmente limitar o requisito subjetivo, este também
pode balizar aquele, limitando a um ano a postergação do prazo de uma nova
progressão após a interrupção por falta grave prevista no artigo 112, §6º, da LEP.

234
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 112

Portanto, para essa tese, a data da nova progressão após a interrupção do prazo
por falta grave não pode ser posterior a um ano da data anteriormente prevista
para progressão.

112.16 Progressão de regime e apenado submetido ao RDD

Não há nada que impeça a concessão de progressão de regime ao conde­


nado que esteja, no momento do pleito, sob Regime Disciplinar Diferenciado.
Evidentemente, o cometimento de falta grave que ensejou a colocação do recluso
sob o RDD pode impedir que ele possa apresentar atestado de boa conduta
carcerária, faltando assim o requisito disciplinar. Todavia, trata-se de mera
suposição, não se podendo generalizar. Impõe-se a análise do caso concreto, pois
o RDD, por si só, não impede a progressão.

112.17 Progressão de regime e decretação de prisão cautelar

Pode ocorrer de a pessoa estar presa por conta de uma prisão preventiva
ou temporária, relativa a um processo criminal em curso ou que se arrasta
na Justiça, e preencher os requisitos para progredir de regime no processo de
execução. Não se pode confundir deferimento com aperfeiçoamento da decisão.
A existência de mandado de prisão por conta de decisão em outro processo
obsta o aperfeiçoamento da decisão concessiva da progressão de regime, mas
não seu deferimento – salvo, claro, se o juízo de execução entender que o crime
ali investigado é falta grave a comprometer o requisito disciplinar. Não havendo
tal conclusão, porém, a progressão de regime deve ser deferida, inclusive com
alteração da data-base para que já se inicie o cumprimento da fração para a
próxima progressão, ao regime aberto. Afinal, a prisão cautelar, por definição,
pode cessar a qualquer momento, e se isso ocorrer a situação já estará regularizada
no âmbito da execução.
Mas atenção: se a pessoa vier a ser condenada neste processo de conhecimento
no qual havia prisão preventiva, e com a soma/unificação das penas ela deixar
de ter direito imediato à progressão, a decisão concessiva anterior (que nunca
chegou a se aperfeiçoar) deverá ser considerada sem efeitos, retornando a data-
base àquela da última prisão.
O raciocínio acima não se aplica aos casos em que a prisão cautelar foi
decretada no mesmo processo que acaba de ganhar sentença condenatória,
sendo iniciada a execução provisória da pena. Se houve a expedição de guia de

235
Art. 112 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

recolhimento provisória e a subsequente unificação provisória das penas, deixa


de subsistir a prisão cautelar vinculada ao processo de conhecimento, nos termos
da Súmula 716-STF e Resolução 113/2010-CNJ devendo o juízo realizar a análise
do regime adequado para cumprimento da pena.

112.18 Progressão de regime em crimes contra a administração pública

Há requisito específico para progressão em crimes contra a Administração


Pública: a reparação do dano ou devolução do produto do crime (art. 33, § 4º,
CP). O requisito foi julgado como recepcionado pela Constituição pelo STF
(EP 22 ProgReg-AgR/DF, Pleno, j. 17/12/2014). A exigência é mitigada, porém, no
caso de comprovada impossibilidade de fazê-lo, por interpretação analógica do
dispositivo referente ao mesmo requisito, no livramento condicional (art. 83, IV,
CP). Pondera-se que se trata do dano material, e não moral, que deve ser pleiteado,
se for o caso, na esfera cível.
O STJ vem exigindo o adimplemento integral deste requisito também
nos casos de progressão provisória de regime (execução provisória pro reo, v.
comentários e críticas no item 105.5).

112.19 O inadimplemento da pena de multa pode impedir a progressão de


regime?

Evidente que não, na medida em que não há previsão legal que estabeleça
o pagamento da pena de multa como requisito da progressão de regime.
Os con­ceitos de reparação do dano e o de devolução do produto do crime tratados
acima são muito distintos da pena de multa que é aplicada cumulativamente à
pena privativa de liberdade. Em debate sobre o art. 33, § 4º, do CP, porém, o STF
inovou e firmou tese no sentido de que “O inadimplemento deliberado da pena de multa
cumula­tivamente aplicada ao sentenciado impede a progressão no regime prisional. Essa
regra somente é excepcionada pela comprovação da absoluta impossibilidade econômica do
apenado em pagar o valor, ainda que parceladamente” e que “A jurisprudência do STF
demonstraria que a análise dos requisitos necessários para progressão não se restringiria
ao art. 112 da LEP, pois outros elementos deveriam ser considerados pelo julgador para
individualizar a pena” (STF, EP 12 ProgReg-AgR/DF, Rel. Min. Roberto Barroso,
j. 08/04/2015). Quais seriam esses outros requisitos além dos previstos em Lei?
A plena incidência do princípio da legalidade estrita à execução penal não é
compatível com grau tamanho intenso de ativismo judicial – in malam partem – e
produz enorme insegurança jurídica.
236
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 112

112.20 Progressão de regime e preso estrangeiro com pedido de extradição


deferido

O preso estrangeiro com pedido de extradição deferido também tem direito


à progressão de regime, desde que a prisão para fins de extradição tenha as suas
condições adaptadas ao regime adequado de execução da pena. Nesse sentido: “(...)
A exclusão do estrangeiro do sistema progressivo de cumprimento de pena conflita com
diversos princípios constitucionais, especialmente o da prevalência dos direitos humanos
(art. 4º, II) e o da isonomia (art. 5º), que veda qualquer discriminação em razão da raça,
cor, credo, religião, sexo, idade, origem e nacionalidade. IV - Cabe ao Juízo da execução das
penas a análise dos riscos de fuga peculiares à situação concreta, bem como a manutenção
de frequentes contatos com o Ministério de Estado da Justiça acerca do momento mais
adequado para que a extradição se efetive, evitando-se, assim, eventual colocação em regime
aberto sem as cautelas aplicáveis à espécie, tais como, a título de exemplo, a utilização de
tornozeleiras eletrônicas, instrumentos de monitoramento que têm se mostrado bastante
eficazes (...)” (STF, Ext 947 QO, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, Tribunal Pleno,
j. 28/05/2014).

112.21 Progressão de regime e preso estrangeiro em situação irregular

O preso estrangeiro em situação irregular e com pedido ou até decreto de


expulsão, da mesma forma, não impede a progressão de regime ou livramento
condicional, podendo se adotar medidas acautelatórias como, por exemplo, o
monitoramento eletrônico (STJ, HC 324.231/SP, Rel. Min. Reynaldo Soares da
Fonseca, 5ª T., j. 03/09/2015). O simples fato de o apenado estar em situação
irregular no país ou a existência de decreto de expulsão não são motivos que,
por si só, obstam a vedação da progressão de regime e o livramento condicional,
o que consistiria em violação ao princípio da igualdade.

112.22 Progressão de regime e presos incluídos em penitenciária federal

Quanto ao direito de progressão a regime semiaberto por parte de presos


incluídos em penitenciária federal, já decidiu STF e STJ que fica “suspensa” a
possibilidade de progressão de regime enquanto perdurarem as razões para
inclusão do detento no sistema penitenciário federal (STF, HC 129.509/RJ, Rel.
do acórdão Min. Roberto. Barroso, j. 24/11/2015; STJ, CC 137.110/RJ, Rel. Min.
Ericson Maranho, 3ª Seção, j. 22/04/2015). Ocorre que as unidades federais são
definidas como estabelecimentos de regime fechado, como fica claro do art. 6º
237
Art. 112 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

do Decreto 6.049/2007, não se tratando de um regime disciplinar abstratamente


aplicável a todos os regimes (fechado, semiaberto ou aberto). Logo, se a pessoa
presa tem deferido o direito de progressão ao regime semiaberto, parece mais
correto dizer que está cessado seu período de permanência no sistema federal,
devendo retornar ao sistema penitenciário de origem, não sendo possível ao juízo
de origem sequer rejeitar seu retorno.

112.23 Vedação à progressão de regime e organizações criminosas

O art. 2º, § 9º, da Lei 12.850/2013, incluído pela Lei 13.964/2019, passou a
vedar a progressão de regime, o livramento condicional “ou outros benefícios
prisionais” se houver elementos probatórios de manutenção de vínculo associativo
com organização criminosa, desde que a vinculação tenha sido expressamente
reconhecida em sentença. Assim dispõe o texto legal: “O condenado expressamente
em sentença por integrar organização criminosa ou por crime praticado por meio de
organização criminosa não poderá progredir de regime de cumprimento de pena ou obter
livramento condicional ou outros benefícios prisionais se houver elementos probatórios
que indiquem a manutenção do vínculo associativo”.
A lei não explica a natureza ou como se produziriam os “elementos proba­
tórios” indicativos da “manutenção do vínculo associativo”. Obviamente só há
natureza de prova se houver contraditório e autorização judicial, com respeito ao
procedimento legal, nos casos de utilização de “informantes” ou interceptações
telefônicas. O problema é dispor de um parâmetro tão genérico e flexível com
uma consequência tão radical, como a suspensão da possibilidade de progressão
de regime, de livramento condicional e de todos os “benefícios prisionais”.
Trata-se de vedação genérica e inconstitucional por violação tanto ao
princípio da individualização como, sobretudo, da proporcionalidade. Não há o
que justifique permitir que um condenado por crime gravíssimo possa ter direito
à progressão de regime e seu colega de cela, condenado por crimes mais leves,
não possa, apenas porque se lhe atribui a imputação de vínculo associativo com
organização criminosa.
Vale observar, por fim, que não há vinculação necessária entre a condição de
“mula”, ou seja, função de transporte da droga ilícita, e o pertencimento a orga­
ni­zação criminosa, sendo possível inclusive o reconhecimento de tráfico privi­le­
giado (STF, 131.795/SP, Rel. Min. Teori Zavascki, j. 03/05/2016; STJ, HC 387.077/SP,
Rel. Min. Ribeiro Dantas, j. 06/04/2017).

238
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 113

112.24 Progressão de regime e falta de vagas

A Súmula Vinculante nº. 56, do STF, estabelece que “a falta de estabelecimento


penal adequado não autoriza a manutenção do condenado em regime prisional mais
gravoso, devendo-se observar, nessa hipótese, os parâmetros fixados no RE 641.320/RS”.
A ementa do acórdão mencionado trouxe, nessa esteira, algumas
possibilidades importantíssimas diante da superlotação carcerária, inclusive
flexibilizando requisitos legais: “Havendo déficit de vagas, deverão ser determinados:
(i) a saída antecipada de sentenciado no regime com falta de vagas; (ii) a liberdade
eletronicamente monitorada ao sentenciado que sai antecipadamente ou é posto em prisão
domiciliar por falta de vagas; (iii) o cumprimento de penas restritivas de direito e/ou estudo
ao sentenciado que progride ao regime aberto. Até que sejam estruturadas as medidas
alternativas propostas, poderá ser deferida a prisão domiciliar ao sentenciado.” (STF, RE
641.320/RS, Rel. Min. Gilmar Mendes, Pleno, j. 11.5.2016).
Sua aplicação direta se dá sobre o regime semiaberto, possibilitando a ante­
cipação de direitos da execução penal, com a finalidade de abertura de vagas.
Sobre a Súmula e a jurisprudência dos Tribunais Superiores, ver comentários ao
artigo 85 (item 85.6).

Art. 113  O ingresso do condenado em regime aberto supõe a aceitação


de seu programa e das condições impostas pelo Juiz.

113.1 Aceitação do condenado como requisito para progredir para o regime


aberto

Há requisitos específicos para a progressão ao regime aberto. O primeiro


é a aceitação, pelo sujeito, de um programa constituído por condições legais
(art. 114 e 115, LEP) e judiciais (art. 115, LEP).

239
Art. 114 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

Art. 114  Somente poderá ingressar no regime aberto o condenado que:


I - estiver trabalhando ou comprovar a possibilidade de fazê-lo imedia­
tamente;
II - apresentar, pelos seus antecedentes ou pelo resultado dos exames
a que foi submetido, fundados indícios de que irá ajustar-se, com
autodisciplina e senso de responsabilidade, ao novo regime.
Parágrafo único. Poderão ser dispensadas do trabalho as pessoas referidas
no artigo 117 desta Lei.

114.1 Requisitos para ingressar no regime aberto

O trabalho é condição obrigatória do regime aberto, sendo esse o argumento


invocado para se negar o direito à remição pelo trabalho neste regime. Quanto
à exigência de estar trabalhando ou comprovar a possibilidade de fazê-lo
imediatamente, o juízo deve ser razoável e considerar os índices de desemprego e
o caráter fortemente discriminatório do tratamento recebido pelo egresso, fatores
que dificultam a obtenção de ocupação lícita. Não pode a falta de uma proposta
comprovada de emprego ser óbice para a concessão da progressão. Nesse sentido:
“A regra descrita no art. 114, inciso I, da Lei de Execuções Penais, que exige do condenado,
para a progressão ao regime aberto, a comprovação de trabalho ou a possibilidade imediata
de fazê-lo, deve ser interpretada com temperamentos, pois a realidade mostra que, estando
a pessoa presa, raramente possui ela condições de, desde logo, comprovar a existência de
proposta efetiva de emprego ou de demonstrar estar trabalhando, por meio de apresentação
de carteira assinada. Precedentes.” (STJ, HC 229.494/RJ, Rel. Min. Marco Aurélio
Belizze, 5ª T., j. 11/09/2012).
Segundo o próprio dispositivo (art. 114, parágrafo único), condenados
maiores de setenta anos, acometidos de doença grave, com filho menor ou
deficiente físico ou mental, ou condenadas gestantes, não são abrangidos pela
exigência.
Quanto à análise dos antecedentes e do “resultado dos exames a que foi
submetido”, mais uma vez se recorre à impossível pretensão de prognose quanto
ao comportamento do sujeito. Não há saídas para uma leitura crítica e de viés
garantista, a não ser a busca da “redução dos danos” através da exigência de
uma objetividade mínima, a qual, no caso, pode se consubstanciar na ausência
de registros de falta grave no atestado de conduta carcerária.

240
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 115

Art. 115  O Juiz poderá estabelecer condições especiais para a concessão


de regime aberto, sem prejuízo das seguintes condições gerais e
obrigatórias:
I - permanecer no local que for designado, durante o repouso e nos dias
de folga;
II - sair para o trabalho e retornar, nos horários fixados;
III - não se ausentar da cidade onde reside, sem autorização judicial;
IV - comparecer a Juízo, para informar e justificar as suas atividades,
quando for determinado.

115.1 Condições para concessão de regime aberto

São condições gerais e obrigatórias – sem prejuízo de outras condições,


especiais, que podem ser estabelecidas pelo juiz – para o cumprimento de pena
em regime aberto: a permanência em local designado, durante o repouso e em
dias de folga; o retorno do trabalho em horários fixados; não se ausentar da cidade
sem autorização judicial; e o comparecimento em juízo quando determinado.

115.2 Impossibilidade de fixar pena restritiva de direitos como condição do


regime aberto

De acordo com entendimento sumulado: “É inadmissível a fixação de pena


substitutiva (artigo 44 do CP) como condição especial ao regime aberto” (Súmula 493/STJ),
não se admitindo, portanto, a cumulação da prestação de serviços à comunidade
com o estabelecimento de regime aberto de cumprimento de pena.

115.3 Início de cumprimento da pena em regime inicial aberto

Caso se trate de início de cumprimento da pena em regime aberto, com o réu


solto, a discussão gira em torno a qual seria o momento de início de cumprimento
da pena: o trânsito em julgado da condenação ou a audiência admonitória?
A resposta repercute na interrupção do curso da prescrição da pretensão
executória, com base no art. 117, V, do Código Penal (“início ou continuação do
cumprimento da pena”). Prevalece, como posição amplamente majoritária nos
241
Art. 115 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

tribunais estaduais, o entendimento de que a pena em regime inicial aberto só


iniciaria efetivamente com a audiência admonitória.
Não há base legal, porém, para sustentar essa posição. A LEP estabelece
expressamente o primeiro comparecimento como início da execução somente para
as penas restritivas de direito de prestação de serviços à comunidade (art. 149,
2º LEP) e de limitação de fim de semana (art. 151, parágrafo único, LEP), que são
distintas da pena privativa de liberdade em regime aberto. Não cabe interpretação
extensiva in malam partem em situações que são juridicamente muito diferentes.

115.4 Natureza declaratória da decisão de progressão ao regime aberto e


audiência admonitória como mera formalidade

Por coerência, também aqui a decisão que defere a progressão de regime


haverá de ter reconhecida sua natureza declaratória, sendo a audiência admonitória
mera formalidade, absolutamente dispensável para o aperfeiçoamento da decisão.
Muito mais razoável seria, aliás, que tal audiência fosse realizada na própria
unidade, no momento de saída do regime mais gravoso ou de retirada da
tornozeleira eletrônica, tal qual ocorre com a cerimônia de livramento condicional.
No dia-a-dia, são inúmeros casos em que o regime aberto é cassado antes
mesmo de começar, de forma irrazoável e desproporcional, porque a pessoa não
compareceu à audiência admonitória no foro responsável pela fiscalização das
condições do regime aberto, o que pode ocorrer pelos mais variados motivos,
sendo muitos relacionados à mera desinformação.
A proposta de aplicação da teoria do adimplemento substancial a situações
assim é válida e correta. Tratar-se-ia de avaliar o cumprimento das obrigações
laterais – que não se confundem com a própria pena privativa de liberdade – de
forma contextualizada, ampliando as possibilidades de cumprimento tardio,
valorizando o comparecimento no patronato, ainda que não seja o local correto,
ou trazendo rigor à demanda pelo esgotamento das tentativas de localização da
pessoa em regime aberto que não comparece na audiência admonitória.
Embora se trate da adaptação de uma teoria do direito privado, vale notar
que nunca houve constrangimento ou arguição de atecnicidade na importação
similar de outras categorias, mas para prejudicar o réu, como por exemplo na
subversão da coisa julgada pela cláusula “rebus sic stantibus”. Nesse caso, trata-se
de buscar evitar decisões desproporcionais e irrazoáveis de regressão de regime.

242
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 116

115.5 Compatibilidade entre regime aberto e trabalho noturno

O trabalho noturno é perfeitamente compatível com as condições do regime,


restando equivocada a interpretação da lei no sentido de que ele estaria vedado.
O texto legal não fala em repouso necessariamente “noturno” e a vedação atentaria
contra a finalidade do próprio regime aberto.

Art. 116  O Juiz poderá modificar as condições estabelecidas, de ofício, a


requerimento do Ministério Público, da autoridade administrativa ou do
condenado, desde que as circunstâncias assim o recomendem.

116.1 Possibilidade de modificação das condições do regime aberto

Dentro dos parâmetros estabelecidos e limitados pelos princípios da


razoabilidade e proporcionalidade, o juízo de execução pode modificar, de
ofício, as condições estabelecidas. O próprio condenado, o Ministério Público e
a autoridade administrativa também podem requerer a alteração, a qual pode
ocorrer para desburocratizar e viabilizar o cumprimento das condições.

116.2 Regime aberto e pandemia da COVID19

Por conta das medidas de prevenção ao contágio por COVID19 e seguindo


a Recomendação 62/2020-CNJ, o dever de comparecimento em juízo foi suspenso
para pessoas cumprindo pena em regime aberto. Expirado o tempo, não há outra
saída legal senão declarar extinta a pena por seu integral cumprimento, visto que
o não -comparecimento decorre de determinação judicial decorrente de motivo de
força maior. Nesse sentido concordou o STJ: “O período de suspensão do dever
de apresentação mensal em juízo, em razão da pandemia de Covid-19, pode
ser reconhecido como pena efetivamente cumprida” (STJ, HC 657.382/SC, 6ª T.,
j. 27/04/2021).

243
Art. 117 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

Art. 117 Somente se admitirá o recolhimento do beneficiário de regime


aberto em residência particular quando se tratar de:
I - condenado maior de 70 (setenta) anos;
II - condenado acometido de doença grave;
III - condenada com filho menor ou deficiente físico ou mental;IV -
condenada gestante.

117.1 Possibilidade de custódia em residência domiciliar para beneficiário de


regime aberto

A possibilidade de custódia em residência particular é prevista neste artigo


apenas para o caso de condenado em regime aberto e nas hipóteses em que seja (a)
maior de 70 anos; (b) estiver com doença grave; (c) ser condenada com filho menor
ou deficiente físico ou mental ou (d) estar na condição de gestante (art. 117, LEP).
Inexistente casa de albergado, estabelecimento adequado para o cumprimento
da pena em regime aberto, a jurisprudência dos Tribunais Superiores é firme no
sentido de admitir que se trata de problema imputável ao Estado, admitindo no
caso, portanto, a prisão domiciliar.

117.2 Posição jurisprudencial consolidada pela ampliação das hipóteses de


prisão domiciliar

Já se admite há muito tempo, superando entendimento pela taxatividade e


interpretação restritiva do rol do art. 117, com fulcro no fundamento da dignidade
da pessoa humana (art. 1º, III, CR), a extensão da medida a condenados em regime
semiaberto em casos de ausência de vagas em estabelecimento adequado (SV
nº. 56/STF e REXT 641.320/RS) e regime fechado, inclusive em hipóteses de
cabimento não previstas em lei.
A jurisprudência de STF e STJ, no entanto, tem restringido a aplicação
da prisão domiciliar com base na Súmula Vinculante, asseverando não ser
“automática”: ver, sobre o assunto, comentários no item 85.6.

117.3 Prisão domiciliar e prisão especial

Além desses casos, tem-se ainda a Lei nº 5.256, de 6 de abril de 1967, que
regulamenta a prisão especial e admite a prisão domiciliar do réu ou acusado

244
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 117

“nas localidades em que não houver estabelecimento adequado ao recolhi­mento


dos que tenham direito a prisão especial” (art. 1º, Lei 5.256); no mesmo sentido,
ainda, a regra concernente aos advogados (art. 7º, V, Lei 8.906/94).

117.4 Substituição da prisão preventiva pela prisão domiciliar

A Lei da Primeira Infância (Lei 13.257/2016) modificou o Código de Processo


Penal, prevendo seu art. 318, incisos IV, V e VI, a possibilidade de substituição da
prisão preventiva pela prisão domiciliar nos casos de gestante, mulher com filho
até 12 (doze) anos de idade incompletos e homem, caso seja o único responsável
pelos cuidados do filho de até 12 (doze) anos incompletos. O STF determinou a
substituição da prisão preventiva pela domiciliar “de todas as mulheres presas
gestantes, puérperas, ou mães de crianças e deficientes sob sua guarda” (STF, HC
143.641, Rel. Min. Ricardo Lewandovski, 2ª T., j. 20.02.2018).
Note-se que a lei não exige prova pericial, ou seja, estudo psicossocial, quando
se tratar de pedido de gestante ou mulher com filho menor de 12 anos (art. 318, IV
e V, CPP), não havendo outros requisitos para a concessão da prisão domiciliar.
A prisão preventiva ainda pode ser substituída por prisão domiciliar nos
casos de réu idoso maior de 80 (oitenta) anos, se estiver “extremamente debilitado
por motivo de doença grave” ou caso seja imprescindível aos cuidados especiais de
pessoa menor de 6 (seis) anos de idade ou com deficiência (art. 318, I, II e III, CPP).
Há detração penal nos casos de prisão domiciliar: “Embora inexista previsão
legal, o recolhimento domiciliar noturno, por comprometer o status libertatis da
pessoa humana, deve ser reconhecido como pena efetivamente cumprida para
fins de detração da pena, em homenagem ao princípio da proporcionalidade e
em apreço ao princípio do non bis in idem. Precedentes” (STJ, HC 496.049/MG,
Rel. Min. Felix Fischer, j. 14/05/2019).

117.5 Descumprimento das condições da prisão domiciliar não configura


crime de desobediência

Considerando já haver previsão de sanção específica para o descumprimento


das condições impostos para custódia domiciliar, não há crime de desobe­
diência: “1. O Superior Tribunal de Justiça firmou a orientação de que o crime de
desobediência é subsidiário, estando configurado apenas quando, desrespeitada
a ordem judicial, inexistir sanção específica, ressalvada expressa cumulação.

245
Art. 118 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

2. Evidenciado que o descumprimento das condições impostas quando da


concessão da prisão domiciliar, prevista no art. 117 da Lei de Execução Penal,
importaria na regressão de regime prisional, não há falar em crime de desobe­
diência, dada a existência de sanção específica cominada. (...).” (STJ, HC 486.040/
MG, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, j. 28/03/2019).

Art. 118  A execução da pena privativa de liberdade ficará sujeita à forma


regressiva, com a transferência para qualquer dos regimes mais rigorosos,
quando o condenado:
I - praticar fato definido como crime doloso ou falta grave;
II - sofrer condenação, por crime anterior, cuja pena, somada ao restante
da pena em execução, torne incabível o regime (artigo 111).
§ 1° O condenado será transferido do regime aberto se, além das
hipóteses referidas nos incisos anteriores, frustrar os fins da execução ou
não pagar, podendo, a multa cumulativamente imposta.
§ 2º Nas hipóteses do inciso I e do parágrafo anterior, deverá ser ouvido
previamente o condenado.

118.1 Considerações gerais sobre a regressão de regime

A regressão de regime é a reversão da progressão – logo, é o retorno ao


regime anterior mais severo – que se dá por razões de ordem disciplinar ou para
a adequação da nova pena, nos termos das hipóteses previstas em lei: (a) prática
de fato definido como crime doloso ou falta grave; (b) condenação por crime
anterior, quando a unificação decorrente da soma das penas (a nova e a restante)
tornar incabível o regime atual; e (c) frustração dos fins da execução, no caso de
condenado em regime aberto.

118.2 Regressão de regime por causa da prática de fato definido como crime
doloso ou falta grave

Basta a mera “prática” do fato, não se exigindo a condenação e o trânsito em


julgado, no caso de crime doloso. Este é o entendimento amplamente majoritário
e sumulado (Súmula 526/STJ), porém não imune a críticas de corrente minoritária
que entende ser necessária a condenação definitiva.
246
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 118

Não há regressão de regime em face da prática de contravenção penal,


conforme teor expresso da LEP.
Admite-se a possibilidade de regressão de regime definitiva mesmo antes
do trânsito em julgado do “novo crime doloso” praticado (STJ, HC 333.615/SC,
Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, 5ª T., j. 15/10/2015).
Necessário, de todo modo, ao menos o processo criminal instaurado, evitando
a produção de efeitos em casos de infração de menor potencial ofensivo arquivadas
por conta da composição dos danos ou transação penal (Lei 9.099/95). Não havendo
posterior condenação, a falta grave deverá ser afastada. Vale registrar que a des­
criminalização ou despenalização superveniente de qualquer conduta deve ser
levada em consideração, esvaziando-se enquanto falta grave. O exemplo mais
significativo é o porte de drogas para uso pessoal, na medida em que se trata de
conduta já descarcerizada (art. 28, Lei 11.343/06) e que ruma à descriminalização.
Não é razoável, nesse sentido, sem que a hipótese seja especificamente prevista
como falta grave, que se a considere conduta a ensejar a regressão de regime e
demais consequências advindas do cometimento de qualquer outro crime doloso.

118.3 Regressão de regime por conta de condenação por crime anterior e


incompatibilidade da pena unificada

Visando “adequar” a nova pena total ao regime cabível, há a regressão no


caso de nova condenação referente a crime cometido anteriormente, mas cuja
pena definitiva, quando somada ao quantum de pena restante, torna incabível o
regime aberto ou semiaberto, conforme os critérios estabelecidos pelo Código
Penal (art. 33, CP).

118.4 Regressão de regime por frustração dos fins da execução, no caso de


condenado em regime aberto

A definição de frustração é vaga e subjetiva, devendo ser interpretada


restritivamente tendo por referência o art. 115 da LEP. Não é possível, por exemplo,
que um juízo de reprovação meramente moral da conduta do condenado em
regime aberto enseje tal conclusão. É razoável, por outro lado, exigir-se a prática
efetiva de fato definido como crime doloso ou alguma das modalidades de falta
grave prevista em lei (art. 50, LEP), desde que compatível com o regime aberto,
não se esquecendo que este ainda se trata de pena privativa de liberdade e que o
status do condenado não é o de egresso, diversamente do que ocorre no livramento

247
Art. 118 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

condicional (vide art. 26, II, LEP), no qual não se admite o cometimento de faltas
disciplinares.

118.5 Inadimplemento da pena de multa

Em relação à falta de pagamento da multa imposta cumulativa à privação


da liberdade, também mencionada como hipótese de regressão de regime aberto
ao semiaberto (art. 118, § 1º, LEP), observa-se que o dispositivo perdeu eficácia
desde que o inadimplemento da pena de multa passou a ser considerado dívida
de valor regida pelas normas da dívida ativa da Fazenda Pública (Lei 9268/96).
Ainda que esta posição tenha sido fragilizada pelo julgamento da ADI 3150/
DF, após a qual se passou a entender que “o inadimplemento da pena de multa
obsta a extinção da punibilidade do apenado” (STJ, AgRg no REsp 1.850.903/SP,
5ª T., j. 28/04/2020), entende-se que permanece incabível a regressão de regime
por este motivo.

118.6 Regressão e regime inicial

A regressão de regime deveria ser limitada pela fixação do regime inicial de


cumprimento de pena estabelecido na sentença condenatória, pois esse é alcançado
pela coisa julgada em sentido pro reo. É por isso que, se a sentença condenatória
determina o regime semiaberto como inicial e o condenado comete falta grave no
próprio regime semiaberto, inadmissível a hipótese de regressão ao fechado. Tal
posição, porém, é minoritária (por exemplo, v. STJ, AgRg no Resp 1.778.649/PA,
Rel. Min. Ribeiro Dantas, 5ª T., j. 18/02/2020).

118.7 Regressão cautelar

No que tange ao procedimento adotado na regressão, a primeira questão


problemática é a admissão da possibilidade de regressão cautelar ou suspensão/
sustação cautelar/provisória de regime sem previsão legal, seja invocando um
poder geral de cautela ou em aplicação analógica do art. 145 da LEP, que trata
da possibilidade de suspensão do livramento condicional. No caso, a regressão
cautelar se dá imediatamente e dispensando a oitiva do condenado. É bastante
frequente nos casos de fuga do condenado que se encontra em regime semiaberto,
quando recapturado o condenado permanece desde logo em unidade de regime
fechado ou em cadeia pública.
248
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 119

Não deveriam pairar dúvidas sobre a plena aplicabilidade dos princípios


constitucionais da ampla defesa e do contraditório (art. 5º, LV, CR) em todos os
casos, o que ensejaria interpretação extensiva do art. 118, § 2º, da LEP, ouvindo-se,
assim, Ministério Público e a defesa, além do próprio condenado, e se exigindo
a devida motivação e fundamentação da decisão (art. 93, IX, CR), sob pena
de nulidade. Argumenta-se também pela violação ao princípio da legalidade,
diante da ausência de previsão legal, e pela desnecessidade, em face do art. 684
do Código de Processo Penal, que dispensa ordem judicial para que se realize a
prisão de condenado evadido. A posição amplamente majoritária nos Tribunais
Superiores, todavia, continua sendo pela desnecessidade da oitiva no caso de
regressão cautelar, a qual, mesmo nesses casos, deve ter aplicação restritiva.

118.8 Regressão não é efeito automático ou necessário da falta grave

A regressão de regime não é um efeito mecânico ou automático do reconhe­


cimento judicial de falta grave. Ela é apenas uma das possibilidades, devendo
o juízo sopesar seus malefícios sob os parâmetros de individualização exigidos
pelo art. 57 da LEP, sendo plenamente possível, por exemplo, a homologação da
falta sem regressão de regime, ainda que com alteração da data-base, em situações
como a evasão do regime semiaberto e a recaptura sem a prática de novo delito.
É imprescindível que a decisão judicial de regressão seja fundamentada, não bas­
tando a mera referência ao dispositivo legal, sob pena de nulidade.
O STJ aparentemente admite essa posição, tanto que firmou tese pela dis­
pen­sabilidade da audiência de justificação quando houver falta grave sem
regressão de regime (STJ, AgInt no HC 532.846/SC, Rel. Min. Nefi Cordeiro,
6ª T., j. 09/12/2019; AgRg no Resp 1.827.686/MS, Rel. Min. Ribeiro Dantas, 5ª T.,
j. 17/09/2019). É honesto ponderar, todavia, que os precedentes se referem a
situações em que não há regressão de regime porque o faltoso já estava em regime
fechado. Juridicamente, de qualquer forma, a possibilidade de homologação sem
regressão é válida também para os casos de falta grave em regime semiaberto.

Art. 119  A legislação local poderá estabelecer normas complementares


para o cumprimento da pena privativa de liberdade em regime aberto
(artigo 36, 1º, do Código Penal).

249
Art. 120 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

119.1 Possibilidade de normas locais complementares sobre o regime aberto

Outras regras de cumprimento e fiscalização do regime aberto, que não


ultrapassem os limites estabelecidos pela lei federal, podem ser estabelecidas
pela legislação local.

SEÇÃO III
Das Autorizações de Saída

SUBSEÇÃO I
Da Permissão de Saída

Art. 120  Os condenados que cumprem pena em regime fechado ou


semi-aberto e os presos provisórios poderão obter permissão para sair
do estabelecimento, mediante escolta, quando ocorrer um dos seguintes
fatos:
I - falecimento ou doença grave do cônjuge, companheira, ascendente,
descendente ou irmão;
II - necessidade de tratamento médico (parágrafo único do artigo 14).
Parágrafo único. A permissão de saída será concedida pelo diretor do
estabelecimento onde se encontra o preso.

120.1 Objetivo das autorizações de saída

Segundo a Exposição de Motivos da LEP, o objetivo das autorizações de


saída é “atenuar o rigor da execução contínua da pena de prisão” (item 127),
desdobrando-se nas permissões de saída (art. 120 e 121, LEP) e nas saídas
temporárias (art. 122 a 125, LEP). Mais que mero benefício, podem ser consideradas
como um elemento do tratamento assistencial que abrange todos as pessoas presas
(permissões de saída) ou componente do sistema progressivo a incidir sobre os
apenados em regime semiaberto (saídas temporárias).

250
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 121

120.2 Considerações gerais sobre a permissão de saída

A permissão de saída consiste na permissão ao apenado em regime fechado


ou semiaberto ou ainda ao preso provisório de sair do estabelecimento por tempo
indeterminado, porém breve – “a duração necessária à finalidade da saída” (art.
121, LEP) –, com escolta, se presente alguma das duas seguintes hipóteses, ambas
de cunho humanitário (art. 120, I e II, LEP): (a) falecimento ou doença grave de
cônjuge, companheira(o), ascendente, descendente ou irmão; ou (b) razões de
saúde e necessidade de tratamento médico.
A princípio, a competência para avaliação e concessão do pedido de
permissão de saída é do diretor do estabelecimento (art. 120, parágrafo único, LEP).
De qualquer forma, é inafastável o direito de acesso à jurisdição (art. 5º, XXXV,
CR) e o pedido pode ser dirigido ao juiz de execução por conta da própria (art.
66, III, “f”, LEP), especialmente se já indeferido pela autoridade administrativa.
Embora seja comum se exigir do apenado a comprovação formal do fale­
cimento ou doença grave, assim como o respectivo parentesco, é de fato irrazoável
exigir da pessoa presa documentos de difícil acesso e em momento de sofrimento
e vulnerabilidade. Especialmente nos casos referentes à(o) compa­nheira(o), não se
pode ignorar a grande incidência de relações conjugais informais, o que implica e
recomenda que a exigência de comprovação do parentesco se paute por critérios
minimamente razoáveis.
Se o pedido for deferido, mas não for possível sua concretização em tempo
hábil por conta de questões ligadas ao próprio Poder Público – por exemplo, a
falta ou o atraso de escolta policial para o ato –, a pessoa prejudicada poderá,
certamente, pleitear indenização por danos morais no juízo competente.

Art. 121  A permanência do preso fora do estabelecimento terá a duração


necessária à finalidade da saída.

121.1 Indeterminação do prazo da permissão de saída

Diferentemente da saída temporária, a qual conta com prazos determina­


dos, a permissão de saída terá a “duração necessária” à sua finalidade, em regra
bastante curta.

251
Art. 122 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

SUBSEÇÃO II
Da Saída Temporária

Art. 122  Os condenados que cumprem pena em regime semi-aberto


poderão obter autorização para saída temporária do estabelecimento,
sem vigilância direta, nos seguintes casos:
I - visita à família;
II - freqüência a curso supletivo profissionalizante, bem como de instrução
do 2º grau ou superior, na Comarca do Juízo da Execução;
III - participação em atividades que concorram para o retorno ao con­
vívio social.
§ 1º. A ausência de vigilância direta não impede a utilização de equi­
pamento de monitoração eletrônica pelo condenado, quando assim
determinar o juiz da execução. (Redação dada pela Lei nº 13.964, de 2019)
§ 2º Não terá direito à saída temporária a que se refere o caput deste
artigo o condenado que cumpre pena por praticar crime hediondo com
resul­tado morte. (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)

122.1 Considerações gerais sobre a saída temporária

A saída temporária ou visita periódica ao lar (VPL) – tantas vezes equi­


vo­ca­damente denominada “indulto” – consiste na saída do estabelecimento
prisional sem escolta ou vigilância, por período de no máximo sete dias, com
a possibilidade de adoção de mecanismo de monitoramento eletrônico (art.
122, § 1º, LEP). Interpretação restritiva do texto legal restringiria a aplicação da
medida aos condenados em regime semiaberto, mas não há sentido em se negar
a possibilidade de saída temporária àqueles que, em regime aberto, cumprem
pena em prisão-albergue, ou mesmo àqueles que cumprem o regime semiaberto
na forma “harmonizada”, com monitoração eletrônica.
As hipóteses são previstas pelo art. 122 da LEP e são as seguintes, ipsis literis:
“(a) visita à família; (b) freqüência a curso supletivo profissionalizante, bem
como de instrução do 2º grau ou superior, na Comarca do Juízo da Execução;
(c) participação em atividades que concorram para o retorno ao convívio social”.
Por família se entenderá também a entidade familiar constituída por união
estável (art. 1.723, Código Civil) ou, na ausência desses, eventual círculo de pessoas
íntimas que guardem para com o sujeito relações de igual teor. Na ausência de
252
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 122

ulteriores restrições legais ou razões específicas vinculadas ao crime cometido, os


motivos da visita não devem ser objeto de valoração por parte do juiz, podendo
abarcar inclusive feriados e datas comemorativas.
Em relação à participação em atividades educacionais e profissionalizantes,
tem-se admitido que corram fora da comarca do Juízo de execução, mormente
quando se tratar de local próximo e de fácil acesso. Não há motivos para
indeferimento de eventual possibilidade de trabalho ou estudo no período noturno
se a pessoa presa demonstra estar disposta a cumprir regularmente os horários
estabelecidos e retornar à unidade após o compromisso, comprovando, com seus
atos, tal disposição.
A saída para participação “em atividades que concorram para o retorno
ao convívio social” é a terceira hipótese e se afigura bastante vaga, restando à
valoração judicial a análise do caso concreto.
Não se deve confundir deferimento de pedido de trabalho externo, pela
direção da unidade, com a saída temporária, na medida em que aquele é carac­
terizado pela continuidade, não sendo exigido, quando em regime semiaberto,
nenhum lapso temporal: nem aquele da saída temporária, e tampouco o quantum
de 1/6 referente ao trabalho externo quando em regime fechado (art. 37, LEP).

122.2 Hipótese de vedação da saída temporária

A Lei 13.769/2019 vedou a saída temporária ao condenado que cumpre pena


por crime hediondo com resultado morte. Vale lembrar que ela só seria possível, em
tese, após a progressão ao regime semiaberto, a qual poderá ocorrer regulamente
após cumprimento dos requisitos do art. 112 da LEP.

122.3 Saída temporária no regime semiaberto harmonizado (cumprido em


prisão domiciliar e/ou monitoramento eletrônico)

O Superior Tribunal de Justiça reconheceu, em 2019, o direito à saída tem­


porária de todos as pessoas presas em regime semiaberto, ainda que este seja
cumprido em regime domiciliar, com ou sem monitoração eletrônica. A concre­
tização da medida se daria na ampliação dos horários e do perímetro permitido
para circulação fora da custódia domiciliar.
Nesse sentido: “Ao apenado em regime semiaberto que preencher os requi­
sitos objetivos e subjetivos do art. 122 e seguintes da Lei de Execuções Penais, deve
ser concedido o benefício das saídas temporárias. No caso, a Corte local indeferiu
253
Art. 122 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

o pedido de saídas temporárias, por entender que o benefício é incompatível com


a prisão domiciliar. Observado que o benefício da saída temporária tem como
objetivo a ressocialização do preso e é concedido ao apenado em regime mais
gravoso – semiaberto –, não se justifica negar a benesse ao reeducando que se
encontra em regime menos gravoso – aberto, na modalidade de prisão domiciliar
–, em razão de ausência de vagas em estabelecimento prisional compatível com
o regime semiaberto” (HC 489.106-RS, Dje 26/08/2019).

122.4 Saída temporária para visita a amigo e agente religioso

O pleito de saída temporária para visita a amigo tem precedentes divergentes


entre si. Em junho de 2020, por exemplo, o STJ entendeu ser incabível o pedido por
ausência de previsão legal e ausência de demonstração do vínculo com a pessoa
visitada (STJ, AgRg no HC 544.503/RJ, 6ª T., j. 23.06.2020).
Em outubro de 2019, porém, o mesmo STJ entendeu possível o deferimento
da saída temporária para visita a amigo porque a interpretação sistemática
recomenda não compreender “com tamanha austeridade” o art. 122, I, da LEP
(STJ, HC 510.067/RJ, 6ª T., j. 25.10.2019). No caso concreto, pesou a demonstração
inequívoca de vínculo afetivo com a pessoa a ser visitada.
Em caso anterior, o STJ já autorizara a saída temporária para visita a agente
religioso. Embora se tratasse de condenação por crime grave (estupro com morte),
o STJ entendeu que “a visitação do paciente ao seu conselheiro consiste em
atividade que concorre para o retorno ao convívio social, nos termos do inciso III.
(...). O fortalecimento dos ensinamentos morais ao paciente, oportunizado tanto
pela possibilidade de convivência no lar do conselheiro, quando pela recompensa
advinda de um benefício obtido pela demonstração de interesse em acolher
uma vida ética e digna, devem ser, de fato, considerados como uma atividade
que contribuirá para seu retorno ao convívio social” (STJ, HC 175.674/RJ, 5ª T.,
j. 10.05.2011). No caso concreto, o agente religioso aconselhara o preso por cinco
anos, no regime fechado.
Portanto, admite-se tanto a interpretação extensiva do art. 122, I, LEP (“visita
a família”) como também o enquadramento do pedido no inciso III do mesmo
artigo, ou seja, como atividade que concorre “para o retorno ao convívio social”.
De qualquer modo, é imprescindível que o pedido seja acompanhado, no caso
concreto, pela demonstração do vínculo afetivo com a pessoa a ser visitada e da
relevância do contato.

254
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 123

Art. 123  A autorização será concedida por ato motivado do Juiz da


execução, ouvidos o Ministério Público e a administração penitenciária
e dependerá da satisfação dos seguintes requisitos:
I - comportamento adequado;
II - cumprimento mínimo de 1/6 (um sexto) da pena, se o condenado for
primário, e 1/4 (um quarto), se reincidente;
III - compatibilidade do benefício com os objetivos da pena.

123.1 Requisitos para a saída temporária

O requisito do comportamento adequado deve ser interpretado objetiva­


mente, ou seja, a partir da aferição dos registros de faltas disciplinares de natureza
grave, em consonância à regra prevista para outros direitos da execução penal.
Sobre o requisito objetivo, é pacífica a aplicação da Súmula 40 do STJ: “Para
obtenção dos benefícios de saída temporária e trabalho externo, considera-se o tempo
de cumprimento da pena no regime fechado”. Portanto, leva-se em conta o tempo
transcorrido sob regime fechado, não se reiniciando a contagem se o preso passar
ao regime semiaberto. Por proporcionalidade, o preso que adentra o regime inicial
semiaberto também não precisa cumprir o referido lapso temporal para obter o
direito à saída temporária.

123.2 Interrupção do prazo e falta grave

Havia discussão no STJ sobre a possível interrupção do prazo para concessão


de saída temporária quando houver prática de falta grave. Exemplo de precedente
favorável a essa tese: “O cometimento de falta grave pelo apenado implica reinício da
contagem do prazo para obter os benefícios relativos à execução da pena, entre eles saídas
temporárias e trabalho externo, somente sendo excepcionado o livramento condicional,
o indulto e a comutação de pena” (STJ, HC 374.086/DF, Rel. Min. Ribeiro Dantas,
5ª T., j. 20/06/2017). Exemplo de precedente contrário: “A prática de falta grave no
curso da execução não interrompe o prazo para a concessão da saída temporária e trabalho
externo, cujos requisitos estão expressamente previstos nos artigos 36, 37 e 123 da Lei
de Execuções Penais, que não faz qualquer referência à necessidade de nova contagem de
prazo para a concessão do benefício” (STJ, AgRg no REsp 1549712/DF, Rel. Min. Nefi
Cordeiro, 6ª T., j. 17/10/2017).

255
Art. 123 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

O posicionamento majoritário foi firmado em 2019, no sentido de que “a


prática de falta grave durante o cumprimento da pena não acarreta a alteração
da data-base para fins de saída temporária e trabalho externo” (STJ, AgRg nos
EDv nos EREsp n. 1.755.701/RS, Min. Nefi Cordeiro, Terceira Seção, DJe 19/6/2019).

123.3 Sobre a compatibilidade com os objetivos da pena

Na análise da “compatibilidade com os objetivos da pena”, parâmetro


fundamental é a própria finalidade de reintegração social da execução penal, sendo
este o objetivo da pena (art. 1º, LEP), não se podendo admitir que o benefício seja
negado com base em mera presunção de “provável fuga” em face do quantum
de pena restante a ser cumprido. Há sanções e consequências expressamente
previstas para todos os casos de infração disciplinar, não sendo este um argumento
legítimo para, isoladamente, denegar-se a saída temporária, sobretudo se o preso
ostenta bom comportamento e já cumpriu período considerável de pena em
regime fechado.

123.4 Decisão sobre o pedido de saída temporária

A decisão sobre o pedido é ato de competência do juiz da execução (art. 66,


IV, LEP), devendo atender à necessária motivação (art. 93, IX, CR), após oitiva do
Ministério Público e da administração penitenciária.
Há controvérsia jurisprudencial quanto à necessidade de manifestação
judicial para cada saída temporária, mesmo se periódica. Argumenta-se que a
decisão em conjunto significaria automatização do benefício por meio de indevida
delegação de poderes à administração penitenciária – esta foi, inclusive, a posição
da Súmula 520/STJ, com potencial prejuízo à população carcerária tendo em conta
a grande quantidade de pedidos. Mais razoável e correta foi a posição assumida
pelo STF, no sentido da possibilidade de um único ato judicial estabelecer um
calendário de saídas temporárias (STF, HC 128763, Rel. Min. Gilmar Mendes,
2ª T., j. 04/08/2015), desde que em decisão fundamentada e passível de revisão no
caso de falta disciplinar posterior.
Sobre este tópico, o STJ revisou e flexibilizou o afirmado na Súmula 520:
“(...). Primeira tese: É recomendável que cada autorização de saída temporária do preso
seja precedida de decisão judicial motivada. Entretanto, se a apreciação individual do
pedido estiver, por deficiência exclusiva do aparato estatal, a interferir no direito subjetivo
do apenado e no escopo ressocializador da pena, deve ser reconhecida, excepcionalmente, a

256
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 124

possibilidade de fixação de calendário anual de saídas temporárias por ato judicial único,
observadas as hipóteses de revogação automática do art. 125 da LEP. Segunda tese:
O calendário prévio das saídas temporárias deverá ser fixado, obrigatoriamente, pelo Juízo
das Execuções, não se lhe permitindo delegar à autoridade prisional a escolha das datas
específicas nas quais o apenado irá usufruir os benefícios. Inteligência da Súmula n. 520 do
STJ. Terceira tese: Respeitado o limite anual de 35 dias, estabelecido pelo art. 124 da LEP,
é cabível a concessão de maior número de autorizações de curta duração. Quarta tese: As
autorizações de saída temporária para visita à família e para participação em atividades
que concorram para o retorno ao convívio social, se limitadas a cinco vezes durante o ano,
deverão observar o prazo mínimo de 45 dias de intervalo entre uma e outra. Na hipótese
de maior número de saídas temporárias de curta duração, já intercaladas durante os doze
meses do ano e muitas vezes sem pernoite, não se exige o intervalo previsto no art. 124,
§ 3°, da LEP (...)” (STJ, REsp, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, 3ª Seção, j. 14/09/2016).

Art. 124  A autorização será concedida por prazo não superior a 7 (sete)
dias, podendo ser renovada por mais 4 (quatro) vezes durante o ano.
§ 1º Ao conceder a saída temporária, o juiz imporá ao beneficiário as
seguintes condições, entre outras que entender compatíveis com as
circunstâncias do caso e a situação pessoal do condenado: (Incluído pela
Lei nº 12.258, de 2010)
I - fornecimento do endereço onde reside a família a ser visitada ou onde
poderá ser encontrado durante o gozo do benefício; (Incluído pela Lei
nº 12.258, de 2010)
II - recolhimento à residência visitada, no período noturno; (Incluído pela
Lei nº 12.258, de 2010)
III - proibição de frequentar bares, casas noturnas e estabelecimentos
congêneres. (Incluído pela Lei nº 12.258, de 2010)
§ 3º Quando se tratar de frequência a curso profissionalizante, de ins­
trução de ensino médio ou superior, o tempo de saída será o necessário
para o cumprimento das atividades discentes. (Renumerado do parágrafo
único pela Lei nº 12.258, de 2010)
§ 3º Nos demais casos, as autorizações de saída somente poderão ser
concedidas com prazo mínimo de 45 (quarenta e cinco) dias de intervalo
entre uma e outra. (Incluído pela Lei nº 12.258, de 2010)

257
Art. 124 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

124.1 Prazo da saída temporária

Se concedida, a saída terá duração de no máximo sete dias, podendo ser


renovada por mais quatro vezes durante o ano, com um intervalo mínimo de
quarenta e cinco dias entre elas (art. 124, § 3º, LEP). Logo, tem-se um limite anual
de trinta e cinco dias. Há flexibilidade, porém, admitindo-se a concessão de mais
saídas temporárias, de menor duração, desde que não se ultrapasse o limite global
de trinta e cinco dias. O STF já negou pedido para que a contagem fosse feita
em horas, e não em dias, considerando que o preso saía da unidade às 12 horas:
“O prazo máximo de sete dias previsto no art. 124 da Lei nº 7.210/84 tem natureza penal,
haja vista que se imbrica com a própria execução da pena. 3. O dia do começo, portanto,
inclui-se no cômputo do prazo da saída temporária (art. 10, CP). 4. Não há como se
autorizar o paciente a se ausentar do presídio ou a ele retornar à zero hora, não apenas
por importar em indevida contagem do prazo em horas (art. 11, CP), como também por
questões de evidente segurança penitenciária” (STF, HC 130883, Rel.
Min. Dias Toffoli, 2ª T., j. 31/05/2016).
Ainda, há e deve haver toda a flexibilidade no caso de se tratar de frequência
a curso profissionalizante, supletivo ou superior, quando então o tempo será o
“necessário para o cumprimento das atividades discentes” (art. 124, §2º, LEP).

124.2 Condições da saída temporária

O juiz estabelecerá determinadas condições obrigatórias ou “outras que


entender compatíveis com as circunstâncias do caso e a situação pessoal do con­
denado” (art. 124, § 1º, LEP), sendo obrigatório o fornecimento de endereço onde
possa ser encontrado, o recolhimento à residência visitada no período noturno
e a proibição de frequentar bares, casas noturnas ou similares. As tendências
recentes em prol do monitoramento eletrônico abarcam também a possibilidade
de sua utilização como forma de controle do condenado em regime semiaberto
que obtém o direito à saída temporária (art. 146-B, II, LEP), embora não seja
recomendável “ocupar” um equipamento em situação que não gera abertura de
vaga no sistema penitenciário.

124.3 Ausência de previsão de interrupção ou suspensão da pena

Os dias fruídos em saída temporária são computados como pena cumprida,


pois não há previsão de suspensão da pena nesse caso. Caso o sentenciado não

258
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 125

retorne na data estipulada, poderá ser considerado foragido, havendo, apenas


a partir desse momento, com base em determinação judicial, interrupção da
execução da pena.

Art. 125  O benefício será automaticamente revogado quando o


condenado praticar fato definido como crime doloso, for punido por
falta grave, desatender as condições impostas na autorização ou revelar
baixo grau de aproveitamento do curso.
Parágrafo único. A recuperação do direito à saída temporária dependerá
da absolvição no processo penal, do cancelamento da punição disciplinar
ou da demonstração do merecimento do condenado.

125.1 Revogação da saída temporária

A revogação é obrigatória no caso de prática de fato definido como crime


doloso, punição por falta grave, desatendimento das condições da autorização
ou apresentar baixo grau de aproveitamento do curso. Considerando que os dois
primeiros pontos – prática de crime doloso e punição por falta grave – são também
causas de regressão de regime (art. 118, I, LEP), recomenda-se aguardar ao menos
o desfecho do processo administrativo disciplinar. Observa ROIG, ainda, que
apenas faltas graves com nexo direto em relação aos deveres inerentes à saída é
que configuram causa legítima de revogação30.
Na hipótese de o condenado reverter o quadro desfavorável – sendo
absolvido na respectiva esfera judicial ou disciplinar, ou ainda demonstrando
merecimento –, ocorre a recuperação de seu direito à saída temporária (art. 125,
parágrafo único, LEP).

30
ROIG, Rodrigo Duque Estrada. Execução Penal, p. 380.

259
Art. 126 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

SEÇÃO IV
Da Remição

Art. 126  O condenado que cumpre a pena em regime fechado ou


semiaberto poderá remir, por trabalho ou por estudo, parte do tempo de
execução da pena. (Redação dada pela Lei nº 12.433, de 2011).
§ 1º A contagem de tempo referida no caput será feita à razão de:
(Redação dada pela Lei nº 12.433, de 2011)
I - 1 (um) dia de pena a cada 12 (doze) horas de frequência escolar -
atividade de ensino fundamental, médio, inclusive profissionalizante, ou
superior, ou ainda de requalificação profissional - divididas, no mínimo,
em 3 (três) dias; (Incluído pela Lei nº 12.433, de 2011)
II - 1 (um) dia de pena a cada 3 (três) dias de trabalho. (Incluído pela Lei
nº 12.433, de 2011)
§ 2º As atividades de estudo a que se refere o § 1º deste artigo poderão
ser desenvolvidas de forma presencial ou por metodologia de ensino
a distância e deverão ser certificadas pelas autoridades educacionais
competentes dos cursos frequentados. (Redação dada pela Lei nº 12.433,
de 2011)
§ 3º Para fins de cumulação dos casos de remição, as horas diárias de
trabalho e de estudo serão definidas de forma a se compatibilizarem.
(Redação dada pela Lei nº 12.433, de 2011)
§ 4º O preso impossibilitado, por acidente, de prosseguir no trabalho ou
nos estudos continuará a beneficiar-se com a remição. (Incluído pela Lei
nº 12.433, de 2011)
§ 5º O tempo a remir em função das horas de estudo será acrescido de 1/3
(um terço) no caso de conclusão do ensino fundamental, médio ou supe-
rior durante o cumprimento da pena, desde que certificada pelo órgão
competente do sistema de educação. (Incluído pela Lei nº 12.433, de 2011)
§ 6º O condenado que cumpre pena em regime aberto ou semiaberto
e o que usufrui liberdade condicional poderão remir, pela frequência a
curso de ensino regular ou de educação profissional, parte do tempo de
execução da pena ou do período de prova, observado o disposto no inciso
I do § 1º deste artigo. (Incluído pela Lei nº 12.433, de 2011)
§ 7º O disposto neste artigo aplica-se às hipóteses de prisão cautelar.
(Incluído pela Lei nº 12.433, de 2011)
§ 8º A remição será declarada pelo juiz da execução, ouvidos o Ministério
Público e a defesa. (Incluído pela Lei nº 12.433, de 2011)

260
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 126

126.1 Considerações gerais sobre a remição

A remição consiste na compensação, como pena cumprida, de um dia de


pena para cada três dias de trabalho ou ainda para cada doze horas de frequência
escolar divididas em, no mínimo, três dias (art. 126, § 1º, I e II, LEP). Através do
instituto, eleva-se o quantum de pena cumprida. Há ao menos dois fatos geradores
do direito à remição: o trabalho e o estudo, com possibilidade concreta de
ampliação hermenêutica do sentido de estudo para abarcar novas modalidades.
Tem sido amplamente admitida pelo STJ a interpretação extensiva do art.
126, abarcando o trabalho artesanal e outras atividades que podem não estar
expressamente previstas no dispositivo legal (STJ, REsp 1.720.785/ RO, Rel.
Min. Ribeiro Dantas, 5ª T., j. 12/03/2018; AgRg no HC 416.050/SC, Rel. Min. Joel
Paciornik, 5ª T., j. 06/02/2018; REsp 1666637/ES, Rel. Min. Sebastião Reis Junior,
6ª T., j. 26/09/2017, entre outros).

126.2 Remição pelo trabalho

De acordo com o art. 126, II, da LEP, o condenado soma 1 (um) dia de pena
cumprida para cada 3 (três) dias de trabalho, o que é possível somente quando
em regime fechado ou semiaberto. Não há remição pelo trabalho, portanto, para
condenados em regime aberto, em livramento condicional, em prisão domiciliar ou
cumprindo pena restritiva de direitos, regra sujeita a críticas de base constitucional
e principiológica.
A regulamentação do trabalho carcerário ou realizado fora do estabeleci­
mento penal estabelece uma jornada entre seis e oito horas, com descanso em
domingos e feriados (art. 33, LEP), exigindo-se a habitualidade, estabilidade e
continuidade do serviço prestado. Se extrapolado o limite, será considerado um
dia de trabalho a cada seis horas extras (STJ, REsp 106.493-4/ RS, Rel. Min. Og
Fernandes, j. 11/12/2009).
Pela mesma lógica, também os períodos trabalhados com período inferior
a 6 horas devem ser computados e contabilizados para fins de remição (STJ, HC
664.330/MG, Rel. Min. Reynaldo da Fonseca, j. 05/05/2021).
Exige-se a comprovação documental da carga horária de trabalho realizado,
assim como o registro preciso dos dias trabalhados, excluindo-se os dias de
descanso e quando a atividade laborativa for inferior a seis horas. No entanto, se a
jornada inferior a seis horas foi determinação da direção do presídio, sem qualquer
indisciplina, subsiste o direito à remição, com base nos princípios da segurança
jurídica e da proteção da confiança (STF, RHC 136.509, Rel. Min. Dias Toffoli,
261
Art. 126 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

2ª T., j. 04/04/2017; STF, HC 143.324/ MG, Rel. Min. Dias Toffoli, j. 04/05/2017; STJ,
REsp 1.721.257/MG, 5ª T., Rel. Min. Jorge Mussi, j. 05/06/2018).
É possível que haja horário especial de trabalho aos designados para serviços
de conservação e manutenção e, enfim, também possível se afigura o trabalho
em domingos e feriados, por inteligência do próprio art. 33, parágrafo único, da
LEP. Se a direção do estabelecimento atestar o trabalho em domingos e feriados,
não há dúvida sobre o direito à remição (STJ, HC 346.948/RS, Rel. Min. Reynaldo
Soares da Fonseca, 5ª T., j. 21/06/2016).
É possível a cumulação da remição pelo trabalho e pelo estudo, conforme
expressamente previsto pelo art. 126, § 3º, LEP, devendo as horas estabelecidas
para cada atividade serem compatibilizadas. Sobre o tema, entendeu o STF que
a pessoa presa tem direito à remição da pena por trabalho e estudo realizados
concomitantemente, desde que dentro dos limites diários de jornada de trabalho
e de frequência escolar, individualmente considerados (STF, RHC 187.940, 2ª T.,
j. 05/03/2021).
Importante, ainda, atentar à regra do art. 126, § 4º, segundo o qual “o preso
impossibilitado, por acidente, de prosseguir no trabalho ou nos estudos, continuará a
beneficiar-se com a remição”. Deve-se compensar 1 (um) dia de pena remida para cada
3 (três) dias de paralisação diretamente ligada ao acidente ocorrido. Ocorrendo a
verificação técnica da recuperação do condenado, evidentemente cessará a remição
por dias parados e deverá ocorrer o retorno ao trabalho.
Na medida em que a lei não distingue a natureza do trabalho, contam
para a remição tanto trabalho interno como externo, seja ele manual, agrícola,
industrial ou artesanal. A remição por atividade laborativa extramuros é admitida
expressamente pela Súmula 562 do STJ: “É possível a remição de parte do tempo de
execução da pena quando o condenado, em regime fechado ou semiaberto, desempenha
atividade laborativa, ainda que extramuros”.
A jurisprudência do STJ admite a remição por trabalho para o preso
que exerce função de “representante de galeria”, desde que a atividade seja
formalmente reconhecida pela direção do estabelecimento penal (STJ, AgRg no
HC 515.431/RS, 6ª T., j. 19/09/2019; REsp 1.804.266/RS, 6ª T., j. 11/06/2019; HC
460.630/RS, 6ª T., j. 11/06/2019).

126.3 Remição pelo estudo e pela leitura

A regra é de 1 (um) dia de pena remida/cumprida para cada doze horas


de frequência escolar divididas em, no mínimo, três dias (art. 126, § 1º, I, LEP).

262
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 126

Há remição tanto no estudo presencial como no estudo à distância (art. 126,


§ 2º, LEP), devendo os cursos frequentados obter certificação das autoridades
educacionais competentes. Não é relevante se o dia de frequência escolar era útil
ou não útil (STJ, AgRg REsp 1.487.218/DF, Rel. Min. Ericson Maranho, j. 5.2.2015).
A Lei 12.433/11 trouxe ainda outras regras e possibilidades especialmente
relevantes. Desde logo, diferentemente da remição pelo trabalho, há remição
pelo estudo também para os condenados em regime aberto ou no período de
prova do livramento condicional, além dos casos de regime fechado e semiaberto,
o que se dá “pela frequência a curso de ensino regular ou de educação profissional”
(art. 126, § 6º, LEP).
Como incentivo à persistência nos estudos, prevê o art. 126, § 5º, LEP, a
possibilidade de acréscimo de 1/3 (um terço) do tempo a remir nos casos de
conclusão do ensino fundamental, médio ou superior durante o cumprimento
da pena, exigindo-se a certificação pelo órgão educacional competente. Por
“ensino superior” deve se considerar como abarcada a conclusão de cursos de
pós-graduação, lato ou strictu sensu, pois estes constituem espécies daquele.
A referência, nesse ponto, sempre foi a Recomendação nº. 44/2013, do
Conselho Nacional de Justiça, a qual regulamenta diversos aspectos da remição
pelo estudo e pela leitura. Entre eles, no item IV, como proceder à aplicação
do art. 126, § 5º, quando a conclusão do ensino médio se dá pela aprovação no
Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM) ou Exame Nacional para Certificação
de Competências de Jovens e Adultos (ENCCEJA), por esforço próprio do
apenado, sem que tenha havido efetiva frequência escolar: “Na hipótese de o
apenado não estar, circunstancialmente, vinculado a atividades regulares de ensino no
interior do estabelecimento penal e realizar estudos por conta própria, ou com simples
acompanhamento pedagógico, logrando, com isso, obter aprovação nos exames nacionais
que certificam a conclusão do ensino fundamental Exame Nacional para Certificação de
Competências de Jovens e Adultos (ENCCEJA) ou médio Exame Nacional do Ensino
Médio (ENEM), a fim de se dar plena aplicação ao disposto no § 5º do art. 126 da LEP
(Lei n. 7.210/84), considerar, como base de cálculo para fins de cômputo das horas, visando
à remição da pena pelo estudo, 50% (cinquenta por cento) da carga horária definida
legalmente para cada nível de ensino [fundamental ou médio - art. 4º, incisos II, III e seu
parágrafo único, todos da Resolução n. 03/2010, do CNE], isto é, 1600 (mil e seiscentas)
horas para os anos finais do ensino fundamental e 1200 (mil e duzentas) horas para o
ensino médio ou educação profissional técnica de nível médio”.
Admitindo a aplicação da Recomendação nesses termos, v. STJ, AgRg no
HC 416.050/ SC, Rel. Min. Joel Paciornik, 5ª T., j. 06/02/2018. O Supremo Tribunal
Federal também entendeu pela aplicação da Recomendação, destacando a
263
Art. 126 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

observância da carga horária do ensino médio regular como base de cálculo, e


não a menor carga horária da modalidade EJA – Educação de Jovens e Adultos
(STF, RHC 165.084/SC, Rel. Min. Gilmar Mendes, j. 17/05/2019).
Esclarecendo dúvida sobre a interpretação da Recomendação, o STJ
uniformizou entendimento dispondo que: “A controvérsia diz respeito à
remição da pena no patamar de 50% da carga horária definida legalmente para
o ensino fundamental, em virtude da aprovação no ENCCEJA. Questiona-se se
as 1.200/1.600h dispostas na Recomendação n. 44/2013 do CNJ já equivalem aos
50% da carga horária definida legalmente para cada nível de ensino ou se os 50%
incidirão sobre essas 1.200/1.600h. (...) interpretar que as 1.600 horas mencionadas
na Recomendação 44/2013 do CNJ correspondem a 50% da carga horária definida
é justamente cumprir o dispositivo, porquanto o CNE não estabeleceu 1600
horas anuais como o máximo possível. Essa particular forma de parametrar a
interpretação da lei “ é a que mais se aproxima da Constituição Federal, que faz
da cidadania e da dignidade da pessoa humana dois de seus fundamentos (incisos
II e III do art. 1º). (...) Assim, a base de cálculo de 50% da carga horária definida
legalmente para o ensino fundamental deve ser considerada 1.600 horas, a qual,
dividida por doze, resulta em 133 dias de remição em caso de aprovação em todos
os campos de conhecimento do ENCCEJA. Serão devidos, portanto, 26 dias de
remição para cada uma das cinco áreas de conhecimento. Logo, como o paciente
obteve aprovação integral, ou seja, nas cinco áreas de conhecimento, a remição
deve corresponder a 133 dias, acrescido de 1/3, que totaliza 177 dias remidos.”
(STJ, HC 602.425/SC, 3ª Seção, j. 04/04/2021).
Ou seja, a aprovação em todas as áreas de conhecimento do ENCCEJA enseja
o direito à remição de 177 dias.
A Recomendação 44/2013 foi, porém, revogada pela Resolução 391/2021-
CNJ, de 10 de maio de 2021. A nova Resolução absorve as mesmas regras em seu
art. 3º, parágrafo único, e também estabelece diretrizes e procedimento para a
remição pela leitura.
A remição pela leitura é modalidade de remição pelo estudo e não exige
alteração legislativa para poder ser implementada, sendo constitucional e possível,
ainda, sua previsão em leis estaduais, tendo em vista o art. 24, I, da Constituição,
que prevê competência legislativa concorrente para União, Estados e Distrito
Federal em matéria de direito penitenciário. O direito à remição pela leitura foi
reconhecido pelo STF em março de 2021 (STF, AgRg no HC 190.806/SC, 2ª T.
j. 30/03/2021).
Já vem sendo implementado o benefício, nesse sentido, no Sistema Peni­ten­
ciário Federal, com base na Portaria Conjunta 276, de 20 de junho de 2012, com
264
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 126

respaldo tanto do Conselho Nacional de Educação (CNE) como do Conselho


Nacional de Política Criminal e Penitenciária (CNPCP). Os critérios adotados
foram os seguintes: o preso tem entre 21 (vinte e um) e 30 (trinta) dias para
leitura de uma obra literária, apresentando nesse prazo uma resenha que deverá
ser submetida a critérios legais de avaliação (fidedignidade e clareza), sendo
possível a remição de 4 (quatro) dias de pena, no limite de até 12 (doze) obras e
48 (quarenta oito) dias remidos por ano (art. 4º, Portaria 276-MJ).
No Estado do Paraná, a Lei Estadual 17.329/2012 estende a remição pela
leitura ao direito penitenciário estadual: com a leitura mensal de 1 (uma) obra,
apresentação de relatório ou resenha submetido a avaliação dos profissionais
da educação do Estado, tendo por critérios a ortografia, a coesão e a coerência,
poderá o leitor, com nota superior a 6 (seis) pontos, remir 4 (quatro) dias de pena.
A nova Resolução do CNJ, aprovada em maio de 2021, estabelece que “para
cada obra lida corresponderá a remição de 4 (quatro) dias de pena, limitando-se,
no prazo de 12 (doze) meses, a até 12 (doze) obras efetivamente lidas e avaliadas
e assegurando-se a possibilidade de remir até 48 (quarenta e oito) dias a cada
período de 12 meses” (art. 5º, V). Mudança interessante é a garantia da remição
pela leitura de qualquer obra literária, “independentemente de participação em
projetos ou de lista prévia de títulos autorizados” (art. 5º, caput). A pessoa terá de
21 a 30 dias para realizar a leitura, contados do empréstimo do livro, devendo, em
até 10 dias após, apresentar relatório de leitura conforme roteiro a ser fornecido
pelo Juízo ou pela respectiva Comissão de Validação, a qual validará o relatório
sem caráter de avaliação pedagógica ou de prova (art. 5º, § 1º, III).
É controversa a possibilidade de remição por estudo ou leitura por ocasião da
conclusão de cursos de estudos bíblicos. Um dos problemas apontados pelo STJ é
a apresentação apenas do certificado de conclusão do curso, sem possibilidade de
se aferir a frequência em horas (STJ, HC 508.120/SC, j. 12/11/2019). Nos Tribunais
de Justiça dos Estados há decisões divergentes entre si, ora reconhecendo a
possibilidade de remição (TJMG, AgEx 0192930-13.2020.8.13.0000, out. 2020), ora
negando, como em São Paulo, onde o Tribunal de Justiça declarou inconstitucional
a Lei Estadual 16.648/18-SP que regulamentava a remição pela leitura, incluindo
a leitura da Bíblia (TJSP, ADI 2182765-41.2019.8.26.0000, j. 29/01/2020).
A remição será sempre declarada pelo juiz da execução, após ouvir Ministério
Público e Defesa (art. 126, § 8º, LEP), não havendo violação a direitos, porém, em
casos de procedimento automatizado regulamentado por portaria do juízo que
visa apenas conferir maior celeridade à declaração judicial dos dias remidos.

265
Art. 126 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

126.4 Remição e preso provisório

O instituto é inteiramente aplicável ao preso provisório – neste caso, porém,


o trabalho é uma faculdade, e não um dever, do apenado, e a remição será
posteriormente considerada na detração, no caso de condenação, conjugando-se
os art. 126, § 7º da LEP, e art. 42 do CP.

126.5 Remição por trabalho executado antes do início da execução da pena

Entende o STJ pela possibilidade de remição por trabalho adimplido antes do


início da execução da pena, desde que posterior ao delito: “1. Não se desconhece
que este Superior Tribunal de Justiça firmou orientação quanto à impossibilidade
de remição do tempo de trabalho executado em momento anterior à prática do
delito da pena a ser remida. 2. Nos casos, no entanto, em que o labor tenha sido
realizado em data posterior à prática do delito cuja condenação se executa, ainda
que anterior ao início da execução, é possível a aplicação do instituto” (STJ, HC
420.257/RS, Rel. Min. Nefi Cordeiro, j. 19/04/2018).

126.6 Novas modalidades de remição e as práticas sociais educativas

Novas modalidades de remição também são cada vez mais colocadas em


discussão e podem ser levadas ao Poder Legislativo ou Judiciário, como a remição
pelo esporte, por atividades musicais, com base em interpretação extensiva in
bonam partem do art. 126 da LEP. Por exemplo, já foi reconhecido direito à remição
por participação em coral (STJ, RESP 1.666.637, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior,
6ª T., j. 26/09/2017).
Em maio de 2021, o Conselho Nacional de Justiça aprovou a Resolução
391/2021-CNJ, estabelecendo procedimento para “o reconhecimento do direito
à remição de pena por meio de práticas sociais educativas”, por meio de ativi­
dades escolares, práticas sociais educativas não-escolares e leitura de obras lite­
rárias. Entre as práticas sociais educativas não-escolares, inclui-se atividades
de natureza “cultural, esportiva, de capacitação profissional, de saúde, dentre
outras, de participação voluntária, integradas ao projeto político-pedagógico
(PPP) da unidade ou do sistema prisional e executadas por iniciativas autônomas,
instituições de ensino públicas ou privadas e pessoas e instituições autorizadas
ou conveniadas com o poder público para esse fim” (art. 2º, parágrafo único, II).

266
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 126

126.7 Remição ficta e a pandemia do novo Coronavírus

Discute-se, ainda, hipóteses de remição em que não há, efetivamente, a


concretização do trabalho ou estudo, pelas mais variadas razões, e ainda assim
se possa declarar dias remidos – por isso a denominação “remição ficta”. Há uma
hipótese legal de remição ficta, que é a regra do art. 126, § 4º, segundo o qual “o
preso impossibilitado, por acidente, de prosseguir no trabalho ou nos estudos, continuará
a beneficiar-se com a remição”.
São controversas, mas relevantes, as sugestões de se conceder remição
quando não há oferta, por parte do Estado, de oportunidades de trabalho e/ou
estudo. Se há tal obrigação legal ao Estado, assiste razão a ROIG quando observa
que vedar a remição ficta, nesses casos, acaba punindo duplamente a pessoa
punida: por não poder trabalhar ou estudar e por não poder valer-se da remição31.
Em importante exemplo, o Juízo da Corregedoria do Sistema Prisional da
Comarca de Joinville, Santa Catarina, determinou pela Portaria 8/2018 a aplicação
de remição ficta (a cada 3 dias de pena cumprida, 1 dia de remição) “a quem não
for proporcionado trabalho” nos termos da LEP “e que declare do próprio punho
que deseja trabalhar, nos exatos termos da remição pelo trabalho”.
O advento da pandemia do novo Coronavírus fortaleceu este debate, visto
que milhares de pessoas presas que estavam trabalhando e estudando subitamente
pararam de fazê-lo por conta das medidas sanitárias de prevenção ao contágio.
Aventa-se a possibilidade de aplicação direta do próprio art. 126, § 4º à situação,
equiparando os obstáculos oriundos da pandemia ao conceito de acidente de
trabalho. Até o fechamento desta edição o tema não chegara aos Tribunais
Superiores, mas vem encontrando posições divergentes nos Estados.
Há notícia de concessão de remição ficta nesses termos, por exemplo, ao
menos no Distrito Federal e em comarcas do Estado da Bahia e de Minas Gerais.
Em Santa Catarina, após Habeas Corpus coletivo impetrado pela Defensoria
Pública do Estado, o Tribunal de Justiça chegou a instaurar incidente de resolução
de demandas repetitivas (IRDR) para deliberar sobre o alcance da norma do art.
126, § 4º, mas acabou por denegar a ordem, entendendo que a crise decorrente
da pandemia não pode ser equiparada a acidente de trabalho (TJSC, HC 5016498-
48.2020.8.24.0000, j. 09/12/2020).
Concordamos com o voto vencido, proferido pela Relatora: “a nosso sentir,
a interrupção de todas as atividades laborais e/ou intelectuais em andamento por

31
ROIG, Rodrigo Duque Estrada. Execução Penal, p. 393.

267
Art. 126 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

conta da barreira sanitária imposta nos estabelecimentos prisionais para obstar a


proliferação do vírus amolda-se perfeitamente à conceituação de acidente. Logo,
os presos que ficaram impossibilitados, por acidente - leia-se, pelas barreiras
sanitárias impostas repentinamente a fim de conter o avanço da pandemia do
coronavírus que assola o País - de prosseguirem no trabalho, nos estudos ou em
programas de leitura, devem continuar a se beneficiar com a remição, porquanto
abarcados pela disposição do § 4º do art. 126 da LEP”.
Tal posição foi defendida, inclusive, pelo Conselho Nacional do Ministério
Público por meio da Nota Técnica 2/2020: “Nos casos de restrição ou suspensão
das autorizações de saída, bem assim de limitação de circulação dos presos que se
encontrem no gozo de trabalho externo (excepcional), trabalho interno e atividades
de ensino ou programas de leitura, sugere-se que sejam aventadas a possibilidade
de consideração de tempo ficto do período respectivo ao recolhimento para fins de
contenção da pandemia, para posterior consideração de institutos como remição
e verificação de comportamento carcerário” (itens 2.2 e 2.3).
Um indicativo de possível posicionamento na mesma linha foi a suspensão,
pelo STF, do art. 29 da Medida Provisória 927/2020, permitindo que a contaminação
do trabalhador por Covid-19 fosse considerada doença ocupacional, a depender
do caso concreto (STF, ADI 6342, ADI 6344, ADI 6349, ADI 6352, e ADI 6354, j.
29/04/2020). A Medida Provisória acabou perdendo validade, mas o debate sobre
a natureza jurídica das consequências da pandemia em determinados contextos
é análogo.

126.8 Penas ilícitas: remição ficta ou compensação penal decorrente de


condições degradantes de prisão

A proposta de remição por conta da superlotação carcerária, com condições


degradantes de custódia, é polêmica. Quando proposta pelo Min. Roberto Barroso
no STF, entendeu a maioria da Corte que o tribunal não poderia criar nova hipó­tese
de remição sem previsão legal, sendo somente caso de reconhecimento do direito à
indenização por danos morais, por conta das condições degradantes: “(...) Aplicação
analógica do art. 126 da Lei de Execuções Penais. Remição da pena como indenização.
Impossibilidade. A reparação dos danos deve ocorrer em pecúnia, não em redução da
pena. Maioria.” (STF, REXT 580.252/MS, Rel. p/ acórdão: Min. Gilmar Mendes,
j. 16/02/2017). A proposta é controversa porque pode ser interpretada como espécie
de “remição por tortura”, além da implícita liberação de responsabilidades aos
gestores do sistema prisional.

268
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 126

O tema tem grande densidade teórica por meio da categoria de penas ilícitas
do ponto de vista qualitativo32, ensejando direito à indenização pelo Estado porque
há excesso em relação à pena fixada na sentença condenatória. O tempo linear
passa a ser tratado como tempo vivencial, produzindo outros parâmetros para
aferição do cumprimento da pena. Trata-se de um dos principais debates – quiçá
o principal – dentre os temas contemporâneos e avançados de execução penal, e
que por ora não comporta aprofundamento neste volume.
A Corte Interamericana de Direitos Humanos determinou, em Medida
Provisória constante de Resolução de 22/11/2018, o cômputo de remição ficta
por pena cumprida nas condições degradantes no Instituto Penal Plácido de
Sá Carvalho (IPPSC), no Complexo Penitenciário de Bangu, no Rio de Janeiro:
“O Estado deverá arbitrar os meios para que, no prazo de seis meses a contar da presente
decisão, se compute em dobro cada dia de privação de liberdade cumprido no IPPSC,
para todas as pessoas ali alojadas, que não sejam acusadas de crimes contra a vida ou a
integridade física, ou de crimes sexuais”.
O STJ corroborou o entendimento e concedeu ordem neste sentido: “vale
asseverar que, por princípio interpretativo das convenções sobre direitos
humanos, o Estado-parte da CIDH pode ampliar a proteção dos direitos humanos,
por meio do princípio pro personae, interpretando a sentença da Corte IDH
da maneira mais favorável possível aquele que vê seus direitos violados. No
mesmo diapasão, as autoridades públicas, judiciárias inclusive, devem exercer o
controle de convencionalidade, observando os efeitos das disposições do diploma
internacional e adequando sua estrutura interna para garantir o cumprimento
total de suas obrigações frente à comunidade internacional, uma vez que os países
signatários são guardiões da tutela dos direitos humanos, devendo empregar a
interpretação mais favorável a indivíduo. Logo, os juízes nacionais devem agir
como juízes interamericanos e estabelecer o diálogo entre o direito interno e o
direito internacional dos direitos humanos, até mesmo para diminuir violações
e abreviar as demandas internacionais. É com tal espírito hermenêutico que se
dessume que, na hipótese, a melhor interpretação a ser dada, é pela aplicação a
Resolução da Corte Interamericana de Direitos Humanos, de 22 de novembro de
2018 a todo o período em que o recorrente cumpriu pena no IPPSC“ (STJ, RHC
136.961/RJ, j. 28/04/2021).

32
VACANI, Pablo. La cantidad de pena en el tempo de prisión: sistema de la medida cualitativa. Buenos
Aires: AdHoc, 2015.

269
Art. 126 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

126.9 Remição por trabalho no regime semiaberto harmonizado cumprido


em prisão domiciliar e/ou monitoração eletrônica

Em algumas decisões de Tribunais estaduais, o direito à remição pelo trabalho


é negado porque a pessoa está em regime semiaberto harmonizado, em custódia
domiciliar e/ou sob monitoração eletrônica, afirmando-se se tratar de um “regime
aberto”, e não semiaberto.
Porém, tal posicionamento demandaria a formalização do reconhecimento
de uma progressão antecipada ao regime aberto. Não é possível que o regime
semiaberto harmonizado seja “equiparado ao regime aberto” apenas no ponto
que prejudica o sentenciado.
Sobre o tema, destaca-se a posição do Superior Tribunal de Justiça que
reco­nhece a possibilidade de remição da pena por trabalho realizado em prisão
domiciliar, em regime semiaberto harmonizado: “em se tratando de remição da
pena, é, sim possível proceder à interpretação extensiva em prol do preso e da
sociedade, uma vez que o aprimoramento dele contribui decisivamente para os
destinos da execução” (STJ, AGRg no Resp 1689353/SC, Rel. Min. Sebastião Reis
Júnior, j. 06/02/2018).
Outro exemplo: “PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO
RECURSO ESPECIAL. EXECUÇÃO CRIMINAL. AUSÊNCIA DE ESTABE­LE­
CIMENTO PRISIONAL COMPATÍVEL COM O REGIME SEMIABERTO. APE­
NADO USUFRUINDO PRISÃO DOMICILIAR. REMIÇÃO DA PENA PELO
TRABALHO. POSSIBILIDADE. ART. 126 DA LEP. AGRAVO NÃO PROVIDO.
A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é firme no sentido de que os
sentenciados que cumprem pena no regime semiaberto ou fechado têm direito à
remição da pena pelo trabalho, consoante a previsão legal do art. 126 da Lei de
Execução Pena. Precedentes. In casu, o apenado faz jus ao benefício da remição,
pois, apesar de cumprir pena no regime intermediário, encontra-se em prisão
domiciliar em decorrência única e exclusiva da ausência de vaga adequadas e com­
patíveis com o regime semiaberto, ou seja, em razão da falência do próprio sis­te­
ma carcerário. Agravo regimental não provido.” (STJ, AgRg no Resp 1505182/RS,
Rel. Min. Ribeiro Dantas, j. 03/05/2018).

126.10 Possibilidade de arredondamento para cima dos dias remidos

É controversa a hipótese de arredondar para cima o saldo remanescente de


dias remidos. Em situação na qual havia saldo de 0,33 dia a remir por trabalho,
entendeu o STJ que o arredondamento para cima “representaria premiação sem
270
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 127

a necessária contrapartida do sentenciado, sendo que o saldo remanescente será


somado a futuras horas de trabalho, inexistindo, pois, prejuízo ao apenado”
(STJ, AgRg no HC 618.959/PR, 6ª T., j. 02/03/2021).
Todavia, em caso concreto envolvendo remição pelo estudo, o Tribunal
entendeu de modo distinto, em importante decisão: “(...) 2. É firme o entendimento
desta Corte Superior no sentido de que os cálculos aplicados na execução da pena
também devem ser interpretados de forma mais benéfica ao apenado. Precedentes.
3. Nesse contexto, não resultando em número inteiro o cálculo dos dias a serem
remidos, opera-se o arredondamento matemático dos algarismos decimais para
o número inteiro imediatamente superior, entendimento que se mostra mais
razoável. 4. Na espécie, as instâncias ordinárias, no cálculo da remição, dividiram
por 12 as 224 horas de estudos cumpridas pela reeducanda, resultando em 18,666
dias a serem remidos, tendo a Corte a quo mantido o arredondamento da fração
excedente (0,666) para declarar remidos 19 dias de pena (e-STJ fls. 93/94), o que
não merece reparos.” (STJ, AgRg no REsp 1.914.970/MT, 5ª T., j. 32/02/2021).

Art. 127  Em caso de falta grave, o juiz poderá revogar até 1/3 (um
terço) do tempo remido, observado o disposto no art. 57, recomeçando
a contagem a partir da data da infração disciplinar. (Redação dada pela
Lei nº 12.433, de 2011)

127.1 Perda de dias remidos como sanção

Trata-se de dispositivo bastante controverso que prevê a perda de dias


remidos como sanção específica para o reconhecimento judicial de falta disciplinar
de natureza grave. Previa o artigo, até a Lei 12.433/2011, a perda integral do
tempo remido no caso de cometimento de falta grave. A severa regra foi objeto
de muitos questionamentos sobre sua constitucionalidade, posicionando-se o
STF com a edição da Súmula Vinculante nº 9, em 2008, com o seguinte teor:
“O disposto no art. 127 da Lei 7.210/84 foi recebido pela ordem constitucional vigente
e não se lhe aplica o limite temporal previsto no caput do artigo 58”, referindo-se, na
parte final, ao dispositivo da LEP que limita a trinta dias a suspensão de direitos.

271
Art. 127 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

127.2 Debate sobre a constitucionalidade da perda dos dias remidos

A argumentação pela inconstitucionalidade do dispositivo – presente no


próprio STF em posição minoritária – sempre levou em conta a natureza da sentença
do reconhecimento da remição, declarada pelo juiz de execução (art. 126, § 3º, c.c.
art. 66, III, c, LEP), formando assim coisa julgada. A inconstitucionalidade estaria
exatamente na violação de direito adquirido e do princípio da intangibilidade do
julgado favorável ao réu (art. 5º, XXXVI, CR).
Para a posição majoritária, a remição seria mecanismo premial, chegando
a ser utilizada metáfora comparando-a com créditos em um registro bancário
que podem ser estornados se desrespeitadas as regras, no caso, disciplinares,
cuja observância permanece enquanto condição resolutiva ou sujeita à cláusula
rebus sic stantibus. Já para a perspectiva minoritária, não se trata de mero meca­
nismo disciplinar e sim de elemento tratamental de uma pena voltada à resso­
cialização: sendo assim, cada dia remido é um direito adquirido na forma de uma
complementação de seu próprio salário pelo trabalho realizado.

127.3 Necessidade de fundamentação da decisão

Com a Lei 12.433/11, que retroage e alcança todos os condenados que tiveram
a perda integral dos dias remidos em momento anterior, o art. 127 passou a
prever que, em caso de falta grave, o juiz poderá decretar a perda apenas de até
um terço (1/3) dos dias remidos, observando o art. 57 da LEP, o qual determina
que “na aplicação das sanções disciplinares, levar-se-ão em conta a natureza, os motivos,
as circunstâncias e as consequências do fato, bem como a pessoa do faltoso e seu tempo de
prisão”. A contagem recomeça a partir da data da infração disciplinar.
Como se vê, a decretação da perda dos dias remidos não é vinculada, mas
uma faculdade do magistrado, o qual tem obrigação de motivar a decisão segundo
os critérios do art. 57 da própria LEP. No caso de sua aplicação, estabelece-se o
limite máximo de um terço (1/3) dos dias remidos, devendo a perda ser em menor
monta se assim indicarem as circunstâncias do caso concreto. Segundo o STJ,
“caracteriza coação ilegal a decretação da perda dos dias remidos na fração máxima de 1/3
sem fundamentação concreta” (STJ, HC 282.265/RS, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, 6ª
T., j. 22/04/2014). Por outro lado, o STJ admite que “falta de natureza especialmente
grave” fundamente a perda dos dias remidos na fração legal máxima de 1/3 (STJ,
AgRg no HC 550.207/SP, 5ª T., j. 18/02/2020).

272
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 128

A perda só poderá ocorrer se houver a efetiva punição pela respectiva


falta grave, com o devido procedimento administrativo disciplinar e a oitiva do
apenado, não obstante a obscuridade do texto legal nesse ponto.

127.4 Limite temporal da possibilidade de perda de dias remidos

A perda dos dias remidos só pode atingir período de trabalho ou estudo


anterior ao cometimento da infração disciplinar, até pela natureza premial do
instituto. É inadmissível, por exemplo, que no ato de homologação judicial da
falta grave se decrete a perda de dias remidos obtidos no lapso temporal entre o
cometimento da falta e sua análise judicial, ou seja, trabalho ou estudo realizado
posteriormente à infração disciplinar (STJ, HC 541.649/SP, Rel. Min. Leopoldo
de Arruda Raposo (Convocado), 5ª T., j. 12/11/2019; REsp 1517936/RS, Rel. Min.
Maria Thereza de Assis Moura, 6ª T., j. 01/10/2015).
Por outro lado, quanto a dias de trabalho ou estudo já comprovados,
mas ainda não declarados remidos, é comum que o juízo de execução declare
dias remidos pendentes e, de imediato, decrete sua perda em decorrência de
falta disciplinar de natureza grave. O STJ admite essa possibilidade invocando
“interpretação sistemática e teleológica” do artigo (STJ, REsp 1672643/RS, Rel.
Min. Rogerio Schietti Cruz, 6ª T., j. 03/10/2017).

127.5 Inaplicabilidade para o liberado condicional que comete novo delito

O art. 127 não atinge o egresso que se encontra em período de prova do


livramento condicional e usufrui do direito à remição por estar frequentando curso
de ensino regular ou de educação profissional. Isto porque se trata de egresso, não
subordinado ao sistema disciplinar da LEP e que, por isso, não comete a falta grave
a que se refere o dispositivo em tela, sem prejuízo das consequências específicas
previstas para o descumprimento das condições do livramento condicional (STJ,
HC 271.907/SP, Rel. Min. Rogerio Schietti, 6ª T., j. 27/03/2014).

Art. 128  O tempo remido será computado como pena cumprida, para
todos os efeitos. (Redação dada pela Lei nº 12.433, de 2011)

273
Art. 128 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

128.1 Cômputo do tempo remido como pena cumprida

A redação do art. 128 dada pela alteração em 2011 encerrou controvérsia


sobre a forma de cálculo do abatimento dos dias remidos com o acolhimento da
posição que já se manifestava como majoritária na jurisprudência. Tratando-se
de norma material e mais benéfica, a nova redação do art. 128 retroage e atinge
condenados que tiveram o cálculo da pena remida realizado segundo a corrente
minoritária.
Havia, em síntese, duas correntes, que divergiam entre (a) somar o tempo de
pena remida ao tempo de pena já cumprida ou (b) subtrair do total de pena aplicada
o tempo de pena remida, com consequências significativas no cálculo final do
requisito temporal exigido para outros benefícios penitenciários.
A posição ora acolhida pela lei é acertadamente a primeira, tratando a
remição com a mesma lógica da detração penal: tempo remido é pena cumprida.
Logo, o cálculo do requisito temporal em outros institutos considerará o tempo
de pena remida como pena já cumprida, simplesmente somando-as para verificar
se já foi cumprida a fração necessária ao benefício correspondente.
A forma de cálculo adotada repercute sobre o quantum máximo de
cumprimento de pena – 30 (trinta) anos, segundo o art. 75 do Código Penal. Afinal,
o quantum de pena remida será, para todos os efeitos, “pena cumprida”, fazendo
com que o condenado chegue ao tempo de 30 (trinta) anos de pena cumprida
mesmo que não tenha, efetivamente, permanecido este tempo no cárcere.

128.2 Período de trabalho ou estudo anterior à data-base para direitos da


execução

Podem ocorrer situações em que o pedido de remição se refira a período


de trabalho ou estudo anterior à atual data-base para progressão de regime
e/ou livramento condicional. Por exemplo, o preso já está em regime semiaberto
e pede remição “com atraso” por período trabalhado no regime fechado. Caso
o art. 128 seja aplicado mecanicamente, há o risco desta remição muito pouco
efeito produzir em relação ao requisito objetivo para ele pleitear a progressão
ao regime aberto. O mais justo e correto parece ser, nesse caso, garantir que os
dias remidos lançados no atestado de pena como pena cumprida e posterior à
data-base ou, caso não seja este o entendimento adotado, que o tempo remido
seja deduzido da pena remanescente, não se aplicando neste específico caso o
art. 128 em sua literalidade.

274
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 129

Art. 129  A autoridade administrativa encaminhará mensalmente ao


juízo da execução cópia do registro de todos os condenados que estejam
trabalhando ou estudando, com informação dos dias de trabalho ou das
horas de frequência escolar ou de atividades de ensino de cada um deles.
(Redação dada pela Lei nº 12.433, de 2011)
§ 1º O condenado autorizado a estudar fora do estabelecimento penal
deverá comprovar mensalmente, por meio de declaração da respectiva
unidade de ensino, a frequência e o aproveitamento escolar. (Incluído
pela Lei nº 12.433, de 2011)
§ 2º Ao condenado dar-se-á a relação de seus dias remidos. (Incluído pela
Lei nº 12.433, de 2011)

129.1 Encaminhamento ao juízo de informações sobre atividades que


implicam em remição de pena

O registro e o encaminhamento ao Juízo de Execução do número de dias


de trabalho de todos os condenados que estejam exercendo atividade laborativa
é encargo mensal da administração penitenciária. Logo, falhas no registro não
podem prejudicar o condenado, que tem direito a receber a relação de seus dias
remidos (art. 129, § 2º, LEP) e deve ser favorecido em caso de dúvida.
Da mesma forma, para a remição pelo estudo, se o condenado estiver preso,
o registro e o encaminhamento ao Juízo de Execução do registro de frequência
escolar e aproveitamento é encargo mensal da administração penitenciária. Porém,
se estiver solto, é o próprio condenado que deverá comprovar as informações
(art. 129, § 1º, LEP).
São ilegais quaisquer exigências de requisitos não expressamente previstos
em lei, sobretudo para declaração de dias remidos por estudo.
O bom comportamento não é requisito para declaração dos dias remidos,
sem prejuízo de, havendo notícia de falta grave, aplicar-se a posteriori a sanção
descrita no art. 127.

Art. 130  Constitui o crime do artigo 299 do Código Penal declarar ou


atestar falsamente prestação de serviço para fim de instruir pedido de
remição.

275
Art. 131 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

130.1 Crime de falsidade ideológica

A LEP busca aqui evidenciar que a falsa declaração ou certificação de serviço


prestado para instruir pedido de remição configura crime de falsidade ideológica,
tipificado pelo art. 299 do Código Penal.

SEÇÃO V
Do Livramento Condicional

Art. 131  O livramento condicional poderá ser concedido pelo Juiz da


execução, presentes os requisitos do artigo 83, incisos e parágrafo único,
do Código Penal, ouvidos o Ministério Público e Conselho Penitenciário.

131.1 Considerações gerais sobre o livramento condicional

O livramento condicional é hoje, no Brasil, um instituto de direito peni­


tenciário orientado à colocação antecipada do condenado em liberdade na etapa
final da execução da pena – por isso não é propriamente um substitutivo penal –,
cumpridos certos requisitos e de forma vinculada a um programa de tratamento.
Ele é independente do regime de cumprimento em que se encontra o condenado.
Historicamente, o livramento é componente fundamental dos lineamentos
originais do sistema progressivo irlandês, no qual seria a última e fundamental
etapa da execução da pena. No Brasil, foi introduzido na legislação nacional
pelo Código Penal de 1890 (art. 50 a 52), mas ganhou aplicabilidade apenas com
a Lei n o. 4.577, de 5 de setembro de 1922, seguida do Decreto no. 16.665, de 6 de
novembro de 1924. Atualmente, sua regulamentação legal conjuga dispositivos do
Código Penal (art. 83 a 90) e da Lei de Execução Penal (art. 131 a 146), tratando,
respectivamente, dos aspectos substanciais e procedimentais.
A natureza jurídica do livramento condicional é de modalidade de cumpri­
mento da pena.
O instituto é aplicável apenas aos casos de pena aplicada igual ou superior
a dois anos (art. 83, CP), após o cumprimento de determinada fração da pena
e o atendimento de outros pressupostos. Entretanto, negar a possibilidade de
livramento a um reincidente, por exemplo, que preenche os requisitos, apenas
porque condenado a uma pena inferior a dois anos, não faz sentido e parece grave
violação aos princípios da igualdade e da razoabilidade. É viável argumentar,
276
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 131

nesse sentido, pela não recepção do texto legal, neste ponto, pela Constituição
de 1988.

131.2 Requisitos ou pressupostos para o livramento condicional

Os requisitos ou pressupostos normativos para a admissibilidade do


livramento condicional podem ser caracterizados como (a) objetivo ou temporal;
(b) reparação do dano; e (c) subjetivo ou avaliação clínico-criminológica sobre o apenado.

131.3 Requisito objetivo ou temporal

De acordo com o Código Penal, a pessoa deve cumprir (I) mais de um terço
da pena, caso não seja reincidente em crime doloso e apresente bons antecedentes
(art. 83, I, CP); (II) mais de metade da pena, se reincidente em crime doloso (art.
83, II, CP); (III) mais de dois terços da pena, se a condenação tiver sido por crime
hediondo, prática de tortura, tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, tráfico
de pessoas e terrorismo, se o apenado não for reincidente específico em crimes
dessa natureza (art. 83, V, CP).
O crime de associação para o tráfico (art. 35, Lei 11.343/2006), embora
não seja equiparado a hediondo, tem requisito específico de 2/3 (dois terços)
da pena previsto no art. 44, parágrafo único, da mesma Lei. Prevalece no STJ o
entendimento pela aplicação da fração, com base no princípio da especialidade
(STJ, HC 526.196/RS, Rel. Leopoldo de Arruda Raposo, j. 12/11/2019).
Descabido e ilegal, porém, pretender aplicar a fração de 2/3 (dois terços) ao
tráfico privilegiado, ou seja, quando há incidência da minorante prevista no art.
33, § 4º, da Lei 11.343/2006. O art. 44 da Lei de Drogas, que estabelece a fração
mais gravosa, menciona expressamente apenas o caput e o § 1º do art. 33. O tráfico
privilegiado não tem natureza de crime equiparado a hediondo, como assentado
pelo STF no HC 118.533/MS, julgado em 23/06/2016 e que tratava de um pedido
de livramento condicional, e agora pelo disposto pelo art. 112, § 5º da LEP.
O primário de maus antecedentes deve cumprir mais de um terço da pena,
enquadrando-se no inciso I do art. 83 do CP, pois incabível interpretação analógica
em outro sentido (STJ, HC 102.278/RJ, 6ª T., Rel. Min. Jane Silva, j. 03.04.2008; STJ,
HC 26.140/RJ, 6ª T., Rel. Min. Paulo Medina, j. 18.11.2003)
A aferição da periculosidade que precede a definição do quantum de pena
cumprida exigida deve ter um critério objetivo, assim como no sursis, na medida
em que haverá reincidência tão-somente se a pena referente à condenação
277
Art. 131 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

por fato cometido nos termos da definição legal de reincidência não tiver sido
cumprida há mais de cinco anos (art. 64, I, CP). Em relação ao conceito de bons e
maus antecedentes, há que se resolver a tensão inafastável para com o princípio
da presunção de inocência. O STJ já se manifestou sobre o tema afirmando que
o livramento condicional não pode ser negado apenas com base nos “maus
antecedentes”, mormente se a circunstância já foi sopesada na aplicação da pena
(STJ, HC 57.300/SP, 5ª T., Rel. Min. Gilson Dipp, j. 05.12.2006).
Assim como na progressão de regime, quando houver cumulação de crime
comum e hediondo, tem-se o chamado requisito temporal misto. Nesses casos,
deve-se realizar o cálculo diferenciado ou discriminado, tomando-se as penas
separadamente.
No caso de condenação superveniente em razão do cometimento de novo
crime, as penas são somadas (art. 84, CP), mantendo-se a data-base na primeira
prisão (salvo se o novo crime tiver sido cometido durante o período de prova,
pois nesse caso se aplica o art. 88 do CP). Mas se tratando de crime anterior ao
livramento, a unificação das penas, no que toca ao livramento, não tem o condão
de alterar a data-base deste último.
Não há relação entre a data-base da progressão de regime e aquela do
livramento condicional. Havendo progressão de regime, a fração exigida para
o livramento condicional continua sendo calculada com base no total da pena
aplicada, mantendo-se a data-base na primeira prisão. E havendo livramento
condicional, não deve ser interrompida a data-base para progressão. Embora se
trate de prática corriqueira, é equivocada a interrupção da contagem do requisito
objetivo da progressão de regime porque o preso saiu em livramento condicional,
justamente porque o livramento, nos moldes atuais, não constitui etapa do sistema
progressivo, tratando-se de direitos independentes entre si.
Em nenhuma hipótese, portanto, a não ser que haja novo crime durante o
período de prova, reinicia-se a contagem do requisito temporal para o livramento
condicional. O cometimento de falta grave não enseja a interrupção, nos termos da
Súmula 441 do STJ; e a superveniência de nova condenação, com a consequente
unificação das penas, também não pode permitir a interrupção, o que violaria
gravemente a literalidade da lei penal (art. 84, CP).

131.4 Requisito da reparação do dano e cumprimento das obrigações civis


decorrentes do crime

A concessão de livramento condicional é também subordinada ao adimple­


mento das obrigações civis decorrentes do crime, ou seja, a reparação do dano,
278
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 131

“salvo efetiva impossibilidade de fazê-lo” (art. 83, IV, CP). Há forte movimento,
todavia, no sentido de entender que a Lei 10.792/03 teria derrogado este dispo­
sitivo, passando a exigir somente o “bom comportamento”.
Há base legal com potencial, nesse ponto, para a valoração da construção
de práticas de mediação e justiça restaurativa, com a participação da vítima, no
âmbito da execução penal, indo-se além da concepção meramente pecuniária do
conceito de reparação, a qual pode ser simbólica e dialogicamente construída.

131.5 Requisito subjetivo ou da valoração clínico-criminológica do autor

Trata-se de um conjunto de critérios eminentemente subjetivos (art. 83, III


e parágrafo único, CP) que constituem o pilar ideológico e estrutural do tema:
em linhas gerais, prevê-se uma série de valorações subjetivas diagnósticas e
prognósticas voltadas à pessoa do apenado, sempre com forte apelo à criminologia
clínica, quando não ao mero e grosseiro exercício de adivinhação.
O art. 83, III, do CP, foi alterado pela Lei 13.964/2019. Antes, a referência era
mais genérica: exigia-se (i) comprovação de comportamento satisfatório durante
a execução da pena, (ii) bom desempenho no trabalho e (iii) aptidão “para prover
à própria subsistência mediante trabalho honesto”. Após as alterações, a redação
atual do dispositivo demanda a comprovação de: “a) bom comportamento durante
a execução da pena; b) não cometimento de falta grave nos últimos 12 (doze)
meses; c) bom desempenho no trabalho que lhe foi atribuído; e d) aptidão para
prover a própria subsistência mediante trabalho honesto”.
Duas alterações pontuais, portanto: a substituição de “satisfatório” por
“bom” na adjetivação do comportamento durante a execução da pena e a inclusão
de exigência objetiva referente à ausência de falta grave nos últimos 12 (doze)
meses.
Quanto à comprovação de comportamento satisfatório durante a execução da
pena, já entendeu o STJ ser ilegal limitar a análise deste requisito aos últimos seis
meses de execução da pena (STJ, REsp 1.325.182/ DF, Rel. Min. Rogerio Schietti
Cruz, 6ª T., j. 20/02/2014).
Por outro lado, se não há penas perpétuas, qualquer efeito penal ou disci­
plinar deve ter um lapso temporal de duração, não podendo faltas graves gerarem
efeitos indefinidamente.
O debate tende a continuar, mesmo com as alterações da Lei 13.964/2019, pois
o termo cujo sentido está frequentemente em discussão – “durante a execução da
pena” – foi mantido. Mas é razoável argumentar que a alínea “b” constitui novo
279
Art. 131 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

critério vinculante de interpretação da alínea “a”: ter bom comportamento durante


a execução da pena seria exatamente não cometer faltas graves nos últimos 12
(doze) meses. A alegação de que seriam exigências independentes entre si não faz
sentido, na medida em que esvazia e torna inócua a própria alteração legislativa
que incluiu a alínea “b” no texto legal.
Entendeu a I Jornada de Direito Penal e Processo Penal do Conselho da
Justiça Federal e STJ que esta delimitação de 12 (doze) meses aplica-se apenas às
infrações penais praticadas a partir de 23/01/2020, quando entrou em vigor a Lei
13.964/2019. Porém, se o caso concreto indicar que há faltas graves anteriores sendo
levadas em consideração para indeferir o livramento condicional, a alteração é
mais benéfica no caso concreto e deve assim ser considerada, retroagindo.
O art. 83, parágrafo único, do CP, por sua vez – “Para o condenado por crime
doloso, cometido com violência ou grave ameaça à pessoa, a concessão do livramento ficará
também subordinada à constatação de condições pessoais que façam presumir que o liberado
não voltará a delinquir” –, implica um prognóstico sobre o comportamento futuro
do condenado por crime doloso com violência ou grave ameaça à pessoa. Como
é evidente, parece impossível se realizar qualquer juízo objetivamente verificável
sobre o comportamento futuro de alguém. O dispositivo muitas vezes é base
para a realização de perícias médico-psiquiatras, o que não significa, de qualquer
forma, que elas sejam capazes de “prever o futuro”. O dispositivo chegou a ter a
sua constitucionalidade questionada, mas o STF o considerou recepcionado pela
Constituição (STF, HC 69740, Rel. Min. Celso de Mello, j. 18/05/1993), considerando
que a realização da perícia dependeria de juízo discricionário do magistrado que
o considerasse necessário para formação de seu convencimento.
A questão é que a redação do art. 112 da LEP dada pela Lei 10.792, de
1º de dezembro de 2003, deixara de exigir a realização de exame criminológico
para a concessão de progressão de regime, estendendo a disposição também
ao livramento condicional. Assim, além do requisito temporal seria necessária
apenas a comprovação de comportamento satisfatório, através do diretor do
estabelecimento, excluindo-se a realização de perícias médico-psiquiátricas e do
exame criminológico. Sobre o debate quanto à possibilidade do juiz ainda assim
requerer a sua realização, remete-se à discussão travada no item sobre a pro­
gressão de regime.

131.6 Hipóteses de vedação do livramento condicional

As alterações promovidas pela Lei 13.964/2019 no art. 112 da LEP incluíram


a expressão “vedado o livramento condicional” somente para os primários e
280
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 131

reincidentes condenados por crime hediondo ou equiparado com resultado morte


(ver art. 112, VI, “a”, e VIII, LEP).
A nova regra passa a conviver com a anterior, que já vedava o livramento
para o reincidente específico em crime hediondo, tortura, tráfico de drogas ilícitas
e terrorismo (art. 83, V, CP), esta introduzida pela Lei dos Crimes Hediondos (Lei
8.072/90).
O conceito de “reincidência específica” do art. 83, V, do CP, não é devi­
damente esclarecido pelo texto legal, que se refere a “crimes dessa natureza”,
apresentando-se, por conta disso, ao menos três possíveis interpretações: (a) uma
ampliativa, entendendo bastar que sejam crimes hediondos ou equiparados a
hediondo para a configuração da reincidência específica; (b) outra restritiva, que
exige uma identidade mais consistente entre os tipos penais, como o mesmo bem
jurídico tutelado; (c) e por fim outra ainda mais restritiva, a qual entende só haver
reincidência específica se for caso de condenações por um mesmo tipo penal.
O art. 44, parágrafo único, da Lei 11.343/06, também veda o livramento
condicional ao reincidente específico nos crimes ali listados (arts. 33, caput e §
1º, e 34 a 37, da mesma Lei). Em qualquer caso, não há reincidência específica
entre condenações por tráfico de drogas e tráfico privilegiado, o qual não tem
sequer natureza equiparada a hediondo, não incidindo a vedação constante do
dispositivo.
Por outro lado, a Lei 13.964/2019 foi bastante clara quanto aos casos de crime
hediondo ou equiparado com resultado morte e silenciou diante das demais
hipóteses de crime hediondo ou equiparado sem resultado morte, ainda que
se trate de reincidente. Em outras palavras, a ausência da expressão “vedado o
livramento condicional” no inciso VI da nova redação do art. 112 parece se colocar
como antinômica em relação à parte final do art. 83, V, do Código Penal. Sendo
assim, prevalecendo a regra posterior, a vedação ao livramento condicional deve
incidir apenas quando o crime hediondo ou equiparado tiver resultado morte.
Uma segunda e grave hipótese de vedação ao livramento condicional decorre
do art. 2º, § 9º, da Lei 12.850/2013, incluído pela Lei 13.964/2019: “O condenado
expressamente em sentença por integrar organização criminosa ou por crime
praticado por meio de organização criminosa não poderá progredir de regime
de cumprimento de pena ou obter livramento condicional ou outros benefícios
prisionais se houver elementos probatórios que indiquem a manutenção do
vínculo associativo”.
Ou seja, a manutenção do vínculo com organização criminosa, tendo a
vinculação sido expressamente reconhecida em sentença, também seria causa de
impedimento à obtenção da progressão e do livramento. A lei não explica como

281
Art. 132 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

se dá a instrução comprobatória da “manutenção do vínculo associativo”, com a


consequência radical de suspensão de todos os “benefícios prisionais”. Trata-se
de vedação genérica e inconstitucional (v. comentários ao art. 112).
Em 2006, o Supremo Tribunal Federal considerou inconstitucional a regra
da Lei 8.072/90 que impunha regime integralmente fechado aos condenados por
crimes hediondos. A questão é se a decisão do STF alcançaria também formas
de vedação genérica ao livramento condicional. Segundo a posição dominante,
a redação do art. 83, V, do CP não fora contemplada pelo julgamento do HC
82.959/SP e seguiria, portanto, em vigor, ao menos até a Lei 13.964/2019. Não se
pode, entretanto, negar coerência à posição minoritária, visto que o fundamento
constitucional em tela – a individualização da pena (art. 5º, XLVI, CR) – também
pode ser invocado contra a vedação genérica do livramento condicional nos casos
acima narrados.

Art. 132  Deferido o pedido, o Juiz especificará as condições a que fica


subordinado o livramento.
§ 1º Serão sempre impostas ao liberado condicional as obrigações
seguintes:
a) obter ocupação lícita, dentro de prazo razoável se for apto para o
trabalho;
b) comunicar periodicamente ao Juiz sua ocupação;
c) não mudar do território da comarca do Juízo da execução, sem prévia
autorização deste.
§ 2° Poderão ainda ser impostas ao liberado condicional, entre outras
obrigações, as seguintes:
a) não mudar de residência sem comunicação ao Juiz e à autoridade
incumbida da observação cautelar e de proteção; b) recolher-se à
habitação em hora fixada;
c) não frequentar determinados lugares.
d) (VETADO) (Incluído pela Lei nº 12.258, de 2010)

132.1  Condições do livramento condicional

O livramento condicional tem tratamento jurisdicional e a competência


para apreciação do pedido é do juiz de execução. O pedido pode ser da defesa
282
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 132

ou do condenado, por seu próprio punho, e de acordo com modificação recente


devem ser ouvidos Ministério Público e defesa (art. 112, § 2º, LEP), não sendo
mais obrigatório o parecer do Conselho Penitenciário.
As condições podem ser obrigatórias (art. 132, § 1º, LEP) ou facultativas
(art. 132, § 2º, LEP).
São condições obrigatórias e presentes em qualquer caso: (a) “obter ocupação
lícita, dentro de prazo razoável se for apto para o trabalho”; (b) “comunicar
periodicamente ao Juiz sua ocupação”, com a periodicidade que for por este
estabelecida; e (c) “não mudar do território da comarca do Juízo da execução,
sem prévia autorização deste” (art. 132, § 1º, LEP).
Evidentemente, o juiz deve levar sempre em conta o contexto socioeconômico,
ponderando os índices de desemprego e as dificuldades específicas de acesso ao
mercado de trabalho por parte de egressos da prisão antes de estabelecer um
“prazo razoável” para o condenado obter ocupação lícita.
São condições facultativas ou judiciais, em rol meramente exemplificativo,
segundo o texto legal: (a) “não mudar de residência sem comunicação ao Juiz e à
autoridade incumbida da observação cautelar e de proteção”; (b) “recolher-se à
habitação em hora fixada”; (c) “não frequentar determinados lugares” (art. 132,
§ 2º, LEP).
Entendeu o STJ que “a mudança de endereço sem autorização judicial durante o
curso do livramento condicional, em descumprimento a uma das condições impostas na
decisão que concedeu o benefício, não configura, por si só, falta disciplinar de natureza
grave” (STJ, HC 203.015/SP, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, 6ª T.,
j. 26/11/2013).

132.2 Período de prova do livramento condicional

O período de prova, no livramento condicional, é o quantum de pena restante.


O descumprimento de alguma das condições durante o curso deste prazo poderá
causar a suspensão ou revogação do benefício e o retorno ao cárcere. Atenção,
porém: o descumprimento de determinada condição, ou mesmo a prática de
novo crime, não implicam em falta grave, pois o liberado é egresso e não mais
está sujeito ao poder disciplinar. Por conta disso é que não pode haver outras
consequências típicas da aplicação de sanções disciplinares, tais como a perda
de parte dos dias remidos.

283
Art. 133 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

Art. 133  Se for permitido ao liberado residir fora da comarca do Juízo


da execução, remeter-se-á cópia da sentença do livramento ao Juízo do
lugar para onde ele se houver transferido e à autoridade incumbida da
observação cautelar e de proteção.

133.1  Competência territorial para fiscalização do livramento condicional

O juízo competente para fiscalização do livramento condicional é aquele


do local de sua residência, sendo alterada a competência no caso de mudança
residencial.

Art. 134  O liberado será advertido da obrigação de apresentar-se


imediatamente às autoridades referidas no artigo anterior.

134.1 Advertência ao liberado

No caso de mudança de endereço, o liberado condicional será advertido


sobre a necessidade de se apresentar imediatamente, bem como prestar contas
das demais condições estabelecidas, ao juízo competente para a fiscalização. Não
havendo a formalização de tal advertência, a circunstância deve ser levada em
conta em eventual situação de descumprimento das condições.

Art. 135  Reformada a sentença denegatória do livramento, os autos


baixarão ao Juízo da execução, para as providências cabíveis.

135.1 Reforma da sentença denegatória do livramento condicional

Nos casos de indeferimento do pedido de livramento condicional, recurso


da Defesa e provimento do recurso, o juízo de execução tomará as providências
cabíveis, judiciais e administrativas, para aperfeiçoamento do livramento

284
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 136

condicional concedido pela instância superior. No mesmo sentido, o art. 721 do


Código de Processo Penal: “Reformada a sentença denegatória do livramento, os autos
baixarão ao juiz da primeira instância, a fim de que determine as condições que devam
ser impostas ao liberando”.

Art. 136  Concedido o benefício, será expedida a carta de livramento


com a cópia integral da sentença em 2 (duas) vias, remetendo-se uma à
autoridade administrativa incumbida da execução e outra ao Conselho
Penitenciário.

136.1 Formalização do livramento condicional

A formalização do aperfeiçoamento do livramento condicional se dá com a


expedição da carta de livramento, a qual faz as vezes do alvará de soltura, quando
recebida pela autoridade administrativa.

Art. 137  A cerimônia do livramento condicional será realizada solene­


mente no dia marcado pelo Presidente do Conselho Penitenciário, no
estabelecimento onde está sendo cumprida a pena, observando-se o
seguinte:
I - a sentença será lida ao liberando, na presença dos demais condenados,
pelo Presidente do Conselho Penitenciário ou membro por ele designado,
ou, na falta, pelo Juiz;
II - a autoridade administrativa chamará a atenção do liberando para as
condições impostas na sentença de livramento; III - o liberando declarará
se aceita as condições.
§ 1º De tudo em livro próprio, será lavrado termo subscrito por quem
presidir a cerimônia e pelo liberando, ou alguém a seu rogo, se não souber
ou não puder escrever.
§ 2º Cópia desse termo deverá ser remetida ao Juiz da execução.

285
Art. 138 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

137.1 Cerimônia de livramento condicional

A cerimônia de livramento condicional, em regra presidida por membro


do Conselho Penitenciário ou designado, aperfeiçoa o ato quando há o aceite
do condenado, produzindo consequências jurídicas relevantes: o apenado deixa
de ser considerado “recluso” e passa ao status de “egresso”, o que o subtrai da
subordinação ao poder disciplinar da autoridade penitenciária. Além disso, a
partir desse momento, inicia-se a contagem do lapso de cinco anos referido no
art. 64, I, do CP, após o qual não será mais considerado reincidente, assim como
o prazo de dois anos para a reabilitação, desde que, evidentemente, não haja a
ulterior revogação do livramento.
Posição distinta e relevante considera a decisão concessiva do livramento
condicional como de natureza declaratória, já havendo o direito no momento de
preenchimento dos requisitos: por tal linha, eventual cometimento de falta grave
após o cumprimento do requisito objetivo não pode ser levado em conta como
juízo negativo sobre o comportamento33.

Art. 138  Ao sair o liberado do estabelecimento penal, ser-lhe-á entregue,


além do saldo de seu pecúlio e do que lhe pertencer, uma caderneta,
que exibirá à autoridade judiciária ou administrativa, sempre que lhe
for exigida.
§ 1º A caderneta conterá:
a) a identificação do liberado;
b) o texto impresso do presente Capítulo;
c) as condições impostas.
§ 2º Na falta de caderneta, será entregue ao liberado um salvo-conduto,
em que constem as condições do livramento, podendo substituir-se
a ficha de identificação ou o seu retrato pela descrição dos sinais que
possam identificá-lo.
§ 3º Na caderneta e no salvo-conduto deverá haver espaço para consignar-
se o cumprimento das condições referidas no artigo 132 desta Lei.

33
ROIG, Rodrigo Duque Estrada. Execução Penal, p. 405.

286
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 139

138.1 Prestação de informações ao sentenciado beneficiado pelo livramento


condicional

Mais uma vez, a lei exige a prestação de informações ao sentenciado


beneficiado pelo livramento condicional, no caso por meio de uma caderneta que
servirá como identificação e acompanhamento diante da autoridade judicial e
administrativa. Eventual descumprimento desta obrigação, por parte do Estado,
deve ser levado em conta na análise da justificativa do condenado acusado de
des­cumprimento das condições do livramento condicional.

Art. 139  A observação cautelar e a proteção realizadas por serviço social


penitenciário, Patronato ou Conselho da Comunidade terão a finalidade
de:
I - fazer observar o cumprimento das condições especificadas na sentença
concessiva do benefício;
II - proteger o beneficiário, orientando-o na execução de suas obrigações
e auxiliando-o na obtenção de atividade laborativa.
Parágrafo único. A entidade encarregada da observação cautelar e da
proteção do liberado apresentará relatório ao Conselho Penitenciário,
para efeito da representação prevista nos artigos 143 e 144 desta Lei.

139.1 Observação cautelar

A lei prevê tanto a observação cautelar, ou seja, não ostensiva, das atividades
do condenado, como a prestação de assistência ao egresso, por meio do serviço
social, patronato ou Conselho da Comunidade.

Art. 140  A revogação do livramento condicional dar-se-á nas hipóteses


previstas nos artigos 86 e 87 do Código Penal.
Parágrafo único. Mantido o livramento condicional, na hipótese da
revogação facultativa, o Juiz deverá advertir o liberado ou agravar as
condições.

287
Art. 140 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

140.1 Revogação do livramento condicional

A revogação do livramento condicional significa o retorno do condenado à


prisão e se afigura obrigatória nas hipóteses de condenação irrecorrível a pena
privativa de liberdade por crime cometido durante ou antes da vigência do
benefício (art. 86, CP). Exige-se sentença condenatória transitada em julgado,
enquanto a mera prática da infração pode acarretar, no máximo, a suspensão.
Ressalva-se que, apesar do termo “obrigatória”, a condenação por crime praticado
antes do início do período de prova não altera a data-base e pode dar ensejo à
imediata concessão de um novo livramento condicional.
A revogação será facultativa “se o liberado deixar de cumprir qualquer das
obrigações constantes da sentença, ou for irrecorrivelmente condenado, por crime ou
contravenção, a pena que não seja privativa de liberdade” (art. 87, CP). Recomenda-se
que a revogação facultativa seja sempre evitada, preferindo-se as alternativas da
admoestação ou mesmo do estabelecimento de novas e mais rigorosas condições
de cumprimento.
Vale observar, ainda, que viola o princípio da legalidade a revogação imediata
do livramento condicional diante da notícia de novo crime, sem condenação
definitiva, sob a forma da revogação facultativa, alegando que a mera prática de
novo delito significa o descumprimento das condições judiciais. A taxatividade
penal não permite selecionar hipótese mais genérica quando há previsão específica
que abrange a mesma situação, prevendo outro tipo de consequência.

140.2 Reversão da concessão do livramento em recurso de agravo

É possível que o Ministério Público recorra da decisão do juízo de execução


que defere o pedido de livramento condicional. A situação, porém, pode ensejar
uma série de injustiças e distorções, devendo ser analisada à luz do escopo maior
da execução penal.
O transcurso de dois anos para julgamento do recurso, por exemplo, período
no qual o liberado havia conseguido emprego lícito e retornado a sua família,
foi considerado fundamento para concessão de ordem em habeas corpus pelo STJ,
invocando as Regras de Mandela: “1. Nos termos da Regra 4 das chamadas “Regras
de Mandela”, instituídas pelas Nações Unidas, além da busca pela proteção da
sociedade contra a criminalidade, pela redução da reincidência e pela punição
em razão da prática de crime, também constituem objetivos do sistema de justiça
criminal a reabilitação social e a reintegração das pessoas privadas de liberdade.
288
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 141

Isto assegura-lhes, na medida do possível, que, ao retornar à sociedade, sejam


capazes de levar uma vida autossuficiente, com respeito às leis. 2. Representa,
pois, constrangimento ilegal sanável pelo habeas corpus a revogação de livramento
condicional depois de transcorridos mais de dois anos de sua concessão pelo
Juízo das Execuções Criminais, quando inequivocamente demonstrado que o
apenado cumpre, com regularidade, as condições impostas para concessão da
benesse. 3. Não se pode permanecer insensível à situação daquele que, depois de
anos segregado da vida em sociedade, convivendo, por seus graves erros, com as
mazelas do confinamento, não apenas apresenta bom comportamento carcerário
e condições subjetivas reconhecidas em avaliações social e psicológica mas, ao
deixar provisoriamente os limites impostos pelas grades e enfrentar as barreiras
para a superação dos deslizes do passado, efetivamente reencontra sua dignidade
no seio de sua família e no emprego lícito, com registro em carteira de trabalho,
e busca, agora, a retidão em sua conduta. 4. Ordem concedida para, ratificada a
liminar, permitir ao paciente que permaneça sob livramento condicional enquanto
cumpridos os requisitos para a concessão da benesse, impostos pelo Juízo das
Execuções Criminais” (STJ, HC 360.907/SP, Rel. Min. Rogério Schietti Cruz,
j. 12/02/2019).
Em outro caso similar, em que o livramento foi cassado em segunda instância,
discutiu-se a possibilidade de cômputo do tempo transcorrido em livramento pelo
liberado (v. comentários ao item 142.2).

140.3 Impossibilidade jurídica da prática de falta grave por liberado


condicional

O liberado condicional não pratica falta grave porque é egresso e não


se subordina ao sistema disciplinar da LEP (STJ, HC 271.907/SP, Rel. Min.
Rogerio Schietti, 6ª T., j. 27/03/2014), não podendo haver perda de dias remidos
(art. 127, LEP); sem prejuízo da revogação do livramento e outras consequências
expressamente previstas em lei.

Art. 141  Se a revogação for motivada por infração penal anterior à


vigência do livramento, computar-se-á como tempo de cumprimento
da pena o período de prova, sendo permitida, para a concessão de novo
livramento, a soma do tempo das 2 (duas) penas.

289
Art. 142 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

141.1 Consequências da revogação do livramento condicional motivada por


infração penal cometida antes do período de prova

Tempo cumprido em liberdade condicional é pena expiada, sem qualquer


dúvida. Entretanto, a lei estabelece critérios que produzem consequências
radicalmente distintas nos casos de revogação do livramento. A diferenciação mais
importante para a compreensão das consequências da revogação do livramento
é aquela entre os casos de condenação irrecorrível por crimes praticados antes ou
durante o período de prova.
Na primeira situação – crimes praticados antes –, os efeitos são brandos: é
permitida a concessão de um novo livramento abarcando a primeira pena, cujo
requisito temporal será recalculado com base na soma das duas penas em sua
integralidade, mantendo-se a data-base na primeira prisão. Não há que se falar
em soma do restante da primeira pena com a nova, pois o texto legal é claro no
sentido de dispor que as penas devem ser integralmente somadas e, ato contínuo,
computado como pena expiada todo o tempo transcorrido em livramento condi­
cional, até a revogação (art. 141, LEP). Essa será a base para o cálculo do requi­
sito temporal para um novo pedido de livramento. E se mesmo com a soma ou
unificação o novo requisito temporal já estiver preenchido, o condenado pros­
seguirá em liberdade e o livramento sequer deve ser revogado.

Art. 142  No caso de revogação por outro motivo, não se computará na


pena o tempo em que esteve solto o liberado, e tampouco se concederá,
em relação à mesma pena, novo livramento.

142.1 Consequência da revogação do livramento condicional motivada por


infração penal cometida durante o período de prova

Quando o novo crime é cometido durante o período de prova, o trato é rigoroso:


fica vedada a concessão de novo livramento em relação à pena anterior e todo o
período transcorrido em liberdade condicional, no período de prova, é perdido,
não sendo computado como tempo de cumprimento de pena (art. 88, CP). Logo,
eventual novo pedido de livramento condicional terá que aguardar o cumprimento
integral da pena anterior, só podendo ser realizado com base na nova pena.

290
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 143

142.2 Cassação do livramento em segunda instância é equivalente a


“revogação por outro motivo”?

Em caso curioso, no qual o livramento foi cassado em segunda instância,


discutiu-se a possibilidade de cômputo do tempo transcorrido em livramento pelo
liberado. Entendeu o STJ que o provimento do recurso de agravo interposto pelo
Ministério Público equivaleria à “revogação por outro motivo” referida pelo art.
142 da LEP, com suas graves consequências, inclusive o não cômputo do tempo
em que o liberado permaneceu em livramento condicional (STJ, HC 494.349/PR,
Rel. Min. Nefi Cordeiro, j. 01/08/2019). Porém, o acórdão citado apenas faz refe­
rências a outros precedentes do STJ que tratam de situações fáticas distintas, em
que o próprio liberado deu causa à revogação.
Com efeito, o provimento de recurso pela cassação do livramento condicional
toca nos fundamentos da decisão que o concedeu, não havendo fato novo ou
causa de revogação posterior dada pelo próprio liberado. O sentido de “outro
motivo” no art. 142 da LEP se relaciona à leitura do dispositivo imediatamente
anterior (art. 141), que trata de infração penal anterior ao livramento. Logo, ele
está tratando de infração penal cometida durante o livramento, a hipótese mais
grave nesse tema, com sanções para o apenado, equiparada aqui a uma situação
“regular” dentro do jogo processual. Por fim, importante pontuar que o recurso
de agravo não possui efeito suspensivo e o cômputo do período transcorrido como
pena cumprida constitui ato jurídico perfeito, o qual pode ser desconsiderado
apenas a título de sanção se o liberado cometer infração penal durante o período
de prova, como prevê a lei.

Art. 143  A revogação será decretada a requerimento do Ministério


Público, mediante representação do Conselho Penitenciário, ou, de ofício,
pelo Juiz, ouvido o liberado.

143.1 Requerimento de revogação do livramento condicional

A revogação pode ocorrer mediante requerimento do Ministério Público, por


representação do Conselho Penitenciário ou de ofício, pelo Juiz. Deve ser ouvido o
liberado, ou seja, há expressa previsão de contraditório no procedimento judicial
de revogação do livramento condicional.

291
Art. 144 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

Art. 144  O Juiz, de ofício, a requerimento do Ministério Público, da


Defensoria Pública ou mediante representação do Conselho Penitenciário,
e ouvido o liberado, poderá modificar as condições especificadas na
sentença, devendo o respectivo ato decisório ser lido ao liberado por
uma das autoridades ou funcionários indicados no inciso I do caput do
art. 137 desta Lei, observado o disposto nos incisos II e III e §§ 1º e 2º do
mesmo artigo. (Redação dada pela Lei nº 12.313, de 2010).

144.1 Modificação das condições do livramento condicional

As condições podem ser modificadas, de ofício, a requerimento do Ministério


Público ou diante de representação do Conselho Penitenciário. Em qualquer caso
deve se atentar ao contraditório e ampla defesa (art. 5º, LV, CR) e, se concretizada
qualquer modificação, deverá ser novamente realizada a cerimônia de livramento
a fim de que se tome ciência.

Art. 145  Praticada pelo liberado outra infração penal, o Juiz poderá
ordenar a sua prisão, ouvidos o Conselho Penitenciário e o Ministério
Público, suspendendo o curso do livramento condicional, cuja revogação,
entretanto, ficará dependendo da decisão final.

145.1 Suspensão do livramento condicional e prorrogação do período de


prova

A suspensão do livramento condicional, por sua vez, ocorre quando o sujeito


pratica nova infração penal. Como bem afirma ROIG, não se trata de medida
automática; ao contrário, deve ser evitada se a infração imputada não ensejar
privação da liberdade, tal qual uma infração de menor potencial ofensivo34.
A expedição de mandado de prisão não é, de maneira alguma, um efeito auto­
mático da decisão de suspensão do benefício, mas uma possibilidade, devendo
ser conjugado o art. 145 da LEP com a devida fundamentação sobre as razões da

34
ROIG, Rodrigo Duque Estrada. Execução Penal, p. 428.

292
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 146

prisão; além de ser a providência lógica se houver decretação de prisão preventiva


em outro processo. Já se manifestou o STF, inclusive, de forma bastante restritiva
em relação ao suposto liame entre suspensão do livramento condicional e prisão
do condenado (STF, HC 105.497/RJ, Rel. Min. Gilmar Mendes, j. 15/02/2011).
Não havendo razão consistente para esta, deve-se aguardar decisão final sobre
o novo delito.
Defende-se a observância do direito à ampla defesa na suspensão do
livramento, devendo ser ouvidos o condenado e a defesa técnica (por força do
art. 5º, LV, CR, não obstante o silêncio da LEP).
Há, na suspensão, a possível prorrogação do período de prova (art. 89, CP), a
fim de que se aguarde o trânsito em julgado da sentença relativa à nova infração
– mas apenas aquela praticada durante o período de prova – para que se declare
extinta a punibilidade ou a revogação do benefício. Porém, tal prorrogação não é
automática e causa polêmica: descabida é sua aplicação aos casos de instauração
do processo durante o período de prova, porém por crime anterior ao mesmo. Tal
modalidade de prorrogação, não prevista em lei, é inadmissível.

Art. 146  O Juiz, de ofício, a requerimento do interessado, do Ministério


Público ou mediante representação do Conselho Penitenciário, julgará
extinta a pena privativa de liberdade, se expirar o prazo do livramento
sem revogação.

146.1 Extinção da punibilidade pela expiração do prazo do livramento


condicional

Cumpridas as condições e transcorrido o período de prova sem a revogação


do benefício, deverá ser declarada extinta a punibilidade (art. 90, CP), devendo
o juiz assim o declarar de ofício, por requerimento do interessado ou Ministério
Público, ou ainda por representação do Conselho Penitenciário.
É expressa a lei no sentido de que “Se até o seu término o livramento não é
revogado, considera-se extinta a pena privativa de liberdade” (também cf. o art. 90, CP).
Sendo assim, até mesmo eventual omissão ou negligência do próprio Estado,
fazendo com que a informação do cometimento de novo crime pelo apenado
chegue ao conhecimento do juízo de execução só após o término do período de
prova, não poderá ter outra consequência senão o reconhecimento da extinção

293
Art. 146-A ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

da pena que já se operou (nesse sentido: STJ, HC 149.527, 5 T., Rel. Min. Arnaldo
Lima, j. 23.3.2010).
O STJ editou súmula sobre a matéria: “A ausência de suspensão ou revogação
do livramento condicional antes do término do período de prova enseja a ex­
tinção da punibilidade pelo integral cumprimento da pena”. (Súmula 617, DJe
01/10/2018).

Seção VI
Da Monitoração Eletrônica
(Incluído pela Lei nº 12.258, de 2010)

Art. 146-A  (VETADO). (Incluído pela Lei nº 12.258, de 2010)


Art. 146-B  O juiz poderá definir a fiscalização por meio da monitoração
eletrônica quando: (Incluído pela Lei nº 12.258, de 2010)
I - (VETADO); (Incluído pela Lei nº 12.258, de 2010)
II - autorizar a saída temporária no regime semiaberto; (Incluído pela Lei
nº 12.258, de 2010)
III - (VETADO); (Incluído pela Lei nº 12.258, de 2010)
IV - determinar a prisão domiciliar; (Incluído pela Lei nº 12.258, de 2010)
V - (VETADO); (Incluído pela Lei nº 12.258, de 2010)
Parágrafo único. (VETADO). (Incluído pela Lei nº 12.258, de 2010)

146-B.1 Considerações gerais sobre a monitoração eletrônica

As propostas de adoção de mecanismos de vigilância eletrônica em con­


denados e/ou processados devem ser compreendidas a partir do reconhecimento
da mesma ambivalência que caracteriza as modalidades de alternativa à prisão:
são introduzidas com o argumento de reduzir a população carcerária mas, nos
fatos, deve haver comprometimento e acompanhamento para que não venham
a se tornar mero incremento da intervenção estatal sobre a liberdade individual,
sem realmente contribuir para redução da população carcerária.
Apenas dois casos são expressamente aqui permitidos e ambos se enquadram
nesta crítica: saída temporária e prisão domiciliar. Ambas as hipóteses consistem,

294
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 146-C

afinal, em situações nas quais, inexistindo a vigilância eletrônica, a liberdade


individual seria mais amplamente exercida.
Porém, o rol não é taxativo e há experiências regionais ampliando o uso da
monitoração eletrônica, inclusive como modalidade de cumprimento do regime
semiaberto e antecipando progressões de regime, em aplicação à SV nº. 56/STF e
às diretrizes estabelecidas pelo STF no RE 641.320.
Cabe detração em casos de medida cautelar de recolhimento noturno com
monitoramento eletrônico, computando-se o tempo como pena efetivamente
cumprida (STJ, HC 455.097, 3ª Seção, j. 14/04/2021).

Art. 146-C  O condenado será instruído acerca dos cuidados que deverá
adotar com o equipamento eletrônico e dos seguintes deveres: (Incluído
pela Lei nº 12.258, de 2010)
I - receber visitas do servidor responsável pela monitoração eletrônica,
responder aos seus contatos e cumprir suas orientações; (Incluído pela
Lei nº 12.258, de 2010)
II - abster-se de remover, de violar, de modificar, de danificar de qualquer
forma o dispositivo de monitoração eletrônica ou de permitir que outrem
o faça; (Incluído pela Lei nº 12.258, de 2010)
III - (VETADO); (Incluído pela Lei nº 12.258, de 2010)
Parágrafo único. A violação comprovada dos deveres previstos neste
artigo poderá acarretar, a critério do juiz da execução, ouvidos o Ministério
Público e a defesa: (Incluído pela Lei nº 12.258, de 2010)
I - a regressão do regime; (Incluído pela Lei nº 12.258, de 2010)
II - a revogação da autorização de saída temporária; (Incluído pela Lei
nº 12.258, de 2010)
III - (VETADO); (Incluído pela Lei nº 12.258, de 2010)
IV - (VETADO); (Incluído pela Lei nº 12.258, de 2010)
V - (VETADO); (Incluído pela Lei nº 12.258, de 2010)
VI - a revogação da prisão domiciliar; (Incluído pela Lei nº 12.258, de 2010)
VII - advertência, por escrito, para todos os casos em que o juiz da
execução decida não aplicar alguma das medidas previstas nos incisos
de I a VI deste parágrafo. (Incluído pela Lei nº 12.258, de 2010)

295
Art. 146-C ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

146-C.1 Cuidados e deveres do condenado com o equipamento eletrônico

Primeiramente, consta a obrigação da autoridade judicial e administrativa em


prestar todas as informações à pessoa monitorada sobre o manuseio e manutenção
do equipamento. Caso se trate de pessoa analfabeta ou especialmente vulnerável,
a obrigação é ainda mais relevante e deve ser documentalmente comprovada, sob
pena de se dever mitigar efeitos de eventuais violações futuras.
De seu lado, a pessoa monitorada tem os deveres de manter contato constante
com a autoridade responsável pela fiscalização e manutenção da tornozeleira ou
similar, especialmente considerados os casos recorrentes de vícios na bateria.
O dispositivo descreve, ainda, o dever de se abster de remover, violar, modi­
ficar ou danificar de qualquer forma o mecanismo de monitoração eletrônica, seja
por conta própria ou através de terceiros.

146-C.2 Monitoração eletrônica e sistema disciplinar

Destaca-se que o descumprimento desses deveres não é previsto como falta


grave. Há divergência do STJ no sentido de que a inobservância do perímetro
de inclusão rastreado não configura falta grave (STJ, REsp 1519802/SP, Rel. Min.
Maria Thereza de Assis Moura, 6ª T., j. 10/11/2016), mas o tribunal admite que
o rompimento do equipamento ou ausência de bateria pode configurar falta
de fuga. Mas apenas o desaparecimento do controle de GPS, com a retirada do
equipamento ou o descarregamento definitivo da bateria, pode ser interpretado
dessa forma (v. comentários ao art. 50).

146-C.3 Consequências previstas para o descumprimento dos deveres


relativos à monitoração eletrônica

Ainda que não se trate de falta grave, porém, podem acarretar a regressão
de regime e a revogação da saída temporária, a revogação da prisão domiciliar
ou a advertência por escrito.
O procedimento para regressão de regime por conta de violação de deveres
da monitoração eletrônica exige comprovação da violação e oitiva de Ministério
Público e Defesa, não admitindo a lei a regressão cautelar neste caso, sendo esta
a melhor interpretação do parágrafo único.
É inadmissível a regressão de regime por conta de descarregamento des­
contínuo da bateria, por períodos curtos de tempo, pois a situação não configura
296
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 146-D

dolo de fuga e tampouco se enquadra em quaisquer das hipóteses descritas no


inciso II.
Importante observar que a prisão do monitorado que descumpre as
obrigações impostas necessita de ordem judicial, não cabendo tal decisão à Polícia
Militar. Nesse sentido entendimento sobre prisão cautelar aplicável à execução
penal: “O simples descumprimento das obrigações impostas ao monitorado não
pode ser justificativa para o imediato recolhimento a estabelecimento prisional pela
Polícia Militar, por caber ao Judiciário decidir sobre a prisão ou a substituição da
medida cautelar, nos termos dos §§ 4°, 5° e 6° do artigo 282 do CPP, do parágrafo
único do artigo 312 do CPP e do inciso LXI do artigo 5º da Constituição Federal”
(CNJ - PCA 0004645-39.2016.2.00.0000, j. 26/10/2017).

Art. 146-D  A monitoração eletrônica poderá ser revogada: (Incluído


pela Lei nº 12.258, de 2010)
- quando se tornar desnecessária ou inadequada; (Incluído pela Lei
nº 12.258, de 2010)
- se o acusado ou condenado violar os deveres a que estiver sujei­
to durante a sua vigência ou cometer falta grave. (Incluído pela Lei
nº 12.258, de 2010)

146-D.1 Revogação da monitoração eletrônica

O dispositivo estabelece hipóteses de revogação da monitoração eletrônica,


o que não se confunde com aplicação de sanção disciplinar. As hipóteses são
vagas: quando ela se tornar “desnecessária ou inadequada” e quando o acusado
ou condenado “violar os deveres a que estiver sujeito durante a sua vigência ou
cometer falta grave”.
A revogação da monitoração eletrônica não implica necessariamente na
regressão de regime prevista no artigo anterior, a qual é cabível somente nas
duas hipóteses ali descritas.
A fundamentação da decisão de determinação de uso de monitoração
eletrônica deve ser concreta, segundo o STJ: “(...) Ainda que o monitoramento
eletrônico, com a colocação de tornozeleiras, se constitua em alternativa tecnológica
ao cárcere, a necessidade de sua manutenção deve ser aferida periodicamente, podendo
ser dispensada a cautela em casos desnecessários. Inteligência do art. 146-D da LEP: a
297
Art. 147 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

monitoração eletrônica poderá ser revogada quando se tornar desnecessária ou inadequada.


3. A simples afirmação de que o monitoramento é medida mais acertada à fiscalização do
trabalho externo com prisão domiciliar deferido ao apenado em cumprimento de pena de
reclusão no regime semiaberto, sem maiores esclarecimentos acerca do caso concreto, não
constitui fundamento idôneo para justificar o indeferimento do pleito, sobretudo quando o
apenado apresenta histórico favorável, com manifestação dos Ministérios Público Federal
e Estadual pela retirada do equipamento. 4. Assim como tem a jurisprudência exigido
motivação concreta para a incidência de cautelares durante o processo criminal, a fixação
de medidas de controle em fase de execução da pena igual motivação exigem, de modo
que a incidência genérica - sempre e sem exame da necessidade da medida gravosa - de
tornozeleiras eletrônicas não pode ser admitida. 5. Habeas corpus não conhecido, mas
concedida a ordem de ofício para determinar seja sustada a exigência de monitoramento
eletrônico, ressalvada nova e justificada decisão determinadora dessa ou de outras medidas
paralelas de controle da execução penal” (STJ, HC 351.273/CE, Rel. Min. Nefi Cordeiro,
6ª T., j. 02/02/2017).

CAPÍTULO II
Das Penas Restritivas de Direitos

SEÇÃO I
Disposições Gerais

Art. 147  Transitada em julgado a sentença que aplicou a pena restritiva


de direitos, o Juiz da execução, de ofício ou a requerimento do Ministério
Público, promoverá a execução, podendo, para tanto, requisitar,
quando necessário, a colaboração de entidades públicas ou solicitá-la
a particulares.

147.1 Considerações gerais sobre as penas restritivas de direitos

Foi apenas a partir da segunda metade da década de 90 que se passou


efetivamente a aplicar, no Brasil, medidas com o intuito de se evitar a reclusão
já em momentos anteriores à fase executiva, e não somente através de institutos
de direito penitenciário fruíveis no curso da execução da pena. Dois percursos
diferentes então se abriram: o primeiro, com os Juizados Especiais (Lei 9.099, de
26 de setembro de 1995), e o segundo, com a nova regulamentação das Penas

298
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 147

Restritivas de Direitos (Lei 9.714, de 25 de novembro de 1998), não obstante estas


já serem previstas formalmente desde a edição da LEP em 1984.

147.2 Impossibilidade de execução provisória de penas restritivas de direitos

Não há execução provisória de pena restritiva de direito. O STF chegou


a autorizar a execução provisória exclusivamente no contexto do debate sobre
a possibilidade de início da execução após condenação em segunda instância,
entendimento que não mais prevalece.
Segundo a Súmula 643-STJ: “A execução da pena restritiva de direitos depende
do trânsito em julgado da condenação”.
Portanto, não se deve fazer a unificação provisória, caso o condenado já
cumpra pena de prisão e seja condenado por novo delito a uma pena restritiva de
direitos. A expedição da guia de recolhimento provisória pressupõe a existência
de prisão preventiva no processo de conhecimento, o que certamente não é o caso
se a condenação foi a uma pena restritiva de direitos.

147.3 Natureza das penas restritivas de direitos

A forma pela qual as penas restritivas de direito se colocam como alternativas


à privação da liberdade reside em seu caráter substitutivo, permitindo ao juiz,
no momento em que profere a sentença condenatória, substituir a pena privativa
de liberdade por uma ou mais penas restritivas de direito. Trata-se de pena, de
qualquer forma, cujo tempo de cumprimento será, em regra, igual àquele previsto
para a pena privativa de liberdade aplicada (art. 55, CP). A exceção é o caso de
pena substituída superior a um ano, quando a pena substitutiva de prestação de
serviços à comunidade poderá ser cumprida em tempo inferior (art. 46, § 4º, CP).
Se cumprida parcialmente a “pena alternativa”, o tempo deverá ser descontado
em eventual conversão à pena privativa de liberdade.

147.4 Obrigatoriedade da substituição da pena privativa de liberdade pela


pena restritiva de direitos

A substituição da pena privativa de liberdade por pena restritiva de direitos


é obrigatória quando presentes os requisitos legais (art. 44, CP), quais sejam:
a) Pena aplicada: pena privativa de liberdade aplicada não superior a quatro
anos, se o crime for doloso; qualquer quantum de pena, se o crime foi cometido
299
Art. 147 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

por imprudência (art. 44, I, CP); b) Ausência de violência ou grave ameaça à


pessoa (art. 44, I, CP); c) Não-reincidência em crime doloso nos últimos cinco anos
(art. 44, II, c.c. art. 64, I, CP); e d) Aferição de conveniência e oportunidade da
medida: segundo a análise da culpabilidade, antecedentes, conduta social e
personalidade do condenado, e também os motivos e circunstâncias do caso
concreto (art. 44, III, CP). No caso de reincidência genérica, é ainda possível a
substituição se o juiz entender a medida como “socialmente recomendável” em
face da condenação anterior (art. 44, §3º, CP).

147.5 Inconstitucionalidade da vedação da pena restritiva de direitos

A vedação para condenados pelos crimes de produção, colaboração ou tráfico


de drogas (expressão constante do art. 33, § 4º, Lei 11.343/06) foi reconhecida
como inconstitucional pelo STF (STF, HC 97.256/RS, Rel. Min. Ayres Britto,
j. 1º/09/2010), sendo o trecho suspenso pela Resolução nº 5/2012 do Senado
Federal. Cabendo substituição por pena restritiva de direitos nos casos de tráfico
de drogas, logicamente também se reconheceu a possibilidade de regime aberto
quando incabível a substituição.

147.6 Possibilidades de substituição

Nos termos do art. 44, § 2º do Código Penal, ainda, o quantum de pena apli­
cada determina o âmbito de possibilidades de substituição: apenas multa ou
apenas uma pena restritiva de direitos, se a condenação não ultrapassa um ano;
e uma pena restritiva de direitos e multa, ou duas penas restritivas de direito,
caso a pena aplicada seja superior a uma ano.
A LEP não trata da prestação pecuniária, modalidade de PRD regulada pelo
art. 45, §§ 1º e 2º, do CP, com caráter reparatório e não se confundindo com a pena
de multa. A medida consiste em pagamento em dinheiro – ou prestação de outra
natureza, se houver a concordância do beneficiário – à vítima, seus dependentes
ou entidade pública ou privada com destinação social. Conforme estabelece o texto
legal, a importância paga, em valor fixado pelo juiz entre 1 (um) e 360 (trezentos
e sessenta) salários mínimos, será deduzida de eventual montante decorrente de
condenação em fsede cível tendo o mesmo beneficiário. Vale insistir no ponto de
que a prestação pecuniária é plenamente compatível com a privação de liberdade.
Deve ser permitido o cumprimento simultâneo, não cabendo a conversão desta
em pena privativa de liberdade no procedimento de unificação.

300
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 148

A LEP também não trata da perda de bens e valores, prevista no art. 45,
§ 3º, do CP. Trata-se da destinação de “bens e valores” do condenado ao Fundo
Peni­tenciário Nacional (salvo legislação especial), nos limites do prejuízo causado
ou benefícios obtidos pelo agente, ou por terceiro, com a prática do crime.

Art. 148  Em qualquer fase da execução, poderá o Juiz, motivadamente,


alterar a forma de cumprimento das penas de prestação de serviços à
comunidade e de limitação de fim de semana, ajustando-as às condições
pessoais do condenado e às características do estabelecimento, da
entidade ou do programa comunitário ou estatal.

148.1 Alteração da forma de cumprimento da pena restritiva de direitos

A conversão da PRD em pena privativa de liberdade deve ser evitada. Essa


é a diretriz deste dispositivo, o qual permite que o juízo motivadamente adeque
a forma de cumprimento das penas de prestação de serviços à comunidade e de
limitação de fim de semana às condições pessoais do condenado e às demandas
da entidade ou programa na qual ele cumpre a pena.

148.2 Consequências da pandemia do novo Coronavírus na execução das


penas restritivas de direito

Medidas sanitárias adotadas a partir de 2020 inviabilizaram o cumpri­mento


regular de algumas penas restritivas de direito, notadamente a prestação de
serviços à comunidade e a limitação de fim de semana.
Em diversos Estados, tem-se buscado solucionar a questão por meio da
substituição das PRD aplicadas por medidas como doação de sangue e atividades
remotas que podem ser cumpridas ainda na vigência das medidas preventivas
de proteção. A solução tem base legal no art. 148 da LEP, levando em conta a
pandemia como motivo de força maior.
Tribunais Estaduais têm corroborado também a possibilidade de extinção
da pena por integral cumprimento, seguindo orientação técnica do Conselho Na­
cional de Justiça: se a interrupção foi involuntária, admite-se a contagem ficta do
tempo faltante para o fim de extinguir a pena substitutiva de prestação de serviços
à comunidade, especialmente considerando que “a manutenção prolongada de
301
Art. 149 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

pendências jurídico penais tem um efeito dessocializador, em particular quanto


as oportunidades de trabalho e renda” (TJGO, AgEx nº 04289106020208090000
– Goiânia, 2ª C. C., DJe. 29/10/2020; no mesmo sentido: TJSC, AgEx 0001859-
41.2020.8.24.0023, 2ª C.C., j. 17/11/2020).

SEÇÃO II
Da Prestação de Serviços à Comunidade

Art. 149  Caberá ao Juiz da execução:


I - designar a entidade ou programa comunitário ou estatal, devida­mente
credenciado ou convencionado, junto ao qual o condenado deverá
trabalhar gratuitamente, de acordo com as suas aptidões;
II - determinar a intimação do condenado, cientificando-o da entidade,
dias e horário em que deverá cumprir a pena;
III - alterar a forma de execução, a fim de ajustá-la às modificações ocor­
ridas na jornada de trabalho.
§ 1º o trabalho terá a duração de 8 (oito) horas semanais e será realizado
aos sábados, domingos e feriados, ou em dias úteis, de modo a não
prejudicar a jornada normal de trabalho, nos horários estabelecidos
pelo Juiz.
§ 2º A execução terá início a partir da data do primeiro comparecimento.

149.1 Considerações gerais sobre a prestação de serviços à comunidade

Dispositivo que deve ser lido em conjunto ao art. 46 do Código Penal.


Consiste “na atribuição de tarefas gratuitas ao condenado” em prol de entidades
assistenciais de caráter diverso, sem que isso possa prejudicar a sua jornada de
trabalho. A medida é aplicável no caso de penas superiores a seis meses; sendo
superior a um ano, ainda, a pena substitutiva pode ser cumprida em menos tempo
que o previsto para a pena privativa de liberdade, sendo esta (art. 46, § 4º, CP)
uma exceção expressa à regra do art. 55 do CP. Nunca, porém, em menos tempo
que a metade da pena privativa de liberdade aplicada. São imprescindíveis o
acompanhamento judicial e a fiscalização por parte da própria organização da
sociedade civil beneficiada com a prestação de serviços (art. 149 e 150, LEP).
Art. 149.

302
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 150

Art. 150  A entidade beneficiada com a prestação de serviços enca­


minhará mensalmente, ao Juiz da execução, relatório circunstanciado das
atividades do condenado, bem como, a qualquer tempo, comunicação
sobre ausência ou falta disciplinar.

150.1 Fiscalização da prestação de serviços à comunidade

A fiscalização da prestação de serviços é compartilhada, sendo encargo da


entidade beneficiada prestar informações regulares ao juízo, por meio de relatório
circunstanciado com periodicidade mensal.

SEÇÃO III
Da Limitação de Fim de Semana

Art. 151  Caberá ao Juiz da execução determinar a intimação do


condenado, cientificando-o do local, dias e horário em que deverá
cumprir a pena.
Parágrafo único. A execução terá início a partir da data do primeiro
comparecimento.

151.1 Considerações gerais sobre a limitação de fim de semana

Dispositivo que deve ser lido em conjunto ao art. 48 do Código Penal.


Trata-se da imposição de obrigação de permanência em casa de albergado
ou estabelecimento similar, aos sábados e domingos, por cinco horas diárias,
ocupadas pela participação em cursos, palestras e outras atividades de caráter
educativo. É o juízo que deverá determinar a intimação do condenado e prestar
informações referentes à forma de cumprimento da pena. A lei estabelece o
primeiro comparecimento como marco de início da execução da PRD.

303
Art. 152 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

Art. 152  Poderão ser ministrados ao condenado, durante o tempo de


permanência, cursos e palestras, ou atribuídas atividades educativas.
Parágrafo único. Nos casos de violência doméstica contra a mulher, o
juiz poderá determinar o comparecimento obrigatório do agressor a
programas de recuperação e reeducação. (Incluído pela Lei nº 11.340,
de 2006)

152.1 Limitação de fim de semana e violência doméstica

A Lei 11.340/06 (Lei Maria da Penha) inseriu dispositivo (art. 152, parágrafo
único, LEP) segundo o qual o juiz poderá determinar o comparecimento obriga­
tório do condenado a programas específicos de recuperação nos casos de violência
doméstica contra a mulher.

Art. 153  O estabelecimento designado encaminhará, mensalmente, ao


Juiz da execução, relatório, bem assim comunicará, a qualquer tempo, a
ausência ou falta disciplinar do condenado.

153.1 Fiscalização da limitação de fim de semana

Seguindo a mesma sistemática da prestação de serviços, a cooperação com a


comunidade se concretiza aqui com a partilha da tarefa de fiscalização, devendo
o estabelecimento designado encaminhar mensalmente ao juízo relatório circuns­
tanciado sobre o comparecimento do condenado.

SEÇÃO IV
Da Interdição Temporária de Direitos

Art. 154  Caberá ao Juiz da execução comunicar à autoridade competente


a pena aplicada, determinada a intimação do condenado.
§ 1º Na hipótese de pena de interdição do artigo 47, inciso I, do Código
Penal, a autoridade deverá, em 24 (vinte e quatro) horas, contadas do
304
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 155

recebimento do ofício, baixar ato, a partir do qual a execução terá seu


início.
§ 2º Nas hipóteses do artigo 47, incisos II e III, do Código Penal, o Juízo
da execução determinará a apreensão dos documentos, que autorizam
o exercício do direito interditado.

154.1 Considerações gerais sobre a interdição temporária de direitos

Deve ser lido em conjunto ao art. 47 do Código Penal, que prevê quatro
modalidades de interdição temporária do exercício de direitos por parte do
condenado, sendo
(a) “proibição do exercício de cargo, função ou atividade pública, bem
como de mandato eletivo” – neste caso, a autoridade deve determinar
o cumprimento em até 24 horas após recebimento do ofício com a
comunicação;
(b) “proibição do exercício de profissão, atividade ou ofício que dependam
de habilitação especial, de licença ou autorização do poder público”;
(c) “suspensão de autorização ou de habilitação para dirigir veículo”,
observando-se que nesses dois últimos casos o juízo de execução
determinará a apreensão dos respectivos documentos (art. 154, §2º,
LEP);
(d) “proibição de frequentar determinados lugares” e,
(e) inserido pela Lei 12.550/2011, a “proibição de inscrever-se em concurso,
avaliação ou exame públicos”.

Art. 155  A autoridade deverá comunicar imediatamente ao Juiz da


execução o descumprimento da pena.
Parágrafo único. A comunicação prevista neste artigo poderá ser feita
por qualquer prejudicado.

155.1 Descumprimento das medidas

O eventual descumprimento de tais medidas de interdição temporária de


direitos poderá ser comunicado ao juízo de execução por qualquer prejudicado
ou pela autoridade competente.
305
Art. 156 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

CAPÍTULO III

Da Suspensão Condicional

Art. 156  O Juiz poderá suspender, pelo período de 2 (dois) a 4 (quatro)


anos, a execução da pena privativa de liberdade, não superior a 2 (dois)
anos, na forma prevista nos artigos 77 a 82 do Código Penal.

156.1 Considerações gerais sobre a suspensão condicional da pena

A suspensão condicional da pena é regulamentada pelos art. 77 a 82 do


Código Penal e pelos arts. 156 a 163 da Lei de Execução Penal, esta tratando das
questões procedimentais. Trata-se da suspensão da execução da pena privativa de
liberdade, substituindo-a por obrigações de fazer que, materialmente, equiparam-
se parcialmente às penas restritivas de direito. Se o condenado cumpre todas
as condições e obrigações estabelecidas no prazo demarcado – é o “período de
prova” – estará extinta a punibilidade (art. 82, CP).
Diferentemente do sistema da probation, o sursis leva à suspensão da pena, e
não do processo. A decisão pela sua concessão ou não ocorre na própria sentença
condenatória, observando-se a exigência constitucional (art. 93, IX, CR) e legal
(art. 157, LEP) da devida motivação e fundamentação. Há diversas posições
quanto à sua natureza jurídica, nem sempre excludentes entre si. Pode-se, em
suma, compreender-se a suspensão condicional da pena como uma modalidade de
execução alternativa à privação da liberdade – por isto chamada de “substitutivo
penal” – que suspende a execução da pena de prisão e aplica, em seu lugar, deter­
minadas obrigações de fazer que devem ser cumpridas no decurso do “período
de prova”. Cumprido este sem revogação, será extinta a punibilidade: por isto,
diz-se ser o sursis uma condição resolutiva de extinção da punibilidade. Não
se trata de afirmar que o sursis seria tão-somente uma condição de extinção da
punibilidade (mesmo porque permanecem outros efeitos da condenação), mas
simplesmente de enfatizar sua principal consequência.

156.2 Requisitos para concessão do sursis previstos no Código Penal

(a) Inaplicabilidade da substituição por pena restritiva de direitos. Na esteira do


entendimento segundo o qual a substituição de pena é mais favorável ao réu que
306
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 156

a suspensão condicional, resta excluída (art. 77, II, CP) a aplicação da suspensão
condicional da pena ao condenado cuja pena aplicada seja passível de substituição
por pena restritiva de direitos (art. 44, CP).
(b) Pena privativa de liberdade aplicada. O quantum temporal de pena privativa
de liberdade aplicada exigida para a concessão do sursis, e o prazo do “período de
prova”, podem variar de acordo com características do autor. Ressalva-se que a
distinção entre sursis simples/comum e especial leva em conta apenas as modalidades
de cumprimento, sem alterar o requisito temporal a partir da pena aplicada.
A mudança ocorre quando a suspensão condicional da pena assume como critérios
a idade do condenado ou razões de saúde, quando o sursis será chamado etário
ou humanitário. Logo, especificamente acerca do requisito temporal exigido para
a concessão do sursis, considera-se que tanto no caso do sursis simples/comum ou
especial (sobre a distinção entre eles, v. ponto infra e art. 78, § 2º, CP), exige-se
uma pena privativa de liberdade aplicada não superior a dois anos. O benefício
não cabe quando se trata de penas restritivas de direito ou penas de multa
(art. 80, CP). O prazo do “período de prova” poderá variar entre dois e quatro
anos (art. 77, CP). No caso do sursis etário, aplicável a condenados idosos – mais de
70 anos de idade na data de publicação da sentença ou acórdão –, e humanitário, por
razões de saúde, o requisito temporal se alarga a uma pena aplicada não superior
a quatro anos. O prazo do “período de prova”, por sua vez, poderá variar entre
quatro e seis anos (art. 77, § 2º, CP). Há, ainda, previsão específica para os crimes
ambientais (art. 16, Lei 9.605/98), para os quais há possibilidade de sursis quando
a pena aplicada não ultrapassa três anos.
(c) Que o condenado não seja reincidente em crime doloso, excetuando-se eventual
condenação a pena de multa (art. 77, I, CP). A aferição do status de reincidente deve
ser feita objetivamente, com base no critério da existência de sentença condenatória
transitada em julgado, aplicando pena privativa de liberdade, observando-
se o prazo de cinco anos contado a partir de seu integral cumprimento ou da
cerimônia de livramento condicional (art. 64, I, CP). Se houve concessão de sursis
na condenação anterior, o termo inicial de contagem do referido prazo de cinco
anos é a data da audiência admonitória. Inquéritos e processos em andamento,
ou mesmo sentenças condenatórias não transitadas em julgado, não podem ser
equiparadas a reincidência.
(d) Que “a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e personalidade do
agente”, além dos “motivos e circunstâncias”, sejam favoráveis (art. 77, II, CP). Trata-se
do único requisito com elementos propriamente subjetivos, suficiente para inserir
a decisão pela concessão ou não do sursis dentro do espaço de discricionariedade

307
Art. 157 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

onde se move o juiz, que, ao proferir a sentença, realizará a sua prognose em


relação ao comportamento futuro do réu. De todo modo, e mesmo tendo acabado
de condenar o réu, o magistrado deve se pautar pelo princípio da presunção de
inocência na realização de seu prognóstico. Para que este seja construído sob
uma discricionariedade minimamente vinculada, não é recomendável que o juiz
tenha absoluta liberdade para “adivinhar”, com base em dados do processo,
carac­terísticas supostamente marcantes da conduta social e da personalidade do
con­denado. A questão circundante, neste ponto, é que a exigência de uma “con­
duta social ilibada” e seus similares não corresponde à lógica da medida, criada
exatamente como um instrumento de “pôr em prova”. A reeducação, afinal, é a
finalidade, e não o pressuposto, da concessão da suspensão condicional da pena.

156.3 Vedação da suspensão condicional da pena

A suspensão condicional da pena é vedada pelo art. 44 da Lei 11.343/06 para


o crime de tráfico de drogas, com precedente nesse sentido do STF (HC 101919/
MG, 1a T., Rel. Min. Marco Aurélio, j. 6.9.2011). Não há o que impeça, porém, a
concessão do sursis nos casos de crimes hediondos em geral: antes mesmo da
declaração de inconstitucionalidade do regime integralmente fechado a concessão
da suspensão condicional da pena já era admitida.

Art. 157  O Juiz ou Tribunal, na sentença que aplicar pena privativa de


liberdade, na situação determinada no artigo anterior, deverá pronunciar-
se, motivadamente, sobre a suspensão condicional, quer a conceda, quer
a denegue.

157.1 Fundamentação da concessão ou denegação do sursis

O artigo apenas exige que, na sentença condenatória, o juízo motive e


fundamente a concessão ou denegação do sursis, o que é adequado segundo os
termos do art. 93, IX, da CF.

308
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 158

Art. 158  Concedida a suspensão, o Juiz especificará as condições a que


fica sujeito o condenado, pelo prazo fixado, começando este a correr da
audiência prevista no artigo 160 desta Lei.
§ 1° As condições serão adequadas ao fato e à situação pessoal do con­
denado, devendo ser incluída entre as mesmas a de prestar serviços à
comunidade, ou limitação de fim de semana, salvo hipótese do artigo
78, § 2º, do Código Penal.
§ 2º O Juiz poderá, a qualquer tempo, de ofício, a requerimento do
Ministério Público ou mediante proposta do Conselho Penitenciário,
modificar as condições e regras estabelecidas na sentença, ouvido o
condenado.
§ 3º A fiscalização do cumprimento das condições, reguladas
nos Estados, Territórios e Distrito Federal por normas supletivas, será
atribuída a serviço social penitenciário, Patronato, Conselho da Comu­
ni­dade ou instituição beneficiada com a prestação de serviços, inspe­
cionados pelo Conselho Penitenciário, pelo Ministério Público, ou ambos,
devendo o Juiz da execução suprir, por ato, a falta das normas supletivas.
§ 4º O beneficiário, ao comparecer periodicamente à entidade fiscali­
zadora, para comprovar a observância das condições a que está sujeito,
comunicará, também, a sua ocupação e os salários ou proventos de que
vive.
§ 5º A entidade fiscalizadora deverá comunicar imediatamente ao
órgão de inspeção, para os fins legais, qualquer fato capaz de acarretar
a revogação do benefício, a prorrogação do prazo ou a modificação das
condições.
§ 6º Se for permitido ao beneficiário mudar-se, será feita comunicação
ao Juiz e à entidade fiscalizadora do local da nova residência, aos quais
o primeiro deverá apresentar-se imediatamente.

158.1 Condições da suspensão

As condições são as regras fixadas para cumprimento pelo sujeito ao qual foi
concedida a suspensão condicional da pena. Constituem o conteúdo do tratamento
alternativo que substitui a execução da condenação à privação da liberdade e
podem ser modificadas a qualquer tempo pelo juiz, inclusive de ofício (art. 158,
§ 2º, LEP), mas sempre ouvido o condenado.

309
Art. 159 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

A lei prevê algumas condições obrigatórias (art. 78, CP) e abre espaço para
que o juiz fixe outras que considerar necessário (art. 79, CP). Tratam-se, res­
pectivamente, das condições legais e judiciais.
Também as condições são critérios de classificação das modalidades de
suspensão condicional da pena. No sursis simples ou comum, são desde logo
aplicadas as condições legais determinando que o condenado, no primeiro ano,
preste serviços à comunidade ou sofra limitação de fim-de-semana.
A exigência, porém, pode ser substituída se o apenado já houver reparado o
dano (sendo possível fazê-lo) e se as circunstâncias o forem “inteiramente favo­
ráveis” (art. 78, § 2º, CP). Neste caso – trata-se do sursis especial –, a substituição
implicará na aplicação cumulativa de condições limitativas da liberdade de
locomoção, quais sejam: (a) proibição de frequentar determinados lugares; (b)
proibição de se ausentar da comarca onde reside sem autorização judicial; e (c)
comparecimento mensal em juízo para prestar conta das próprias atividades.
Em relação à determinação das condições judiciais, importa que exista um
controle de razoabilidade com parâmetros no próprio ordenamento constitucional.
Por exemplo, as condições não podem, em si, constituírem uma nova modalidade
de sanção ou ultrapassar a restrição de direitos realizada na sentença condenatória.

Art. 159  Quando a suspensão condicional da pena for concedida por


Tribunal, a este caberá estabelecer as condições do benefício.
§ 1º De igual modo proceder-se-á quando o Tribunal modificar as
condições estabelecidas na sentença recorrida.
§ 2º O Tribunal, ao conceder a suspensão condicional da pena, poderá,
todavia, conferir ao Juízo da execução a incumbência de estabelecer as
condições do benefício, e, em qualquer caso, a de realizar a audiência
admonitória.

159.1 Suspensão condicional da pena concedida por Tribunal

Quem concede o sursis é que tem o encargo de fixar ou modificar as condições


do benefício, bem como realizar a audiência admonitória, inclusive quando se
tratar de Tribunal. O dispositivo ainda prevê a possibilidade de o Tribunal conferir
ao Juízo a quo a incumbência.

310
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 160

Art. 160 Transitada em julgado a sentença condenatória, o Juiz a lerá


ao condenado, em audiência, advertindo-o das conseqüências de nova
infração penal e do descumprimento das condições impostas.

160.1 Advertência ao condenado

As condições impostas para o sursis têm efeito somente após a audiência


admonitória, momento processual no qual o sujeito toma conhecimento e aceita
as condições impostas, e a partir do qual contam todos os prazos.

Art. 161  Se, intimado pessoalmente ou por edital com prazo de 20 (vinte)
dias, o réu não comparecer injustificadamente à audiência admonitória,
a suspensão ficará sem efeito e será executada imediatamente a pena.

161.1 Não comparecimento na audiência admonitória

O injustificado não comparecimento à audiência admonitória torna a


suspensão sem efeitos, o que é diferente de sua revogação. A intimação por edital
só é possível após esgotadas as tentativas de localização de intimação pessoal,
devendo, antes, haver diligências junto aos órgãos públicos ou privados detentores
do endereço residencial do sentenciado.

Art. 162  A revogação da suspensão condicional da pena e a prorrogação


do período de prova dar-se-ão na forma do artigo 81 e respectivos
parágrafos do Código Penal.

162.1 Revogação da suspensão condicional da pena

A suspensão condicional da pena é revogada quando o comportamento do


sujeito for contrário às condições legais e judiciais, mostrando-se incompatível com
o prosseguimento do período de prova e seu cumprimento satisfatório. Em todo

311
Art. 162 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

caso (e inobstante entendimento contrário na jurisprudência), não é recomendável


do ponto de vista constitucional a admissão da revogação de plano, havendo que
se respeitar a ampla defesa e o contraditório.
A revogação será obrigatória (art. 81, CP) se o apenado, durante o período de
prova, (a) for condenado por crime doloso, com sentença transitada em julgado
ou (b) não cumprir, injustificadamente, as exigências de prestação de serviço
comunitário ou limitação de fins de semana. A lei menciona ainda a frustração da
execução da pena de multa e a injustificada não reparação do dano como causas
de revogação obrigatória (art. 81, II, CP). Entretanto, a pena pecuniária deve
ser tratada como dívida de valor e o procedimento a ser seguido será aquele da
execução em sede cível.
A revogação é facultativa (art. 81, § 1º, CP) se o sujeito (a) inobservar alguma
das condições judiciais ou (b) for condenado a pena privativa de liberdade ou
restritiva de direitos, com sentença transitada em julgado, por crime imprudente
ou contravenção. Neste caso o juiz ainda tem a alternativa (art. 81, § 3º, CP) de, ao
invés de revogar o benefício, prorrogar o período de prova até o máximo, desde
que, por óbvio, já não tenha sido este o prazo estabelecido.

162.2 Prorrogação do período de prova

Considerando que a condenação irrecorrível por crime doloso é causa


obrigatória de revogação (art. 81, I, CP), decorre uma derradeira regra (art. 81,
§ 2º) que busca evitar a situação na qual o sujeito se torna réu em outro crime ou
contravenção e ainda sem sentença definitiva no outro processo transcorre, neste,
o período de prova do sursis: neste caso, o período é prorrogado até o julgamento
definitivo dos referidos processos, e caso se tenha condenação definitiva se operará
a revogação do benefício, evitando a extinção da punibilidade.
Sobre tal regra, três observações: (a) o período de prova é prorrogado apenas
temporalmente, não se obrigando o sujeito a prosseguir cumprindo as condições
do sursis; (b) a prorrogação “muda as regras do jogo” e tem caráter sancionatório,
baseando-se em uma presunção de culpa em relação a um outro processo no qual
deve valer o princípio da presunção de inocência (art. 5º, LVII, CR), o que é no
mínimo questionável; e (c) caso sobrevenha sentença condenatória definitiva, a
revogação será obrigatória apenas se for caso de crime doloso, e facultativa se a
condenação for por contravenção.
Se a prorrogação não for realizada porque não chegou aos autos a notícia
da existência de outro processo criminal em face do condenado, ou mesmo se
tal informação chegar em momento posterior ao encerramento do período de

312
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 163

prova sem revogação, a posição mais democrática é aquela que reconhece como
irreversível a extinção da punibilidade. Mesmo sendo a prorrogação automática,
não dependendo de decisão judicial, também assim é a extinção da pena privativa
de liberdade com a expiração do prazo sem revogação (art. 82, CP). Todavia,
há precedentes dos tribunais superiores considerando que o descumprimento
de condição imposta durante o período de prova pode dar ensejo à revogação,
mesmo após a expiração do prazo do período de prova.

162.3 Sursis e prescrição da pretensão executória

Prevalece entendimento segundo o qual não corre a prescrição executória


durante o período de prova do sursis (STF, HC 91562/PR, Rel. Min. Joaquim
Barbosa, j. 09.10.2007). Não há previsão legal de tal causa impeditiva e o STF
considera que “o efeito decorre da lógica do sistema vigente”, em perigosa flexi­
bilização de um rol que é reconhecido como taxativo.

162.4 Expiração do período de prova e extinção da punibilidade

Caso transcorra o período de prova e o prazo expire sem que tenha havido
revogação, é declarada extinta a punibilidade (art. 82, CP). A lei brasileira optou,
como se vê, pelo critério da ausência de revogação para se definir o significado de
“êxito positivo” do período de prova. Convém assinalar que existem orientações
diversas em outros ordenamentos, em prol de um critério mais explicitamente
subjetivo, segundo o qual o “êxito positivo” do sursis deve decorrer de uma
valoração do juízo de execução acerca da reeducação do réu, independentemente
do decurso do prazo sem revogação.

Art. 163  A sentença condenatória será registrada, com a nota de sus­


pensão em livro especial do Juízo a que couber a execução da pena.
§ 1º Revogada a suspensão ou extinta a pena, será o fato averbado à
margem do registro.
§ 2º O registro e a averbação serão sigilosos, salvo para efeito de infor­
mações requisitadas por órgão judiciário ou pelo Ministério Público, para
instruir processo penal.

313
Art. 164 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

163.1 Registro da suspensão condicional da pena

Regra anterior à difusão do processo eletrônico, busca regulamentar o


registro em livro especial da suspensão condicional da pena, sendo as informações
sigilosas, salvo requisição de órgão judiciário ou do Ministério Público para
instruir processo penal.

CAPÍTULO IV

Da Pena de Multa

Art. 164  Extraída certidão da sentença condenatória com trânsito em


julgado, que valerá como título executivo judicial, o Ministério Público
requererá, em autos apartados, a citação do condenado para, no prazo
de 10 (dez) dias, pagar o valor da multa ou nomear bens à penhora.
§ 1º Decorrido o prazo sem o pagamento da multa, ou o depósito da
respectiva importância, proceder-se-á à penhora de tantos bens quantos
bastem para garantir a execução.
§ 2º A nomeação de bens à penhora e a posterior execução seguirão o
que dispuser a lei processual civil.

164.1 Considerações gerais sobre a pena de multa

A pena de multa é prevista pelo Código Penal como terceira opção san­
cionatória aos imputáveis, ao lado das penas privativas de liberdade e penas
restritivas de direito. O dispositivo prevê o procedimento para sua cobrança, com
citação do condenado em autos apartados para pagamento da multa em 10 dias,
após extração da certidão da sentença condenatória com trânsito em julgado.

164.2 Natureza fiscal da multa e legitimidade para execução

A LEP ainda prevê a possibilidade de penhora de bens para garantir a


execução, seguindo a lei processual civil. A partir desse momento, porém, deve-se
observar a legislação fiscal, inclusive para fins de prescrição, tratando-se a pena
de multa como dívida de valor (art. 51, CP).

314
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 164

Alteração do art. 51 do Código Penal promovida pela Lei 13.964/2019,


determina que a execução da pena de multa será no juízo de execução penal.
Não se altera a natureza fiscal da pena de multa, mas há repercussão no debate
sobre a legitimidade ativa para a execução.
Em julgamento da ADI 3.150/DF, em dezembro de 2018, o STF já havia
decidido ser do Ministério Público a legitimidade prioritária para execução de
multas em condenações penais, devendo ocorrer na Vara de Execuções Penais,
restando à Procuradoria da Fazenda Pública legitimidade subsidiária: “a legi­
timação prioritária para a execução da multa penal é do Ministério Público perante
a Vara de Execuções Penais. 3. Por ser também dívida de valor em face do Poder
Público, a multa pode ser subsidiariamente cobrada pela Fazenda Pública, na
Vara de Execução Fiscal, se o Ministério Público não houver atuado em prazo
razoável (90 dias)” (STF, ADI 3.150/DF, j. 13/12/2018).
O entendimento do STF e a alteração legal significam a superação da Súmula
521-STJ, a qual dispunha ser “exclusiva da Procuradoria da Fazenda Pública” a
legitimidade para execução fiscal de multa pendente de pagamento imposta em
sentença condenatória
Por fim, após o julgamento da ADI 3.150/DF pelo STF, o STJ reviu entendi­
mento anterior e afirmou que a pena de multa continua tendo natureza de sanção
penal. Dessa forma, “o inadimplemento da pena de multa obsta a extinção da
punibilidade do apenado” (STJ, AgRg no REsp 1.850.903/SP, 5ª T., j. 28/04/2020).

164.3 Ausência de efeitos penais em caso de inadimplência

Nessa esteira, não podem haver consequências penais por conta de eventual
inadimplência quanto à pena de multa. Em julgamento de Recurso Repetitivo
(STJ, REsp 1.519.777/SP, 3ª Seção, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, j. 26/08/2015), o
Superior Tribunal de Justiça firmou a tese de que “Nos casos em que haja condenação
a pena privativa de liberdade e multa, extinta a primeira (ou de eventual restritiva de
direitos que a substituir), em razão de seu integral cumprimento, deve ser reconhecida a
extinção da punibilidade, mesmo sem o efetivo pagamento da sanção pecuniária”.

164.4 Suspensão dos direitos políticos e pendência de pagamento da pena de


multa

Ver comentários ao art. 3º.

315
Art. 165 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

Art. 165  Se a penhora recair em bem imóvel, os autos apartados serão


remetidos ao Juízo Cível para prosseguimento.

165.1 Possibilidade de penhora em bem imóvel

Embora a LEP preveja a penhora, o dispositivo deve ser revogado, residindo


todas as regras de execução do valor devida pela multa na legislação pertinente
à execução fiscal.

Art. 166  Recaindo a penhora em outros bens, dar-se-á prosseguimento


nos termos do § 2º do artigo 164, desta Lei.

166.1 Possibilidade de penhora em outros bens

Embora a LEP preveja a penhora, o dispositivo deve ser revogado, residindo


todas as regras de execução do valor devida pela multa na legislação pertinente
à execução fiscal.

Art. 167  A execução da pena de multa será suspensa quando sobrevier


ao condenado doença mental (artigo 52 do Código Penal).

167.1 Suspensão da execução da pena de multa na superveniência de doença


mental

A LEP prevê a suspensão da execução, caso sobrevenha doença mental no


condenado. Porém, mais uma vez, devem ser observadas as regras de execução
fiscal. Ainda que esteja suspenso o processo de execução, vale lembrar que não
fica suspenso, nesse caso, o curso do prazo da prescrição executória, pois não há
previsão legal e são aplicadas os marcos interruptivos e suspensivos da legislação
fiscal.
316
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 168

Art. 168  O Juiz poderá determinar que a cobrança da multa se efetue


mediante desconto no vencimento ou salário do condenado, nas
hipóteses do artigo 50, § 1º, do Código Penal, observando-se o seguinte:
- o limite máximo do desconto mensal será o da quarta parte da remu­
neração e o mínimo o de um décimo;
- o desconto será feito mediante ordem do Juiz a quem de direito;
- o responsável pelo desconto será intimado a recolher mensalmente,
até o dia fixado pelo Juiz, a importância determinada.

168.1 Pagamento da multa mediante desconto no vencimento ou salário do


condenado

A lei possibilita que o pagamento da pena de multa seja realizado mediante


desconto no vencimento/salário do condenado, nos termos do que é previsto no
Código Penal: quando a pena de multa for aplicada isoladamente, quando for
aplicada cumulativamente com pena restritiva de direitos e quando for concedida
a suspensão condicional da pena (art. 50, § 1º, CP). Ainda em coerência com o
disposto no art. 50, § 2º, do CP, segundo o qual o desconto “não deve incidir sobre
os recursos indispensáveis ao sustento do condenado e de sua família”, a LEP limita o
desconto mensal à quarta parte da remuneração, com mínimo de um décimo dela.

Art. 169  Até o término do prazo a que se refere o artigo 164 desta
Lei, poderá o condenado requerer ao Juiz o pagamento da multa em
prestações mensais, iguais e sucessivas.
§ 1° O Juiz, antes de decidir, poderá determinar diligências para verificar
a real situação econômica do condenado e, ouvido o Ministério Público,
fixará o número de prestações.
§ 2º Se o condenado for impontual ou se melhorar de situação econômica,
o Juiz, de ofício ou a requerimento do Ministério Público, revogará o
benefício executando-se a multa, na forma prevista neste Capítulo, ou
prosseguindo-se na execução já iniciada.

317
Art. 170 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

169.1 Parcelamento da pena de multa

Permite-se o parcelamento da pena de multa, em prestações iguais e


sucessivas. Há precedente do STF no sentido de o indulto da pena privativa de
liberdade não alcançar a pena de multa que está sendo paga parceladamente:
“1. O indulto da pena privativa de liberdade não alcança a pena de multa que tenha
sido objeto de parcelamento espontaneamente assumido pelo sentenciado. 2. O acordo de
pagamento parcelado da sanção pecuniária deve ser rigorosamente cumprido sob pena
de descumprimento de decisão judicial, violação ao princípio da isonomia e da boa-fé
objetiva” (STF, EP 11 IndCom-AgR, Rel. Min. Roberto Barroso, Tribunal Pleno,
j. 08/11/2017). No entanto, se o respectivo decreto que concede o indulto abranger
a pena de multa, a interpretação em sentido contrário é inconstitucional porque
viola a competência privativa da Presidência da República para conceder indulto
e comutar penas (art. 84, XII, CF).

Art. 170  Quando a pena de multa for aplicada cumulativamente com


pena privativa da liberdade, enquanto esta estiver sendo executada,
poderá aquela ser cobrada mediante desconto na remuneração do
condenado (artigo 168).
§ 1º Se o condenado cumprir a pena privativa de liberdade ou obtiver
livramento condicional, sem haver resgatado a multa, far-se-á a cobrança
nos termos deste Capítulo.
§ 2º Aplicar-se-á o disposto no parágrafo anterior aos casos em que for
concedida a suspensão condicional da pena.

170.1 Complemento ao art. 168

O artigo repete a regra do artigo anterior, acrescentando às hipóteses ali


descritas a de pena de multa aplicada cumulativamente com pena privativa de
liberdade, enquanto esta estiver sendo executada.

318
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 171

TÍTULO VI
Da Execução das Medidas de Segurança

CAPÍTULO I

Disposições Gerais

Art. 171  Transitada em julgado a sentença que aplicar medida de


segurança, será ordenada a expedição de guia para a execução.

171.1 Execução das medidas de segurança

Não há execução provisória de medidas de segurança, sendo expedida a


guia de internação somente após o trânsito em julgado, nos termos da Resolução
113/2010-CNJ. Porém, tem-se admitido a figura da internação provisória desde que
ela foi prevista pela Lei 12.403/2011, inexplicavelmente, como “medida cautelar
alternativa à prisão” (art. 319, VII, CPP), desde que haja laudo de insanidade
mental. Porém, trata-se de medida cautelar substancialmente equivalente à prisão
preventiva, sem qualquer outra regulamentação infralegal, a qual seria necessária
para evitar sua aplicação abusiva. Deve-se restringir ao máximo seu uso, incidindo
todos os limites temporais à medida de segurança definitiva, notadamente pela
Súmula 527/STJ (ou seja, a medida cautelar obviamente não pode ser mais longa
do que a pena máxima em abstrato cominada para o delito).

171.2 Superação da visão tutelar e Lei 10.216/2001

O tema das medidas de segurança exige a leitura conjunta com os arts.


96-99 do Código Penal, o qual traz os pressupostos de sua aplicação, mas mais
necessária ainda é a superação da visão tutelar e tradicional construída a partir
do inadmissível conceito de “periculosidade”.
Não são apenas o Código Penal e a LEP os dispositivos legais a regula­men­
tarem a execução das medidas de segurança no Brasil. Assumindo o escopo de
enfrentar o tema como uma questão de saúde, o próprio Conselho Nacional de
Justiça determina a observância da Lei 10.216/2001, conhecida como lei da “reforma
psiquiátrica”: “O juiz competente para a execução da medida de segurança, sempre que

319
Art. 172 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

possível buscará implementar políticas antimanicomiais, conforme sistemática da Lei


nº 10.216, de 06 de abril de 2001” (art. 17 da Resolução nº. 113/2010-CNJ).
Para muitos, inclusive, a Lei 10.216/01 já teria derrogado todos os dispositivos
da Parte Geral do Código Penal, assim como da LEP, concernentes às medidas
de segurança. Mesmo que não se chegue a tal conclusão, a conjugação das leis já
produziria profundas transformações na perspectiva sobre o tema.
A Recomendação nº. 35/2011, também do Conselho Nacional de Justiça, é
ainda mais contundente, priorizando a execução da medida de segurança em
meio aberto e visando manter e fortalecer os laços sociais e familiares do paciente.
E mais: “III – em caso de internação, ela deve ocorrer na rede de saúde pública ou
conveniada, com acompanhamento do programa especializado de atenção ao paciente
judiciário”, indicando princípio de não discriminação entre pacientes que come­
teram e os que não cometeram atos definidos como criminais pela lei penal.

171.3 Jurisprudência de direitos humanos e questão manicomial

O Caso Ximenes Lopes vs. Brasil foi a primeira condenação do Brasil na Corte
Interamericana de Direitos Humanos, em 2006, e o primeiro caso envolvendo
violação de direitos de pessoa com deficiência mental; na ocasião, a Corte definiu
a “sujeição” como “qualquer ação que interfira na capacidade de um paciente
de tomar decisões ou que restrinja sua liberdade de movimento”, podendo ser
empregada somente como último recurso e com finalidade protetiva35.

Art. 172  Ninguém será internado em Hospital de Custódia e Tratamento


Psiquiátrico, ou submetido a tratamento ambulatorial, para cumprimento
de medida de segurança, sem a guia expedida pela autoridade judiciária.

172.1 Exigência de expedição de guia pela autoridade judiciária

É direito da pessoa portadora de transtorno mental, caso seja internada, que


se trate de um estabelecimento “dotado de características hospitalares” (art. 99, CP)

35
Sobre, PAIVA, Caio; HEEMANN, Thimotie. Jurisprudência Internacional de Direitos Humanos. 2. ed.
Belo Horizonte: Editora CEI, 2017, p. 312-315.

320
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 172

e não asilar (art. 4º, § 3º , Lei 10.216/2001). Proibida a internação sem a expedição
de guia pela autoridade judiciária.

172.2 Ilegalidade da manutenção de paciente internado em penitenciária

Configura constrangimento ilegal manter pessoa com medida de segurança


em penitenciária, por estar “aguardando vaga” no estabelecimento adequado
(STF, HC 122670, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, j. 05/08/2014). Precedentes do
STJ no mesmo sentido afirmam que “O inimputável submetido à medida de segurança
de internação em hospital de custódia e tratamento psiquiátrico não pode permanecer em
estabelecimento prisional comum, ainda que sob a justificativa de ausência de vagas ou falta
de recursos estatais” (STJ, HC 231.124/SP, Rel. Min. Laurita Vaz, 5ª T., j. 23/04/2013).

172.3 Ilegalidade da submissão de paciente judiciário ao sistema disciplinar e


a medida de isolamento

É absolutamente ilegal tratar o paciente internado em medida de segurança


como preso comum. A redação do art. 44, parágrafo único, da LEP, deixa claro que
o paciente judiciário não está submetido ao sistema disciplinar, mesmo porque
lhe falta a capacidade de culpabilidade e a consciência do ilícito administrativo
(art. 46, LEP).
Portanto, não há possibilidade jurídica de cometimento de falta disciplinar
e a própria lavratura de comunicado disciplinar nesse sentido é um indicativo
concreto de violação do art. 99 do Código Penal e do art. 4º, § 3º da Lei 10.216/2001,
segundo os quais o estabelecimento terá características hospitalares, sendo vedada
a internação em instituição com características asilares.
Mais grave ainda é a colocação do paciente em isolamento disciplinar. A
Portaria de Consolidação do Ministério da Saúde (GM/MS) n. 5, de 28 de setembro
de 2017, que consolida normas sobre as ações e os serviços de saúde do Sistema
Único de Saúde, proíbe a existência de espaços restritivos (celas fortes) (item
2.2.2 do Anexo XXV), como o são as celas destinadas a isolamento disciplinar
nas galerias de “castigo”.
O fluxo para se lidar com situações de surto psiquiátrico é outro, distinto do
procedimento regular do sistema disciplinar, havendo a necessidade de capacitação
de pessoal especificamente para este fim, com a presença de profissionais da saúde
e acompanhamento médico. O uso do isolamento com finalidade terapêutica não
é recomendável pelos estudos médico-psiquiátricos mais atuais, embora também
321
Art. 173 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

não seja proibido. De qualquer modo, ele só pode ser determinado por profissional
da medicina e desde que seja a última alternativa, acompanhado de diagnóstico
clínico, posterior a tentativas de resolução da situação por outros meios como,
por exemplo, o uso de antipsicóticos por via oral. É pacífico, no debate técnico da
área da saúde mental, que o uso de contenção por isolamento desacompanhado
de outras medidas e de acompanhamento médico cria riscos enormes à saúde
do paciente.

Art. 173  A guia de internamento ou de tratamento ambulatorial, ex­traída


pelo escrivão, que a rubricará em todas as folhas e a subscreverá com o
Juiz, será remetida à autoridade administrativa incumbida da execução
e conterá:
I - a qualificação do agente e o número do registro geral do órgão oficial
de identificação;
II - o inteiro teor da denúncia e da sentença que tiver aplicado a medida
de segurança, bem como a certidão do trânsito em julgado;
III - a data em que terminará o prazo mínimo de internação, ou do
tratamento ambulatorial;
IV - outras peças do processo reputadas indispensáveis ao adequado
tratamento ou internamento.
§ 1° Ao Ministério Público será dada ciência da guia de recolhimento e
de sujeição a tratamento.
§ 2° A guia será retificada sempre que sobrevier modificações quanto ao
prazo de execução.

173.1 Elementos da guia de internamento ou tratamento ambulatorial

O artigo traz todos os elementos que deem constar da guia emitida pela
autoridade judiciária. É fundamental que constem informações sobre eventual
período de prisão cautelar ou mesmo internação provisória, pois o período deverá
ser detraído do prazo mínimo para realização do primeiro exame de cessação de
periculosidade (art. 42, CP) e do prazo máximo de internação (S. 527/STJ).

322
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 174

Art. 174  Aplicar-se-á, na execução da medida de segurança, naquilo


que couber, o disposto nos artigos 8° e 9° desta Lei.

174.1 Classificação e exame criminológico nas medidas de segurança

A aplicação dos art. 8º e 9º deverá ser adaptada à peculiaridade de se tratar, a


medida de segurança, de uma questão de saúde mental. Ao invés de classificação
e exame, portanto, deve-se falar em diagnóstico, em tratamento adequado e
prognóstico de alta.

CAPÍTULO II

Da Cessação da Periculosidade

Art. 175  A cessação da periculosidade será averiguada no fim do prazo


mínimo de duração da medida de segurança, pelo exame das condições
pessoais do agente, observando-se o seguinte:
I - a autoridade administrativa, até 1 (um) mês antes de expirar o prazo
de duração mínima da medida, remeterá ao Juiz minucioso relatório
que o habilite a resolver sobre a revogação ou permanência da medida;
II - o relatório será instruído com o laudo psiquiátrico;
III - juntado aos autos o relatório ou realizadas as diligências, serão
ouvidos, sucessivamente, o Ministério Público e o curador ou defensor,
no prazo de 3 (três) dias para cada um;
IV - o Juiz nomeará curador ou defensor para o agente que não o tiver;
V - o Juiz, de ofício ou a requerimento de qualquer das partes, poderá
determinar novas diligências, ainda que expirado o prazo de duração
mínima da medida de segurança;
VI - ouvidas as partes ou realizadas as diligências a que se refere o inciso
anterior, o Juiz proferirá a sua decisão, no prazo de 5 (cinco) dias.

323
Art. 175 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

175.1 Cessação da periculosidade e prazo máximo da medida de segurança

Não obstante se fale em prazo indeterminado – há o prazo mínimo de um


a três anos para realização do exame sobre a “cessação da periculosidade” –,
interpretação sistemática dos dispositivos legais e da vedação constitucional
da prisão perpétua fundamentaram entendimento jurisprudencial segundo
o qual o prazo máximo de 30 anos (agora 40 anos, conforme alteração da Lei
13.964/2019) valeria também para a medida de segurança (STF, HC 98.360/RS,
Rel. Min. Ricardo Lewandowski, j. 04/08/2009; STF, HC 97.621/RS, Rel. Min. Cezar
Peluso, j. 02/06/2009; STF, HC 84.219/SP, Rel. Min. Marco Aurélio, j. 16/08/2005),
independentemente da verificação da “cessação da periculosidade”.
O ideal seria, como já vem defendendo corrente minoritária, a realização da
dosimetria da pena, cujo quantum, ainda que não aplicável, serviria para limitar,
no caso concreto, o tempo de duração da medida de segurança. Seria uma forma
de se evitar o absurdo tratamento mais gravoso ao inimputável que ao imputável.
Majoritário é o entendimento segundo o qual o prazo máximo de duração
da medida de segurança seria a pena máxima cominada em abstrato para o crime
correspondente, com fulcro na vedação constitucional de penas perpétuas (art. 5º,
XLII, b, CR), nos princípios da isonomia e da proporcionalidade. É o entendimento
consolidado pelo STJ na Súmula 527: “O tempo de duração da medida de segurança não
deve ultrapassar o limite máximo da pena abstratamente cominada ao delito praticado”.
Observe-se, assim, que internações ou até medidas cautelares de internação
provisória por conta de crimes de ameaça, cuja pena máxima é de seis meses (art.
147, CP), são aberrações jurisdicionais que chegam a indicar a prática de crime
de abuso de autoridade (art. 4º, “a” e “d”, Lei 4.898/1965).

175.2 Ilegalidade de laudos genéricos e sem fundamentação

Seguindo a sistemática tradicional de realização anual de exame de cessação


de periculosidade, a LEP exige que se trate de “relatório minucioso”. Laudos
vagos, genéricos, com expressões repetidas em casos diversos, não podem ser
aceitos pelo juízo de execução, o qual deverá determinar a realização de novo
exame, com fulcro no art. 181 do CPP: “No caso de inobservância de formalidades, ou
no caso de omissões, obscuridades ou contradições, a autoridade judiciária mandará suprir
a formalidade, complementar ou esclarecer o laudo. Parágrafo único. A autoridade poderá
também ordenar que se proceda a novo exame, por outros peritos, se julgar conveniente”.
Havendo divergência entre os laudos psiquiátrico e psicológico, sendo um
favorável e outro contrário à desinternação, parece indevido optar por acatar a
324
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 176

opinião técnica mais desfavorável ao paciente sem a complementação técnica


necessária. Caso o juízo queira decidir, deverá ser no sentido do laudo mais
favorável, com base no princípio do favor-rei.

Art. 176  Em qualquer tempo, ainda no decorrer do prazo mínimo de


duração da medida de segurança, poderá o Juiz da execução, diante de
requerimento fundamentado do Ministério Público ou do interessado,
seu procurador ou defensor, ordenar o exame para que se verifique a
cessação da periculosidade, procedendo-se nos termos do artigo anterior.
Art. 177  Nos exames sucessivos para verificar-se a cessação da pericu­
losidade, observar-se-á, no que lhes for aplicável, o disposto no artigo
anterior.

176.1 Determinação de exame para verificação da cessação da periculosidade

A periodicidade anual para os exames de “cessação de periculosidade”


é um parâmetro máximo, não mínimo, podendo os exames sucessivos ocorrer
a qualquer tempo por requerimento fundamentado do Ministério Público, da
Defensoria Pública, do interessado ou sua Defesa.

Art. 178  Nas hipóteses de desinternação ou de liberação (artigo 97, § 3º,


do Código Penal), aplicar-se-á o disposto nos artigos 132 e 133 desta Lei.

178.1 Desinternação ou liberação

Quando a perícia indicar a “cessação da periculosidade”, a medida de


segurança será revogada e efetuada a devida desinternação ou liberação do
sujeito, sob as mesmas condições previstas para o livramento condicional. Sendo
assim, a medida de segurança estará suspensa pelo prazo de um ano da liberação
ou desinternação sem a prática de fato que “indique” a “persistência de sua
periculosidade” (art. 97, § 3º, CP), sendo extinta após o decurso de tal prazo.

325
Art. 179 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

Art. 179  Transitada em julgado a sentença, o Juiz expedirá ordem para


a desinternação ou a liberação.

179.1 Condicionamento da desinternação ou liberação

A ordem de desinternação ou liberação é aqui condicionada ao trânsito em


julgado da decisão. Cabendo agravo da decisão de desinternação, isso significa
se tratar da única hipótese na qual o agravo em execução tem efeito suspensivo.

326
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 180

TÍTULO VII
Dos Incidentes de Execução

CAPÍTULO I

Das Conversões

Art. 180  A pena privativa de liberdade, não superior a 2 (dois) anos,


poderá ser convertida em restritiva de direitos, desde que: I - o condenado
a esteja cumprindo em regime aberto;
II - tenha sido cumprido pelo menos 1/4 (um quarto) da pena;
III - os antecedentes e a personalidade do condenado indiquem ser a
conversão recomendável.

180.1 Conversão da pena privativa de liberdade em restritiva de direitos

Progressão ou regressão de regime não são consideradas hipóteses de


conversão, de acordo com a própria Exposição de Motivos da LEP (Itens 160 e
161), segundo a qual na conversão se substitui a pena cumprida, enquanto na
transferência de um regime para outro se opera dentro da mesma pena privativa
de liberdade.
Em relação à conversão da pena privativa de liberdade em restritiva de
direitos, exigia-se pena aplicada não superior a dois anos; porém, o dispositivo
foi parcialmente derrogado pelo art. 44 do CP, o qual admite a substituição, no
próprio momento de aplicação, quando a pena não ultrapassa quatro anos. Não
ocorrendo a substituição na sentença condenatória e iniciada a execução da pena
privativa de liberdade, a conversão pode ser requerida se presentes os demais
requisitos: regime aberto; cumprimento de pelo menos ¼ (um quarto) da pena e
juízo de valor sobre os antecedentes e a personalidade do condenado.

Art. 181  A pena restritiva de direitos será convertida em privativa de


liberdade nas hipóteses e na forma do artigo 45 e seus incisos do Código
Penal.

327
Art. 181 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

§ 1º A pena de prestação de serviços à comunidade será convertida


quando o condenado:
a) não for encontrado por estar em lugar incerto e não sabido, ou
desatender a intimação por edital;
b) não comparecer, injustificadamente, à entidade ou programa em que
deva prestar serviço;
c) recusar-se, injustificadamente, a prestar o serviço que lhe foi imposto;
d) praticar falta grave;
e) sofrer condenação por outro crime à pena privativa de liberdade, cuja
execução não tenha sido suspensa.
§ 2º A pena de limitação de fim de semana será convertida quando
o condenado não comparecer ao estabelecimento designado para o
cumprimento da pena, recusar-se a exercer a atividade determinada
pelo Juiz ou se ocorrer qualquer das hipóteses das letras “a”, “d” e “e” do
parágrafo anterior. § 3º A pena de interdição temporária de direitos será
convertida quando o condenado exercer, injustificadamente, o direito
interditado ou se ocorrer qualquer das hipóteses das letras “a” e “e”, do
§ 1º, deste artigo.

181.1 Conversão da pena restritiva de direitos em pena privativa de liberdade

A conversão em pena privativa de liberdade ocorre nos casos de descum­


primento injustificado das condições colocadas; inobstante isso, é possível se
manter a pena substitutiva mesmo se sobrevier nova condenação por pena
privativa de liberdade, evitando-se neste caso a conversão (art. 44, §§ 4º e 5º, CP)

181.2 Conversão da prestação de serviços à comunidade

Especificamente, a pena de prestação de serviços à comunidade será


convertida em privação da liberdade quando o condenado (a) não for encontrado
por estar em lugar incerto e não sabido, ou desatender a intimação por edital;
(b) não comparecer, injustificadamente, à entidade ou programa no qual presta
serviço; (c) recusar-se, injustificadamente, a prestar o respectivo serviço; (d) pra­
ticar falta grave; ou (e) sofrer nova condenação a pena privativa de liberdade, cuja
execução não tenha sido suspensa.

328
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 182

181.3 Conversão da limitação de fim de semana

A pena de limitação de fim-de-semana é convertida nos casos (a) de não


comparecimento do condenado ao estabelecimento designado; (b) de recusa
ao exercício da atividade determinada pelo Juízo; (c) estando o condenado em
lugar incerto e não sabido ou desatendendo intimação por edital; (d) de prática
de falta grave; ou, enfim, (e) de nova condenação a pena privativa de liberdade,
cuja execução não tenha sido suspensa.

181.4 Conversão da interdição temporária de direitos

A pena de interdição temporária de direitos será convertida (a) quando o


direito interditado vier a ser exercido, injustificadamente, pelo condenado, ou
ainda (b) se estiver o condenado em lugar incerto e não sabido, (c) desatendendo
intimação por edital, ou (d) se sobrevier nova condenação a pena privativa de
liberdade, cuja execução não tenha sido suspensa.

181.5 Observância do regime inicial fixado na sentença condenatória

Caso haja a conversão da pena restritiva de direitos em pena privativa de


liberdade, deverá ser respeitado o regime aplicado na sentença condenatória que
procedeu à substituição, sendo descabido bis in idem determinar a regressão ao
regime fechado por conta da conversão, sem que haja outro fundamento de fato
para tanto.

Art. 182  (Revogado pela Lei nº 9.268, de 1996)


Art. 183  Quando, no curso da execução da pena privativa de liberdade,
sobrevier doença mental ou perturbação da saúde mental, o Juiz, de
ofício, a requerimento do Ministério Público, da Defensoria Pública ou
da autoridade administrativa, poderá determinar a substituição da pena
por medida de segurança.
(Redação dada pela Lei nº 12.313, de 2010).

329
Art. 183 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

183.1 Substituição/conversão da pena privativa de liberdade por medida de


segurança

É possível a substituição/conversão das penas privativas de liberdade em


medida de segurança quando sobrevier doença mental ou perturbação da saúde
mental. Nesse caso, “Sua duração está adstrita ao tempo que resta para o cumprimento
da pena privativa de liberdade estabelecida na sentença condenatória, sob pena de ofensa
à coisa julgada” (STJ, HC 130.162/SP, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura,
6ª T., j. 02/08/2012).
Caso se verifique a cessação da doença ou perturbação da saúde mental,
a legalidade estrita exige a desinternação, e não a “reconversão” da medida de
segurança em pena privativa de liberdade, hipótese sem base legal.

183.2 Convivência entre execuções de pena privativa de liberdade e de


medida de segurança

Merece atenção especial a situação em que há execuções de penas privativas


de liberdade em curso, e em novo processo sobrevém sentença absolutória
imprópria impondo medida de segurança. Todas as condenações anteriores
devem ser convertidas em medida de segurança, de modo unificado? Ou seria
admissível a coexistência de penas aplicadas para a pessoa como imputável com
a medida de segurança? Assim decidiu o STJ: “(...) O sistema vicariante afastou
a imposição cumulativa ou sucessiva de pena e medida de segurança, uma vez que a
aplicação conjunta ofenderia o princípio do ne bis in idem, já que o mesmo indivíduo
suportaria duas consequências em razão do mesmo fato. 3. Tratando-se o reconhecimento da
incapacidade de decisão incidental no processo penal, não há obstáculo jurídico à imposição
de medida de segurança em um feito e penas privativas de liberdade em outros processos”
(STJ, HC 275.635/ SP, Rel. Min. Nefi Cordeiro, 6ª T., j. 03/03/2016).
A posição adotada pelo STJ, portanto, é a de que não há violação ao sistema
vicariante na coexistência de penas e medidas de segurança porque elas se
refeririam a fatos distintos. Porém, a execução é una. Não é possível compatibilizar
medidas fundadas em pressupostos tão distintos como são a culpabilidade e a
“periculosidade”. A opção mais correta parece ser a absorção de todas as penas
privativas de liberdade em curso pela nova medida de segurança, não havendo
como o condenado ser imputável para alguns casos, e inimputável para outros.

330
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 184

Art. 184  O tratamento ambulatorial poderá ser convertido em internação


se o agente revelar incompatibilidade com a medida.
Parágrafo único. Nesta hipótese, o prazo mínimo de internação será de
1 (um) ano.

184.1 Conversão do tratamento ambulatorial em internação

Espécie de “regressão” específica das medidas de segurança, o tratamento


ambulatorial pode ser convertido em internação se o agente revelar “incompa­
tibilidade com a medida”, conceito vago e impreciso e que deve ser delimitado
de forma análoga ao tratamento do imputável, ou seja, exigindo a prática de
condutas equiparáveis às faltas disciplinares de natureza grave.

CAPÍTULO II
Do Excesso ou Desvio

Art. 185  Haverá excesso ou desvio de execução sempre que algum ato
for praticado além dos limites fixados na sentença, em normas legais ou
regulamentares.

185.1 Excesso ou desvio de execução

Se a inobservância dos parâmetros legais tem caráter quantitativo, trata-se


de excesso; já se tem caráter qualitativo, configura desvio. Configura excesso,
por exemplo, a aplicação arbitrária e por tempo indeterminado de sanções
administrativas; e desvio a configuração de condições insalubres e inadequadas
para a sobrevivência humana; ou ainda, é também considerado desvio a concessão
de um benefício penitenciário ao condenado sem a presença de todos os requisitos
previstos.
A manutenção do apenado em regime mais gravoso que aquele fixado na
sentença como regime inicial, ou aguardando vaga no regime correto, muito
frequente quando faltam vagas em estabelecimentos de regime semiaberto,
configura constrangimento ilegal e situação na qual cabe, indubitavelmente,
331
Art. 186 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

instauração de incidente de desvio de execução, ou mesmo Reclamação em face


de violação da Súmula Vinculante nº. 56/ STF.

Art. 186  Podem suscitar o incidente de excesso ou desvio de execução:


I- o Ministério Público;
II - o Conselho Penitenciário;
III - o sentenciado;
IV - qualquer dos demais órgãos da execução penal.

1.6 Legitimidade para suscitar o incidente de excesso ou desvio de


execução

Todos os órgãos da execução penal, bem como o próprio sentenciado, por


meio não necessariamente formal (como uma carta ao juízo), podem suscitar
incidentes de excesso ou desvio de execução.

CAPÍTULO III
Da Anistia e do Indulto

Art. 187  Concedida a anistia, o Juiz, de ofício, a requerimento do interes­


sado ou do Ministério Público, por proposta da autoridade administrativa
ou do Conselho Penitenciário, declarará extinta a punibilidade.

187.1 Considerações gerais sobre a anistia

Historicamente caracterizado como prerrogativa do poder soberano, o


“poder de graça” sobreviveu às críticas tanto iluministas como positivistas e se
mantém até hoje, não como “renúncia” ao “direito de punir”, mas como um ato
de poder – eminentemente ligado à soberania – capaz de abolir os efeitos da pena.
A anistia é ato político do Poder Legislativo (art. 48, VIII, CR) que extingue
a punibilidade concreta (art. 107, II, CP) em relação a determinado fato punível
(crime político), antes ou depois de instaurado processo. A anistia pode ser

332
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 188

classificada como própria ou imprópria, conforme incida antes ou depois


do trânsito em julgado de eventual condenação; total ou parcial, conforme a
amplitude de seu alcance; condicionada ou incondicionada, conforme imponha
ou não obrigações ao(s) anistiado(s); e, por fim, irrestrita ou restrita, conforme
inclua todos os crimes conexos com o principal ou apenas alguns desses.

Art. 188  O indulto individual poderá ser provocado por petição


do condenado, por iniciativa do Ministério Público, do Conselho
Penitenciário, ou da autoridade administrativa.

188.1 Considerações gerais sobre o indulto

Trata-se de ato político do Poder Executivo, mais especificamente da


Presidência da República (art. 84, XII, CF), capaz de extinguir a punibilidade de
réu condenado por crime comum (art. 107, II, CP). De acordo com o art. 84, XII,
parágrafo único, da Constituição, a atribuição pode ser delegada a Ministros de
Estado, ao Procurador-geral da República ou ao Advogado-geral da União.
No artigo, trata-se do indulto individual ou graça. No caso de indulto
humanitário, concedido em decorrência de grave estado de saúde do preso
verificado por avaliação médica, excepciona-se a exigência de parecer do Conselho
Penitenciário (art. 70, I, LEP) podendo-se também afastar a vedação aos casos de
crime hediondo ou equiparado por absoluta supremacia da tutela da vida humana
e do princípio da dignidade.

Art. 189  A petição do indulto, acompanhada dos documentos que a


instruírem, será entregue ao Conselho Penitenciário, para a elaboração
de parecer e posterior encaminhamento ao Ministério da Justiça.

189.1 Indulto individual

Trata-se aqui do indulto individual, de muito raro uso. Na prática, insere-se


a petição na análise à luz dos decretos de indulto coletivo, sequer chegando ao
conhecimento da Presidência da República.

333
Art. 190 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

O exercício do poder de graça é vedado, por imposição constitucional (art.


5º, XLIII, CR), nos casos de tortura, tráfico ilícito de entorpecentes, terrorismo e
crimes hediondos. A controvérsia possível se dá sobre a extensão da vedação à
comutação de pena, o que dependerá da compreensão sobre a natureza jurídica
desta última, e mesmo ao indulto coletivo, o qual seria algo distinto e previsto
apenas no art. 84, XII, da CF.
De acordo com o art. 70, I, da LEP, não há parecer do CONPEN nos casos
de indulto humanitário.

Art. 190  O Conselho Penitenciário, à vista dos autos do processo e


do prontuário, promoverá as diligências que entender necessárias e
fará, em relatório, a narração do ilícito penal e dos fundamentos da
sentença condenatória, a exposição dos antecedentes do condenado e
do procedimento deste depois da prisão, emitindo seu parecer sobre o
mérito do pedido e esclarecendo qualquer formalidade ou circunstâncias
omitidas na petição.

190.1 Necessidade de parecer do Conselho Penitenciário

Artigo de baixa ou nenhuma eficácia atualmente, o parecer do Conselho


Penitenciário é exigido para os pedidos de indulto individual.

Art. 191 Processada no Ministério da Justiça com documentos e o


relatório do Conselho Penitenciário, a petição será submetida a despacho
do Presidente da República, a quem serão presentes os autos do processo
ou a certidão de qualquer de suas peças, se ele o determinar.

191.1 Procedimento do indulto individual

Na mesma linha, a petição de graça será submetida ao Presidente da


República, após instrução.

334
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 192

Art. 192  Concedido o indulto e anexada aos autos cópia do decreto,


o Juiz declarará extinta a pena ou ajustará a execução aos termos do
decreto, no caso de comutação.

192.1 Indulto coletivo, comutação de penas e repercussão judicial

O indulto coletivo é concedido por decreto e decorre de ato discricionário


privativo do Presidente da República (art. 84, XII, parágrafo único, CR), que pode
delegar a atribuição a Ministros de Estado, ao Procurador-geral da República ou
ao Advogado-geral da União. Dirigindo-se a fatos, e não a pessoas, tem o condão
de extinguir a punibilidade (art. 107, II, CP), permanecendo os efeitos civis da
condenação. Havia o costume, no Brasil, de se editar sempre um decreto de
indulto coletivo no dia de Natal, mas nada impede que outros sejam publicados
em outras datas.
É controversa a natureza jurídica da comutação de pena: embora seja
tradicionalmente tratada como modalidade de indulto parcial, levanta ROIG
o argumento de que é impossível tratar comutação como forma de indulto
porque não é juridicamente viável se falar em uma hipótese de extinção parcial
de punibilidade36. A rigor, o conceito de graça diria respeito apenas à petição
individual de perdão de pena, enquanto os conceitos de indulto e comutação
seriam, respectivamente, o ato coletivo de indulto por decreto presidencial e a
conversão de uma pena em outra. A importância prática disso é que ambos não
estariam abarcados pela vedação constitucional nos casos de crime hediondo ou
equiparado.
De fato, percebe-se que o art. 84, XII, da Constituição, fala expressamente
na prerrogativa presidencial de “conceder indulto e comutar penas”, sem que os
termos indulto ou comutação seja assim mencionados na vedação que se faz aos
crimes hediondos ou equiparados no art. 5º, XLIII, da CF, no qual se fala apenas
em “graça ou anistia”. Na mesma esteira, parte da doutrina já defendia a definição
de comutação não como redução da pena, mas como a substituição da pena
aplicada por uma nova37, permitindo inclusive a recusa por parte do condenado.

36
ROIG, Rodrigo Duque Estrada. Execução Penal, p. 493 e ss.
37
Nesse sentido: MORAES, Railda Saraiva de. O poder de graça. Rio de Janeiro: Forense, 1979.

335
Art. 192 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

A posição do STF é contra esse entendimento: “A jurisprudência deste


Supremo Tribunal Federal é firme no sentido de que o instituto da graça, previsto
no art. 5.º, inc. XLIII, da Constituição Federal, engloba o indulto e a comutação
da pena, estando a competência privativa do Presidente da República para
a concessão desses benefícios limitada pela vedação estabelecida no referido
dispositivo constitucional” (STF, HC 115.099/SP, Rel. Min. Carmen Lúcia, j.
19/02/2013).
Por fim, entende o STJ que “para a concessão de indulto, é de se considerar
a pena originalmente imposta ao apenado, não sendo computada a pena
remanescente em decorrência de comutações anteriores” (STJ, AgRg no HC
454.365/SP, Rel. Min. Nefi Cordeiro, j. 07/02/2019).

192.2 Natureza declaratória da decisão concessiva de indulto ou comutação

Apesar de o preenchimento das condições fixadas, por cada condenado, ser


verificado pelo juízo de execução, a decisão deste é meramente declaratória, não
podendo haver a criação ou exigência de requisitos não previstos no decreto. Pelo
mesmo motivo, a data de publicação do decreto é a única data-base legítima de
referência para aferição de todos os requisitos.
Nesse sentido é ilegal a exigência, pelo juízo, de exame criminológico, se
este não foi previsto expressamente no respectivo decreto presidencial (STF, HC
98422, Rel. Min. Gilmar Mendes, 2ª T., j. 05/10/2010). Do mesmo modo, é ilegal
negar indulto ou comutação por conta de falta grave praticada fora do período
estabelecido pelo decreto (STJ, HC 266.280/SP, Rel. Min. Laurita Vaz, 5ª T.,
j. 15/08/2013).
Na mesma linha, o STJ veda interpretação extensiva ou ampliativa das
restrições contidas nos decretos de indulto, como no exemplo: “Consoante a
jurisprudência deste Superior Tribunal de Justiça, a interpretação extensiva das
restrições contidas no decreto concessivo de comutação/indulto de penas consiste,
nos termos do art. 84, XII, da Constituição Federal, em invasão à competência
exclusiva do Presidente da República, motivo pelo qual, preenchidos os requisitos
estabelecidos na norma legal, o benefício deve ser concedido por meio de sentença
- a qual possui natureza meramente declaratória -, sob pena de ofensa ao princípio
da legalidade” (STJ, HC 529.025/SP, Rel. Min. Nefi Cordeiro, j. 17/12/2019).
Os requisitos para o indulto podem ter caráter objetivo – como, por exemplo,
o cumprimento de uma determinada fração da pena aplicada – ou subjetivo,
referentes ao comportamento, aos antecedentes e à personalidade do condenado.

336
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 192

Mas o cometimento de falta grave não impede, necessariamente, a concessão do


indulto, mormente porque o requisito disciplinar deve ser valorado à época da
publicação do decreto presidencial, e não posteriormente. Com efeito, deixar de
conceder indulto ou comutação porque foi cometida falta grave – até mesmo a
fuga – em data posterior ao decreto natalino viola os termos deste e configura
bis in idem, na medida em que a respectiva falta disciplinar será levada em conta
como obstáculo para o decreto natalino do ano seguinte.
Ainda que o decreto de indulto coletivo não seja auto executável, ao juízo
cabe apenas a verificação do preenchimento de condições já estabelecidas e
a declaração de um direito já existente, declarando extinta a punibilidade ou
reajustando a pena, no caso de comutação.

192.3 Indulto e efeitos secundários da condenação

Entendeu o Superior Tribunal de Justiça, na Súmula 631/STJ, que o indulto


alcança apenas os efeitos primários da condenação: “O indulto extingue os
efeitos primários da condenação (pretensão executória), mas não atinge os efeitos
secundários, penais ou extrapenais”. (Súmula 631, DJe 29/04/2019). Uma das
principais consequências práticas desse entendimento é que o indultado seguirá
sendo reincidente, pelo prazo legal, ou com maus antecedentes.

192.4 Discussão sobre a necessidade de homologação da falta grave ocorrer


no período de doze meses anterior ao decreto de indulto coletivo

O tema tem a seguinte posição do STF: “Cinge-se a controvérsia a determinar se


a homologação judicial da aplicação de sanção por falta grave, para obstar a comutação de
pena, necessariamente precisa se verificar no prazo de doze meses, contados retroativamente
à data de publicação do decreto em questão, ou se é suficiente que a falta grave tenha sido
praticada nesse interstício, ainda que a homologação judicial ocorra a posteriori. 3. Em face
do próprio texto legal, de sua ratio, exige-se apenas que a falta grave tenha sido cometida
no prazo em questão. 4. Com efeito, o art. 5º, caput, do Decreto nº 8.380/14, limita-se a
impor a homologação judicial da aplicação da sanção por falta grave, não exigindo que ela
tenha que se dar nos doze meses anteriores a sua publicação. Precedente. 5. Não bastasse
isso, uma vez que se exige a realização de audiência de justificação, assegurando-se o
contraditório e a ampla defesa, não faria sentido que a homologação judicial devesse ocorrer
dentro daquele prazo, sob pena de não haver tempo hábil para a apuração de eventual falta
grave praticada em data próxima à publicação do decreto” (STF, RHC 133443, Rel. Min.
Dias Toffoli, 2ª T., j. 04/10/2016).
337
Art. 192 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

192.5 Possibilidade de indulto em concurso de crimes

O indulto recai sobre a pena – ou seja, sobre a punibilidade concreta rela­


tiva a determinado fato – e não sobre o condenado como autor. Para obter a pena
total e proceder ao cálculo das frações exigidas, entende o STJ que importa a data
do trânsito em julgado da condenação e não da juntada da guia de recolhimento:
“Na análise do preenchimento do requisito objetivo para fins de concessão do
benefício do indulto, devem ser consideradas todas as condenações com trânsito
em julgado até a data da publicação do Decreto Presidencial, sendo indiferente
o fato da juntada da guia de execução penal ocorrido em momento posterior à
publicação do decreto” (STJ, AgRg no REsp 1792365/ES, Rel. Min. Laurita Vaz,
j. 04/02/2020).
É possível que ele incida parcialmente nos casos de concurso material ou
superveniência de nova condenação, quando apenas um dos crimes em questão
tem a graça vedada. Por exemplo, é possível que o indulto incida sobre os crimes
comuns cometidos em concurso ou cujas penas são executadas conjuntamente
à pena decorrente de condenação por crime hediondo, excluindo-se a graça
somente para este último. Decretos recentes estabeleceram a regra de exigência
de cumprimento de ao menos 2/3 (dois terços) da pena correspondente ao crime
impeditivo para que possa haver indulto ou comutação da pena correspondente ao
crime comum. Trata-se de uma ficção jurídica criada justamente para possibilitar
a aplicação do instituto, pois para o cômputo de pena efetivamente cumprida o
condenado cumprirá primeiro a integralidade da pena mais grave (art. 76, CP)
para só depois cumprir a pena passível de indulto.

192.6 Discussão sobre o alcance do indulto em casos de parcelamento da


pena de multa

Há precedente do STF no sentido de o indulto da pena privativa de liberdade


não alcançar a pena de multa que está sendo paga parceladamente: “Execução
Penal. Agravo Regimental. Indulto da pena privativa de liberdade. Impossibilidade de
extensão à multa objeto de parcelamento. 1. O indulto da pena privativa de liberdade
não alcança a pena de multa que tenha sido objeto de parcelamento espontaneamente
assumido pelo sentenciado. 2. O acordo de pagamento parcelado da sanção pecuniária
deve ser rigorosamente cumprido sob pena de descumprimento de decisão judicial,
violação ao princípio da isonomia e da boa-fé objetiva. 3. Hipótese em que o requerente
não comprovou impossibilidade econômica que justificasse o descumprimento do ajuste.

338
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 192

4. Agravo regimental desprovido”. (STF, EP 11 IndCom-AgR, Rel. Min. Roberto


Barroso, Tribunal Pleno, j. 08/11/2017). No entanto, se o respectivo decreto que
concede o indulto abranger a pena de multa, a interpretação em sentido contrário é
inconstitucional porque viola a competência privativa da Presidência da República
para conceder indulto e comutar penas (art. 84, XII, CF).

192.7 Controle judicial do decreto presidencial de indulto coletivo

Em 2018, o Supremo Tribunal Federal suspendeu liminarmente e parcial­


mente os efeitos do Decreto nº. 9.246/2017, no bojo da Ação Direta de Inconsti­
tucionalidade nº. 5.874, ajuizada pelo Ministério Público Federal. Em decisão
monocrática de 12 de março de 2018, argumentou-se que: “(...). O decreto de indulto
não pode esvaziar a política criminal estabelecida pelo legislador, tornando os requisitos
para a extinção da punibilidade consideravelmente mais brandos do que aqueles exigidos
para o cumprimento adequado da pena. Violação à separação dos Poderes. Perdão da multa
que também desatende os fins constitucionais a serem protegidos pela política criminal.
Cumprimento deficiente dos deveres de proteção do Estado a diversos valores e bens
jurídicos constitucionais que dependem da efetividade mínima do sistema penal. 5. Excesso
de leniência que é particularmente grave no que diz respeito aos crimes de corrupção e
correlatos. Necessária exclusão desses crimes do âmbito de incidência do indulto. (...)”.
O STF invocou, portanto, possível incompatibilidade com os fins constitu­
cionais do indulto e violação do princípio da separação dos poderes. Ocorre
que não há restrição constitucional a situações de natureza humanitária para
concessão do indulto, não se podendo dizer que o indulto seria exclusivamente
aquele humanitário. Ainda, o art. 84, XII, da Constituição, é claro em estabelecer
a concessão de indulto e comutação de penas como competência privativa do
Presidente da República, ensejando o questionamento se não é o próprio Poder
Judiciário a violar o princípio da separação de poderes quando altera requisitos
e parâmetros de um decreto presidencial.
Em 9 de maio de 2019, no julgamento definitivo da ADI 5.874/DF, o Tribunal,
por maioria, revogou a cautelar e julgou improcedente a ação direta, prevalecendo
o entendimento pela constitucionalidade do Decreto nº. 9.246/2017.

339
Art. 193 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

Art. 193  Se o sentenciado for beneficiado por indulto coletivo, o Juiz,


de ofício, a requerimento do interessado, do Ministério Público, ou por
iniciativa do Conselho Penitenciário ou da autoridade administrativa,
providenciará de acordo com o disposto

193.1 Reconhecimento judicial dos requisitos para indulto

O reconhecimento do preenchimento das condições determinadas, com a


consequente extensão dos efeitos do indulto, pode ocorrer (a) de ofício, pelo juiz;
(b) por requerimento da Defensoria Pública ou do Ministério Público; (c) por
requerimento do interessado ou quem o represente; (d) por iniciativa do Conse­
lho Penitenciário ou (e) da própria autoridade administrativa, providenciando-
se o anexo de cópia do decreto aos autos. Se o requerimento não foi formulado
pela Defesa, o juiz deve ouvi-la antes de conceder ou negar o indulto (art. 112,
§§ 1º e 2º, LEP).
Vale observar que não há nada que impeça a concessão de indulto nos casos
de sursis, livramento condicional ou de pena restritiva de direito, na medida em
que em nenhum momento se restringe o instituto à pena privativa de liberdade
ou à vigência de sua execução. Para o sursis e o livramento condicional, basta
considerar a premissa de que o período de prova constitui cumprimento de pena:
fora do cárcere, mas pena. O mesmo raciocínio vale para as penas restritivas de
direitos, situação na qual a ausência de incompatibilidade é reforçada por uma
questão lógica: não é possível que a imposição de sanção menos gravosa implique
na menor fruição de determinados benefícios em comparação ao caso de imposição
de sanção mais gravosa. Ora, se a pena restritiva de direitos é aplicada de forma
substitutiva à pena privativa de liberdade, não é admissível que não possa o
condenado, nesse caso, e desde que presentes os requisitos, fruir de benefícios
decorrentes do exercício do poder de graça que incidirão sobre condenados a
pena privativa de liberdade. De qualquer forma, é possível que o próprio decreto
exclua a incidência da graça em algumas dessas hipóteses.

193.2 Indulto e execução provisória da pena

A concessão de indulto sempre foi possível em sede de execução provisória,


ou seja, havendo sentença condenatória não transitada em julgado. Evidentemente,
a absolvição é mais benéfica que a extinção da punibilidade por tal via, não
340
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 193

sendo este, porém, um óbice definitivo, mesmo porque a concessão não afasta o
cabimento de revisão criminal. Todavia, o art. 11, II, do Decreto nº. 9.246/2017,
que previa indulto na pendência de recurso da acusação, foi considerado
inconstitucional em decisão monocrática do Ministro Roberto Barroso, em 12 de
março de 2018, no bojo da ADI nº. 5.874.

193.3 Indulto e detração penal pelo período entre o decreto presidencial e a


decisão que extingue a punibilidade

Há precedente do Superior Tribunal de Justiça considerando que a


concessão de indulto abrange o período temporal entre o decreto presidencial e
a decisão concessiva. Ou seja, este lapso temporal não pode ser “aproveitado”
pelo condenado como prisão cautelar cumprida em novo processo criminal,
e descontado a título de detração na sentença condenatória. Nesse sentido:
“RECURSO ESPECIAL. EXECUÇÃO PENAL. EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE
EM RAZÃO DE INDULTO PLENO. PERÍODO COMPREENDIDO ENTRE A
PUBLICAÇÃO DO DECRETO PRESIDENCIAL E A DECISÃO QUE CONCEDE
O BENEFÍCIO NO CASO CONCRETO. DETRAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE.
1. O instituto da detração não pode tangenciar o benefício do indulto porque, enquanto o
período compreendido entre a publicação do Decreto Presidencial e a decisão que reconhece
o indulto, decretando-se a extinção da punibilidade do agente, refere-se à uma prisão pena,
a detração somente se opera em relação à medida cautelar, o que impede a sua aplicação no
referido período. 2. Recurso especial a que se nega provimento” (STJ, REsp 1557408/DF,
Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, julgado
em 16/02/2016, DJe 24/02/2016).
Todavia, se a decisão é meramente declaratória, a concessão do indulto
ocorre na data do decreto. E se há outra decisão decretando prisão preventiva
ou temporária por novo delito, ainda que a prisão penal e a prisão processual se
sobreponham no período compreendido entre o decreto presidencial e a decisão
concessiva de indulto, não parece haver fundamento legal para se negar vigência
ao art. 42 do Código Penal, que prevê a detração da prisão provisória.

341
Art. 194 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

TÍTULO VIII
Do Procedimento Judicial

Art. 194  O procedimento correspondente às situações previstas nesta


Lei será judicial, desenvolvendo-se perante o Juízo da execução.

194.1 Procedimento judicial

Por situações previstas nesta Lei, deve-se compreender inclusive aquelas


atinentes ao sistema disciplinar, o qual não pode nem deve ser subtraído do
controle jurisdicional quanto à legalidade dos atos administrativos. A execução
penal é una e individualizada, atuando sobre o sujeito, havendo uma ou várias
condenações. Não à toa, o processo de execução é regido por um único número de
cadastro vinculado ao executado, reunindo todos os eventuais processos criminais
e condenações referentes a fatos diversos.

Art. 195  O procedimento judicial iniciar-se-á de ofício, a requerimento do


Ministério Público, do interessado, de quem o represente, de seu cônjuge,
parente ou descendente, mediante proposta do Conselho Penitenciário,
ou, ainda, da autoridade administrativa.

195.1 Início do procedimento judicial

Experiências recentes demonstram que a informatização dos sistemas de


execução penal é passo decisivo e imprescindível ao cumprimento e à celeridade no
respeito aos direitos da execução penal. Para tanto, é também fundamental que os
dados provenientes de diversas fontes sejam integrados em plataforma inteligente,
capaz de ao mesmo tempo indicar informações sobre o andamento processual do
processo de execução, mas também informações sobre o comportamento e sobre
o local de prisão da pessoa.
Por outro lado, redobra-se a necessidade de atenção da defesa técnica aos
cálculos automaticamente realizados pelo sistema. Há controvérsias relevantes
342
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 196

sobre qual fração incidir sobre o quantum de pena, sobre a data-base fixada para a
progressão de regime e o livramento condicional, entre inúmeros outros aspectos.
Não à toa, os pedidos de retificação de relatório ou atestado de penas são os mais
importantes novos incidentes da execução penal, muitas vezes preliminares para
que se possa ter reconhecido pelo sistema eletrônico o adimplemento do requisito
objetivo dos direitos da execução.

Art. 196  A portaria ou petição será autuada ouvindo-se, em 3 (três)


dias, o condenado e o Ministério Público, quando não figurem como
requerentes da medida.
§ 1º Sendo desnecessária a produção de prova, o Juiz decidirá de plano,
em igual prazo.
§ 2º Entendendo indispensável a realização de prova pericial ou oral, o
Juiz a ordenará, decidindo após a produção daquela ou na audiência
designada.

196.1 Procedimento na execução penal

São muito simples as disposições legais sobre o procedimento judicial na


execução penal, restringindo-se à definição de prazo de 3 (três) dias para oitiva
do Ministério Público e do condenado, ou seja, da Defesa, quando não figurarem
como requerentes. O prazo para a Defensoria Pública é contado em dobro. É de
três dias também o prazo para decisão judicial.
A informatização do processo deve trazer avanços no controle de prazos
para o alcance de direitos da execução penal, o que pode ensejar maior celeridade
no procedimento. O juízo da 1a Vara de Execução Penal de Curitiba, Paraná,
por exemplo, venceu o 13º Prêmio Innovare, no ano de 2016, categoria Juiz,
por conta de portaria que automatizou a concessão de progressão de regime, a
partir da detecção, pelo processo eletrônico, do alcance do requisito objetivo e da
inexistência de faltas graves. Esse é o resumo da boa prática: “O processo ocorre
da seguinte forma: cinco dias antes do fim de alguma etapa do cumprimento da pena,
promotor, defensor e juiz são avisados da data e realizam, pelo próprio sistema, todos os
procedimentos e pesquisas necessários à liberação do apenado. Documentos exigidos para
a concessão de um alvará de soltura ou de uma progressão de regime, como o atestado de
bom comportamento carcerário e a manifestação do Ministério Público sobre o cabimento

343
Art. 197 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

dessa liberação, são viabilizados e produzidos em tempo real, poupando tempo, além de
recursos materiais e humanos. Havendo impugnação, a questão é decidida pelo juízo. Não
havendo, a secretaria checa os dados e, confirmando-os, toma as medidas necessárias para
que haja a concessão do benefício, no exato dia em que o sentenciado faz jus ao direito,
sem atrasos”.38

196.2 Princípio da oralidade e audiências de justificação

Embora o parágrafo segundo indique a produção de prova pericial ou


oral somente se “indispensável”, diversos decretos presidenciais de indulto
condicionam o impedimento do indulto ou comutação por falta grave à sua
homologação judicial com audiência de justificação. Independentemente da
previsão dos decretos, o princípio da oralidade deve ser homenageado e aplicado
na execução penal, sendo muito importante que o controle judicial sobre o sistema
disciplinar não prescinda da oitiva direta da pessoa presa, por meio das audiências
de justificação.

Art. 197  Das decisões proferidas pelo Juiz caberá recurso de agravo,
sem efeito suspensivo.

197.1 Agravo em execução

A lei prevê o recurso de agravo – sem efeito suspensivo – como modalidade


única de impugnação de quaisquer decisões do juízo de execução, mas sem
definir seu respectivo procedimento. É que, no mesmo período de elaboração da
LEP, preconizava-se a inserção do agravo de instrumento no Código de Processo
Penal, o que acabou por não ocorrer, deixando a questão em aberto acerca do rito
a ser seguido. A lacuna produziu duas correntes na jurisprudência: (a) para a
primeira, o correto seria a aplicação subsidiária dos dispositivos do CPP referentes
ao recurso em sentido estrito (art. 581-592, CPP), com fulcro no art. 2º da LEP; e
(b) para a segunda, melhor seria a aplicação analógica das regras concernentes
ao agravo de instrumento do Código de Processo Civil, com fulcro no art. 3º do

38
Disponível em: http://www.premioinnovare.com.br/media/imprensa/4/download/pdf.

344
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 197

CPP. Há diferenças relevantes quanto ao prazo e ao procedimento: por exemplo, na


primeira hipótese o prazo é de cinco dias para interposição e de dois dias para
apresentação das razões; já se aplicado o CPC, com a nova regulamentação, ter-
se-ia prazo único de quinze dias.
Embora sustentada por boa parte da doutrina, a aplicação do Código de
Processo Civil não merece guarida em face dos próprios critérios tradicionais de
interpretação: havendo dispositivo da própria LEP remetendo à interpretação
analógica do Código de Processo Penal (art. 2º, LEP), não haveria razão para se
defender a analogia com o Código de Processo Civil. É essa, inclusive, a posição
prevalente no Supremo Tribunal Federal, que já editou a Súmula 700/STF segundo
a qual “É de cinco dias o prazo para interposição de agravo contra decisão do juiz da
execução penal”.
A legitimidade para agravar é do Ministério Público, da Defesa ou do próprio
condenado, que pode postular diretamente em juízo. Interposto o agravo por
petição ou termo nos autos, deverá ser ouvido o Ministério Público, sob pena de
nulidade. O princípio da fungibilidade recursal é aplicável: sendo assim, eventual
interposição errônea de outro recurso, pelo condenado, pode ser conhecida como
agravo em execução.
Admitindo-se a utilização do rito do recurso em sentido estrito, há a
possibilidade de juízo de retratação e o conseguinte efeito regressivo (art. 589,
CPP). Nesse caso, reformando-se a própria decisão, o gravame resta invertido e
a parte contrária é que poderá, então, recorrer “por simples petição”.
Há uma hipótese excepcional em que se admite efeito suspensivo para
o agravo em execução: no caso de impugnação, pelo Ministério Público, da
expedição de ordem de desinternação ou liberação de indivíduo sujeito a medida
de segurança (art. 179, LEP), na medida em que o texto legal fala na expedição
da ordem apenas após o trânsito em julgado.Se a lei é específica quanto a esta
hipótese, significa que não cabe pedir liminar ou tutela de urgência em outros
casos, sem prejuízo da possibilidade de impetração de habeas corpus se o caso
concreto indicar constrangimento ilegal apto a ensejar a ação constitucional.
Sobre o tema, vale atentar à Súmula 604/STJ: “Mandado de segurança não se
presta para atribuir efeito suspensivo a recurso criminal interposto pelo Ministério
Público.”. O entendimento é aplicável ao Agravo em Execução interposto pelo
Ministério Público.

345
Art. 197 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

197.2 Outras opções de defesa na execução penal

Embora a lei trate expressamente somente do agravo, há outras possibilidades


de exercício do direito de defesa na execução penal. Primeiramente, se houver
carência de motivação das decisões do juízo de execução, violando-se imperativo
constitucional (art. 93, IX, CR), é essencial o devido manejo dos embargos de
declaração, quando houver ponto obscuro, omisso, ambíguo ou contraditório.
Mais controversa é a questão do cabimento de embargos infringentes nos casos
de decisão colegiada não unânime: para o STF (HC 77.456, Rel. Min. Carlos
Velloso, j. 15/12/1998; HC 65.988, Rel. Min. Sydney Sanches, j. 08/03/1989), acena-
se positivamente à possibilidade com fulcro no próprio rito do recurso em
sentido estrito. Segundo entendimento diverso, adotado em precedentes no STJ
(REsp 194.548/DF, Rel. Min. José Arnaldo da Fonseca, j. 02/03/1999), os embargos
infringentes seriam cabíveis apenas nos casos de apelação e recurso em sentido
estrito e não constituiriam, no caso, etapa necessária à interposição de eventual
recurso especial ou extraordinário aos Tribunais Superiores, considerando-se
inaplicável, no caso, a Súmula 207/STJ (“É inadmissível recurso especial quando cabíveis
embargos infringentes contra o acórdão proferido no tribunal de origem”).

197.3 Descabimento de medidas coletivas visando cassar decisões favoráveis


às pessoas presas

A legislação é clara ao prever que o agravo é o recurso contra decisão do


Juízo de Execução. Há um imperativo de individualização recursal, portanto,
que não prejudica a possibilidade de impetração de habeas corpus coletivo, posto
que este tem base constitucional e visa atacar atos de constrangimento ilegal que
produzem violação coletiva de direitos, esteja ou não ligada a decisões do juízo
de execução penal. Em outras palavras, o habeas corpus tem autonomia, com objeto
e características próprias.
Não se pode admitir, porém, que visando cassar um conjunto de decisões
do Juízo de Execução Penal concedendo progressão de regime ou livramento
condicional, busque-se “driblar” tanto a necessidade de individualização como a
ausência de efeito suspensivo do Agravo em Execução por meio de ações cautelares
com pedido liminar.
No caso concreto tomado de exemplo, o Ministério Público do Paraná
requereu ao Tribunal de Justiça do mesmo Estado a cassação simultânea de
diversas decisões proferidas pelo Juízo de 1º grau em um mutirão carcerário, em
uma espécie de “habeas corpus coletivo ao contrário”. Na ocasião, o TJPR concedeu
346
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 197

liminar (TJPR, Medida Cautelar de Natureza Penal 0014271-95.2020.8.16.0000,


março de 2020) “suspendendo a eficácia” de aproximadamente trinta decisões
de soltura com base na situação decorrente da pandemia do novo Coronavírus.
Discordamos da própria possiblidade de se admitir, contra o réu, medida
coletiva sem previsão legal ou sequer regimental para fazer as vezes de recurso
regularmente disciplinado pelo ordenamento jurídico, com consequências graves
em termos de insegurança jurídica e efeitos sociais colaterais imensuráveis.

347
Art. 198 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

TÍTULO IX
Das Disposições Finais e Transitórias

Art. 198  É defesa ao integrante dos órgãos da execução penal, e


ao servidor, a divulgação de ocorrência que perturbe a segurança
e a disciplina dos estabelecimentos, bem como exponha o preso à
inconveniente notoriedade, durante o cumprimento da pena.

198.1 Proibição de divulgação de fatos ocorridos dentro do cárcere

Em nome da segurança e da disciplina dos estabelecimentos, é vedado aos


servidores e aos órgãos da execução penal divulgar determinadas ocorrências
“que perturbem a segurança e a disciplina”. A vedação não deve servir como
justificativa para a falta de transparência quanto a mortes e suicídios dentro das
prisões, as quais devem ser, todas, devidamente averiguadas e comunicadas aos
órgãos de execução penal.

199.1 Proibição de divulgação de fatos que exponham o preso a


inconveniente notoriedade

De outro lado, é também vedado divulgar a imagem do preso sem sua


autorização.

Art. 199  O emprego de algemas será disciplinado por decreto federal.


(Regulamento)

199.1 Regulação do emprego de algemas por Súmula Vinculante

Após diversos precedentes, o Supremo Tribunal Federal publicou, em 2008 a


Súmula Vinculante nº. 11, que assim dispõe: “Só é lícito o uso de algemas em casos de
resistência e de fundado receio de fuga ou de perigo à integridade física própria ou alheia,

348
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 200

por parte do preso ou de terceiros, justificada a excepcionalidade por escrito, sob pena de
responsabilidade disciplinar, civil e penal do agente ou da autoridade e de nulidade da prisão
ou do ato processual a que se refere, sem prejuízo da responsabilidade civil do Estado”.

199.2 Regulação do emprego de algemas pelo Decreto 8.858, de 26 de


setembro de 2016

Com o mesmo teor da Súmula Vinculante, o decreto a que fez referência o


dispositivo legal foi publicado apenas em 2016 (nº. 8.858/2016).

199.3 Excepcionalidade absoluta do uso algemas nos pés (“marca-passo”)

As diretrizes estabelecidas tornam de uso ainda mais excepcional o uso de


algemas nos pés, chamados “marca-passos”, o qual deve ser justificado com rigor
maior do que o uso de algemas nas mãos.

199.4 Vedação do uso de algemas em mulheres grávidas

O art. 292, parágrafo único, do Código de Processo Penal, acrescido pela


Lei 13.434, de 12 de abril de 2017, estabelece que: “É vedado o uso de algemas em
mulheres grávidas durante os atos médico-hospitalares preparatórios para a realização
do parto e durante o trabalho de parto, bem como em mulheres durante o período de
puerpério imediato”.

Art. 200  O condenado por crime político não está obrigado ao trabalho.

200.1 Não obrigatoriedade ao trabalho do condenado por crime político

Crimes políticos não têm, a rigor, uma definição estrita pela Constituição,
subentendendo-se serem aqueles previstos na Lei 7.170/83 (crimes contra a
segurança nacional), com disposições específicas na legislação penal.

349
Art. 201 ANDRÉ RI BEI R O GI AMBERARDI NO

Art. 201  Na falta de estabelecimento adequado, o cumprimento da


prisão civil e da prisão administrativa se efetivará em seção especial da
Cadeia Pública.

201.1 Sobre a prisão civil do devedor de alimentos

Única hipótese de prisão civil, a custódia do devedor de alimentos “será


cumprida em regime fechado, devendo o preso ficar separado dos presos comuns”, seguindo
a regra do art. 528, §4º, do Código de Processo Civil. A previsão de separação é
coerente à regra da LEP, caso não haja estabelecimento específico para este fim.

Art. 202  Cumprida ou extinta a pena, não constarão da folha corrida,


atestados ou certidões fornecidas por autoridade policial ou por auxiliares
da Justiça, qualquer notícia ou referência à condenação, salvo para instruir
processo pela prática de nova infração penal ou outros casos expressos
em lei.

202.1 Direito de silêncio nas certidões

É garantido o sigilo em relação aos registros do processo e da condenação,


mas a ela não se restringindo (art. 93, CP), na medida em que pode visar outros
efeitos complementares à pena principal.

Art. 203  No prazo de 6 (seis) meses, a contar da publicação desta Lei,


serão editadas as normas complementares ou regulamentares, neces­
sárias à eficácia dos dispositivos não auto-aplicáveis.
§ 1º Dentro do mesmo prazo deverão as Unidades Federativas, em
convênio com o Ministério da Justiça, projetar a adaptação, construção e
equipamento de estabelecimentos e serviços penais previstos nesta Lei.
§ 2º Também, no mesmo prazo, deverá ser providenciada a aquisição
ou desapropriação de prédios para instalação de casas de albergados.

350
CO M E N TÁ R I O S À L EI D E EXECUÇ ÃO PENAL Art. 204

§ 3º O prazo a que se refere o caput deste artigo poderá ser ampliado, por
ato do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária, mediante
justificada solicitação, instruída com os projetos de reforma ou de
construção de estabelecimentos.
§ 4º O descumprimento injustificado dos deveres estabelecidos para as
Unidades Federativas implicará na suspensão de qualquer ajuda finan­
ceira a elas destinada pela União, para atender às despesas de execução
das penas e medidas de segurança.
Art. 204  Esta Lei entra em vigor concomitantemente com a lei de reforma
da Parte Geral do Código Penal, revogadas as disposições em contrário,
especialmente a Lei nº 3.274, de 2 de outubro de 1957.

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